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Não vimos nada, ainda! Walter Longo é um raro pensador da nossa indústria, em que se pensa pouco e ego muito. Se não tiver nada mais importante para fazer, vale a pena ler seu novo livro Por Pyr Marcondes Walter Longo

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Não vimos nada, ainda!Walter Longo é um raro pensador da nossa indústria, em que se pensa pouco e ego muito. Se não tiver nada mais importante para fazer, vale a pena ler seu novo livro

Por Pyr Marcondes

Walter Longo

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ensar é privilégio de todos. Pensar dife-rente é privilégio de poucos. Pensar que-

brando códigos é privilégio de muito poucos. Pensar como o Walter é privilégio egoísta só dele.

O Walter não só pensa quebrando paradig-mas, como faz como poucos um selfie apu-rado do tempo em que vivemos. Um tempo sem tempo para snapshots. Até porque vupt, já passou.

Passou mas, aha!, o Walter viu: “Na era pós-digital, o futuro é como um trem-bala, basta um instante para que o vulto distante se transforme em uma força que te atropela em alta velocidade”. É uma das coisas que ele diz em seu último livro, Marketing e Co-municação na Era Pós-Digital, que acaba de lançar pela HSM Editora.

Mas... Era Pós-Digital? Explica aí, Walter! “Quando o assim chamado mundo digital

surgiu, chegou introduzindo a um só tempo fascínio e medo. Eu acionava o Shazam no celular e quando ele decifrava a música que eu estava ouvindo aquilo era fascinante. Mas, ao mesmo tempo, eu tinha medo de digitar o número do meu cartão de crédito online porque achava que iam clonar. Convivíamos bem com o fato de ele poder ser clonado pelo frentista do posto ali da esquina, mas isso era território conhecido. O desconhe-cido online é que nos amedrontava. Chamo de Era Pós-Digital o fim dessa dualidade de fascínio e medo e a chegada da comoditiza-ção do universo digital. O que era novidade, agora é corriqueiro. O que era surpreenden-te, agora é esperado”.

Um dos impactos desse novo olhar afeta

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diretamente nosso negócio, reflete ele: “Num mundo em que o digital deixa de ser extra-ordinário e passa a ser ordinário, a existên-cia de uma agência exclusivamente digital é imediatamente anacrônica. Morreu”.

Um Manual de alertasOs alertas do livro são vários. Alerta para a nova dimensão do tempo em nossas vidas e

Longo, no lançamento de seu novo livro: interpretação apurada e fiel do tempo em que vivemos

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em nossos negócios. Alerta para a ubiquida-de da vida em rede. Alerta para a sincronici-dade como nova dimensão da comunicação e do marketing. Alerta para o digital como alma, não mais como arma. Alerta para a tec-nologia como comodity: “O digital de agora em diante é tão comodity quanto eletricida-de ou ar: você só nota quando falta. Tecno-logia não é mais status, nem receio, nem sur-presa. É dia a dia. Se antes eu chegava num lugar e tinha wi-fi eu ficava feliz, hoje se não tiver fico puto ”.

Walter mergulha assim, sem dó, na crítica a nossa indústria, enfileirando alertas e per-cepções de inadequação da nossa atividade às transformações do mundo real.

Na nossa ilha da fantasia (digo eu, mas acho que ele concorda), o digital é tardiamente e ainda um susto gerador de retração e medo. Lá fora, na vida real, isso já foi: “Trabalhamos numa indústria que gosta de colocar rótulos e nomear as coisas, para se sentir no coman-do delas. Administramos definindo clusters. Vejo, por exemplo, como uma das maiores excrescências que atrapalham o nosso negó-cio a definição de anunciante. Eu sou uma agência, a Veja é um veículo, mas a Procter & Gamble não é um anunciante só porque ela faz anúncios, da mesma forma que ela não é uma transportante, só porque trans-porta mercadorias. Ou uma internetante só porque tem site na internet. As empresas são empresas. Da mesma forma que é uma excrescência definir pessoas como consumi-dores. As pessoas não nasceram para consu-mir, nasceram para viver. Temos que parar de imaginar que o mundo gravita em torno da

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nossa indústria, é nossa indústria que gravita em torno do mundo. Essa visão de umbigo do mundo distorce e atrapalha a percepção das nuances da vida real, das pessoas reais, das empresas reais. Essa é uma das razões pelas quais acho que nossa indústria está demorando a perceber com profundidade e abrangência das mudanças pelas quais es-tamos passando. Criar rótulos e enquadrar a vida real em clusters, tendências e nomen-claturas deteriora nossa capacidade de per-cepção da realidade. E dos impactos de suas transformações”.

Da mesma forma, receosa diante mudan-

Na sede da Grey, em São Paulo: liderança para o novo momento da empresa

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ças e ignorante sobre a real abrangência da revolução em curso, nossa indústria teme a tecnologia e a demoniza como motor das mudanças. Enquanto isso, algo bastante mais relevante acontece...

Citando um dos mais brilhantes pensado-res contemporâneos da Era Digital (ou Pós--Digital), Clay Shirky, Walter faz questão de destacar: “Uma das premissas que devemos adotar hoje como básica é a de que verda-deiras revoluções não acontecem quando a sociedade adota novas tecnologias, mas quando ela adota novos comportamentos”.

Quem não viu a mudança real de compor-tamento na vida real levanta a mão aê!

As empresas, analisa ele, já perceberam que é importante usar armas digitais. Ter seu site na internet, suas comunidade no Facebook, fazer um app para celular, ter seguidores no Twitter. Mas isso é um só pedaço: “Essas ar-mas digitais são indispensáveis, mas não são mais suficientes para aproveitar a integrali-dade das mudanças de comportamento das pessoas na vida real. No mundo Pós-Digital, passa a ser fundamental as empresas adqui-rirem uma alma digital. Alma digital é fazer com que o mundo digital esteja entranhado em todos os processos de cada organiza-ção. Isso vai além de digitalizar as estruturas e se expande para a digitalização da cultura

“Criar rótulos e enquadrar a vida real em clusters, tendências e nomenclaturas

deteriora nossa capacidade de percepção da realidade”

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e das práticas dessas corporações. Passa por integrar dados dispersos numa cadeia tecnológica que não se conversa entre áreas diferentes. Passa por usar a internet como rede do cotidiano corporativo. De relacionamento e enriquecimento do co-nhecimento. Dos negócios e dos públicos aos quais precisamos nos dirigir. Passa por buscar soluções colaborativas de gestão”.

Os três poderesOnisciência, onipresença e onipotência. Esses são os três novos poderes que, enu-mera Walter, o mundo digital coloca ago-ra a disposição das pessoas. E, por via de consequência, da nossa indústria e das marcas.

“Esse é um tripé que há até pouco tem-po era privilégio de Deus”, humaniza ele. “Nós nos tornamos super-poderosos. Se não soubermos usar esses três super-po-deres, a concorrência vai usar”.

Mas afinal, se todos esses poderes estão aí a disposição de todos, porque as em-presas não lançam mãos deles rápida e definitivamente?

“Porque atrás das empresas existem pes-soas e pessoas não nasceram para mudar. Somos resistentes às mudanças. Quando você prende um bebê elefante a uma esta-ca, ele fica ali porque não tem forças para se soltar. Quando ele cresce e ganha for-ças para ser livre, não muda porque que acredita que não pode mudar. Assim são os seres humanos, elefantes de circo. Tra-balhamos na zona de conforto. Ocorre que resistir à mudança é o maior entrave para

Grandes sacadas do Marketing e Comunicação na Era Pós-Digital

“O gestor que se acomoda e acredita que vai continuar para sempre sendo o que é, está morto.”

“As empresas que não reciclam ideias não se sustentam no mercado. Sustentabilidade é repensar e não aceitar verdades prontas.”

“As empresas anunciantes estão subindo o edifício dessa nova era pela escada, enquanto os consumidores estão subindo pelo elevador.”

“Se antes vencer na cidade grande permitia que automaticamente alguém se tornasse vencedor em qualquer lugar, hoje, com a era pós-digital, é possível vencer em escala global de qualquer lugar.”

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a aceitação das transformações da Nova Era. Achamos que no marketing trabalhamos na indústria da ousadia e das transformações, mas somos uma das indústrias mais conser-vadoras que conheço. A prisão a paradigmas é como uma estaca imaginária, que nos im-pede o movimento em direção ao futuro”.

Numa sociedade transformadora e em transformação, agora numa velocidade nun-ca antes conhecida, as empresas e as mar-cas estão reagindo de forma letárgica. Numa das mais brilhantes frases do livro sobre essa nova realidade das empresas e de sua forma de responder ao tempo, Walter afirma: “Es-tamos hoje num mundo efêmero em que as marcas estão ficando ultrapassadas porque não estão agindo de maneira efêmera para continuarem perenes”.

Ser efêmero para perpetuar-se é bom, hem?

Ok, o mundo está em transformação e a velocidade agora é outra. Mas como mudar?

“Só existe uma forma de viver intensamen-te esse momento de transição e transforma-ção: atirar-se corajosa e inteiramente nele. O medo paralisa. Atirar-se entusiasmadamente ao novo mobiliza. É igualmente transforma-dor. Nunca tenha medo das novas ideias. Te-nha medo das antigas.”

Snapshot mundo real. Up to you fazer seu selfie nele. XXI

Grandes sacadas do Marketing e Comunicação na Era Pós-Digital

“A beleza dos sistemas colaborativos é que eles organizam as contribuições, fazendo com que o todo seja sempre maior que a soma das partes.”

“Na era pós-digital, tudo se inverteu e simplesmente não há mais o que seja regra.”

“Toda tecnologia, ferramenta ou mídia fica velha. Agora, cada vez mais rápido.”

“A comunicação é planejada de forma linear e consumida de forma cada vez mais caótica.”

“Saímos de um mundo de mídias e espectadores para um universo de infinitas conexões entre marcas e pessoas.”

“Não vimos nada ainda...”