museus, turismo e território: como podem os equipamentos

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Museus, Turismo e Território: Como podem os equipamentos culturais tornar-se importantes atracções turísticas regionais? Alexandra Rodrigues Gonçalves Resumo – As atracções culturais estão a tornar-se componentes principais dos destinos turísticos. No entanto, a relação entre o turismo e os locais patrimoniais, e neste caso com os museus, possui alguns pontos de conflito. O planeamento e a gestão contemporânea tem que incluir o turista como um visitante importante da atracção cultural, para que os benefícios potenciais possam ser maximizados e o visitante possa ser satisfeito. As funções tradicionais do património cultural estão a ser reinventadas e hoje os visitantes esperam experimentar o património. Os museus e outras atracções culturais devem tornar-se atracções turísticas e poderão assim evitar a possibilidade de ocorreram impactes negativos resultantes da interacção com o turismo. Os riscos e as formas de ultrapassar os impactes potenciais são também referidos. Palavras-chave - Gestão do Património Cultural; Turismo e Território; Museus e Experiência Turística. **** Introdução A cultura assume-se cada vez mais como uma forma de lazer, como uma opção de ocupação de tempos livres, à disposição de uma sociedade mais instruída e com mais rendimento disponível. Assiste-se a uma consciência mais generalizada da importância da cultura como factor de desenvolvimento das sociedades. Por outro lado, a visão de que a arte e a cultura se constituem como um domínio do bem-estar público também está ultrapassada. Regra geral, os profissionais do turismo não possuem um conhecimento aprofundado de gestão do património cultural e por sua vez, os responsáveis pelo património cultural encontram em vários documentos internacionais (Cartas, Declarações, Convenções) algum suporte à gestão destes locais, que possibilita uma utilização sustentável com benefícios para a cultura e o turismo. O turismo assume um papel associado à transformação, ao desenvolvimento, ao marketing e à orientação do produto, enquanto que a gestão do património cultural é a proprietária dos bens, assumindo a responsabilidade de os gerir e de evitar os impactes resultantes da sua visitação. A organização institucional da cultura e do património difere de país para país e tende a reflectir as diferentes tradições administrativas, realidades sociais e políticas. Nos últimos 20 anos tem-se assistido a um aumento exponencial de projectos culturais, pela proliferação de festivais e encontros artísticos, pelo início da construção de espaços qualificados para a acção cultural: bibliotecas, cine teatros, auditórios, anfiteatros, centros culturais, museus. A cultura tem ganho uma dimensão

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  • Museus, Turismo e Territrio:

    Como podem os equipamentos culturais tornar-se importantes atraces tursticas regionais?

    Alexandra Rodrigues Gonalves

    Resumo As atraces culturais esto a tornar-se componentes principais dos destinos tursticos. No

    entanto, a relao entre o turismo e os locais patrimoniais, e neste caso com os museus, possui alguns

    pontos de conflito.

    O planeamento e a gesto contempornea tem que incluir o turista como um visitante importante da

    atraco cultural, para que os benefcios potenciais possam ser maximizados e o visitante possa ser

    satisfeito.

    As funes tradicionais do patrimnio cultural esto a ser reinventadas e hoje os visitantes esperam

    experimentar o patrimnio. Os museus e outras atraces culturais devem tornar-se atraces tursticas

    e podero assim evitar a possibilidade de ocorreram impactes negativos resultantes da interaco com

    o turismo. Os riscos e as formas de ultrapassar os impactes potenciais so tambm referidos.

    Palavras-chave - Gesto do Patrimnio Cultural; Turismo e Territrio; Museus e Experincia

    Turstica.

    ****

    Introduo

    A cultura assume-se cada vez mais como uma forma de lazer, como uma opo de ocupao de

    tempos livres, disposio de uma sociedade mais instruda e com mais rendimento disponvel.

    Assiste-se a uma conscincia mais generalizada da importncia da cultura como factor de

    desenvolvimento das sociedades. Por outro lado, a viso de que a arte e a cultura se constituem como

    um domnio do bem-estar pblico tambm est ultrapassada.

    Regra geral, os profissionais do turismo no possuem um conhecimento aprofundado de gesto

    do patrimnio cultural e por sua vez, os responsveis pelo patrimnio cultural encontram em vrios

    documentos internacionais (Cartas, Declaraes, Convenes) algum suporte gesto destes locais,

    que possibilita uma utilizao sustentvel com benefcios para a cultura e o turismo. O turismo assume

    um papel associado transformao, ao desenvolvimento, ao marketing e orientao do produto,

    enquanto que a gesto do patrimnio cultural a proprietria dos bens, assumindo a responsabilidade

    de os gerir e de evitar os impactes resultantes da sua visitao.

    A organizao institucional da cultura e do patrimnio difere de pas para pas e tende a reflectir

    as diferentes tradies administrativas, realidades sociais e polticas. Nos ltimos 20 anos tem-se

    assistido a um aumento exponencial de projectos culturais, pela proliferao de festivais e encontros

    artsticos, pelo incio da construo de espaos qualificados para a aco cultural: bibliotecas, cine

    teatros, auditrios, anfiteatros, centros culturais, museus. A cultura tem ganho uma dimenso

  • PENICHE_ Congresso Internacional Turismo da regio de Leiria e Oeste_22.23 de Novembro de 2007

    Alexandra R. Gonalves: Museus, Turismo e Territrio

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    estratgica e os museus, no raramente promovem actividades tursticas que esto na base de

    economias locais e regionais. Na actualidade, os turistas representam uma parte importante das visitas

    aos museus, tornando-se em alguns casos uma percentagem expressiva do seu pblico.

    A discusso sobre os museus, o turismo e o seu territrio parte de uma clarificao do conceito

    de museu actual e da emergncia de novos paradigmas na sociedade, aos quais o museu do futuro no

    poder ficar indiferente, sobretudo, como forma de potenciar a sua atractividade junto do pblico

    turista, mas tambm se se pretende afirmar como equipamento de lazer. Consciente dos desafios desta

    relao procura-se demonstrar com este trabalho que existem benefcios claros resultantes de uma

    aproximao entre estes campos.

    A partilha de conhecimento entre estes dois poderes o turismo e os museus ser fundamental

    para o dilogo entre estas duas reas, e o seu sucesso depender da discusso conjunta de formas de

    trabalho em equipa, para que objectivos comuns e benefcios mtuos possam ser alcanados, com

    reflexos positivos junto das comunidades locais.

    Neste artigo, um dos assuntos discutidos a funo do museu. Outros aspectos incluem: o

    museu como produto turstico; a relao entre museus, territrio e experincia turstica; museus,

    turismo e comunidade local; a gesto e o marketing dos museus; e estratgias com vista ao

    desenvolvimento dos museus como atraces tursticas. Alguns autores argumentam que existe em

    curso um processo global de homogeneizao em face da estandardizao de ofertas entre diferentes

    destinos tursticos, pelo que, se estabelece como essencial o estmulo diversidade cultural, que as

    abordagens mais prximas do territrio e dos seus recursos tendem a evidenciar.

    O reconhecimento da importncia da sustentabilidade cultural j foi apreendido pelo turismo

    cultural, e os agentes do turismo esto hoje conscientes que o futuro da indstria turstica depende da

    proteco dos recursos ambientais, patrimoniais e culturais de cada regio.

    Uma vez identificada a metodologia da investigao, ser estabelecido um breve

    enquadramento conceptual, onde a importncia de planear o turismo com base nos recursos culturais e

    naturais do territrio, as necessidades de cooperao entre os agentes dos vrios domnios, a

    emergncia de novos consumos tursticos e a inovao na gesto dos espaos museolgicos, so

    alguns dos tpicos mais relevantes a abordar. Posteriormente, desenvolve-se anlise emprica aplicada

    ao territrio do Algarve, cujos resultados se espera contribuam para um alargamento da discusso ao

    nvel nacional.

    1. O problema de investigao e a metodologia

    Este trabalho centra-se numa avaliao do museu enquanto equipamento ao dispor do turista e

    representao da cultura e da identidade de um territrio, ou de uma comunidade. A discusso da

    temtica Museus, Turismo e Territrio emerge como problemtica de interesse relacionada com a

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    investigao de Doutoramento em desenvolvimento com o tema: A cultura material, a musealizao

    e o turismo: a valorizao da experincia turstica nos museus nacionais..

    Outros trabalhos da autora sobre o turismo cultural, as atraces culturais e as comunidades

    locais, e a interpretao do patrimnio cultural, serviram tambm de suporte a esta reflexo,

    destacando-se: O patrimnio cultural nas cidades como oferta complementar ao produto sol e praia

    no Algarve, 2003 (tese de mestrado); O Algarve: a interpretao do seu patrimnio arqueolgico e o

    turismo, 2005; Museus, Turismo e Comunidade Local, 2006; Managing Cultural Attractions and

    Tourism The relationship between Tourism, Museums and Local Communities, 2007.

    1.1 Objectivos e tcnicas de investigao

    No decurso da reviso de literatura efectuada, determinou-se como problema de investigao:

    "Podem os museus tornar-se atraces tursticas principais?

    Como se caracteriza a actual relao entre os Museus e Turismo?

    Outras questes relevantes emergiram da recolha de informao secundria e de outras leituras

    complementares: Como se define o museu actual e o seu futuro? Que relaes se estabelecem entre o

    museu e a comunidade? Que desafios resultam da oferta do museu como atraco turstica?

    Numa tentativa de dar resposta a estas questes, estabeleceram-se os seguintes objectivos

    principais:

    Caracterizar a actual relao entre os museus e o turismo, e os principais pontos de convergncia e divergncia entre os dois domnios.

    Determinar o actual modelo de gesto do museu. Analisar o potencial de utilizao dos museus como recursos tursticos. Apresentar e discutir propostas de desenvolvimento dos museus como plos de atraco turstica a partir de uma base territorial.

    A recolha de informao secundria tambm se determinou essencial para a caracterizao do

    panorama museolgico actual em Portugal (estatsticas oficiais de visitantes, estudos de pblicos) e

    para a definio do estado da arte em relao aos estudos aplicados ao turismo cultural e, em

    particular, aos museus e turismo (documentao de organismos internacionais, estudos e investigao

    publicada a nvel internacional, documentao dos organismos nacionais, tais como da Rede

    Portuguesa de Museus e do Instituto dos Museus e da Conservao, estudos e trabalhos desenvolvidos

    no territrio nacional).

    Por sua vez, a informao primria que se apresenta resulta da combinao de vrias tcnicas de

    recolha e anlise de dados:

    1. Entrevista exploratria semi-estruturada para avaliar como perspectiva o/a responsvel pelo museu o relacionamento entre o museu e o turismo; tendo utilizado a anlise de contedo como tcnica para o tratamento da informao obtida a anlise de contedo;

    2. Questionrio tcnico desenvolvimento de uma ficha do museu que acrescenta ficha do museu da Rede Portuguesa de Museus, elementos identificados pela autora como essenciais

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    para o turismo e o turista (enquanto pblico do museu).

    3. Observao participante no sentido de avaliar algumas das questes referidas nas entrevistas e verificar constrangimentos e potencialidades resultantes do caso de cada museu em particular.

    4. Anlise textual a partir da recolha de casos de estudo, internacionais e nacionais, disponveis sobre as temticas relacionadas.

    Acrescer que a anlise de contedo um dos mtodos de anlise utilizados em metodologias

    qualitativas e pressupe, no caso das entrevistas, a transformao dos registos orais em textos que se

    codificam, criando categorias a partir da leitura, que tm por base a relevncia da taxonomia na sua

    relao com o enquadramento emprico de onde emergem, o que envolve reflexo e o questionar das

    categorias e cdigos a partir do contexto real (Jennings, 2005).

    Optou-se por uma utilizao de metodologias diversas porque possibilita uma maior riqueza da

    informao recolhida e, em simultneo, uma confirmao (ou no) da investigao qualitativa baseada

    na entrevista semi-estruturada. Esta abordagem insere-se nas novas tendncias do paradigma do

    relativismo que defende que as tcnicas de investigao e de anlise de dados devem ser

    seleccionadas e combinadas em face dos objectivos da investigao. A entrevista semi-estruturada

    possibilita a manuteno de um tipo de conversao com um grau de profundidade relativa e menor

    grau de subjectividade que numa entrevista no estruturada (Jennings, 2005).

    No conjunto desenvolveram-se quatro entrevistas (Albufeira, Faro, Portimo e Tavira) junto dos

    responsveis dos museus do Algarve (integrados na Rede Portuguesa de Museus), entre Agosto e

    Outubro, tendo determinado sete pontos de reflexo, em torno das quais se desenvolveu a entrevista

    (Anexo I). Na anlise emprica do panorama museolgico regional e da sua relao com o turismo

    sero tambm utilizados alguns dos resultados do inqurito por questionrio administrado junto de 60

    residentes de Faro entre Outubro e Novembro de 20061.

    O trabalho resulta de uma abordagem regional fragmentada (pois integra apenas os quatro

    museus do Algarve da Rede Portuguesa de Museus) mas considera-se que as mesmas questes de

    investigao so facilmente transpostas para uma qualquer realidade geogrfica (quer outra regio,

    quer mbito nacional) porque os seus fundamentos tericos tm uma base internacional. Certamente

    outras tendncias podero ser identificadas se a investigao assumir um mbito mais alargado,

    enriquecendo os contributos para a definio de novos modelos de gesto e de planeamento dos

    museus, enquanto equipamentos culturais mais atractivos e competitivos na resposta ao pblico

    turista.

    2. Enquadramento conceptual Museus, Turismo e Territrio

    1 Os inquritos foram aplicados em 3 pontos principais da cidade: no Museu Municipal de Faro; na Biblioteca Municipal de Faro e na Baixa Comercial da cidade. O principal objectivo da investigao foi avaliar a relao existente entre o museu, a comunidade e o turismo. Foi desenvolvido um pr teste de 10 questionrios junto de alunos do Curso Superior de Turismo da Universidade do Algarve. Os pr requisitos definidos para responderem ao questionrio foram: viver no concelho de Faro, ter mais de 15 anos e ter visitado o museu. Para o tratamento e anlise dos dados estatsticos utilizou-se o SPSS (Statistical Package for Social Sciences).

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    Conforme referido e sistematizado na Figura 1, a temtica apresenta dois tipos de inter relaes

    chave que se props analisar, que constituem: por um lado, a relao dos museus com o territrio e a

    comunidade que nele vive; e por outro lado, a relao museus e turismo. Identificam-se igualmente

    alguns pontos de contacto e de conflito que podem emergir nesta inter relao, procurando apontar

    aces e estratgias de cooperao que esto a emergir nos domnios dos museus e do turismo.

    A actividade turstica utiliza a singularidade e as especificidades dos locais como foras

    principais de atraco dos destinos. O turismo por sua vez, tem-se relacionado com o patrimnio

    cultural concebendo uma grande variedade de produtos culturais, contudo, esta relao nem sempre

    tem sido equilibrada. Os recursos econmicos e financeiros adicionais que o turismo pode gerar para a

    conservao e preservao do patrimnio cultural so os benefcios mais apontados (McKercher e du

    Cross, 2002; Russo e Van der Borg, 2002).

    A sociedade actual enfrenta hoje novos desafios que tm determinado o crescimento de uma

    viso sustentvel, assente na valorizao e preservao de recursos endgenos, que por sua vez, tem

    contribudo para que o patrimnio cultural assuma maior importncia enquanto factor de

    desenvolvimento local e regional (Gonalves, 2003; Herbert, 1995; Hernndez e Tresseras, 2001;

    Nuryanti, 1996).

    Figura n.1 Base conceptual

    Fonte: autora, 2007

    A utilizao do patrimnio cultural pelo turismo revela-se ainda um assunto de alguma

    sensibilidade, sentindo o turismo como uma ameaa (Herbert, 1995). O patrimnio cultural pode ser

    concebido como um recurso principal para a comunidade, o que exige uma utilizao equilibrada.

    Neste contexto, os museus so parte de uma unidade global e parceiros privilegiados, no dilogo entre

    passado e futuro, todavia, na actual sociedade do lazer, disputam o nosso tempo livre com um cada vez

    maior nmero de atraces.

    Existe uma extensa literatura disponvel associada s questes do patrimnio cultural e do

    turismo que se procuram sistematizar nos vrios quadros includos neste ponto. Destacam-se as

    Turismo

    Territrio Museu

    Comunidade

    Turismo

    Territrio

    Turismo

    Territrio Museu

    Comunidade

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    diferenas de estrutura, objectivos, agentes envolvidos, utilizao dos bens e organismos que os

    representam (Tabela 1). Algumas interaces positivas tambm j foram apontadas:

    A cultura e o turismo comeam a definir objectivos econmicos em conjunto, como resultado dos benefcios mtuos j identificados.

    O processo de transformao dos recursos culturais em produtos tursticos pode constituir-se como um incentivo para revitalizar a identidade cultural da comunidade.

    O patrimnio cultural contribui para um ambiente favorvel para a incubao e desenvolvimento de projectos tursticos, que podem criar condies para a inovao e diversificao dos produtos tursticos e dos destinos, respondendo a novas necessidades do mercado turstico (Jansen-Verbeke and Lierois, 1999).

    O turismo com base no patrimnio cultural mais do que a observao da arquitectura, da

    histria ou da natureza. verdade que relativamente fcil promover o patrimnio cultural atravs de

    apresentaes descontextualizadas e sem significado (ou com adulterao desse significado) (Phelps,

    1994) e caber sobretudo a esses locais a responsabilidade de apresentar e interpretar o seu patrimnio

    para o seu pblico atravs dos seus artefactos. Os edifcios histricos e os monumentos j se

    constituram como atraces principais h longa data, no entanto, relativamente recente o

    reconhecimento do turismo cultural e patrimonial como um sector distinto da vastido da indstria

    turstica (Prentice e Light, 1994).

    Tabela n. 1 - Gesto do patrimnio cultural e do turismo

    Patrimnio Cultural Turismo Estrutura

    . Orientada para o sector pblico

    . Sem fins lucrativos . Orientada para o sector privado . Orientada para o lucro

    Objectivos . Fim social mais vasto . Objectivos comerciais Actores/Agentes- Chave

    . Grupos da comunidade

    . Grupos do patrimnio

    . Grupos minoritrios, tnicos, indgenas

    . Residentes locais

    . Grupos empresariais

    . No residentes

    Atitude econmica face aos bens

    . Valor de existncia

    . Conservar pelo seu valor intrnseco . Valor de uso . Conservar pelo seu valor extrnseco

    Actores/Agentes-chave da utilizao

    . Residentes Locais

    . Com frequncia crianas em idade escolar . No residentes

    Antecedentes dos profissionais a trabalharem no sector

    . Cincias Sociais

    . Formao graduada em Artes . Formao graduada em Marketing e Negcios

    Utilizao dos bens

    . Valor para a comunidade como representao do patrimnio cultural tangvel e intangvel

    . Valor para o turista como produto ou actividade que pode ajudar a criar a imagem de marca de um destino

    Organismos polticos internacionais/ONGs

    . ICOMOS/ICOM/UNESCO- promoo da conservao da cultura

    . WTO/WTTC promover o desenvolvimento do turismo

    ONGs Nacionais

    . Fundos Nacionais/Fundos do Patrimnio Cultural/organizaes tnicas e locais

    . Associaes empresariais do turismo/organismos privados do turismo

    Organismos nacionais/regionais Polticos/burocrticos

    . Agncias nacionais, estatais, e locais e alguns museus relacionados com a gesto do patrimnio cultural, arquivos

    . Organismos nacionais, estatais e regionais de turismo com funes de desenvolvimento de produtos, promoo e maximizao das receitas para o turismo

    Agentes . Organizaes nacionais para profissionais do patrimnio cultural/grupos histricos locais/lderes religiosos

    . Associaes nacionais empresariais do turismo, outros organismos da indstria

    Fonte: adaptado de McKercher e du Cros, 2002:14 e 2006:213

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    Ashworth relembra algumas especificidades que interessa considerar relativa natureza dos

    recursos culturais:

    1. Enorme heterogeneidade de produtos e servios culturais a ser oferecidos aos turistas.

    2. A natureza da cultura torna confere-lhe alguma ubiquidade, pois todos os locais tm uma

    histria e um passado. O que dificulta o sucesso de estratgias assentes nestes recursos para

    aqueles locais que no renam condies de verdadeira distino e aumenta a possibilidade de

    competio de outros pelo mesmo mercado.

    3. Os produtos e servios culturais possuem uma grande variedade de utilizadores para alm dos

    turistas e servem uma grande variedade de funes para alm do turismo, o que trs algumas

    implicaes gesto destes recursos.

    4. O turismo utiliza com frequncia recursos culturais que no foram produzidos para o mercado

    turstico, e que so de propriedade e gesto de pessoas que so indiferentes, ou at hostis, em

    relao ao mercado turstico (Ashworth, 1995).

    expectvel que a integrao com sucesso do desenvolvimento turstico numa comunidade, ou

    num destino, d melhores resultados do que a imposio do turismo como modelo de desenvolvimento

    de forma no relacionada. Butler (1999) identifica trs princpios fundamentais para esse sucesso:

    aceitao; eficincia e harmonia.

    Os residentes so parte do produto turstico e o facto de se apelar participao da comunidade

    local no projecto de desenvolvimento turstico dos destinos contribui para uma reduo dos impactes

    negativos (Timothy e Boyd, 2003). O envolvimento dos residentes no planeamento d s comunidades

    a oportunidade de participar na forma como o seu patrimnio cultural protegido e mostrado aos

    turistas. O que por sua vez, pode contribuir para o aumento do orgulho e sentimento de pertena

    (McArthur e Hall, 1993).

    As comunidades receptoras tm reagido de forma diferente ao desenvolvimento do turismo,

    variando as suas respostas em funo do nvel de desenvolvimento do turismo, mas tambm conforme

    os interesses dos grupos (Costa e Ferrone, 1995). As comunidades raramente possuem uma viso

    uniforme do turismo, e as reaces podem ir do suporte entusistico ao seu desenvolvimento, como

    oposio total. Quanto maior envolvimento da comunidade for promovido no processo de

    planeamento e desenvolvimento do turismo, maiores garantias de aceitao, sucesso e sustentabilidade

    ter o projecto do seu desenvolvimento (Butler, 1999). De facto, o relacionamento que se estabelece

    entre as comunidades receptoras e o turista em regra superficial e breve, assentando

    maioritariamente em objectivos comerciais (Holloway, 1998).

    A investigao identificou outros efeitos positivos do turismo, tais como: trocas culturais,

    revitalizao de tradies locais, aumento da qualidade de vida, melhoria da imagem da comunidade,

    aumento do sentimento de lugar. Como factores determinantes das percepes e das atitudes dos

    residentes em relao ao turismo, os autores apontam os factores econmicos e sociais, o tempo de

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    residncia na rea e a dependncia econmica do turismo (Besculides et al., 2002). A concluso

    comum aos estudos consiste na necessidade de envolver as comunidades locais no processo de

    planeamento e desenvolvimento do turismo, pois apenas pela participao activa da comunidade local

    se poder conseguir que o patrimnio cultural produza benefcios econmicos e sociais reais

    (Besculides et al., 2002, Hampton, 2005).

    Contudo, os debates associados relao do turismo na gesto e planeamento do patrimnio

    cultural transcendem largamente a questo da participao activa das comunidades. Na tabela 2

    procura-se sistematizar alguns dos debates mais correntes sobre a gesto do patrimnio cultural e

    turismo.

    Tabela n. 2 - Debates correntes na gesto do patrimnio cultural e turismo Debates correntes na gesto do patrimnio cultural

    Descrio

    Musificao-banalizao das cidades

    Patrimnio como mero cenrio preparado para consumo turstico Modelos estereotipados de renovao urbana- operaes de clonagem + monofuncionalizao de alguns sectores urbanos

    Contaminao arquitectnica Construo das infra-estruturas tursticas - integrao entre as infra-estruturas tursticas e a envolvente (em particular das caractersticas do meio natural) Urbanizao sem respeito pelas reas naturais ou histricas

    Competio pelo espao /desertificao do centro histrico/tercearizao e gentrificao

    Expulso dos antigos moradores + aumento acentuado dos preos dos terrenos e imobiliria Tercearizao da rea concentrao de actividade comercial Gentrificao reconquista da rea por classes sociais mais elevadas

    Perda de autenticidade/ Commodification

    Aculturao- comercializao da cultura; alteraes na cultura receptora e na identidade local pela assimilao da cultura do turista Interesses econmicos manipulao de tradies e costumes para entretenimento

    Patrimnio e Identidade Segundo alguns autores descoberta de um patrimnio pode significar a morte de uma identidade, dado que, a patrimonializao representa a introduo de mutaes na identidade. Diz respeito ao medo de que a cultura local assimile as influncias da cultura dos turistas que mais preponderante sobre as tradies, valores e costumes nas chamadas sociedades tradicionais, mas tambm a necessidades decorrentes do desenvolvimento da actividade turstica, de fornecer aos turistas as comodidades a que esto habituados nos seus pases de origem e de instituies que tm a responsabilidade de fornecer as imagens e as narrativas associadas a esse patrimnio, no inclurem nas suas narrativas todo o patrimnio, sobretudo dos grupos tnicos minoritrios.

    Sustentabilidade do Turismo Cultural e capacidade de carga

    Super-povoamento de muitos locais histricos - deteriorao fsica (e.g. Veneza, Bruges, Florena) Maximizao da utilizao/congestionamento

    Fonte: Gonalves, 2003 (a partir de Barr, 1995; Bianchini e Parkinson, 1993; Bourdieu, 1979, Bourdieu e Darbel, 1991; Misiura, 2006; Peixoto, 2004; Prentice, 1993a e 1994; Richards e Bonink, 1995; Richards, 1996 ;Silberberg, 1995; Smith, 2003; Van der Borg e Costa, 1993).

    Na discusso sobre as divergncias e convergncias entre os agentes do turismo, os

    responsveis pelo patrimnio cultural e a comunidade local, a Comisso Australiana do Patrimnio

    Cultural reconhece que muitos locais patrimoniais so altamente valorizados pelas comunidades locais

    e regionais, que se tornam naturalmente suas protectoras. As comunidades desejam desenvolver o

    turismo, mas tambm proteger a sua privacidade, e preocupam-se com os efeitos que o turismo pode

    trazer, pelo que apontam como fundamental que se: estabeleam as necessidades, os interesses e

    aspiraes da comunidade local na fase de pr-planeamento; tenham em considerao as

    sensibilidades culturais ou religiosas associadas ao uso e apresentao do local patrimonial;

    identifiquem e consultem os lderes da comunidade local; apresente a perspectiva da comunidade

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    local; analisem formas da populao local ter um papel activo na gesto e operao da atraco

    turstica (os amigos do patrimnio; aces de voluntariado; story telling; visitas guiadas; entre

    outros); procurem maximizar os benefcios para a comunidade local e reduzir ou evitar os impactes

    negativos (AHC, 2004).

    Inskeep (1994) aponta como formas de evitar os impactes negativos derivados do turismo e de

    potenciar o desenvolvimento do turismo cultural: proporcionar oportunidades para intercmbio

    cultural entre comunidade local e turistas (interaco); assegurar o acesso cultura por parte das

    comunidades locais; preservao dos estilos arquitectnicos locais; preservar a autenticidade das artes

    locais e dos festejos culturais; proteger e apoiar os mtodos de produo cultural locais; favorecer a

    criao de centros culturais locais integrando espaos de exposio e de espectculos; e quando

    necessrio, preveno das visitas a espaos religiosos e a cerimnias onde os impactes possam ser

    menos positivos2.

    Uma nova mentalidade tem vindo a emergir baseada no desenvolvimento e na implementao

    de estratgias de marketing que garantam padres de qualidade que no afectem os objectivos sociais

    do patrimnio cultural, ou que possibilitem que os lucros comprometam a sua existncia (Izquierdo e

    Samaniego, 2004). Desvalles muito crtico aco do turismo associando-a mercantilizao dos

    museus, pois considera que se verifica um consumo excessivo dos bens das coleces, mas tambm

    dos bens patrimoniais que permanecem in situ e fala em massificao:

    () tem[-se] assistido aos bilies investidos para transformar estes locais culturais em

    supermercados do objecto patrimonial. Certamente que os nossos museus precisavam de

    rejuvenescimento; mas permitiu-se que os mercadores entrassem no templo. Conservaram o seu

    pblico fiel de intelectuais, de quadros e de classe mdia que visitam pelo menos uma exposio

    por ano () e a frequncia familiar aumentou ligeiramente passando de 19% a 25% no decorrer

    dos ltimos dez anos; no entanto, globalmente, em lugar de passar de um no-pblico a um

    pblico de proximidade, passou-se a um pblico de superfcie, ou seja o dos turistas, os quais

    segundo o programa dos operadores fazem o Louvre numa hora visitando sobretudo a

    Samotrcia3 e a Monalisa e constituem 25% dos visitantes deste museu e mais de metade nos

    museus paisienses. (Desvalles, 2003: 54-55).

    No entanto, no decorrer do artigo o autor relembra que no s ao turismo deve ser apontado o

    perigo de comercializao, mas tambm ao mercado das artes e acusa o museu de: no se saber fazer

    compreender utiliza uma linguagem inacessvel maioria das pessoas; ser propriedade da populao de

    um territrio onde esto implantados, pelo que o seu contedo deve estar suportado nesse territrio;

    muitas vezes confundir a aco cultural com as relaes pblicas e o marketing.

    Internacionalmente tem vindo a ser promovida alguma reflexo sobre o conceito de museu e a

    2 Outras formas de fazer face aos riscos potenciais criados pelo turismo junto do patrimnio cultural incluem-se numa vasta reviso de literatura

    publicada na obra da autora: Gonalves, A. (2003) A componente cultural no turismo urbano como oferta complementar ao produto sol e paraia no Algarve. Lisboa, Instituto de Financiamento e Apoio ao Turismo/GEPE/Ministrio da Economia.

    3 Escultura grega que representa a deusa Atena Nik

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    Alexandra R. Gonalves: Museus, Turismo e Territrio

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    sua evoluo, e defende-se hoje que os museus combinem o seu objectivo social de instituies

    guardis de memrias, com responsabilidades na preservao de um patrimnio, na investigao e na

    educao com outro tipo de actividades de promoo desses objectivos, com a concepo e

    implementao de estratgias de marketing, que no comprometam a sua existncia (Kotler e Kotler,

    1998; Izquierdo e Samaniego, 2004), e que gerem impactes econmicos positivos para as

    comunidades e para o prprio museu (McLean, 1997; Reussner, 2003).

    Para uma melhor compreenso do contexto cultural e da evoluo do museu atravs do tempo

    apresenta-se a definio de museu.

    2.1 A definio de museu

    O papel do museu na actual sociedade encontra-se em acesa discusso, reconhecendo-se de

    forma crescente que o conceito tradicional de exposio e de museu est em crise e declarando-se a

    necessidade do museu se tornar mais dinmico e competitivo, procurando uma ligao mais estreita e

    participada com a sociedade, utilizando um discurso mais comercial, mas sem que se distancie das

    misses de conservao e conhecimento da arte (Martos e Santos, 2004:86). Os museus so, ou

    deviam ser espelhos da sociedade, do seu desenvolvimento e da sua cultura, do passado e do

    presente. As alteraes resultantes da evoluo da sociedade determinaram que o conceito de museu

    tradicional se tornasse obsoleto (McLean, 1987).

    Nos anos 60 o museu era um templo de cultura e as suas paredes eram opacas. No sculo XX

    a cultura democratizou-se e o interesse pblico pelos museus cresceu e diversificou-se. Hoje, o museu

    um instrumento educacional capaz de promover o reconhecimento de novos patrimnios (ex. do

    patrimnio industrial, onde se insere o caso do novo Museu Municipal de Portimo).

    O conceito de museu do ICOM (International Council of Museums) tambm tem sido

    frequentemente redefinido e adaptado realidade: "A museum is a non-profit making, permanent

    institution in the service of society and of its development, and open to the public, which acquires,

    conserves, researches, communicates and exhibits, for purposes of study, education and enjoyment,

    material evidence of people and their environment. (ICOM Statutes, 1989, article 2, paragraph I).

    Esta definio foi adoptada em Haia, na Holanda em 1989, tendo sido revista em 1995 e novamente

    em 2001. Como se pode verificar, as referncias aquisio e conservao permanecem prioritrias

    sobre as questes de educao e de entretenimento.

    As funes principais de qualquer museu so: identificar, recuperar e reunir grupos de objectos

    e de coleces; document-los; preserv-los; estud-los; apresentar ou expor esses objectos aos

    pblico em geral; e interpret-los ou explic-los (Hernndez e Tresseras, 2001). As primeiras funes

    so as mais tradicionais e historicamente as mais reconhecidas, enquanto que as outras tm a ver com

    o pblico e as dimenses sociais da gesto do patrimnio cultural.

    A questo do uso social do patrimnio cultural ganhou maior relevncia a partir de 1920-30s,

    pela tomada de conscincia de que a perda de ligao com o contexto de produo e uso desse

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    patrimnio significaria a perda do seu significado. Qualquer coleco ou museu s pode ser explicado

    atravs da sua histria (Hernndez and Tresseras, 2001). Foi neste perodo que os responsveis pelos

    museus se tornaram mais sensveis aos desejos e motivaes da procura e se demonstraram mais

    abertos a uma interaco entre proteco, difuso e estudo. Datam deste tempo as primeiras grandes

    exposies temporrias, as visitas escolares, e os primeiros departamentos pedaggicos, e educativos

    dos museus. So introduzidos novos sistemas de exposio e de apresentao das coleces e surgem

    os primeiros estudos de pblicos. Contudo, o perodo de Guerra instalou uma crise na museologia

    internacional e s em 1984 com a Declarao do Qubec se reafirmou a importncia da funo

    social do museu, determinando-se como objectivos principais: o alargamento da noo tradicional de

    museu; a integrao da populao na sua aco; a integrao da interdisciplinaridade no museu; a

    introduo de novos mtodos de comunicao e de gesto que incluem o visitante (ICOM, 1989).

    Outro conceito apresentado pela primeira vez no referido documento foi o da Museologia

    Activa que envolve o desenvolvimento das pessoas e das comunidades pela sua associao a

    projectos futuros dos museus, com o objectivo principal de contribuir para um sentimento de orgulho

    local e contribuir para a preveno da destruio das identidades culturais. nos anos 80 com a

    emergncia dos turismo de massas que os locais patrimoniais comeam a assumir o papel de

    atraces, sendo nos anos 90 que o edifcio do museu perde nfase e ganha maior relevncia a

    possibilidade de transferir temporariamente as exposies para fora dos museus (Boniface e Fowler,

    1993; Garcia, 2003; Hernndez e Tresseras, 2001; Misiura, 2006).

    Em Portugal, segundo o conceito de museu adoptado e introduzido na Lei-Quadro dos Museus

    Portugueses, um museu : uma instituio de carcter permanente, com ou sem personalidade

    jurdica, sem fins lucrativos, dotada de uma estrutura organizacional que lhe permite: a) Garantir um

    destino unitrio a um conjunto de bens culturais e valoriz-los atravs da investigao, incorporao,

    inventrio, documentao, conservao, interpretao, exposio e divulgao com objectivos

    cientficos, educativos e ldicos; b) Facultar acesso regular ao pblico e fomentar a democratizao da

    cultura, a promoo da pessoa e o desenvolvimento da sociedade. (Lei n.47/2004 de 19 de Agosto).

    Este conceito aproxima-se da definio do ICOM e introduz, pela primeira vez, a necessidade de

    se possuir uma coleco visitvel, bem como um processo de credenciao dos museus, para que

    tenha lugar o reconhecimento oficial da qualidade tcnica desse museu (requisitos e processo

    encontram-se regulamentados pelo Despacho Normativo n.3/2006 do Ministrio da Cultura e foram

    publicados em Dirio da Repblica, I Srie-B, N 18 de 25 de Janeiro de 2006).

    2.2 A gesto e o marketing aplicado aos museus

    Regra geral, as definies de museu centram-se mais no lado da produo do que no da procura,

    demonstrando-se uma abordagem de consumo numa fase incipiente, associando-se a um entendimento

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    de espao pblico (ou semi-pblico). Numa viso ps-moderna do papel do museu referida a

    importncia dos servios educativos e culturais, assim como, a importncia de incluir cinemas, teatros,

    bibliotecas especializadas, bons bares e restaurantes, novos espaos comuns, criando uma oferta

    diversificada e complementar, que possa dar origem a permanncias mais longas e agradveis naquele

    espao (v. Tabela 3).

    Tabela n.3 Dimenses do museu em face do tipo de gesto/direco

    Fonte: a partir de Gilmore e Rentschler, 2002

    Alguns museus colocam a nfase da sua actuao nas actividades tradicionais de investigao e

    nas coleces. No recorrem por isso a consultores, no analisam o mercado, no fomentam as visitas

    ou as doaes/mecenato. Os museus mais modernos so geridos com um enfoque empresarial:

    centram-se na promoo de programas criativos, preocupam-se com gerar fundos atravs de

    exposies temporrias; donativos; festas; entre outras. Estes museus, acentuam nas suas polticas e na

    programao a participao do pblico. Para tornar o museu mais acessvel a uma audincia mais

    ampla e atrair em particular aqueles visitantes que no iriam ao museu tradicional, promovem um

    crescente nmero de eventos de grande alcance. Os museus esto a adoptar uma orientao para o

    mercado para tornar o museu mais acessvel ao pblico (Gilmore e Rentschler, 2002) e querem

    oferecer experincias excitantes (Kirshenblatt-Gimblett, 1998).

    De acordo com Izquierdo e Samaniego (2004) o xito do museu requer a utilizao de uma

    combinao de estilos apresentados na Tabela 3, colocando uma nfase crescente na abordagem

    empresarial. Todavia, o museu v a sua gesto restringida por um conjunto de factores de diferente

    natureza, onde se incluem questes financeiras, administrativas e legais, que por vezes, se tornam

    inibidoras da introduo de alguma flexibilidade (Martos e Santos, 2004). Inserem-se tambm no

    sector no lucrativo, o que dificulta uma atitude mais orientada para o mercado e desempenhos de

    qualidade.

    Weil aponta quatro factores principais para a avaliar qualidade da aco do museu: possuir uma

    misso claramente definida (que se perpetue, mas que seja exequvel); ter capacidade em termos de

    recursos (fiscais, fsicos e humanos); avaliar a eficcia global do museu (se o museu fez a diferena; se

    produziu impacto junto da audincia desejada); e medir a eficincia (a utilizao racional e equilibrada

    D i m e n s e s d o s e r v i o

    n f a s e n a a b o r d a g e m t r a d i c i o n a l / c o n s e r v a o

    n f a s e n a a b o r d a g e m e m p r e s a r i a l / m a r k e t i n g

    E d u c a o I m p o r t n c i a d a d a e s t t i c a ; m a n u t e n o e c o n s e r v a o d a s c o l e c e s .

    I m p o r t n c i a d a d a a o v i s i t a n t e ; c r i a r i m p a c t o , d i f e r e n c i a r - s e , a m b i e n t e a m i g v e l p a r a o v i s i t a n t e .

    A c e s s i b i l i d a d e H o r r i o s d e f u n c i o n a m e n t o e s t a n d a r d i z a d o s ; o c o n s u m i d o r p o d e a p r o x i m a r -s e d e u m a f o r m a l i m i t a d a d a s c o l e c e s .

    A i n t e r a c o e n t r e o p e s s o a l e o v i s i t a n t e c o n s t a n t e .

    C o m u n i c a o P r e d o m i n a a o b s e r v a o p a s s i v a , a s m e n s a g e n s e s t a n d a r d i z a d a s , a a t e n o i m p e s s o a l ; E x i s t e u m a e s c a s s a p a r t i c i p a o d o v i s i t a n t e .

    O v i s i t a n t e p a r t i c i p a n a e x p e r i n c i a , m e n s a g e n s m a i s i n d i v i d u a l i z a d a s ; e n v o l v i m e n t o e m o c i o n a l d o v i s i t a n t e .

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    dos recursos) (Weil, 2002). O elemento relativo eficcia, o mais difcil de avaliar, na medida em que

    nos sectores lucrativos, o rendimento gerado ou a recuperao dos gastos so os indicadores que se

    costuma considerar.

    Admite-se que no fcil introduzir e aplicar os conceitos e os modelos dos negcios lucrativos,

    no sector dos museus, e que podero resultar daqui alguns pontos de conflito com o turismo. Contudo,

    o museu que no futuro deseje desenvolver uma programao que obedea a padres de qualidade e

    ombrear com outras ofertas de lazer ter que promover uma anlise: do mercado; da concorrncia; do

    consumidor; e dos canais de distribuio (Weil, 2002).

    S ser possvel definir a estratgia se se conhecerem as audincias. Os museus possuem uma

    crescente diversidade de programao dirigida a diferentes audincias (Garcia, 2003; Kotler e Kotler,

    1998). O marketing importante porque permite ao museu confirmar a sua misso e dar uma resposta

    eficiente aos seus pblicos, na medida em que atravs das suas tcnicas so identificados: o perfil do

    visitante; o mercado em que o museus opera; o potencial de desenvolvimento dos principais

    segmentos do mercado e as estratgias com vista a aumentar a base dos consumidores, bem como de

    atraco de novas audincias.

    No caso Portugus, os museus tm uma capacidade de gesto reduzida salvo naqueles casos em

    que se constituem como entidades privadas autnomas a sua estrutura orgnica difere pouco de

    regio para regio, e os seus meios humanos e os recursos econmicos so estabelecidos

    fundamentalmente em funo dos gastos com o pessoal, dos gastos correntes para o funcionamento

    dos servios, e do plano de actividades aprovados pela entidade que tem a tutela. Por exemplo, as

    receitas provenientes das entradas nos museus da administrao central, bem como das vendas nas

    suas lojas no revertem a favor do oramento do prprio museu, mas so reintegrados a nvel central.

    Uma capacidade de gesto to limitada dificulta a afirmao do museu enquanto instituio

    dinamizadora de uma aco cultural e social em torno do espao em que se desenvolve a sua

    actividade. Tambm se verifica uma grande diversidade de tipologias de museus e das suas tutelas que

    conduzem a formas e a situaes de gesto oramental muito dspares, no correspondendo em muitos

    casos a oramentos autnomos do museu, mas dependentes de entidades que lhes so exteriores

    (Serra, 2007).

    A maioria dos museus tambm no tem procurado integrar a sociedade civil no seu projecto e o

    tecido social tem em regra uma participao de espectador em face da aco promovida pelos museus.

    Verifica-se um crescimento das expectativas da parte dos visitantes e consumidores em relao

    ao facto da experincia no museu incluir mais diverso e envolvimento. Sabe-se que os mecanismos

    interactivos e a oferta de outros servios de lazer de qualidade como o merchandising, comrcio e

    restaurao, aumentam a notoriedade dos museus, bem como alargam o seu mercado de aco.

    Algumas organizaes tm apostado numa gesto do tipo best value recrutando pessoal com as

    competncias necessrias para gerar novas fontes de financiamento e manter as qualidades

    competitivas (Lennon e Graham, 2001, do o exemplo do Museu de Cincia de Londres).

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    A venda livre dos bens declarados de interesse cultural encontra-se fortemente restringida em

    muitos pases pela legislao nacional, pelo que, os museus possuem um nmero de peas elevado em

    reserva, que consideram sem grande valor, mas que por vezes, o seu emprstimo ou o seu intercmbio

    podem contribuir para a valorizao do esplio.

    Em regra, os museus em funo da sua insero territorial, possuem um maior nmero de peas

    de determinadas civilizaes que, podem no existir noutros pases ou noutros territrios e pelo

    intercmbio podem dar a conhecer em outros museus, outras culturas. No caso Europeu, Martos e

    Santos (2004) falam na partilha desse patrimnio como forma de contribuir para um maior

    conhecimento da histria europeia, propondo a criao de uma Rede de Museus de Civilizao

    Europeia no mbito da Comisso Europeia. Por outro lado, o emprstimo temporal destes objectos

    no expostos a outras instituies, permitiria a rentabilizao desse patrimnio, e at estar na base

    de novas aquisies, pelas receitas que da podem advir.

    Os museus actuais procuram uma renovao e adaptao ao visitante (Izquierdo e Samaniego,

    2004). A monitorizao dos visitantes nos museus uma das medidas mais implementadas

    internacionalmente. Por exemplo, no Natural History Museum em Londres, que recebe cerca de 1,7

    milhes de visitantes ao ano, promoveu um processo de reorganizao, criando equipas de

    especialistas dedicadas a estudar os percursos e a experincia do visitante. Conceberam ainda circuitos

    temticos e orientam as visitas para aqueles visitantes com tempo limitado (Garcia, 2003). Para

    estudar o perfil do visitante e do no visitante implementaram inquritos nos autocarros de Londres,

    entrevistas pessoais e questionrios aos visitantes dos museus. Outros autores propem a adopo do

    modelo de experincia interactiva (Interactive Experience Model) que pressupe cuidados acrescidos

    com elementos como o contexto fsico espaos para descansar/sentar; legendagem e percurso

    (itinerrio) (Falk e Dierking, 1992).

    Uma recomendao chave ser assim o desenvolvimento de estratgias de base territorial.

    Prope-se hoje uma alterao aos tradicionais discursos evolucionistas dos museus e defende-se a

    introduo de uma organizao museolgica orientada para correspondncias e relaes que

    possibilitem a abrangncia de uma multiplicidade de histrias, bem como, um maior leque de

    possveis interpretaes (Semedo, 2006). Esta quebra com a organizao clssica da exposio pode

    estar, no entanto, na base de alguma desorientao.

    O museu no deve ser um mero local onde esto depositados materiais que funciona como

    centro de investigao e apenas pode ser visitado por uma minoria, mas deve ser perspectivado como

    um ncleo de projeco cultural e social, com uma continua e decisiva funo didctica, com uma

    aproximao viva cultura. (Martos e Santos, 2004:80).

    Segundo Alice Semedo est-se a operar uma revoluo e renovao dos museus que coloca a

    nfase na promoo da experincia; [e] que revela novos horizontes ticos, epistemolgicos e

    estticos. A procura de relevncia fora dos seus contextos habituais sem qualquer dvida, um dos

    eixos desta metamorfose museolgica. (Semedo, 2005:6). As pessoas esperam hoje que a visita ao

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    museu seja relaxante, divertida e que se traduza num espao de sociabilizao, tal como em outros

    centros de lazer ou de educao. O museu emerge num leque alargado de opes de lazer, pelo que,

    tm que se modernizar para ir ao encontro de um mercado mais exigente e isso significa programas

    educativos diferenciados e com propostas adequadas aos seus pblicos e a necessidade de melhorar as

    infraestruturas do museu. Mas ser que os responsveis pela gesto do museu so da mesma opinio?

    Um estudo desenvolvido junto dos directores dos museus norte americanos4 demonstrava que as

    estratgias de marketing mais importantes que os directores desejavam desenvolver eram: novas

    exposies para promover a repetio de visitas; oferecer programas para diferentes visitantes;

    aumentar a reputao do museu pelo reforo da publicidade, relaes pblicas e patrocnio. As

    estratgias menos apontadas foram (ordem crescente de ponderao): estabelecimento de

    sucursais/seces noutros locais para chegar a outras audincias; e pagar a uma agncia de publicidade

    para fortalecer a identificao do museu. O planeamento das exposies tinha em conta sobretudo

    (ordem decrescente de importncia): as necessidades de diferentes grupos de visitantes; avaliar a

    orientao (ou no) da exposio para os visitantes; preparar actividades interactivas para ir ao

    encontro dos estilos de aprendizagem dos visitantes (Yeh e Lin, 2005). Verificou-se tambm que o

    peso das entradas de visitantes no oramento do museu j substancial (segunda fonte principal de

    rendimento), mas mais surpreendente foi que os directores dos museus evidenciaram que acreditam

    que os meios de comunicao tradicionais, como a rdio, a TV, os jornais e as revistas so mais

    eficientes, do que o e-mail ou a pgina on-line (Yeh e Lin, 2005).

    Gostava de destacar a relevncia dada pelos inquiridos necessidade de possuir actividades

    hands-on, do tipo ateliers, e uma loja, como formas de possibilitar uma melhoria das experincias

    interactivas nos museus e de estimular a aquisio de reprodues para estender a memria da visita

    ao museu.

    Quanto ao catering ou incluso de servios de restaurao no museu, Falk e Dierking (1992)

    defendem que este servio pode contribuir para melhorar a experincia do visitante no museu e que at

    a preparao de pratos especiais que vo ao encontro da exposio em decurso, pode ser uma das

    formas de passar a mensagem do museu. inegvel tambm o contributo que pode dar para o aumento

    das receitas do museu e, tal como Yeh e Lin (2005) afirmam, ningum conseguir desfrutar de uma

    visita ao museu se estiver com fome. Por sua vez, as sucursais so referida por Kotler e Kotler (1998)

    como forma de projectar a imagem dos museus noutros locais, o que pode contribuir para a atraco

    de novos visitantes.

    Hein (1998) afirma que a aprendizagem se deve constituir como a funo principal dos museus,

    todavia, h que acompanhar os novos processos de aprendizagem e adapt-los aos estilos dos tempos

    modernos: Museums are extraordinary places where visitors have an incredible range of experiences

    (Hein, 1998:2). Yeh e Lin reconhecem que o museu apresenta vantagens associadas s formas de

    4 Estudo conduzido a partir de uma populao de 8000 museus dos EUA que so membros da Associao Americana de Museus, dos quais

    foi seleccionada uma amostra de 400 directores para responderem a um inqurito por correio. Os dados foram tratados em SPSS (Statistical Package for Social Sciences). (Yeh e Lin, 2005).

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    Alexandra R. Gonalves: Museus, Turismo e Territrio

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    aprendizagem informais e afirmam Learning in museums give visitors a self-directed learning

    opportunity to construct personal learning atmosphere, scheduling, and content. (Yeh e Lin,

    2005:281). Mas para que tal se verifique, ser necessrio que os museus acompanhem a sociedade e tal

    como afirmava um dos directores que se entrevistou: No concebo que em minha casa tenha por

    exemplo o acesso a determinadas tecnologias e que no museu no tenha os computadores, a

    informao via audiovisual, j h museus virtuais, j h museus com interpretao interactiva.5.

    No est em causa a discusso do museu como parque de atraces, mas a verdade que o

    museu um espao onde se contam histrias e hoje as pessoas esperam mais do que a simples venda

    de uma mercadoria (i.e. o bilhete de entrada numa exposio), procuram uma experincia (Tabela 4).

    Tabela n. 4 A emergncia da experincia como conceito econmico

    Evoluo das abordagens econmicas at ao presente

    Commodities Goods Services Experiences Seller Market User Client Guest Buyer Characteristics Features Benefits Sensations

    Fonte: Pine e Gilmore, 1996:6

    Segundo Pine e Gilmore a experincia criada quando: a company intentionally uses services

    as the stage and goods as props, to engage individual customers in a way that creates a memorable

    event. (Pine e Gilmore, 1999:11).

    A experincia turstica por definio um processo subjectivo, da que segundo Ryan (1997)

    ser fundamental o contexto da experincia, assim como os antecedentes scio-culturais. A

    intangibilidade do produto turstico conduz a uma identificao da experincia turstica como uma

    matria de percepo (Fainstein e Gladstone, 1999).

    Os analistas culturais enfatizam os efeitos da indstria turstica sobre o espao e as referncias

    simblicas. A autenticidade quase sempre uma referncia obrigatria quando se discute a experincia

    turstica, considerada por inmeros autores como questo fundamental, numa anlise desenvolvida por

    Judy Cohen (2002) sobre os trabalhos de Dean MacCannell (1976), Daniel Boorstin (1987) e Umberto

    Eco (1983) a autora conclui que nem sempre o turista tem como objectivo a procura de uma

    experincia autntica e caracteriza o turista ps-moderno: () not so much a new type of animal, but

    rather a decision-maker with a new array of options. (Cohen, 2002:34).

    Cohen argumenta que os turistas modernos no so diferentes daqueles de tempos passados e

    que desde longa data que o turista procura minimizar os desconforto e os riscos associados s viagens.

    Por sua vez, a encenao da autenticidade sobre a forma de cerimnias, actividades e eventos tem

    sido vastamente disseminada e hoje bastante comum, ainda que criticada por alguns. Por seu lado,

    Smith (2003) considera que mais importante do que discutir se a autenticidade real ou encenada, ser

    5 No se identifica o interlocutor por questo de confidencialidade das respostas (entrevista 3, Outubro de 2007).

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    Alexandra R. Gonalves: Museus, Turismo e Territrio

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    assegurar que as comunidades locais se sentem confortveis com o seu papel de actores e animadores

    do turista.

    Recursos autnticos sero os locais, servios ou eventos que reflectem o patrimnio nacional,

    regional ou local. A autenticidade pode ser determinada com base em vrios critrios. O recurso pode

    at nem reter todas as caractersticas culturais relevantes, mas deve reter todas as que se relacionam

    com a sua identidade histrica ou a sua relao com a tradio cultural (Lord, 2002). Em suma, as

    experincias tursticas autnticas sero aquelas com significado.

    De acordo com McKercher e du Cros (2002) ser ainda fundamental que se identifiquem

    aqueles recursos que so realmente excepcionais e de valor nico, e que sero os responsveis por

    atrair as pessoas ao destino.

    Saliente-se uma vez mais, a importncia de consultar os vrios agentes dos dois sectores para

    assegurar que se evitam conflitos. Todas estas reflexes so relevantes para determinar o potencial de

    atraco do turismo por parte dos museus. Por outro lado, deve existir a conscincia que, regra geral,

    os museus possuem um grande potencial de atraco turstica, podendo constituir-se como

    contribuintes vlidos e parceiros principais do desenvolvimento do turismo cultural na teoria e na

    prtica (Benediktsson, 2004).

    2.3 O museu como plo de atraco turstica

    Os grandes museus da Europa so um importante factor de mobilizao de pessoas, sobretudo

    atravs das suas grandes exposies. Estes museus esto extremamente interligados com a poltica da

    prpria cidade as decises sobre as grandes exposies na Holanda, por exemplo, no provm do

    director do museu ou de um grupo de conservadores, mas do departamento de marketing da cidade e

    da deciso colectiva de um grupo de gestores para tentar aumentar as visitas. Este fenmeno teve

    incio nos anos 90 na Holanda, com as exposies de Van Gogh, tendo sido seguido no Reino Unido e

    em Frana, e esteve na origem de centenas de milhares de visitas s cidades (Bellacasa, 1999).

    Para conseguir concretizar este tipo de iniciativas tem que se adaptar as estruturas dos museus

    ao novo consumidor. Em Espanha procurou-se promover este tipo de iniciativas atravs do Ano de

    Goya e do Ano de Velsquez, mas sem o sucesso desejado, que se atribui ao descurar do aspecto da

    comercializao turstica. Numa referncia ao caso Espanhol, o autor conclui que os grandes museus

    ainda no perceberam que tm que possuir gestores e alterar a sua estrutura de gesto. Num grande

    nmero de museus os horrios no esto adaptados aos fluxos tursticos e encerram aos Domingos.

    Bellacasa (1999) reconhece que o visitante contemporneo necessita de: flexibilidade,

    informao em vrios idiomas, produtos comercializados pelo museu, realizar actividades volta das

    coleces. Em suma precisa de viver o museu, estabelec-lo como marco da cidade e factor de

    desenvolvimento da mesma. Outros museus, como o Museu do Louvre ou o Museu Britnico j

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    introduziram a possibilidade de alugar salas e outros espaos para jantares e para filmagens como

    forma de angariar mais recursos financeiros.

    No chega possuir um legado histrico relevante, necessrio que exista uma aco poltica

    para que o local possa atrair turistas e afirmar-se como destino de turismo cultural. Ser tambm

    fundamental envolver as populaes e conseguir a participao da administrao pblica nos diversos

    nveis.

    O territrio dinmico e por vezes converte-se em museu, por sua vez, o museu representa um

    espao territorial, de expresso da histria e arte de uma rea geogrfica. Existe uma dialctica entre

    ambos (Rocio, 2004). Os recursos patrimoniais possuem uma forte ligao com o territrio que

    emerge como o espao em que se desenvolveu a actividade humana ao longo dos tempos (Martos e

    Santos, 2004). A proteco e a dinamizao destes recursos tm conduzido procura de solues que

    possibilitem um desenvolvimento sustentado do potencial destes recursos, que tero estado na origem,

    em Espanha, dos parques culturais e dos parques arqueolgicos, por exemplo (Martos e Santos, 2004).

    Compreende-se hoje que necessrio associar os vestgios arqueolgicos e os monumentos aos

    territrios onde foram encontrados ou edificados, e por isso verifica-se uma crescente musealizao

    in situ e dos centros de interpretao. Contudo, no s nestes casos isso deve acontecer. O museu

    pode encontrar a sua base territorial numa cidade e est-se perante um museu de cidade, ou pode

    assentar numa rea mais ampla, e a assume-se como a base da estratgia de actuao as vrias reas

    patrimoniais do patrimnio em que se insere. Veja-se o caso do Ecomuseu, conceito desenvolvido

    em Frana tem por base o interesse pela ecologia e etnologia (Martos e Santos, 2004)

    Tambm a necessidade de tornar os vestgios compreensveis conduziu a uma tendncia para

    no descontextualizar, na medida em que a sua manuteno no territrio possibilita uma leitura do

    objecto no lugar de origem. Uma nova viso do territrio estar nos fundamentos de um novo conceito

    de museu, com base territorial e participao da comunidade.: ()los ecomuseos, los museus

    integrales y los museos institutos se apresentan como modelos ptimos para el desarrollo de estas

    polticas patrimoniales. (Martos e Santos, 2004:92).

    Tabela n. 5 - Rota Romana Andaluza

    Estudo de caso: Museu e Territrio Rota Romana Andaluza (Ruta Btica Romana)

    - Projecto de turismo cultural que procura valorizar o legado romano em torno da Via Augusta no seu trajecto Andaluz.

    - Foram os municpios que tiveram a iniciativa e que constituram a organizao de uma sociedade com os seguintes objectivos: colocar em valor este patrimnio; difundir esse patrimnio; conservar o mesmo.

    - Integra patrimnio artstico, cultural, monumental, tradies e gastronomia em torno do legado romano da Via Augusta.

    - parte do projecto europeu das vias romanas do Mediterrneo.

    - Transversalmente cada municpio organiza exposies itinerantes, produz guias, vdeos promocionais e outros materiais como moedas, jogos, etc.

    - Gerou emprego e dinamiza a economia assumindo a conservao do patrimnio em causa atravs de polticas integradas nos mbitos do: urbanismo, da economia, do meio ambiente, do turismo e da cultura.

    - O projecto exigiu o compromisso de vrios nveis da administrao, da comunidade e da Confederao de Empresrios da Andaluzia, da Consejeria de Turismo da Junta da Andaluzia e o apoio da Consejeria da Cultura.

    Fonte: Rocio, 2004

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    Este projecto vai ao encontro do conceito de museu integral (conceito introduzido pela

    UNESCO em 1972), um museu que desenvolve as suas funes tradicionais, mas integra o

    desenvolvimento de polticas patrimoniais sobre um territrio, integrando toda a populao desse

    territrio na sua actuao, constituindo-se como ncleo dinamizador del desarrollo cultural y tambin

    econmico de la zona (Martos e Santos, 2004:74). Um exemplo que os autores apontam o de

    Aragn em que foi introduzido o conceito de parque cultural que se assumem como instituies

    integradoras do patrimnio histrico daquele territrio (Martos e Santos, 2004).

    O total dos visitantes dos museus da Andaluzia em 2000 ascendeu a 1.222.283 visitantes, a que

    se acrescem 2.234.054 de visitantes da Alhambra, que representa quase o dobro dos visitantes dos

    museus no seu conjunto. S para registo a Andaluzia em 2000 recebeu 19.780.727 turistas (Martos e

    Santos, 2004), o que se significa que um nmero elevado de turistas no visita qualquer museu.

    Outro elemento interessante da regio de Andaluzia tem que ver com o facto da distribuio

    geogrfica dos museus se encontrar muito concentrada em torno das 8 capitais de provncia, que se

    constituem por sua vez, como aqueles locais de maior rentabilidade econmica e de maior fluxo

    turstico, pois so tambm as maiores aglomeraes urbanas (entre 20000 e 50000 habitantes). As

    zonas com mais de 2 museus ou at 5 museus so as que constituem territrios e cidades com

    patrimnio de maior importncia: Sevilha, Cdis, Mlaga, Granada, Crdoba, Huelva e Almeria

    encontram-se entre esses locais.

    Se se pretender fazer uma anlise paralela do caso do Algarve, verifica-se que os quatro museus

    estudados (que integram a Rede Portuguesa de Museus) situam-se todos nas cidades de maior

    dimenso populacional do Algarve, na faixa litoral e nas zonas de maior afluxo turstico da regio.

    Numa anlise de dimenso nacional em 2002, dos 591 museus que integraram a Base de Dados do

    Observatrio das Actividades Culturais, apenas 6,9% se localizavam no Algarve (30,5% na zona de

    Lisboa e Vale do Tejo; 26,1% no Norte; 19,8% no Centro; e 9,8% no Alentejo) (Lima dos Santos e

    Bairro Oleiro, 2005).

    Existe um nmero crescente de autores que defendem na sua investigao que os museus se

    constituem como elementos principais de atraco de turismo cultural, advindo da possibilidades de

    desenvolvimento econmico local e regional muito positivas (Prieto et al., 2002), o que tem

    contribudo para a disputa que se vive entre as cidades numa tentativa de conseguir possuir um museu

    emblemtico, com projecto de assinatura de um arquitecto de renome.6

    Um outro caso que merece referncia da Esccia, onde desde 1999 foi criado um Visitor

    Attractions Monitor (VAM) que recolhe e publica as estatsticas do sector das atraces tursticas

    6 Refira-se o caso de Bilbau e do Museu Guggenheim, que nos dois primeiros anos de funcionamento recebeu mais de 2,5 milhes de

    visitantes. No primeiro ano de funcionamento (2001) o museu teve 1,36 milhes de visitantes, ficando em 2 lugar na tabela dos museus espanhis mais visitados, a seguir ao Museu do Prado. A amplitude das transformaes introduzidas em Bilbau em termos de imagem, fizeram do museu um cone do renascimento urbano e da mediatizao, que muitos outros programas de criao de sucursais tm procurado copiar. A Fundao Guggenheim estuda o desenvolvimento de novos museus, por exemplo, Hong Kong, Singapura e Guadalajara no Mxico (Poulot, 2005).

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    integrando os museus (Lennon e Graham, 2001). A perspectiva do museu enquanto atraco turstica

    no ainda hoje pacfica e grande parte das galerias e museus do Reino Unido so propriedade do

    sector pblico, de associaes e de organismos sem fins lucrativos. J foram vrios os autores que

    referiram a funo comercial dos museus, no lazer e no turismo (Ambrose, 1994), outros afirmaram a

    necessidade de uma maior orientao para o mercado (Cossons, 1985), ou mesmo evidenciaram a

    necessidade de uma revisitao dos objectos, procurando criar uma ligao com o presente (Hall,

    1997) para se desenvolverem como locais competitivos (Lennon e Graham, 2001).

    Na Esccia, a atitude perante o turismo tem permanecido ao longo dos tempos quase imutvel

    apontando-se como o turismo como responsvel por tornar a histria em mercadoria (Hewison, 1987),

    mas uma orientao comercial emergente na poltica pblica levou a que se introduzissem padres de

    excelncia nas organizaes de servios pblicos. Alguns dos indicadores introduzidos nesta avaliao

    qualitativa foram: padres de desempenho, informao e abertura; consulta e escolha; cortesia e ajuda;

    melhorias na qualidade do servio; melhorias planeadas e inovao; com a centralidade da avaliao

    colocada no cliente. As estatsticas j so utilizadas pelas atraces para medir o seu desempenho

    relativamente aos seus concorrentes e alguns dos indicadores incluem a monitorizao do nmero de

    visitantes, a sua permanncia mdia e a despesa por visitante (Lennon e Graham, 2001).

    Lennon e Graham (2001) apontam o desenvolvimento de novas estruturas, mais flexveis, tais

    como, o trabalho em rede, a colaborao ou a partilha de recursos como medidas capazes de contribuir

    para uma maior eficcia das polticas, que levaria a interpretaes mais coerentes do patrimnio

    cultural e a um maior estmulo procura. Apontam trs factores principais que tm dificultado uma

    maior orientao para o mercado dos museus: resistncias dos museus que aumentaram a sua

    dependncia do mecenato e tendem a aguardar um maior suporte das suas redes normais de

    financiamento (sector pblico, fundaes, voluntrios); ausncia por parte dos profissionais dos

    museus das competncias de gesto necessrias para lidar com as presses financeiras, legais e

    comerciais; as obrigaes ticas do sector dos museus levam a que considerem prioritrio a noo de

    servio pblico, pela proteco e preservao do seu legado para as geraes futuras.

    Esto assim identificados exemplos de esforos internacionais no sentido de tornar os museus

    espaos atractivos e atraces de lazer competitivas. Tal como afirma Silberberg (1995) a relao que

    se estabelece entre os museus e os locais histricos, e o turismo tem de deixar de centrar-se No que

    que podes fazer por mim? e reflectir uma abordagem do tipo O que posso fazer por ti?. Entre

    algumas das polticas e prticas que Silberberg refere, encontramos:

    Os museus podem ajudar os hotis a definir packages de fim-de-semana para ultrapassar o problema frequente das quebras nas taxas de ocupao.

    Os museus podem ajudar a definir programas complementares de lazer para os acompanhantes dos participantes em congressos e seminrios.

    O bilhete de ingresso pode ser considerado como passe alargado de um dia e incluir descontos noutras atraces, ou na restaurao local.

    Definio de horrios em coordenao com o comrcio local (Silberberg, 1995).

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    Efectivamente as oportunidades so ilimitadas se todos reconhecerem benefcios num

    relacionamento e parceria mais estreita entre o turismo e os museus.

    A investigao do museu actual inclui novas dimenses nomeadamente a monitorizao do seu

    desempenho em termos de expectativas e nveis de satisfao do visitante com a experincia. Alguns

    pases j incluram na sua agenda poltica a melhoria da qualidade das atraces culturais e

    patrimoniais, desenvolvendo mecanismos de avaliao da qualidade. No caso Escocs, a

    estandardizao dos processos de avaliao da qualidade dos museus assegurado pelo MAS

    Registration Scheme (Museums Association), que resultou de uma iniciativa conjunta em 1998, da

    Museum and Gallery Commission (MGC) e do Museum Training Institute, (MTI) (Lennon e Graham,

    2001)7.

    Da reviso de literatura sobre a gesto do museu resultam algumas propostas que se sumariam

    como propostas para um novo modelo de gesto dos museus:

    1. O museu deve constituir-se como instituio semi-pblica ou co-financiada, por fundaes pblicas, consrcios, empresas pblicas ou organismos autnomos.

    2. Os recursos devem ser atribudos em funo de critrios objectivos, tais como: nmero de visitantes, qualidade da coleco, quantidade da coleco, superfcie expositiva, plano estratgico.

    3. Os recursos externos devem basear-se em: entrada de visitantes, patrocnio, explorao de lojas.

    4. Introduzir dias de livre acesso: limitados a dias especiais e determinados grupos.

    5. Cooperao com outras instituies pblicas (desde a administrao central at aos municpios).

    6. Concepo de sistema de museus bem vinculado rea geogrfica.

    7. Evitar descontextualizao das coleces, pelo contrrio lig-las envolvente imediata.

    8. A poltica relativa aos museus deve interligar-se com outras polticas meio ambiente, obras pblicas, educao e turismo como instrumento de desenvolvimento local (Martos e Santos, 2004; Serra, 2007).

    H que ter conscincia que o visitante-turista (potencial ou efectivo) tem diferentes tipos de

    necessidades de informao, que incluem a simples informao no local, mas tambm informao

    mais complexa sobre os significados histricos e culturais do local (interpretao) (Eagles et al.,

    2002). Os museus devem dar resposta s necessidades de informao dos turistas, e a informao mais

    elementar inclui: a lista e a descrio dos recursos patrimoniais e culturais existentes; a sinaltica

    direccional e referncias para chegar ao local; os horrios de funcionamento e o preo de ingresso; as

    diferentes actividades disponveis no equipamento, entre outras. O principal benefcio de fornecer um

    programa de interpretao reside na capacidade de construir audincias que compreendem e apreciam

    os recursos a ser visitados, o que tambm contribuir para uma reduo de impactes negativos e atrair

    maior suporte pblico para o local. Uma vez no museu, as necessidades de informao tornam-se mais

    7 Este Instituto em 1998 d lugar a uma organizao concebida para a formao e desenvolvimento de competncias alargadas a todo o sector

    cultural e patrimonial, denominada Cultural Heritage Training Organization (CHNTO)(Lennon e Graham, 2001).

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    complexas e o visitante querer obter informao mais detalhada e que possibilite estabelecer um

    dilogo entre passado, presente e futuro.

    Os museus e a museologia moderna tm que ser capazes de contribuir para um dilogo

    interdisciplinar, em especial porque tm um importante contributo para dar para o campo da

    conservao e desenvolvimento sustentado do turismo cultural.

    3. Anlise emprica

    Uma breve contextualizao do panorama museolgico nacional dar lugar ao panorama do

    Algarve, procurando descrever e analisar criticamente os resultados, com base no enquadramento

    conceptual desenvolvido e das linhas orientadoras apontadas para o museu do futuro.

    3.1 O panorama museolgico nacional

    Em Portugal, foi com o trabalho conjunto do Observatrio das Actividades Culturais e do

    Instituto Portugus de Museus que se deu incio a um estudo objectivo e profundo do panorama

    museolgico portugus entre 2000 e 2003, recentemente publicado (Lima dos Santos e Oleiro, 2005) e

    que tem vindo a ser actualizado (Soares Neves e Alves dos Santos, 2006).

    Os primeiros passos no sentido de melhor se conhecer a realidade museolgica nacional datam

    de 1999 com o Inqurito aos Museus em Portugal desenvolvido pelo Observatrio das Actividades

    Culturais e pelo Instituto Portugus de Museus (Soares Neves e Alves dos Santos, 2001). data foram

    identificados 680 registos de museus (tendo sido excludos os ncleos dos museus polinucleados e os

    museus desactivados em projecto ou temporariamente fechados por obras). Desses 680 museus,

    foram recolhidas 530 respostas vlidas, tendo-se includo entre os inquiridos: os Jardins Zoolgicos,

    Botnicos, Aqurios e Monumentos Musealizados (excluem-se os stios arqueolgicos e as Reservas e

    Parques Naturais). Este primeiro estudo resultou na assinatura num protocolo conjunto (Instituto

    Nacional de Estatstica, Instituto Portugus de Museus e Observatrio das Actividades Culturais), para

    a criao de uma Base de Dados do Museus.

    Em face dos dados disponveis e apresentados no Grfico 1, o nmero de museus a funcionar

    em 31 de Dezembro de 2005 era de 1.018, o que representa um acrscimo de 40% em relao a 1999.

    Foi nos museus com abertura espordica que se verificou maior crescimento. Salienta-se uma

    tendncia crescente para a apresentao de novos projectos de criao de museus, tendo sido

    identificados 326 em 2005 (o que representa 153% de crescimento em relao aos nmeros de 2000),

    sendo a administrao local a grande responsvel por estes novos projectos, e pela declarao de

    intenes de criao de mais museus. Este movimento alargado a todo o pas, com menor incidncia

    no Alentejo.

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    Grfico n. 1 Evoluo do nmero de museus portugueses

    Fonte: Nabais, 1993; Soares Neves e Alves dos Santos, 2006

    Ainda que seja mais reduzido o nmero de museus em situao de fecho, os investigadores

    verificaram igualmente que entre 2000 e 2005 este nmero aumentou substancialmente, o que

    explicam com base em: problemas derivados do mau estado das infra-estruturas onde estavam

    implantadas, ao desaparecimento da prpria tutela e (e mais comummente) a processos de

    reorganizao do sector dos museus por parte das tutelas. (Soares Neves e Alves dos Santos, 2006:6).

    Tambm surgem algumas fuses em unidades museolgicas e alterao de funes de espaos at

    ento consagrados exposio de coleces, como resultado sobretudo de novas opes de gesto

    que visam racionalizar o funcionamento de algumas unidades mais deficitrias. (Soares Neves e

    Alves dos Santos, 2006:6).

    A administrao local as cmaras municipais -, mas tambm algumas empresas municipais

    (fenmeno emergente data de 2005), permanecem como a entidade que mais museus tutela, sendo

    que, comparativamente, a administrao central tem vindo a reduzir o seu peso relativo (Tabela 6). No

    que se refere ao tipo de museu, predominam como mais representativos os museus de: Arte,

    Etnografia, Antropologia, Especializados e Mistos e Pluridisciplinares, verificando-se uma reduo

    mais significativa nos museus de Cincias Naturais e de Histria Natural. A maior concentrao

    geogrfica de museus permanece na regio de Lisboa e Vale do Tejo, mas com uma perda de peso

    relativamente ao conjunto do pas, devido sobretudo ao ganho de peso relativo da regio Norte. Em

    2005 tem tambm lugar uma reduo no nmero de concelhos sem museu, sendo no continente, onde

    mais notrio o aumento de concelhos com pelo menos um museu (Soares Neves e Alves dos Santos,

    2006). Em 2006, os museus do IPM (Instituto Portugus dos Museus) atingiram mais de um milho de

    visitantes, o que j no se verificava desde 2002 (IPM, 2006). Os meses de maior afluncia foram o

    ms de Maio (162 234 visitantes), pois tem lugar neste ms o Dia Internacional dos Museus e a

    Noite dos Museus, e o ms de Agosto (130.385 visitantes). Segundo a informao do IPM este

    N de Museus (1993, 2000 e 2005)

    260

    728

    1018

    0

    200

    400

    600

    800

    1000

    1200

    1993 2000 2005

    N de Museus

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    aumento abrangeu museus de entrada gratuita e paga, bem como foi generalizado a todos os museus

    da RPM (Rede Portuguesa de Museus) (IPM, 2006).

    Tabela n. 6 Entidades proprietrias dos museus em Portugal Museus - Entidade Proprietria N %

    Instituto dos Museus e da Conservao (ex-IPM) 28 23,3 Direco Regional da Cultura dos Aores 8 6,7 Direco Regional dos Assuntos Culturais da Madeira 6 5,0 Administrao Central 6 5,0 Administrao Local 50 41,7 Empresas Pblicas 2 1,7 Privados Associaes Fundaes Igreja Catlica Misericrdias

    5 9 4 2

    4,2 7,5 3,3 1,7

    Total 120 100 Fonte: Rede Portuguesa de Museus, 2007 (http://www.rpmuseus-pt.org/Pt/html.index2.html

    Por sua vez, as Estatsticas da Cultura, Desporto e Recreio 20058 publicadas pelo INE em

    2006 evidenciam os seguintes resultados em relao aos museus em Portugal:

    Museus, por tipologia: 20% eram Museus de Arte, 18% Museus Mistos e Pluridisciplinares e 13% de Museus de Etnologia e Antropologia; com igual percentagem foram identificados os Museus de Histria e os Museus Especializados (9,5%), tendo sido a tipologia dos Museus de Territrio a apresentar menor expressividade no conjunto geral dos museus (2,5%).

    Os museus considerados registaram em 2005 um total de 9,7 milhes de visitantes, dos quais 1,8 milhes foram no mbito de grupos escolares (18%).

    Os museus mais visitados foram: Monumentos Musealizados (27%), com uma mdia de 190 mil visitantes, Jardins Zoolgicos, Botnicos e Aqurios (27%), Museus de Arte (15%).

    Nmero mdio anual de visitantes por museu: 34,1 mil pessoas.

    Acervo: total de 22,2 milhes de objectos, predominando os objectos de filatelia e fotografia (52%). Os bens arqueolgicos e os naturais no vivos representaram 18% e 11%, respectivamente.

    Os museus com maior dimenso de acervo foram: Museus de Cincia e de Tcnica (33% dos objectos); Museus Especializados (21%) e Museus do Territrio (14%) (INE, 2006).

    Os vrios estudos consultados fazem referncia ao facto de um nmero cada vez maior de

    entidades museolgicas procederem ao registo do seu nmero de visitantes anuais, contudo, em face

    da disparidade do nmero de museus auscultados em cada investigao, difcil estabelecer uma

    evoluo das entradas de visitantes nos museus portugueses, apontando a anlise do Observatrio das

    Actividades Culturais e do Instituto Portugus de Museus publicada em 2005 para uma evoluo

    positiva entre 2000 e 2002 (Grfico 2).

    Grfico n. 2 Evoluo do nmero de visitantes nos museus portugueses

    8 Consideraram um total de 285 museus.

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    12.963.69511.829.479

    13.609.609

    2.187.0271.860.679 2.239.439

    0

    2.000.000

    4.000.000

    6.000.000

    8.000.000

    10.000.000

    12.000.000

    14.000.000

    16.000.000

    2000 2001 2002

    N devisitantes

    N devisitantesescolares

    Fonte: Lima dos Santos e Oleiro, 2005:61

    Segundo informao actual prestada pela Rede Portuguesa de Museus (RPM), na sua pgina da

    Internet, o nmero total de museus em Portugal aproxima-se dos 1000. No entanto, alguns destes

    museus correspondem a coleces visitveis, monumentos, stios ou at outras situaes, facto

    associado actual definio de Museu, conforme a Lei Quadro dos Museus Portugueses. Destes 1000

    apenas 120 integravam a Rede Portuguesa dos Museus em Julho de 2007. Esta mesma Lei Quadro

    instituiu o processo de credenciao para o reconhecimento da qualidade tcnica do museu (Artigo

    110), quanto adeso RPM voluntria e pressupe a resposta a um processo de candidatura, de

    acordo com o Despacho Normativo n.3/2006 de 25 de Janeiro.

    Em 2007 foi criado o Conselho Nacional de Cultura (CNC) e constituda uma Seco de Museus

    e Conservao (SMC), rgo responsvel pela apreciao das candidaturas integrao na Rede

    Portuguesa de Museus. Por sua vez, da Ministra da Cultura a deciso de credenciao do museu, que

    tomada com base no relatrio tcnico elaborado pelo Instituto dos Museus e da Conservao (IMC) e

    mediante parecer da SMC do CNC.

    Na pgina da Internet da Rede Portuguesa de Museus pode ler-se A Rede Portuguesa de

    Museus um sistema organizado, baseado na adeso voluntria, configurado de forma progressiva e

    que visa a descentralizao, a mediao, a qualificao e a cooperao entre museus.

    (http://www.rpmuseus-pt.org/Pt/html/index2.html, 2007). Esta rede pressupe uma dupla

    funcionalidade e constitui-se como: rede de informao possibilita disseminao de informao e

    estimula a comunicao; e, rede fsica permite a interconexo entre museus e a qualificao de

    equipamentos.

    No processo de candidatura RPM h um conjunto de documentao que os museus tm que

    integrar contudo no existe referncia no processo necessidade de definio estratgica da sua aco

    junto da comunidade, assim como, se refere a necessidade de elaborar estudos de pblicos sem que

    defina periodicidade dessa auscultao ou os meios que a Rede coloca ao dispor para o efeito.

  • PENICHE_ Congresso Internacional Turismo da regio de Leiria e Oeste_22.23 de Novembro de 2007

    Alexandra R. Gonalves: Museus, Turismo e Territrio

    - 25 -

    A partir dos estudos referidos, bem como de outros trabalhos sobre as prticas de lazer e

    culturais dos portugueses, desenvolve-se a seguinte anlise dos principais factores positivos e

    negativos relativos aos museus portugueses:

    Tabela n. 7 Factores negativos e positivos da anlise secundria dos museus portugueses

    Factores Negativos Factores Positivos Estudos sobre as prticas culturais dos portugueses

    demonstram que a visita a museus uma das prticas de lazer com menor frequncia.

    Elevado peso da tutela pblica: 60% dos museus pertencem administrao pblica e nestes 40% so da administrao local.

    Insuficincia de recursos informticos. Cerca de 52% dos museus nacionais no possuem

    servio educativo organizado (num total de 591 museus em 2002).

    Muitos no possuem servio de acolhimento ou at folheto desdobrvel.

    Aumento do nmero de museus fechados que se atribuem a: mau estado das infra-estruturas; desaparecimento da tutela; processos de reorganizao do sector dos museus por parte das tutelas (fuses de unidades museolgicas, alteraes das funes do espao at ento consagrado coleco, redistribuio dos acervos, entre outros).

    Alguma dificuldade em garantir de forma continuada os requisitos exigidos pelo processo de qualificao como museu, pela Lei Quadro dos Museus Portugueses.

    Enquadramento legal entrave inovao, sobretudo ao nvel das carreiras.

    Perda da especificidade das coleces pela integrao de acervos com dificuldades de definio do seu corpo predominante (derivado sobretudo do alargamento do conceito de patrimnio).

    Tendncia crescente para a apresentao de novos projectos de criao de museus.

    Criao da Rede Portuguesa de Museus/ Inqurito aos Museus/Base de dados dos Museus.

    Esforo de requalificao museolgica. Reduo do nmero de concelhos sem museu e esbatimento da predominncia geogrfica dos museus na Regio de Lisboa e Vale do Tejo.

    Exposies temporrias surgem como oportunidades de captao e alargamento de pblicos, e como instrumento de promoo.

    Crescente interesse pela museologia e museografia. Projectos de investigao que renem parcerias interessantes: OAC, INE, IPM.

    Novos eventos: Comemoraes do Dia Internacional dos Museus e Noite dos Museus tem vindo a funcionar com grande xito.

    Roteiro dos Museus (120 museus da RPM). Algumas oportunidades para o sector podem resultar da dinmica de crescimento dos museus.

    Nova Lei Quadro dos Museus e regime de credenciao pela Rede Portuguesa de Museus tornam mais rigorosas as condies de funcionamento e qualificao dos museus portugueses (existentes e novos).

    Fonte: Autora, 2007 (a partir de Fortuna, 1995; Garcia, 2003; Lima dos Santos e Oleiro, 2005; Novais, 1997; Soares Neves e Alves dos Santos, 2001 e 2006).

    O trabalho coordenado por M. de Lourdes Lima dos Santos e Manuel Bairro Oleiro (2005),

    apontando como uma concluso principal a situao precria dos servios educativos dos museus

    portugueses, na medida em que apenas 48% dos museus nacionais possuem servio educativo.

    Dos vrios relatrios, estudos e trabalhos realizados que se analisaram torna-se evidente que

    existe a necessidade de uniformizao dos procedimentos metodolgicos para a recolha e anlise

    comparativa dos dados.

    3.2 O panorama museolgico regional

    Conforme referido, este ponto reflecte uma anlise dos quatro museus da RPM no Algarve

    situados em Albufeira, Faro, Portimo e Tavira (os dois primeiros so museus fundamentalmente

    arqueolgicos, o Museu de Portimo baseia-se num patrimnio industrial regional (a indstria

    conse