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31 Primavera 2007 N.º 116 - 3.ª Série pp. 31-72 A Segurança Energética da Europa António Costa Silva Presidente da Comissão Executiva da Partex Oil and Gas Resumo O problema da Segurança Energética da Europa tem vindo a assumir um crescente protagonismo no debate político e estratégico tendo em conta o contexto actual do preço alto do petróleo e do gás e o impacto nos preços da energia. As fragi- lidades da Europa são patentes quando se olha para a crescente dificuldade das companhias europeias em terem acesso a novas reservas de petróleo e gás, ao declínio acentuado da pro- dução no Mar do Norte, à onda crescente de nacionalização dos recursos, à utilização pela Rússia da energia como arma geopolítica. Neste sentido é feita uma reflexão sobre a neces- sidade de definir um novo conceito de segu- rança energética para o século XXI. O leque de ameaças diversificou-se com o terrorismo, a desestabilização interna nos países produtores, a erosão da capacidade excedentária de pro- dução, a influência do factor demográfico e a ameaça climática. As respostas estratégicas propostas neste artigo estão relacionadas com a redução da depen- dência da OPEP, a criação de um modelo energético descentralizado, mais híbrido e flexível, a definição de uma nova política para as Reservas Estratégicas de Petróleo e Gás e dos mecanismos de utilização, a diversificação das fontes de abastecimento da Europa, para evitar a dependência da Rússia, com a valori- zação da Bacia Atlântica, do Mediterrâneo e Norte de África e das ligações à Ásia Central através da Turquia. Medidas importantes são também a integração da China e da Índia na Agência Internacional de Energia e a cons- trução do Mercado Único Europeu de Energia. Abstract Energy Security in Europe Nowadays the problem of the Energy Security is one of the top priorities in the European political and strategic debate taking into account the current framework of high oil and gas prices and the strong impact in the prices of energy. The fragilities of Europe are evident when we spot the increasing difficulties of European oil and gas companies to access new reserves, the production decline of the North Sea, the growing wave resources’ nationalization, the utilization by Russia of energy as a political weapon. Within this framework, this paper analyses the need to define a new concept of energy security tailored to the twenty-first century. The range of threats diversified and covers terrorism, the internal destabilization of producing countries, the erosion of OPEC spare capacity, the climatic threat and the influence of the demographic factor. The strategic answers proposed in this paper to tackle the existing threats are related with the reduction of the dependence of OPEC, the creation of a new decentralized Energy Model, more hybrid and flexible, the definition of a policy for Oil and Gas Strategic Reserves and the diversification of the sources of supply to minimize the dependence on Russia with the valorisation of the Atlantic Basin, the Mediterranean and North Africa and the access to Central Asia via Turkey. The integration of China and India in the International Agency of Energy and the building of the European unified and integrated market of energy are mandatory.

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Segurança Energética na Europa

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  • 31Primavera 2007N. 116 - 3. Sriepp. 31-72

    A S e g u r a n a E n e r g t i c a d a E u r o p a

    Antnio Costa SilvaPresidente da Comisso Executiva da Partex Oil and Gas

    Resumo

    O problema da Segurana Energtica da Europatem vindo a assumir um crescente protagonismono debate poltico e estratgico tendo em contao contexto actual do preo alto do petrleo e dogs e o impacto nos preos da energia. As fragi-lidades da Europa so patentes quando se olhapara a crescente dificuldade das companhiaseuropeias em terem acesso a novas reservas depetrleo e gs, ao declnio acentuado da pro-duo no Mar do Norte, onda crescente denacionalizao dos recursos, utilizao pelaRssia da energia como arma geopoltica.Neste sentido feita uma reflexo sobre a neces-sidade de definir um novo conceito de segu-rana energtica para o sculo XXI. O leque deameaas diversificou-se com o terrorismo, adesestabilizao interna nos pases produtores,a eroso da capacidade excedentria de pro-duo, a influncia do factor demogrfico e aameaa climtica.As respostas estratgicas propostas neste artigoesto relacionadas com a reduo da depen-dncia da OPEP, a criao de um modeloenergtico descentralizado, mais hbrido eflexvel, a definio de uma nova poltica paraas Reservas Estratgicas de Petrleo e Gs edos mecanismos de utilizao, a diversificaodas fontes de abastecimento da Europa, paraevitar a dependncia da Rssia, com a valori-zao da Bacia Atlntica, do Mediterrneo eNorte de frica e das ligaes sia Centralatravs da Turquia. Medidas importantes sotambm a integrao da China e da ndiana Agncia Internacional de Energia e a cons-truo do Mercado nico Europeu de Energia.

    AbstractEnergy Security in Europe

    Nowadays the problem of the Energy Security isone of the top priorities in the European politicaland strategic debate taking into account the currentframework of high oil and gas prices and thestrong impact in the prices of energy. The fragilitiesof Europe are evident when we spot the increasingdifficulties of European oil and gas companiesto access new reserves, the production decline ofthe North Sea, the growing wave resourcesnationalization, the utilization by Russia of energyas a political weapon.Within this framework, this paper analyses theneed to define a new concept of energy securitytailored to the twenty-first century. The range ofthreats diversified and covers terrorism, the internaldestabilization of producing countries, the erosionof OPEC spare capacity, the climatic threat andthe influence of the demographic factor.The strategic answers proposed in this paper totackle the existing threats are related with thereduction of the dependence of OPEC, the creationof a new decentralized Energy Model, more hybridand flexible, the definition of a policy for Oil andGas Strategic Reserves and the diversification ofthe sources of supply to minimize the dependenceon Russia with the valorisation of the Atlantic Basin,the Mediterranean and North Africa and theaccess to Central Asia via Turkey. The integrationof China and India in the International Agency ofEnergy and the building of the European unifiedand integrated market of energy are mandatory.

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    A Segurana Energtica da Europa

    1. Introduo

    Em 2003 a Europa identificou os maiores riscos de segurana que o continenteenfrentava no documento European Security Strategy1. Esses riscos abrangiam os Estadosfalhados, o terrorismo global, a violncia religiosa dos grupos extremistas, os con-flitos regionais na vizinhana da Europa e o abastecimento energtico.

    Quatro anos depois a situao evoluiu e o abastecimento energtico, que na alturafoi assumido timidamente como um dos riscos, veio pouco a pouco colocar-se nocentro da agenda de segurana europeia a par com o terrorismo e a ameaa climtica.Nenhum destes riscos pode ser enfrentado e controlado de um ponto de vista exclusi-vamente nacional. So riscos globais que tm expresso local mas exigem polticasunificadas e uma vontade colectiva para serem dominados.

    Nestes ltimos anos, tendo em conta o aumento do preo do petrleo e do gs e oimpacto indirecto nos preos da energia em geral e da electricidade em particular,ficaram a nu algumas das fragilidades da Europa no que diz respeito sua seguranaenergtica. Essas fragilidades tm vindo a aumentar quando se olha para a crescentedificuldade das companhias europeias em terem acesso a novas reservas de petrleoe gs noutras partes do mundo2; ao declnio acentuado da produo no Mar doNorte que serviu depois do primeiro choque petrolfero como um contrapeso geopo-ltico OPEP3; onda crescente de nacionalismo dos recursos que se estende daRssia Amrica Latina4; utilizao pela Rssia da energia como uma arma geopo-ltica e ao seu comportamento inaceitvel na crise do gs com a Ucrnia e na crisedo petrleo com a Bielorssia; perspectiva sombria da Europa, se nada fizer emcontrrio, ao ver aumentar a sua dependncia energtica da Rssia at dela ficar refmdentro de algumas dcadas; incapacidade das lideranas polticas europeias for-jarem uma estratgia energtica comum; inexistncia de um verdadeiro mercadoaberto europeu no domnio da energia que possa servir para estimular a diversificaodas fontes de abastecimento e a diminuio da dependncia; ecloso dentro da Europa

    1 European Commission, European Security Strategy, Luxembourg, Office of UE Publications, 2003.2 A. Costa Silva, O Petrleo e as Relaes Internacionais, Revista de Relaes Internacionais do IPRI, N 6,

    2005.3 A. Costa Silva e F. Barata Alves, Partex Oil and Gas: a Vision of the World World Market and the Role of Gas

    as the Future of Oil, ASPO, Maio 2005.4 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,

    Casa Mateus, Setembro 2006.

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    Antnio Costa Silva

    de uma onda de proteccionismo que estimula os monoplios nacionais e as barreiraseconmicas e que muito forte em pases como a Frana e a Espanha; miopia euro-peia que continua a olhar, em matria de energia, especialmente para Leste, e no per-cebe que fulcral apostar tambm num eixo energtico centrado na Bacia Atlntica enum outro que maximize a interaco e o potencial do Mediterrneo.

    Este artigo procura analisar cada um destes riscos caracterizando-os e escalpeli-zando a sua natureza. Trata em primeiro lugar a questo do que a segurana energ-tica hoje e que muito diferente do conceito prevalecente na dcada de 70 pois reali-dades como o terrorismo ou a tragdia recente do Katrina, vieram trazer umanova percepo para este problema5. Aborda depois a questo do acesso da Europaa recursos energticos e caracteriza as variveis essenciais que vo moldar o futuro.Analisa a dependncia da Europa em relao Rssia, identifica os principais movi-mentos de importao de petrleo e gs da Europa, contextualiza a dominao abso-luta da rede de pipelines que vem da Rssia e que ainda gerida maneira da erasovitica com todas as consequncias negativas que da podem resultar. Evidenciaa pouca ateno que a Europa d a outras formas de se abastecer em petrleo e gs, emespecial atravs do mar e da ligao que h que potenciar na Bacia Atlntica, noMediterrneo e na parte Norte do Continente onde uma aliana da Unio Europeia coma Noruega indispensvel.

    Por fim aborda a situao do mercado energtico europeu, a questo ambiental,o problema das reservas de emergncia e discute a importncia de fortalecer a lide-rana poltica e a viso estratgica e de desenvolver um pensamento geopoltico eu-ropeu ajustado complexidade do mundo actual.

    Na parte final, o artigo enuncia as principais concluses de ndole geopoltica efornece um conjunto de recomendaes para a Europa sair do dilema actual. A primeira a necessidade de criar condies para a emergncia de um novo paradigma ener-gtico, um novo modelo, mais hbrido e flexvel, que conte com a contribuio demltiplas fontes de energia e seja independente de cada uma delas6. Esse modeloser intrinsecamente mais seguro pois a questo da segurana hoje comea exacta-mente a, na natureza do modelo energtico, onde repousa o futuro das sociedadesavanadas.

    5 Daniel Yergin, Ensuring Energy Security, Foreign Affairs, March/April 2006.6 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,

    Casa Mateus, Setembro 2006.

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    A Segurana Energtica da Europa

    O modelo energtico actual, baseado na dominao absoluta dos combustveisfsseis, que asseguram mais de 81% do consumo de energia primria do planeta, mau do ponto de vista geopoltico e ambiental e no garante a sustentabilidade dodesenvolvimento. Este modelo vai mudar no decurso deste sculo e quanto maiscedo melhor para a Europa e para os consumidores europeus.

    2. O Conceito de Segurana Energtica

    Quando Churchill tomou a deciso histrica de substituir o carvo pelo petrleocomo fonte de energia para a Royal Navy, na vspera da I Guerra Mundial,disse: A segurana e a certeza do petrleo reside na variedade e apenas na varie-dade 7.

    Como sabemos, Churchill tinha razo. A marinha inglesa merc de uma fonte deenergia superior tornou-se a mais rpida do mundo apesar de funcionar com o petrleoque vinha do Iro e no com o carvo que vinha do Pas de Gales. Acresce a esse factoque a variedade do petrleo, a sua extraordinria versatilidade como combustvel,permitiram que ele tivesse mltiplas aplicaes no s para gerar electricidade oumover automveis, mas tambm para fabricar plsticos, fertilizantes, adubos e toda agalxia de aplicaes que deu origem indstria petroqumica. A variedade do petrleotornou-o num combustvel seguro, eficiente e praticamente imbatvel em muitas dasaplicaes. Mas este ciclo est a mudar: o petrleo j no hoje dominante como fontepara a produo da electricidade, ainda dominante no sistema de transportes(mas mesmo a a situao est a mudar) e totalmente hegemnico na indstriapetroqumica. Durante as prximas dcadas vamos assistir ao abandono do petrleo dagerao elctrica e trmica, ao declnio do seu domnio nos transportes e sua confinao indstria petroqumica. As consequncias deste ciclo evolutivo vo formatar a socie-dade do futuro. No entanto, a hegemonia do petrleo no desaparecer de um diapara o outro. Ele vai continuar a dominar o modelo energtico por muitas dcadasmas quanto mais cedo se consolidarem as tendncias de mudana mais seguro ser ofuturo.

    7 Daniel Yergin, Ensuring Energy Security, Foreign Affairs, March/April 2006.

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    2.1. O Modelo Energtico Actual e as suas Consequncias

    O modelo actual dominado pelos combustveis fsseis est sob intensa presso8 eas preocupaes sobre a segurana energtica comeam com o fornecimento de petr-leo e gs porque os constrangimentos do sistema produtivo actual so fortes e criamincertezas sobre a capacidade de responder ao crescimento da procura sobretudo daChina e da ndia. A sia hoje responsvel por 41% do crescimento da procuramundial. Em 1970 a Amrica do Norte consumia o dobro do petrleo da sia, mas em2005, pela primeira vez na histria, o consumo da sia ultrapassou o da Amrica doNorte. Este facto caracteriza bem as profundas mutaes que o padro de consumo esta sofrer.

    A isto acrescem os factores geopolticos, a instabilidade em muitos pases produ-tores como o Iraque, a Nigria e a Venezuela, as ameaas terroristas que se concreti-zaram em ataques internos na prpria Arbia Saudita, refinaria de Yanbu em Abrilde 2004 e ao complexo petroqumico de Abqaiq, que o maior do mundo e processou11 MB/D (milhes de barris por dia), em 2005. Se algum destes ataques tivesse tidosucesso, a crise que se seguiria atingiria consequncias imprevisveis porque a ArbiaSaudita o corao do sistema petrolfero mundial9.

    Para os pases ocidentais h preocupaes acrescidas relativamente ao sistemade refinao. H mais de 30 anos que no se constroem refinarias no Ocidente ehoje verifica-se uma dissonncia estrutural entre as capacidades tcnicas dessas refi-narias que foram concebidas para tratar leos mais leves e com baixo teor de enxofree as caractersticas dos leos que so produzidos hoje, cada vez mais pesados e commais alto teor de enxofre. Isto contribui para a falta de sintonia entre os produtosprocurados pelos consumidores no mercado e aqueles que as refinarias podem ofe-recer. O problema da segurana no est pois exclusivamente no abastecimento: aadaptao, renovao e flexibilizao do sistema de refinao, para ter em conta aqualidade do petrleo produzido, essencial para aumentar a segurana do sistemaenergtico.

    Existem tambm preocupaes relativamente ao prprio sistema elctrico e s redesde distribuio de energia com os black-outs que tm ocorrido com maior frequncia.

    Antnio Costa Silva

    8 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,Casa Mateus, Setembro 2006.

    9 A. Costa Silva, O Petrleo e as Relaes Internacionais, Revista de Relaes Internacionais do IPRI, N 6,2005.

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    Foi o caso das falhas que aconteceram na Amrica do Norte (EUA e Canad) em2003 e que deixaram 50 milhes de pessoas sem electricidade. Black-outs similaresocorreram em Itlia no mesmo ano, e na Bacia do Ruhr na Alemanha e no Brasil em200410.

    Por outro lado, a tragdia do Katrina e do Rita, que abalou os EUA em Agostoe Setembro de 2005, veio suscitar um profundo debate sobre o conceito de segu-rana energtica no sculo XXI. Estes furaces paralisaram 27% do sistema de produodos EUA e 21% do seu sistema de refinao. Pela primeira vez na histria assistiu-seao colapso simultneo das plataformas de produo e sondagem, da rede de pipelines,das refinarias, das centrais elctricas e da rede de distribuio de electricidade11.

    O conceito actual de segurana energtica nasceu a seguir ao 1 choque petrol-fero em 1973 e est essencialmente direccionado para prevenir rupturas de abasteci-mento nos pases produtores. Este conceito no suficiente para responder aos proble-mas actuais que so multi-dimensionais e polifacetados. O Katrina mudou a percepodo que hoje a segurana energtica. Precisamos de um novo conceito e de umanova arquitectura capaz de ter em conta a proteco de toda a rede de produo edistribuio de energia. Mas como faz-lo com um modelo energtico centralizado,rgido, com infra-estruturas de distribuio pesadas? o prprio modelo que tem deser mudado.

    2.2. O Impacto do Crescimento Econmico e do Factor Demogrfico

    O consumo de energia no mundo tende a subir medida que o desenvolvimentoeconmico se expande e consolida. O nosso planeta atravessa uma fase de desenvolvi-mento que no tem paralelo nos ltimos 30 anos com o PIB global a crescer desde2004 entre 4,8 e 5% ao ano. Se projectarmos um crescimento de cerca de 2,7% porano para as prximas dcadas, o PIB global vai mais do que quadruplicar em 2030 eeste crescimento rpido uma alavanca-chave que vai fazer crescer o consumo deenergia.

    A isto acresce o factor demogrfico: no ano 2000 a populao do planeta era de6 mil milhes de pessoas sendo que 80% viviam em pases no-OCDE. Em 2030, a

    A Segurana Energtica da Europa

    10 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,Casa Mateus, Setembro 2006.

    11 Daniel Yergin, Ensuring Energy Security, Foreign Affairs, March/April 2006.

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    estimativa de que a populao mundial se aproximar dos 8 mil milhes de pessoascom um crescimento de cerca de 1% ao ano. Mas o facto importante que os pasesdesenvolvidos da OCDE vo experimentar praticamente uma estagnao e os pasesno-OCDE vo crescer mais do dobro com aumentos significativos da populao naAmrica Latina, frica e sobretudo na sia. Mais de 90% do crescimento da populao(cerca de 2 mil milhes de pessoas) vai ocorrer nestas regies12.

    Quais os reflexos do desenvolvimento econmico e do factor demogrfico noconsumo de energia? No ano de 2000 o planeta consumiu cerca de 205 MB/D(milhes de barris por dia) de petrleo equivalente e em 2030 vai passar para335 MB/D. Isto mostra um crescimento de cerca de 60% no consumo de energia entre2000 e 203013.

    Com este ritmo de crescimento o modelo energtico actual insustentvel. Asemisses de dixido de carbono tendero a subir exponencialmente e em 2030 podemoschegar a 38.000 milhes de toneladas o que significa um aumento de cerca de 70%face aos nmeros actuais14. O consumo de combustveis pelo sistema de trans-portes mundial tender tambm a crescer especialmente com a rpida automobi-lizao de pases como a China ou a ndia onde se prev que a frota automvel podesextuplicar nos prximos 15 a 20 anos. Como vamos responder a este crescimentoexponencial das necessidades energticas? Esta tambm uma questo-chave de segu-rana.

    O Relatrio Brundtland15 de 1987 incorpora uma definio de sustentabilidadedo desenvolvimento que hoje amplamente aceite: sustentabilidade significa a capa-cidade de responder s necessidades da gerao actual sem pr em causa as necessi-dades das geraes futuras.

    Podemos dizer que, com o ritmo frentico de consumo de combustveis fsseis e asnecessidades futuras impostas pelo crescimento econmico e pela expanso demogr-fica, o desenvolvimento no sustentvel. A reflexo actual sobre a segurana energ-tica necessita de incorporar tambm estas preocupaes.

    Antnio Costa Silva

    12 ExxonMobil, The Outlook for Energy: A view to 2030, 2006.13 ExxonMobil, The Outlook for Energy: A view to 2030, 2006.14 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,

    Casa Mateus, Setembro 2006.15 Brundtland Report World Commission on Environment and Development (WECD), Our Common

    Future, Oxford University Press, 1987.

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    2.3. A Segurana Energtica no Sculo XXI

    O conceito de segurana energtica que hoje prevalece significa a segurana doabastecimento de petrleo e gs. este conceito que figura no Artigo 103 do Tratado deRoma que criou a Comunidade Europeia e que retomado no Artigo 100 do Tratado deMaastrichit onde se apela a uma reflexo para a diversificao das vrias fontes deenergia quer em termos de produtos quer de reas geogrficas.

    Deve clarificar-se aqui que a segurana do abastecimento energtico um con-ceito diferente da autonomizao no domnio da energia ou da reduo absoluta dadependncia do exterior. Neste sentido, os apelos do Presidente Bush nos seus dis-cursos sobre o Estado da Nao (Fevereiro de 2006 e 2007), estabelecendo que os EUAdevem reduzir totalmente a sua dependncia do exterior, so erros conceptuais. Umacoisa diversificar as fontes de abastecimento, mudar o modelo energtico para mini-mizar riscos de dependncia; outra afirmar a autonomia energtica de um pas.No sculo XXI quando a economia global e em termos de energia a inter-dependnciados pases a regra e no a excepo, lutar pela Autonomia Energtica uma fico.Isto no significa, no entanto, menor ateno pela situao de dependncia do exteriore pela mudana do paradigma energtico.

    No caso da Unio Europeia (UE) esta mudana imperativa: a UE importahoje do exterior 50% da energia que consome e dentro de duas dcadas, se nadafizer para travar essa dependncia, vai importar do exterior 70% da energia que ne-cessita16.

    por isso que o conceito de segurana energtica que prevalece hoje na Europadeve ser revisto, repensado e ampliado. Este conceito assim expresso em documentosda UE17: a segurana do abastecimento no campo da energia significa assegurar, parao bem pblico e para o funcionamento eficaz da economia, a disponibilidade fsicaininterrupta de energia no mercado a preos competitivos para todos os consumidores(privados e industriais), no quadro do objectivo de um desenvolvimento sustentvelprevisto no Tratado de Amesterdo.

    Este conceito um pilar importante da segurana energtica mas deve ser alargadoe repensado: ele no responde a muitas das preocupaes actuais, s mudanas que

    A Segurana Energtica da Europa

    16 European Commission, Estratgia Europeia para uma Energia Sustentvel, Competitiva e Segura, Bruxelas,Maro de 2006.

    17 European Commission, Green Paper on Towards a European Strategy for the Security of Energy Supply,Luxembourg: Office for UE Official Publications, 2001.

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    ocorreram na Europa e no mundo depois da queda do Muro de Berlim em 1989, snovas ameaas como o terrorismo ou as mudanas climticas, s alteraes geopo-lticas e ao posicionamento dos prprios pases produtores. Nestes, a ameaa estabili-dade vem cada vez mais de dentro desses pases, ao contrrio do que acontecia nopassado, e por isso h toda uma srie de elementos novos que tm de ser incorporadosna anlise.

    Nos EUA esse processo j comeou e a iniciativa de Jan Kalicki e David Goldwyn18no seu trabalho Energy and Security: Toward a New Foreign Policy Strategy impor-tante. Eles tentaram forjar uma definio da segurana energtica para o sculo XXIestatuindo que a Segurana Energtica a capacidade de aceder aos recursos que sonecessrios para o desenvolvimento contnuo do poder nacional19. Mais especificamenteestes autores postulam a necessidade de aprovisionar recursos de petrleo egs que sejam fiveis, diversos, amplos e a preos competitivos tomando em linhade conta a infra-estrutura adequada para fazer chegar esses recursos ao mercado20. Eleschamam a ateno para o facto de hoje a segurana energtica englobar duas vertentesimportantes: a capacidade de assegurar os recursos e a capacidade de proteger aeconomia global dos efeitos da volatilidade extrema dos preos.

    Esta ltima questo essencial tendo em conta os sinais que se acumulam sobrea mudana de poltica da Arbia Saudita que hoje est, aparentemente, mais interes-sada em maximizar as suas receitas petrolferas do que em actuar, como no passado,no sentido da estabilizao dos mercados. A Arbia Saudita tirou as lies do contra--ciclo de 1985, que se seguiu ao segundo choque petrolfero, quando os preos dopetrleo entraram em colapso. Durante mais de 20 anos construiu uma capacidadeexcedentria de produo (spare capacity) que foi o nico mecanismo que vigoroupara responder a rupturas de produo e estabilizar o mercado21. A criao dessacapacidade excedentria custou Arbia Saudita mil milhes de dlares mas permitiu--lhe actuar como Swing Producer e repor a produo em crises como a da Venezuela em2002 e 2003, sem que os preos nos mercados internacionais fossem afectados.Hoje, quando a capacidade excedentria sofreu uma forte eroso no claro se a Arbia

    Antnio Costa Silva

    18 Jan Kalicki e David Goldwyn, Energy and Security: Toward a New Foreign Policy Strategy, WoodrowWilson Center Press, Washington, 2005.

    19 Jan Kalicki e David Goldwyn, Energy and Security: Toward a New Foreign Policy Strategy, WoodrowWilson Center Press, Washington, 2005.

    20 Jan Kalicki e David Goldwyn, Energy and Security: Toward a New Foreign Policy Strategy, WoodrowWilson Center Press, Washington, 2005.

    21 Institut Franais du Ptrole, Recherche et Production du Ptrole et du Gas, 2002.

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    Saudita est disposta a manter essa poltica ou se de facto mudou de poltica. Nestecontexto quem vai pagar a spare capacity no sculo XXI? O que podem fazer a Europae os EUA para desenvolverem uma resposta estratgica a esta alterao de poltica?A resposta parte integrante do novo conceito de segurana energtica para o sculo XXI:a Europa e os EUA precisam de repensar a poltica e a gesto das Reservas Estratgicasde Emergncia dos pases desenvolvidos, que podem ser hoje utilizadas com maioragressividade como instrumentos de estabilizao do mercado e de proteco daseconomias contra a volatilidade dos preos. Esta pode ser uma resposta estratgica crescente ascenso da OPEP.

    No contexto da Europa preciso dizer que esta desprezou a energia como umelemento integrante da sua poltica externa nos ltimos 50 anos. Esta falha reflectiu-se naincapacidade europeia para promover a mudana do modelo energtico e para identi-ficar atempadamente as consequncias ambientais de um consumo excessivo decombustveis fsseis. Hoje est vista de todos as propores que esta falha podeassumir. Como diz Robert Cooper: Os custos dos erros intelectuais em relaes interna-cionais so enormes22. A Europa no pode repetir esses erros. E por isso importanteque tenha em conta as mudanas em curso e que vo afectar a arquitectura poltica dofuturo.

    Sejamos claros: a civilizao e a ordem esto hoje sob ameaa o que pode con-duzir a uma catstrofe mltipla se a Europa, EUA e os pases ocidentais no encon-trarem as respostas estratgicas adequadas. Isto transcende o domnio da energiamas inclui, de uma forma profunda e vasta, a energia. O caos est a tomar conta dealguns pases e de algumas regies do mundo. Os Estados falhados prosperam desdea Somlia, Serra Leoa e Libria. Outros como o Iro desafiam a ordem internacionale lanam-se em programas que visam a obteno de armas nucleares. A intervenodos EUA no Iraque ps em causa os equilbrios que existiam no Golfo Prsico e ainstabilidade que grassa neste pas pode propagar-se a toda a regio e ter consequnciasnefastas para o mundo.

    O problema que no passado o mundo funcionava com base no equilbrio de po-deres, as fronteiras estavam bem definidas e quando havia zonas de instabilidadee caos, os imprios organizavam-se e conseguiam colmatar e conter as ameaas. Hojej no assim e tudo mudou. A poltica de equilbrio de poderes j no faz funcionar o

    A Segurana Energtica da Europa

    22 Robert Cooper, The Breaking of Nations, Grove Atlantic Ltd, 2004 (Traduo Portuguesa: Ordem e Caos,Editora Presena).

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    mundo como evidente no caso do Golfo Prsico. A segurana hoje no pode ser con-tida por muros. As fronteiras fsicas j no isolam e pouco significam. A globalizaoe a Internet propagam os acontecimentos de forma instantnea a todos os pases domundo. Os problemas de instabilidade vm hoje de fora e de dentro da Europa e estano est a ser capaz de responder-lhes. A questo : porqu?

    A razo que o conceito de Estado na Europa, e com ele o conceito de segurana, estem mutao profunda. A Europa est a assistir desconstruo do Estado Clssicodetentor da soberania nacional e que tinha o monoplio do poder e da violncialegtimapara proteger os seus cidados e as suas fronteiras. O Estado Clssico tinhaaquilo a que Palmerston chamou os interesses eternos23, os interesses permanentes quetinham a ver com a sua segurana e a sua defesa. Quais so hoje os interesses perma-nentes de Portugal? H interesses permanentes de cada um dos pases da UE? Ou hhoje interesses permanentes da UE? E quais so, se numa questo to vital para ofuturo, como o a definio de uma poltica energtica comum, a Europa falha clamo-rosamente?

    Como que a Europa pode formular uma poltica de segurana, incluindo a segu-rana energtica, quando sabemos que a Europa no tem hoje um pensamento geopo-ltico unificado e um enquadramento estratgico claro que defina com clareza quaisso os seus interesses permanentes? A segurana hoje no depende de muros mas daabertura, da partilha e da transparncia que presidem ao funcionamento da Europa.Esta vai a caminho de um sistema transnacional que j no nacional mas tambmno supranacional. Como compatibilizar a definio de um sistema de seguranacom um quadro institucional que ainda ambguo e onde o prprio discernimentodos interesses permanentes fluido?

    Sejamos claros: a construo da Europa um dos factos polticos mais notveisdo sculo XX e uma das realizaes mais interessantes que vo moldar o futuro.Mas quando falamos de segurana no contexto da desconstruo do Estado Cls-sico Europeu e do caminho para uma ordem transnacional, colocam-se sriasquestes sobre a capacidade de exercer a soberania e de defender uma polticacoerente. Os imprios esto mortos e ainda bem. O fiasco da interveno dos EUAno Iraque veio dar ainda mais acutilncia ao pensamento de Henry Kissinger: oabandono abrupto do conceito de soberania nacional (...) marcou o advento de um

    Antnio Costa Silva

    23 Henry Palmerston, em Briggs Age of Improvement, citado por Henry Kissinger em Diplomacy, 1944(Traduzido para Portugus pela Editora Gradiva).

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    novo estilo de poltica externa subordinado e orientado pelas polticas internas epela inovao de slogans moralistas universais (...) Uma vez que se difunda a dou-trina de interveno universal e as diversas verdades entrem em competio, arris-camo-nos a viver num mundo em que, como na frase de G.K. Chesterton a virtudeinveste s cegas24.

    Quer dizer: no quadro actual a formulao de uma poltica de segurana, in-cluindo a segurana energtica, deve levar a Europa a considerar que a seguranahoje, ao contrrio do que acontecia no passado, no pode ser obtida s com a foramilitar ou com a hegemonia e o equilbrio de poderes. Vivemos num mundo pre-crio onde a guerra foi privatizada e os Estados no so os nicos actores, o equi-lbrio no funciona e a hegemonia suscita reaces violentas de oposio. H anecessidade de revalorizar a diplomacia, as sanes, as coligaes mltiplas, a inte-grao econmica e o uso mais eficaz da fora e da conteno. Talvez seja mais actualdo que nunca o pensamento de Catarina, a Grande, quando disse: A nica forma dedefendermos as nossas fronteiras alarg-las25. Hoje isto no deve funcionar nosentido fsico do termo, mas no sentido econmico, cultural, poltico, diplomtico eessa uma via importante para redefinir um conceito de segurana para o sculo XXI.

    Neste contexto, precisamos de um novo conceito de segurana energtica baseadona seguinte panplia de elementos e que seja capaz de responder s preocupaesda nossa poca:

    i. Assegurar o abastecimento de petrleo e gs de forma estvel e a preos com-petitivos evitando rupturas no fluxo dos recursos energticos, criando meca-nismos de cooperao e coordenao entre as companhias, os governos e a UE.

    ii. Diversificar as fontes de abastecimento para evitar a dependncia de car-tis, monoplios e pases que usam a energia como arma geopoltica;

    iii. Integrar produtores e consumidores num tratado global que assegure o flu-xo dos recursos energticos, promova o investimento e o comrcio e trabalhepara aumentar a competitividade da oferta e da procura;

    iv. Trabalhar para assegurar um escudo de proteco do sistema energtico con-tra choques e rupturas atravs da criao de uma capacidade excedentria

    A Segurana Energtica da Europa

    24 Henry Kissinger, Has NATO success heralded his own demise? citado por Robert Cooper in The Breakingof Nations, 1999.

    25 Robert Cooper, The Breaking of Nations, Grove Atlantic Ltd, 2004 (Traduo Portuguesa: Ordem e Caos,Editora Presena).

  • 44

    de produo (o problema que no passado foi a Arbia Saudita que pagouessa capacidade e hoje no clara a sua predisposio para fazer o mesmo)ou atravs de uma nova poltica e de uma nova gesto dos stocks de reservasde emergncia que podem ser usados pela UE para proteger as suas economi-as contra choques de preos e contra a volatilidade do mercado.

    v. Reforar a proteco das redes elctricas e de distribuio de energia, cons-truir e gerir reservas excedentrias, instalar back-ups da capacidade elctricapara instalaes crticas, desenvolver novos modelos de gesto das redesmulti-centradas e ter planos de contingncia e de resposta para as situaesde crise.

    vi. Trazer a globalizao para o sistema energtico de segurana com a integraoda China e da ndia na Agncia Internacional de Energia e na rede global decomrcio e investimento.

    vii. Criar condies para a mudana do modelo energtico actual favorecendoa maior contribuio das energias renovveis, da hdrica, da elica, solar,biomassa, da energia nuclear, dos biocombustveis e do hidrognio, de formaa compatibilizar o desenvolvimento com a proteco do ambiente e a reduodas emisses de gases com efeito de estufa.

    viii. Introduzir no quadro mental da Segurana Energtica a chamada lei Thatcher:The Unexpected Happens. Se o inesperado acontecer preciso que o sistemaresponda altura e seja capaz de gerir as crises e encontrar as respostas.

    3. O Acesso da Europa a Recursos Energticos

    Uma das caractersticas da distribuio do petrleo e gs no mundo a sua assimetriae a sua concentrao em algumas zonas geogrficas.

    No fim do ano de 2005 (Fig.1) as Reservas Provadas de petrleo no mundo eramde 1.200 mil milhes de barris26, sendo que 61% dessas reservas se localizam noMdio Oriente (Arbia Saudita, Iro, Iraque, Kuwait, Qatar, Emiratos rabes Unidos,Oman).

    26 BP, Statistical Review of World Energy, 2006, London.

    Antnio Costa Silva

  • 45

    A Europa detm apenas 16.2 mil milhes de barris o que corresponde a cercade 1,3% das reservas mundiais (Fig.1). Esta umas das fragilidades estruturais docontinente. Os Estados Unidos tm 29.3 mil milhes de barris (2,4%) e a Rssia epases vizinhos 122.9 mil milhes de barris (10,3%).

    Os pases europeus que detm reservas de petrleo (Fig. 2) so a Noruega(9.7 mil milhes de barris), a Inglaterra (4), a Dinamarca (1.3), a Itlia (0.7) e a Polnia (0.5).

    A Segurana Energtica da Europa

    Fig. 1 Reservas provadas de petrleo no mundo

    RESERVAS PROVADAS DE PETRLEO NO MUNDO EM 2005Total: 1200 Mil Milhes de Barris

    Amrica do Norte (5,0%)

    sia Pacfico (3,4%)

    Europa (1,3%)

    Mdio Oriente (61,9%)

    Rssia e CIS (10,3%)

    frica (9,5%)

    Amricas Centrale do Sul (8,6%)

    Fonte: BP Statistical Review

    Fig. 2 Reservas de petrleo na Europa em 2005

    RESERVAS de PETROLEO na EUROPA em 2005Total: 16.2 Mil Milhes de Barris

    Outros (3,0%)

    Noruega (60,1%)

    Reino Unido (24,9%)

    Dinamarca (8,0%)

    Itlia (4,0%)

    Fonte: BP Statistical Review

  • 46

    Em termos de produo (Fig. 3) a mdia mundial em 2005 foi de 81 MB/D27 coma OPEP responsvel por 41,7% da produo (s o Mdio Oriente representa 30%),OCDE 23,8% e a Rssia e vizinhos 15,2%.

    Antnio Costa Silva

    27 BP, Statistical Review of World Energy, 2006, London.

    A produo da Europa foi de 5.3 MB/D o que corresponde a 6,5% da produomundial. Os maiores produtores da Europa so a Noruega (2.9 MB/D) e o ReinoUnido (1.8 MB/D) (Fig. 4).

    Fig. 4 Produo de petrleo na Europa em 2005Fonte: BP Statistical Review

    PRODUO de PETRLEO na EUROPA em 2005Total: 5.3 MB/D

    Outros (0,3%)

    Noruega (54,7%)Reino Unido (33,9%)

    Dinamarca (7,1%)

    Itlia (2%)Romnia (2,0%)

    Fig. 3 Produo Mundial de Petrleo em 2005Fonte: BP Statistical Review

    PRODUProduo Mdia Mundial: 81 MB/D

    O MUNDIAL de PETROLEO EM 2005

    Europa (7%)

    frica (12%)

    Asia-Pacfico (10%)

    Mdio Oriente (30%)Rssia e CIS (15%)

    America do Norte (17%)America Central e do Sul (9%)

  • 47

    O grande problema que a Unio Europeia (Europa dos 25) consumiu em 200514.7 MB/D, isto consumiu 3 vezes mais petrleo do que o que o continente produz.No entanto, o aumento de consumo em 2005 foi apenas de 0,7%. Portugal consumiu320.000 B/D o que corresponde a cerca de 2,1% do consumo da Europa.

    Em termos de refinao, a Europa tem capacidade para processar 13.7 MB/D(corresponde a cerca de 18,6% da capacidade de refinao instalada no mundo).O problema que esta capacidade est estagnada h muitos anos e j no adequadapara processar leos cada vez mais pesados e com maiores teores de enxofre como osque aparecem no mercado.

    As fontes europeias de petrleo mostram que a dependncia do exterior de 63%(Fig. 5). A UE e a Noruega em conjunto asseguram apenas 37% das necessidadesde petrleo da Europa.

    A Segurana Energtica da Europa

    Fonte: BP Statistical Review/AIE

    Fig. 5 Fontes Europeias de petrleo em 2005

    FONTES EUROPEIAS de PETRLEO em 2005Total de Importao: 13.2 MB/D

    Norte de frica (12%)

    Noruega (16%)

    Mdio Oriente (19%) UE (21%)

    Rssia (27%)

    Outros (5%)

    Em 2005 a Europa importou cerca de 13.2 MB/D, o que mostra a sua dependnciado exterior. Estas importaes so sobretudo da Rssia (27%), do Mdio Oriente(19%), do Norte de frica (12%) e de outras regies (5%).

    A concluso clara: a Europa tem uma grande dependncia do exterior e emespecial da Rssia e, face ao declnio da produo do Mar do Norte, no est a pres-tar ateno suficiente necessidade de diversificar os seus abastecimentos e reforara contribuio do Norte de frica, da frica Ocidental e da Bacia Atlntica.

  • 48

    Os Estados Unidos tm 5.45 tmc o que corresponde a cerca de 3% e a Europa tem5.52 tmc (cerca de 3%). Como vemos, as reservas europeias de gs tambm so escassase essa outra fragilidade. Os principais pases europeus que detm reservas de gs soa Noruega (2.41 tmc), a Holanda (1.41), a Romnia (0.63) e o Reino Unido (0.53). Itlia,Polnia, Alemanha e Dinamarca tambm tm gs mas em quantidades residuais(Fig. 7).

    No que diz respeito ao gs, as reservas provadas do mundo em 2005 eram de179 mil bilies de metros cbicos (tmc)28. Os principais detentores de reservas degs so a Rssia com 26,6%, o Iro com 14,9% e o Qatar com 14,3% (Fig. 6).

    Antnio Costa Silva

    28 BP, Statistical Review of World Energy, 2006, London.

    Fig. 6 Reservas provadas de Gs no mundo em 2005

    RESERVAS PROVADAS de GAS no MUNDO em 2005Total: 179.83 Trilies de metros cbicos (Tmc)

    EUA (3,0%)Arbia Saudita (3,8%)Nigria (2,9%)

    Emiratos rabesUnidos (3,3%)

    Arglia (2,5%)

    Venezuela (2,4%)Cazaquisto (1,6%)

    Outros (21,7%)

    Europa (3%)

    Iro (14,9%)

    Qatar (14,3%)

    Rssia (26,6%)

    Fonte: BP Statistical Review

  • 49

    A Segurana Energtica da Europa

    Fig. 7 Reservas provadas de Gas na Europa em 2005

    Fonte: BP Statistical Review

    RESERVAS PROVADAS de GS na EUROPA em 2005Total Reservas na Europa: 5.52 Trilies de metros cbicos (Tmc)

    Holanda (25,5%)

    Romnia (11,4%)

    Reino Unido (9,6%)

    Alemanha (3,4%)Outros (0,4%)

    Polnia (1,9%) Itlia (3,0%)Dinamarca (1,2%)

    Noruega (43,6%)

    A produo de gs no mundo no ano de 2005 (Fig. 8) foi de 2763 mil milhes demetros cbicos (bcm), com a Rssia responsvel por 21,6%, os EUA 19%, o Iro 3,1%,a Arbia Saudita 2,5%, a Arglia 3,2%, o Qatar 1,6% e o Egipto 1,3%29.

    29 BP, Statistical Review of World Energy, 2006, London.

    Fig. 8 Produo Mundial de Gs em 2005

    Fonte: BP Statistical Review

    PRODUO MUNDIAL DE GS EM 2005Total: 2763 mil milhes de metros cbicos

    Outros (24,1%)

    Emiratos rabesUnidos (1,6%)

    Europa (10,5%)

    Malsia (2,1%)

    Indonsia (2,7%)

    Egipto (1,3%)Qatar (1,6%) Arglia (3,2%) Arbia Saudita (2,5%)

    Iro (3,1%)

    Canad (6,7%)

    EUA (19,0%)

    Rssia (21,6%)

  • 50

    Como se pode verificar, a produo de dois dos pases que detm mais reservas(Iro e Qatar) exgua, comparada com o potencial existente. A produo da Europafoi de 291.3 bcm o que corresponde a cerca de 10,5% da produo mundial, muito acimado que o potencial de reservas do continente justificaria em comparao com outrospases. As necessidades da Europa em termos de gs levam-na a produzir de formarpida os seus recursos endgenos e isto pode criar tambm problemas de dependnciae de segurana no futuro.

    Os maiores produtores europeus (Fig. 9) so o Reino Unido (88 bcm), a Holanda(62.9), a Alemanha (15.8), a Itlia (12), a Romnia (12.9) a Dinamarca (10.4) e a Polnia(4.3).

    Antnio Costa Silva

    Fig. 9 Produo de Gs na Europa em 2005

    Fonte: BP Statistical Review

    PRODUO DE GAS na EUROPA em 2005Total Europa: 291.3 mil milhes de metros cbicos

    Noruega (29,1%)

    Outros (0,3%)

    Polnia (1,4%)

    Dinamarca (3,5%)

    Reino Unido (30,2%)

    Romnia (4,4%)

    Holanda (21,6%)

    Alemanha (5,4%)Itlia (4,1%)

    A grande questo que a Europa consumiu, em 2005, 485 bcm o que correspondea cerca de 17,6% do consumo mundial. O consumo de gs na Europa aumentou cercade 2% em 2005. Portugal, que consumiu em 2005, 3 bcm, o que corresponde a 0,6%do consumo europeu, est na diviso dos pequenos consumidores.

    Em termos das Fontes Europeias de Gs (Fig. 10) e dos movimentos de trading,a Europa utiliza o sistema de pipelines da Rssia (responsvel por 24% do abasteci-mento), o Mar do Norte e os pases europeus produtores (Noruega, Holanda,Dinamarca, Reino Unido, Alemanha, etc.) responsveis por 53% do abastecimento,a Arglia com 19% e o Egipto e Lbia que em conjunto no chegam a 1%. Daqui se infere

  • 51

    que a utilizao dos recursos endgenos boa poltica mas a diversificao para oexterior necessita de contrabalanar o peso crescente da Rssia com uma maior aposta noNorte de frica, no eixo Mediterrnico e na Bacia Atlntica.

    A Segurana Energtica da Europa

    Fig 10 Fontes Europeias de Gs

    Fonte: BP Statistical Review/AIE

    FONTES EUROPEIAS DE GAS

    Outros (4%)

    Noruega (13%)

    Arglia (19%)

    Rssia (24%)

    UE (40%)

    No que diz respeito importao de gs natural liquefeito (LNG) recorrendo via martima, o peso deste sector ainda muito fraco e representa apenas cerca de11% do volume de gs total importado e cerca de 7,6 vezes inferior ao volumeque circula pelo sistema de pipelines. Os maiores fornecedores de LNG so a Arglia(5,5% do total), a Nigria (2,8%), Qatar (1,1%) e Oman (0,4%).

    A Fig. 11 representa os Trade flows de gs no mundo e patente a fraca atenoque a Europa d Amrica Latina, Bacia Atlntica, ao Magrebe, e ao Mediterrneo,o que contrasta com a dependncia crescente da Rssia.

  • 52

    A concluso clara: a Europa aposta pouco no acesso a reservas de gs por viamartima e os poucos pases europeus que apostam nesta via so Portugal, Espanha,Itlia, Grcia, Frana e Blgica.

    Em contrapartida, para os pases cujo abastecimento repousa essencialmente nosistema de pipelines, a dependncia da Rssia atinge nveis preocupantes: 96% paraa Grcia, 91,5% para a Litunia, 89% para a Bulgria, 84% para a Finlndia, 83,8% paraa Repblica Checa, 62% para a Hungria, 68% para a ustria, 60,9% para a Eslovquia,47% para a Polnia, 42,5% para a Alemanha, 29,5% para a Itlia, 25,52% para a Frana.

    Como se depreende desta anlise, hoje a dependncia de muitos pases europeus dogs russo j preocupante. Se, com o declnio da produo no Mar do Norte, a Europaacentuar a sua dependncia da Rssia, o futuro ser ainda mais preocupante.

    H outros factores que prejudicam sobremaneira o acesso da Europa a novos recursosenergticos.

    O primeiro desses factores o reforo considervel do poder das companhiasnacionais de petrleo dos pases produtores (as NOCs) que controlam neste momento80% das reservas mundiais de petrleo. As companhias internacionais, entre elas aseuropeias (as IOCs), controlam apenas 7% das reservas de petrleo de forma directa e

    Fig. 11 Rotas Internacionais de Comrcio do Gs, 2004 e 2030 (bcm)

    Fonte: AIE

    Antnio Costa Silva

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    mais 13% de forma indirecta atravs dos contratos de partilha de produo (ProductionSharing Agreements). A Saudi Aramco (companhia nacional da Arbia Saudita) hoje10 vezes maior do que a Exxon. Longe vo os tempos em que o domnio das 7 Irmsera inquestionvel. O efeito geopoltico para os pases ocidentais e para a Europa devastador com o agravamento da dependncia dos pases produtores30.

    O segundo factor a competio feroz da China e da ndia na luta pelo acesso anovas reservas sendo que estes pases e, em especial a China, adoptaram uma estratgiaque privilegia as relaes entre os Estados e acedem s companhias nacionais dospases produtores atravs das relaes polticas inter-governamentais envolvendonelas as companhias estatais chinesas31.

    O terceiro factor so os constrangimentos estruturais do mercado do petrleo:embora o mercado seja global, ele no de todo um mercado totalmente aberto. Hum condicionamento estrutural quer do lado da oferta pois os pases produtores comoa Arbia Saudita e outros no permitem o acesso s suas reservas, quer do lado daprocura pois em muitos pases do mundo como a China, a Malsia, a Indonsia, o Iroou a Venezuela, os combustveis so subsidiados.

    O quarto factor o crescente nacionalismo dos recursos32 que aparece sempreem alta quando o preo do petrleo sobe e manifesta-se hoje na Rssia, na Bolvia,na Venezuela, no Equador e outros pases. Na Bolvia a terceira vez que os recursosenergticos do pas so nacionalizados. Deve reconhecer-se a questo da soberaniados pases sobre os seus recursos mas o que inaceitvel que quando o preo dopetrleo baixa, esses mesmos pases tentem atrair as companhias internacionaispara realizarem investimentos necessrios ao desenvolvimento dos seus recursose depois, quando os preos sobem, no respeitem os contratos que celebraramvoltando a nacionalizar os recursos. Em geral, o nacionalismo dos recursos signi-fica quase sempre o declnio da produo (s na Venezuela a produo desceu 20%em 3 anos aps o Presidente Chvez chegar ao poder embora hoje j exista umarecuperao), o atraso de projectos-chave, o aumento da burocracia e da corrupoe a criao de um ambiente no competitivo que o caldo de cultura da ineficincia.

    30 A. Costa Silva, O Petrleo e as Relaes Internacionais, Revista de Relaes Internacionais do IPRI, N 6,2005.

    31 A. Costa Silva, O Petrleo e as Relaes Internacionais, Revista de Relaes Internacionais do IPRI, N 6,2005.

    32 A. Costa Silva, Does the End of Oil Means the End of Oil Culture? Seminar on Energy and Environment,Casa Mateus, Setembro 2006.

    A Segurana Energtica da Europa

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    A Europa deve equacionar todas estas dificuldades tanto mais que a sua prin-cipal regio produtiva (o Mar do Norte) j entrou em declnio e s nos ltimos 3 anosa produo desceu cerca de 17%. A melhor estratgia passa pela mudana do modeloenergtico europeu, a diminuio do consumo de combustveis fsseis, a diversifi-cao das fontes de abastecimento. Quanto ao petrleo e gs, a Europa deve celebraruma aliana preferencial com a Noruega, investir com a Noruega na explorao edesenvolvimento dos recursos provveis e possveis que existem no rctico, no Marde Barents, e ao mesmo tempo estabilizar a sua relao com a Rssia e o Mdio Orienteque sero sempre parceiros importantes da Europa. Por outro lado, esta deve construireixos fortes com o Norte de frica e a frica Ocidental, e desenvolver as ligaes coma Bacia Atlntica e a sia Central.

    4. A Dependncia Crescente da Rssia

    Quando a Rssia cortou o abastecimento de gs Ucrnia no dia 1 de Janeiro de 2006,o mercado energtico europeu mostrou todas as suas fragilidades. A Rssia tinhauma pretenso legtima: aumentar o preo do gs que vendia Ucrnia, pois nos ltimosdois anos o preo do gs triplicou nos mercados internacionais. Mas, ao adoptar umcomportamento irresponsvel e cortar o abastecimento, a Rssia mostrou que umfornecedor no fivel e que no hesita em utilizar os seus recursos energticos comouma arma geopoltica. Este foi um aviso srio para a Europa33. A Rssia tem as maioresreservas de gs do mundo, detm o campo de Urengoy na Sibria que o maior doplaneta e a Gazprom, a companhia estatal de gs russa, a maior do mundo e con-trola cerca de 30% das reservas mundiais de gs. Com estes instrumentos o PresidentePutin sonha restabelecer o papel da Rssia como grande potncia e sabe que a Europae o mundo podem ficar ainda mais dependentes das reservas energticas russas com oincio do declnio da produo em algumas regies petrolferas como o Mar do Norte eo Alaska.

    A fragilidade da Europa ficou exposta com o corte de abastecimento Ucrniaporque os volumes de gs que circulam no sistema de pipelines que atravessa a Ucrnia,chegam a Frankfurt e a Milo e esse corte provocou uma reduo de 50% de gs naHungria, 25% na Itlia, 30% em Frana, 30% na Eslovquia, para no falar na ustria

    33 A. Costa Silva, de Frente Estratgia http//www.algebrica.pt/deFrente-e/default, Fevereiro 2007.

    Antnio Costa Silva

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    que hiper-dependente do gs russo34. E isto foi feito no pico do Inverno com todasas consequncias que da resultam.

    A Europa devia ter tirado lies deste incidente mas infelizmente, e como vemsendo habitual, muita gente falou mas pouca gente fez alguma coisa. Hoje a Europarecebe cerca de 53% do gs que consome do Mar do Norte e de pases produtoreseuropeus, 24% vem da Rssia e 19% da Arglia. Dentro de 20 anos, com o declnio daproduo no Mar do Norte, a Europa receber 75% do gs que consome da Rssia.Este o plano que existe e inclusive a Inglaterra que hoje exporta gs, ser nessaaltura um pas importador de gs. Se a Europa persistir nesta via, continuar a apostarapenas na Rssia e no diversificar as suas fontes de abastecimento ficar refm daRssia dentro de duas a trs dcadas, e isso o pior que pode suceder.

    O problema que a Europa no sabe lidar com a Rssia, mas esta sabe muitobem lidar com a Europa. A Rssia fez uma aliana energtica com a Alemanha,corporizada na construo conjunta do gasoduto NEGP (North Eastern Gas Pipeline) quevai atravessar o Mar Bltico para levar o gs russo directamente Alemanha evitandoa circulao por outros pases como a Polnia. O governo polaco reagiu e acusouesta aliana de ser uma nova verso do pacto de Molotov/Von Ribbentrop. Evidente-mente um exagero, mas o facto que a locomotiva alem est atrelada a Moscovoe desde a, a poltica energtica europeia est mais fragilizada e fragmentada. Aprova veio com o corte de abastecimento do petrleo Bielorssia efectuado emJaneiro de 2007. Depois de um ano de retrica europeia de facto nada aconteceu e aRssia, quando chegou a altura de utilizar de novo a chantagem, fez ultimatos e recorreu medida extrema que o corte do abastecimento. A Bielorssia como a Ucrniaso pases de trnsito do gs e petrleo russo que vem para a Europa. Em termosdo gs russo exportado para a Europa, cerca de 80% vem pela Ucrnia e 20% pelaBielorssia, sendo que neste ltimo caso serve essencialmente a Alemanha, a Polniae a Litunia.

    O diferendo com a Bielorssia voltou a revelar outro elemento essencial da polticado Presidente Putin: a Rssia quer o domnio absoluto da rede de pipelines para a utilizarcomo arma poltica e aumentar a dependncia da Europa. A negociao que a Rssiafez sobre o preo do petrleo que vende Bielorssia teve como pressuposto a retenopela Rssia de parte significativa do capital da Beltransgaz, a empresa proprietriado gasoduto que atravessa a Bielorssia. Pouco a pouco, com a sua poltica de chantagem,

    34 A. Costa Silva, de Frente Estratgia http//www.algebrica.pt/deFrente-e/default, Fevereiro 2007.

    A Segurana Energtica da Europa

  • 56

    ameaas e ultimatos, Moscovo vai-se apossando da rede de pipelines que juntamentecom as suas reservas energticas, constituem dois trunfos de peso na sua estra-tgia que visa o domnio do sistema energtico europeu. A aquisio de activos nodownstream em vrios pases europeus como a Alemanha, a Frana, o Reino Unido ou aHolanda e a expanso do controle da rede de distribuio, parte integrante dessaestratgia. Esta uma ameaa directa segurana energtica europeia e urge daruma resposta.

    Ao mesmo tempo, o Presidente Putin acena China e ao Iro, aceita a propostadeste pas para discutir a ideia da criao de uma OPEP do gs que ser um novocartel para reforar a sua poltica de utilizao dos recursos energticos para se afirmarna cena internacional. Putin visita o Qatar (o terceiro pas do mundo com reservasde gs, depois da Rssia e do Iro) para discutir a mesma ideia, aproxima-se da ArbiaSaudita para firmar um tratado de cooperao no domnio da energia e para venderarmas ao regime saudita, aproveitando o vazio poltico criado com as dificuldadesdos Estados Unidos no Mdio Oriente e a sua obsesso pelo Iraque.

    Putin fez um ataque duro aos EUA na Cimeira sobre segurana realizada emMunique em Fevereiro de 2007, na sequncia do anncio pelos EUA da instalao dosistema de defesa anti-mssil (MDI) na Polnia e na Repblica Checa. Podemos dizerque o namoro do Ocidente a Putin e a amizade do Presidente Bush com o lderrusso, no se tem traduzido em nenhum ganho poltico: o regime russo autocrtico,controla a comunicao social, viola os direitos humanos na Tchetchenia, intervmna vida das empresas, destruiu a Yukos e de facto nacionalizou-a. Este nacionalismodos recursos, praticado por Putin, estendeu-se ao projecto Sakalin-2, onde o governorusso nacionalizou 30% das shares retirando-as Shell, Mitsui e Mitsubishi. Aprxima ameaa recai sobre o campo gigante de gs de Kovykta que detido pela BPe TNK. O que um facto que quando Putin chegou ao poder, o sector estatal energ-tico representava apenas 15% do total no pas e hoje j de 60%. Como noutros casos,o Ocidente com a sua miopia poltica, fecha os olhos em troca do apoio de Putin luta contra o terrorismo. E assim que hoje a Rssia est no G8, a que j presidiu naCimeira de San Petersburgo onde o ponto forte da agenda foi a discusso da segu-rana energtica. A ironia no podia ser maior, pois com o dfice de liderana polticaque h nos pases ocidentais e a tibieza do politicamente correcto podemos dizerque a Europa parece hoje desarmada e sem estratgia face a uma Rssia ascen-dente, autoritria e hbil nas suas alianas com o Iro, a China, a Arglia e a ArbiaSaudita.

    Antnio Costa Silva

  • 57

    5. O Fluxo de Petrleo e Gs e o Dilema da Europa

    Um dos problemas mais importantes em termos de segurana energtica asse-gurar o fluxo do petrleo e gs necessrio para alimentar o funcionamento da economiados pases consumidores.

    Quando olhamos hoje para o mapa desses fluxos e projectamos a evoluo futurada circulao, h uma constatao irrefutvel: caminhamos para o congestionamentode algumas vias cruciais de circulao e para o aumento dos obstculos operacionais.

    Hoje circulam pelos mares do planeta 40 MB/D o que corresponde a cerca de 50%da produo mundial. Uma parte significativa (17 MB/D) circula no Estreito de Ormuzque uma das vias martimas mais congestionadas do mundo. Ainda recentemente(no fim de 2006) houve um choque no Estreito, de um petroleiro japons com umsubmarino nuclear americano, que poderia ter tido consequncias nefastas. Por outrolado, as tenses geopolticas no Mdio Oriente esto exacerbadas e elas polarizam-seno Estreito de Ormuz. O Iro domina o Estreito, e de vez em quando faz ameaas veladasde que em caso de ser alvo de presses ou ataques, pode bloquear a circulao. O Iroinvadiu e ocupou trs ilhas localizadas no Estreito e que pertencem aos Emiratos rabesUnidos. A existncia de bases americanas no Qatar e no Bahrein motivo de ameaasrepetidas de grupos extremistas. A crescente instabilidade no Iraque contamina toda aregio e configura o risco de um conflito entre sunitas e xiitas escala regional. O factodo Iro xiita estar a dar passos para fabricar uma bomba nuclear levou j os pases sunitasdo Golfo Prsico, como a Arbia Saudita, o Egipto e a Jordnia, a manifestarem a suainteno de desenvolverem tambm um programa para aquisio de armas nucleares.

    s tenses geopolticas juntam-se os problemas de circulao: dentro de 25 a 30anos, a quantidade de petrleo que vai circular no Estreito de Ormuz pode duplicar.A nvel global, dos 40 MB/D que circulam hoje, podemos chegar aos 72 MB/D dentrode trs dcadas, o que representa um aumento de 80%. Uma questo crucial para aEuropa e o mundo, que vo continuar a precisar do petrleo do Golfo Prsico e emquantidades cada vez maiores medida que outras provncias petrolferas entramem declnio, ser resolver os problemas de congesto na circulao no Estreito deOrmuz e assegurar um abastecimento seguro e ininterrupto.

    Um outro ponto de congesto muito acentuada e que interessa sobretudo aospases da sia e em especial China, Japo e Coreia do Sul, a situao no Estreitode Malaca. A circulao a difcil, h actos de pirataria que se repetem regularmentesobretudo depois do tsunami de Dezembro de 2004 e esta via martima fulcral parao abastecimento da sia.

    A Segurana Energtica da Europa

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    No que diz respeito Europa importante, do ponto de vista da segurana, en-contrar solues e alternativas para o que se passa nos Estreitos do Bsforo e de Darda-nelos.

    Estes estreitos so uma das vias martimas mais congestionadas do mundo, tmapenas 700 metros de largura e atravessam o centro de Istambul onde vivem mais de12 milhes de pessoas.

    Em 1936 quando foi assinada a Conveno de Montreux que regula o trfegomartimo no Bsforo, circulavam a 17 navios por dia e os petroleiros actuais de grandedimenso no existiam35. Hoje circulam no Bsforo 55.000 navios por ano, mais de150 por dia e pelo menos 15% desses navios transportam petrleo. Alguns incidentesrecentes como o de Fevereiro de 2003 que provocou um bloqueio de mais de 55 navios oude 1 de Janeiro de 1999 em que o navio russo Volganeft 248 libertou 6.000 barris depetrleo no estreito, levantam srias preocupaes sobre a evoluo futura da circulaona zona. Continuam a existir por ano em mdia cerca de 17 acidentes, as colisesacontecem com frequncia causando mortes, fogos e derrames, potenciando as condiespara a ocorrncia de uma catstrofe de dimenses maiores.

    A regulao do trfego no Estreito para minimizar o congestionamento est hojeno centro de uma das maiores disputas geopolticas que envolve a Rssia, a Turquia,o Iro, os pases produtores da sia Central, a Europa e os EUA.

    A Rssia, cujos navios representam 25% do trfego no Estreito do Bsforo, querque a maioria do petrleo do Cspio seja transportada atravs do pipeline CPC(Caspian Pipeline Consortium), cuja propriedade detm em conjunto com o governo doCazaquisto. Este pipeline termina no porto russo de Novorossiysk, no Mar Negro, epermite o escoamento atravs do Bsforo. Isto no s no resolve o problema docongestionamento como pode agrav-lo.

    por isso que h uma luta geopoltica em curso para assegurar outras alterna-tivas que visam evitar a Rssia e o Iro e onde a Europa e EUA tm interessesconvergentes. Uma dessas alternativas o pipeline BTC (Baku to Ceyhan) que podetransportar petrleo do Cspio e da sia Central, atravs de Baku, capital do Azerbaijo,at ao porto turco de Ceyhan no Mediterrneo Oriental, passando pela Gergia.Este pipeline tem cerca de 1.750 Km de extenso e custou cerca de 3.5 mil milhes dedlares. O seu traado um autntico tratado de geopoltica pois evita a Rssia e o Iroe passa por pases politicamente mais prximos do Ocidente. O projecto foi apoiado

    35 Energy Intelligence Research, The International Crude Oil Market Handbook, 2006.

    Antnio Costa Silva

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    pelos EUA e pela Europa e abre uma via importante para o escoamento do petrleopara o Ocidente.

    Do ponto de vista da Europa importante apostar nos projectos de pipelinesque visam evitar o Bsforo e assegurar ligaes com o Mediterrneo. Os projectos depipelines Burgas-Alexandropoulos, o projecto Nabucco encabeado pela companhiaaustraca OMV e o pipeline Samsung-Ceyhan, que atravessa a Turquia, podem serimportantes assets estratgicos para facilitar o escoamento do petrleo para a Europae evitar o Bsforo.

    De facto a Europa no deve ficar refm do sistema de pipelines russos, embora estessejam um elemento essencial do abastecimento energtico europeu. A Fig. 12 mostraas rotas dos principais pipelines que abastecem a Europa Oriental e Central e queprovm da Rssia. Todo este sistema operado pela companhia russa estatal Transneft.Esta tem o maior sistema de pipelines do mundo com cerca de 45.000 Km de extenso.Este sistema ainda operado com o estilo de gesto e comando da era sovitica e noresponde s necessidades das economias modernas.

    Fig. 12 Rotas dos Pipelines na Europa Oriental, Central e Turquia

    Fonte: EIR Energy Intelligence Research

    North Atlantic Sea

    Adriatic SeaMediterranean Sea

    Shetlanc Isles

    Key European Crude Oil Pipelines

    Sullom Yoe

    StureNORWAY

    SWEDEN

    DENMARK

    GERMANYBELG.

    LUX.

    FRANCE

    SPAIN

    POLAND

    BELARUS

    RUSSIALATVIA

    LITHUANIA

    ESTONIA

    FINLAND

    SLOVAKIA

    ROMANIA

    BOSNIA

    GREECE

    BULGARIA

    MOLDOVA

    UKRAINE

    SYRIAIRAQ

    AZERBAIJANARMENIA

    IRAN

    GEORGIA

    KAZAKSTAN

    TURKEY

    MONTENEGRO

    MMACEDONIA

    ALBANELA

    FOS

    ITALY

    SWITZ.

    AUSTRIA

    CZECHREPUBLIC

    SERBIA

    HUNGARY

    CROATIA

    Cruden Bay

    Teesside

    PORT

    UGAL

    SchwedoGdansk

    Butinge

    Venlspils

    Baltic Sea

    LEGEND: CONTINENTAL LINESAdriaCEL Central European Line

    Druzhba

    SPSE Southern European Pipeline

    TAL Trans Alpine LineMeroBlack Sea LineOdessa-BrodyCPCAIOC Northern PipelineAIOC Western PipelineBTC (Baku-Tblisi-Ceynan)Balic Pipeline

    Black Sea

    St. PetersburgPrimorsk

    Leuna

    Odessa

    Volgograd

    Kuybyshev

    From W

    est

    Siberia

    Kalamkas

    BakuTblis

    Novorossiysk

    Supsa

    Caspian Sea

    Ceyhan

    Litvinov

    Karlsruhe

    Ingolstadt

    Szazhalombatta

    Genoa

    Trieste SLOV.

    NETH.

    UK

    IRELAND

    North Sea

    BrentFlottaFortiesEkosfiskOseberg

    Sullom Voe, UKFlotta, UKGruden Bay, UKTeesside, UKSture, Norway

    LEGEND: NORTH SEA LINESTERMINAL/LANDING POINT CRUDE

    A Segurana Energtica da Europa

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    A componente central do sistema de pipelines russo que abastece a Europa conhecido por Druzhba (ou linha da Amizade) e serve toda a Europa Oriental eCentral. Estende-se do centro de refinao de Kuybyshev, localizado na regio do Volgae Urais, at Rssia Ocidental e Bielorssia, onde se divide em 3 ramais: um quecorre para norte, para o porto bltico de exportao de Ventspils; o segundo que vaipara Ocidente, para a Alemanha e Polnia incluindo o porto de exportao de Gdansk;e o terceiro que vai para sul para a Hungria, Eslovquia e Repblica Checa.

    Os recentes cortes de abastecimento da Rssia Ucrnia e Bielorssia vieram sus-citar muitas questes sobre a fiabilidade da Rssia como fornecedor. Deve notar-seque h uma interdependncia muito grande hoje entre a Rssia produtora de petrleoe gs e a Europa consumidora. E esta interdependncia devia ser um importantefactor de estabilidade e vai continuar a jogar um papel chave no futuro porque aEuropa depende cada vez mais da Rssia para a energia e a Rssia depende daEuropa para assegurar um fluxo regular de receitas que vital para o funcionamentodo pas.

    O problema reside noutra dimenso: o da segurana energtica da Europa do fu-turo que no pode ficar totalmente dependente da Rssia. por isso que a Europa deveconstruir outras alternativas com os seguintes componentes:

    Explorar o potencial do Norte de frica, nomeadamente as ligaes com a Arglia,a Lbia e o Egipto. No caso do gs, a Europa importa hoje por ano 214 mil milhesde metros cbicos (bcm). Dentro de duas dcadas, em 2030, a Europa importar488 bcm de gs do exterior, mais do dobro do nvel actual. essencial assegurarno futuro que exista a uma contribuio importante do Norte de frica, do MdioOriente e da Amrica Latina, para contrabalanar o peso da Rssia.

    Explorar as ligaes da Europa Oriental (Grcia e Bulgria) com a Turquia eatravs destes pases com o Cspio e a sia Central. Projectos como o BTC,Nabbuco e Alexandropoulos podem ser importantes porque ligam a Europa auma importante regio produtora de petrleo e gs e diminuem a dependnciada Rssia.

    Explorar a aliana com a Noruega, pas europeu que dispe ainda de reservasimportantes de petrleo e gs e que tem um potencial por explorar no Crculo Polarrctico. A aposta na tecnologia e inovao, em conjunto com a Noruega, pode levara Europa a beneficiar do aproveitamento do potencial de uma regio produtiva que estvel, fivel e pode propiciar um contrapeso importante s dependnciasexistentes.

    Antnio Costa Silva

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    Apostar em fora na Bacia Atlntica: necessrio criar um eixo energtico pode-roso na Bacia Atlntica e a Europa pode, quer no mundo do petrleo, quer nodo gs e LNG, potenciar as ligaes que hoje so tnues mas que podem fazercrescer a contribuio da frica Ocidental, de Angola Nigria e Guin-Equatorial,e do Brasil, Trinidad e Tobago Venezuela e Mxico, para dar um enquadramentoimportante ao potencial energtico da Bacia Atlntica.

    6. O Mercado Energtico Europeu

    Quando a tragdia do Katrina se abateu sobre os Estados Unidos falhou tudo: oGoverno federal falhou, o Governo local falhou, o Servio de Proteco Civil falhou.S houve uma coisa que no falhou: o mercado. Dois dias depois da tragdia, quandoa confuso e a anarquia se tinham instalado, o mercado respondeu de forma notvele as estaes de gasolina tinham combustvel para fornecer aos seus clientes. Esta uma lio importante: um mercado aberto, competitivo e transparente, uma ga-rantia de segurana e de estabilidade, mesmo nas piores situaes. Por isso a defesade um mercado energtico aberto e competitivo na Europa, hoje tambm umaquesto de segurana energtica.

    Muitos dos dramas da Europa advm do facto de o mercado energtico integradoser uma fico. E, no entanto, a Europa com os seus 500 milhes de consumidores, osegundo mercado de energia do mundo logo a seguir Amrica do Norte. Se a Europafalar a uma s voz ter um poder tremendo na gnese de solues para os seus pro-blemas enfrentando a mudana para um modelo energtico novo, mais descentralizado,menos dependente dos combustveis fsseis e mais amigo do ambiente. O problema que a Europa um ano poltico e falha na liderana e na inexistncia de vontade polticacolectiva. Hoje a Europa mais um somatrio de fraquezas como diz o EmbaixadorMarcello Mathias36, do que um catalizador de foras e isso deve mudar.

    A assumpo de uma poltica europeia de energia pode voltar a mobilizar a Europaporque esta sempre funcionou a partir de grandes ideias e de grandes projectos. E preciso no esquecer que na gnese da Europa, em 1956, existiram dois acordos para aenergia: o Mercado do Carvo e do Ao e o Tratado Euratom para a energia nuclear.Portanto, a energia est inscrita na matriz gentica da Europa moderna e hoje, mais do

    36 Marcello Mathias, Dirio de Paris 2001-2003, Editora Oceanos, Novembro de 2006.

    A Segurana Energtica da Europa

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    que nunca, importante mobilizar o Continente para falar a uma s voz pois isso abrircaminho para a soluo de muitos dos seus problemas.

    E quais so esses problemas no domnio do mercado energtico?Em primeiro lugar o regresso dos proteccionismos nacionais sobretudo em Espanha

    e Frana. Os proteccionismos nacionais impedem o funcionamento aberto do mercadoe matam a competitividade. A oposio do governo francs OPA da italiana ENELsobre a Suez e a sua interveno para favorecer a aquisio da Suez pela Gaz de France inaceitvel. Vai ao arrepio das regras de um mercado aberto e criou precedentes sriospara o futuro. O mesmo se deve dizer sobre a atitude do governo espanhol em relao OPA da E.on sobre a Endesa. Quando os pases europeus proteccionistas compreenderemque a sua defesa dos monoplios nacionais contraproducente e que o reforo dos mono-plios distorce o mercado, talvez algo possa mudar. Mas at l a via fcil escolhida pelospases proteccionistas liquida a hiptese de caminharmos para um mercado integrado.

    O segundo problema reside exactamente no facto do domnio dos monopliossobre o mercado ser esmagador em muitos pases europeus. Na Alemanha a E.on e a Ruhrdominam mais de 60% do mercado; em Frana a Gaz de France domina mais de 70% domercado e evidente que a dinmica e a natureza dos monoplios vai no sentido doreforo do statu quo, da asfixia de qualquer novo competidor e da defesa acrrima deum mercado fechado e pouco competitivo paralisando todas as tentativas de liberalizaoe flexibilizao. Como dizia o milionrio australiano da imprensa Rupert Murdoch:Um monoplio uma coisa terrvel at termos um. A Europa da energia est prisio-neira do domnio dos monoplios e por isso a liberalizao do mercado energtico,atulhado em barreiras sem fim, marca passo. O processo aberto pela Comisso Euro-peia contra algumas das maiores companhias europeias de energia acusando-as decartelizao e manipulao dos preos do mercado um sintoma.

    O terceiro problema que a Directiva Europeia que estabelece com clareza o pro-cesso de liberalizao e sobretudo a necessidade de unbundling, isto da separaoclara entre a produo e a distribuio do gs e electricidade, no tem sido aplicada.E, no entanto, o unbundling um passo muito importante para abrir o mercado, atrairnovos players, aumentar a competitividade e caminhar no sentido do benefcio dosconsumidores. No por acaso que na Europa fechada da energia, os consumidores soto penalizados e tm em muitos pases os preos mais elevados. A Comisso Europeiatem insistido e bem na necessidade de implementar o unbundling e vrias solues sopossveis. Uma delas obrigar os monoplios a cederem o seu domnio das vias dedistribuio e dos pipelines, nomeando uma companhia independente para geri-los,

    Antnio Costa Silva

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    deixar que eles detenham algumas shares de participao, mas sem permitir o seuenvolvimento directo nas operaes, pois a que eles impedem a entrada de novosplayers e asfixiam a competitividade.

    Por ltimo, a Europa no segue os bons exemplos como o do Reino Unido onde omercado energtico foi liberalizado h alguns anos e os reflexos positivos so palpveis.O Reino Unido dispe de um conjunto de players no seu mercado energtico que somuito competitivos, tem preos que so dos mais baixos da Europa no gs e electricidade,tem uma capacidade de oferta muito dinmica e dos nicos pases europeus onde, como fim dos monoplios, os contratos de abastecimento de gs sofreram a maior diversifi-cao, fruto da dinmica do mercado. Enquanto na Alemanha a E.on faz contratos deabastecimento de gs com a Gazprom e em Frana a GDF segue o mesmo caminho (o quesignifica aumentar ainda mais a dependncia energtica da Europa em relao Rssia),no Reino Unido a diversificao notvel e a Rssia no passa de um dos mltiplosfornecedores, o que mostra com uma clareza impressionante que um mercado aberto ecompetitivo contribui para o aumento da segurana energtica.

    Em concluso podemos dizer que a Europa tem um problema grave: no conseguefazer a construo do mercado nico do gs e da electricidade. Para avanar temde inspirar-se no princpio de Jean Monnet: quando h um problema que no se consegueresolver deve alargar-se o contexto. H que definir e materializar a poltica europeia desegurana energtica, diversificar as fontes de abastecimento, avanar com o mercadoenergtico integrado, derrotar os egosmos nacionais, fazer valer todas as sinergias e serpersistente.

    7. As Reservas Estratgicas

    As Reservas Estratgicas de Petrleo (nos EUA so conhecidas como SPR isto Strategic Petroleum Reserves), so hoje um pilar da segurana energtica dos pasesocidentais. Este instrumento nasceu logo a seguir ao choque petrolfero de 1973, sob aliderana dos EUA, do Presidente Nixon e do seu Secretrio de Estado, Henry Kissinger.Os pases ocidentais que tinham sofrido o embargo poltico dos pases rabes concre-tizado na interrupo do abastecimento de petrleo, na sequncia da guerra Israelo--rabe, puseram em prtica um conjunto de medidas para lidar com potenciaisembargos e rupturas no futuro. Foi assim que foram criadas as Reservas Estratgicasde Petrleo e a Agncia Internacional de Energia.

    A Segurana Energtica da Europa

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    As Reservas Estratgicas foram criadas em 1976 e o seu mecanismo manteve-sepraticamente inalterado at hoje. Podemos dizer que este mecanismo funcionou deforma notvel para responder ao seu objectivo inicial: nunca mais existiram embargospolticos como o de 1973. As medidas ento tomadas pelos pases ocidentais mos-tram a clarividncia das lideranas polticas de ento e em particular do PresidenteNixon e do seu Secretrio de Estado. Outra das suas medidas foi a de fixar standardspara a indstria automvel (a CAFE) que deu resultados notveis, como vimosantes.

    O problema que estes mecanismos nunca foram repensados e hoje a situaointernacional comporta novas ameaas e novos desafios. Por isso necessrio ajustarestes mecanismos, e em particular as Reservas Estratgicas, para podermos responderaos problemas do nosso tempo.

    As Reservas Estratgicas tm hoje trs fraquezas: o seu tamanho desadequados ameaas actuais; o mecanismo para a sua utilizao confuso e pouco claro; e estoconfinadas apenas ao petrleo sendo que o gs deve ser parte integrante de uma polticanova e mais abrangente.

    Nos EUA as SPR foram utilizadas poucas vezes: na 1 Guerra do Golfo e depois datragdia dos furaces Katrina e Rita. A questo que as Reservas Estratgicas dos pasesocidentais (e da Europa em particular), podem ser utilizadas hoje de forma diferentepara minimizar as ameaas existentes. Essas ameaas so a volatilidade dos preos,a especulao que cresce nos mercados de energia e a ausncia do mecanismo essencialque durante muitos anos contribuiu para a regulao do mercado petrolfero: a existnciade uma spare capacity ou capacidade excedentria de produo nos pases produtores eem especial na Arbia Saudita. Este pas actuou no passado como um swing producerque utilizava a sua capacidade excedentria para estabilizar o mercado quandoexistiam rupturas no abastecimento de certos pases produtores. Foi o caso da Venezuelaem Dezembro de 2002 quando a hierarquia da PDVSA (a companhia nacional depetrleos) entrou em rota de coliso com o Presidente Chvez, este despediu mais de18.000 quadros superiores de um dia para o outro, a produo do pas entrou em colapsocom um declnio de 2 MB/D e a Arbia Saudita interveio, reps a produo e os preosmantiveram-se estveis no mercado. isto que hoje no acontece porque uma combi-nao negativa de factores o crescimento da procura mundial, a necessidade deresponder a esse crescimento, a falta de investimento adequado na indstria petrolferae a falta de vontade poltica para manter uma capacidade ociosa de produo levaram eroso do principal mecanismo de estabilizao do mercado. Isto prende-se tambm

    Antnio Costa Silva

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    com um factor geopoltico importante: at que ponto a Arbia Saudita e a sua novaliderana no mudaram de poltica e esto hoje mais interessados em maximizar asreceitas petrolferas do que em actuar como estabilizadores do mercado? O que certo que a vontade revelada pelos pases produtores e, em especial, pela Arbia Sauditano passado, em manterem uma capacidade excedentria de produo, tem-se desva-necido. Essa capacidade custa bilies de dlares e se h uma mudana poltica,como parece inferir-se de um conjunto de atitudes recentes, a pergunta : quem vai pagara nova spare capacitcy?

    Neste quadro assume especial relevo a utilizao pelos pases ocidentais das ReservasEstratgicas de Petrleo e Gs de uma forma mais dinmica e agressiva para fazeremface volatilidade dos preos, protegerem as suas economias e os seus consumidorescontra o efeito abrasivo dessa volatilidade e contra potenciais choques, servindo comoum pilar da segurana energtica. Neste sentido importante reequacionar a magnitudedessas Reservas Estratgicas. Elas foram concebidas para suportar um embargo ou umaruptura do abastecimento e duram cerca de 90 dias mas so desadequadas para enfren-tarem as ameaas actuais. importante redefinir o mecanismo para a sua utilizaotornando-o mais claro e agressivo. necessrio reequacionar a sua localizao, a suaproximidade dos grandes centros de consumo de cada pas europeu e a sua operaciona-lidade em caso de urgncia e necessidade.

    No caso de Portugal estas questes so especialmente relevantes: 40% das ReservasEstratgicas do pas localizam-se na Alemanha. Em caso de crise grave pouco provvelque sirvam os interesses de Portugal. Num quadro de gesto europeia integrada dasReservas Estratgicas bvio que as sinergias se podem maximizar, as localizaesredistribudas, os mecanismos de utilizao repensados. No quadro de uma nova pol-tica de segurana energtica, a gesto integrada e dinmica das Reservas Estratgicaseuropeias, feita em consonncia com os EUA, pode ser uma das respostas dos pasesocidentais para protegerem as suas economias e mercados, reduzirem a influncia daOPEP e reforarem a sua posio geopoltica.

    De facto, quando vemos o mercado energtico mundial sem nenhum mecanismode estabilizao e sob influncia crescente da OPEP, preocupante. A OPEP actuacomo uma persistente fora anti-competitiva no mercado mundial como disse EdwardMorse e Amy Joffe37, isto desafia os princpios da liberalizao e do comrcio livre, actua

    37 Edward Morse e Amy Myers Joffe, OPEC in Confrontation with Globalization em Jan Kalicki e DavidGoldwyn, Energy and Security, 2005.

    A Segurana Energtica da Europa

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    como um cartel bem sucedido e manipula o mercado atravs da limitao do abasteci-mento. Neste sentido, e como a dependncia da Europa face OPEP tende a aumentar, importante encontrar instrumentos adequados para fazer face a esta ameaa econtrabalan-la. Uma nova arquitectura das Reservas Estratgicas e a sua ade-quao s ameaas actuais uma resposta. Outra resposta a mudana do modeloenergtico dos pases ocidentais com a aposta nas energias renovveis, nos biocombustveis,no potencial hidroelctrico, na micro-gerao macia, no hidrognio, no nuclear, nabiomassa, visando diminuir a dependncia da OPEP. Uma terceira resposta a integraoda China, da ndia e dos principais pases emergentes, na Agncia Internacionalde Energia para procurar construir uma plataforma nica dos consumidores e, ao mesmotempo, integrar esses pases na rede mundial de comrcio, investimento e circulaodas commodities.

    Uma nota final sobre a segurana: face complexidade da situao internacionalh uma busca de um novo conceito de segurana onde a energia um ponto nodal.No por acaso que em Maro de 2006, o Presidente da Comisso do Senado dos EUApara as Relaes Exteriores, Richard Lugar, fez aprovar um diploma que regula a polticaenergtica e a diplomacia americanas em situaes de crise. O diploma diz que, porrazes de Estado, os EUA devem ter uma poltica energtica que assegure a seguranado pas atravs do acesso a fontes de energia limpas, disponveis, fiveis e sustentveis.No quadro estabelecido, o diploma deixa a porta aberta criao de alianas estrat-gicas no domnio da energia e a pactos de cooperao no hemisfrio ocidental tendo emvista a soluo de problemas em situaes de crise. inegvel que os EUA esto a darpassos para a redefinio da sua poltica de segurana energtica no sculo XXI.

    O problema que um antigo Conselheiro dos Presidentes Reagan e Bush pai,James Pinkerton, retomou os conceitos do diploma para defender a criao de umaorganizao militar, tipo NATO, para a energia, uma espcie de contra-cartel formadopelos pases consumidores ocidentais. O argumento de que se a guerra demasiadoimportante para ser deixada nas mos dos militares, a energia demasiado importantepara ser deixada nas mos do mercado. E diz: se os EUA derem o primeiro passo, oresto do mundo vir atrs. O problema que este passo, somado aos factoresdesestabilizadores criados pelo terrorismo islmico, pelo radicalismo de pases produ-tores como o Iro ou a Venezuela, por grupos radicais como o do Delta do Niger,pela deteriorao da situao no Iraque e pela poltica externa errnea do governoamericano, arrisca-se a conduzir o mundo para o caos. A militarizao da energia no a soluo.

    Antnio Costa Silva

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    Mas a utilizao mais dinmica das Reservas Estratgicas de Petrleo e Gs, amudana do modelo energtico dos pases ocidentais, a integrao de pases emer-gentes na Agncia Internacional de Energia, o projecto da criao de uma zona transa-tlntica de comrcio livre proposta pela Chanceler Merkel, e onde o eixo energtico daBacia Atlntica pode potenciar todas as suas valncias, so seguramente solues ealiceram em conjunto uma nova resposta estratgica aos problemas internacionaisactuais.

    8. A Ameaa Climtica

    H uma ligao umbilical entre os trs principais desafios do sculo XXI: o terro-rismo, a segurana energtica e a ameaa climtica. importante no esquecer opapel desta ltima quando falamos de segurana e energia. O Modelo Energticoactual um dos responsveis pela degradao climtica e portanto a sua mudana crucial pois alm de todas as vantagens antes expostas, essa mudana o principalcaminho para debelar a ameaa climtica.

    No fundo o que se passa no nosso planeta que estamos a assistir realizao de umadas mais espantosas previses da cincia. Em 1896 o qumico sueco Arrhenius38 notou quea concentrao de dixido de carbono (CO2) na atmosfera contribua para o aquecimentoda Terra e previu que se ela duplicasse a temperatura podia aumentar 4C. Esta previsoest de acordo com as dos mais modernos modelos climticos. Antes da revoluoindustrial a concentrao de CO2 na atmosfera era de 280 partes por milho (ppm) e hoje de cerca de 400. Se continuar o ritmo actual de consumo de combustveis fsseis provvel que se venha a atingir 560 ppm neste sculo e o aumento de temperaturaprevisto por Arrhenius pode acontecer com todas as consequncias de instabilidade paraa vida na Terra39.

    importante dizer que as previses dos modelos climticos contm muitas incer-tezas. O clima um dos sistemas mais complexos que existem para ser modeladomatematicamente. Alguns cientistas so cpticos sobre a possibilidade de estarmos aassistir a uma mudana estrutural do sistema climtico e defendem que estas so

    38 World Meteorological Organization, Climate into the 21st Century, editado por William Burroughs,Cambridge University Press, 2003.

    39 World Meteorological Organization, Climate into the 21st Century, editado por William Burroughs,Cambridge University Press, 2003.

    A Segurana Energtica da Europa

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    alteraes pontuais como as que j existiram no passado. A opinio destes cientistas deveser respeitada e debatida embora existam hoje evidncias, como o sublinha o recenterelatrio do painel da ONU, que estamos em face de uma mudana estrutural com grandeprobabilidade desta ser induzida pelo homem.

    O problema que o debate tem-se centrado at hoje nas incertezas da cincia maso relatrio de Nicholas Stern40, feito em 2006 para o governo ingls, mudou o foco dadiscusso e trouxe-a para o terreno da economia. Stern mostra que o custo da inacopode ser dramtico: o PIB global pode diminuir 20% nas prximas dcadas se nada sefizer, o que significa lanar na pobreza vastas regies do planeta. Ele mostra que, seactuarmos j, gastamos 1% do PIB global para salvar os outros 20%. Isto faz sentidodo ponto de vista ambiental e uma aposta econmica atractiva.

    H portanto que integrar a luta contra a ameaa climtica na nova poltica desegurana e energia dando ateno aos seguintes pontos:

    i. Reconhecer que at hoje fizemos muito pouco e preciso novas polticas e novosplanos de aco; apesar da retrica preciso fazer muito para a Europadar passos slidos e descarbonizar a sua economia.

    ii. A reduo das emisses s ter xito se estiver ligada a mecanismos de mer-cado que a promovam. O sistema europeu de comercializao de emisses um comeo mas no basta: preciso refin-lo, apoiar-se numa maior transpa-rncia dos dados, dos preos e do mercado e ser estimulado por polticas p-blicas empenhadas. preciso criar um mercado do ambiente aberto que vda gua biomassa, aos resduos, reciclagem e aos esgotos. A reduo deemisses no penaliza a economia, estimula-a e vivel do ponto de vista daanlise custo/benefcio.

    iii. preciso actuar ao nvel dos maiores centros poluidores, as centrais trmicase elctricas e o sistema de transportes. A converso das centrais de carvopara gs, o aproveitamento do potencial hidroelctrico, o reforo da utilizaodas energias renovveis, os programas de eficincia energtica, a aposta natecnologia e na inovao (sequestrao do carbono e nanotecnologias), so impe-rativos. No sistema de transportes importante a promoo dos carros hbridose flexi-fuel e o estmulo produo e uso dos biocombustveis.

    40 Nicholas Stern, The Economics of Climate Change, Cambridge University Press, 2006.

    Antnio Costa Silva

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    iv. preciso mobilizar os cidados. Vivemos hoje num mundo em que a economia global e o governo local. Esta contradio acentua a crescente irrelevnciapoltica das instituies que nasceram depois da II Guerra Mundial. Elasno funcionam e os governos tambm no. Temos um problema de governaoglobal do planeta e temos de mudar a forma como produzimos e utilizamosa energia para suster a ameaa climtica. preciso reestruturar o funcionamentoda economia e isso s se pode fazer com cidados mobilizados e esclarecidos.

    9. Concluses

    A segurana energtica um dos grandes desafios do sculo XXI a par com oterrorismo e a ameaa climtica. necessrio um novo quadro conceptual e uma novaestratgia para lidar com esses desafios.

    Fica patente que um dos grandes problemas que existe na Europa, e qui noutrospases, um dfice de liderana poltica para engendrar uma nova viso e um novocaminho. Quando olhamos para as medidas tomadas no dealbar do choque petrolferode 1973 a criao da Agncia Internacional de Energia, a criao das Reservas Estra-tgicas de Petrleo, a lei sobre os standards da indstria automvel nos EUA h quereconhecer a clarividncia e a viso dos lderes de ento. Hoje no estamos to segurosde que existe a mesma qualidade nas lideranas e muitos dos problemas do mundocomeam a. Como disse o prncipe dos poetas portugueses, Lus de Cames: Umrei fraco torna fraca a forte gente. Neste contexto importante a renovao daslideranas polticas nos pases ocidentais e o novo ciclo que se aproxima cria condiespara uma redefinio profunda e objectiva da poltica de segurana energtica. Este o primeiro desafio a vencer.

    No mbito de uma nova arquitectura para a segurana energtica importanterevisitar o conceito e adequ-lo situao actual, incorporar a multidimensionalidadedas ameaas e dos desafios existentes e questionar o prprio Modelo Energtico domi-nante. Este modelo mau, pesado, pouco seguro. H que identificar caminhos paraa sua mudana com uma maior aposta nos recursos endgenos, nas energias reno-vveis, nos biocombustveis, no hidrognio, no potencial hidroelctrico, na micro--gerao, na biomassa e no nuclear.

    necessrio extrair todas as lies da tragdia do Katrina. O modelo de seguranaexistente nasceu no dealbar do choque petrolfero de 1973 e destina-se a evitar rup-

    A Segurana Energtica da Europa

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    turas no abastecimento dos pases produtores. Este modelo no adequado para lidarcom os desafios actuais e deve ser revisto para responder a ameaas rede de produoe distribuio de energia e volatilidade dos preos.

    A diversificao das fontes de abastecimento para evitar a dependncia de car-tis, monoplios e pases que usam a energia como arma geopoltica, importante.Neste sentido, o acesso da Europa a recursos energticos uma preocupao. A Europadepende hoje em 50% da energia vinda do exterior e dentro de 25 anos essa dependnciasubir para 70%41. No caso do gs, a Europa est a criar uma dependncia excessivada Rssia e aposta pouco no desenvolvimento de alternativas para o seu abasteci-mento. incompreensvel o pouco peso que hoje tem o Norte de frica, a fricaOcidental, a Bacia Atlntica em geral. fulcral para o futuro a vitalizao de um eixomediterrnico potenciando as ligaes com a Arglia, a Lbia e o Egipto e um eixoatlntico potenciando as ligaes com a Nigria, a Guin-Equatorial, Angola, Brasil,Trinidad e Tobago e Venezuela.

    Neste quadro, Portugal tem um papel importante a desempenhar pois a Europapode ter, a partir de 2011, falta de gs. A Europa vai ter de importar 240 mil milhesde metros cbicos de gs e com as infra-estruturas actuais e os contratos existentesisso no vai ser possvel. Haver uma falta de gs de pelo menos 70 mil milhes demetros cbicos o que equivale ao consumo actual da Frana e Espanha. Para fazer facea este problema, a Europa vai ter de construir, nos prximos anos, entre 10 a 12novos terminais de gs natural liquefeito (LNG). Portugal, com a sua posio geogrfica, um candidato excelente a abrigar alguns desses terminais podendo oferecer Europauma rede atlntica que escoe a produo da Nigria, Guin-Equatorial, Angola, Trinidade Tobago e a encaminhe para a Itlia, Frana, Alemanha, ustria, Hungria, Polnia eoutros pases que hoje dependem excessivamente do gs russo. Este um projectonacional e europeu que Portugal no pode perder: dele depende a segurana energticada Europa.

    A Europa na sua luta pelo acesso a recursos energticos tem de lidar com opoder crescente das companhias nacionais dos pases produtores, a competio ferozda China e da ndia, os constrangimentos estruturais do mercado energtico e o cresci-mento da onda de nacionalismo dos recursos. Acresce a isto o facto da principalregio produtora da Europa o Mar do Norte estar em declnio. importante potenciar

    Antnio Costa Silva

    41 European Commission, Estratgia Europeia para uma Energia Sustentvel, Competitiva e Segura, Bruxelas,Maro de 2006.

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    todas as possveis alianas dentro do Continente e em especial com a Noruega quetem recursos importantes no rctico, mas sem esquecer a necessidade de estabilizara relao com a Rssia e o Mdio Oriente que so parceiros importantes da Europae assegurar o desenvolvimento das ligaes com a frica, a Bacia Atlntica e a siaCentral.

    A interveno unificada da Europa na luta geopoltica que se desenvolve emtorno das rotas de escoamento do petrleo e gs do Cspio e sia Central, importantepara diminuir a dependncia da Rssia e assegurar rotas alternativas de abastecimento.O apoio aos projectos de pipelines que fazem by-pass ao Bsforo, quer atravs da Grciae Bulgria, quer atravs da Turquia, um importante elemento desta estratgia. O apoioe estmulo construo de pipelines como o BTC que potencia a posio da Turquia,e evita a Rssia e o Iro, outro elemento a explorar. A preocupao com o cres-cente congestionamento de rotas como a do Estreito de Ormuz e a antecipao depossveis