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Introdução A maior parte dos museus mineiros parece estar em- pobrecida. As construções estão muitas vezes em um estado de conservação precário e as exposições “fora de época”, oferecendo pouca informação con- textual. Poucos museus fornecem detalhes sobre a natureza, objetivo e origem das suas coleções. As eti- quetas são pouco freqüentes e limitadas a uma nota batida à máquina dando o título e, às vezes, a data e procedência do objeto (Dickenson, 1994). Ao longo da década de 1970, foram correntes as críticas, oriundas dos mais diversos campos do sa- ber, aos museus. Dizia-se que os museus represen- tavam os lugares das histórias oficiais, do autoritaris- mo das elites ou ainda das sociedades sem história. Com o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, diagnosticava-se o seu desaparecimento. Segundo um dos diretores do Museu Britânico, a imagem de sua instituição na época era a de uma instituição poeirenta, atrasada, repleta de múmias decadentes e mármores sem sentido (Wilson, 1989). Atualmente, observamos o que muitos denominam como sendo a era dos museus e, embora o papel desempenhado por eles ainda seja criticado, princi- palmente por aqueles que têm ressalvas à indústria cultural, é notório o sucesso dos museus junto ao público e crescente o número de análises que o con- sideram um espaço dinâmico e criador de narrativas culturais múltiplas, capazes de atender a um público diferenciado (MacDonald, 1996). MUSEUS BRASILEIROS E POLÍTICA CULTURAL * Myrian Sepúlveda dos Santos * A primeira versão deste artigo foi apresentada na Not- tingham Trent University em 2000 e publicada no Journal of Latin American Cultural Research (Santos, 2001), a partir de uma pesquisa desenvolvida entre 1998 e 2000. Na versão atual, há uma reconstrução da análise anterior a partir da inclusão de novos dados (Comissão de Patrimônio Cultural, 2000; Braga 2002). Artigo recebido em dezembro/2002 Aprovado em março/2004 RBCS Vol. 19 nº. 55 junho/2004

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Introdução

A maior parte dos museus mineiros parece estar em-pobrecida. As construções estão muitas vezes emum estado de conservação precário e as exposições“fora de época”, oferecendo pouca informação con-textual. Poucos museus fornecem detalhes sobre anatureza, objetivo e origem das suas coleções. As eti-quetas são pouco freqüentes e limitadas a uma notabatida à máquina dando o título e, às vezes, a datae procedência do objeto (Dickenson, 1994).

Ao longo da década de 1970, foram correntesas críticas, oriundas dos mais diversos campos do sa-ber, aos museus. Dizia-se que os museus represen-tavam os lugares das histórias oficiais, do autoritaris-mo das elites ou ainda das sociedades sem história.Com o desenvolvimento dos meios de comunicaçãode massa, diagnosticava-se o seu desaparecimento.Segundo um dos diretores do Museu Britânico, aimagem de sua instituição na época era a de umainstituição poeirenta, atrasada, repleta de múmiasdecadentes e mármores sem sentido (Wilson, 1989).Atualmente, observamos o que muitos denominamcomo sendo a era dos museus e, embora o papeldesempenhado por eles ainda seja criticado, princi-palmente por aqueles que têm ressalvas à indústriacultural, é notório o sucesso dos museus junto aopúblico e crescente o número de análises que o con-sideram um espaço dinâmico e criador de narrativasculturais múltiplas, capazes de atender a um públicodiferenciado (MacDonald, 1996).

MUSEUS BRASILEIROS EPOLÍTICA CULTURAL*

Myrian Sepúlveda dos Santos

* A primeira versão deste artigo foi apresentada na Not-tingham Trent University em 2000 e publicada noJournal of Latin American Cultural Research (Santos,2001), a partir de uma pesquisa desenvolvida entre1998 e 2000. Na versão atual, há uma reconstrução daanálise anterior a partir da inclusão de novos dados(Comissão de Patrimônio Cultural, 2000; Braga 2002).

Artigo recebido em dezembro/2002Aprovado em março/2004

RBCS Vol. 19 nº. 55 junho/2004

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Ao analisar as transformações das últimas dé-cadas, Huyssen ressalta que, talvez, pela primeiravez na história, o museu, em seu sentido mais am-plo, tenha assumido o lugar do filho favorito entreas instituições culturais. O museu, como espaço dapreservação da cultura das elites e do discurso ofi-cial, teria sido substituído por uma instituição quese abre aos meios de comunicação de massa e aogrande público. O autor oferece-nos um diagnósti-co da transformação do papel social dos museusem sociedades contemporâneas e abre um lequede possibilidades e desdobramentos às práticas ex-positivas (Huyssen, 1995). Mas o que sabemos nóssobre os museus brasileiros?

No Brasil, observamos, na última década,uma série de estudos importantes que nos forne-cem análises instigantes sobre a constituição dosmuseus no século XIX, sua relação com as insti-tuições acadêmicas e seu papel na constituição danação (Schwarcz, 1993; Abreu, 1996; Gonçalves,1996; Lopes, 1997; Santos, 2000; Williams, 2001).Alguns estudos têm sido produzidos pelos pró-prios profissionais de museus que, incorporandoas contribuições das ciências sociais, procuramcompreender o papel desempenhado pelos mu-seus no mundo contemporâneo (Bezerra, 1993;Chuva, 1995; Chagas, 2001). Ainda são poucos osestudos, no entanto, que procuram relacionar aspráticas desenvolvidas pelos museus a transfor-mações recentes, como enfraquecimento de polí-ticas públicas, fortalecimento do liberalismo econô-mico e consolidação de um mercado transnacional(Arantes, 1991; Almeida, 1991). Aqueles que ana-lisam os processos de mundialização, globaliza-ção ou mesmo de formação de contextos pós-co-loniais destacam as mudanças ocorridas nasesferas da economia, da política, do trabalho emesmo da cultura, mas ainda não incluíram osmuseus brasileiros como parte desses processos.A contribuição existente é composta, em grandeparte, de análises pontuais sobre determinadotipo de museu, ou práticas específicas. Nelas, osmuseus brasileiros estão longe de serem caracte-rizados como instituições culturais de grande su-cesso. Alguns observam a indiferença do públicodiante das modificações implementadas nos mu-seus e do conteúdo simbólico dos objetos, quedeveriam representar valores e práticas consolida-

dos socialmente (Santos, 1992). Outros enfatizama situação precária dos museus que não apresen-tam condições de montar exposições atrativas aopúblico (Dickenson, 1994) e outros ainda os pro-blemas relacionados ao público (Almeida, 2002).

O objetivo deste artigo é dar alguns passosna tentativa de consolidar uma análise de práticas,estruturas e processos presentes entre os museusbrasileiros, tendo em vista as transformações porque passa a sociedade brasileira. Essas reflexõesenvolvem necessariamente a relação dos museuscom o Estado e com o mercado. No Brasil, há umaforte tendência a se privilegiar nos estudos dasquestões nacionais as suas especificidades consti-tuintes, sejam elas nacionais, regionais, sejam lo-cais. Há quase uma rejeição obsessiva a estudosque entrelaçam questões nacionais a estruturas eprocessos mais amplos. A análise desenvolvidaaqui de certa forma transgride essa regra, pois em-bora considere fundamental a constituição singulare histórica dos museus brasileiros, também incor-pora elementos intrínsecos ao campo específico damuseologia, que rompem fronteiras nacionais, as-sim como transformações nas esferas econômicas,políticas e sociais, que também não se restringemao cenário nacional.

Antes de iniciarmos a análise proposta, umesclarecimento precisa ser dado sobre os dadosutilizados neste trabalho. Há hoje um número su-perior a 1.200 museus no país e o levantamentodo número, tipo e práticas desenvolvidas por elesrequer um aparato institucional especializado.Apesar de mais de 80% dos museus brasileiros se-rem ainda instituições públicas, nós não encontra-mos na esfera governamental, no âmbito munici-pal, estadual ou federal, nem levantamento dedados sobre os museus existentes, nem estudosou avaliações sobre as práticas desenvolvidas poreles. Exceção seja feita ao Sistema Estadual deMuseus do Rio Grande do Sul que tem realizadoum esforço significativo nesse sentido. De qual-quer forma, em termos nacionais a fonte de da-dos mais completa sobre museus brasileiros nomomento é aquela que foi disponibilizada ao pú-blico pela Comissão do Patrimônio Cultural, daUniversidade do Estado de São Paulo (CPC/USP).1

A precariedade e a irregularidade dos dadosrelativos a atividades desenvolvidas pelos museus

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no Brasil também têm sido apontadas por investi-gações históricas, em que os autores estão interes-sados em reconstituir o papel dos museus emcontextos anteriores (Williams, 2001). Os dadosexistentes em relação tanto ao passado como aopresente são, portanto, fragmentados e incomple-tos, o que dificulta análises sobre o tema. Em re-lação às diferenças regionais, por exemplo, muitonão pode ser afirmado por falta de dados.2

As dificuldades aqui apresentadas não sãocasuais, como veremos a seguir elas expressamem parte a precariedade de um campo culturalque ainda procura caminhos para garantir sua le-gitimidade junto à sociedade brasileira. Mas é im-portante ressaltar que a falta de dados relativa aosmuseus fez com que apenas algumas hipótesesexplicativas e correlações começassem a ser esbo-çadas; iniciativa esta que foi desenvolvida em cin-co etapas.

Em primeiro lugar, procurou-se mostrar, em-bora resumidamente, uma visão geral sobre aconstituição histórica e social dos museus brasilei-ros, observando que este processo envolve aspec-tos específicos da nação e outros que se referemà relação entre nações. O segundo passo foi ana-lisar a distribuição desigual dos museus brasilei-ros, por região, ao longo dos anos, fato este queé mantido e mesmo ampliado nas últimas déca-das. A partir desta análise também foi possível tra-çar algumas correlações entre os perfis dos mu-seus brasileiros e o desenvolvimento cultural eeconômico do país.

A seguir, procurou-se analisar o grande cres-cimento do número de museus a partir dos anosde 1980, fenômeno este observado não só no Bra-sil, mas também em diversas partes do mundo.Uma das características apontadas pela nova mu-seologia corrente, que tem se fortalecido em diver-sos países nas últimas décadas, diz respeito à preo-cupação crescente em responder às expectativasdo público e oferecer práticas interativas como al-ternativa aos discursos fechados. O que aconteceno Brasil? A partir de dados quantitativos disponí-veis e de uma pesquisa realizada a partir da obser-vação participante do público de três grandes mu-seus brasileiros – Museu Nacional, Museu Paulistae Museu da República –, algumas considerações

foram traçadas sobre as práticas desenvolvidas poresses museus em relação a seu público. Finalmen-te, argumenta-se que a compreensão da relaçãoentre museus e público também requer informa-ções sobre o processo de legitimação das institui-ções museais junto aos diversos setores da populaçãobrasileira, o que implica considerarmos políticasculturais desenvolvidas pelo Estado em relação aosistema de museus existente no país.

Museus brasileiros sob uma perspectiva histórica

Um conjunto considerável de estudos temapontado a forte relação entre museus e a forma-ção dos Estados nacionais (Gillis, 1994; Evans eBoswell, 1999). Alguns deles, influenciados pelotrabalho de Foucault, apontam a maneira pela qualos museus, assim como outras instituições públicasabertas ao público, foram capazes de ordenar, civi-lizar e disciplinar grandes setores da população.Apontam ainda que essas instituições foram impor-tantes para a consolidação do conhecimento enci-clopédico (Bennett, 1995; Duncan, 1995). O pri-meiro grande museu nacional criado no Brasilpode ser compreendido como sendo parte dessecontexto. Em 1818, D. João VI criou no Brasil oMuseu Imperial, um museu de história natural quetinha um grande intercâmbio com os grandes mu-seus de história natural estabelecidos na Europa.Após a República, ele passou a ser denominadoMuseu Nacional. Este primeiro museu brasileiro dehistória natural seguiu os critérios da universalida-de do conhecimento, também presentes entre osgrandes museus de história natural que se consoli-davam na Europa (Lopes, 1997).

No final do século XIX, o Brasil tinha aproxi-madamente dez museus, e, com exceção do Mu-seu Naval e Oceanográfico (1868) e do Museu daAcademia Nacional de Medicina (1898), todos osdemais tinham alguma relação com as práticasclassificatórias dos elementos encontrados na na-tureza. Além do Museu Nacional, os outros doisgrandes museus brasileiros eram o Museu Paulista(1895) e o Museu Goeldi (1866). Todos os três fo-ram constituídos como museus de história natural.

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Há, contudo, tanto aspectos comuns como especi-ficidades a serem consideradas em relação aosmuseus brasileiros. Embora também houvesse im-portantes museus de história natural na Europa, osgrandes museus nacionais não eram aqueles quemostravam a flora e a fauna de cada nação, oumesmo do mundo, mas as riquezas culturais decada Império. No Brasil, o Museu Nacional era omuseu que guardava a riqueza natural, inicialmen-te, do Império, e, mais tarde, da República. O per-fil deste museu indicava a importância dos recur-sos naturais para o novo Estado que se consolidavae a relação de desigualdade na constituição de per-fis nacionais (Santos, 2000). Em países com heran-ça arqueológica pré-Colombiana, como México,Peru, Bolívia e Guatemala, museus de arqueologiatornaram-se os mais importantes de cada nação.

Os museus latino-americanos podem sercompreendidos como parte das narrativas nacio-nais constituídas a partir de regimes de poder queentrelaçavam de forma desigual antigas metrópo-les e suas colônias (Pratt, 1999; Mignolo, 2000).Também em relação à constituição das nações la-tino-americanas é preciso considerar que o Brasilocupou um lugar cujas especificidades precisamser bem demarcadas. Se houve uma tendência nospaíses que declaravam a independência das matri-zes colonialistas em criar um conjunto de símbo-los que lhes desse autonomia por meio da ruptu-ra radical com a antiga metrópole (Lowenthal,1976), no Brasil, esses símbolos criados após a de-claração da Independência marcaram a singulari-dade do Império, ou seja, um novo Estado quenão procurava a ruptura radical com Portugal.

Outro aspecto a ser considerado diz respei-to ao caráter acadêmico dos museus de histórianatural no Brasil. São muitos os relatos de épocaque nos mostram que esses museus, durante oImpério, estiveram mais voltados para a pesquisado que para o grande público (apud Santos,2000). Não há estudos sobre o público desses mu-seus durante a República Velha, mas a grande vi-rada dada pelos museus europeus após a migra-ção dos estudiosos das ciências naturais para asuniversidades, quando grandes dioramas e mode-los explicativos passaram a priorizar o grande pú-blico, não parece ter sido a regra no Brasil. A dis-

tribuição desigual e hierárquica de renda e educa-ção no país também é um fator importante a sercontemplado para compreendermos o porquê deos museus permanecerem voltados para um pú-blico mais seleto de interessados. No Brasil, dife-rentemente de outros países, a função principaldo museu dificilmente poderia ser associada à im-posição de práticas disciplinares sobre amplos se-tores da população, pois o caráter de grande es-cala das visitações não parece ter sido umacaracterística a ser destacada nos museus.

Em 1922, Gustavo Barroso, ao criar o MuseuHistórico Nacional, foi responsável pelo estabeleci-mento de um marco que anunciava uma nova erade museus nacionais no Brasil. O acervo deixava deser constituído por elementos da natureza e passa-va a ser de objetos que representassem a históriada nação. Esta, entretanto, privilegiou o legado daelite brasileira, assim como seus feitos históricos,mantendo à parte a participação popular. A home-nagem à tradição e ao Império serviu também debase ao discurso nacionalista conservador e elitistaque Barroso vinha defendendo há alguns anos.Como conseqüência, a grande maioria da popula-ção ficou simplesmente do lado de fora do museu(Williams, 2001, p. 149). Em 1922, também erainaugurada no Museu do Ipiranga uma seção deHistória. Sob direção de Affonso de Taunay, o Mu-seu do Ipiranga desviava-se da ênfase que foradada nos primeiros anos às ciências naturais, pas-sando a priorizar coleções relacionadas à históriade São Paulo.3 Mas foi ainda Barroso que exerceupapel importante na configuração dos demais mu-seus. Ele foi o responsável pela criação do Cursode Museus, que, entre 1932 e 1970, formou técni-cos para todo o país. A ideologia patriótica, hierár-quica, romântica, anticosmopolita e conservadorade Barroso manteve-se presente na criação, em1934, da Inspetoria dos Monumentos Nacionais.

O modelo implantado por Barroso conviveuem certa medida com o dos modernistas queorientaram e dirigiram o Serviço do PatrimônioHistórico e Artístico Nacional (SPHAN), criado em1937.4 Tal como Barroso, o ministro Gustavo Ca-panema compreendeu a preservação do patrimô-nio como parte da construção do Estado e de for-mação da nação. A nova política de preservação

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do patrimônio continuou a priorizar os vínculoscom fatos e personagens históricos que represen-tassem a nação, como defendia Barroso, mas de-senvolveu uma concepção distinta do que seriarelevante para a nação: novos eventos históricose heróis foram priorizados e passou-se a dar ên-fase ao rigor da pesquisa no tratamento históricoe cultural da nação.

A institucionalização da proteção do patrimô-nio histórico e artístico nacional ficou a cargo de Má-rio de Andrade e de Rodrigo Mello Franco de An-drade. O primeiro foi o responsável por projetar acriação do Serviço do Patrimônio Artístico Nacio-nal (SPAN), procurando juntar o popular ao erudi-to, valorizando os aspectos da cultura considera-dos até então menos nobres; e o segundo foi odiretor do SPHAN por trinta anos, do momento desua fundação até 1967. Procurava-se instituir cole-ções nacionais capazes de sustentar a diversidadecultural do país. Nas palavras de Bomeny, “umaelástica e inesgotável capacidade de inclusãoorienta a concepção de patrimônio de Mário deAndrade” (Bomeny, 1995, p. 18).

Os modernistas mineiros valorizaram a he-rança barroca do estado de Minas Gerais comoelemento genuinamente nacional. A política depreservação do patrimônio cultural tombou inú-meros prédios e sítios históricos e criou um gran-de número de museus. Entre eles, o Museu Nacio-nal de Belas Artes, no Rio de Janeiro; o Museu dasMissões, no Rio Grande do Sul; e os Museus daInconfidência e do Ouro, em Minas Gerais. Osprimeiros museus de Arte Sacra no Brasil datamdesse período. Os museus brasileiros modificarame diversificaram suas narrativas, abandonando an-tigos heróis nacionais e erigindo representantesmais populares da nação.

Segundo Williams, os museus criados após1945 não eram mais tão nacionalistas como aquelesdo período Vargas (Williams, 2001, p. 191) e, em-bora mantivessem à margem os setores menos pri-vilegiados da nação, eles ofereciam novas oportu-nidades em termos de visitação, patronato culturale formação de classe. No campo da arte, o Brasil foio primeiro país da América Latina a ter um conjun-to de importantes museus e uma Bienal capazes deaglutinar um acervo significativo de obras de arte

nacionais e estrangeiras, clássicas e contemporâneas.Destacam-se o Museu de Belas Artes, estabelecidoem 1937, o de Arte de São Paulo (MASP), 1947, oMuseu de Arte Moderna de São Paulo, 1948, majo-rando seu prestígio com a organização das bienaisinternacionais a partir de 1951,5 e o Museu de ArteModerna do Rio de Janeiro, 1948. É interessante no-tar que os três últimos museus foram fundados en-tre 1946 e 1948 e fazem parte do restritíssimo nú-mero de museus fortemente beneficiados peloinvestimento privado. No período pós-guerra, apresença de empresários estrangeiros e dos pode-rosos grupos da imprensa que se formavam, comoEstado de São Paulo e Diários Associados, foi res-ponsável pelo investimento privado em museus dearte não só no eixo São Paulo-Rio de Janeiro, mastambém em Campinas, Pernambuco e Paraíba.

Não há muitos dados disponíveis sobre astransformações ocorridas nos museus brasileirosno período pós-guerra. Mas alguns dados sobre aorganização dos museus na esfera internacionalpodem nos oferecer algumas sugestões sobre al-gumas medidas implementadas por órgãos públi-cos federais. Em 1946, reunindo representantes de147 países, foi criado o Conselho Internacionalde Museus (ICOM), uma organização não gover-namental que mantém relações formais com aUnesco (Organização das Nações Unidas para aEducação, Ciência e Cultura). O ICOM tem defini-do desde então linhas mestras que exercem algu-ma influência sobre as práticas desenvolvidas pe-los profissionais de museus. O Brasil faz parte doConselho Internacional de Museus desde sua cria-ção, participando da construção de definições emetas específicas a serem alcançadas.

A partir da definição básica de museu comoinstituição permanente, que adquire, conserva,pesquisa, transmite e expõe testemunhos materiaisdo homem e do seu meio ambiente, diversos aden-dos foram realizados, ampliando a diversidade doque se compreendia por museu, assim como seusvínculos e responsabilidades em relação à socieda-de. Atualmente podem ser consideradas instituiçõesmuseais não só monumentos, jardins botânicos ezoológicos, aquários, galerias, centros científicos,planetários, reservas naturais, como também cen-tros culturais, práticas culturais capazes de preser-

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var legados intangíveis e atividades criativas domundo digital.

Além disso, se observamos as diversas reso-luções adotadas pelas conferências gerais, pode-mos constatar que o papel a ser atribuído aos mu-seus tem sido objeto de grandes debates. Nasdécadas de 1950 e 1960, a grande ênfase era dadaà conservação das coleções e ao papel educacio-nal dos museus. Eles, entretanto, entraram em cri-se na década de 1970, quando se passou a criticá-los como instrumentos de veiculação de discursosoficiais, e, então, novas propostas de intervençãona sociedade surgiram. Segundo Hughes de Vari-ne, a mesa-redonda organizada pela Unesco emcooperação com o ICOM, em Santiago de Chile,em 1972, pode ser considerada um marco que es-tabelece as fronteiras entre a museologia das cole-ções e aquela que concebe o museu como instru-mento de desenvolvimento social:

Os museólogos latino-americanos presentes [...]tomaram consciência de que não conheciam ascidades onde habitavam, onde trabalhavam, ondehaviam educado seus filhos. [...] Em Bogotá,como em Quito, eles estavam “sentados” sobretoneladas de outro pré-colombiano; no Brasil ouna Argentina, eles eram responsáveis pelas cole-ções de Belas Artes ou de espécimes científicos;

no México, o público era constituído mais por tu-ristas “gringos” que por índios, cuja herança esta-va representada na sala (Varine, 1995, p. 18).

A transferência de foco das coleções para acomunicação e para a necessidade do visitante,neste período, tem sido ressaltada por diversos au-tores (Lumley, 1988; Hooper-Greenhill, 1996).Conceitos como os de museu integral, patrimônioglobal e ecomuseu entraram para o campo depreocupações dos profissionais de museu. Em paí-ses europeus e norte-americanos, os debates dosanos de 1970 parecem ter influenciado uma novadiretriz teórica, mais tarde consolidada e conheci-da como nova museologia, que apresenta aspec-tos associados às democracias liberais consolida-das nesses países.

A partir da década de 1970, as novas práticasdesenvolvidas nos museus priorizam o respeito àdiversidade cultural, a integração dos museus às di-versas realidades locais e a defesa do patrimôniocultural de minorias étnicas e povos carentes. Maisdo que isso, os museus modificaram a relação co-tidiana entre profissionais de museus, exposições epúblico. A tarefa educativa passou a ser compreen-dida a partir do diálogo com o público e de práti-cas interativas. Objetos, práticas e costumes passa-

Figura 1Museus por Ano de Fundação e Região

Fonte: Dados obtidos em Comissão do Patrimônio Cultural (1997).

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ram a estar subordinados a uma resposta mais ati-va do público. As narrativas produzidas tornaram-se temas de debate que fazem parte da agenda po-lítica contemporânea.

No Brasil, o discurso desenvolvimentista foiincorporado, por exemplo, por dirigentes de mu-seus históricos, que passaram a substituir antigosdiscursos enaltecedores de heróis e feitos históri-cos por aqueles mais próximos da nova historio-grafia (Santos, 1992). A crise dos anos de 1970 decerta forma foi superada. Quando observamos ocrescimento dos museus ao longo do século XX, oaspecto a ser destacado é que a maior parte deles,isto é, 81,24% dos museus atualmente existentes,foi criada apenas nas últimas quatro décadas (Fi-gura 1), sendo que o grande aumento do númerode museus ocorreu nos anos de 1980, com umaqueda desse crescimento na década seguinte.

O número cada vez maior de museus a partirdos anos de 1980 não foi uma peculiaridade brasilei-ra. Esse fenômeno foi analisado em diversas regiõesdo mundo como sendo uma resposta a demandasmais localizadas e como parte de um movimentoque tornou mais diversificado o processo de preser-vação do passado. Em 1991, German Vittae, respon-sável pelos museus locais na França, diagnosticou ogrande crescimento do número de museus em pe-quenas cidades na França. Segundo ele, os franceses

passaram a procurar as fontes patrimoniais que per-mitissem a afirmação de seu passado. O aumentodos museus locais representaria a abertura de luga-res de convívio, dando espaço tanto para o fortaleci-mento de auto-estima e criatividade, como para ma-nifestações solidárias (Ministère de la Culture et de laCommunication, 1991, p. 71).

Observamos na última década uma grandetransformação no perfil dos museus europeus enorte-americanos, que se multiplicaram, democra-tizaram seus discursos e abriram suas portas paraum público bem maior. Não seria exagerado afir-mar que os museus, entre as instituições culturaiscontemporâneas, foram aqueles que melhor seadaptaram ao mundo atual. Entretanto, enquantopara alguns autores vivemos hoje um momentode democratização dos processos de preservaçãoda memória, para outros, o mundo contemporâ-neo é o da fragmentação cultural.

Poderíamos compreender o boom dos mu-seus na década de 1980 tanto a partir de um pro-cesso de comercialização das narrativas e dos ele-mentos simbólicos preservados pelos museus, quepassaram a captar grandes investimentos e atrairum número considerável de visitantes, como a partirdo fortalecimento de demandas específicas e lo-cais, que diversificaram uma memória anterior-mente calcada em narrativas nacionalistas autoritá-

Figura 2Museus por Região (%)

Fonte: Dados obtidos em Comissão do Patrimônio Cultural (1997).

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rias. A esse respeito, é necessário que se faça estu-dos mais aprofundados, com acesso a dados quan-titativos e qualitativos, para que possamos com-preender melhor o crescimento do número demuseus no Brasil nas últimas décadas.

Ainda assim, podemos afirmar que as trans-formações ocorridas no Brasil como nos demaispaíses latino-americanos parecem não ter tidotanto sucesso como nos países mais desenvolvi-dos economicamente. Em 1992, conforme assina-lado por profissionais da área na Declaração deCaracas, os museus latino-americanos continua-vam em crise, carentes de recursos financeiros ede uma política cultural coerente.

[...] na América Latina os museus, geralmente, nãosão conscientes da potencialidade de sua lingua-gem e de seus recursos de comunicação, e muitosnão conhecem as motivações, interesses e neces-sidades da comunidade em que estão inseridos,nem seus códigos de valores e significados (Araú-jo, 1995, p. 40)

Nas seções seguintes, procuraremos analisaralguns dados relativos à localização geográficados novos museus criados no Brasil, tipos de in-vestimentos realizados e público alcançado.

Diferenças regionais e sociais

Com base nos dados da Comissão do Patri-mônio Cultural, da Universidade do Estado de SãoPaulo (CPC/USP), de 1997, foram construídos doisgráficos sobre a distribuição de museus pelos es-tados do Brasil. Eles indicam que não só há umaconcentração das instituições que preservam amemória nas regiões Sul e Sudeste (Figura 2), masque esse padrão de desenvolvimento se intensifi-ca nas últimas décadas (Figura 1). Outro item con-siderado foi a concentração populacional. Não háuma correlação linear entre a concentração popu-lacional nas regiões Sul e Sudeste e número demuseus. Quando medimos o número de museusem relação às populações de cada estado, obser-vamos que a Região Sul, muito menos populosado que a Região Nordeste, tem índices grandes deconcentração de museus (Figura 3).

A distribuição dessas instituições pareceobedecer prioritariamente o critério do poder fi-nanceiro e cultural. As regiões que têm o maiornúmero de museus – Sudeste e Sul –detêm res-pectivamente 59,4% e 15,9% do PIB do país. Tam-bém são os estados destas regiões que têm menortaxa de analfabetismo e maior índice de urbaniza-ção (IBGE, 1997). Entre as análises sobre museus,têm recebido bastante destaque aquelas influen-

Figura 3Desvio Padrão Calculado a partir da Relação Museus/Habitantes

Fonte: Dados obtidos em Comissão do Patrimônio Cultural (1997).

MUSEUS BRASILEIROS E POLÍTICA CULTURAL 61

ciadas pelas pesquisas de Bourdieu e sua equipe(cf. Bourdieu e Darbel, 1969). Esses pesquisado-res mostram que os museus de arte na França de-veriam ser considerados instituições detentoras decapital cultural, capital este disputado entre os di-versos setores da população e utilizado na repro-dução e na manutenção de hierarquias sociais. Aassociação feita por Bourdieu entre disputa porcapital simbólico e obtenção de prestígio sem dú-vida oferece uma boa explicação para a concen-tração dos museus nas regiões mais ricas do país.

Observando, entretanto, a Figura 3, pode-mos perceber que, no Brasil, o desenvolvimentoeconômico de cada região e a associação entremuseu e capital cultural não podem ser conside-rados os únicos elementos a explicar a concentra-ção de museus em uma determinada região. ORio de Janeiro, estado que possui o segundomaior PIB do país e um acervo cultural importan-te por ter sido capital federal durante longo perío-do, não apresenta a maior concentração de mu-seus. Tampouco São Paulo, que tem o maior PIBdo país e tem um investimento em museus de artesem competidores nos outros estados. Os estadosque apresentam um maior número de museus porhabitante são Minas Gerais, Rio Grande do Sul,Paraná e Santa Catarina. É necessário, portanto,analisarmos outros elementos capazes de influen-ciar a multiplicação do número de museus nas úl-timas décadas, especialmente no que tange ao de-senvolvimento histórico e cultural de cada região.

Infelizmente, não há dados suficientes paraque possamos caracterizar uma situação mais pre-cisa do funcionamento dos museus nestes esta-dos. Trabalharemos, portanto, com os dados dis-poníveis com o intuito de apresentar algumastentativas de interpretação da situação atual porque passam os museus no país. Em relação a Mi-nas Gerais, por exemplo, o primeiro fator a serconsiderado é que o número maior de museusque foi listado pode ser resultado do retorno maiseficiente de questionários, devido a um acordoespecífico realizado entre a CPC e a Secretaria deCultura do Estado de Minas Gerais. Ainda assim,pode-se considerar que mesmo que haja umamargem de erro, esta dificilmente seria suficiente

para explicar o grande número de museus em Mi-nas Gerais.

Há um estudo interessante que analisa o de-senvolvimento histórico dos museus em Minas Ge-rais e tenta traçar seu perfil, embora não lide comdados estatísticos, comparativos, nem tenha comofoco a distribuição dos museus no estado (Dicken-son, 1994).6 De qualquer forma, esse estudo assi-nala corretamente que são os museus de arte sacraque cumprem o papel de destaque entre os mu-seus mineiros. Como vimos, a concentração demuseus em Minas poderia ser explicada pela polí-tica de preservação do SPHAN, que valorizou osmonumentos relacionados ao período colonial e àarte barroca concentrados em Minas Gerais.

Entretanto, também nesse estado o aumentodo número de museus ocorreu após a política pre-servacionista dos modernistas. Os dados mostramque 77,86% dos museus foram criados a partir de1960 e 35,11%, a partir de 1988. Além disso, cons-tata-se que crescimento foi progressivo e descen-tralizado. Dos 46 museus criados após 1988, ape-nas quatro se localizam em Belo Horizonte(8,69%). Esses dados indicam que pequenos mu-seus foram criados por autoridades locais. As pre-feituras de Lagoa Santa, Pouso Alegre, Bom Jesus,Divinópolis, Machado, Miraí e muitas outras pe-quenas cidades abriram seus museus. A Constitui-ção de 1988, ao possibilitar uma maior autonomiados governos municipais, certamente exerceu umpapel importante a esse respeito. Ainda que estu-dos qualitativos fossem desejáveis para melhor ca-racterizar os novos museus municipais, acredita-mos ser possível afirmar que em sua grandemaioria trata-se de pequenas instituições que agre-gam objetos que, de alguma forma, dão destaqueao município no contexto nacional. De um modogeral, apresentam um acervo eclético, constituídode objetos de personagens locais, dos processosde colonização, de minérios ou mesmo da arte jáconsagrada como sendo nacional, seja ela erudita,seja popular.

Nos estados do Sul, observamos o maior nú-mero de museus proporcionalmente ao númerode habitantes (Figura 3). Em Santa Catarina, 74,36%dos museus existentes foram criados nas últimas

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três décadas. Desses, apenas 15,38% localizam-seem Florianópolis. Há também um aumento do nú-mero de museus criados por empresas privadas.O padrão de crescimento no Rio Grande do Sul eno Paraná acompanham o modelo descrito, ouseja, o de multiplicação acelerada de museus lo-cais nas três últimas décadas, subsidiados por go-vernos estaduais e municipais, como tambémcrescimento do número de museus sustentadospor capital privado.

Seria interessante observar o comportamentodeste padrão de descentralização e investimentosprivados nos demais estados do Brasil. Entretanto,somente existem esses dados para o estado do Riode Janeiro (Braga, 2002), onde o crescimento donúmero de museus apresenta características dife-rentes. Comparado com o índice nacional, nãohouve neste estado um aumento significativo nasúltimas décadas (59,37%). Além disso, a grandemaioria dos museus criados nas últimas quatro dé-cadas ainda se concentra na capital (79,49%). Ade-mais, o crescimento não está associado a iniciati-vas municipais, mas o padrão se confirma comrelação à elevação dos índices de investimentoprivado. Enquanto no período de 1960 a 1979 osmuseus criados foram majoritariamente financia-dos por órgãos públicos, federais ou estaduais, noperíodo subseqüente, isto é, entre 1980 e 2000,um número bem maior foi resultado de iniciativaprivada (Tabela 1).

Tabela 1Museus do Rio de Janeiro por Natureza Jurídica

Fonte: Dados obtidos em Comissão do Patrimônio Cul-

tural (1997, 2000) e Braga (2002).

O Museu Internacional de Arte Naïf, o MuseuH. Stern, o Museu Amsterdam Sauer ou mesmo oMuseu Casa do Pontal (arte popular) são institui-ções privadas, localizadas na capital do estado eque atendem os setores de maior poder aquisitivoda população. Além disso, embora não tenhamosdados estatísticos sobre a forma de financiamentoatual de todos os museus do Rio de Janeiro, algu-mas entrevistas com diretores dos grandes museusnacionais indicaram, por exemplo, que no MuseuHistórico Nacional aproximadamente metade deseu orçamento provém, atualmente, de empresasprivadas.

Contudo, apesar da grande concentração demuseus na capital, há algumas transformações im-portantes decorrentes das práticas desenvolvidasnas últimas décadas, qual sejam, maior diversifica-ção e pluralidade da apropriação de bens simbó-licos. A criação do EcoMuseu do Quarteirão Cul-tural do Matadouro, em 1983, foi uma iniciativade moradores do bairro periférico de Santa Cruz,e surgiu a partir de demandas locais. Outro aspec-to a ser ressaltado é que a temática histórica e na-cionalista, que ainda predominava nos museus doestado entre 1960 e 1980 (Museu da República,Museu do Primeiro Reinado, Museu Villa-Lobos),vem sendo diversificada nas últimas décadas.

Apesar da escassez de dados comparativosentre regiões, podemos afirmar que, primeiro,houve um crescimento acelerado no número demuseus municipais, em Minas Gerais; segundo,uma menor descentralização no Rio de Janeiro,embora acompanhada de maior pluralidade temá-tica e aumento de iniciativas privadas; e, terceiro,uma descentralização dos museus paralelamenteao aumento de investimentos privados, nos esta-dos do Sul. Em contrapartida, Bahia, Pará e Mara-nhão têm o menor número de museus por habi-tantes. A Bahia, embora tenha se destacado comopólo de referência dos movimentos de fortaleci-mento da identidade negra, é um estado de pou-cos museus. Em suma, os museus brasileiros con-centram-se nas regiões Sul e Sudeste, foram emsua maioria criados recentemente, estão distribuí-dos pelos municípios e é significativo o crescimen-to do investimento privado nessas instituições.Esse padrão é compatível com o descrito em di-

1960-1979 1980-2000

Ministérios Públicos e

Secretarias do Estado 14 6

Prefeituras 0 2

Universidades Federais 1 1

Fundações e Instituições Públicas 0 7

Instituições Privadas 2 9

MUSEUS BRASILEIROS E POLÍTICA CULTURAL 63

versos países, onde ocorreu a descentralização.Contudo, ainda não temos estudos qualitativosque nos forneçam instrumentos para melhor ava-liarmos se o crescimento do número de museusreflete interesses econômicos, políticas locais clien-telistas ou, ainda, iniciativas de diversas comunida-des em preservar sua memória. Essas iniciativasrevelam sobretudo as condições de organização, adisputa por reconhecimento e o fortalecimento deauto-estima como um processo de negociação denarrativas constituídas de que participam diversossetores da sociedade (MacDonald e Fyfe, 1996).

Os museus e seu público

Um dos dados mais simples utilizados paraavaliar o desempenho dos museus diz respeito aseu público. Segundo Almeida,

[...] nos últimos 25 anos, na Europa e América doNorte, houve um grande aumento do número depesquisas de público de museus, passando de en-quetes demográficas para estudos de comporta-mento, personalidade, referências, reações e assi-milações (Almeida, 1995, p. 325).

Ainda, segundo esta autora, as exposiçõesrecentes baseiam-se no processo de comunicaçãoe os profissionais têm aprimorado suas pesquisas

sobre o perfil e as expectativas do público visitan-te. Os museus hoje são instrumentos que educama partir da interação do visitante com o meio am-biente e por intermédio da utilização de instru-mentos dinâmicos e plurais. Enfatizam-se o poten-cial multidimensional da visita e os processosafetivos e sensório-motores, evitando-se disposi-ções lineares, factuais e hierarquizadas. Além dis-so, faz parte de práticas desenvolvidas nos museusa observação constante da resposta do visitanteaos estímulos apresentados. Como situar os mu-seus brasileiros em relação a essas práticas? Procu-ram eles atender as demandas da população? Quaisas práticas desenvolvidas?

No Brasil, não sabemos quantos são os mu-seus, qual o acervo predominante, a natureza jurí-dica da instituição, nem mesmo a data da criação.Tampouco temos dados sobre público, objetivostraçados e resultados obtidos de grande parte dosmuseus. Apesar de haver uma tradição de educa-ção patrimonial no Brasil, e de alguns museus,principalmente os de ciência, estarem incorporan-do novas abordagens interativas com o público,estas ainda são práticas negligenciadas pela maio-ria dos museus brasileiros. Almeida, por meio delevantamento bibliográfico cuidadoso, destaca ospoucos estudos sobre o comportamento do públi-co no Brasil, e chama atenção para o fato de queesses trabalhos não produziram novas exposições,políticas culturais ou mesmo modificações nas ex-

Tabela 2Museus e Público Visitante7

Fonte: Dados obtidos em Forteau e Octobre (1999) e Braga (2002).

Número de Visitantes/Ano

Estados Unidos National Gallery, Washington 6.200.000Metropolitan Museum of Art, Nova York 3.723.000

França Louvre, Paris 6.060.000Musée d’Orsay 2.724.000

Inglaterra British Museum 5.620.000Brasil Museu de Arte Moderna, São Paulo 302.000

Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro 55.000Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro 75.000Museu Paulista, São Paulo (média 1994-1998) 260.000Museu Nacional, Rio de Janeiro 85.000

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posições anteriores, apontando a descontinuidadedas mesmas (Almeida, 1995, pp. 325-327).

Entre os museus que recebem, hoje, mais vi-sitantes no Brasil estão o Museu Paulista e o Mu-seu Butantã, em São Paulo, o Museu da Inconfi-dência, em Minas Gerais, e o Museu Imperial, noRio de Janeiro. Esses museus recebem entre 200 a300 mil visitantes por ano. Os grandes museus na-cionais de países europeus e norte-americanos re-cebem de 2 a 6 milhões de visitantes por ano,sendo uma das atividades culturais de maior su-cesso na disputa de público. O Museu do Louvre,por exemplo, recebe mais ou menos o mesmonúmero de visitantes que a torre Eiffel (Tabela 2).

Evidentemente que não podemos consideraresses números em termos absolutos e comparar onúmero de visitantes do Louvre ou do British Mu-seum com o do MAM ou do Museu Nacional. Es-ses grandes museus europeus e norte-americanosagregaram obras de arte e tesouros incalculáveis dediversas partes do mundo durante os séculos XIXe XX, estão localizados em centros do capital finan-ceiro e mundial, cuja população tem um poderaquisitivo e demandas culturais muito diferentesdaquelas presentes na população brasileira. Alémdisso, não podemos levar em consideração apenasnúmeros. Levar o grande público ao museu, aindaque composto pelos diversos segmentos da popu-lação, não significa necessariamente que se estádemocratizando a cultura, nem, muito menos, aten-dendo a demandas de parcelas maiores da popu-lação. Pode-se estar apenas modificando a natu-reza da exposição e transformando elementosculturais mais complexos em objetos estereotipa-dos a serviço apenas de práticas de consumo e dis-tração. No entanto, a diferença de público é tãogrande que merece alguma atenção.

Na França, a relação entre o público visitantee a população mostra que 33% dos franceses vãoao museu pelo menos uma vez por ano. Somenteas salas de cinemas conseguem atrair um públicomaior (Ministère de la Culture et de la Communica-tion, 2000). Na Inglaterra, os índices variam de 29 a58%. No Canadá, esse percentual atinge 50%. NosEstados Unidos, o National Research Centre for theArts avaliou que 56% dos norte-americanos visitamum museu de história pelo menos uma vez por ano

(Hooper-Greenhill, 1996, p. 61). Observamos, ain-da, uma preocupação constante por parte tanto dospróprios museus, como das autoridades governa-mentais em aumentar o percentual de visitantes. Asautoridades francesas associam a freqüência de 33%à indiferença do público. Por essa razão fomentam-se debates públicos para buscar soluções nessesentido. O ex-ministro Jack Lang declarou inúmerasvezes à imprensa que os museus deveriam abrirsuas portar para o cidadão comum. Na Inglaterra,Matthew Evans, ao assumir a direção do Museums,Galleries and Libraries Commission, após tomar co-nhecimento de que a visita a museus tinha caídoem 4%, declarou à imprensa que se o público nãoia a museus que estes fossem às escolas, pubs e lo-jas e procurassem expor nestes estabelecimentosseu acervo. E toda essa preocupação se dá a partirde números que mostram que a visita a museus egalerias tornou-se, entre as práticas culturais, umadas mais procuradas nesses países. Quais os objeti-vos traçados por cada museu brasileiro em rela-ção aos visitantes? Evidentemente não podemosgeneralizar, mas é possível descrever aqui o com-portamento do público observado em três mu-seus brasileiros.8

O Museu Nacional, situado na Quinta da BoaVista, no Rio de Janeiro, recebe em torno de 75mil visitantes por ano. À primeira vista, grandeparte desse público é constituído por estudantes,mas, segundo entrevistas realizadas com profissio-nais e visitantes, constatou-se que se trata sobretu-do de alunos das escolas públicas próximas àQuinta da Boa Vista e de turistas ocasionais de ou-tros estados do Brasil. Estudantes de escolas priva-das ou mesmo de escolas públicas da zona sul sãomais raros. Somente quando são produzidas expo-sições temporárias com qualidade técnica elevadaé que um público de estudantes de melhor prepa-ro acadêmico é atraído para o museu.

Um dos problemas apontados pelos visitan-tes foi o mau estado de conservação do acervo. Omuseu, realmente, conta com sérios problemas deconservação tanto do acervo como do próprioprédio, que foi o palácio imperial. Sanitários en-contram-se deteriorados; há falta de bebedouros,cafés e locais para o público se sentar; vitrines esalas apresentam pouca preservação e limpeza; le-

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gendas, sinalização e folhetos explicativos inexis-tem; e, por fim, os guia, quando disponíveis, estãomal preparados.9 Devido às dimensões do acervodo Museu Nacional, e do próprio palácio que oabriga, a conservação do prédio e do acervo de-pende de grandes investimentos, difíceis de seremobtidos. O Museu localiza-se no interior de umparque que, por sua vez, também precisa de in-vestimentos de modo a proporcionar segurança elazer para o público. A situação precária das ex-posições do Museu Nacional justifica e fortalece,em grande medida, a associação que os morado-res da cidade fazem entre museu e coisa velha(Chagas, 1987).

Outro problema do Museu Nacional diz res-peito à falta de profissionais apropriados. Em 1999,muitos dos módulos em exposição datavam de cin-qüenta anos atrás. A maioria de seus profissionaistêm fortes vínculos com a pesquisa acadêmica, umavez que o museu faz parte da Universidade Federaldo Rio de Janeiro. Em contrapartida, há um núme-ro reduzido de profissionais responsáveis pelo es-tudo dos objetos a serem expostos, pela avaliaçãodo público e pela análise de questões museográfi-cas. Os profissionais entrevistados foram incapazesde dizer até mesmo quais eram os objetos em ex-posição. Há, sem dúvida, uma tentativa, por partedos diretores, de implementar mudanças nesse sen-tido, reorganizando o acervo, modernizando osmódulos expositivos, reconstruindo narrativas eampliando o diálogo com o público. Mas, vítima deum círculo vicioso, o museu carece de público, pro-fissionais adequados e investimento.

Diferentemente do Museu Nacional, o MuseuPaulista obteve recentemente apoio financeiro nãosó da Universidade de São Paulo (USP), como tam-bém de empresas paulistas. Conseguiu, com isso,fazer obras e melhorias no prédio, reorganizar eampliar o acervo, contratar profissionais e multipli-car o número de exposições temporárias. As expo-sições permanentes procuram mostrar a vida coti-diana na cidade de São Paulo, estimulando umapostura crítica em relação a discursos mistificado-res, etnocêntricos, nacionalistas e com pretensõesà universalidade (Bezerra, 1993). Contudo, em en-trevistas, diversos profissionais da instituição, de-clararam que não havia políticas traçadas para au-

mentar o número de visitantes no Museu, já que setratava, como justificativa, de um dos museus maisvisitados do Brasil. A afirmação é absolutamenteverdadeira, mas se considerarmos que São Paulotem aproximadamente 15 milhões de habitantes, eé uma das regiões mais ricas do país, com grau ele-vado de urbanização, resta perguntar por que mui-tos profissionais se contentam, hoje, com o núme-ro de 260 mil visitantes por ano. Isso se torna maispreocupante quando os dados mostram que, em1955, o museu recebeu 280 mil visitantes. Alémdisso, ainda com base em entrevistas realizadas noMuseu Paulista, constatamos que a maior visitaçãodo museu ocorre no feriado de 7 de Setembro,quando pessoas da periferia da cidade procuramlazer principalmente nos jardins do museu.

Uma outra questão a ser investigada no Mu-seu Paulista é o significado que ele tem para seusvisitantes. Independentemente das diversas narra-tivas construídas no interior do museu, que subs-tituíram antigos discursos comemorativos, elecontinua a ser compreendido pelo público comoo monumento que celebra o “grito do Ipiranga”,e, portanto, visitado sobretudo na data da procla-mação da Independência. Os moradores de SãoPaulo não parecem conhecer sua nova proposta –o prédio continua sendo associado à antiga mora-dia de D. Pedro I ou de sua amante, função quenunca teve.

A terceira instituição a ser considerada é oMuseu da República, no Rio de Janeiro, que temse modernizado, passando por importantes refor-mas realizadas com um financiamento substantivo.As exposições atuais procuram se afastar do enal-tecimento a Getúlio Vargas, narrando a história re-publicana de uma nova maneira, o que inclui, porexemplo, objetos da cultura popular. Além disso,o museu delineou já há alguns anos uma políticasignificativa de aproximação com a comunidadelocal e tem obtido sucesso nesse sentido. O par-que do museu é uma área de lazer importante, lo-calizada no Catete, um bairro da zona sul, e rece-be em torno de 900 mil visitantes por mês. OMuseu da República incorporou em seu espaçosala de cinema, livraria, restaurante, auditóriospara debates e palestras e passou a promovereventos ao ar livre. Certamente o público do mu-

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seu aumentou na última década, mas isso combase nos parâmetros apresentados anteriormentepara os demais museus.

Segundo um estudo estatístico realizado em1999 pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas(Ence), 59% dos visitantes do Museu da Repúbli-ca recebem mais de dez salários mínimos pormês, isto é, a maior parte dos visitantes encontra-se entre os 24,6% mais ricos da população brasi-leira. Se considerarmos o grau de escolaridade, aexclusão é maior: 62% dos visitantes têm ensinosuperior, o que corresponde apenas a 8,9% da po-pulação. Em relação à ocupação dos visitantes, amaior incidência é de estudantes e professores(35,9%). Além disso, a partir de depoimentos for-necidos pelos próprios profissionais do museu,chegamos à conclusão de que o museu continuasendo, em grande medida, reconhecido pela po-pulação por ter sido o Palácio do Catete, local emque Getúlio Vargas se suicidou. Apesar dos inves-timentos e das iniciativas no sentido de abrir asportas do museu e seu entorno para a população,o Museu da República continua com um públicobastante seleto. Independentemente dos objetivostraçados e das novas narrativas criadas, observa-se que os visitantes ainda associam majoritaria-mente o museu a casa onde Getúlio se suicidou.

O que podemos apontar em relação às prá-ticas desenvolvidas nesses três museus é que,apesar de situações bem distintas no que diz res-peito a investimento, práticas expositivas e estadode conservação, observamos um distanciamentomuito grande entre cada uma dessas instituições eo público. Como analisamos, os museus contem-porâneos em geral têm se dedicado às pesquisassobre comunicação e público, reformulando apartir daí os projetos a serem traçados. Além dis-so, avaliações contínuas propiciam um aprimora-mento das práticas desenvolvidas (Lumley, 1988;Hooper-Greenhill, 1996). Entretanto, no Brasil,não sabemos dizer nem mesmo qual a proporçãoda população que vai a museus. Também não hádados comparativos entre a visitação de museus eoutras atividades culturais. Nos três estudos decaso, os resultados não são muito alentadores. NoMuseu Nacional, não há investimentos nem estu-dos sistemáticos sobre o público, e a procura ao

Museu está muito abaixo do que poderíamos es-perar, dada a amplitude de seu acervo, sua loca-lização e seu significado histórico. No Museu Pau-lista, há investimentos e estudos sobre o público,mas ainda observa-se uma procura limitada e semmuita relação com os novos objetivos traçadospor seus profissionais. No Museu da República,observamos investimentos, estudos sobre o públi-co, diversificação de atividades, mas, ainda assim,os resultados não mostram um padrão de visita-ção alternativo em relação aos demais. Os proble-mas relacionados à legitimidade dos museus bra-sileiros, portanto, envolvem outras questões,analisadas na seção seguinte.

Políticas Culturais: autonomia adminis-trativa, Estado e mercado

Diversos autores têm apontado que as práti-cas culturais na América Latina, diferentemente dospaíses europeus e norte-americanos, não se cons-tituíram em uma esfera autônoma, permanecendofortemente ligadas ao poder público (Franco, 1970;Candido, 1985; Ortiz, 1988). O aspecto central doconceito de autonomia está na emergência de umuniverso regulado por um aparato de legitimaçãode um discurso próprio (Ortiz, 2002). É possívelobservar, entretanto, diferenças significativas naforma pela qual esses campos foram organizados.Vejamos inicialmente o caso na Inglaterra.

Segundo o depoimento de um dos diretoresdo Museu Britânico (Wilson, 1989), o corpo diretordo museu (Board of Trustees) é escolhido a partirdo comprometimento de alguns profissionais comos objetivos declarados e as metas propostas paraa instituição. Seus membros não são remuneradosno exercício do mandato e não podem ter qual-quer vínculo econômico com a instituição. Eles es-colhem e nomeiam curadores e demais profis-sionais do museu e têm a responsabilidade deencaminhar as atividades desenvolvidas segundocritérios próprios ao campo estabelecido. O princi-pal poder deliberativo está concentrado na mão depares, legitimados pelo conhecimento notório ecomprometimento com os objetivos estabelecidospela instituição de preservar os valores mais caros

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à nação. Como há um aparato institucional legiti-mado socialmente, ele tem o poder de defender osinteresses da instituição ante as pressões políticas,comerciais, da imprensa e mesmo da opinião pú-blica (Idem, ibidem). O processo de avaliação dodesempenho de cada museu que faz parte do sis-tema é razoavelmente transparente, constante ebem recebido pelas diversas instituições. Na Ingla-terra, há um órgão governamental, o Conselho deMuseus, Bibliotecas e Arquivos (MLAC), que levan-ta dados e publica estudos estatísticos sobre as di-versas atividades desenvolvidas pelos museus, seusméritos e pontos fracos, sejam eles públicos, sejamprivados (Museums & Galleries Commission, 1998,1999). Os investimentos públicos e privados ba-seiam-se nos critérios de avaliação.

Na França, a presença do Estado como ela-borador de políticas culturais de apoio e avaliaçãodos museus é bem mais forte do que na Inglater-ra. Ainda assim, podemos dizer que há um com-promisso das instituições culturais francesas comobjetivos traçados por elas próprias e que as prá-ticas desenvolvidas nos museus convivem ou seimpõem a interesses políticos alheios ao campocultural. Também aqui, observa-se um sistema deavaliação contínuo de práticas desenvolvidas e re-sultados obtidos pelas diversas instituições. O De-partamento de Informação e Comunicação, do Mi-nistério da Cultura e da Comunicação, congregaum número de profissionais reconhecidos pelosprofissionais de museus e pela população em ge-ral e publica regularmente uma grande quantida-de de avaliações, análises e estudos qualitativos equantitativos sobre a performance das práticasculturais (Dubois, 1999; Ministère de la Culture etde la Communication, 1991, 2000). Embora seja oEstado que regulamenta e avalia grande parte dasatividades desenvolvidas, estas são acompanhadasde perto por pesquisadores, intelectuais e pelo pú-blico em geral.

Os museus norte-americanos são mais sus-ceptíveis tanto às pressões do poder econômico,isto é, de fundações, de pessoas físicas e de gru-pos organizados que doam somas significativas –por exemplo, as Associações de Amigos do Museu(AAM) –, como da opinião pública. Mas tambémeles têm conseguido legitimar um discurso próprio

e garantir certa autonomia em relação a grupos fi-nanciadores, à mídia e a pressões diversas. Estu-dos sobre os museus norte-americanos mostramque eles se comportam como uma esfera públicaaberta, em que diversos interesses são negociados.A produção de exposições tem sido analisadacomo sendo resultado de verdadeiras “guerras cul-turais”. Segundo um dos profissionais do MuseuNacional da História da América (The NationalMuseum of American History), essa instituiçãopassou a incorporar objetos que faziam parte decomédias televisivas, e aproximar-se da história docotidiano, a partir de um processo conflituoso emque diversos setores da sociedade se posiciona-ram no sentido de construir alternativas à intençãodos membros contribuintes de manter o museucomo símbolo da história tecnológica e militar danação (Hughes, 1997). O Museu Guggenheim temsido criticado justamente por não manter suasfronteiras sobre controle com o poder econômico.Da mesma forma que na Europa, os museus nor-te-americanos são avaliados constantemente porinstituições credenciadas, como a Comissão Nacio-nal de Estudos Estatísticos sobre Museus, e o re-sultado das atividades desenvolvidas é divulgadoamplamente.

García Canclini (1992) procura mostrar aolongo de seu trabalho que a participação em umaesfera pública decisória não é necessariamenteantagônica a interesses de mercado. O autor gos-taria de substituir os parâmetros de Estado e mer-cado por um processo de negociação mais amplo,em que participam diversos setores da sociedadecivil, sendo também fator determinante a própriaestruturação de cada esfera discursiva. A grandetransformação observada nos museus contempo-râneos não pode ser reduzida a uma maior adap-tação ao mercado, pois o que eles fazem é trazerà tona uma nova percepção de justiça, em que in-divíduos reagem de forma muito mais ativa aoseu entorno do que no passado, conquistando odireito de rejeitar normas culturais majoritárias eestruturas narrativas de poder e prestígio em sualuta por igual respeito.

Em que pese às diferenças, museus euro-peus e norte-americanos conseguiram construirum campo relativamente autônomo, cujos objeti-

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vos são defendidos por aqueles mais próximos oumais ativos no próprio campo que os constitui.Da mesma forma que podemos falar de um cam-po literário, científico, televisivo, em que certasnormas, regras e valores organizam práticas de-senvolvidas, podemos pensar em um campo mu-seal. Além disso, podemos compreender tantodisputas por capital simbólico no interior do cam-po, como a utilização deste capital na manuten-ção de prestígio em outras esferas de poder da so-ciedade. No estudo sobre museus, assim como noestudo sobre o gosto, Bourdieu e seus colabora-dores mostraram como determinado capital sim-bólico pode ser utilizado por agentes sociais parase posicionarem de forma privilegiada na hierar-quia social (Bourdieu e Darbel, 1969; Bourdieu,1979). Há, entretanto, um outro aspecto no traba-lho de Bourdieu que gostaríamos de ressaltar.Embora este autor assinale que as fronteiras entreos diferentes campos não são fixas, e que, portan-to, o conceito de campo é relativo, ele procuraexplicar a dinâmica entre eles, mostrando, porexemplo, que quanto mais o campo do conheci-mento for autônomo, menos ele dependerá dapolítica, da economia ou da religião (Bourdieu,2001, pp. 167-173).

No caso dos museus brasileiros, a construçãode um campo museal precisa necessariamente serpensada a partir de políticas culturais desenvolvi-das pelo Estado. Como vimos, a grande maioriados museus foi criada pelo Estado e é ainda poreles mantida. García Canclini (1992) aponta astransformações recentes por que têm passado osmuseus latino-americanos – segundo o autor, asúltimas das instituições culturais a serem direta-mente subvencionadas pelo Estado. Além disso,ele analisa a tendência contemporânea de privati-zar e transferir para a sociedade civil as responsa-bilidades que antes cabiam ao Estado. A observa-ção de Canclini é válida para o caso brasileiro. NoBrasil, tem sido clara a tentativa do Estado de di-minuir sua intervenção nas instituições culturais.Desde 1991, por exemplo, a Lei Rouanet (n.8313/91) permite que pessoas físicas e jurídicaspossam investir na área da cultura e abater estaquantia do imposto devido.

De um lado, os investimentos públicos nos

museus têm diminuído gradativamente, levando asinstituições a se tornarem mais competitivas, a uti-lizarem técnicas de marketing e a captarem recur-sos entre empresas privadas. Os grandes museus,como, por exemplo, o Museu Histórico Nacional,têm diversificado e ampliado as exposições, con-seguindo até mesmo duplicar seu orçamento apartir da captação de recursos privados. De outrolado, entretanto, a redução da política cultural àsleis de incentivo fiscal deixa evidente a fragilidadeda infra-estrutura que apóia e regula os museus. Aretração do Estado em relação às políticas inter-vencionistas relativas à cultura representou nãosó a “não intervenção”, como também o fortale-cimento de regras de mercado sobre um campofracamente estruturado. Como apontado ao lon-go deste artigo, os suportes necessários de ava-liação, estruturação e renovação de um sistemaexistente não se consolidaram no decorrer das úl-timas décadas.

Embora os museus brasileiros tenham consti-tuído um campo próprio, denominado interna-mente como “museal”, em que valores, critérios,práticas e discursos específicos são reconhecidos,é notória a falta de transparência e de visibilidade,por exemplo, na gestão de recursos e seleção deprofissionais, questões ainda vinculadas a trocasde favor e decisões políticas que não atendem cri-térios claros estabelecidos dentro do campo. Con-trariamente aos avanços na área do ensino, aindanão há sistemas de avaliação das práticas desen-volvidas pelos museus. Em sua maioria, eles nãopossuem uma estrutura mínima para procedernem mesmo avaliações internas de seu desempe-nho. Alheios às reivindicações políticas e sociaisque ocorrem na sociedade, os projetos expositivosainda não incorporaram nem os debates recentessobre a violência simbólica inerente ao aparatodiscursivo, nem as pesquisas sobre o comporta-mento do público.

Se antes eram associados a narrativas oficiaisda nação e à cultura das elites dominantes, os mu-seus, tanto europeus como norte-americanos, apa-recem hoje como espaços de negociação em queos diversos atores demonstram um cuidado cadavez maior com a diversidade cultural e com o fatode que constroem narrativas sobre o “outro”. No

MUSEUS BRASILEIROS E POLÍTICA CULTURAL 69

Brasil, onde a desigualdade social atinge níveismuito superiores, os museus enfrentam, entretanto,um duplo desafio: ao se abrirem a uma participa-ção maior do público necessitam trabalhar não sócom a diversidade cultural do país, respeitando asdiversas gramáticas locais, a partir da contribuiçãode tecnologias e abordagens desenvolvidas na esfe-ra transnacional, mas também com problemas dedistribuição de renda e poder, responsáveis pelaexclusão de grande parte da população das arenasculturais. Será a partir da capacidade de resposta aquestões que surgem do entrelaçamento entre es-pecificidades locais e estruturas e processos maisamplos, portanto, que poderemos esperar uma re-novação das instituições que se voltam para a pre-servação do patrimônio cultural do país.

NOTAS

1 A Comissão do Patrimônio Cultural obteve, em1997, de 1.000 questionários distribuídos, 852 res-postas. Houve um segundo levantamento, publica-do em 2000, mas, segundo os próprios realizadosda enquête, a resposta obtida foi menor. Estão au-sentes das duas listagens não só museus importan-tes, como o Museu Nacional de Belas Artes, do Riode Janeiro, como dados essenciais sobre alguns mu-seus (data de criação, natureza pública ou privadae assim por diante). Não há estudos estatísticos so-bre os dados coletados pela CPC disponibilizadosao público.

2 No caso do Rio de Janeiro, uma tese recente demestrado (Braga, 2002) levantou dados que com-plementam aqueles fornecidos pela CPC, permitin-do alguns avanços na análise da situação dos mu-seus no Rio de Janeiro. Em relação aos demaisestados, poucos dados adicionais àqueles obtidospela CPC foram obtidos.

3 Para uma excelente análise da formação de Affonsod’Esccragnolle Taunay (1917-1945) como historiador,seus modelos historiográficos e a relação entre suasconcepções de História e o trabalho museográficodesenvolvido no Museu Paulista, ver Brefe (1999).

4 A convivência entre os dois modelos de preserva-ção, o primeiro saudosista e ligado à tradição, en-quanto o segundo voltado para o “abrasileiramentodo brasileiro” pode ser compreendido a partir da vi-são de que o modernismo foi suficientemente “am-

plo e ambíguo para permitir interpretações bastan-te variadas, e não se colocar em contradição frontalcom o programa político e ideológico do Ministérioda Educação. Em algumas versões, modernismo seaproximaria perigosamente do irracionalismo na-cionalista e autoritário europeu, e não é por acasoque o próprio Plínio Salgado seja identificado comuma das vertentes deste movimento” (Schwartzmanet al., 1984, p. 98).

5 Para uma análise dos diversos movimentos que an-tecederam a criação do Museu de Arte Moderna deSão Paulo, como Sociedade Pró-Arte Moderna, Clu-be dos Artistas Modernos, Salão de Maio, FamíliaArtística Paulista e o Sindicato dos Artistas Plásticos,bem como da relação entre o museu e a aberturadas bienais a partir da iniciativa de Francisco Mata-razzo Sobrinho, ver Almeida (1976).

6 O autor utiliza o Guia Quatro Rodas de 1991 comobase de dados e faz sua análise sobre o universo decinqüenta museus (Dickenson, 1994, p. 224). Em1997, a CPC listou 131 museus no estado.

7 Esta Tabela apresenta dados aproximados, uma vezque não há estudos disponíveis no Brasil que for-neçam esses dados com precisão. Além disso, a se-leção de museus apresentada foi determinada pelasinformações obtidas. Várias tentativas foram realiza-das, por exemplo, para obtenção de dados sobrepúblico visitante junto ao Museu de Arte de SãoPaulo, sem que quaisquer respostas fossem obtidas.Como não há avaliação e divulgação pública daspráticas de museus, o fornecimento de dados fica acritério e julgamento de cada instituição.

8 Durante 1998 e 1999 entrevistas foram realizadascom os diversos profissionais que trabalhavam nes-ses museus com o intuito de percebermos sua inser-ção e motivação na instituição. Tendo ainda comobase uma metodologia qualitativa, procurou-se, pri-meiro, observar detalhadamente o comportamentodos visitantes no interior dos museus e, segundo,entrevistar alguns deles. Agradeço aos bolsistas deiniciação científica Denise de Almeida Rodrigues,Caty Ane de Souza e Fabio Ponso, pela participaçãona pesquisa, e à Universidade do Estado do Rio deJaneiro (UERJ) e ao CNPq pelo apoio institucional efinanceiro.

9 Ver relatório interno, realizado pela professora Ânge-la Maria Moreira Martins, em 1995, sobre as condi-ções encontradas pelos usuários do Museu Nacional.

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MUSEUS BRASILEIROS EPOLÍTICA CULTURAL

Myrian Sepúlveda dos Santos

Palavras-chaveMemória coletiva; Museus;Modernidade; Política cultural.

Os estudos sobre museus multiplica-ram-se na última década. Os museushá muito deixaram de ser objeto dehistoriadores da arte, passando a in-teressar cientistas sociais, que ospercebem como uma das institui-ções centrais da modernidade. NoBrasil, observamos, na última déca-da, uma série de estudos importan-tes que nos fornecem análises insti-gantes sobre a constituição dosmuseus no século XIX, sua relaçãocom as instituições acadêmicas eseu papel na constituição da nação.O objetivo deste artigo é ampliareste campo de investigação. Paraisso, analisam-se práticas, estruturas,políticas culturais e processos pre-sentes entre os museus brasileiros,tendo em vista as transformaçõespor que passa a sociedade brasileirae sua relação com contextos trans-nacionais.

BRAZILIAN MUSEUMS ANDCULTURAL POLICY

Myrian Sepúlveda dos Santos

Key wordsCollective memory; Museums;Modernity; Cultural Policies.

Many studies on museums havebeen made in the last decade. Mu-seums have long been put aside byart historians, being of more interestto social scientists who have percei-ved them as central institutions ofmodernity. It has been observed inBrazil during the last decade a seriesof important studies analyzing theconstitution of museums in the nine-teenth century, its relationship withacademic institutions, and its role inthe making of the nation. The articleaims at broadening this field of in-vestigation by analyzing practices,structures, cultural policies, and cur-rent processes among Brazilian mu-seums, considering the transforma-tions the Brazilian society has beenthrough and its relationship withtransnational contexts.

MUSÉES BRÉSILIENS ET POLITI-QUE CULTURELLE

Myrian Sepúlveda dos Santos

Mots-clésMémoire collective; Musées; Moder-nité; Politique culturelle.

Les études à propos des musées sesont multipliées au cours de la der-nière décennie. Les musées, jusqu’àlors réduits à l’intérêt d’historiensd’art, intéressent, de nos jours, lesscientifiques du domaine ses scien-ces sociales, qui les perçoivent entant qu’institutions centrales de lamodernité. Au Brésil, nous obser-vons, au cours des derniers dix ans,la réalisation d’une série d’études im-portantes qui nous fournissent desanalyses instiguantes sur la constitu-tion des musées au XIXe siècle, deleur relation avec les institutions aca-démiques et de leur rôle dans laconstitution de la nation. L’objectifde cet article est d’élargir ce champd’investigation. Pour cela, nousanalysons les pratiques, les structu-res, les politiques culturelles et lesprocessus présents entre les muséesbrésiliens, en vue des transforma-tions par lesquelles passe la sociétébrésilienne et de sa relation avec lescontextes transnationaux.