nacionalismo. ideologia e política no brasil

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iv UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS HUMANAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS SOCIAIS NACIONALISMO: IDEOLOGIA E POLμTICA NO BRASIL (1953-1964) ANTONIO CμCERO CASSIANO SOUSA Dissertaç_o apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito para obtenç_o do grau de Mestre em História. Orientador: Prof. Dr. Afonso Carlos Marques dos Santos

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iv

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

CENTRO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS HUMANAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CI_NCIAS SOCIAIS

NACIONALISMO: IDEOLOGIA E POLµTICA NO BRASIL (1953-1964)

ANTONIO CµCERO CASSIANO SOUSA

Dissertaç_o apresentada ao

Instituto de Filosofia e

Ciências Sociais da

Universidade Federal do

Rio de Janeiro como

requisito para obtenç_o do

grau de Mestre em

História.

Orientador: Prof. Dr. Afonso Carlos Marques dos Santos

iv

Rio de Janeiro, 1993

NACIONALISMO: IDEOLOGIA E POLµTICA NO BRASIL (1953-1964)

Dissertaç_o submetida ao corpo docente

do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da

Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito

parcial à obtenç_o do GRAU DE MESTRE.

Aprovada por:

Prof._____________________________________________.

(Presidente da Bancada)

Prof._____________________________________________.

Prof._____________________________________________.

Rio de Janeiro

iv Dezembro de 1993

+---------------------------------------------------------

+

¦

¦

¦SOUSA, Antonio Cícero Cassiano. ¦

¦

¦

¦Nacionalismo: Ideologia e Política no Brasil (1953 - ¦

¦1954). Rio de Janeiro, UFRJ - IFCS, 1993. ¦

¦

¦

¦Dissertaç_o: Mestre em História ¦

¦

¦

¦ 1. Brasil República 2. Nacionalismo ¦

¦ 3. Reformas sociais 4. Antiimperialismo ¦

¦

¦

+---------------------------------------------------------

+

iv

AGRADECIMENTOS

A elaboraç_o das dissertaç•es universitárias s_o

cercadas por uma certa clausura, muitas vezes, necessária,

outras tantas, exagerada. O esforço para se fugir desta

tendência, certamente, é responsável por quanto possam ter de

sintonia com o fazer coletivo, com a aventura cotidiana do

homem. Os agradecimentos s_o tentativas limitadas de

reconhecimento de t_o importante contribuiç_o.

As bolsas de estudo concedidas pelo CNPq (Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico),

durante parte considerável da elaboraç_o da dissertaç_o, e

pela FAPERJ (Fundaç_o de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio

de Janeiro), na fase de conclus_o, foram essenciais à criaç_o

de condiç•es de trabalho que permitiram sua conclus_o.

Do convívio com o professor Afonso Carlos Marques dos

Santos, orientador deste trabalho, ficam marcas indeléveis na

minha formaç_o: rigor profissional incomparável, aliado à

generosidade e à paciência com que sempre recebeu as

limitaç•es e tropeços nesta caminhada.

Foram importantes aliados, criando um ambiente de

estímulo e seriedade, professores do Instituto de Filosofia e

Ciências Sociais da UFRJ, como Francisco Teixeira Vinhosa e

José Luiz Werneck da Silva, autores de valiosas sugest•es

quando da defesa do projeto. O professor Olavo Brasil de Lima

Jr., na ocasi_o

professor do IUPERJ (Instituto Universitário de Pesquisas do

Rio

v de Janeiro), indicou importantes caminhos a seguir na análise

que fez do projeto; também nesta fase, as sugest•es e críticas

do professor Sheldon Maram, da Universidade do Estado da

Califórnia, EUA, foram norteadoras de importante

desenvolvimento. Também os professores Nilson Araújo de Souza

(UFMS) e Daniel Aar_o Reis Filho (UFF) forneceram valiosos

subsídios e sugest•es na etapa final do projeto.

O ambiente de estímulo e seriedade do qual fui beneficiário

deve-se, por outro lado, aos colegas e amigos do Curso de

Mestrado: Elaine Rosa, Maria Ana Qualigno, Margarete da Silva,

Dilma Cabral Costa, Paulo Knauss de Mendonça, Luís e Dilma

Andrade.

No magistério, a companhia de colegas, que mesmo em

condiç•es de trabalho adversas acreditam e apostam na

valorizaç_o profissional: Demartone Silva Gomes, Dilson da

Silveira, Francisco Palomanes Martinho, Jairo José Reis da

Silva, Carlos Gabriel Guimar_es, Alberto Ribeiro da Silva, Maria

das Graças Lisboa Pereira, Newton Augusto C. de Oliveira e Lúcia

Melo.

Quero agradecer a Barbosa Lima Sobrinho e Osny Duarte

Pereira, símbolos da nacionalidade, as sugest•es e a forma

carinhosa com a qual fui recebido para as entrevistas.

Sou grato a tantos outros amigos, que n_o se indispuseram

completamente com o autor, tantas vezes acometido da inclinaç_o

para a clausura: Maria Geralda de Miranda, Miguel Alves

Ferreira, Jonatan da Silva Lima, Maria Pinto Cecílio, Cláudio

Ferme, Etelvina Lisboa Pereira, Claudinei de Castro, Eleutéria

Amora, Maria José Dantas e Maria das Graças Coelho.

Agradeço a atenç_o dos funcionários da Secretaria de Pós-

Graduaç_o de História do IFCS; e dos digitadores responsáveis

pela cópia final deste trabalho: Eli e Renato Reis.

Em casa, agradeço o apoio e o interesse de Gonçalo,

Liduvina, José Carlos, Marta, Francisco e Marlene.

Por último, mas n_o menos importante, reconfortado pela

presença carinhosa e companheira de Aparecida Tiradentes dos

Santos, sempre paciente e inspirada nas sugest•es e co-autora do

anexo sobre as organizaç•es nacionalistas.

vi

Para meus pais, pelo apoio

primordial.

Para Rodrigo e Felipe, acreditando

na pátria mais generosa que virá.

vii E aos homens e mulheres

comprometidos com a luta pela

liberdade dos povos.

RESUMO

O tema deste trabalho é o movimento nacionalista no Brasil,

no período que vai de 1953 a 1964. Tem como objetivo analisar as

organizaç•es nacionalistas, os líderes e o discurso voltado para

sensibilizar as massas; mesmo analisando o discurso do Estado, a

ênfase se localiza nas aç•es oriundas da sociedade civil,

verificando diferentes graus de relacionamento entre ambos, em

particular, observando a perspectiva popular de apreens_o do

nacional. Desta forma, demonstrando a compatibilidade da quest_o

nacional com a teoria das classes sociais.

A construç_o simbólica será elemento importante nesta

análise: como elo unificador da vis_o de mundo subjacente ao

discurso, e como elemento-chave na popularizaç_o do

nacionalismo.

A hipótese central apresentada é que, nos anos cinqüenta, o

movimento nacionalista elabora programa bastante articulado e de

forte apelo popular, cujo maior exemplo é a criaç_o da

Petrobrás, em 1953.

Os nacionalistas elaboram discurso e desenvolvem aç•es

sintonizadas com as lutas antiimperialistas que ocorrem em todo

o mundo. Noprimeiro momento, desenvolve-se a luta pelo monopólio

estatal de energia, seguindo-se a fase onde o Estado detém a

iniciativa das aç•es - s_o os anos JK. Por último, o projeto

nacional-popular atinge o seu ponto máximo de amadurecimento.

O aumento da presença do Estado na gest_o econômica,

acompanhado da intensificaç_o da participaç_o popular, dilui o

aspecto de "ideologia de Estado" do nacionalismo e aprofunda as

contradiç•es entre o projeto nacional-popular e o processo de

expans_o estrangeira no país, tendo como desfecho o golpe

militar de 1964, quando saem vitoriosas as forças ligadas a este

outro projeto.

ix

ABSTRACT

The theme of this work is the nationalistic movement in

Brazil, during the period from 1953 to 1964. Having as its aim

to analyze the nationalistic organizations, the leaders and the

speech which was directed to touch the popular masses; even in

an analysis of the State's speech, the emphasis is placed in the

action originated in the society, being verified different

degrees of relationship between both, specifically, observing

the popular perspective to apprehend the national. Thus, showing

the compatibility of the national question with the theory of

the social classes.

The symbolic construction will be an important element in

this analysis: as an unifying link of the world's vision

underlying the speech and as a key element in the popularization

of nationalism.

The presented central hypothesis is that, in the 50's, the

nationalistic movement develop a very articulate programme with

a strong popular appeal, of which the best example is the

creation of Petrobrás, in 1953.

The nationalists elaborate speech and develop action tuned

in with the antiimperialist fight which were happening all over

the world. In the first movement, the fight for the State

monopoly of energy is developed, being followed by a phase where

the State hold the initiative in the action - those are the

Juscelino Kubitschek's years. And at last the popular national

project reach its maximum matureness grade.

The State's presence increase in the economics conduct

together with intensification of popular participation, dilute

the "State's ideology" aspect of nationalism and strengthen the

contradictions between the popular national project and the

process of foreing expansion in the country, having as an

outcome the military coup of 1964, when are victorious the

forces coonected to another project.

xi

SUM°RIO

INTRODUÇ_O .......................................... 01

1. PROGRAMA E MITO .................................. 17

1.1. A carta-testamento: simbologia e programa ... 18

1.2. As origens da simbologia ................... 30

1.3. A luta pelo monopólio estatal de energia .... 34

1.3.1. A Petrobrás: potencializaç_o de

nossas riquezas ...................... 34

1.3.2. Eletrobrás: obstáculos maiores ....... 41

1.3.3. °tomo: a autonomia adiada ............ 45

2. A FORMAÇ_O DA OPINI_O ............................ 56

2.1. JK: que nacionalismo ? ...................... 58

2.2. O nacionalismo nos partidos ................. 61

2.3. Asorganizaç•es nacionalistas:estruturae

aç_o......................................... 68

2.4. A nova marcha para oeste .................... 73

2.4.1. Plano de Metas: o Estadono planejamento

......................... 73

2.4.2. Brasília: meta-síntese enovo símbolo

.............................. 75

2.4.3. Entre o passado e futuro ............. 78

xii 3. MASSAS E PODER ................................... 88

3.1. A campanha pelas reformas de base ........... 88

3.1.1. O controle do capital estrangeiro .... 92

3.1.2. Jango: entre os planos doFMI e o

"Caminho Brasileiro" ................ 102

3.1.3. A nacionalizaç_o das refinarias:a

ampliaç_o do monopólio ............... 105

3.2. O projeto nacional-popular e o golpe de

1964 ........................................

107

CONCLUS_ES .......................................... 117

REFER_NCIAS BIBLIOGR°FICAS .......................... 122

ANEXOS .............................................. 134

xiii

8

INTRODUÇÃO

Je confesse avoir éprouvé, au

cours des annés de travail dont

voici le resultat, et ce à

maints reprises, la menace d'un

engloutissement.

Jean Plumyène

Com estas palavras o historiador francês definiu as

dificuldades enfrentadas na elaboração de sua obra Les

nations romantiques. Histoire du nationalisme: le XIXe

siécle. O estudo da questão nacional apresenta desafios desde

o primeiro momento: alguns autores chegam a negar a

possibilidade de conferir a noções como nação e povo um

status científico (01). O historiador inglês, Eric Hobsbawn,

autor de valiosas contribuições ao estudo do tema, afirma:

"As discussões em torno desse tema sensível são tão

apaixonadas, densas e confusas que a primeira tarefa do

historiador é desemaranhá-las para que o fenômeno em si

possa ser visto" (02).

Ao mesmo tempo que apresenta tais restrições, o estudo

das nações e do nacionalismo, pela sua historicidade latente,

exige a perspectiva do historiador, sem a qual correr-se-á o

risco de se deixar enganar pelos mitos nacionais. As nações

modernas procuram localizar suas origens na mais remota

antigüidade, ao se afirmarem como o oposto do construído, não

necessitariam de definições. Tão recentes na história dos

homens, parecem eternas.

8

Acompanhar a evolução dos referidos conceitos permitirá

que se afaste o anacronismo, tornando possível pensar

historicamente a nação e os nacionalismos

A naç_o, como nós a vislumbramos ainda hoje, é criaç_o

dos tempos modernos. Encontramos, entre os pensadores da

Ilustraç_o e na geraç_o que os sucedeu, reflex•es sobre o que

se pode chamar de idéia de naç_o. Por um lado, a ênfase do

político na construç_o da naç_o, presente em Rosseau e Kant;

por outro, a subordinaç_o da política ao âmbito da cultura,

presente na obra de Herder e Fichte (03). Neste momento a

idéia de naç_o está vinculada à consolidaç_o dos anseios da

burguesia em oposiç_o aos particularismos do feudalismo. É o

momento de formaç_o dos Estados-nacionais, em que se associam

as idéias de autodeterminaç_o, liberdade individual e

soberania popular. Com o intuito de ressaltar aspectos apenas

essenciais, sem estabelecer limites muito rígidos, esta fase

vai até meados do século XIX (04).

No segundo momento, a naç_o é incorporada ao discurso

progressivamente mais excludente das classes dominantes. As

classes populares s_o alijadas dos projetos de construç_o das

naç•es. É sintomático que a palavra nacionalismo surja ligada

à xenofobia e ao anti-semitismo, no final do século XIX (05).

Para Hobsbawn, o nacionalismo nasce ambíguo, pois ao mesmo

tempo que defende o direito à autodeterminaç_o, sugere que,

através de seu libertador nacional, conduziria os outros

povos também à liberdade. Tal atitude foi adaptada às

políticas conservadoras e imperialistas do final do século

XIX e início do século XX (06).

É neste quadro que a II Internacional (1889-1914) vai

desenvolver seu debate em torno da chamada quest_o nacional,

em que as matrizes da ênfase na política ou na cultura,

herdeiras do Iluminismo, nortear_o vis•es polarizadoras do

debate. De um lado Lenin (1870-1924) e o grupo a ele ligado;

de outro, os social- democratas austríacos, onde se sobressai

Otto Bauer (1881-1938).

Bauer dá um caráter historicista à sua obra que a faz

possuir um valor inegável. Situando-se no terreno do

materialismo histórico, se op•e ao conservadorismo burguês

dos mitos da "naç_o eterna" e do racismo. Para Otto Bauer, o

que distingüe uma nacionalidade da outra é o caráter nacional

(07). Josef Stálin (1879-1953), em artigo de 1913 (08) se

oporá a este reducionismo da naç_o à comunidade de cultura.

8

Outra importante participante deste debate foi Rosa

Luxemburg (1871-1919). Embora tenha escrito anteriormente

sobre o tema (09), somente a partir da coletânea de artigos

redigidos entre 1908 e 1909 tem início sua polêmica com

Lenin. O ponto de partida de Rosa e Lenin é o mesmo. Ambos

defendem o internacionalismo proletário como elemento que

supera as diferenças nacionais. A polêmica surge com a

descrença de Rosa Luxemburg nas possibilidades do

proletariado dar outro caráter ao Estado burguês (10). No

entanto, é necessário não generalizar as opiniões da autora

sobre o caso polonês. Nas suas formulações não há

incompatibilidade entre questão nacional e socialismo (11).

Lenin se destaca na medida em que compreende melhor a

ligação dialética entre internacionalismo e o direito de

autodeterminação nacional. Por outro lado, sua percepção da

historicidade do conceito de nação se traduz na sua aguda

sensibilidade para "saisir et souligne, dans chaque problème,

dans chaque contradiction, son aspect politique (...). C'est

cet aspect méthodologique que explique (entre autres)

l'impressionante actualité de la pensée de Lénine au XXe

siècle, période de l'imperialisme..." (12) (grifos do autor).

No ensaio O imperialismo, fase superior do capitalismo,

escrito em 1916, Lenin apresenta a outra face da

autodeterminação das nações - o fenômeno do imperialismo. O

autor se propõe a analisar "os laços e as relações recíprocas

existentes entre as particularidades econômicas fundamentais

do imperialismo (13) (grifos do autor). Hannah Arendt, de

certa forma, amplia este quadro de observações, ressaltando:

"A expansão como objetivo permanente e supremo da

política é a idéia central do imperialismo. Não implica

em pilhagem temporária nem na assimilação duradoura,

características da conquista" (14).

Tanto Lenin como Arendt percebem como nacionalismo e

imperialismo se relacionam dialeticamente, são faces da mesma

moeda, chegando o primeiro a distingüir nacionalismo e

autodeterminação,Lenin não usa o termo nacionalismo por sua

vinculação à xenofobia, em outra ocasião refere-se ao nacionalismo

das nações oprimidas e nacionalismo das nações opressoras (15).

Hannah Arendt vai observar como facilmente o nacionalismo da

segunda metade do século XIX se transformou em imperialismo,

graças à expansão justificada como interesse comum da nação (16).

8

A emergência das massas na política, a partir da segunda

metade do século XIX, marca a transformação da idéia de nação

em força política, assinalando o surgimento do nacionalismo

(17). A entrada em cena das classes populares remete a duas

questões: a manipulação da memória coletiva pelas classes

dominantes, constituindo o que Antônio Gramsci chama

de "biografia" nacional, com o objetivo de coesionar o

conjunto da nação em torno do sentimento nacional, e, por

outro lado, a possibilidade da apreensão da memória nacional

numa perspectiva popular (18). Gramsci observa que em muitas

línguas, "nacional" e "popular" são sinônimos, ou quase, como

nos casos alemão e russo. Para o autor, nação deve se

subordinar ao povo. Estas duas questões estão presentes na

obra de Gramsci, tanto a crítica a esta concepção romântica

da nação, como a possibilidade da construção do nacional-

popular.

A apreensão do nacional pelas classes populares

corresponde ao terceiro momento da questão nacional, quando

se torna instrumento na história da libertação política,

tanto na Europa (países eslavos, bálticos, escandinavos,

balcânicos), como na África e Ásia (19). Na América Latina e

Caribe, a construção desse projeto nacional-popular traduzir-

se-á em programas voltados para a independência econômica e à

cultura popular. Para Gramsci, só é nacional o que é popular,

e lembra autores que são compreendidos por sua

universalidade, como Shakespeare, Victor Hugo ou Tolstói,

preocupados em "captar no saber e na consciência populares

instantes de `revelação' que alteram a visão de mundo do

artista ou do intelectual..." (20). Esta leitura de Antonio

Gramsci, do nacional, associa-o às concepções predominantes

na época da II Internacional, quanto a historicidade com que

é necessário circunscrever o fato nacional, o que traz como

conseqüência a possibilidade da apreensão do nacional pelas

classes populares, ou como, na terminologia dos marxistas da

II Internacional, a questão nacional do proletariado.

Entre nós, a literatura sobre a questão nacional nos

anos cinqüenta é fortemente marcada por profunda desconfiança

em projetos que partam do Estado. De tal forma este tem sido

o alvo privilegiado nas análises. Temos os trabalhos de Caio

Navarro de Toledo, ISEB: Fábrica de Ideologias (21),

analisando a produção teórica elaborada pelos intelectuais

vinculados a esta instituição subordinada ao Ministério da

Educação e Cultura. Temos a obra de Gabriel Cohn, Petróleo e

nacionalismo, procurando interpretar o processo que conduziu

à entrada do Estado nesta área da economia nacional a partir

das relações entre os diversos grupos sociais envolvidos na

formulação do projeto: técnicos, políticos e militares, no

8

entanto, não temos ainda a história da campanha "o petróleo é

nosso", como também é incipiente a produção acerca das

manifestações de cultura popular do período (22).

A relação história e cultura tem sido analisada por

diversos autores. Para os objetivos do presente trabalho,

observaremos as contribuições de Carlos Guilherme Mota,

Ideologia da cultura brasileira; Renato Ortiz, Cultura

brasileira e identidade nacional; e Lúcia Lippi de Oliveira,

A Questão Nacional na Primeira República (23). Tanto Carlos

Guilherme Mota, como Renato Ortiz, excluem a possibilidade da

questão nacional ser compatível com a teoria marxista das

classes sociais. Ortiz refere-se a uma pluralidade de

identidades, construídas por diferentes grupos sociais.

Carlos G. Mota ressaltará o componente ideológico do aposto

nacional, considerando consciência de classe como conceito

analítico. Não me parece uma boa forma de resolver a questão.

Os dois conceitos são ideológicos e os dois podem ser

científicos. O trabalho de Lucia Lippi de Oliveira fica no

meio do caminho: não vê a questão nacional como elemento que

obscureça o conflito de classes, mas deixa claro que o

nacionalismo não "trabalha com aquilo que distingüe os homens

no espaço social". Ora, se não distingüe, uniformiza e

manipula, mas a serviço de quem ?

Arrisco-me a dizer que estes trabalhos, em particular o

último, não atentam suficientemente para esta nova dimensão

do espaço, ampliada progressivamente desde os tempos

modernos, o espaço das relações internacionais, onde nações

e organizações transnacionais se interagem, onde

nacionalismos e imperialismos medem força.

Outra reflexão sobre o tema extremamente influente é a

realizada por Marilena Chauí, que procura ressaltar o uso do

nacional associado ao discurso do poder, ou seja, do Estado

Nacional,

"pois a ideologia nacionalista é o instrumento poderoso

da unificação social, não só porque fornece a ilusão da

comunidade indivisa (a nação), mas também porque permite

colocar a divisão fora do campo nacional, isto é, na

nação estrangeira" (24).

8

O que a autora não atenta é que a partir do século XX,

em particular a partir do após II Guerra, o discurso do poder

não é mais exclusivamente o do Estado nacional. Pelo

contrário, as fronteiras nacionais começam a oferecer

empecilhos à expansão de organizações transnacionais.

Finalizando esta revisão bibliográfica, quero mencionar

dois trabalhos que possuem o mérito de situar a questão

nacional como força impulsionadora de transformações em

nossa época, à medida que se torna elemento de mobilização

popular. Trata-se de Nationalism in Brazil, de Bradford

Burns; e Presença dos Estados Unidos no Brasil, de Luiz

Alberto Moniz Bandeira. Embora com limitaç•es de proposta e

método, respectivamente, as duas obras se situam afinadas com

as reflex•es de Hobsbawn, Hans Kohn e Benedict Anderson sobre

o uso da quest_o nacional pelos movimentos de libertaç_o do

século XX (25).

O tema deste trabalho é o movimento nacionalista do

Brasil no período que vai de 1953 a 1964. Analisa as

organizaç•es sociais, os líderes e o discurso destinado a

promover coes_o em torno das teses nacionalistas; e enfatiza

as aç•es oriundas da sociedade, verificando diferentes graus

de relacionamento com o Estado, mas ressaltando a perspectiva

popular de apreens_o do nacional. Desta forma, pretendo

demonstrar a viabilidade de uma teoria das classes sociais,

em que a quest_o nacional seja importante elemento de

compreens_o.

A relaç_o classe e naç_o foi abordada a partir de dois

pressupostos: toda identidade é uma construç_o simbólica,

portanto, mito e símbolo ser_o elementos-chave na compreens_o

da formaç_o da consciência nacional. Por outro lado, a

identidade é uma imagem construída na relaç_o com o outro.

Portanto, a naç_o é construída, nessa fase, no enfrentamento

com o imperialismo, ou seja, este é o locus de sua

inteligibilidade.

No caso analisado o discurso dominante tem como base a

afirmaç_o da incapacidade de construç_o de um modelo

econômico em que a potencializaç_o das capacidades internas

seja efetivada. A construç_o do projeto nacional-popular será

o parâmetro para a compreens_o das vicissitudes do movimento

nacionalista.

8

Outro conceito fundamental na abordagem é o de

ideologia, observado na sua relaç_o com a estrutura econômica

e na possibilidade de se tornar saber universalizante,

deixando, portanto, de ser saber exclusivamente ideológico.

Quanto ao primeiro aspecto, é necessário observar a

possibilidade da ideologia se articular e se rearticular n_o

somente como resposta ao "real", mas também como conhecimento

que se volta para a realidade na forma de projetos de

manutenç_o ou transformaç_o da ordem (26).

Adam Schaff, comentando a relaç_o sujeito-objeto, fala

sobre a interaç_o entre esses dois pólos, tanto um como o

outro mantêm sua existência objetiva e real e exercem

influência mútua:

"Estainteraç_o produz-se no enquadramento da prática

social do sujeito que apreende o objeto na - e pela -

sua atividade" (27).

A quest_o nacional quando examinada neste trabalho é

vista, portanto, como resposta a condiç•es materiais que

impedem a consolidaç_o do projeto nacional-popular e como

discurso que aponta para a sua construç_o. A ideologia, no

momento em que assume seu caráter universalizante, torna-se

vis_o de mundo, forma superadora do real. A produç_o do

pensamento está, assim, sempre conectada com as modificaç•es

na vida social e material(28).

Sobre este fenômeno da reduç_o e ampliaç_o do horizonte

das ideologias, nos momentos de exercício do poder e de

conquista de ades•es, assim se refere Karl Marx:

"Com efeito,cada nova classe que toma o lugar da que

dominava antes dela é obrigada, para alcançar os fins a

que se prop•e, a apresentar seus interesses como sendo

interesse comum de todos os membros da sociedade, isto

é, para expressar isso mesmo em termos ideais: é

obrigada a emprestar às suas idéias a forma de

universalidade, e apresentá-las como sendo as únicas

racionais, as únicas universalmente válidas" (29).

8

Outro obstáculo à compreens_o dos processos políticos e

sociais do período tem sido a preocupaç_o obsessiva de alguns

autores com a forma. Na análise governantes-governados,

insiste- se no conceito de populismo como elemento

explicativo maior para o período (30). Esta ênfase na relaç_o

líder-massa obscurece a mobilizaç_o popular e o programa

nacionalista. Francisco Weffort vê a importância do movimento

nacionalista como movimento de massa, mas o desqualifica em

seguida "por emergir ao nível do Estado" (31). Pretendo

demonstrar que esta mobilizaç_o, em boa parte, se deu fora

das estruturas do Estado, e quando a intercessão Estado-

massas aconteceu foi com base em identificações

significativas e mutuamente enriquecedoras. O autor, ao

insistir que o populismo "só pode ser compreendido

adequadamente como expressão de interesses determinados de

classe" (32) (grifos do autor) quer, na verdade, afirmar que

a teoria de classes prescinde da premissa nacional (33).

O objetivo deste trabalho é, portanto, compreender a

elaboração do discurso nacionalista e sua busca de adesão,

observando a construção simbólica como elemento unificador da

visão de mundo a ele subjacente. A hipótese central é que o

nacionalismo constitui o nexo dos variados projetos,

discursos e elementos ideológicos que ocupam a cena política

do período que vai de 1953, ano de criação da Petrobrás, até

1964, quando o golpe militar interrompe o processo de

mobilização popular em torno das reformas de base, lapso

referido neste trabalho como anos cinqüenta, fazendo analogia

com a periodização de Frederic Jameson para os anos sessenta,

que considera plausível situar seu final em torno de 1972-

1974 (34).

A busca de adesão em larga escala supõe a necessidade do

uso de formas de comunicação de amplo alcance. A presente

pesquisa procurou, portanto, privilegiar fontes com tal

característica, a saber: o texto jornalístico, o discurso

político e o texto científico de divulgação.

Os dois jornais pesquisados apresentam perfis inovadores,

objetivando atingir as amplas massas da população: ambos

nacionalistas, sendo a Última Hora (1951-1991) mais vinculado

ao nacionalismo oficial. Já O Semanário (1956-1964), mais

independente. Assinale-se que o primeiro apresentou uma

proposta estética revolucionária para a época. Até a Última

Hora, os jornais editados no Brasil não eram para ser lidos

pelas classes populares

8

O debate em torno dos projetos de construção nacional

exige um certo nível de aprofundamento e permanência da

informação que os jornais não possuem. Desenvolve-se uma

literatura engajada na defesa do nacionalismo, de

características bem variadas, desde as antologias da Editora

Fulgor, até os ensaios da Coleção Cadernos do Povo

Brasileiro.

Como preocupação metodológica mais ampla, a abordagem

das fontes pressupõe o conhecimento histórico como

construção, algo muito óbvio, pois característico de todo

conhecimento, mas no caso da história, um alerta não-

desnecessário, já que suas categorias encarnam-se no processo

histórico e são atingidas pelas mudanças que no seu decorrer

acontecem. Precisa, portanto, o historiador, promover uma

reflexão incessante sobre seu objeto, nas palavras de Ernst

Cassirer:

"não são coisas nem acontecimentos, porém documentos ou

monumentos os primeiros e imediatos objetos de nosso

conhecimento científico" (35).

8

NOTAS

(01) Na defesa desse ponto de vista, ver, entre outros, Luiz

Felipe Baêta Neves, As Máscaras da Totalidade

Totalitária: memória e produç_o sociais, Rio de Janeiro,

Forense Universitária, 1988, e Francisco Weffort, O

populismo na política brasileira, 3ª ed., Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1980.

(02)HOBSBAWN, Eric. A Era dos Impérios: 1875-1914. 2ª ed.

Traduç_o Sieni Maria Campos e Yolanda Steidel de Toledo.

Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, p. 92.

(03)OLIVEIRA, Lúcia Lippi de . A Quest_o Nacinal da Primeira

República. S_o Paulo, Brasiliense, 1990, pp. 32-42.

(04)Encontramos essa periodizaç_o em diversos autores: Hans

Kohn, verbete Nacionalismo, David Sills (dir.)

Enciclopedia Internacional de las Ciencias Sociales,

Madrid, Aguilar Ediciones, 1975, pp. 306-310; Eric J.

Hobsbawn, Naç•es e nacionalismo desde 1780, traduç_o de

maria Celia Paoli e Anna Maria Quirino , Rio de Janeiro,

Paz e Terra, 1990; Benedict Anderson, Naç_o e

Consciência Nacional, traduç_o Lolio L. de Oliveira, S_o

Paulo, °tica, 1989; Rogério Cerqueira Leite, Quem tem

medo do nacionalismo, S_o Paulo, Brasiliense, 1983. É

necessário registrar que Hans Kohn se equivoca ao

considerar a primeira fase já nacinalismo, quando trata-

se do surgimento da idéia de naç_o.

(05)HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios, op. cit., pp. 203-

204.

(06)HOBSBAWN, Eric J. A Era das Revoluç•es: 1789-1848.

Traduç_o de Maria Tereza L. Teixeira e Marcos Penchel.

3ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981, pp. 152-153.

(07)LOWY, Michael. Le probleme de l'histoire: Remarques de

théorie et de méthode. In HAUPT, Georges et al. (org.)

8

Les marxistes et la question nationale; 1848-1914.

Paris, Maspero, 1974, p. 385.

(08)STALIN, J. O marxismo e a questão nacional. In Obras,

vol. 2. Rio de Janeiro, Editorial Vitória, 1952.

(09)Na coletânea Les marxistes et la question nationale, são

transcritos dois textos desse período.

(10)LUXEMBURG, Rosa. A Questão Nacional e a Autonomia.

Tradução de Antonio R. Bertelli. Belo Horizonte, Oficina

de Livros, 1988, p. 64.

(11) O que podemos observar em Rosa Luxemburg é uma certa

descrença quanto à possibilidade dos Estados nacionais

constituírem-se em espaço para a luta antiimperialista,

para a autora as nações são invólucros vazios "dans

lesquels chaque periode historique et les rapports de

classes dans chaque pays coulent un contenu materiel

particuler", tal afirmação a afasta da visão que procura

enfatizar a historicidade do conceito de nação, a nação

não pode ser um invólucro vazio, pois a cada nova

situação apresenta o aspecto material anterior. Cf.

Fragment

In Oeuvres II (Écrits politiques, 1917-1918).

Présentation et traduction nouvelle de Claudie Weill.

Paris, Maspero, 1971, pp. 95-96.

(12)LOWY, Michael. Op. cit. pp. 388-389.

(13)LÉNINE, V. I. O imperialismo, fase superior do

capitalismo (ensaio popular). In Obras escolhidas, vol.

1. São Paulo, Alfa-Ômega, 1982, p. 586.

(14)ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. Tradução de

Roberto Raposo. São Paulo, Companhia das Letras, 1989,

p. 155.

(15)Para Lenin, o termo autodeterminação nacional evita a

ambigüidade de nacionalismo, que pode significar a

opressão das nações mais fortes sobre as mais fracas.

Cf. Sobre o direito dos povos à autodeterminação, in

Obras escolhidas, op. cit., vol. 1, p. 542, e sobre a

questão das nacionalidades ou da "autonomização", op. p.

650.

8

(16)ARENDT, Hannah. Op. cit. pp. 182-183.

(17)HOBSBAWN, Eric J. A Era dos Impérios, op. cit., p. 127.

(18)Para acompanhar esta abordagem ver Antonio Gramsci,

respectivamente, em El "risorgimento". Traduç_o de

Manlio Macri, Buenos Aires, Granica, 1974, pp. 91, e

Literatura e Vida Nacional. Traduç_o

Rio de Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978, pp. 105-

106.

(19)BOSI, Alfredo. Um testemunho do presente (prefácio). In

MOTA, Carlos Gulherme. Ideologia da Cultura Brasileira.

4ª ed., S_o Paulo, °tica, 1980, p.

(20)GRAMSCI, Antonio. Literatura e Vida Nacional. Op. cit.,

p.

(21)TOLEDO, Caio Navarro de. ISEB: Fábrica de Ideologias. 2ª

ed., S_o Paulo, °tica, 1982.

(22)COHN, Gabriel. Petróleo e nacionalismo. S_o Paulo, Difel,

1968. Sobre a campanha "o petróleo é nosso" temos a

síntese de Gerson Moura, A campanha do petróleo, S_o Paulo,

Brasiliense, 1986, Coleç_o Tudo é História, e O petróleo é

nosso, de Maria Augusta Tibiriçá de Miranda, Petrópolis,

Vozes, 1983, memorial que descreve a mobilizaç_o popular.

(23)ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional.

2ª ed., S_o Paulo, Brasiliense, 1986.

(24)CHAUµ, Marilena. Cultura e democracia: o discurso

competente e outras falas. 5ª ed., S_o Paulo, Cortez,

1990, p.21.

(25)BURNS, E. Bradford. Nationalism in Brazil: a historical

survey. New York, Frederick Praeger Publishers, 1968;

BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Presença dos Estados

8

Unidos no Brasil. (séculos de história). 2ª ed., Rio de

Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978.

(26)LEFORT, Claude. As formas da história. Traduç_o de Luiz

Roberto S. Fortes e Marilena Chauí. 2ª ed., S_o Paulo,

Brasiliense, 1990, p. 298.

(27)SCHAFF, Adam. História e Verdade. Traduç_o de Maria Paula

Duarte. S_o Paulo, Martins Fontes, 1897, pp. 75-76.

(28)VILAR, Pierre. Marx e a História. In Hobsbawn, Eric.

(org.). História do Marxismo. Vol. 1, Rio de Janeiro,

Paz e Terra, 1983, p. 107.

(29)MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A ideologia alem_ (I

Feurbach). Traduç_o de José Carlos Bruni e Marco A.

Nogueira. 8ª ed., S_o Paulo, Hucitec, 1991, p. 74.

(30)Para a análise do populismo consideramos principalmente

Francisco Weffort, O populismo na política brasileira,

3ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1980, e Sindicatos

e Política, tese de livre-docência, S_o Paulo, USP,

1972; Octavio Ianni, O Colapso do Populismo no Brasil,

4ª ed., Rio de Janeiro, Civilizaç_o Brasileira, 1978; o

trabalho de Angela de Castro Gomes, A invenç_o do

trabalhismo. S_o Paulo, Vértice, 1988, contribui para o

início de revis_o desse quadro conceitual.

(31)WEFFORT, Francisco. Sindicatos e Política. Tese

apresentada para concurso de livre-docência. S_o Paulo,

USP, 1972, p. IV 7.

(32)WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira.

Op. cit., p. 26.

(33)MORAES, Jo_o Quartim de. Le statut theorique de la notion

de dependance. In IV Seminaire Latino-Americain, CETIM,

Genève, abril de 1972. O autor critica tanto às formulaç•es

de Fernando H. Cardoso como as de Francisco Weffort. Para

8

Quartim de Moraes, Cardoso n_o critica a noç_o de "situaç_o

concreta de dependência", caindo num certo empirismo. Já a

Weffort a crítica é a partir do ponto de vista abstrato.

(34)JAMESON, Friedrich. Periodizando os anos 60. In HOLLANDA,

Heloísa Buarque de (org.). Pós-modernismo e política.

Rio de Janeiro, Rocco, 1991, p. 89.

(35)CASSIRER, Ernst. Antropologia filosófica. 2ª ed., S_o

Paulo, Mestre Jou, 1977, p. 277.

8

CAPµTULO I

PROGRAMA E MITO

"As naç•es todas s_o

mistérios. Cada uma é todo

o mundo a sós. _ m_e de

reis e avó de impérios,

vela por nós!"

Fernando

Pessoa

O nacionalismo, no Brasil, em meados da década de

cinqüenta, vive um momento de afirmaç_o. Há dois marcos desse

fortalecimento: a criaç_o da Petrobrás, em 3 de outubro de

1953 e a morte do presidente Getúlio Vargas em 24 de agosto

de 1954. Esses dois fatos est_o carregados de significados

para o programa nacionalista e sua simbologia. S_o os dois

símbolos maiores e em torno deles, constelaç•es se formam,

como as tentativas de construç_o simbólica a partir do

caráter nacional, quando se procura eleger o povo como

símbolo da naç_o. A retomada do culto aos heróis republicanos

pelos nacionalistas será outro elemento de análise do esforço

que empreenderam os nacionalistas para popularizar suas

idéias.

A busca de símbolos por parte dos nacionalistas, na

acirrada batalha dessa etapa da construç_o da naç_o,

sintetiza com dramaticidade como povo e governantes viveram

suas contradiç•es.

1.1. A carta-testamento: simbologia e programa

O documento histórico mais significativo desse período

éa carta-testamento. O gesto final de Vargas e sua última

mensagem abrem uma fenda entre as duas facç•es em luta:

8

nacionalistas e n_o-nacionalistas, e oferecem aos primeiros

sua bandeira de maior significado, agora rota e manchada de

sangue. Como n_o- nacionalistas identifico todos aqueles que

conservam um discurso de maior ou menor alinhamento com as

naç•es de industrializaç_o mais antiga, notadamente, os

Estados Unidos da América.

Morto, Vargas se transforma em bandeira. Anteriormente,

nem entre os nacionalistas tinha apoio integral. Aqueles

ligados à campanha "o petróleo é nosso" apontavam as

violências policiais, durante seu governo. Afirmam que Vargas

procurava atender às reivindicaç•es dos trustes e comprovam

ligaç•es de seus ministérios com essas corporaç•es. Nem a

criaç_o da Petrobrás é considerada, por esses setores, como

sua realizaç_o. Afirma-se, sempre, que cedeu à press_o da

opini_o pública (01).

Nelson Werneck Sodré compara Vargas a Kubitschek, ao

comentar sua posiç_o favorável à posse de JK:

"Desejava a sua posse por uma quest_o de princípio, como

desejara que Vargas cumprisse o seu mandato até o fim,

apesar de ter sérias raz•es pessoais para desejar o

contrário" (02).

Essas duas opini•es ilustram o grau de isolamento em que

se encontrava o presidente. O sucesso administrativo do

governo n_o consubstanciava-se em sucesso político. E o seu

programa político era considerado limitado pelos

nacionalistas. E qual era esse programa ?

Desde a campanha presidencial de 1950, a quest_o

nacional esteve presente nos discursos de Vargas, formando

com a reforma social o binômio da campanha (03). Esse

nacionalismo, no entanto, n_o visa a impedir a entrada do

capital estrangeiro. Vargas fala, sempre, em controle, ou

melhor, ressalta, sempre, este aspecto.

O jornal _ltima Hora, ao fazer um balanço do governo

Vargas, durante o ano de 1953, e prospectivas para o ano de

1954, apresenta este ano como o "ano decisivo para a

emancipaç_o econômica do Brasil", justificando:

8

"em fevereiro começará a funcionar, com aço fabricado na

própria usina, aço brasileiro, o segundo alto forno de

Volta Redonda, maior e com mais capacidade de produção

que o primeiro. A Companhia Hidrelétrica do Vale de São

Francisco iniciará praticamente as suas atividades..."

Cita também a Petrobrás, já estruturada e com verbas

aprovadas pelo Congresso. E conclui com a perspectiva do

projeto da Eletrobrás:

"organizada nos mesmos moldes da Petrobrás, o que

facultará ao país as maiores possibilidades de progresso

no que diz respeito à energia elétrica, problema dos

mais importantes na atual conjuntura" (04).

Nesse mesmo ano, Vargas recomendara ao Ministro da

Fazenda, Oswaldo Aranha, levantamento sobre a atuação do

capital estrangeiro no Brasil. O resultado desse trabalho

aparece no discurso de 31 de janeiro de 1954. Para Nelson

Werneck Sodré esse discurso

"desvendou o problema da remessa de lucros das empresas

estrangeiras instaladas no Brasil, na quase totalidade,

meras dependentes ou representantes dos grandes

monopólios norte-americanos. Era libelo candente, cheio

de dados concretos, mostrando a terrível chaga cancerosa

que nos corroía a vitalidade econômica e financeira.

Constituía espetáculo escandaloso e inédito ver o

próprio Presidente da República denunciar à Nação, em

pronunciamento sensacional, a exploração a que vínhamos

sendo submetidos." (05)

Vargas inicia o discurso afirmando: "Posso hoje anunciar

o meu programa de governo, programa que venho executando em

silêncio e só não o anunciei previamente porque os debates

teriam impedido sua realização." E mais adiante define sua

posição frente ao capital estrangeiro:

8

"Eu não pretendo nacionalizar nem os bens nem o capital

estrangeiro. Não pretendo encampar nem desapropriar

empresas. O que tenho o dever de evitar é a

desnacionalização do Brasil" (05a).

Desde a campanha presidencial, e desdobrando-se nos

discursos e decretos referentes ao tema, consolida-se a

posição de Vargas em defesa do controle do capital

estrangeiro, denunciando seu caráter espoliativo. No entanto,

não exclui a possibilidade de sua participação no processo de

industrialização em curso (06). Reside aqui o ponto de

separação entre o presidente e os nacionalistas militantes.

Os nacionalistas podem ser definidos por sua atuação em

duas esferas distintas: uma, voltada para a ação de persuasão

no interior do aparelho de Estado, nos Ministérios,

Comissões, Assessorias etc.; outra, dedicada à ação externa

de formação da "opinião pública". Rômulo de Almeida (Assessor

Econômico de Vargas) e Gondin da Fonseca (funcionário

aposentado do Banco do Brasil e jornalista) são,

respectivamente, exemplos dessa dupla atuação (07).

Forçosamente, Vargas estará mais próximo dessa primeira

corrente, e encontrará, na segunda, críticas à sua moderação

e conciliação.

São desse período decretos restritivos ao capital

estrangeiro. O primeiro, de janeiro de 1953; o outro, de

janeiro de 1954. Em 1952, o governo Vargas já apresentara um

decreto limitando a remessa de lucros. Essas atitudes

repercutem nas relações Brasil-Estados Unidos. A partir de

então, surgem modificações na política estadunidense,

interrompe-se a política de financiamento de governo a

governo e passa-se a incentivar os investimentos de grandes

capitais privados. Desta forma inviabiliza-se a concessão de

empréstimos negociados pela Comissão Mista Brasil-Estados

Unidos (08).

Nelson Werneck Sodré considera o posicionamento frente

ao capital estrangeiro fator relevante para a crise política

que se desencadeia a partir de meados de 1953 (09). Cibilis

da Rocha Viana vai na mesma direção:

8

"Só o temor dos grupos internacionais e nacionais de que

se consolidasse definitivamente a experiência brasileira

de desenvolvimento autônomo, sem dependência do

capitalismo monopolista multinacional, poderia

justificar toda uma série de ações coordenadas, visando

desestabilizar o Governo" (10).

No nacionalismo de Vargas encontra-se a preocupação com

a formação da unidade nacional necessária para enfrentamento

ao imperialismo. Era necessária a união nacional capaz de

fazer "uma só Nação das duas que hoje existem justapostas e

separadas, trazer enfim para o efetivo abrigo da Bandeira da

Pátria aqueles que até hoje só conhecem dos seus concidadão

mais felizes a indiferença ou a opressão" (11). As palavras

de Vargas, no século XX, se assemelham às críticas do então

futuro primeiro-ministro inglês Disraeli, quando denuncia as

"duas nações" que dividem a Grã-Bretanha no século XIX: de um

lado, a dos ricos; de outro, a dos pobres.

O antagonismo entre os que desejam o desenvolvimento

internacionalizado e os que pretendem o desenvolvimento

econômico independente se intensifica a partir de 1954 (12).

As medidas nacionalistas de Vargas fortalecem essa segunda

opção. No entanto, não são suficientes para garantir-lhe o

apoio de que necessita.

As insatisfações caminham, progressivamente, para um

único ponto: Vargas. A crise se resolve com sua redução na

pessoa do presidente:

"É em Vargas que se concentram os esforços de reviso

política, transformando-o em fonte de todas as

desavenças. Da forma como foi reduzida a crise, o

suicídio de Vargas acaba por esvaziá-la rapidamente, já

que desaparecerá o elemento ao qual foram imputadas

todas as causas de todos os problemas" (13).

8

As razões da crise se encontram, por sua vez, no

amadurecimento do programa nacionalista que Vargas expressa e

que pulsa nos movimentos nacionalistas, cuja expressão maior

é a campanha "o petróleo é nosso" e nas formulações dos

técnicos ligados à burocracia, onde se destaca a Assessoria

Econômica do segundo governo Vargas e o pessoal técnico-

militar.

No Congresso, as investigações contra Vargas adquirem

tons fortes em dois momentos: a Comissão Parlamentar de

Inquérito que investigou o jornal Última Hora e o pedido de

impeachment.

A Última Hora fora fundada em 1951, por Samuel Wainer,

primeiramente, circulando no Rio de Janeiro, depois São Paulo

e outros estados. Era decididamente o único jornal pró-

Vargas, embora não fosse o único nacionalista. Na grande

imprensa, o Diário de Notícias assumiu a defesa do monopólio

estatal do petróleo, e havia jornais nacionalistas que

mantinham uma certa distância dos governos, como O Semanário,

fundado em 1956, por Oswaldo Costa. A ligação da Última Hora

com o governo Vargas era muito grande: parte do financiamento

que permitiu sua fundação foi conseguida no Banco do Brasil.

A oposição usa este argumento para apurar possíveis

irregularidades. Em abril de 1953, instala-se a Comissão

Parlamentar de Inquérito que até início de 1954 foi um foco

de acusações contra o governo (14).

O pedido de impeachment apresentado no início de 1954,

pela União Democrática Nacional, tem um desfecho favorável ao

governo: comprova-se que não havia uma coalizão oposicionista

no Congresso capaz de derrotá-lo.

No dia 5 de agosto de 1954, ocorre o atentado da Rua

Toneleros, onde morre o major Rubens Vaz e Carlos Lacerda sai

ferido. Samuel Wainer assim descreve o impacto do

acontecimento:

"De certa forma, a tormenta apanhou os getulistas

desprevenidos. ...Depois de ver derrotada no Congresso a

proposta de impeachment de Vargas, a UDN dava a

impressão de cansaço. O antigetulismo parecia exaurido,

sem argumentos, abatido pela resistência de um homem

que apesar do assédio, continuava no poder (15).

8

A partir de então a crise se agrava progressivamente. O

próprio presidente passa a acalentar a idéia da resistência

com o sacrifício da sua vida. Aproximadamente quinze dias

antes de 24 de agosto, fora encontrada parte de uma das

versões da carta - testamento, onde estava escrito: "_ sanha

dos meus inimigos deixo o legado da minha morte". Na verdade,

não se trata de um bilhete, mas de uma versão mais pessoal da

carta (16).

A outra versão, aquela que seria divulgada amplamente,

escrita com a ajuda de Maciel Filho, era uma declaração de

resistência. Assim comenta o seu ministro da Justiça,

Tancredo Neves:

"Quando hoje a gente lê a carta, percebe que ela tanto

serve para justificar uma resistência ou um gesto de

bravura. Toda a nossa conversa um pouco antes da reunião

ministerial era uma conversa de resistência. É curioso.

Ele não foi para a reunião com o espírito do suicídio. A

idéia se implantou nele depois da reunião. Foi ali que

os ministros militares o decepcionaram. Foi sobretudo

isso, foi o balanço que ele fez da reunião. Ele era um

homem acuado " (17).

Às 8 horas da manhã do dia 24 de agosto, Vargas recebe o

ultimato das Forças Armadas, que na verdade era a sua

deposição, pois o pedido de licença apresentado não fora

aceito. Depois de ir ao seu escritório, volta aos aposentos,

e com um tiro no peito atinge o coração. Amarrara o seu

cadáver ao lado de seus assassinos (18).

A cópia divulgada foi a datilografada, que estava

encostada no abajur da mesa de cabeceira. A carta é lida por

Oswaldo Aranha para os presentes e depois, por telefone, para

a Rádio Nacional, antes das 9 horas. Passa, depois, a ser

irradiada para todo o país. O major Fitipaldi, ajudante de

ordens de Getúlio, que encontrara quinze dias antes as

anotações manuscritas de memória, referidas acima, de memória

reproduziu a frase para Vitor Costa, diretor da Rádio

Nacional (19). Era acendido nas ondas do rádio o estopim da

reação. Note-se que desde 21 de agosto, tiveram início os

8

programas radiofônicos do jornalista Eloy Dutra, em defesa de

Vargas, na rádio Mayrink Veiga (20).

O depoimento de José Américo de Almeida, escritor e

ministro da Viação do segundo governo de Vargas, ilustra as

primeiras reações à morte do presidente:

"Atingindo o palácio, rompi a onda, vendo máscaras

convulsivas e ouvindo exclamações de desespero. Filhos

do sul, afeitos a lutas mortais, em espasmos de

sensibilidades trituradas, não continham o pranto. Nunca

vi tanta lágrima. O quanto pode um ser humano sofrer,

sofria essa gente amargurada, numa dor sufocada ou

rebentando em soluços que explodiam como urros de

maldição. E lá fora, as multidões inconsoláveis

esperavam a visitação - a hora funesta dos desmaios

coletivos, decorações que não resistiam à brutalidade do

choque" (21).

Perpetrado seu último ato de vontade, Vargas desencadeia

a força subterrânea e contida da massa. Completara-se a

construção simbólica em torno de sua figura (22). Esta

síntese está muito próxima do conceito de mito como função

criadora de Georges Sorel (1847 - 1922), complexo de metas

remotas, de tensas disposições morais e a espera de um

sucesso apocalíptico... um sistema de valores e um panorama

do mundo, que inspiram e orientam os governantes ou os

aspirantes ao governo (23). Esta "animação criadora" irrompeu

às ruas das principais capitais do país. O seu gesto

paralisou os adversários e pôs em ação os seus aliados - o

povo.

Assim Samuel Wainer narra a passagem de um grupo pela

sede da Última Hora:

"Nesse momento, comecei a ouvir um rugido, feito de

milhares de vozes, que vinha das bandas da Candelária.

Olhei pela janela e vi uma multidão de manifestantes

descalços, subnutridos, feios. Gritavam Getúlio!, e

reconheci o mesmo urro medonho, assustador, com o qual

me familiarizara durante a campanha eleitoral de 1950. A

massa estacou diante do prédio da Última Hora e

exigiu que eu lhe falasse" (24).

8

A mensagem de Vargas tem grande eficácia. O gesto e o

conteúdo da carta-testamento constroem o maior mito político

da nossa história contemporânea. Pode-se afirmar que havia um

código já inscrito no imaginário, construído desde o Estado

Novo, que permitiu que a fagulha pusesse fogo na pradaria. Na

raiz do racional está o irracional; Raoul Girardet, na sua

análise dos mitos políticos de nosso tempo, chama a atenção

para o elemento acidental, a crise, a momentos de tensão e

marginalização. E, ressalta a importância da permanência

quando da figura do líder na cena política, de forma que

torne possível uma razoável sedimentação no imaginário.

Assim, o discurso de Vargas encontra ressonância estrondosa

no sentimento nacionalista latente. Girardet afirma que não

atentar para o aspecto da sacralização da política, a partir

do século XX, é correr o risco de pouco compreender a

história desse período (25).

Vargas encarna com radicalidade, nos seus últimos

momentos, o mito do salvador. Na carta-testamento assume esta

forma de exercício da autoridade política definida pelos

latinos como gravitas, "a firmeza na provação, a experiência,

a prudência, o sangue-frio, o comedimento, a moderação" (26).

Um elemento essencial, nesse modelo, é a sua doação à pátria.

Vargas ressalta este aspecto:

"Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora,

resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo

suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a

mim mesmo, para defender o povo que agora se queda

desamparado. Nada mais vos posso dar a não ser meu

sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém,

querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço

em holocausto a minha vida" (27). (os grifos são meus)

Os últimos gestos do presidente apontam sua obstinação

em resolver a crise de seu modo, caso o apoio militar lhe

faltasse. Miguel Teixeira, amigo com o qual prezava

intimidade e confiança, transmitira-lhe, no dia anterior, o

pensamento de Oswaldo Aranha, de reunir um grupo decidido a

resistir até a morte em caso de ataque. "Como Miguel Teixeira

insistisse, Getúlio perdeu a serenidade e, com punho cerrado

junto à face do amigo, disse: "Isto é um assunto pessoal meu"

(28). A convergência das insatisfações sobre ele,

exclusivamente, colabora para fortalecer a idéia de que a

saída para a crise se daria com o sacrifício de sua vida. Não

8

é uma fuga, pois agora Vargas, nas suas palavras, se encarna

na história e se oferece como estandarte de guerra:

"Escolho este meio de estar sempre ao vosso lado. Quando

a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a

energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos

vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para

a ação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome

será a vossa bandeira de luta" (29).

Vargas tem consciência da importância simbólica de seu

gesto e empresta seu nome àquela luta, o qual será a bandeira

daqueles que a prosseguiriam.

Na carta-testamento, Vargas também define seu pensamento

político no que diz respeito ao modelo econômico. Ali estão

as principais realizações de seu governo e, de forma

contundente, os obstáculos enfrentados. Enfatiza a criação da

Petrobrás:

"Quis criar a liberdade nacional na potencializado das

nossas riquezas através da Petrobrás. Mal começa esta a

funcionar, a onda de agitação se avoluma" (30).

No Congresso, encontram obstáculos a lei de lucros

extraordinários e o projeto de criação da estatal do setor

elétrico:

"A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero....A lei

de lucros extraordinários foi detida no Congresso.

...Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até

500% ao ano. Nas declarações de valores do que

importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100

milhos de dólares por ano" (31).

Esses dois pontos, mais a questão da política nuclear,

não tratada por Vargas, serão analisados a seguir.

8

O nome Getúlio e a carta são brandidos como armas de

guerra nas ruas das principais cidades do país e, no enterro,

em São Borja. E em pouco tempo já começam a merecer

interpretações por parte dos nacionalistas.

Os Cadernos do Nosso Tempo, publicação do IBESP

(Instituto Brasileiro de Estudos Sociais e Políticos), um

antecessor do ISEB, no início de 1955 apresentam sua análise,

provavelmente de autoria de Hélio Jaguaribe, em que o

articulista argumenta que o suicídio de Vargas mostrou que "o

móvel real da luta contra o Presidente Vargas e o golpe que o

havia deposto era o interesse de classe das forças

reacionárias e anti-nacionais." O gesto do presidente, por

sua vez, representa a

"luta pela emancipação econômica e social do país e,

dentro deste, de suas classes não possuidoras. Essa

mesma é também a significação que lhes dão as massas

trabalhadoras. E o que emprestou ao Presidente Vargas

esse caráter mítico de que ele se revestiu é justamente

o fato de sua vida e sua obra serem consideradas, pela

massa, de uma forma objetiva e a-histórica, como algo

que vai no puro plano da sua significação simbólica,

independentemente de suas motivações" (32).

Os membros do IBESP se situam no setor que chamei

anteriormente de técnico-burocrático do nacionalismo,

distingüindo-se dos militantes. Como já afirmei, esse setor

tem ligações mais estreitas com o Estado, é de se esperar,

portanto, mais fácil assimilação da simbologia getuliana. O

autor adverte para as limitações do programa. Falta

fundamentação teórica e aponta a solução:

"a partir desse mito, se a burguesia industrial e a

intelligentzia técnica exercerem o papel a que

historicamente estão convocados, poder-se-á empreender

com base ideológica, orientação programática e

organização política, uma ação transformadora no Brasil"

(33).

8

Escrito ainda no calor dos acontecimentos, mas

conservando o mesmo conteúdo favorável, há o artigo de Oswald

de Andrade, no Correio da Manhã, em que afirma que o

"pistoleiro" Vargas atingira "ponto extremamente importante

do momento nacional, particularmente quando conclama à luta

contra os imperialismos. " O escritor destaca que Getúlio

aponta "em testamento, um caminho que deve ser seguido - o da

luta pela emancipação nacional" (34).

O impacto da carta pode ser aquilatado nos esforços para

impedir sua divulgação e a tentativa de questionar sua

autenticidade. Ali estão a construção simbólica do

nacionalismo no seu ponto máximo e a síntese de suas

principais conquistas e obstáculos, além da identificação

clara do inimigo: o imperialismo. A partir de então, a carta

torna-se programa do PTB e parâmetro para pesar a conduta de

seus membros. Em 1957, no seu discurso na Convenção do

partido, João Goulart procura desfazer os rumores que davam

como tendo renegado o nacionalismo, depois de visita aos

Estados Unidos. Goulart afirma que o seu vade-mecum político

continuava sendo a carta-testamento de Getúlio (35). O

jornalista José Clemente, comentando o apoio do petebista

Souza Neves a Jânio e Costa Lima, que teriam cento e

cinqüenta milhões para gastar na campanha eleitoral, diz que

esse dinheiro é suficiente para "esses petebistas das

Arábias" arquivarem a carta de Getúlio (36).

A carta-testamento adquire, assim, uma função ritual. Na

estreita aproximação do mito à memória coletiva, sua divulgação

e o ritual de sua leitura no aniversário de morte de Vargas,

demonstram seu prestígio entre o povo. A memória nacional, ao

contrário da memória coletiva é produto da história social e

não da simples ritualização da tradição (37).

1.2. As origens da simbologia

As representações da nação podem voltar-se para formas

objetivas como as bandeiras, hinos nacionais, elementos da

natureza, como também podemos ter a nação representada como

povo (38). A possibilidade de associação simbólica entre

nação e povo encontra obstáculos, pois qual seria o caráter

nacional do povo brasileiro ? (39). Não teremos, portanto,

símbolos nacionais que possam dar conta deste aspecto da

representação.

8

Os nacionalistas buscarão seus símbolos na história

republicana, de forma direta, remetendo-se à sua instauração,

ou aos movimentos anti-coloniais do século XVIII, destacando-

se aqui a figura de Tiradentes (40).

É razoavelmente aceito que todo simbolismo se edifica

sobre as ruínas dos edifícios simbólicos precedentes (41).

Faz-se, necessário, portanto, observar a que valores tal

simbologia se remete.

Nos precursores e fundadores da República busca-se

inspiração. Suas qualidades como, coragem, serenidade, devem

ser imitadas. Anualmente, por ocasião do aniversário de morte

de Floriano Peixoto, o jornal O Semanário noticia as

solenidades alusivas à data. Essas solenidades são

organizadas pela Associação Benjamin Constant, Deodoro e

Floriano (ABCDEF), o Partido Socialista, o Movimento

Nacionalista Brasileiro e os Sindicatos dos Gráficos,

Bancários, Metalúrgicos e Aeroviários. É sempre lembrada a

resposta dada por Floriano à pergunta sobre como receberia a

intervenção estrangeira na Revolta da Armada: "À bala!" Para

o jornal, essa frase "exprime a energia com que os patriotas

nacionais e democratas devem liqüidar no território nacional

o capital estrangeiro colonizador..." (42).

O aniversário de morte de Tiradentes merece, também, a

mesma ritualização. Para E. R. Leach, o ritual é uma forma

privilegiada de comunicação, onde o código é decifrado na

recriação do fato, estabelecendo dessa forma sua força (43).

No dia 21 de abril de 1954, a Última Hora apresenta em

sua primeira página editorial alusivo à morte de Tiradentes.

Diz inicialmente que, por muito tempo, "este acontecimento

foi esquecido, porque sob o manto da independência política

dominavam o país remanescências muito fortes do nosso passado

colonial." Referindo-se à capacidade atual do povo vencer

seus opressores: "Sabe (o povo) que a liberdade não é uma

coisa abstrata, uma mera aspiração moral. Sabe que a

liberdade política só será completa quando a nação se sentir

livre da opressão econômica". Cita Volta Redonda, Petrobrás e

a futura Eletrobrás; a luta pela liberdade começa com a

exploração de nossas riquezas. E conclui: "Enfrentamos, com

serenidade, os perigos, como Tiradentes os enfrentou, em sua

época, até o sacrifício extremo. E temos fé que, desta vez,

os traidores, - ninguém se iluda - levarão a pior" (44). O

editorial é acompanhado por ilustrações do enforcamento de

Tiradentes: altivo, parece desafiar seus algozes. Os

nacionalistas se inclinam, portanto, para uma interpretação

8

da figura de Tiradentes que se afasta da de Cristo, pelo

menos do Cristo "adocicado da maioria das representações"

(45).

No seu discurso em Ouro Preto, por ocasião do dia 21,

Vargas também associa Tiradentes e luta nacionalista:

"É ainda a mesma bandeira (a de Tiradentes) que estamos

empunhando na luta dos nossos dias pelos supremos

interesses do Brasil. Apenas não combatemos hoje a

tirania colonial e a prepotência da metrópole longínqua.

A luta dos nossos dias é a de um governo legitimamente

constituído, de base nacionalista e popular, contra a

mentalidade negativista, que descrê do nosso futuro, das

nossas possibilidades e reservas, da capacidade criadora

da nossa gente, enfim, que não acredita no Brasil" (46).

Os movimentos nacionalistas, na década decinqüenta,est_o

preocupados com a busca das origens. Há uma intenç_o de

reconstruir ideologicamente a naç_o. A construç_o simbólica

está a serviço de um fim:a luta antiimperialista. Os heróis

nacionais d_o sentido a essa luta. N_o se trata de simples

exaltaç_o da grandeza passada (47).

Os anos cinqüenta se apresentam como retomada da luta

nacionalista. A possibilidade e o fracasso os fazem anos de

afirmaç_o e crise, renascimento e morte.É um momento de

intensa busca dos sinais e símbolos que possam auxiliar no

enfrentamento dos desafios. Como disse Marx,é nesses momentos

que "os homens conjuram ansiosamente em seu auxílio os

espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os

gritos de guerra e as roupagens, a fim de apresentar-se nessa

linguagem emprestada" (48). Assim como os revolucionários de

1789, na França, vestiram-se no passado romano, os

nacionalistas dos anos cinqüenta foram buscar nos primórdios

da República, inspiração para seus símbolos.

Os nacionalistas acreditam em valores e perspectivas

para a sociedade que os fazem se preocupar com a construção

da identidade nacional. A valorização da identidade está

vinculada ao seu programa político de transformação. O poder

que a construção da auto-imagem positiva possui, ou seja, sua

8

potencialidade em acionar mudanças, é assim sintetizada por

Jurandir Freire Costa:

"A imagem que temos de nossa identidade

nacionalé uma espécie de profecia que seauto-realiza.

Quanto mais desmoralizamos nossa identidade, mais nos

convencemos de que somos cidadãos inviáveis e mais

contribuímos para convencer os outros de que nada

podemos fazer para mudar o status quo" (49).

1.3. A luta pelo monopólio estatal de energia

1.3.1. Petrobrás: "potencialização das nossas riquezas"

A criação da Petrobrás é a maior realização do

nacionalismo no Brasil. É mito de progressiva carga

simbólica, fortalecendo a intocabilidade do monopólio estatal

do petróleo, que se mantém inabalável mesmo em tempos de onda

privatizante, como os atuais. É realização de mais de trinta

anos de luta, considerando as tentativas de exploração por

particulares na década de vinte.

A produção historiográfica sobre o petróleo no Brasil,

embora razoável, ainda não contempla uma história da campanha

"o petróleo é nosso" (50). Gabriel Cohn, em Petróleo e

Nacionalismo, aborda a criação da Petrobrás a partir das

relações significativas entre os diversos grupos sociais

envolvidos no processo: técnicos, políticos e militares.

Gerson Moura, em A Campanha do Petróleo, elabora uma síntese

do tema, registrando com relevo a participação popular.

A mobilização popular teve início em 1947 com as célebres

conferências patrocinadas pelo Clube Militar, e atinge seu auge

em 1953, com a criação da Petrobrás. Nos limites desse

trabalho, a intenção é observar em linhas gerais como os

nacionalistas defenderam e ampliaram sua conquista.

Pode-se afirmar que a campanha "o petróleo é nosso" não

acabou na criação da empresa estatal. Prosseguiu em duas

frentes: na consolidação da empresa e na construção simbólica.

8

Gondin da Fonseca alerta para a necessidade de a

campanha em prol do monopólio estatal da energia (petróleo,

eletricidade e átomo) prosseguir. Reconhece estarem os

antinacionalistas "derrotados e sem prestígio na consciência

do povo", mas dispõem ainda de uma grande força:

"dispõem os antinacionalistas, por enquanto, de todas as

estações de rádio cariocas e paulistanas, que penetram

no país inteiro; de todas as tevês; e da imensa maioria

dos jornais. Três governadores de grandes unidades

federativas - Jânio Quadros, Ildo Meneghetti e Cordeiro

de Farias - confessam-se entreguistas rubros,

escrachados, patriotas da Standard, entusiastas de "o

petróleo é deles" (51). (Esta crônica foi escrita,

provavelmente, em 1956.)

O projeto da Petrobrás foi debatido quase linha por

linha, no Congresso. Primeiramente analiso a repercussão

na opinião pública; a seguir, detenho-me no papel das

organizações nacionalistas e dos partidos na sua

criação.

Apenas dois jornais da chamada grande imprensa

defenderam o monopólio estatal do petróleo: a Última Hora e

o Diário de Notícias. No Diário de Notícias escreviam

defendendo apaixonadamente o monopólio do petróleo, Rafael

Correia de Oliveira e Osvaldo Borba. Barbosa Lima Sobrinho

afirma que suas crônicas não deixaram de influir no

posicionamento da UDN sobre o tema (52). Na Última Hora,

além da posição editoral clara do seu proprietário (53),

Francisco de Assis Barbosa mantém em coluna diária

incessante defesa do monopólio.

Os diversos depoimentos de sindicalistas alertando

para as conseqüências da demora na criação da Petrobrás,

demonstram a sua importância para os trabalhadores. No

setor de transportes, a preocupação com o possível

racionamento de gasolina e outros subprodutos petrolíferos

teria repercussões no transporte de massa. Em entrevista ao

jornal Última Hora, o diretor da Central do Brasil afirma:

8

"Aqui, por exemplo a Central do Brasil terá que sofrer

as suas duras conseqüências. Diminuindo a

circulação dos veículos auto-motivos coletivos, nossas

composições seriam mais procuradas pela população. E

sinceramente, não haveria capacidade para satisfazer a

circulação dos passageiros. Incentivar, portanto os

transportes - e para isso o petróleo entra em cena com

a sua grande parcela - é um dos imperativos do

momento. E a Petrobrás vem ao encontro dessa

emergência" (54).

O presidente do Sindicato dos Condutores Autônomos de

Veículos alerta para a ameaça de desemprego, caso o

racionamento de combustíveis e óleos lubrificantes seja

imposto. Diz que 150.000 trabalhadores podem ser atingidos.

O sindicalista diz que "há falta de patriotismo da parte dos

parlamentares que estão bloqueando o projeto do ouro negro."

Propõe a unidade de todos os grupos, partidos políticos,

"todas as correntes democráticas", para resolver o problema

do petróleo (55).

Procura-se, também, popularizar a discussão recorrendo

ao rádio. No programa Problemas e Soluções, transmitido pela

Rede Continental, aborda-se a questão do petróleo. O programa

reproduz trechos de estudiosos do assunto, como Roy Nash,

Essad Bey, Anton Zischlka, Luiz Fisher e Monteiro Lobato.

Esses autores ressaltam, por um lado, o potencial petrolífero

do Brasil, seja, por outro, as vicissitudes dos pioneiros na

exploração do petróleo no seu enfrentamento com os trustes do

petróleo: Standard Oil e a Royal Dutch & Shell (56).

No inicio da década de trinta os estudos realizados pelo

geólogo Vitor Oppenheim fortaleceram a tese da não-existência

de petróleo no subsolo brasileiro. Depois da abertura do

primeiro poço, em 1939, acrescente-se um novo elemento à

polêmica: quem teria as melhores condições de realizar sua

exploração - Estado ou a iniciativa privada ? (57). Em vista

disso a Última Hora mantém, durante o ano de 1953, constante

noticiário sobre a descoberta de novos poços. Assim,

apresenta argumento incontestável na defesa da existência e

viabilidade de sua exploração pelo Estado.

O início das perfurações do primeiro poço de petróleo do

Paraná é saudado pelo jornal. O engenheiro Plínio Catanhede,

presidente do CNP (Conselho Nacional de Petróleo), comunica

ao presidente Vargas a descoberta. O jornal registra que o

8

fato de companhias estrangeiras terem pesquisado e arrendado

terras neste estado é forte indício da existência de petróleo

(58). Em visita a poços petrolíferos da Bahia, o governador

Amaral Peixoto defende a participação de entidades privadas

de capital nacional na exploração, e ainda, "não só o Governo

como as firmas comerciais, deveriam ter o direito de

contratar com entidades estrangeiras em matéria de serviço"

(59). O governador Amaral Peixoto não era um nacionalista,

isto mostra que a peregrinação aos poços de petróleo seduzia

amplos setores. Em visita aos poços de Candeias e à refinaria

de Mataripe, Bahia, o General Juarez Távora, comandante da

Escola Superior de Guerra, afirma:

"Desde que o Governo encontre a solução política que

julgue ideal para a questão petrolífera, deveremos

apoiá-lo, intransigentemente, para que o mesmo execute a

obra" (60).

A questão já adquirira um nível tal de amadurecimento,

que mesmo setores não decididos pelo monopólio estatal do

petróleo já se inclinavam a apoiá-lo.

Nesta mesma visita, pode-se observar como o contato com

o petróleo, vê-lo jorrar, sujar as mãos no líquido que brota

da terra, adquire um tom de adesão à causa, de conversão.

Como a água do batismo, assinalando a conversão de novos

fiéis, o petróleo jorrando comprova a velha tese da

existência e seduz para a outra - a do monopólio estatal. O

general estava acompanhado de alunos da Escola, que

aplaudiram calorosamente seu discurso. O jornal detalha o

contato dos visitantes com o petróleo:

"A despeito de se tratar de um jorro simples, despido

de espetaculosidade, pois o C-50 (poço de petróleo)é

bombeado, foi indisfarçável a alegria e o entusiasmo que

contaminou a todos aqueles que apreciavam, pela primeira

vez, jorrar o petróleo brasileiro. Almirantes, generais,

brigadeiros, diplomatas, legisladores, enfim, todos os

membros da comitiva da ESG externaram a sua satisfação

ante o espetáculo que, para alguns, até então, estava no

campo da fantasia" (61).

8

Na Bahia, vários poços são inaugurados nesse ano, e em

dezembro, o engenheiro Plínio Catanhede comunica ao

presidente Vargas a descoberta de lençol petrolífero na

região do Rio Madeira, na Amazônia (62).

Poços e lençóis vão sendo descobertos. O líquido, enfim,

brotando do chão coroa a grande campanha: a primeira página

de Última Hora da edição que anunciou a fundação da Petrobrás

trazia a manchete: FUNDADA A PETROBRÁS. Abaixo uma grande

foto de Getúlio com as mãos banhadas de petróleo. Roberto

Silveira, vice- governador do Estado do Rio de Janeiro,

eleito em 1954, usa um archote iluminado com petróleo da

Bahia, nas manifestações em que participa (63).

Popularizar a campanha é um desafio constante. Após a

criação da Petrobrás, não se trata mais de provar a

existência do petróleo, mas sim da viabilidade da empresa, de

nacionalizar a importação do petróleo bruto e a distribuição.

Quanto à popularização da campanha, o Diretório Central dos

Estudantes da Universidade do Brasil decide recomendar aos

acadêmicos "que erguessem torres simbólicas de petróleo". A

nota distribuída aos jornais e nas escolas superiores, em

janeiro de 1955, afirma: "refletindo os mais puros

sentimentos patrióticos da mocidade acadêmica" e "a despeito

de todas as calúnias, da deturpação de fatos e dados visando

mistificar a opinião pública nacional e criar um clima de

ceticismo e descrença em nossas possibilidades", "os

estudantes resolveram intensificar a campanha pela tese

nacionalista na exploração do petróleo, juntamente com todo o

Povo brasileiro" (64). Atente-se para o fato de que os

estudantes dizem intensificar a campanha, não a consideravam,

de forma alguma, encerrada.

O jornal O Semanário passa, a partir de então, a

noticiar as inaugurações das torres simbólicas. No Rio de

Janeiro, o Centro Acadêmico Cândido de Oliveira inaugura, em

início de julho de 1957, torre de petróleo na Cinelândia,

"que pretende ser marco da luta pela emancipação econômica do

povo brasileiro", segundo o jornal (65). Em Alagoas, durante

uma semana nacionalista, várias autoridades locais e

representantes da Frente Nacionalista Brasileira discursam

junto a uma torre de petróleo (66). Em várias cidades do

Brasil são inauguradas torres de petróleo. Em São Paulo, é

inaugurada, no Largo de São Francisco, no dia 9 de maio de

1958, no quinto aniversário do início dos trabalhos da

Petrobrás.

8

Na cidade de São João da Boa Vista, São Paulo, por

ocasião de um comício de Carlos Lacerda, os nacionalistas

colocaram faixa de 4 metros na torre simbólica e mandaram

imprimir e distribuíram milhares de cópias da carta-

testamento (67).

A nota recomendava, também, a realização de debates e

exposições. Em janeiro de 1958, a UNE (União Nacional dos

Estudantes) organiza exposição de produtos nacionais na

Cinelândia, com stands e exibição de filmes ao ar livre.

Participam a Petrobrás, a Companhia Siderúrgica Nacional, a

Fábrica Nacional de Motores, o Instituto Nacional do Mate, o

Instituto Brasileiro do Café e o Departamento de Caça e Pesca

(68).

Ao encerrar esta seção, duas notas: primeira, a campanha

da tese do monopólio estatal do petróleo prossegue após a

criação da Petrobrás, e se desdobra para outras

reivindicações, como procuro mostrar a seguir. Segunda nota:

a historiografia sobre o petróleo procura dissociar a criação

da Petrobrás dos interesses populares. Luciano Martins afirma

que o estabelecimento do monopólio nada acrescentou à vida

das classes populares, "le monopole d'Etat sur le pétrole ne

peut pas être considéré comme une `revendication des masses',

y compris parce qu'il n'apporte rien à leur situation" (69).

O movimento não só foi massivo e influente (Barbosa Lima

Sobrinho atribui a aprovação do monopólio, em boa parte, à

influência que a campanha nacionalista teve na eleição de

deputados e senadores comprometidos com sua causa) (70), como

procurou formas de popularização de suas idéias nas torres

simbólicas de petróleo, nos debates, exposiç•es e na imprensa

nacionalista.

1.3.2. Eletrobrás: obstáculos maiores

"A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero". Assim

Vargas se refere à questão da energia elétrica na sua carta-

testamento.

Durante a Segunda Guerra, a impossibilidade de

importação tornou obsoletos e antieconômicos os equipamentos

das empresas de energia elétrica. Por outro lado, o Estado

mantinha controle sobre as tarifas. Desta forma, não tinham,

os grupos estrangeiros, controladores do setor -- Light e

8

American Power, interesse em fazer investimentos capazes de

assegurar o fornecimento de energia elétrica que o país

precisava (71).

O grupo canadense-estadunidense Brazilian Traction Light

& Power Co. Ltda era responsável pelo suprimento de energia

elétrica no eixo Rio-São Paulo, e o grupo estadunidense

American & Foreign Power C. (AMFORP) atuava em outras áreas

vitais, como o interior dos estados de São Paulo e do Rio de

Janeiro, Porto Alegre, Pelotas, Salvador, Recife, Natal e

Vitória (72).

Em 1951, os estudos da Comissão Mista Brasil-Estados

Unidos destacaram o déficit energético brasileiro; decide,

então, o governo, confiar à Assessoria Econômica da

Presidência a tarefa de equacionar o problema da energia

elétrica. Em dezembro de 1953, Vargas denuncia o obsoletismo

do sistema de concessões, responsabilizando-o pelo atraso no

desenvolvimento industrial do país. A Última Hora apresenta

as repercussões do discurso do presidente. Destaca a opinião

do líder da corrente nacionalista (embora a Frente

Parlamentar Nacionalista não tivesse sido criada, nota-se a

existência de alguma articulação entre os deputados

nacionalistas) Lúcio Bittencourt(PTB-MG). O deputado teme

pela segurança do governo, "uma vez que a ação corruptora dos

trustes é tão poderosa que não será impossível se conseguir a

repetição do golpe de 45, no qual se vê nítido o dedo

americano" (73).

Vargas envia projetos ao Congresso criando o Plano

Nacional de Eletrificação e a Eletrobrás. Em 31 de agosto de

1954, já estava constituído o Fundo Federal da Eletrificação.

Criado pela Lei nº 2308, este fundo foi gerido pelo BNDE até

a criação da Eletrobrás (1962) (74).

O principal obstáculo à criação da Eletrobrás era o fato

de que um grupo estrangeiro que dominava o processo de

produção de energia elétrica nos principais centros

econômicos do país -- a Light, possuía uma influência muito

grande dentro do governo Vargas (75) e no Congresso. O

ministro da Fazenda de Vargas, Oswaldo Aranha, e a cúpula do

BNDE também puseram obstáculo à criação da empresa (76).

O projeto permanece anos no Senado. No governo JK, a

política adotada contraria a orientação de Vargas. Barbosa

Lima Sobrinho diz que o governo Kubitschek destruiu a

primeira parte do plano de eletrificação, desviando recursos

8

nacionais, oriundos da taxa de eletrificação, para a

indústria estrangeira (Pirelli e Standard Eletric). Da mesma

forma se beneficiou a Light e a Bond and Share (ligada à

AMFORP), "prestando-se o Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico a esse trabalho de desnacionalização... Furnas é um

capítulo vergonhoso de entreguismo, quando deveria ser uma

obra nacional, como Três Marias ou Paulo Afonso" (77). Osny

Duarte Pereira faz as mesmas críticas. Cita Lucas Lopes, que

nesse período (1957) era presidente do BNDE e define assim a

política de JK para o setor:

"O governo vem apoiando financeiramente a indústria

privada de eletricidade e remeteu ao Congresso um

projeto de lei que propõe medidas capazes de

restabelecer o interesse dos capitais privados nesse

setor... O governo concorda com a criação da

Eletrobrás, mas não pretende fazer dela um órgão de

monopólio estatal..."

Osny Pereira afirma que o governo constrói usinas para a

Light e Bond and Share distribuírem energia elétrica.Cita

Franklin D. Roosevelt, presidente dos Estados Unidos, fonte

absolutamente fora de suspeição, buscando argumentos: "Nunca,

enquanto eu for presidente dos Estados Unidos, o Governo

Federal abandonará sua soberania sobre as fontes de energia"

(78).

Osny Duarte Pereira afirma que foram introduzidas

emendas que desvirtuaram completamente o projeto original da

Eletrobrás. Refere-se, sobremodo, à emenda que permite

desmembrar centrais elétricas da Eletrobrás para entregá-las

aos trustes.

Comenta sobre a possibilidade de JK reverter esse

quadro:

"Ainda bem, que o Sr. Presidente da República é

permeável a esses sentimentos populares. Eis porque

ainda se espera um gesto de defesa da soberania

nacional, vetando o farrapo de Eletrobrás que transita

no Senado" (79).

8

A criação da Eletrobrás não despertou nenhuma campanha

popular, como a "o petróleo é nosso". Gondin da Fonseca chega

a falar da campanha pelo monopólio estatal da energia

(incluindo eletricidade e átomo) mas isto não é suficiente

para popularizá- la. Ela foi quase, exclusivamente, uma

batalha decidida no âmbito da burocracia.

Há apenas um momento em que essa luta encontra apoio das

massas, fazendo lembrar as concentraç•es populares da

campanha "o petróleo é nosso". Foi quando o governador do Rio

Grande do Sul, Leonel Brizola, encampou a Companhia de

Energia Elétrica Rio- Grandense, em março de 1959, pelo preço

simbólico de um cruzeiro. A Companhia era controlada pela

Bond and Share (holding filiada à AMFORP, que, por sua vez,

era ligada ao grupo Morgan). No ato da encampação, o

Secretário de Viação mandou hastear a bandeira nacional no

edifício, sob os aplausos da multidão reunida em frente ao

prédio (80).

A luta contra a Companhia vinha desde o governo Valter

Jobim. Peritos do governo do Rio Grande do Sul fizeram

tombamento dos bens da companhia e constataram a existência

de lucros estrondosos. Como explicar o serviço de péssima

qualidade dispensado ao povo riograndense ?

Barbosa Lima Sobrinho apóia a atitude do governador:

"Se o Brasil não tem o direito de se libertar dessa

situação e se, no estabelecer a indenização devida aos

mercadores de energia, não puder invalidar ou deixar de

lado as espertezas e as fraudes de contabilidade com que

se constituiu, à custa dos usuários, isto é, dos

brasileiros, um patrimônio fictício, fruto de lucros

exorbitantes dissimulados numa escrita de hábeis

extorsionários, seria então, o caso de revogar a lei do

13 de maio e de voltar para o tronco e as senzalas..."

(81).

Como se vê, trata-se de enfrentamento muito mais

complexo do que o do petróleo. Os grupos estrangeiros já

estavam implantados internamente, com apoio em diversos

setores da sociedade e da administração. O governador Leonel

8

Brizola, por sua atitude ousada, começa a se destacar como

líder nacionalista.

O deputado Euzébio Rocha, autor do substitutivo ao

projeto que criou a Petrobrás, tentara, sem sucesso, encampar

a Light. Na sua justificativa, o deputado "faz referências à

capacidade realizadora dos brasileiros, que certos grupos

procuram diminuir justamente para deixar nossas principais

fontes de riquezas exploradas por trustes estrangeiros". Cita

Volta Redonda, como exemplo de que a iniciativa estatal pode

e deve, em certos setores, se transformar em instrumentos do

progresso do país." A seguir associa industrialização,

distribuição e consumo de energia elétrica. Cita o presidente

dos Estados Unidos no período de 1933-1945, Franklin

Roosevelt, transformado em ideólogo do nacionalismo

brasileiro:

"a energia elétrica é alguma coisa mais do que

necessidade. Ela é o verdadeiro sangue vital de uma

nação industrial, sangue que deve correr abundantemente

e sem interrupção, se se quiser conservar o bem estar

social e a energia de uma nação" (82).

O projeto é aprovado na Câmara em 1960. Em 11 de junho

de 1962, João Goulart cria a Centrais Elétricas Brasileiras -

Eletrobrás. Mas a consolidação da empresa levará anos,

somente nos governos militares ela tem início.

1.3.3. Átomo: a autonomia adiada

Por que a questão nuclear não merece nenhuma referência

de Getúlio, na carta-testamento ? O presidente não quer

comentar a grande derrota de sua política nacionalista. Em

1952 e 1954, o Brasil assinara com os Estados Unidos acordos

extremamente prejudiciais a uma política autônoma no setor

(83).

O acordo de 1952 implicava a exportação de monazita e

óxido de tório (o tório, extraído da monazita, junto com o

8

urânio, é um dos minerais usados na produção de energia

nuclear) sem as compensações específicas pleiteadas pelo

Conselho Nacional de Pesquisas (CNP). Este princípio, das

compensações específicas, fora incorporado à nossa política

para o setor, em 1951, quando da criação do CNP. Significa

que o país deveria barganhar a venda de minerais atômicos

para obter informações técnicas e equipamentos. Outro

princípio também fora incorporado: haveria liberdade de

relações com outros povos, além de nosso tradicional aliado

da América do Norte. No acordo de 1952, estes dois princípios

foram derrubados.

O período é de certa tensão nas relações Brasil-Estados

Unidos. O Acordo Militar Brasil-Estados Unidos, assinado em

1952, determinava a venda de nossos minerais atômicos "in

natura" e a baixos preços, além de alinhamento incondicional

a qualquer ação de guerra dos EUA (84). Outro fator de tensão

foi a solicitação da Organização das Nações Unidas de envio

de tropas brasileiras para combater na Coréia.

A política de desenvolvimento autônomo para a energia

atômica, por ser secreta, não pôde contar com a mobilização

popular para sua sustentação. A virtual participação na

guerra, no entanto, foi repudiada com manifestações populares

no Rio de Janeiro e São Paulo (85). Embora o ministro das

Relações Exteriores de Vargas, João Neves da Fontoura, negue,

as pressões do governo dos Estados Unidos para que o Brasil

envie tropas à Coréia exigiriam atitude mais firme que a

adotada pelo ministro (86). O Brasil acaba aceitando a

situação criada pelos Estados Unidos: ou participação na

guerra ou recuo na política nuclear autônoma.

Em 1954, novo recuo: reclamando do não cumprimento, por

parte dos Estados Unidos, de parte do acordo que implicava a

compra de sais de terras raras, o governo brasileiro assina

novo acordo, trocando areias monazíticas, derivados de terras

raras e tório por trigo (87).

O principal idealizador da orientação autônoma para a

política atômica foi o Almirante Álvaro Alberto, fundador e

primeiro presidente do CNP. Álvaro Alberto procurou

estabelecer relações com outros países, já que os Estados

Unidos só se dispunham a fornecer informações e tecnologias

ultrapassadas:

"desde que iniciamos nossas conversações com a Comissão

de Energia Atômica dos EUA, foi-nos invariavelmente

8

afirmada a impossibilidade de qualquer forma

interessante de cooperação no terreno da tecnologia de

reatores, a não ser o que já fora

`desclassificado'..."(88)

Em 1953, Álvaro Alberto obtém, na França, uma usina de

produção de urânio puro; e na Alemanha, uma usina de

separação de isótopos. Com estas duas usinas o Brasil estaria

em condições de iniciar sua indústria de energia atômica .

Álvaro Alberto afirma que agiu em sintonia com o presidente

Vargas:

"Não foi somente em face das dificuldades de ordem legal

para as quais apelavam os membros da Comissão de Energia

Atômica dos EUA, que eu tomei essa providência... Tomei

essa providência por determinação do Presidente da

República, Sr. Getúlio Vargas, que foi um grande

patriota, um homem de cultura extremamente ampla e

percuciente (89).

Contudo, nada disso se concretizou. O governo Café

Filho, sob pressão de funcionários do governo dos Estados

Unidos, altera a política atômica em dois pontos essenciais:

retira do CNP o papel de negociar externamente e concede

tratamento preferencial aos EUA. Procura, também,

desestabilizar a atuação de Álvaro Alberto à frente do CNP,

levando-o a se exonerar do cargo em 2 de março de 1955 (89).

O caráter secreto dessa política torna difícil seu

trato junto às massas. Aí está uma razão para o silêncio de

Vargas. No entanto, o saldo negativo da política de seu

governo no setor, embora a opinião do presidente fosse

nacionalista, como atesta Álvaro Alberto, também o leva a

silenciar. Mas porque a opinião do presidente não se impõe ?

Os setores contrários à política autônoma estavam com

posições chaves na administração. A Orquima Estabelecimentos

Industriais Reunidos, empresa que monopolizava a maioria das

jazidas litorâneas de monazita e se opunha à referida

política, tinha um ministro no governo, o empresário paulista

Horácio Láfer, Ministro da Fazenda até 1953. Como a Light

tinha em Alzira Vargas do Amaral Peixoto sua representante

(90), na política nuclear encontra-se o governo Vargas também

8

enfraquecido internamente e não conta com a possibilidade de

um movimento de massas.

Até agora procurei mostrar como o apoio popular era

vital à afirmação do programa nacionalista. Onde foi possível

mobilizar amplas massas o programa foi vitorioso (caso da

Petrobrás). Nos outros setores (energia elétrica e energia

atômica) os projetos foram adiados. O projeto vitorioso,

ancorado numa tradição simbólica anterior, por sua vez funda

novos significados, como demonstram as inaugurações das

torres simbólicas, no período, e o lema "o petróleo é nosso",

até hoje. Apesar do adiamento da autonomia nos setores

elétrico e nuclear, este primeiro momento assinala

fortalecimento do nacionalismo. A associação nacionalismo e

política de massas, à medida que se desenvolve, cria tensões

e faz o programa aprofundar-se em aspectos essenciais, como

procurarei mostrar a seguir.

8

NOTAS

(01) MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O Petróleo é Nosso. A

luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.

Petrópolis, Vozes, 1983, p. 399.

(02) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo Ditadura Militar.

Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis, Vozes,

1988, pp. 192-193.

(03) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa. Entrevista

concedida ao autor, 1992.

(04) Última Hora, 31/12/53.

(05) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo à Ditadura

Militar. Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis,

Vozes, 1988, p. 134.

(05a) Op. cit., p.137.

(06) Maria Celina S. D'Araújo em O Segundo Governo Vargas

(1951- 1954), Rio de Janeiro, Zahar, 1982, pp. 100-102,

afirma que o nacionalismo de Vargas não teria força para

conter a entrada do capital estrangeiro, ora Vargas não

pretende conter a entrada do capital estrangeiro, ele

quer controlá-lo.

(07) SAES, Décio. Classe média e política no Brasil. In:

FAUSTO, Boris. (org.) História Geral da Civilização

Brasileira, tomo III, vol. 10, São Paulo, Bertrand,

1986, p. 404.

(08) D'ARAÚJO, Maria Celina S. op. cit., p. 26.

(09) SODRÉ, Nelson Werneck. op. cit., pp. 134-138.

(10) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e Política

Nacionalista de Desenvolvimento - de Getúlio a Jango.

Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, p. 64.

8

(11) CARVALHO, Maria Isabel Valladão de. Ideologia e discurso

político: os projetos governamentais no período de 45 a

64. São Paulo, Tese de Doutorado, USP, 1989, p. 62. A

autora tem como elemento de análise as mensagens

presidenciais enviadas anualmente ao Congresso.

(12) IANNI, Octavio. O Colapso do Populismo no Brasil. 4ª ed.

Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978, pp. 66-68.

(13) D'ARAÚJO, Maria Celina S. Op. cit., p. 168.

(14) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de (coord.).

Fundação Getúlio Vargas. Centro de Pesquisa e

Documentação de História Contemporânea. Dicionário

Histórico-Biográfico Brasileiro: 1930-1983. Rio de

Janeiro, Ed. Forense Universitária: FGV/CPDOC.

Financiamento de Estudos e Projetos. FINEP, 1984. pp.

3.390-3.394, vol. 4. Ver também WAINER, Samuel. Minha

Razão de Viver. Rio de Janeiro, Record, pp. 189-204.

(15) WAINER, Samuel. Op. cit., p. 199.

(16) Rubem Fonseca, em seu romance Agosto corrobora essa

versão do bilhete afirmando que ele é falso. Na verdade,

o major Fitipaldi, ajudante-de-ordens de Getúlio,

encontrara anotações da carta de cunho mais pessoal que

o presidente preparava, juntamente com a outra,

divulgada amplamente. Cf. SILVA, Hélio. 1954: um tiro no

coração. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978,

p. 291, e PEIXOTO, Alzira Vargas do Amaral. Entrevista

Jornal do Brasil, 28/7/91.

(17) LIMA, Valentina da Rocha. (Coord.) Getúlio: uma história

oral. Rio de Janeiro, Record, 1986, p. 262.

(18) Esta foi uma expressão usada por Vargas em conversa com

Euzébio Rocha, questionado pelo deputado sobre a

situação, respondera: "Você não sabe como os

árabes punem os assassinos ?" Cf. LIMA, Valentina da

Rocha. Op. cit., p. 266.

(19) PEIXOTO, Alzira Vargas do Amaral. Op. cit.

(20) O Semanário, nº 93, de 15 a 21/01/58.

8

(21) SILVA, Hélio. Op. cit., pp. 280-281.

(22) Para uma síntese da construção mítica de Vargas no

período do Estado Novo ver LENHARO, Alcir. Sacralização

da política. São Paulo, Papirus/Ed. da Unicamp,1986, e

VELLOSO, Mônica Pimenta. Cultura e poder político, In:

Estado Novo, Ideologia e Poder, Rio de Janeiro, 1982.

(23) SILVA, Benedito. (coord. geral) Dicionário deCiências

Sociais. 2º ed., Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio

Vargas, 1987, pp. 768-769.

(24) WAINER, Samuel. Op. cit., p. 206.

(25) GIRARDET, Raoul. Mitos e mitologias políticas. Trad. de

Maria Lúcia Machado. Rio de Janeiro, Cia. das Letras,

1987, p. 191.

(26) Idem, op. cit., p. 174.

(27) SILVA, Hélio. Op. cit., p. 348.

(28) Idem, ibidem, p. 268.

(29) Ibidem, p. 348.

(30) Ibidem, p. 347.

(31) Ibidem, p. 347.

(32) Cadernos do Nosso Tempo, nº 3, jan-mar. 1955,

IBESP,

pp. 21-22.

(33) Op. cit., p. 22.

(34) SILVA, Hélio. Op. cit., pp. 364-365.

(35) O Semanário, nº 79, de 10 a 17/10/57.

(36) O Semanário, nº 90, de 26 a 02/10/57.

8

(37) ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional.

2ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1986, p. 135.

(38) HOBSBAWN, Eric. A Produção em Massa de Tradições:

Europa, 1879 a 1914. In: HOBSBAWN, E. e RANGER, T.

(org.) A invenção das tradições. Rio de Janeiro, Paz e

Terra, 1984, p. 284.

(39) RODRIGUES, José Honório. Aspirações nacionais. 2ª ed.,

São Paulo, Fulgor, 1965, p. 19-20.

(40) José Murilo de Carvalho, em A formação das almas, Rio de

Janeiro, Cia. das Letras, 1990, analisa a batalha

historiográfica em torno da figura de Tiradentes.

(41) CASTORIADIS, Cornelius. A instituição imaginária da

sociedade. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986, p. 147.

(42) O Semanário, nº 264, de 14 a 21/07/61.

(43) SILVA, Benedito. Op. cit., pp. 1081 e 1082.

(44) Última Hora, 22/04/54.

(45) CARVALHO, José Murilo de. Op. cit., p. 65.

(46) Última Hora, 22/04/54.

(47) Raoul Girardet critica o que chama de movimentos

nacionalisteiros, obcecados por esta busca das origens.

Parece-me que essa busca das origens, a mitificação dos

heróis, não é em si, politicamente, condenável. O

questionamento deve se dar em torno dos valores

embutidos na reconstrução simbólica. O Tiradentes

altivo, mesmo subversivo, se vincula à causa da

independência nacional.

Cf. GIRARDET, R. Op. cit., p. 104.

(48) MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. In: Os

pensadores. 2ª ed., São Paulo, Abril Cultural, 1978, p.

329.

8

(49) COSTA, Jurandir Freire. Ser ou não ser brasileiros. In

Super-interessante, nº 5, novembro de 1991, São Paulo,

Editora Abril, p. 35.

(50) COHN, Gabriel. Petróleo e nacionalismo. São Paulo,

Difel, 1968.

(51) FONSECA, Gondin da. Senhor Deus dos Desgraçados! São

Paulo, Fulgor, 1958 (?), p. 175.

(52) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa.Entrevista

concedida ao autor, 1992.

(53) SamuelWainer é alvo de críticas por parte de alguns

nacionalistas. Oswaldo Costa desconfia do seu

nacionalismo em vista de ligaç•es com João Neves da

Fontoura, ministro das Relaç•es Exteriores de Vargas até

1953, considerado entreguistapor aqueles. O jornal,

também destoa de seus pares quando apóia o Acordo

Militar Brasil-Estados Unidos. Cf. PASSOS, Gabriel

(org.) Antologia nacionalista: Brasileiros contra o

Brasil. São Paulo, Fulgor, 1958, p. 189, e _ltima Hora,

de 12/01/53, 15/01/53, 24/03/53 e 1º/06/53.

(54) _ltima Hora, 25/02/53.

(55) _ltima Hora, 20/02/53.

(56) _ltima Hora, 1º/09/53.

(57) Segundo Gondin da Fonseca, Monteiro Lobato (1882-1948)

se op•em ao programa nacionalista ao defender a

participação da iniciativa privada nacional na

exploração do petróleo. Para o jornalista, não seria

mais possível repetiraexperiência americana, quando

centenas de empresas se formaram para atuar no

setor,pois o grau de monopolização já atingira, no

início do século XX índices bastantes elevados.Cf.

FONSECA, Gondin da, Que sabe você sobre petróleo. Op.

cit., paffim.

(58) _ltima Hora, 08/07/53.

8

(59) _ltima Hora, 10/07/53.

(60) _ltima Hora, 17/07/53.

(61) _ltima Hora, 17/07/53.

(62) _ltima Hora, 17/07/53.

(63) O Semanário, nº 99, de 6 a 12/03/58.

(64) MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O Petróleo é Nosso. A

luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.

Petrópolis, Vozes, 1983, p. 408.

(65) O Semanário, nº 65, de 9 a 15/07/57.

(66) O Semanário, nº 80, de 17 a 24/10/57.

(67) O Semanário, nº 88, de 12 a 19/12/57.

(68) O Semanário, nº 88, de 12 a 19/12/57.

(69) MARTINS,Luciano. Pouvoir et développment économique--

formation etévolution des structures politiques

auBrésil. Paris, Antropus, 1976, pp. 348-349.

(70) LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa. Op. cit.

(71) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e a Política

Nacionalista de Desenvolvimento -- de Getúlio a Jango.

Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, pp. 46-47.

(72) ABREU, Alzira Alves de e BELOCH, Israel. Op. cit., pp.

1164- 1166, vol. 2.

(73) _ltima Hora, 21/12/53.

(74) VIANNA, Cibilis da Rocha. Op. cit., pp. 46-47.

(75) Osny Duarte Pereira comenta que o fato de Alzira Vargas

do Amaral Peixoto ser advogada da Light criava

dificuldades para a atuação de Vargas. Cf. entrevista

concedida ao autor.

8

(76) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos

nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização

Brasileira, 1963, p. 90.

(77) PEREIRA, Osny D. Estudos Nacionalistas: as cadeias do

imperialismo. 2ª ed., Rio de Janeiro, Conquista, 1962.

(2 vol.), pp. 79-82.

(78) PEREIRA, Osny. Op. cit., p. 185.

(79) Idem, ibidem.

(80) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Estudos Nacionalistas. Rio de

Janeiro, Civilização Brasileira, 1981, p. 37.

(81) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Op. cit., p. 42.

(82) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Op. cit., p.

(83) SALLES, Dagoberto. As razões do nacionalismo. São Paulo,

Fulgor, 1959, pp. 88 e 94-95. O livro traz o relatório

da Comissão Parlamentar de Inquérito da energia atômica

instaurada em 1956 no Congresso Nacional. Boa parte dos

dados apresentados nessa seção foram extraídos desse

relatório, de autoria do deputado Dagoberto Salles, do

PSD de São Paulo.

(84) SALLES, Dagoberto. Op. cit., pp. 94-95.

(85) Última Hora, 12/01/53, 15/02/53 e 24/03/53.

(86) Cf. SALLES, Dagoberto. As razões do nacionalismo. São

Paulo, Fulgor, 1959, pp. 77-78.

(87) SALLES, Dagoberto. Ibidem, p. 98-99.

(88) Idem, ibidem, pp. 98-99.

(89) SALLES, Dagoberto. Op. cit., p.107.

8

(90) Cf. nota 75 do presente trabalho.

8

CAPµTULO II

A FORMAÇão DA OPINIão

Farei um cântico aestes

Estados a fim de que

nenhum Estado fique

sujeito a outro em

circunstância alguma..."

Walt

Whitman

A morte de Getúlio exige dos nacionalistas

aperfeiçoamento na sua ação junto às massas. Era necessário

conquistá-las para levar adiante seus propósitos políticos. O

debate é intenso e parte de seus protagonistas, como

assinalei no capítulo anterior, toma emprestado do passado as

roupagens que lhes vão conferir maior brilho e força.

Marilena Chauí diz que o leitor dos discursos, livros,

revistas e panfletos produzidos nesse período, tem a

impressão de ter sido "empurrado até Paris, levado aos clubes

jacobinos e girondinos, à Assembléia Nacional, à Bastilha --

a retórica brasileira era a imitação com pitadas de marxismo

e de desenvolvimentismo cepalino, da Revolução Francesa"

(01).Chauí encontra no uso de express•es como "vontade do

povo" e os "magnos interesses da nação", a evidência desse

recurso ao quadro conceitual originário do Iluminismo.

8

Os autores nacionalistas fazem questão de frisar que se

dirigem ao povo, "às amplas massas da população" (02).

Aguinaldo Marques explicita, assim, os objetivos de seu

livro:

"Que os brasileiros de todas as profiss•es, desde o

maishumilde operário até o mais altamente colocado na

pirâmidecultural e social... de todasastendências

políticas e religiosas, mas unidos pelo sentimento comum

de amorà Pátria e a seu povo, leiam-no e meditem" (03).

Sérgio Magalhães, deputado pelo PTB/DF, não está

preocupado em discutir com "economistas, administradores e

parlamentares, mas sobretudo na esperança de desvendar para

um grande contingente de brasileiros... a trama interna da

atual conjuntura econômico-financeira e suas perspectivas"

(04). Não se dirigem a uma classe social em particular, mas

ao conjunto dos cidadãos -- ao povo.

A análise do discurso oficial relativo ao período tem

sido extremamente crítica quanto ao uso de conceitos como

"povo" ou "trabalhador do Brasil". Afirma-se que, desta

forma, eliminar-se- ía diferenciaç•es essenciais, como as

diferenças de classes sociais, estabelecendo-se que a idéia

de "povo" resistiria a qualquer tentativa de definição

científica (05).

O conceito de povo se vincula ao exercício da

cidadania, constituindo-se daqueles conscientes, ou

virtualmente conscientes, de seus direitos, encontrando-se

assim o direito de autodeterminação dos povos no palco das

lutas pela ampliação da cidadania (06).

Para os nacionalistas, todos os cidadãos estão,

potencialmente, inclinados a se constituirem em povo. Gondin

da Fonseca revela uma inquebrantável fé no poder da

racionalidade. Acredita que não raro o posicionamento

antinacionalista é fruto da ignorância. Diz que não duvida da

honestidade de Juscelino, mas duvida de sua inteligência

(refere-se à mensagem que o presidente enviara reavaliando os

ativos das empresas de energia elétrica). O jornalista

comenta assim o papel dos nacionalistas:

"Esmagar a ignorância é, na realidade,o dever detodo

8

nacionalista. Indivíduos há que não podem ser

recuperados, porque estão velhos demais para mudar de

rumo. Outros podem todavia" (07).

Portanto, estão dispostos até mesmo a convencer aqueles

a que consideram "entreguistas".

2.1. JK: que nacionalismo ?

A presença de Juscelino na cena política nacional, a

partir de 1956, cria um novo referencial. Depois de Vargas,

responsável por ter legado uma forte herança nacionalista,

quais seriam as definiç•es do novo presidente nesse campo ?

"O nacionalismo que eu adoto é aquele que se baseia no

nosso desenvolvimento" (08). JK faz questão de frisar que seu

nacionalismo não se confunde com "outros". Assumindo o

discurso nacionalista está interessado em assegurar apoio na

sociedade, mobilizada pelo nacionalismo. JK afirma que o seu

nacionalismo é racional, em oposição ao emocional dos seus

adversários: "Não somos isolacionistas, não somos xenófobos,

não somos prisioneiros de nenhuma atitude mesquinha de inveja

e de nenhum sentimento estreito de temor ou rancor ante

outros povos, ante qualquer outro povo..." (09). O

nacionalismo de JK, ao enfatizar o crescimento econômico,

dilui o aspecto da relação com as naç•es mais poderosas.

Miriam Limoeiro Cardoso afirma que:

"esta visão obscurece as contradiç•es, pois o que estava

em jogo no debate político do período não eram as

relaç•es com os `outros povos' em geral, tratava-se de

discussão de relaç•es específicas de dependência a

determinado tipo de naç•es estrangeiras, especialmente

através do intercâmbio de capital, discussão essa

centrada, na época, na remessa de lucros para o exterior

e na `sangria' que isto representava para a economia

nacional" (10).

A industrialização é a solução para todos os males da

nação. Esta visão da industrialização a qualquer preço,

fazendo concess•es ao capital estrangeiro em pontos como

mineração, indústria automobilística e a cessão do território

de Fernando de Noronha para os Estados Unidos, para que

construa ali uma base de mísseis teleguiados, faz com que os

nacionalistas façam-lhe pesadas restriç•es. Nelson Werneck

Sodré afirma que o governo JK está quase integralmente

subordinado ao imperialismo (11).

8

Oswaldo Costa, jornalista proprietário de O Semanário,

comenta entrevista de JK à Última Hora, em que o presidente,

questionado sobre que rumos teria o monopólio estatal do

petróleo no seu governo, limitara-se a dizer que a Petrobrás

era lei e, portanto, cabia-lhe cumprir a lei. O jornalista

argumenta que não basta que o chefe de Estado afirme que é

pela Constituição, "porque há uma Constituição - tinha graça

se não o estivesse - mas se é constitucional. Isso é o que

importa. Ser pela Petrobrás `porque a Petrobrás é lei', meu

caro presidente, é confessar-se, na prática, `contra a

Petrobrás'" (12).

Há um setor do nacionalismo que não se alinha numa

postura crítica a JK. No ISEB ocorre uma nítida divisão:

Hélio Jaguaribe e Roland Corbisier mantêm-se fiéis à

orientação do presidente. Osny Duarte Pereira, Nelson Werneck

Sodré e Álvaro Vieira Pinto manifestarão seu desacordo diante

do "entreguismo" ou da "baixa taxa de consciência

nacionalista" do governo JK (13). No Congresso não se

encontra essa nitidez. Diante do avanço da indústria

automobilística estrangeira alguns deputados admitem

resignados que "não há outra saída" (14). Outros, como Josué

de Castro (PTB/PE), procuram defender o governo JK da

acusação de dirigismo econômico excessivo, vinda,

ironicamente, dos setores antinacionalistas. Segundo o

deputado, estes setores pretendem dominar a petroquímica, e

desta forma fazer do petróleo substituto do café, isto é,

"simples produto primário, para ser transformado no interesse

desses grupos internacionais e não no da economia do País". O

resultado da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre energia

atômica também é favorável à política de Juscelino no setor.

Mas mesmo esse apoio no Congresso é descendente no final de

seu governo, pois afasta-se da Ala Moça do PSD, de onde vinha

o apoio de pessedistas nacionalistas (15), coincidindo com o

amadurecimento do PTB nessas questões.

O termo desenvolvimentismo é de uso corrente a partir

dos anos cinqüenta, entre vários economistas que vêem, na

ajuda externa e na injeção de capitais estrangeiros, as

condições necessárias ao desenvolvimento econômico (16).

Juscelino foi o responsável por sua divulgação entre nós,

associando o termo às suas realizações. Miriam Limoeiro

Cardoso define desenvolvimentismo como, simplesmente, a

ideologia do crescimento econômico a qualquer preço,

"excluídos unicamente os meios que contrariam ideologicamente

a ordem vigente" (17). Esta ênfase na necessidade de capitais

externos distingüe o desenvolvimentismo do nacionalismo. Os

nacionalistas adotarão a tese "o capital se faz em casa"

(18). O desenvolvimentismo tratava de capturar a mística do

8

nacionalismo para implementar políticas que se afastavam dos

princípios de defesa da autonomia e independência nacional. O

aumento do nível de emprego e os aspectos "modernizantes"

trazidos pela instalação da indústria automobilística e de

eletrodomésticos criaram o clima de otimismo traduzido nessa

construção da memória coletiva sobre o período, sintetizada

pela expressão "anos dourados". Para tanto, contribuíram as

realizaç•es imediatas do governo, mesmo com implicaç•es

graves para o chamado programa nacionalista, e a

personalidade do presidente, "efusiva, espontânea e aberta"

(19), responsável por transmitir a crença nas possibilidades

do país a amplos setores da sociedade. E Brasília talvez seja

a prova maior que o presidente tenha apresentado dessa

potencialidade e o símbolo novo a contribuir para a

construção mítica de um tempo a ser resgatado.

2.2. O nacionalismo nos partidos

De que forma este debate se refletiu no sistema político

? A campanha "o petróleo é nosso" é um exemplo de que é

possível atingir amplos setores da população com teses

nacionalistas. Criada a Petrobrás, novos desafios surgem e

paira no ar uma interrogação sobre o que entendem as massas

de nacionalismo. Pesquisa de opinião pública divulgada na

época, aponta que apenas 7% da população urbana e 1% da rural

conhecem o nacionalismo e o adotam como ideologia. A maioria

dos "nacionalistas declarados" tem educação universitária e é

oriunda da classe média residente nas grandes cidades (20).

Osny Duarte Pereira apresenta outro dado para mostrar a

"amplitude da consciência nacionalista". Na Delegacia de

Ordem Política e Social havia, em 1958, 800.000 fichas de

cidadãos tidos como comunistas. Os dados são significativos

já que os adversários dos monopólios são ali considerados

comunistas (21).

A forte penetração do nacionalismo nos setores médios

leva os partidos a considerarem de forma cuidadosa seu

posicionamento frente a quest•es respaldadas em tal programa.

O caso da UDN é ilustrativo. Este partido abriga notórias

figuras contrárias ao nacionalismo, como Carlos Lacerda,

Juarez Távora e outros. No entanto, em 1957, segundo Gabriel

Passos (UDN/MG), teria um programa com "perfeita linha

nacionalista" (22). E na discussão sobre a criação da

Petrobrás, a UDN, por intermédio do deputado Bilac Pinto,

apresenta projeto favorável ao monopólio. Como já afirmei, a

atuação de jornalistas ligados a UDN, em defesa do monopólio

estatal, muito contribuiu para esse posicionamento do partido

(23). Como a UDN, o PSD também tinha sua ala reformista, a

8

chamada Ala Moça, que via de regra assumia posiç•es

nacionalistas.

Barbosa Lima Sobrinho, no entanto, relativiza esse

nacionalismo: na aprovação do projeto que criou a Petrobrás,

a UDN e o PSD compareceram profundamente desfalcados na

votação de uma emenda essencial -- a que se referia à

participação de empresas estrangeiras no trabalho de

pesquisa:

PSD ....... 42%

UDN ....... 37%

PTB ....... 54%

PR ....... 81%

PSP ....... 29%

Fonte: LIMA SOBRINHO, B. Estudos nacionalistas, p. 145.

O PTB é o partido que tem maior definição quanto ao

nacionalismo. Esta afirmação não tem como base o programa (o

da UDN também era nacionalista), mas sim o comportamento de

seus parlamentares. As eleiç•es de 1954 e 1958 fizeram surgir

parlamentares dispostos a imprimir atuação comprometida com

nacionalismo e reformas sociais, em particular a

reforma agrária (24). O PTB, especialmente, vai se beneficiar

com esta tendência: 60% dos parlamentares que fundam a Frente

Parlamentar Nacionalista, em 1956, pertencem a esta

agremiação (25).

Na XI Convenção Nacional, instalada em 1º de maio de

1959, o PTB aprova várias moç•es, entre outras, a condenação

à internacionalização da Amazônia. O Plano de Ação Política,

também aprovado na convenção, contém vários ítens

nacionalistas (26). As moç•es aprovadas na XII Convenção,

realizada em 1960, também possuem essa preocupação:

"proibição da exportação demanganês,proibiçãodas

nacionalizaç•es suspeitas", como aquelas propostas para

a Standard Oil e Light and Power, comotambém, `proibição

ao capital estrangeiro de atuar no setor farmacêutico e

defesa da Petrobrás'" (27).

8

O PTB era o partido com maior definição quanto ao

nacionalismo, mas havia entre as outras agremiações uma certa

concordância em aspectos importantes.

A forma como se desenvolveu o debate em torno do projeto

de criação da Petrobrás apresenta sinais de que se busca a

negociação. Euzébio Rocha (PTB/SP) apresenta seu substitutivo

antes a Vargas, que o apóia. Fica claro que a apresentação

pelo Executivo de projeto tão moderado fazia parte de uma

estratégia para facilitar sua aprovação.

Na concepção de Maria do Carmo Campello de Souza, a

aprovação do substitutivo de Euzébio Rocha é uma grande

exceção. A regra é o afastamento dos partidos de formulações

sobre o econômico. Reconhece, inicialmente, as peculiaridades

que assumem as questões econômico-financeiras no processo

legislativo. A matéria econômico-financeira é freqüentemente

indivisível no essencial. A autora compara com uma lei de

diretrizes e bases para a educação, que poderá ser

desmembrada em vários itens, votados separadamente. Tal

caráter retira as decisões do campo econômico-financeiro da

esfera político-partidária, situando-as no âmbito da

burocracia estatal, contribuindo, desta forma, para exagerar-

se o caráter de autonomia dos órgãos técnicos do governo

(28).

Como já afirmei, as eleições de 1954 e 1958 trouxeram

para o Congresso deputados comprometidos com o programa

nacionalista. Analisando os resultados das eleições de 1958

(legislativo e executivo estaduais), O Semanário reconhece na

eleição de Chagas Rodrigues (UDN/PTB) no Piauí; Cid Sampaio

(Coligação Oposições Unidas UDN/PTB/PSP/PTN/PSB), em

Pernambuco; Roberto da Silveira (PTB/PDC/UDN/PSB), no Estado

do Rio; Gilberto Mestrinho (PTB/PST/PSB), no Amazonas; e

Leonel Brizola (PTB), no Rio Grande do Sul, importante

vitória das "forças populares e nacionalistas". Para o

legislativo federal as votações de Fernando Ferrari (PTB), no

Rio Grande do Sul; e Josué de Castro (PTB), em Pernambuco,

são destacadas. Ferrari suplantava Carlos Lacerda como o

deputado mais votado do país, e Josué de Castro obtivera a

maior votação para deputado até agora registrada em todo o

Nordeste. Segundo o artigo, "o pleito de 3 de outubro

transgrediu os limites do puro e simples partidarismo para

transformar-se num divisor de águas: de um lado, o

nacionalismo; de outro, o entreguismo" (29).

8

A eleição de Juscelino pode ser vista como parte da

tendência assinalada anteriormente. Juscelino Kubitschek

vence as eleições de 1955 beneficiado pelo fortalecimento do

PSD e PTB após a morte de Getúlio (30). A herança getulista

incorpora-se aos partidos ligados à sua trajetória. Segundo

Amaral Peixoto, Vargas via com simpatia o nome de Juscelino.

Vencidas as resistências no interior de seu partido (há no

PSD um grupo disposto a impedir o prosseguimento da política

de Vargas), JK lança-se à campanha (31).

Convêm mencionar que a ajuda eleitoral do PTB e do PC

foi significativa. A pequena diferença entre Juscelino e

Juarez Távora deve ser debitada a estes dois partidos. Note-

se que as eleições de presidente e vice-presidente eram

separadas e João Goulart obteve mais votos que o seu

companheiro de chapa.

Outro elemento que ajudou a campanha de Juscelino foi a

apresentação de programa definindo suas propostas para

demandas da sociedade.

Já em 1960 a herança getulista se encontra razoavelmente

diluída, pois Juscelino não quer influir diretamente na

sucessão; tem os olhos voltados para 1965, e dentro de sua

estratégia o ideal é que surja um candidato de "união

nacional" (32).

O PTB, na sua XI Convenção Nacional, cogita lançar João

Goulart candidato a presidente. Jango vê com cautela tal

proposta e a convenção termina aprovando resolução que

condiciona o apoio do Partido à aceitação do programa

reformista. E este candidato será o Marechal Lott,

transformado no candidato do movimento nacionalista. A

campanha de Lott foi fomentada pela Ala Moça do PSD (grupo

que pregava a renovação do PSD, aproximando-o do programa

nacionalista). A Frente Parlamentar Nacionalista e a fração

novembrista, formada por civis e militares que participaram

ou apoiaram o movimento de 11 de novembro (33).

As campanhas eleitorais são vistas pelos nacionalistas,

independente do resultado, com otimismo. Acreditam que

tiveram êxito na campanha presidencial de 1960, quando foi

eleito Jânio Quadros:

8

"o Nacionalismo ganhou em meses o que ele levaria anos,

talvez, para conquistar. Hoje, ele é, inegavelmente, a

grande força - poderosa e incontrastável - com que os

partidos e os candidatos terão que contar daqui por

diante, nos prélios eleitorais. Milhões e milhões de

brasileiros não apenas tomaram conhecimento de seu

programa como se solidarizaram com ele" (34).

O próprio candidato das forças que se alinham na defesa

do capital estrangeiro diz ser seu objetivo

"disciplinar a remessa de rendimentos para o exterior,

que se processa de forma imoderada, irracional e

intermitente e se constitui num fator permanente de

descapitalização e sangria de divisas" (35).

Osny Duarte Pereira afirma que a defesa do nacionalismo

virou condição para que o parlamentar seja eleito (36).

O espaço dos partidos é pequeno para o movimento

nacionalista. Desde a campanha "o petróleo é nosso" dois

instrumentos têm sido usados pelos nacionalistas na batalha

pela conquista de adesão: organizaç•es não-partidárias, cujo

exemplo pioneiro é o Centro de Estudos e Defesa do Petróleo,

criado em 1948 e a imprensa, desempenhando, desde então,

papel de destaque.

Os nacionalistas insistem em frisar que não estão numa

campanha "somente sentimental". As forças que combatem são

poderosas -- os trustes e monopólios. Desta forma é

necessário razão e conhecimento da realidade brasileira (37).

Estamos de volta, na expressão de Marilena Chauí, aos clubes

jacobinos.

Adotam uma concepção de ideologia próxima, nesse momento

de conquista de ades•es, de concepção de mundo. Para

integrar as diferentes classes sociais no seu projeto

apresentam a promessa de atender os anseios dos setores

8

sociais abrigados na unidade nação. Isto significa que as

classes sociais podem ampliar a noção de ideologia, de

programa sócio-político; torna-se concepção de mundo. Esta

ampliação se dá para que suas idéias adquiram a forma de

universalidade e possam "apresentá-las como sendo as únicas

racionais, as únicas universalmente válidas" (38). No

movimento nacionalista há aqueles que vêem a questão nacional

apenas como elemento de uma concepção de mundo mais ampla --

os marxistas. Há outros que adotam o nacionalismo como a

concepção de mundo -- os nacionalistas "stricto sensu".

2.3. As organizaç•es nacionalistas: estrutura e ação

Durante o governo JK cresce a convicção de que é preciso

organizar o movimento nacionalista, de forma que pressione os

centros de decisão. Guerreiro Ramos assim se refere a esta

necessidade:

"o movimento nacional ora em organização deveria tornar-

se uma instituição militante, de ação contínua, com o

objetivo de dar a base popular necessária para a

realização do desenvolvimento econômico" (39).

Este desafio é aceito pelo movimento. De 1954 a 1962

foram criadas nada menos que treze organizaç•es destinadas a

realizar tal objetivo no território nacional.

A análise sumária da composição social de suas

diretorias reafirma a presença maciça da classe média: delas

participam, preponderantemente, militares, professores e

estudantes universitários, parlamentares e outros

profissionais de nível superior, como jornalistas e

advogados. O jornalista Clóvis Marques descreve a rotina de

trabalho de um desses grupos: inicialmente se organizam em

equipes de estudo que elaboram relatórios e os exp•em ao

grupo. Esses resultados são arquivados e tornam-se fonte de

consulta freqüente. O grupo costuma fornecer oradores para

comícios, preletores para sindicatos, orientadores de cursos

para centros acadêmicos, colaboração para jornais etc. O

autor levanta a possibilidade de que grupos assim organizados

ampliassem suas atividades, passando a assessorar

parlamentares, organizaç•es de industriais, sindicais etc. O

ISEB, organização criada por intelectuais nacionalistas, em

8

1955, chegou a ser considerada pela Frente Parlamentar

Nacionalista como seu órgão de assessoria, já que os partidos

tinham pouca formulação e não agiam de forma coordenada na

hora de discutir quest•es polêmicas (40).

Ao lado da atividade de reflexão e elaboração de estudos

sobre os chamados problemas nacionais, onde se destaquem os

debates e cursos realizados pelo ISEB e as atividades

desenvolvidas pelo CPC (Centro Popular de Cultura),há o

trabalho de mobilização de massas dos comícios e passeatas.

Em 1957, a Frente Nacionalista Brasileira, criada em

1956, por estudantes vinculados à UNE, preparou a "Marcha ao

Catete", em que entregou ao presidente Juscelino memorial com

suas reivindicações de baixa do custo de vida, defesa da

Petrobrás e independência econômica. O Semanário afirma que:

"os entreguistas tudo fizeram para que a manifestação

não se realizasse. Os jornais divulgaram que a marcha

tinha sido suspensa, faixas pregadas pela UNE,

convocando para o ato, foram arrancadas. Os sindicatos

operários foram advertidos pela Delegacia de Ordem

Política e Social de que "não tinham licença para

comparecer à demonstração dos estudantes" (41).

A manifestação contou com um desfile de carros

nacionais, faixas, cartazes e discursos aludiam à Petrobrás,

à indústria automobilística nacional e condenavam a entrega

do território de Fernando de Noronha aos Estados Unidos (42).

Em resposta à manifestação, JK assegura que:

"O petróleo brasileiro será sempre por nós explorado!

Defenderemos os minerais atômicos, as fontes de energia

em prol do Brasil. Defenderemos palmo a palmo nosso

território Juro que o governo defenderá

intransigentemente o Brasil na realização de sua obra

econômica" (43).

Outra expressiva manifestação de massas foi organizada

pela Frente de Novembro, organização criada em março de 1956,

congregando militares, petebistas, sindicalistas, comunistas

8

e parlamentares, com o objetivo de dar conteúdo político ao

movimento que assegurara a normalidade constitucional em 11

de novembro de 1955 (44). A manifestação, realizada em frente

ao Ministério da Guerra, contou com a presença de 15 mil

pessoas. As declarações do presidente da Frente, Coronel Nemo

Canabarro, alusivas à divisão nas Forças Armadas, têm como

conseqüência sua prisão e o fechamento da organização (45).

A Liga de Emancipação Nacional, fundada em 1954, por

membros do Centro de Estudos e Defesa do Petróleo, também

encontra

dificuldades no relacionamento com o governo JK, sendo

extinta em junho de 1956.

A presença de comunistas nessas organizaç•es serviu, em

alguns casos, para justificar seu fechamento, mas é exagero

pensar que as controlassem (46). Essas organizaç•es contam

com a expressiva participação de nacionalistas, que deixam

claro a intenção de se situarem acima das polarizaç•es entre

capitalismo e socialismo (47). O deputado Neiva Moreira

(PSP/MA), membro da Frente Parlamentar Nacionalista, procura

desfazer essa corrente acusação dos adversários do

nacionalismo, de que este teria se convertido em instrumento

do comunismo. Diz que o próprio Partido Comunista alertara

seus membros para o perigo do desvio nacionalista (48).

Observa-se que os nacionalistas fogem de uma etiqueta

muito restrita que revele associação com o comunismo. Assim,

pretendem evitar a partidarização do movimento. Neiva Moreira

observa ainda que a fundação de um partido nacionalista

criaria dificuldades eliminando da luta "forças muito

atuantes que já se entrosam nas organizaç•es políticas

existentes" (49).

As manifestaç•es de massa e sua relação com Estado,

permeada por tentativas de diálogo e conflitos que, em duas

ocasi•es, terminam com o silenciamento do discurso

reivindicativo, apresentam o nacionalismo emergindo fora do

Estado (50). Este dado precisa ser considerado na tentativa

de compreensão do debate ideológico do Brasil dos anos

cinqüenta, orientado até hoje por uma historiografia

desatenta para as manifestaç•es da sociedade civil.

8

Intensificando a ofensiva nacionalista, a partir de

1957, O Semanário inicia a campanha "Compre artigos

nacionais". Argumenta que boa parte dos lucros obtidos por

empresas estrangeiras são remetidos para fora do país via

pagamento de royalty. O jornalista afirma que paga-se essa

taxa, simplesmente, para se "usar determinada marca, como se

você fizesse muita questão disso". Arremata dizendo: "E a

indústria nacional não fica nada a dever à indústria

estrangeira, na qualidade de seus produtos. Em alguns casos,

até a qualidade é superior." O jornal promete publicar,

progressivamente, quais produtos industriais pertencem à

indústria de capital estrangeiro e multinacional (52) (os

grifos são do jornalista).

Disp•e-se o jornal a enfrentar o chamado complexo

colonial que tende a valorizar o que é estrangeiro. Barbosa

Lima Sobrinho diz que este sentimento existe em todas as ex-

colônias. No Brasil não existiria um sentimento profundo de

independência nacional: "entre nós ainda há um complexo

colonial, contra o qual precisamos lutar" (53). Por outro

lado, a impetuosidade do império em demonstrar seu poder é

vista pelo nacionalismo tanto como complexo de inferioridade,

resultado da "luta contra as dúvidas íntimas, de que ainda

não se libertou, como pode ser a expansão de uma vaidade, que

ainda não se acostumou de todo com as posiç•es conquistadas"

(54).

Intervindo na polêmica entre Gabriel Passos, deputado

pela UDN/MG e Jânio Quadros, na ocasião deputado pelo PTB/PN,

que atacava a construção da estrada Belém-Brasília, não

vendo sentido na construção de uma estrada no meio do mato,

chamando-a de "caminho de onças", imediatamente O Semanário

responde, investindo o animal de características valorizadas

na concepção do jornal, como "resistência ao agressor", "amor

à liberdade". Em tom de ironia, elege a onça símbolo do

nacionalismo, "melhor símbolo, portanto, não pode ser

encontrado para nossa luta do que esse nobre e belo animal,

rápido no ataque, encarniçado da defesa, corajoso, resoluto,

indomável." E concluiu: "A onça é nossa! E vem aí para

engolir os trustes estrangeiros, os entreguistas, os

traficantes de influência, os negocistas... (55).

A marcha desse debate aponta a consolidação do

nacionalismo como centro da polarização ideológica. No

governo JK chega-se ao auge desse processo, com o surgimento

de um novo personagem central, depois de Vargas, -- JK -- e

uma resposta à radicalização do nacionalismo -- o

desenvolvimentismo.

8

2.4. A nova marcha para oeste

"... só a cidade moderna oferece ao espírito humano um

ambiente onde ele pode ter consciência de si mesmo."

(Hegel)

"Os homens não são feitos para ser amontoados em

formigueiros.Quanto mais se juntam, mais se corrompem.

As cidades são o abismo da espécie humana."

(Rosseau)

2.4.1. Plano de Metas: o Estado no planejamento

A decisão de construir Brasília é atribuída ao acaso de

um comício em Goiás, no meio da campanha presidencial.

Questionado por um cidadão sobre sua decisão de cumprir a

Constituição (a Carta de 1891 estabelecia a transferência da

capital), o então candidato a presidente, Juscelino

Kubitschek, assim respondeu:

"Acabode prometer que cumprirei, na íntegra, a

Constituição, e não vejo razão para ignorar esse

dispositivo.Durantemeu qüinqüênio,farei a mudançada sede

do Governo e construirei a nova capital" (56).

O programa de governo, no entanto, já era obra bem

pensada, e foi apresentado no decorrer da campanha: era o que

passou a se chamar, no governo, Plano de Metas, sendo

Brasília eleita como a meta-síntese.

O Plano de Metas nasce sem vínculos maiores com os

partidos. A equipe de técnicos que elaborou o Plano foi

chefiada por Lucas Lopes, do PSD de Minas Gerais e antigo

colaborador de Kubitschek, e contou com a presença de membros

da assessoria econômica de Vargas (57). As inspiraç•es

primeiras do Plano partiram das análises do grupo CEPAL -

BNDE (Comissão Econômica para a América Latina da Organização

das Naç•es Unidas e Banco Nacional do Desenvolvimento

Econômico). Constituía-se de 31 metas, distribuídas em seis

grandes grupos: energia, transportes, alimentação, indústrias

de base, educação, e a meta-síntese: Brasília.

8

A grande inovação do Plano de Metas consistiu na

ampliação da racionalidade do sistema administrativo. O Plano

tinha uma visão integrada do conjunto da economia e pretendia

planejar de forma consistente o processo de substituição de

importaç•es. O controle do processo estava garantido com a

criação dos órgãos de administração paralela, instrumentos

mais ágeis, diferentes da tradicional máquina administrativa

(58).

A abertura ao capital estrangeiro e concess•es às

corporaç•es transnacionais são consideradas atitudes

condenáveis do ponto de vista nacionalista. No entanto, JK

consegue, de certa forma, neutralizar a oposição no

Congresso. No debate sobre a instalação da indústria

automobilística no Brasil, o deputado Dagoberto Salles

(PSD/SP), membro da Frente Parlamentar Nacionalista,

reconhece que deve-se apoiar sua instalação porque "não há

outra saída" (59). Barbosa Lima Sobrinho sustenta que havia

uma possibilidade de certa autonomia nessa área com o

fortalecimento da Fábrica Nacional de Motores (60).

Desde o governo Vargas há o projeto de construção de uma

indústria automobilística nacional. Em 1953, a Comissão

Nacional de Desenvolvimento Industrial já estabelecera a

proibição de importação de veículos montados (61). Este

projeto estaria sendo inviabilizado com a má administração da

FNM. O deputado Ortiz Borges (PTB/RS), da Frente Parlamentar

Nacionalista, apresenta, em 1963, projeto de lei

estabelecendo o controle governamental sobre a produção e os

preços da indústria automobilística. O projeto tem como

objetivo corrigir distorç•es dessa indústria e fortalecer a

Fábrica Nacional de Motores (62). No entanto, no governo JK,

assistimos ao enfraquecimento da capacidade decisória do

Congresso e uma certa perplexidade da FPN (63). Os

nacionalistas fora do Parlamento parecem acreditar que é

possível industrializar-se recorrendo a recursos técnicos e

equipamentos estrangeiros, e, ainda, que esta indústria pode

ser genuinamente nacional. Para ressaltar a importância do

controle nesse intercâmbio, Caio Prado Júnior lembra que os

primeiros grandes empreendimentos industriais na União

Soviética foram realizados pelos trustes. A Ford Motor

Company instalou a primeira indústria automobilistica e a

usina hidrelétrica de Dnieper foi construída pela firma

inglesa Metropolitan Vickers (64).

8

2.4.2. Brasília: meta-síntese e novo símbolo

Francisco Adolfo de Varnhagen, historiador e diplomata,

depois Visconde de Porto Seguro, é o responsável pela

divulgação contemporânea da idéia de construção de Brasília

(História Geral do Brasil, tomo II, 1834, p. 814) (65).

Varnhagem viaja ao interior do país para estudar as

possibilidades de colonização. Em 1877 escreve ao Ministério

da Agricultura louvando as condições propícias encontradas

(66) para a construção da nova capital.

Brasília situa-se, portanto, na onda de reformas

racionalizantes que atingiu, no final do século XIX e início

do século XX, cidades com Paris, Viena, São Petersburgo e Rio

de Janeiro. Belo Horizonte e Brasília representam o auge da

onda, pois trata-se não apenas de reformar, mas de se

construir novas cidades (67). Essas modificações na estrutura

espacial representam o esforço de racionalidade em altíssimo

grau: toma o Estado a decisão de reordenar o território para

melhor assegurar sua ação sobre a sociedade.

A defesa da soberania nacional talvez seja o argumento

mais consolidado para justificar a transferência da capital -

- a defesa da soberania, ao lado da defesa de um espaço

racionalizado e higienizado para o exercício do poder. O Rio

de Janeiro era freqüentemente identificado na imagem negativa

da desordem e luxúria. O nacionalista J. R. Vasconcelos

associa Rio de Janeiro ao "gozo mundano". O contato com a

natureza será capaz de regenerar "os homens do governo e

funcionários", que em Brasília "estarão em contato com o

verdadeiro Brasil, o Brasil dos cerrados, dos sertões, das

florestas, da natureza agreste que precisa ser transformada"

(68). O Rio de Janeiro representa a "cultura colonial e

litorânea" (69). Nesta concepção, as reformas de Pereira

Passos, realizadas no início do século, parecem ter sido

insuficientes para dotá-lo da racionalidade requerida. Celso

Furtado afirma que a conquista desse imenso território,

8

possibilitada pela construção de Brasília, significa romper

com as fronteiras que a economia colonial nos legou (70).

Já a defesa da soberania situa-se na "marcha para o

oeste": um de nossos primeiros cronistas já alertara para a

nociva tendência de "permanecermos como caranguejos aferrados

ao litoral" (71). O litoral, o oceano, é considerado fator

dispersivo e cosmopolita, o nacionalista luso-brasileiro Leão

Cunha, citando Malheiro Dias, afirma:

"foium prodígio `haver conseguido no contacto

desnacionalizador, cosmopolita do oceano' fundar e

desenvolver... vivaz e resistente nacionalismo nessa

fímbria de praias'... Brasília é mais uma bandeira.A

última, a mais espetacular, a mais futurante bandeira

lusíada" (72).

A "marcha para o oeste" constitui esse sonho, até então

sempre adiado, de reviver as bandeiras, agora ocupando

efetivamente as terras conquistadas na primeira expansão:

"graças à construção de Brasília começou de fato no Brasil a

realização do velho sonho da "marcha para oeste", levando a

civilização ao recôndito de regi•es que até há pouco eram

gigantescos vazios demográficos, sobre os quais se voltavam

de quando em quando os apetites de potências imperialistas"

(73). A conquista do interior significa ir de encontro aos

"legítimos interesses nacionais", é também deixar de

privilegiar a população que vive no litoral (74). A oposição

à construção de Brasília só pode situar-se, portanto, "no

conservadorismo das minorias alienadas, voltadas para a

Europa" (75).

Outro artigo, publicado em O Semanário, situa a

construção de Brasília como marco na delimitação de nossas

fronteiras, ressaltando sua importância na garantia da

soberania do Brasil na Amazônia. A ameaça de perda de

soberania na Amazônia era antiga denúncia de nacionalistas

como Artur Bernades e Artur Cesar Ferreira Reis. Em palestra

pronunciada em Três Rios, Plínio de Abreu Ramos afirma que a

construção de Brasília vai garantir a conquista da "zona mais

rica e ainda inexplorada do terrítório nacional, e desta

forma "evitar a ameaça que pesou sobre a Amazônia durante o

governo Dutra" (76).

2.4.3. Entre o passado e o futuro

8

Brasília apresenta, na sua relação com o tempo, um

paradoxo. Ao mesmo tempo em que se vincula ao futuro, ao se

constituir símbolo do desenvolvimento, a principal inspiração

de sua concepção estética é a arquitetura colonial. Pietro

Maria Bardi afirma que Niemeyer projetou a Praça dos Três

Poderes com a mesma impetuosidade que distingüiu suas

experiências anteriores no desenvolvimento das formas do

Barroco Romântico. Bardi reconhece Niemeyer como legítimo

herdeiro dos mestres barrocos (77). A herança barroca também

está presente nas esculturas realizadas por Alfredo

Ceschiatti. Esta presença se faz notar no Anjo e nos

Evangelistas que o escultor situou dentro e fora da Catedral

de Brasília. Por sua vez, os vitrais de Marianne Peretti

incorporaram amplas curvas, substituindo a tradicional

rigidez dos vitrais tradicionais (78).

Niemeyer, comentando as soluç•es que deu para os

palácios da Praça dos Três Poderes e a praça no seu conjunto,

diz que suas formas puras e geométricas garantiram

características próprias e inéditas e "uma ligação com a

velha arquitetura do Brasil Colonial; não com a utilização

simplista de elementos daquela época, mas exprimindo a mesma

intensão plástica, o mesmo amor pelas curvas e pelas formas

ricas e apuradas que tão bem a caracterizaram" (79).

A construção de uma nova cidade, com tão alto grau de

vínculo a um projeto político, ressalta a indissociabilidade

entre espaço e tempo. Para Stamo Papadaki, a cidade deveria

tentar realizar o tempo-espaço antropocêntrico -- em oposição

ao labirinto das cidades não-planejadas. Brasília surge como

cidade que não se contenta somente em crescer; busca suas

raízes no passado remoto da humanidade. "Com seus galhos

abertos em direção ao futuro, é todo um presente sem fim, sem

interrupção; o futuro já teve início e o homem histórico,

sobrecarregado, poderia deter-se aí e descansar" (80).

No presente ela coincide com a construção da "grande

nação", com o "despertar da consciência nacional" (81).

Certamente ela é um dos principais responsáveis pelo clima de

otimismo que caracterizou aquele período. O país revelava

uma potencialidade que impressionava os observadores

estrangeiros:

8

"ver serem realizadas com tanto vigor as obras atuais de

Brasília, poucos meses depois de traçados os planos para

as mesmas, representa realmente, uma experiência

alentadora para qualquer europeu. No Velho Mundo não

estamos acostumados, absolutamente, à execução tão

rápida e tão confiante de uma idéia" (82).

Roland Corbisier vê a construção de Brasília implicada

na lógica do processo de emancipação econômica e cultural.

Se assim não fosse, o governo "não teria encontrado forças

para vencer os poderosos interesses, as forças da rotina e da

inércia, o pessimismo e o desalento que, desde o início

procuraram desacreditar e impedir a realização da meta-

síntese..." (83). Nas festas de inauguração de Brasília, o

presidente parece vingar-se desses adversários representando-

os na figura do velho que na encenação denominada A Alegoria

das Três Capitais representa a rotina:

"recortado sobre o modelo daquele velho do Restelo que,

no poema de Camões, se opõe à partida de Vasco da Gama,

é semelhante em tudo a muitos deputados e senadores

contra os quais tive que lutar, para fazer a

transferência da capital" (84).

O sonho da cidade democrática, no entanto, não se

realiza. As contradições do país também ali se reproduzem.

Depois de um ano de inaugurada, Nelson Werneck Sodré assim vê

sua evolução:

"Brasília é o Brasil, em que convizinham e antagonizam o

velho e o novo, o grande e o pequeno... Representa e

retrata o Brasil que estamos vivendo, por isto mesmo. E

por isto mesmo, depois de um ano, nela aparecem o

desemprego, a miséria, a favela. Ela avançou no tempo

como concretização política e como arte, mas não podia

avançar no tempo como solução social " (85).

Osny Duarte Pereira vê no aparecimento dessas

contradições, isto é, nos contrastes entre as condições

oferecidas no Plano Piloto e as favelas da periferia, o fator

8

de despertar para uma nova consciência: a consciência da

defesa dos interesses nacionais (86).

Do seu desenho arquitetônico, o traçado mais

popularizado talvez tenha sido o das colunas do Palácio da

Alvorada; aquelas colunas que dão a impressão de flutuarem

sob o chão. A forma das colunas foi largamente difundida em

marcas industriais, capas de revistas, livros, azulejos etc.

Parece aqui encontrar-se o signo que trouxe maior significado

à industrialização ocorrida no período. Vinhas de Queiroz faz

uma interessante análise do significado da palavra alvorada e

do desenho das colunas:

"possui(a palavra) conotações desenvolvimentistas, liga-se a

idéia de surgimento de um novoBrasil

industrializado.Essas concepç•es não serão sincrônicas

ao próprio desenho das curvas que caracterizam o

palácio ? Ou,demaneiramaisgeral, os edifícios de

Brasília não serão um signo de uma filosofia do

desenvolvimento e da própria história social do Brasil

contemporâneo ?" (87).

Outro visitante estrangeiro parece ter tido essa mesma

impressão: "Au cours de leur développement,les grandes

nations ont souvent leur symbole, et sans doute Brasília est-

elle un symbole de cette sorte" (88).

Tanto Brasília como a política de industrialização de JK

e a personalidade política do presidente se constróem com

base na ponte entre o velho e o novo. Niemeyer busca na curva

e na pureza das formas do Barroco o aspecto da tradição que

incorpora na nova arquitetura. A industrialização e a

conquista do interior se remetem ao tempo das bandeiras e do

velho sonho da "marcha para o oeste". Já a personalidade de

JK incorpora seu estilo moderno de administração e

reminiscências do folclore mineiro. São mitos e projetos que,

atualizados, funcionam como elemento coesionador de

intenç•es; em torno de Brasília, os nacionalistas se

unificaram. Não há nenhuma voz discordante; fazem-se

observaç•es para a inevitabilidade da reprodução das

contradiç•es sociais na nova capital, mas o apoio é unânime.

A oposição se limita aos seus tradicionais adversários.

8

NOTAS

(01) CHAUÍ, Marilena. Cultura e democracia: o discurso

competente e outras falas. 5ª ed., São Paulo, 1990, p.

107.

(02) BASBAUM, Leôncio. Caminhos brasileiros do

desenvolvimento. São Paulo, Fulgor, 1960, p. 8.

(03) MARQUES, Aguinaldo. Fundamentos do nacionalismo. São

Paulo, Fulgor, 1960, p. 14.

(04) MAGALHÃES, Sérgio. Problemas do desenvolvimento

econômico. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1960,

p. 4.

(05) Cf. nota nº 01 da introdução ao presente trabalho.

(06) SILVA, Benedito (coord. geral). Dicionário de Ciências

Sociais. 2ª ed., Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio

Vargas, 1987, pp. 953-955.

(07) O Semanário, nº 74, de 04 a 11/09/57.

(08) KUBITSCHEK, Juscelino. A marcha do amanhecer. São Paulo,

Bestseller, 1962, p. 114.

(09) JK - Discursos, 1956, 720, p. 234, apud Cardoso, Miriam

L. Ideologia do Desenvolvimento: JK-JQ. 2ª ed., Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1978, p. 196.

(10) CARDOSO, Miriam L. Op. cit., p. 196.

(11) SODRÉ, Nelson Werneck. Do Estado Novo à Ditadura

Militar; Memórias de um soldado. 2ª ed., Petrópolis,

Vozes, 1988, p. 214.

8

(12) O Semanário, nº 65, de 04 a 11/07/57.

(13) TOLEDO, Caio Navarro de. ISEB: Fábrica de Ideologias. 2ª

ed., São Paulo, °tica, 1982, p. 149.

(14) CASTRO, Josué de. Dirigismo econômico e

nacionalismo. (Discurso proferido na Câmara Federal em

20/07/57)Riode Janeiro, Imprensa Nacional, 1957, p. 11.

(15) MARAM, Sheldon. Op. cit., p. 107.

(16) BOUDON, Raymond. Ideologia. São Paulo, °tica, 1989, pp.

225- 226.

(17) CARDOSO, Miriam L. Op. cit., p. 421.

(18) Esta expressão foi cunhada por Ragnar Nurkse, Problemas

de Formación de Capital, México, 1955.

(19) MARAM, Sheldon. Op. cit., p. 101.

(20) RODRIGUES, José Honório. Aspiraç•es nacionais. 2ª ed.,

São Paulo, Fulgor, 1965, pp. 31-32.

(21) PEREIRA, Osny Duarte. Estudos Nacionalistas: as cadeias

do imperialismo no Brasil. 2ª ed., Rio de Janeiro,

Conquista, 1962. 2 vol., p. 264.

(22) O Semanário, de 12 a 19/12/57.

(23) Cf. capítulo I deste trabalho.

(24) DELGADO, Lucilia de A. Neves. PTB: Do Getúlio ao

Reformismo (1945-1964). São Paulo, Marco Zero, 1989, p.

210. Sobre o PTB ver Mendes, Marly Lucília."O Partido é

V. Exª!"... (A evolução do PTB, 1945-1964). Dissertação

de Mestrado, Rio de Janeiro, UFRJ, 1987, e D'Araújo,

Maria Celina Soares. A ilusão trabalhista. Tese de

Doutorado, Rio de Janeiro, IUPERJ, 1989.

8

(25) DELGADO, Lucilia de A. Neves. Op. cit., pp. 207-211 e

237- 240.

(26) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. Op. cit., pp. 181-182.

(27) Id. ibid. , p. 190.

(28) SOUZA, Maria do Carmo C. Campello de. Estado e partidos

políticos no Brasil (1930 a 1964). São Paulo, Alfa-

ômega, 1976, p. 56. Este trabalho analisa em que medida

o Estado condiciona o sistema partidário, concluindo

que este condicionamentoé caracterizado pela tendência

autoritáriae centralizadora do período anterior a

1945.Ver também, LIMA JR., Olavo Brasil de. Os partidos

políticos Brasileiros:a experiência federal e regional:

1945/64. Trad.de Gustavo Aronowick, Rio de Janeiro,

Ediç•es Graal, 1983.

(29) O Semanário, nº 131, de 16 a 23/10/58.

(30) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. O Segundo Governo Vargas

(1951-1954). Rio de Janeiro, Zahar, 1982, p. 169.

(31) MARAM, Sheldon. Juscelino Kubitschek e a política

presidencial. In: GOMES, Angela de Castro (org.) O

Brasil de JK. Rio de Janeiro, Ed. da Fundação Getúlio

Vargas/CPDOC, 1991, p. 105.

(32) MARAM, Seldon. Op. cit., p. 108. Este candidato de

"união nacional" seria Juracy Magalhães, líder da UDN.

(33) D'ARAÚJO, Maria Celina S. A ilusão trabalhista. O PTB de

1945-1965. Rio de Janeiro, Tese de Doutorado, IUPERJ,

1989, p. 187.

(34) O Semanário, nº 231, de 08 a 14/10/60.

(35) Jornal do Brasil, 20.09.60.

(36) PEREIRA, Osny Duarte. Op. cit., p. 228.

8

(37) Ver nesse sentido PASSOS, Gabriel de R. (org.Antologia

nacionalista. São Paulo, Fulgor, 1958, p. XII, e

MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá. O petróleo é nosso.

Petrópolis, Vozes, 1983, pp. 416-417, onde a autora

reproduz discurso do vice-governador Roberto da

Silveira.

(38) MARX, K. e ENGELS, F. A Ideologia Alem_ (Feuerbach). 8ª

ed. Trad.de José Carlos Bruni e Marco A. Nogueira. São

Paulo, Hucitec, 1991, p. 74.

(39) O Semanário, nº 65, de 09 a 15/07/57.

(40) MAGALHÃES, Sérgio. (depoimento, 1978) Rio deJaneiro,

FGV/CPDOC História Oral, 1983.

(41) O Semanário, nº 74, 04 a 11/09/57.

(42) Op. cit.

(43) Idem.

(44) Ibidem.

(45) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. Op. cit., pp. 163-165.

(46) Maria Victoria Benevides,O governo Kubitschek. 3ª ed.,

Rio de Janeiro, Paz e Terra, p. 98, exagera ao afirmar

que a Liga de Emancipação Nacional era uma organização

comunista. Na verdade, a autora parece endossar o

argumento do governo para o fechamento da entidade.

(47) O Semanário, nº 145, de 29/01 a 04/02/59.

(48) OSemanário, nº 73, de 28/08 a 04/09/57. Sobre as

formulaç•es dos comunistas no Brasil, sobre a questão

nacional, ver CARONE, Edgard. O PCB. São Paulo, Difel, 2

v, 1983, e Prado Jr., Caio. A Revolução Brasileira. 5ª

ed. São Paulo, Brasiliense, 1977.

8

(49) O Semanário, nº 73, de 28/08 a 04/09/57.

(50) Francisco Weffort só refere-se ao nacionalismo elaborado

pelo Estado, op. cit., p. 40.

(51) HOBSBAWN, Eric. A Era do Capital: 1848-1871. 4ª ed., Rio

de Janeiro, Paz e Terra, 1982, pp. 113-154.

(52) O Semanário, nº 70, de 09 a 16/08/57.

(53) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Estudos Nacionalistas. Rio de

Janeiro, Civilização Brasileira, 1981, p. 79.

(54) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos

nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,

1963 (Coleção Cadernos do Povo Brasileiro), p. 123. O

termo complexo colonial tem origem nas observações de

Frantz Fanon sobre as conseqüências da dominação

européia na África. Cf. FANON, Frantz. Os Condenados da

Terra. 2ª ed., Tradução de José L. de Melo. Rio de

Janeiro, Civilização Brasileira, 1979.

(55) O Semanário, nº 150, de 12 a 18/03/59.

(56) Nosso século 1945/1960.A era dos Partidos. São Paulo,

Abril Cultural, 1980, p. 207.

(57) LAFER, Celso. O planejamento no Brasil. Observações

sobre o Plano de Metas (1956-1961). In: MINDLIN, Betty

L. Planejamento.

(58) LAFER, Celso. Estado e sociedade no Brasil: problemas de

planejamento. In: Argumento, ano 1, nº 2, novembro de

1973, p. 41.

(59) MARTINS, Luciano. Pouvoir et développment économique

formation et évolution des structures politiques au

Brésil. Paris, Antropus, 1976, pp. 432-433.

(60) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Entrevista concedida ao

autor, fevereiro de 1992.

8

(61) Última Hora, 06/06/53.

(62) O Semanário, de 25/04 a 10/05/63.

(63) MARTINS, Luciano. Op. cit., pp. 432-433.

(64) PASSOS, Gabriel. (org.) Op. cit., pp. 60-61.

(65) VARNHAGEM, Francisco Adolfo. História Geral do Brasil.

Tomo 11, 1854, p. 814, citado por ALMEIDA, Theodoro

Figueira de. Brasília: a cidade histórica da América.

Riode Janeiro, s/ed., 1960, p. 19.

(66) FREIRE,José de Maring.A mudança da Capital é uma

aspiração Secular. Separata do nº VI da Revista do

Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Belo

Horizonte, Imprensa Oficial, 1959.

(67) BOMENY, Helena. Op. cit., pp. 148-151.

(68) VASCONCELOS, J. R. Brasília, peça de política

nacionalista. In: Revista Brasiliense, nº 14, nov/dez.

1957, pp. 174-175.

(69) CORBISIER, Roland. Op. cit., p. 54.

(70) FURTADO, Celso. A pré-revolução brasileira. Rio de

Janeiro, Fundo de Cultura, p. 115.

(71) SALVADOR, Frei Vicente do. História do Brasil (1500-

1627). 5ª ed., São Paulo, Melhoramentos, 1965.

(72) LEão, Cunha. Brasília: última bandeira. Lisboa, Separata

do nº 12 da revista Tempo Presente, 1960, pp. 5-10.

Alcir Lenharo, em Sacralização da Política, São Paulo,

Edit. Unicamp/Papirus, 1986, analisa a "cruzada" da

Marcha para Oeste, tanto no plano discursivo quanto das

justificativas administrativas. Para o autor, este tema

constitui um bom exemplo da fabricação de imagens

associadas à nação,ver particularmente pp. 53-74.

8

(73) Diário da Noite, 19/01/60.

(74) Brasil. Presidênciada República, Serviço de

documentação. Brasília e a opinião nacional, 1960. Rio

de Janeiro, Presidência... 1960, p. 25.

(75) RODRIGUES, José Honório. Op. cit., p. 162.

(76) O Semanário, nº 202, de 26/03 a 1º/04/60.

(77) BARDI, Pietro Maria. Profile of the New Brazilian Art.

Rio/São Paulo/Porto Alegre, Liv. Kosmos Editora, 1970,

pp. 44-52.

(78) MORAIS, Frederico. Livro-Módulo Governo do Distrito

Federal, s/d.

(79) NIEMEYER, Oscar. Minha experiência em Brasília. Riode

Janeiro, Vitória, 1961, pp. 49-53.

(80) PAPADAKI, Stamo. Brasília: um retorno. In: Módulo, nº

24, Rio de Janeiro, agosto de 1961, p. 3.

(81) CORBISIER, Roland. Brasília e o desenvolvimento

nacional. Rio de Janeiro, ISEB/MEC, 1960, passim.

(82) QUEIROZ, Maurício Vinhas de. Arquitetura e

desenvolvimento. In: Módulo, Rio de Janeiro (37), agosto

de 1964, p. 16.

(83) CORBISIER, Roland. Op. cit., p. 18.

(84) KUBITSCHEK, Juscelino. Por que construí Brasília. Rio de

Janeiro, Bloch, 1975, p. 302.

(85) O Semanário, nº 262, de 05 a 12/06/61.

(86) O Semanário, nº 247, de 31/01 a 07/02/61.

8

(87) QUEIROZ, Maurício Vinhas de. Op. cit., p. 19.

(88) MALRAUX, André. Brasília. Discurso proferido por

André

Malraux a 24/08/59. Rio de Janeiro, Presidência...

Serviço

de Documentação, 1959.

8

CAPµTULO III

MASSAS E PODER

"Existe um fato... da

máxima importânciana vida

pública no presente

momento. Esse fato é a

ascensãodasmassasao

completo poder social."

Ortega y

Gasset

3.1. A campanha pelas reformas de base

A campanha "o petróleo é nosso" permanecera até a década

de sessenta como o grande referencial de mobilização de

massas no Brasil. Fora inegavelmente popular e atingira seu

objetivo com a criação do monopólio estatal do petróleo,

criando ainda uma prática política presente nas várias

organizaç•es nacionalistas criadas a partir da segunda metade

dos anos cinqüenta. Progressivamente, essas organizaç•es vão

ampliando suas reivindicaç•es, configurando um amplo programa

nacionalista, que começa a encontrar definição também nas

formulaç•es partidárias.

8

Esse programa se populariza como reformas de base e se

consolida em 1958, quando a direção nacional do PTB designa

uma comissão formada por Osvaldo Lima Filho, Armindo Doutel

de Andrade, César Pinto, Francisco Clementino de San Tiago

Dantas e outros, com o objetivo de preparar o programa das

reformas de base, em que se destacam a reforma agrária e a

regulamentação da presença do capital estrangeiro (01). O

Senador Alberto Pasqualini (RS) e o Deputado Federal Hermes

Lima (BA) revelam a preocupação de que as reformas de base

sejam plenamente assumidas pelo Partido (02). No entanto,

pode-se afirmar que tanto nos partidos como nas organizaç•es

nacionalistas, já há um elevado grau de maturação sobre a

necessidade dessas reformas.

A relação entre organizaç•es nacionalistas e partidos

políticos foi marcada pela quebra dos limites que

originariamente caracterizaram essas organizaç•es. Os

partidos políticos ganharam na medida em que os grupos

nacionalistas funcionavam, por vezes, como órgãos de

assessoria, fornecendo quadros, planos e outras formulaç•es

programáticas. Por sua vez, as suas indecis•es levavam os

grupos a assumirem posiç•es que seriam mais próprias dos

partidos, como o lançamento das candidaturas do Marechal Lott

e João Goulart, pelo Movimento Nacionalista Brasileiro (03).

Após a derrota da candidatura Lott, o MNB entra em crise, que

o leva a crescente perda de influência.

A luta pela posse de João Goulart fortalece a liderança

de Leonel Brizola, que passa a ter papel de destaque nas

novas organizaç•es fundadas a partir de então. Em 1961 é

fundada a Frente de Libertação Nacional, congregando líderes

do movimento que permitiu a posse de Goulart, como os

governadores Leonel Brizola e Mauro Borges, parlamentares da

Frente Parlamentar Nacionalista e membros do MNB e da UNE.

Não tem vida longa; após as eleiç•es de 1962 já está

desarticulada. O seu sucedâneo é a Frente de Mobilização

Popular, fundada no mesmo ano e com a mesma composição de

forças, acrescida a presença de militares de baixa patente

reivindicando o direito de votar e ser votado. A FMP

constitui-se atuante grupo de pressão durante a tramitação do

projeto de reforma agrária do PTB, rejeitado na Câmara dos

Deputados, em outubro de 1963 (04).

As reformas de base adquiriram a forma de projetos mais

definidos quando da apresentação do programa de governo do

Primeiro-Ministro Brochado da Rocha, pessedista que

participara do governo Brizola. Segundo Cibilis da Rocha

Viana, a aceitação pelo Congresso dessa indicação deveu-se ao

8

forte apoio popular que Brochado da Rocha teria. Estava,

portanto, identificado com as reformas de base (05). O

programa foi apresentado em julho de 1962 e observava as

recomendaç•es contidas na mensagem presidencial enviada ao

Congresso Nacional no mesmo ano.

O Primeiro-Ministro solicitaria posteriormente delegação

legislativa, conforme previa o Ato Institucional que

instituíra o parlamentarismo, e em agosto apresenta os

projetos de lei que abarcavam desde o abastecimento e

expansão da produção agrícola até a consulta plebiscitária

sobre o sistema de governo. A tática dos opositores às

reformas foi demonstrar desinteresse, voltando suas críticas

à proposta sobre a antecipação do plebiscito. O Congresso

Nacional não se manifestou sobre as reformas, apenas concedeu

poderes para o Executivo alterar aspectos da legislação sobre

agricultura e abastecimento. Esta primeira tentativa de

aprovação das reformas se encerra quando o Primeiro-Ministro

não se submete ao voto de confiança e renuncia (06).

Parecia cada vez mais claro para os defensores das

reformas de base que era necessário criar condiç•es para o

efetivo exercício do governo por João Goulart -- era

necessário o retorno ao presidencialismo. As greves gerais de

julho e setembro de 1962, dirigidas pelo CGT (Comando Geral

dos Trabalhadores) tiveram importância considerável na

antecipação da consulta. A primeira mobilização provoca a

renúncia do Primeiro-Ministro Auro de Moura Andrade; a

segunda, consegue a antecipação do plebiscito para 6 de

janeiro de 1963. A primeira greve, considerada por Jover

Telles a maior mobilização operária que o país já teve

(07), procurou ampliar sua pauta insistindo na formação de um

ministério nacionalista; a segunda, exigia a sanção da Lei

de Remessa de Lucros e o aumento do salário-mínimo em 100%

(08). As duas paralisaç•es atingiram vários estados e

contaram com a participação de mais de 1 milhão de

trabalhadores.

Restabelecidos os poderes presidenciais, as reformas de

base têm nova oportunidade de implementação. Elas passam a

ser sintetizadas num conjunto de quatro blocos: reforma

agrária, reforma bancária, reforma tributária e

administrativa e reforma urbana. As duas primeiras chegaram a

ser encaminhadas ao Congresso, sendo a reforma agrária

rejeitada na Câmara dos Deputados, em outubro de 1963, fato

que provoca a renúncia do Ministro da Educação, Paulo de

Tarso, membro da Frente de Mobilização Popular (09).

Certamente, reforma agrária e controle do capital estrangeiro

8

foram os dois aspectos mais discutidos das reformas, e,

conseqüentemente, alvos de maior polêmica. Detenho- me a

seguir na análise desse segundo ponto, pois seu caráter

emblemático permite avançar na compreensão do programa

nacionalista.

3.1.1. O controle do capital estrangeiro

"No exato sentido, pois, tudo se resume a isto: o

capital é realizado em casa."

Ragnar Nurkse

O Congresso se antecipou ao Executivo, aprovando leis

situadas no espírito das reformas de base, como a Lei de

Remessa de Lucros, o Estatuto do Trabalhador Rural,

estendendo a legislação trabalhista para o campo e a

definição de política nuclear nacional, entre outras. Esta

atuação do Congresso relativiza a conhecida tese da

orientação basicamente conflitiva entre um poder executivo

reformista versus um legislativo conservador (10).

No debate sobre a remessa de lucros, os nacionalistas

adotam a tese de Ragnar Nurkse de que o capital se faz em

casa. Para Barbosa Lima Sobrinho, o centro do problema se dá

quando o fluxo de saída de capital é maior que o fluxo de

entrada. Quando isto acontece temos um processo de

descapitalização. Não existe capital internacional; "ele se

personaliza no dono. E se há um dono, o dono tem

nacionalidade..." (11). O capital que vem com seu portador ou

que ingressa na forma de empréstimos ao governo ou a empresas

brasileiras é visto com simpatia. Aquele que entra sob a

forma de empréstimos a empresas estrangeiras com garantia do

Tesouro Nacional é totalmente condenável (12).

O exame desse fluxo de entrada e saída é extremamente

favorável ao argumento dos nacionalistas: do total de capital

investido no setor manufatureiro, no período entre 1957 e

1965, o capital proveniente dos Estados Unidos participou com

apenas 22%; os outros 78% foram obtidos no próprio país (13).

8

Os investimentos globais do Plano de Metas também contaram

com reduzida participação do capital estrangeiro -- apenas

1/3. No final de seu governo, JK lamenta a pouca ajuda

recebida dos Estados Unidos (14). Com a intensificação da

presença do capital estrangeiro, os países de

industrialização recente se convertem em exportadores de

capital, já que um volume crescentemente maior de recursos

sob a forma de juros, royalties e lucros exportados passa a

ser remetido para os países de industrialização antiga.

Barbosa Lima Sobrinho e Aristóteles Moura consideram que

o capital nacional tem supremacia na formação total do

capital. A poupança doméstica contribuíra no período de 1950

a 1959 com 97,2% do total. Afirmam que frente à debilidade da

burguesia industrial interna, o desenvolvimento deve ser

alcançado com planejamento e execução estatal. Por sua

própria natureza, voltado para o lucro rápido, o capital

privado não se dirigirá aos setores básicos (15).

Da mesma forma, a importação de tecnologia exige

critérios e controle. A facilidade para a importação de

máquinas e equipamentos, criada com a Instrução 113, no

governo Café Filho, dispensando-a de cobertura cambial, abre

caminho para a associação capital nacional/capital

estrangeiro, pois as empresas nacionais se viram na

contigência de se associarem ao capital estrangeiro para

terem acesso a essas importaç•es. Esse tratamento

extremamente favorável ao capital estrangeiro permitiria sua

entrada no país a taxas nunca vistas, principalmente na forma

de capital de empréstimos (16).

Como conseqüência temos um quadro onde dois aspectos se

destacam: primeiro, foram contabilizados como capitais

estrangeiros montantes superiores aos efetivamente

incorporados. Barbosa Lima Sobrinho assim se refere a essa

"nacionalização" do capital:

"...capital estrangeiro, não raro, é tão somente

apelido. O que há é capital nosso, inscrito em nome de

estrangeiros. São recursos de nossos bancos, de nossa

poupança, prosperando atrás de barreiras alfandegárias,

levantadas para a proteção de iniciativas estrangeiras"

(17).

8

Este será sempre um forte argumento dos nacionalistas

para o estabelecimento de regulamentação que controle a

atuação do capital estrangeiro. Em segundo lugar, o acesso

aos favores permitiu que empresas beneficiadas se

expandissem, controlando outras, promovendo a concentração do

parque industrial (18).

A primeira legislação sobre o assunto é o decreto nº

9.025 apresentado no governo Dutra, em 27 de fevereiro de

1946 (19). Este decreto cria um sistema de garantia de câmbio

para a remessa de lucros de até 8% sobre o capital

estrangeiro registrado. O registro deve ser feito apenas do

capital que ingressa no país. Os lucros obtidos em cruzeiros

não podem ser considerados na remessa de lucros; é capital

que deve ser reinvestido no país. Em agosto de 1946, o

decreto é praticamente revogado, passando a SUMOC

(Superintendência da Moeda e do Crédito) a ter autonomia de

decisão sobre o assunto. Em janeiro de 1952 Vargas apresenta

novo decreto, revogado um ano depois pelo Congresso.

Extingue-se a progressiva nacionalização dos lucros e o

registro, concedendo-se amplas liberdades de movimentação ao

capital estrangeiro.

A euforia desenvolvimentista dos anos JK obscurece o

debate sobre a questão. Em fins dos anos cinqüenta, Sérgio

Magalhães (PTB/DF) começa a apresentar pequenos projetos de

lei sobre o assunto. Na campanha presidencial de 1960, os

dois principais candidatos, o Marechal Lott e o Sr. Jânio

Quadros, comprometem-se com o controle do capital estrangeiro

(20).

O movimento sindical passa a incluir o controle da

remessa de lucros entre as suas reivindicaç•es. Em

conferência realizada em março de 1959, metalúrgicos do

Distrito Federal aprovam documento que inclui esta

reivindicação e entregam-no ao presidente Juscelino, que o

aprova. O III Congresso Sindical Nacional, realizado nos dias

18 e 19 de fevereiro de 1961, aprova documento com o mesmo

teor. Em janeiro de 1962 a Comissão Permanente das

Organizaç•es Sindicais do Estado da Guanabara reivindica a

ratificação, pelo Senado, pelo Conselho de Ministros e pelo

presidente, da lei aprovada na Câmara, em novembro de 1961.

Nas greves gerais de julho e setembro de 1962, a

reivindicação também se fazia presente.

Embora o PTB incluisse esse ponto no seu programa, o

movimento de opinião que permitiu sua aprovação aconteceu, em

boa parte, fora dos partidos. As organizaç•es nacionalistas e

os sindicatos constituíram-se em eficientes grupos de

8

pressão, forçando o Congresso, como na antecipação do

plebiscito, a aprovar demandas reivindicadas pela sociedade.

Em agosto de 1959, o deputado Fernando Santana (PTB/BA)

discursa apresentando dados da SUMOC que revelam não ser tão

importante assim a presença do capital estrangeiro entre nós.

No mesmo mês, em pronunciamento no Clube Militar, o deputado

Sérgio Magalhães critica os favorecimentos cambiais. O

capital estrangeiro entra pelo câmbio livre e sai à taxa de

câmbio favorecido (21).

Os pronunciamentos do campo favorável à plena

liberalização do capital estrangeiro, nesse momento, situam

de forma genérica suas críticas ao nacionalismo. O projeto

ainda não merecia preocupaç•es. No mesmo agosto de 1959, o

Embaixador dos Estados Unidos, John Cabot, discursando na

Câmara de Comércio Americana, diz que o nacionalismo tem

apenas base emocional. O seu próprio país permitiu que o

capital estrangeiro participasse da construção nacional e

muito lucrou com isso; beneficiaram-se de grandes somas da

própria América Latina. Afirma que as exportaç•es de lucros

não são excessivas (menos de 3% sobre o investimento total).

Faz duras críticas aos comunistas: "Advogam a nacionalização

dos bens estrangeiros, por saberem não haver meio mais seguro

do que este para fazer naufragar a economia de uma nação..."

(22). O Subsecretário de Estado, Sr. Douglas Dillon, em

pronunciamento feito em fevereiro de 1960, repete os

argumentos do embaixador e acrescenta:

"...dificilmente se poderia esperar que os investimentos

estrangeiros continuem a ser atraídos para a América

Latina, se estiverem sujeitosa restriç•es, sem a

conveniente compensação" (23).

Em sua visita ao Brasil, no mesmo mês, o presidente dos

Estados Unidos, Dwight Eisenhower, ressalta a contribuição

positiva do capital estrangeiro: São Paulo, região que

concentra maior volume de capital estrangeiro é a mais

desenvolvida (24).

Barbosa Lima Sobrinho contesta esta defesa do capital

estrangeiro. Diz que "todos os países que progrediram

basearam-se em capitais próprios", e que ao alegarem terem

dependido de capital estrangeiro para o seu desenvolvimento,

estavam "renunciando às glórias dos que haviam construído a

8

grandeza econômica dos Estados Unidos." Cita relação de

cinqüenta milionários dos Estados Unidos que mais

contribuíram para o seu desenvolvimento e só encontra lá nove

estrangeiros, e mesmo assim, residentes no país (25).

Eleito, o Sr. Jânio Quadros ordena que o líder da UDN,

deputado Menezes Cortes, envie projeto em regime de urgência

sobre o tema; cumpria assim seu compromisso de campanha. Mas

o referido projeto é recebido com ressalvas pelos

nacionalistas. Segundo Barbosa Lima Sobrinho, o projeto de

Jânio Quadros pretendia reduzir o imposto sobre os lucros

extraordinários. Em lugar de aplicar impostos pesados às

invers•es realizadas, "o projeto do Sr. Jânio Quadros prefere

conceder-lhes um prêmio régio, na redução dos tributos a que

podem estar sujeitos os lucros excessivos do capital

estrangeiro" (26). No Congresso forma-se uma comissão

composta por Barbosa Lima Sobrinho (PSB/PE), Celso Brant

(PR/MG) e José Joffily (PSD/PA), que tem como centro a

preocupação com o reinvestimento. Isto é, os lucros obtidos

no país não poderiam ser registrados como capital estrangeiro

(27).

O deputado Daniel Faraco (PSD/RS), defensor do projeto

que visava apenas criar um instrumento fiscal, argumentava

que o "movimento de capitais externos, tanto de risco como de

empréstimo, e respectivas rendas, longe de ocasionar uma

sangria de recursos cambiais do país, reforça

consideravelmente esses recursos". O grave problema, segundo

o deputado, é a hemorragia interna (os déficits) (28).

Depois de intenso debate, é aprovado na Câmara dos

Deputados o substitutivo Celso Brant, que teve origem nos

pequenos projetos do deputado Sérgio Magalhães. O projeto

recebeu 151 votos favoráveis, 60 contrários e 116 deputados

estavam ausentes. Segundo Sérgio Magalhães, os deputados

filiados à Frente Parlamentar Nacionalista nunca passaram de

oitenta (29). Esta maioria expressiva indica um realinhamento

das forças políticas no Congresso. A campanha nacionalista

provocou efeitos devastadores nos partidos de centro e

centro-direita. PSD e UDN, considerados partidos

conservadores, praticamente se dividiram ao meio. PTB e PSB,

com programa e atuação impregnados por forte nacionalismo

apresentaram alto padrão de unidade (30). A existência nos

dois partidos considerados conservadores, PSD e UDN, de duas

alas reformistas ajuda a explicar esta cisão. As alas

reformistas estavam se revelando sensíveis às demandas da

sociedade. Era 30 de novembro de 1961 e o país vivia a crise

8

institucional em torno dos poderes do presidente:

presidencialismo ou parlamentarismo ?

A vitória era parcial, pois ainda restava a batalha do

Senado.

Os adversários do projeto denunciam que a expressiva

votação obtida constituir-se-ía em aberta interferência de

industriais paulistas; beneficiava-se São Paulo em detrimento

de Minas, Nordeste e Rio Grande do Sul. Este fato estaria

fazendo surgirem, na própria esquerda , críticas aos excessos

do projeto (31). Sérgio Magalhães atribui a localização de

resistências maiores no Rio de Janeiro ao fato de que ali se

situavam as sedes das principais empresas multinacionais

(32).

O Sr. Antônio Devisate, presidente da FIESP (Federação

das Indústrias do Estado de São Paulo), afirma que o projeto

precisa ser alterado; a Federação das Indústrias da Guanabara

também faz restriç•es a alguns dispositivos (33). Os

empresários paulistas defendem o registro de capital e,

principalmente, a fixação de uma ordem de prioridades

para os investimentos industriais novos (34).

Em conferência pronunciada no Conselho Nacional de

Economia, o presidente da Junta Administrativa da CNI

(Confederação Nacional da Indústria), Sr. Fernando Gasparian,

explicita o ponto de vista da entidade. A participação do

capital estrangeiro é de extrema utilidade, pois complementa

a poupança interna. O poder público deve pôr obstáculos à sua

entrada em setores já suficientemente cobertos pela produção

interna. Esta produção interna deve estar sendo "empreendida

em condiç•es satisfatórias de qualidade e preço". Não se deve

conceder vantagens ao capital estrangeiro (35).

O apoio de empresários a alguns aspectos do projeto é

alvo de duras críticas dos intransigentes defensores do

capital estrangeiro. O Embaixador John Cabot refere-se, em

seu discurso, a brasileiros que, ingenuamente, aceitam a

pregação comunista. Esses empresários são acusados de se

esconderem no manto protetor do nacionalismo para

consolidarem e protegerem seus monopólios. A não instalação

de empresas estrangeiras em setores ou regi•es onde as

empresas brasileiras atendem às necessidades visaria

beneficiar as industrias paulistas. Faz-se a defesa da

concorrência como forma de baratear os preços. A aliança de

8

comunistas e empresários locais objetiva que os primeiros

anulem a concorrência e os segundos escravizem o consumidor

(36).

No Senado o projeto sofre alteraç•es sensíveis,

estabelecendo impostos sobre as remessas, atenuando o

dispositivo de limite. Sérgio Magalhães, mesmo não

concordando com estas alteraç•es assina o projeto para que

ele tenha andamento. De volta à Câmara dos Deputados, os

deputados nacionalistas dão ao projeto sua feição original,

eliminando as alteraç•es realizadas pelo Senado. O projeto

readquire assim a forma do substitutivo Celso Brant, que é

novamente posto em votação e aprovado em 3 de setembro de

1962, em votação simbólica (37).

A lei limita as remessas anuais de lucros em 10% do

investimento registrado. O lucro que excede a este limite é o

chamado capital suplementar, que, embora pertença a

estrangeiros, não dá direito à remessa. O reinvestimento é a

quantia que poderia ter sido legalmente remetida para o

exterior, mas não foi (38).

O centro das atenç•es passa a ser o gabinete

presidencial. Press•es são feitas para que o presidente vete

os artigos polêmicos. Em janeiro de 1964, afirmando sua clara

opção pelas reformas de base, o presidente João Goulart

sanciona a lei.

8

Osny Duarte Pereira alerta para que não se tenha ilusões

quanto à lei, e lembra que ela foi usada pelas empresas

estrangeiras como álibi para justificar o retraimento de seus

investimentos a partir de 1963. A imprensa defensora da

completa liberdade para o capital estrangeiro contribui com a

desestabilização do governo Goulart, associando a aprovação

da lei à queda dos investimentos diretos de capital

estrangeiro (39).

Entre os nacionalistas há um consenso de que controlar a

remessa de lucros é tarefa difícil (40) e que esta medida

tomada de forma isolada pouco significa. Algumas

considerações como conclusões:

A repercussão do debate se deve à intensa penetração do

capital estrangeiro (mesmo considerado minoritário no total dos

investimentos). Por outro lado, a idéia de exercer algum tipo

de controle sobre este fenômeno motiva a ação dos nacionalistas

e torna seu discurso coerente e assimilável por amplos setores

da população. Note-se que em 1963 os investimentos estrangeiros

já controlavam 40% da indústria do país (41).

A coalização que se formou na sua aprovação aponta para

a possibilidade de um realinhamento partidário capaz de dar

sustentação ao modelo de economia independente que se estava

forjando. Embora houvesse alguma resistência do Congresso

quanto às reformas de base, é simplificar muito atribuir a

crise institucional do governo Goulart à polarização de um

executivo progressista versus um Congresso conservador (42).

Há sinais de demonstração de sensibilidade do Congresso à

pressão das massas - antecipação do plebiscito, aprovação do

Estatuto do Trabalhador Rural, além da lei citada acima. O

Congresso esboçava sinais de uma possibilidade: resolver as

contradições entre a estrutura agrária concentrada e a

expansão do capital estrangeiro, por um lado; e o modelo de

desenvolvimento independente, por outro (43).

3.1.2.Jango: entre os planos do FMI e o "Caminho Brasileiro"

8

Restabelecido o presidencialismo, o presidente Goulart

passa a viver o dilema de optar entre o clássico receitual

recessivo do FMI e o prosseguimento do desenvolvimento. A

primeira inclinação do presidente é por conciliar a política

do FMI com o projeto desenvolvimentista.

Cabe ao economista e auxiliar de Juscelino na criação da

SUDENE (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste),

Celso Furtado, a tarefa de realizar tal proeza, que recebe o

nome de Plano Trienal, publicado a 30 de dezembro de 1962 e

apresentado à nação no discurso de Ano-Bom de 1963. Nesta

apresentação Goulart é cauteloso; afirma não se tratar de

decis•es fechadas; espera assim que o Plano seja objeto de

amplo debate. As críticas foram, certamente, bem maiores do

que imaginava o presidente. Economistas como Ignácio Rangel,

ex-membro da Assessoria Econômica do governo Vargas, não

acreditam nessa fusão de monetarismo e estruturalismo (44). A

Frente Parlamentar Nacionalista e o CGT se op•em ao Plano.

O jornal O Semanário critica o presidente por não ter

aproveitado a campanha pelo retorno ao presidencialismo para

popularizar as reformas de base e a idéia do planejamento

econômico global. Considera o planejamento econômico a base

em que deveria se fundamentar o presidencialismo. Portanto,

a elaboração do Plano não poderia ter permanecido em sigilo.

O jornal, no entanto, deposita grandes esperanças no

planejamento, que é visto como a condição para a "justiça

social, efetiva, democrática". Como na campanha "o petróleo é

nosso", é necessário criar um "gigantesco movimento de

massas" para levar adiante esta concepção (45). As campanhas

da siderurgia e do petróleo -- exemplos de planejamento

parcial -- forjaram a "mística nacionalista". O CGT não

poderia deixar de responder a esta questão que o presidente

apresenta no Plano: por que não fazer do planejamento

econômico global o mesmo que foi feito nessas campanhas (46)

?

8

O Plano pretendia, ao mesmo tempo, oferecer aos

investidores e credores externos segurança quanto à

orientação do governo, o que significa conter gastos, conter

inflação, reduzir presença do Estado na economia, e promover

o desenvolvimento. Mantinha em seus postulados a necessidade

de alterar a estrutura agrária brasileira, com rapidez e

eficiência. Objetivo é ali apresentado apenas como elemento

de retórica, já que sua implementação inviabilizaria as metas

recessivas contempladas no conjunto do Plano.

As pressões por aumentos salariais e liberação de

créditos impedem o cumprimento das metas de estabilização

(47), as mudanças estruturais prometidas também não

acontecem; em maio, Celso Furtado já admite ter fracassado:

"a luta em que nos havíamos empenhado, no quadro do Plano

Trienal, para manter sob controle a situação econômica,

estava praticamente perdida" (48). A boa vontade de O

Semanário desaparecera:

"Isto é o Plano Trienal: Estagnação, Desemprego,

Retenção das empresas industriais do Estado; Elevação

dos impostos; Supressão do crédito bancário; falências e

concordatas; Salários e vencimentos devorados pela

"verdade cambial"; menos escolas, menos hospitais, menos

estradas, menos obras públicas, tudo trancado pelos

cortes orçamentários. Economia é a palavra de ordem que

o Ministro Celso Furtado lhe sopra aos ouvidos, como um

Necker ressuscitado" (49).

A partir do fracasso do Plano Trienal, João Goulart opta

claramente pelas reformas de base. Esta opção é feita de

forma contundente em dois documentos: o discurso pronunciado

no comício de 13 de março, na Central do Brasil; e a

mensagem presidencial enviada ao Congresso a 15 de março.

Estas duas falas se assemelham muito aos discursos de

Getúlio. No discurso de 13 de março, Jango, como o velho

8

líder, dirige-se aos "trabalhadores do Brasil". Há uma

acentuada preocupação com a renovação das instituições,

rompendo com o passado que impede o acesso de amplos setores

aos bens do desenvolvimento:

"Consciente das distorções verificadas ao longo do nosso

processo de transformação social e da necessidade

imperiosa de reformas estruturais e institucionais,

assumi a responsabilidade de comandar a luta pela

renovação da sociedade brasileira..." (50).

Não se trata apenas de prosseguir com o processo de

desenvolvimento, mas é dado a ele a dimensão de justiça e

igualdade outrora secundarizada: "O nosso lema, trabalhadores

do Brasil, é progresso com justiça, e desenvolvimento com

igualdade" (51). Dois obstáculos são identificados: a relação

com o capital estrangeiro e a estrutura agrária concentrada.

O primeiro obstáculo fora de forma razoável enfrentado pelo

Congresso quando aprovou a lei de remessa de lucros. A

referência do presidente a esta lei não apresenta nada de

catastrófico: "obtivemos o reescalonamento da dívida externa

do País pouco tempo após regulamentar a execução da Lei de

Remessa de Lucros..." (52). O segundo obstáculo é

exaustivamente abordado no discurso de 13 de março. É

enfatizado o seu alcance social e a integração com o modelo

de desenvolvimento independente:

"Areforma agrária não é capricho de um Governo ou

programa de um partido. É produto da inadiável

necessidade de todos os povos do mundo. Aqui, no Brasil,

constitui a legenda mais viva da esperança do nosso

povo, sobretudo daqueles que labutam no campo.

Areforma agrária é também uma imposição progressista

do mercado interno, que necessita aumentar a sua

produção para sobreviver" (53).

O presidente parece ter aguçada percepção das dimens•es

da crise. Comunica no comício que já assinara decreto com um

ensaio de reforma agrária, o chamado decreto da SUPRA

(Superintendência da Reforma Agrária). O presidente quer

deixar muito claro o novo caminho, as suas novas opç•es.

8

3.1.3.A nacionalização das refinarias: a ampliação do

monopólio

Do monopólio estatal ficaram excluídas as refinariais

particulares já existentes no país: Capuava, Ipiranga,

Manguinhos, Amazonas e Destilaria Rio-Grandense. A refinaria

de Manguinhos fora construída pelos empresários Elyeser

Magalhães, Peixoto de Castro e Drault Ernany.

A refinação tem uma importância estratégica na indústria

petrolífera. O general Horta Barbosa fundamenta assim esta

tese: "alicerce da independência econômica de um povo, a

indústria de refinação deverá ser criada com a descoberta ou

não de jazidas de petróleo" (54). No entanto, o fato de as

refinarias serem de propriedade de brasileiros diminuíria as

restriç•es entre os nacionalistas. Qual o significado então

do decreto de Jango, que nacionalizava as refinarias

particulares, apresentado no comício de 13 de março ?

Desde a organização do comício, passando pelas palavras

de Jango, até esse decreto assinado, há uma intenção de

associar o momento à figura de Vargas. O palanque, segundo

informaç•es do Palácio do Catete, seria o mesmo usado por

Getúlio Vargas nos seus mais importantes aparecimentos em

público (55). Estava João Goulart completando a obra iniciada

por Getúlio. Em dezembro de 1963 assinara decreto

estabelecendo o monopólio da importação de petróleo e seus

derivados. A nacionalização das refinarias, menos por seu

impacto na política do petróleo, assinalava o encontro com a

simbologia getuliana:

"Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública,

o decreto de encampação de todas as refinarias de

petróleo particulares, desejo prestar homenagem de

respeito àquele que sempre esteve presente nos

sentimentos do nosso povo, o grande e imortal Presidente

Getúlio Vargas" (56).

8

A bandeira oferecida por Getúlio com a sua morte

tremulava para além das faixas e cartazes:

"O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua

a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu,

particularmente, vivo hoje momento de profunda emoção ao

poder dizer que, com este ato, soube interpretar o

sentimento do povo brasileiro " (57). (Osgrifossão meus)

A ligação de João Goulart com Vargas era muito estreita.

Assim, era natural que procurasse pautar sua atuação política

na do presidente morto em 1954, a cuja trajetória política

estava intimamente ligado, tendo sido seu Ministro do

Trabalho de 1953 a 1954. Acrescente-se a isso as

circunstâncias da morte do presidente, em que a posse de uma

cópia da carta-testamento e o seu emocionado discurso no

enterro o fazem herdeiro político de Getúlio.

Dessa forma, é inevitável a comparação entre os dois

líderes, em que se destaca o esforço de João Goulart em

prosseguir e aprofundar as transformaç•es implementadas desde

Getúlio, notadamente, a partir do restabelecimento de seus

plenos poderes, com a vitória do presidencialismo no

plebiscito de 6 de janeiro de 1963 e do fracasso do Plano

Trienal. A partir desse momento é claro o seu compromisso com

as reformas de base.

3.2. O projeto nacional-popular e o golpe de 1964

Benedict Anderson chama de nacionalismo de última onda

(58) o nacionalismo do século XX, que nasce como resposta ao

imperialismo, localizado fundamentalmente na °frica e °sia.

Amplio esta idéia considerando que na América Latina e no

Caribe a atuação do imperialismo e a formação de movimentos

nacionalistas também representam o principal fenômeno

político deste século na região. A primeira fase corresponde

ao desenvolvimento da idéia de nação nas grandes revoluç•es

do século XVIII -- a Revolução Americana e a Revolução

Francesa. A França revolucionária transformara-se em quartel-

general de todas as revoluç•es e exercia forte influência nos

movimentos de libertação anticoloniais. A idéia de nação se

encontra aqui ainda vinculada aos outros postulados liberais.

Não se pode, rigorosamente, falar de nacionalismo nesse

período, mas deve-se registrar que a idéia de nação cumpre um

papel revolucionário, assim como os outros princípios

8

liberais, ao se opor ao feudalismo. Somente a partir de

meados do século XIX, com a divisão do movimento

revolucionário, surge o que Hobsbawn chama de movimentos

nacionalistas conscientes, em que Itália e Alemanha são os

casos mais típicos. A partir do momento que sua formulação

ganha autonomia vincula-se ao pensamento conservador, ciclo

que só encerra com a sua reconciliação com a transformação

social, ocorrida a partir da década de trinta. Trata-se da

última onda, como assinala Benedict Anderson.

Barbosa Lima Sobrinho denomina essa última fase de

nacionalismo defensivo. Considera necessário distinguir

entre a concepção que orienta, por um lado, as nações da

África e Ásia; e, por outro, a Alemanha de Guilherme II e

Adolf Hitler (59). Hans Kohn afirma que, a partir do século

XX, o nacionalismo se constitui num "movimento socialmente

revolucionário" (60). O seu programa exige para todos os

membros do grupo nacional as mesmas oportunidades econômicas

e culturais. Ao conceituarem nacionalismo, autores como Lima

Sobrinho apresentam como substancial o antagonismo de

interesses ou de idéias. O imperialismo, no século XX,

torna-se o alvo desse antagonismo. A nação, que tantas vezes

foi "avó de impérios", agora pode ser apreendida pelas

classes populares, constituindo o nacional- popular.

Hobsbawn afirma que esta "combinação de liberação

nacional e transformação social" vai se constituir "numa

força formidável no século XX" (61).

Por sua vez, o movimento comunista se reconcilia com o

nacionalismo; no mundo, Hobsbawn localiza esse momento em

meados da década de 30 (62). No Brasil da década de cinqüenta

há uma notável colaboração entre comunistas e nacionalistas,

graças à alteração de linha programática realizada pelo PCB

em 1954, quando passa a defender a participação na frente

antiimperialista formada pela "pequena burguesia urbana, da

burguesia e dos latifundiários que tenham contradições com o

imperialismo..." (63). Ainda Hobsbawn: "o papel dos

comunistas na resistência antifacista emprestou uma

considerável plausibilidade a seus resgates de

patriotismo..." (64).

Para os nacionalistas, nação e imperialismo, ou anti-

nação, representam interesses inconciliáveis, sendo os

interesses antinacionais identificados pelo latifúndio e os

monopólios estrangeiros. Conciliar esses interesses com os

interesses nacionais, seria o mesmo que "conciliar o ser e o

não ser, a nação e a anti-nação" (sic)(65).

8

Esta fusão entre os chamados interesses nacionais e a

transformação social se expressa na luta pelas reformas de

base; reafirma-se, por exemplo que não há possibilidade de

autonomia nacional sem reforma agrária. A crescente

mobilização popular deixa de se constituir em simples

elemento de pressão para exigir participação no processo

decisório - a participação de representantes dos

trabalhadores na administração da Previdência Social já

acontecia desde 1960, quando foi aprovada a Lei Orgânica da

Previdência Social. Os últimos pronunciamentos de Jango e o

comício da Central assinalam o clímax dessa formulação e da

mobilização de massas pelas reformas. A sua aprovação

dependia, cada vez mais, do fortalecimento da frente

antiimperialista. Em 1962 Celso Furtado já detectara a

necessidade de promover essa coesão em torno das reformas no

Congresso. Elaborara manifesto visando comprometer os

candidatos ao Parlamento com o programa de reformas de base.

Para o autor, as reformas de base eram apresentadas de forma

pouco consistente:

"Teria que ser um documento convincente, mas escrito em

linguagem moderada, sem sectarismos, capaz de aglutinar

personalidades de um amplo espectro político. A idéia

era de que cada candidato ao Parlamento fosse convidado

por esses líderes e assiná-lo e, a fortiori, a cumpri-

lo, uma vez no exercício do mandato. Daí surgiria uma

Frente Parlamentar pelas Reformas de Base, cuja atuação

marcaria a próxima sessão do Congresso" (66).

Não pretendendo deter-me na análise do golpe de 1964,

quero chamar a atenção para as divisões na frente das

reformas de base como um elemento de enfraquecimento da

frente antiimperialista. Em agosto de 1963 foi realizado o

primeiro comício pelas reformas, com presença, estimada em

cerca de 100 mil pessoas, e presidido por Jango, acompanhado

pelos três ministros militares. Neste comício o presidente

enfatiza, mais uma vez, a necessidade das reformas. Aqui fica

clara a fratura na frente nacionalista: pessoas ligadas ao

deputado Leonel Brizola afirmaram, na ocasião, que o comício

visava fortalecer Jango para que este pudesse dar um golpe. O

golpe seria dado contra o governador Carlos Lacerda, mas o

seu objetivo real era "esmagar as esquerdas" (67).

8

Comparando a campanha "o petróleo é nosso" com a

campanha pelas reformas de base, Oswaldo Costa atribui à

obstinação com vitórias eleitorais um fator desagregador

considerável. O sucesso da primeira campanha ligava-se ao

desprendimento de suas lideranças (68).

Preocupações eleitorais e incapacidade em construir a

unidade interna capaz de resolver as contradições criadas

pelo avanço do projeto de desenvolvimento independentes são

elementos que iluminam o entendimento da crise de 1964.

O programa se amplia: da defesa do monopólio estatal da

energia às reformas de base. A unidade das forças engajadas

nesse projeto toma forma orgânica com a fundação, em 1962, da

Frente de Mobilização Popular. A FMP, de certa forma, é

sucedânea da Frente de Libertação Nacional e estuário para o

qual convergem os outros movimentos nacionalistas e

organizaç•es populares, como a UNE e o CGT.

8

NOTAS

(01) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de (coord.)

Dicionário Histórico e Biográfico Brasileiro: 1930-1983.

Rio de Janeiro, Ed. Forence Universitária: Fundação

Getúlio Vargas/Centro de Pesquisa e Documentação de

História Contemporânea (CPDOC).Financiadora de Estudos e

Projetos (FINEP), 1984, p. 2605.

(02) DELGADO, Lucília de A. Neves. PTB: Do Getulismo ao

Reformismo (1945-1964). São Paulo, Marco Zero, 1989, p.

(03) D'ARAÚJO, Maria Celina Soares. A ilusão trabalhista. O

PTB de 1945-1965. Rio de Janeiro, Tese de Doutorado,

IUPERJ, 1989, p. 187.

(04) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alvez de (coord.). Op.

cit. pp. 1390-1391, vol. 2.

(05) VIANA, Cibilis da Rocha. Reformas de Base e Política

Nacionalista de Desenvolvimento -- de Getúlio a Jango.

Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980, pp. 116-

126.

(06) VIANA, Cibilis da Rocha. Op. cit., p. 177.

(07) DELGADO, Lucília de Almeida Neves. O Comando Geral dos

Trabalhadores (1961-1964). Petrópolis, Vozes, 1986, p.

189.

(08) DELGADO, Lucília de Almeida Neves. Op. cit., p. 192.

(09) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.). Op.

cit., pp. 1390-1391.

(10) Esta tese esteve muito em voga no início dos anos

sessenta. É discutida por SOUZA, Maria do Carmo Campello

de. Estado e partidos políticos no Brasil (1930-1964).

2ª ed., São Paulo, Alfa-ômega, 1983, pp. 152-154.

Segundo a autora, a mudança sócio-econômica incidia em

tempos diferentes sobre a formação dos dois poderes,

provocando alteraç•es em sua atuação, com um

enfraquecimento relativo do executivo e o aumento da

8

representatividade e institucionalização dos partidos,

tornando possível a aprovação das reformas no Congresso.

(11) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Barbosa Lima Sobrinho

(depoimento). Rio de Janeiro, FGV/CPDOC, 1983, p. 370.

(12) MAGALHÃES, Sérgio et all. A Questão da Remessa de

Lucros. Rio de Janeiro, Ed. Universitária, 1962, passim.

(13) MARTINS, Luciano. Pouvoir et developpement economique.

Paris, Antropus, 1976, p. 440.

(14) CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento -

- Brasil: JK-JQ. 2ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra,

1978, pp. 187-190.

(15) MAGALHÃES, Sérgio et al. Op. cit., passim.

(16) LESSA, Carlos. 15 anos de política econômica. São Paulo,

Brasiliense, 1983, p. 58.

(17) LIMA SOBRINHO, A. J. Barbosa. Desde quando somos

nacionalistas ? Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,

1963 (Coleção Cadernos do Povo Brasileiro), p. 112.

(18) LESSA, Carlos. Op. cit., p. 69.

(19) Barbosa Lima Sobrinho em Estudos Nacionalistas, Rio,

Civilização Brasileira, 1981, e o verbete capital

estrangeiro do Dicionário Histórico-Biográfico

Brasileiro apresentam um bom relato dessa legislação no

Brasil.

(20) Novos Rumos, de 3 a 9 de abril de 1959 e Jornal do

Brasil, 20 de setembro de 1960, respectivamente.

(21) Jornal do Brasil, 19 de agosto de 1959.

(22) Idem, 16 de agosto de 1959.

(23) Ibidem, 13 de fevereiro de 1960.

(24) Ibidem, 26 de fevereiro de 1960.

(25) LIMA SOBRINHO, Barbosa. Japão: o capital se faz em casa.

2ª ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1990, pp. 11-12.

(26) Jornal do Brasil, 5 de novembro de 1961.

(27) SKIDMORE, Thomas. Brasil: De Getúlio a Castelo. 4ª ed.,

Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975, pp. 277-278.

8

(28) Jornal do Brasil, 7 de novembro de 1961.

(29) MAGALHÃES, Sérgio et. al. Op. cit., p. 73.

(30) SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Sessenta e quatro:

anatomia da crise. São Paulo, Vértice, 1986, p. 99.

(31) MAGALHÃES, Sérgio. Sérgio Magalhães (depoimento, 1978).

Rio de Janeiro, FGV/CPDOC, 1983, p.

(32) Jornal do Brasil, 5 de dezembro de 1961.

(33) Idem, 3 de dezembro de 1961.

(34) Novos Rumos, de 2 a 8 de dezembro de 1961.

(35) Jornal do Brasil, 17 de dezembro de 1961.

(36) Idem, 6 de novembro de 1963.

(37) Para acompanhar a trajetória do projeto ver os

depoimentos acima citados e Wanderley Guilherme dos

Santos, op. cit., particularmente o capítulo 5.

(38) MAGALHMAGALHÃESES, Sérgio. Problemasdo desenvolvimento

econômico. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1960,

pp. 35-36.

(39) PEREIRA, Osny Duarte. A lei de remessa de lucros. In.:

Civilização Brasileira, setembro de 1964, nº 15, p. 209.

(40) Cf. Barbosa Lima Sobrinho, depoimento, op. cit., p. 408

e entrevista de Almino Afonso, Jornal do Brasil, 3 de

dezembro de 1961.

(41) DAVIS, Horace B. Para uma Teoria Marxista do

Nacionalismo. Rio de Janeiro, Zahar, 1978, p. 210.

(42) Cf. nota número 10 do presente trabalho.

(43) SOUZA, Nilson Araújo de. A herança de Getúlio (II). In

Hora do Povo, nº 163, de 02 a 16 de abril de 1985. O

autor afirma que os governos de Juscelino Kubitschek,

Jânio Quadros e João Goulart prosseguem o ciclo iniciado

com Getúlio Vargas. A ruptura desta orientação nacional-

democrática só ocorreria com o golpe de 1964.

(44) MIRANDA, José Carlos da Rocha. O Plano Trienal: o canto

de cisne do nacional-desenvolvimentismo. Campinas,

UNICAMP. Tese de Doutoramento, 1979, p. 141. Os

economistas e cientistas sociais ligadas à CEPAL,embora

8

se alinhassem em diversos pontos com o programa

nacionalista, irão progressivamente dele se afastando. O

livro de CARDOSO, Fernando Henrique. Empresário

Industrial e Desenvolvimento Econômico. Difel, São

Paulo, 1964, assinala essa ruptura. Nestelivro,

Fernando Henrique Cardoso nega a possibilidade de a

burguesia nacional vir a desempenhar papel importante no

modelo de desenvolvimento independente. Tal tendência

só tem se afirmado no interior desse grupo desde então.

(45) O Semanário, nº 317, de 10 a 16 de janeiro de 1963.

(46) O Semanário, nº 322, de 14 a 20 de fevereiro de 1963.

(47) SILVA, Hélio. 1964:golpe ou contragolpe ?Rio de Janeiro,

Civilização Brasileira, 1975, pp. 169-172.

(48) FURTADO, Celso. A fantasia desfeita. 2ª ed., Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1989, p. 166.

(49) O Semanário, nº 339, de 27 de junho a 3 de julho de

1963.

(50) CARVALHO, Maria Izabel Valladão de. Ideologia e discurso

político: os projetos governamentais do período 45 a 64.

São Paulo, USP, Tese de Doutoramento, 1988, p. 117.

(51) GOULART, João. Discurso do Dia 13 de Março. In: SILVA,

Hélio. Op. cit., pp. 457-466.

(52) Idem, ibidem.

(53) Ibidem.

(54) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.). Op.

cit., p. 2713.

(55) SKIDMORE, Thomas. Op. cit., p. 347.

(56) GOULART, João. O Discurso do Dia 13 de Março. In: SILVA,

Hélio. Op. cit. p. 464.

(57) Idem, ibidem.

(58) Para o desenvolvimento deste parágrafo tomei como base:

o verbete nacionalismo escrito por Barbosa Lima Sobrinho

para o Dicionário Histórico-Biográfico, op. cit., pp.

2357-2362, o mesmo verbete na Enciclopedia Internacional

de las Ciencias Sociales. Vol. 7. Madrid, Aguilar,

1975, pp. 306- 310, de autoria de Hans Kohn, HOBSBAWN,

Eric. A Era das Revoluç•es: 1789-1848. 3ª ed., Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1981, capítulo sete, A Era do

8

Capital: 1848-1875. 4ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra,

1982, capítulo cinco, A Era dos Impérios: 1875-1914. 2ª

ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1988, capítulo seis e

Naç•es e Nacionalismo desde 1780. Rio de Janeiro, Paz e

Terra, 1990, passim. Esta última obra sintetiza as

reflex•es do autor sobre o tema. O seu alto grau de

erudição não impede que, ao relaxar da análise do

aspecto econômico,acredite estar o nacionalismo entrando

em declínio a partir de 1950. Ressaltando o papel de

transformação social do nacionalismo, recorri a

ANDERSON, Benedict. Nação e Consciência Nacional. São

Paulo,°tica, 1989, passim e KOHN, Hans. A era do

nacionalismo. Rio, São Paulo, Fundo de Cultura, 1962

(?), passim.

(59) BELOCH, Israel e ABREU, Alzira Alves de. (coord.) Op.

cit. pp. 2358-2359.

(60) KOHN, Hans. Nacionalismo. In: SILLS, David. (coord.)

Enciclopedia Internacional de las Ciencias Sociales.

Vol. 7 Madrid, Aguilar, 1975, p. 307.

(61) HOBSBAWN, Eric. A Era do Capital: 1848-1875. 4ª., Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1982, p. 112.

(62) HOBSBAWN, Eric. Naç•es e nacionalismo desde 1780. Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1990, 174.

(63) SOUZA, Nilson de Araújo de. Op. cit.

(64) HOBSBAWN, Eric. Op. cit., Idem.

(65) MAGALHÃES, Sérgio. Prática da emancipação nacional. 2ª

ed., Rio de Janeiro, Ediç•es Tempo Brasileiro, 1964, pp.

39-40.

(66) FURTADO, Celso. Op. cit., p. 143.

(67) O Semanário, nº 348, de 29 de agosto a 4 de setembro de

1963.

(68) O Semanário, nº 348, de 29 de agosto a 4 de setembro de

1963.

8

CONCLUS_ES

A campanha "o petróleo é nosso" é parte de um programa

mais amplo, que inclui a construção da estatal do setor

elétrico e o projeto nuclear autônomo. Os nacionalistas

têm claro que é vital a consolidação da empresa

petrolífera e esta é questão central de suas

manifestaç•es públicas, seja nas ruas, na imprensa ou no

Congresso Nacional. A defesa da Petrobrás, como procurei

mostrar, se dá na divulgação de suas primeiras

realizaç•es, apresentadas em exposiç•es de produtos

nacionais, como a organizada em janeiro de 1958 pela

UNE. Por outro lado, procura-se disseminar a instalação

de torres simbolizando a Petrobrás. Observa-se aqui a

tentativa de erigir monumentos não-oficiais intentando

fortalecer a coesão programática com o apelo ao

imaginário. Junto às torres simbólicas eram realizados

os atos em defesa do petróleo, acompanhados regularmente

pelo jornal O Semanário.

Ao contrário do petróleo, o debate em torno da questão

da eletricidade e do projeto nuclear quase que se restringe

ao Congresso e à imprensa, e, no caso do petróleo, vai exigir

longa maturação. A Eletrobrás só será criada em 1962, no

governo João Goulart;e a Comissão Nacional de Energia

Nuclear, em 1956, no governo Kubitschek.

A carta-testamento acompanha esse processo de construção

simbólica. É reproduzida e lida nas manifestaç•es e

transforma-se em profissão de fé nacionalista, constituindo-

se, sua leitura anual, por ocasião do aniversário de morte do

presidente Vargas, ritual incorporado à nossa memória

coletiva. A permanência desse

ritual até nossos dias confirma sua inclusão no que Hobsbawn

chama de "tradição inventada", em que a repetição inculca

valores e normas de comportamento. Esta repetição

implica continuidade em relação ao passado. Nesse

8

sentido, o uso que os nacionalistas fazem das figuras de

Tiradentes e Floriano Peixoto é bem representativo dessa

necessidade de elaboração simbólica.

Vargas, após o 24 de agosto, é incluído neste panteão

dos heróis nacionais. O passado transforma-se em tradição

para emprestar aos homens a força de que necessitam para

revolucionarem-se (01). No comício de 13 de março, um

espectro perpassa os gestos e palavras de Jango e da massa

presente na praça - Vargas.

No segundo momento procurei estabelecer duas tendências

principais: o movimento nacionalista revela seu pluralismo e

vitalidade com o surgimento, a partir de meados da década de

cinqüenta, de mais de uma dezena de organizaç•es, e, por sua

vez, o Estado se volta de forma mais efetiva para a formação

da consciência coletiva, em que Brasília é o exemplo dessa

preocupação e o Plano de Metas é a afirmação programática.

Fortalecido organicamente, o movimento intensifica a

conquista de adesão. O teor de seu discurso expressa a

certeza de que não basta um vago sentimento nacionalista, de

forma que é necessário razão e conhecimento da realidade

brasileira, nas palavras de Roberto Silveira (02). Em outras

palavras, é necessário transformar o sentimento coletivo de

nacionalidade em opinião pública.

A existência de duas concepç•es de nacionalismo-- o

nacionalismo desenvolvimentista e o nacionalismo militante

das diversasorganizaç•es -- revela a radicalização do debate.

Os sinais de fortalecimento do movimento nacionalista são

expressivos. Diversas organizaç•es são fundadas nesse

período. O Semanário, jornal das quais se torna porta-voz, é

fundado em 1956.

O terceiro momento é o da luta pelas reformas de base.

Há duas manifestaç•es de massa desse período marcadamente

caracterizadas por seu conteúdo nacionalista: os dois

comícios pelas reformas de base - o primeiro, realizado em

agosto de 1963; e o célebre comício de 13 de março de 1964.

O processo de equalização obtido nessas reuni•es de

massa é a face externa do desencontro em torno dos caminhos a

serem tomados. Para um setor expressivo do movimento

nacionalista, tanto o Congresso como o presidente João

8

Goulart são empecilhos sérios para as reformas. O debate em

torno de alternativas e ritmo para implementação das reformas

revela a abrangência a que chegou o movimento. Neste momento

ele já atingira setores situados a certa distância do seu

centro irradiador. O comentário do poeta Manuel Bandeira, em

1957, sobre o livro Que sabe você sobre o petróleo ?, de

Gondin da Fonseca, já prenunciava tal amplitude(03).

Dois projetos permanecem presentes em todas as

manifestaç•es, sejam nos comícios ou greves, apontando

emblematicamente para o aspecto nacional das reformas - o

controle do capital estrangeiro e a ampliação do monopólio do

petróleo, traduzido na nacionalização das refinarias.

A aprovação desses dois projetos e o início de

enfrentamento da questão agrária assinalam o amadurecimento

do projeto nacional-popular. O aumento da presença do Estado

na gestão econômica, acompanhada da intensificação da

participação popular, dilui o aspecto de "ideologia de

Estado" do nacionalismo. O projeto nacionalista, que se

articula desde a campanha "o petróleo é nosso" até 1964, tem

fortes vínculos com a sociedade. Aí reside sua força - o

nacional como apreensão das classes populares.

As determinaç•es concretas, analisadas neste trabalho

tendo como base o movimento nacional centrado nas classes

populares, articulam-se com o sistema capitalista mundial e

sugerem graves contradiç•es entre o projeto nacional-popular

e o processo de expansão estrangeira no país.

8

NOTAS

(01) MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. In: Os

pensadores. 2ª ed., São Paulo, Abril Cultural, 1978, p.

329.

(02)MIRANDA, Maria Augusta Tibiriçá de. O Petróleo é Nosso. A

luta contra o "entreguismo", pelo monopólio estatal.

Petrópolis, Vozes, 1983, pp. 416-417.

(03)Contracapa de Que sabe você sobre o petróleo ? 5ª ed.,

Rio de Janeiro, Livraria São José, 1957.

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8

XAVIER, Alberto. Brasília e Arquitetura Moderna

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8

ANEXOS

8

ANEXO I

CARTA-TESTAMENTO DE GET_LIO VARGAS

"Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo

coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim. Não me

acusam, insultam; não me combatem, caluniam - e não me dão o

direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a

minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre

defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino

que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação

dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me

chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de

libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de

renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha

subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos

nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho.

A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso.

Contra a Justiça da revisão do salário mínimo se

desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na

potencialização de nossas riquezas através da Patrobrás; mal

começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A

Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o

trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja

independente. Assumi o Governo dentro da espiral

inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros

da empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas

declaraç•es de valores do que importávamos existiam fraudes

constatadas de mais de 100 milh•es de dólares por ano. Veio a

crise do café, valorizou-se o nosso produto. Tentamos

defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão

sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.

Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a

uma pressão constante, incessante, tudo suportando em

silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para

defender o povo que agora se queda desamparado. Nada mais vos

posso dar a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o

sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro,

eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de

estar sempre ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa

porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós

e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu

pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá

unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de

8

meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e

manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio

respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram,

respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me

liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo

não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para

sempre em sua alma e meu sangue terá o preço do seu resgate.

Lutei contra a espolioação do Brasil. Lutei contra a

espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as

infâmias, a calúnia, não abateram meu ânimo. Eu vos dei a

minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio.

Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e

saio da vida para entrar na História."

ANEXO II

DISCURSO DO PRESIDENTE JOão GOULART, EM 13 DE MARÇO DE

1964

"(...) Estaríamos, assim, brasileiros, ameaçando o

regime se nos mostrássemos surdos aos reclamos da nação,

desta Nação e desses reclamos que, de Norte a Sul, de Leste a

Oeste, levantam o seu grande clamor pelas reformas de base e

de estrutura, sobretudo pela reforma agrária, que será o

complemento da abolição do cativeiro para dezenas de milh•es

de brasileiros, que vegetam no interior, em revoltantes

condiç•es de miséria. Ameaça à democracia, enfim, não é vir

confraternizar com o povo na rua. Ameaça à democracia é

empulhar o povo brasileiro, é explorar os seus sentimentos

cristãos, na mistificação de uma indústria do anticomunismo,

insurgindo o povo até contra os grandes e iluminados

ensinamentos dos grandes e santos Papas que informam notáveis

pronunciamentos, das mais expressivas figuras do episcopado

nacional. O inolvidável Papa João XXIII é que nos ensina,

povo brasileiro, que a dignidade da pessoa humana exige,

normalmente como fundamento natural para a vida, o direito e

o uso dos bens da terra, ao qual corresponde a obrigação

fundamental de conceder uma propriedade para todos. É dentro

desta autêntica doutrina que o Governo brasileiro vem

procurando situar sua política social, particularmente no que

diz respeito à nossa realidade agrária. O cristianismo nunca

foi o escudo para os privilégios condenados para o Santo

Padre, nem também, brasileiros, os rosários podem ser

levantados contra a vontade do povo e as suas aspiraç•es mais

legítimas. Não podem ser levantados os rosários da fé contra

o povo, que tem fé numa justiça social mais humana e na

8

dignidade das suas esperanças. Os rosários não podem ser

erguidos contra aqueles que reclamam a discriminação da

propriedade da terra, hoje ainda em mãos de tão poucos, de

tão pequena minoria (...).

(...) De minha parte, à frente do Poder Executivo, tudo

continuarei fazendo para que o processo democrático siga o

caminho pacífico, para que sejam derrubadas as barreiras que

impedem a conquista de novas etapas e do progresso. E podeis

estar certos, trabalhadores, de que juntos, Governo e povo,

operários, camponeses, militares, estudantes, intelectuais e

patr•es brasileiros que colocam os interesses da pátria acima

de seus interesses, haveremos de prosseguir, e prosseguir de

cabeça erguida, a caminhada da emancipação econômica e

emancipação social do país. O nosso lema, o nosso lema,

trabalhadores do Brasil, é progresso com justiça, e

desenvolvimento com igualdade. A maioria dos brasileiros já

não se conforma com a ordem social imperfeita, injusta e

desumana. Os milh•es que nada têm impacientam-se com a

demora, já agora quase insuportável, em receber os dividendos

de um progresso tão duramente construído, mas construído

também com o esforço dos trabalhadores e o sacrifício dos

humildes. Vamos continuar lutando pela construção de novas

usinas, pela abertura de novas estradas, pela implantação de

mais fábricas, de novas escolas, de hospitais para o povo

sofredor; mas sabemos, trabalhadores, que nada disso terá

sentido profundo se ao homem não for assegurado o sagrado

direito ao trabalho e a uma mais justa participação no

desenvolvimento nacional (...).

(...) A reforma agrária não é capricho de um Governo ou

programa de um partido. É produto da inadiável necessidade de

todos os povos do mundo. Aqui, no Brasil, constitui a legenda

mais viva da esperança do nosso povo, sobretudo daqueles que

labutam no campo.

A reforma agrária é também uma imposição progressista do

mercado interno, que necessita aumentar a sua produção para

sobreviver.

Os tecidos e os sapatos sobram nas prateleiras das lojas

e as nossas fábricas estão produzindo muito abaixo de sua

capacidade. Ao mesmo tempo em que isso acontece, as nossas

populaç•es mais pobres vestem farrapos e andam descalças,

porque não têm direito para comprar.

Assim, a reforma agrária é indispensável, não só para

aumentar o nível de vida do homem do campo, mas, também, para

dar mais trabalho às indústrias, e melhor remuneração ao

trabalhador urbano.

8

Interessa, por isso, também a todos os industriais e aos

comerciantes. A reforma agrária é necessária, enfim, à nossa

vida social e econômica, para que o País possa progredir, em

sua indústria e no bem-estar do seu povo.

Como garantir o direito de propriedade autêntica quando,

dos quinze milh•es de brasileiros que trabalham a terra, no

Brasil, apenas dois milh•es e meio são proprietários ?

O que estamos pretendendo fazer no Brasil, pelo caminho

da reforma agrária, não é diferente, pois, do que se fez em

todos os países desenvolvidos do mundo. É uma etapa de

progresso que precisamos conquistar e haveremos de conquistar

(...).

(...) Tenho autoridade para lutar pela reforma da atual

Constituição, porque esta reforma é indispensável e porque o

seu objetivo único e exclusivo é abrir o caminho para a

solução harmônica dos problemas que afligem ao nosso povo.

Não me animam, trabalhadores, - e é bom que a Nação me ouça -

quaisquer propósitos de ordem pessoal. Os grandes

beneficiários das reformas serão, acima de todos, o povo

brasileiro e os governos que me sucederem. A eles,

trabalhadores, desejo entregar uma nação engrandecida,

emancipada e cada vez mais orgulhosa de si mesma, por ter

resolvido mais uma vez, e pacificamente, os graves problemas

que a história nos legou.

Dentro de 48 horas vou entregar à consideração do

Congresso Nacional a mensagem presidencial deste ano.

Nela, estão claramente expressas as intenç•es e os

objetivos deste Governo. Espero que os senhores

congressistas, em seu patriotismo, compreendam o sentido

social da ação governamental, que tem por finalidade acelerar

o progresso deste País e assegurar aos brasileiros melhores

condiç•es de vida e trabalho, pelo caminho da paz e do

entendimento, isto é, pelo caminho reformista, pacífico e

democrático.

Mas estaria faltando ao meu dever se não transmitisse,

também, em nome do povo brasileiro, em nome destas cento e

cinqüenta ou duzentas mil pessoas que aqui estão, caloroso

apelo ao Congresso Nacional, para que venha ao encontro das

reivindicaç•es populares, para que, em seu patriotismo, sinta

os anseios da Nação, que quer abrir caminho, pacífica e

democraticamente, para melhores dias. Mas também,

trabalhadores, quero referir-me a um outro ato que acabo de

assinar, interpretando os sentimentos nacionalistas deste

País. Acabei de assinar, antes de dirigir-me para esta grande

8

festa cívica, o decreto de encampação de todas as refinarias

particulares (...).

(...) A partir de hoje, trabalhadores brasileiros, a

partir deste instante, as refinarias de Capuava, Ipiranga,

Manguinhos, Amazonas e Destilaria Rio-Grandense passam a

pertencer ao povo, passam a pertencer ao patrimônio nacional.

Procurei, trabalhadores, depois de estudos cuidadosos,

elaborados por órgãos técnicos, depois de estudos profundos,

procurei ser fiel ao espírito da Lei nº 2.004, lei que foi

inspirada nos ideais patrióticos e imortais de um brasileiro

que também continua imortal em nossa alma e nosso espírito.

Ao anunciar, à frente do povo reunido em praça pública,

o decreto de encampação de todas as refinarias de petróleo

particulares, desejo prestar homenagem de respeito àquele que

sempre esteve presente nos sentimentos do nosso povo, o

grande e imortal Presidente Getúlio Vargas.

O imortal e grande patriota tombou, mas o povo continua

a caminhada, guiado pelos seus ideais. E eu, particularmente,

vivo hoje momento de profunda emoção ao poder dizer que, com

este ato, soube interpretar o sentimento do povo brasileiro.

Alegra-me ver, também, o povo reunido para prestigiar

medidas como esta, da maior significação para o

desenvolvimento do País e que habilita o Brasil a aproveitar

melhor as suas riquezas minerais, especialmente as riquezas

criadas pelo monopólio do petróleo. O povo estará sempre

presente nas ruas e nas praças públicas, para prestigiar um

Governo que pratica atos como estes, e também para mostrar às

forças reacionárias que há de continuar a sua caminhada, no

rumo da emancipação nacional.

Na mensagem que enviei à consideração do Congresso

Nacional estão igualmente consignadas duas outras reformas

que o povo brasileiro reclama, porque é exigência do nosso

desenvolvimento e da nossa democracia. Refiro-me à reforma

eleitoral, à reforma ampla que permita a todos os brasileiros

maiores de 18 anos ajudar a decidir os seus destinos, que

permita a todos os brasileiros que lutam pelo engrandecimento

do País a influir nos destinos gloriosos do Brasil. Nesta

reforma, pugnamos pelo princípio democrático, princípio

democrático fundamental, de que todo alistável deve ser

também elegível.

Também está consignada na mensagem ao Congresso a

reforma universitária, reclamada pelos estudantes

brasileiros, pelos universitários, classe que sempre tem

8

estado corajosamente na vanguarda de todos os movimentos

populares e nacionalistas.

Ao lado dessas medidas e desses decretos, o Governo

continua examinando outras providências de fundamental

importância para a defesa do povo, especialmente das classes

populares.

Dentro de poucas horas, outro decreto será dado ao

conhecimento da Nação. É o que vai regulamentar o preço

extorsivo dos apartamentos e residências desocupados, preços

que chegam a afrontar o povo e o Brasil, oferecidos até

mediante o pagamento em dólares. Apartamento, no Brasil, só

pode e só deve ser alugado em cruzeiros, que é dinheiro do

povo e a moeda deste País. Estejam tranqüilos que dentro de

em breve este decreto será uma realidade.

E realidade há de ser também a rigorosa e implacável

fiscalização para que seja cumprido. O Governo, apesar dos

ataques que tem sofrido, apesar dos insultos, não recuará um

centímetro sequer na fiscalização que vem exercendo contra a

exploração do povo. E faço um apelo ao povo para que ajude o

Governo na fiscalização dos exploradores do povo, que são

também exploradores do Brasil. Aqueles que desrespeitarem a

lei, explorando o povo - não interessa o tamanho de sua

fortuna, nem de seu poder, esteja ele em Olaria ou na Rua do

Acre - hão de responder perante a lei pelo seu crime.

Aos servidores públicos da Nação, aos médicos, aos

engenheiros do serviço público, que também não me têm faltado

com o seu apoio e o calor de sua solidariedade, posso afirmar

que suas reivindicaç•es justas estão sendo objeto de estudo

final e que em breve serão atendidas. Atendidas porque o

Governo deseja cumprir o seu dever com aqueles que

permanentemente cumprem o seu para com o País (...)."

8

ANEXO III

QUADRO DE ORGANIZAÇ_ES NACIONALISTAS

+------------------------------------------------------------

-------------------------------------------------------------

---------------------------------------+

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E

¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão

¦ OBSERVAÇ_ES ¦

¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão

¦ CARACTERµSTICAS ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

+-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Liga de Emancipa-¦* Abril de 1954¦* Membros do Centro de

Estudos¦ ¦* Junho de 1956

¦* A Liga de Emancipação¦

¦ ção Nacional ¦ ¦ e Defesa do Petróleo

e da¦ ¦

¦ Nacional foi extinta no¦

¦ ¦ ¦ Economia Nacional

¦ ¦

¦ governo JK. ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente Naciona-¦* 9/06/1955 ¦* Principal dirigente:

Coronel¦* Definia nacionalismo como "o regi-¦* Interrompeu

suas ativi-¦ * Durante a campanha eleito-¦

¦ lista ¦ ¦ Nemo Canabarro Lucas

¦ me de liberdade e igualdade das¦ dades em novembro

de¦ ral de 1960, a Frente pro-¦

¦ ¦ ¦

¦ naç•es e dos homens dentro de cada¦ 1955, dando lugar

ঠcurou difundir a idéia da¦

¦ ¦ ¦

¦ nação." ¦ Frente de

Novembro. ɦ criação do Partido Nacio-¦

8

¦ ¦ ¦

¦ ¦ reativada após o

fecha-¦ nalista. ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ mento desta, em 1956.

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ Suas atividades são

en-¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ cerradas

definitivamente¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ em 1961, quando é

subs-¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ tituída pelo

Partido¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ Nacionalista.

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* ISEB - Instituto¦* 14/07/55 ¦* Criado no governo

Café¦* Dar conteúdo ideológico ao desen-¦* 1964, com o

golpe¦ ¦

¦ Superior de Estu-¦ ¦ Filho, com base em

proposta¦ volvimento nacional. ¦ militar.

¦ ¦

¦ dos Brasileiros. ¦ ¦ de um grupo de

intelectuais¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ conhecido como

"Grupo de¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ Itatiaia".

¦ ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente Parlamen-¦* 1956, após a¦* Formada por

representantes¦* Nota da FPN apoiando a política¦

¦* Dividida nas eleiç•es¦

¦ tar Nacionalista.¦ posse de JK. ¦ de vários partidos,

sendo¦ externa de Jânio. ¦

¦ presidenciais de 1960,¦

¦ ¦ ¦ que a maioria (60%)

era de¦ ¦

¦ quando uma parte apoia¦

8

¦ ¦ ¦ petebistas. Fundada

pela Ala¦ ¦

¦ Jânio; e outra, Lott. ¦

¦ ¦ ¦ Moça do PSD.

¦ ¦

¦ Novamente fragmentada em¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ 1962. ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ A presença de Leonel¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ Brizola na liderança provo-¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ca o afastamento dos¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ deputados moderados. ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente 11 de¦* Março de 1956¦* Militares petebistas,

comu-¦* Dar conteúdo político ao movimento¦* Novembro de

1956, quando¦* Promove manifestação em¦

¦ Novembro. ¦ ¦ nistas e

parlamentares. ¦ de 11 de novembro de 1955. ¦

também é preso o Coronel¦ frente ao Ministério da¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ Nemo Canabarro, líder

do¦ Guerra no primeiro aniver-¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦ movimento.

¦ sário do 11 de Novembro,¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ que atrai cerca de 150.000 ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ pessoas. ¦

+------------------------------------------------------------

-------------------------------------------------------------

---------------------------------------+

+------------------------------------------------------------

-------------------------------------------------------------

---------------------------------------+

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

8

¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E

¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão

¦ OBSERVAÇ_ES ¦

¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão

¦ CARACTERµSTICAS ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

+-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* GAP - Grupo de¦* 1957 ¦* Bloco Parlamentar

composto¦ ¦

¦ ¦

¦ Ação Política ¦ ¦ por mais de cem

deputados e¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ contando com o

apoio de¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ cerca de 40 da

minoria. ¦ ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* MNB - Movimento¦* Junho de 1957¦* Professores e

funcionários¦ ¦* 1958

¦* Unifica-se em 1958 com a¦

¦ Nacionalista Bra-¦ ¦ da Faculdade

Nacional de¦ ¦

¦ Frente Nacionalista Brasi-¦

¦ sileiro. ¦ ¦ Filosofia.

¦ ¦

¦ leira, formando nova enti-¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ dade, intitulada Movimento¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ Nacionalista Brasileiro. ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente Naciona-¦ ¦* Estudantes vinculados

à UNE.¦* Manifesto publicado em "O Semaná-¦* 1958

¦* Unifica-se, em 1958, com o¦

¦ lista Brasileira.¦ ¦

¦ rio", de 1 a 8/08/57. ¦

¦ MNB, formando nova entidade¦

8

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ intitulada MNB (Movimento¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ Nacionalista Brasileiro. ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* MNB - Movimento¦* 1958 (fruto¦* Estudantes vinculados

à UNE,¦* A primeira Convenção Nacional do¦ 1964, com

o golpe¦ ¦

¦ Nacionalista Bra-¦ da fusão en-¦ professores e

funcionários¦ MNB, realizada de 9 a 11/09/60,¦ militar.

¦ ¦

¦ sileiro. ¦ tre a FNB e o¦ da Faculdade

Nacional de¦ define a estrutura organizativa do¦

¦ ¦

¦ ¦ antigo MNB). ¦ Filosofia.

¦ movimento e homologou as candida-¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ turas do Marechal Lott e de João¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ Goulart à Presidência e à Vice-¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ Presidência da República. ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Liga Nacionalista¦* 1959 (posse¦* Gabriel Passos

(Presidente);¦* Defesa da independência econômica¦

¦* Não chegou a ter atuação¦

¦ Brasileira. ¦ da primeira¦ Sérgio MAGALHÃES

(Vice); e¦ do povo brasileiro como fundamento¦

¦ expressiva. ¦

¦ ¦ diretoria). ¦ Anderson Mascarenhas

(Secre-¦ e condição de sua liberdade¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ tário Geral).

¦ política. ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente de Liber-¦ * 24/10/1961 ¦* Grupo que havia lutado

pela¦* Além do ideário nacionalista, tam-¦ * Após as

eleiç•es de¦ ¦

8

¦ tação Nacional. ¦ ¦ posse de João

Goulart,¦ bém presente em outras organiza-¦ 1962.

¦ ¦

¦ ¦ ¦ incluindo os

governadores¦ ç•es, a FLN enfatizava o seu cará-¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ Mauro Borges e Leonel

Brizo-¦ ter democrático. Aqui os comunis-¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ la, parlamentares da

FPN e¦ tas não seriam considerados "ove-¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ membros do MNB e UNE.

¦ lhas negras." ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* CPC - Centro Po-¦* Dezembro de¦* Intelectuais de

esquerda e¦* Defendia a relação arte/processos¦

¦* Antecedente: Teatro de¦

¦ pular de Cultura.¦ 1961/1962 ¦ UNE (Oduvaldo Viana

Filho,¦ materiais; era necessário que o¦

¦ Arena (SP) e UNE Volante. ¦

¦ ¦ ¦ Leon Hirzman e

C. E.¦ povo entendesse o mundo em que¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦ Martins).

¦ vive, para romper os limites da¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ situação opressiva. ¦

¦ ¦

¦-------------------+---------------+------------------------

------+------------------------------------+-----------------

---------+-----------------------------¦

¦* Frente de Mobili-¦* 1962 ¦* Sucedâneo da FLN, era

também¦* Atuava como grupo de pressão junto¦

¦* Esteve presente no comércio¦

¦ zação Popular ¦ ¦ liderado por Leonel

Brizola ¦ ao presidente João Goulart. ¦

¦ das Reformas de 13 de março¦

¦ ¦ ¦ e reunia deputados da

FPN,¦ ¦

¦ de 1964. ¦

¦ ¦ ¦ sindicalistas e

estudantes. ¦ ¦

¦ ¦

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8

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¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

¦ ORGANIZAÇão ¦ CRIAÇão ¦ INICIATIVA E

¦ FINALIDADES E/OU ¦ EXTINÇão

¦ OBSERVAÇ_ES ¦

¦ ¦ ¦ COMPOSIÇão

¦ CARACTERµSTICAS ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

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¦* Movimento Nacio-¦* 05/07/1963 ¦* Esposas de

parlamentares da¦ ¦

¦ ¦

¦ nalista Feminino.¦ ¦ FPN.

¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦ ¦

¦ ¦

¦ ¦

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