mudanzas-gardabarreiras

12
Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicación ______________________________________________________________________________ www.comunicacion3punto0.com |[email protected] 1 Do gatekeeping ao gatewatcher: o papel das redes sociais no ecossistema mediático Prof. Doutor João Canavilhas Universidade da Beira Interior Covilhã, Portugal Curriculum Vitae : João Canavilhas es licenciado en Comunicação Social (Universidade da Beira Interior) y doctor por la Universidad de Salamanca. (España). Actualmente es profesor en la Universidade da Beira Interior donde imparte clases de webperiodismo, periodismo radiofónico e infografia multimedia para periodistas. Además de las funciones docentes, es Director de periódico online URBI, el primer periódico universitario portugués en la web y coordinador de radio y televisión de UBI. Es miembro del Centro de Investigación Labcom-UBI (evaluación FCT: Very Good) donde investiga temas conectados con nuevas tecnologías y periodismo. ABSTRACT (n.b.: En el idioma original de la Comunicación, Español, Inglés, Portugués o Francés, 250 palabras máximo) A massificação da Internet está a redefinir as relações entre o jornalismo e os leitores. O modelo de difusão característico da primeira época dos media (“um para muito”) deu lugar aos modelos descentralizados e bidireccionais da segunda era dos media (Poster, 2000) em que a informação circula de “muitos para muitos”, de “muitos para um” e de “um para um”. A mudança no ecossistema mediático foi acelerada pelo aparecimento dos media sociais (blogues, microblogues e redes sociais) com o aumento do número de fontes e, consequentemente, da quantidade de informação em circulação. As consequências desta oferta excessiva sentem-se na actividade jornalística, mas também na forma como os leitores se relacionam as notícias: enquanto os media aperfeiçoam formas de distribuição que os diferencie da concorrência e os aproxime da audiência, os leitores procuram processos que lhes permitam triar a avalanche de informação recebida diariamente pela Web. Se a blogosfera contribui sobretudo para aumentar a oferta informativa, influenciando fundamentalmente o lado da emissão, as redes sociais têm mais preponderância ao nível da recepção, estando a funcionar como um segundo nível de seriação de notícias. Trata-se de um novo tipo de gatekeeping desenvolvido pelos media nos seus canais sociais, mas também por cidadãos com prestígio (gatewatchers) em torno dos quais se constroem comunidades virtuais. Neste trabalho analisa-se o potencial das redes sociais na redistribuição de notícias, nomeadamente no que concerne ao aumento do número de leitores e à transformação das audiências em comunidades com maior intervenção no ecossistema mediático. ABSTRACT (Inglés, siempre debe existir un abstract en inglés, 250 words máx) Internet massification is redefining the connections between journalism and its readers. The diffusion model, characteristic of the first media era (“from one to many”) gave place to decentralised and bidirectional models, in the second media era (Poster, 2000), where the information runs “from many to many”, “from many to one” and “from one to one”. The changes in the media ecosystem were accelerated by the “social media” (blogs, microblogs and social networks) multiplying the number of sources, thus the quantity of information. The consequences of this excessive offer of information can be felt in the way readers relate themselves with the news: as the media perfect forms of distribution that distinguish them from

Upload: eduardo-leonel-barreto

Post on 16-Nov-2015

212 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Doutor João Canavilhas

TRANSCRIPT

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    1

    Do gatekeeping ao gatewatcher: o papel das redes sociais no ecossistema meditico

    Prof. Doutor Joo Canavilhas Universidade da Beira Interior

    Covilh, Portugal

    Curriculum Vitae : Joo Canavilhas es licenciado en Comunicao Social (Universidade da Beira Interior) y doctor por la Universidad de Salamanca. (Espaa). Actualmente es profesor en la Universidade da Beira Interior donde imparte clases de webperiodismo, periodismo radiofnico e infografia multimedia para periodistas. Adems de las funciones docentes, es Director de peridico online URBI, el primer peridico universitario portugus en la web y coordinador de radio y televisin de UBI. Es miembro del Centro de Investigacin Labcom-UBI (evaluacin FCT: Very Good) donde investiga temas conectados con nuevas tecnologas y periodismo.

    ABSTRACT (n.b.: En el idioma original de la Comunicacin, Espaol, Ingls, Portugus o Francs, 250 palabras mximo)

    A massificao da Internet est a redefinir as relaes entre o jornalismo e os leitores. O modelo de difuso caracterstico da primeira poca dos media (um para muito) deu lugar aos modelos descentralizados e bidireccionais da segunda era dos media (Poster, 2000) em que a informao circula de muitos para muitos, de muitos para um e de um para um. A mudana no ecossistema meditico foi acelerada pelo aparecimento dos media sociais (blogues, microblogues e redes sociais) com o aumento do nmero de fontes e, consequentemente, da quantidade de informao em circulao. As consequncias desta oferta excessiva sentem-se na actividade jornalstica, mas tambm na forma como os leitores se relacionam as notcias: enquanto os media aperfeioam formas de distribuio que os diferencie da concorrncia e os aproxime da audincia, os leitores procuram processos que lhes permitam triar a avalanche de informao recebida diariamente pela Web. Se a blogosfera contribui sobretudo para aumentar a oferta informativa, influenciando fundamentalmente o lado da emisso, as redes sociais tm mais preponderncia ao nvel da recepo, estando a funcionar como um segundo nvel de seriao de notcias. Trata-se de um novo tipo de gatekeeping desenvolvido pelos media nos seus canais sociais, mas tambm por cidados com prestgio (gatewatchers) em torno dos quais se constroem comunidades virtuais. Neste trabalho analisa-se o potencial das redes sociais na redistribuio de notcias, nomeadamente no que concerne ao aumento do nmero de leitores e transformao das audincias em comunidades com maior interveno no ecossistema meditico.

    ABSTRACT (Ingls, siempre debe existir un abstract en ingls, 250 words mx)

    Internet massification is redefining the connections between journalism and its readers. The diffusion model, characteristic of the first media era (from one to many) gave place to decentralised and bidirectional models, in the second media era (Poster, 2000), where the information runs from many to many, from many to one and from one to one. The changes in the media ecosystem were accelerated by the social media (blogs, microblogs and social networks) multiplying the number of sources, thus the quantity of information. The consequences of this excessive offer of information can be felt in the way readers relate themselves with the news: as the media perfect forms of distribution that distinguish them from

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    2

    their competitors and bring them close to their audience, readers look for processes that allow them select the information storm received daily over the web. If the blogosphere contributes essentially to increase the offer of information, with particular influence upon the emitting side, social networks have higher weight on the reception level, as a news selector of a second degree. It is a new kind of gatekeeping, developed by the media themselves in their social channels or by prestigious citizens (gatewatchers) within the networks around which virtual communities are created. In this paper it is analysed the potential of the social networks in the redistributing of the news, especially concerning the increasing number of readers and the transformation of audiences in communities who can participate more in the media ecosystem.

    PALABRAS CLAVE Redes Sociais, jornalismo, gatekeeping,

    KEY WORDS Social Networks, journalism, gatekeeping

    Grupo temtico 4: Comunicacin y Periodismo: blogs, wikis, redes sociales, Web 3.0 y telefona en Internet.

    Introduo

    A evoluo do jornalismo est umbilicalmente ligada ao aparecimento de novas tecnologias. A

    imprensa de caracteres mveis, o telefone ou os computadores so apenas trs exemplos de

    tecnologias que alteraram as rotinas de produo noticiosa em diferentes momentos da histria

    do jornalismo.

    Na ltima dcada, as grandes mudanas no campo do jornalismo esto relacionadas com uma

    tecnologia que se transformou num novo meio, a Internet, com particular destaque para um dos

    seus servios: a World Wide Web.

    Criada no incio da dcada de 90, no CERN, a Web parecia ser apenas mais um servio da

    Internet, como o correio electrnico e o FTP, mas a realidade mostrou algo diferente: apenas

    cinco anos aps o seu aparecimento, o nmero de utilizadores da Web crescia a um ritmo

    superior a 100%. O aumento exponencial de contedos disponveis, o desenvolvimento de

    browsers mais intuitivos e o aparecimento do Blogger (1999), do Facebook (2004), do Youtube

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    3

    (2005) e do Twitter (2006) transformaram a Web no grande motor da Internet que passou de16

    milhes de utilizadores, em Dezembro de 1995, para cerca de 1,8 mil milhes, em Dezembro de

    2009 (Internet World Stats).

    As aplicaes que alavancaram a sucesso da Web so tambm as mais utilizadas pelos

    jornalistas no seu dia a dia. Algumas delas, como as redes sociais e os blogues, alteraram

    profundamente as rotinas de produo noticiosa, estando hoje perfeitamente integradas na

    actividade profissional jornalstica, sobretudo em duas fases cruciais do processo de produo

    jornalstico: a recolha de informao e a distribuio de notcias.

    Enquanto fontes, os blogues e as redes sociais suscitam cada vez mais ateno dos jornalistas

    nas suas rotinas dirias de pesquisa. O caso da licenciatura do primeiro-ministro portugus Jos

    Scrates um bom exemplo do potencial destas aplicaes, com o blogue Portugal Profundo a

    estar na origem de uma polmica que dominou as primeiras pginas dos jornais durante

    semanas. Mais recentemente, o anncio de que Cristiano Ronaldo tinha sido pai, efectuada pelo

    prprio no Twitter e Facebook, deu origem a milhares de notcias em todo o mundo. Estes so

    apenas dois exemplos portugueses da forma como estas aplicaes se transformaram numa

    importante fonte de informaes, aumentando o leque de opes dos jornalistas.

    Tambm no campo da distribuio de notcias se registam alteraes, com blogues e redes

    sociais transformados em verdadeiros canais de distribuio instantnea. Para alm dos prprios

    media utilizarem estes canais, os leitores chamaram a si esta actividade, funcionando como uma

    espcie de novos gatekeepers que comentam e seleccionam as notcias mais interessantes para

    os seus amigos (Facebook) ou seguidores (Twitter). Desta forma, the people formerly known as

    the audience, na feliz expresso de Jay Rosen (2006), coloca-se no centro de um novo

    ecossistema meditico, aproximando os dois extremos do processo de produo de notcias: a

    recolha de informao e a distribuio dos contedos. Como refere Rosental Alves, pasamos

    del sistema media-cntrico al yo-cntrico, donde el individuo se transforma en un

    microorganismo al tener el poder de comunicarse, de intercambiar informacin, de

    redistribuir (1). Esta mudana est a provocar rupturas num ecossistema que ainda procura

    agora novos equilbrios.

    1. Do gatekeeping ao gatewatching

    O relatrio Understanding the Participatory News Consumer (The Pew Internet & American

    Life Project, 2010) confirmou uma tendncia: os americanos esto a usar cada vez mais as redes

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    4

    sociais para filtrar a informao que lhes interessa. A confirmar-se este comportamento, o

    percurso da informao passa a ter dois nveis de gatekeeping. No primeiro nvel, os jornalistas

    seleccionam os acontecimentos que renem condies para se transformarem em notcia, um

    processo motivado pela escassez de espao nas pginas dos jornais e nos servios informativos

    radiofnicos e televisivos (Bruns, 2003). No decorrer deste processo, subordinado aplicao

    de critrios profissionais e organizativos, so combinados os diferentes valores-notcia

    relacionados com as caractersticas do prprio acontecimento, com o processo produtivo de

    cada meio de comunicao, com as caractersticas do pblico ao qual se destina a informao e

    com a concorrncia do meio em questo (Wolf, 1987). Para alm desta seriao dos

    acontecimentos a tratar, o jornalista recorre ainda a diversas tcnicas para reduzir a sua

    informao ao espao que o editor lhe atribuiu.

    No caso das publicaes na Web esta situao altera-se. Sem limitaes espaciais, o jornalista

    pode publicar uma maior quantidade de notcias nos mais variados formatos e com possibilidade

    de ligao a outras fontes e documentos atravs de links. Esta disponibilidade espacial

    tendencialmente infinita acaba por se transformar num potencial obstculo para os leitores, pois

    a cada segundo que passa so disponibilizadas milhares de notcias na Web. Aos meios de

    comunicao juntam-se ainda os contedos produzidos por empresas, instituies e utilizadores

    que alimentam sites, blogues e redes sociais, gerando-se um caudal informativo que os

    utilizadores no conseguem acompanhar. Esta realidade criou a necessidade de mecanismos de

    triagem, tendo surgido os leitores de feeders, as tags, etc. Ainda assim, a quantidade de

    informao na Web tal que os consumidores continuam procura de novos mecanismos de

    seleco.

    David Sasaki (2), vencedor do Knight News Challenge Winner em 2007 e Director da Rising

    Voices, diz que uma das queixas mais ouvidas nas conferncias est relacionada com a baixa

    qualidade dos filtros. Sasaki considera que a soluo pode passar por aplicaes como o

    StumbleUpon, Digg, Google Reader, NewsTrust, baseadas em algoritmos, ou outras mediadas

    por voluntrios, como o True/Slant, The Daily Beast ou Global Voices. No seu dia-a-dia, Sasaki

    confirma a tendncia evidenciada no estudo da PEW (2010): For many of us, Twitter is

    becoming the front page of our morning newspaper., conclui Sasaki.

    Um estudo da Retrevo (2010) confirma que 42% dos americanos comeam o dia a consultar as

    redes sociais (Facebook e Twitter), e 16% dizem ser nestas aplicaes que procuram as notcias

    da manh. O j referido relatrio do PEW (2010) aponta no mesmo sentido: cerca de metade

    dos americanos optam pela leitura das notcias nas redes sociais porque confiam na seleco

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    5

    noticiosa que os seus amigos fazem. O estudo revela ainda que 75% dos consumidores de

    notcias online recebem links para essas notcias via e-mail ou redes sociais, e 52% partilha

    igualmente notcias por esta via. Por fim, o estudo refere que 51% dos utilizadores de redes

    sociais, como o Facebook, dizem que todos os dias lem notcias disponibilizadas por algum

    dos seus amigos, e 23% seguem notcias disponibilizadas nestas redes por media tradicionais ou

    jornalistas.

    Esta realidade permite verificar que primeira aco de gatekeeping dos jornalistas, segue-se

    uma segunda protagonizada por utilizadores de referncia, porm esta segunda aco de

    seleco apresenta caractersticas diferentes da anterior: j no se trata de seleccionar/resumir

    informao, mas sim de indicar pistas de leitura. Bruns (2003) chamou a esta actividade

    Gatewatching referindo que ela completes the shift from a focus on summarising the

    information contributed to a news story by a variety of news sources () In other words,

    gatewatchers fundamentally publicise news (by pointing to sources) rather than publish it (by

    compiling an apparently complete report from the available sources) (Bruns, 2003, s/n).

    O gatewacher emerge assim como um elemento central num ecossistema meditico onde a

    fragmentao motivada pela multiplicao de fontes e o excesso de informao obrigam os

    media a disputarem a ateno dos leitores. If scarcity is a main motivator of the type of

    organized activity that could possibly be labeled an economy, then the scarcity of attention is an

    especially good one (Goldhaber, 1997, s/n). Nesta economia da ateno, o gatewatcher

    funciona com um analista de mercados financeiros que aconselha os seus seguidores/amigos a

    investirem a sua ateno neste ou naquele tema, publicando os links para as notcias : The

    World Wide Web's key feature, the hyperlink, more or less automates this redirection of the

    flow of attention making it easy to pass attention further up the chain, helping to unify the world

    wide flow of attention into one complex free-standing system (Goldhaber, 1997, s/n). Este

    fluxo de ateno cresce medida que a notcia partilhada e comentada pelos leitores, gerando-

    se novas ligaes entre leitores. A estabilizao destas ligaes tende a transformar um grupo de

    leitores numa comunidade, algo que, curiosamente, coincidente com uma misso do

    jornalismo: ajudar as comunidades a definirem-se, encontrando uma cultura comum enraizada

    na realidade (Kovach & Rosenstiel, 2001).

    2. Comunidades online e audincias

    O nmero de utilizadores de redes sociais no pra de crescer. O Facebook, com cerca de 500

    milhes de utilizadores, a maior rede social, mas juntamente com Myspace, QQ, Orkut,

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    6

    Ozone, Vkontakte e CyWorld, ultrapassam os mil milhes de utilizadores. A blogosfera, que em

    2006 crescia razo de um blogue por cada meio segundo, j passou a sua fase urea, no

    entanto h milhes de blogues que continuam a ser actualizados. Quanto ao Twitter, uma

    plataforma de microblogues, os nmeros apontam para cerca de 190 milhes de utilizadores.

    Com os media sociais em acelerado crescimento, os meios de comunicao procuram adaptar-se

    a este ecossistema meditico em rpida mutao, optimizando os sites para a partilha das

    notcias (SMO - Social Media Optimization) e oferecendo espaos para comentrios. O

    objectivo envolver mais os leitores, criando comunidades virtuais, agregados sociais surgidos

    na Rede, quando os intervenientes de um debate o levam por diante em nmero e sentimento

    suficientes para formarem teias de relaes pessoais no ciberespao. (Rheigold, 1993,18). O

    sucesso do SMO e a emergncia dos gatewatchers levou ao nascimento de comunidades virtuais

    que permitem aos media cumprir uma das suas misses: a criao de espaos de debate.

    Journalism must provide a forum for public criticism and comment (Kovach & Rosenstiel

    2001, 134). O estudo do PEW (2010) confirma que 72% dos americanos consomem notcias nas

    redes sociais porque gostam de falar com outros consumidores acerca do contedo das notcias,

    um comportamento que justifica a necessidade de integrar as redes no ecossistema como forma

    de envolver mais os leitores. News consumption is a socially-engaging and socially-driven

    activity, especially online. The public is clearly part of the news process now. Participation

    comes more through sharing than through contributing news themselves. (PEW, 2010, 10).

    Cientes desta nova realidade, os media criaram contas nas redes sociais, efectuando um segundo

    nvel de gatekeeping e funcionado eles prprios como dinamizadores do grupo. Esta aposta em

    contas prprias nas redes sociais e o SMO tm o mesmo objectivo aumentar o nmero de

    leitores - mas os resultados podem ser distintos. Enquanto no primeiro caso a aco dirigida

    directamente aos leitores, no segundo caso o contacto indirecto, pois so os gatewatcher que

    redistribuem a informao para a sua comunidade. Estamos assim perante dois conceitos

    distintos: comunidade e audincia

    Uma audincia caracteriza-se por uma relao unidireccional entre emissor e receptor (de um

    para muitos) e pela inexistncia de relaes entre os receptores. Este tipo de relacionamento o

    modelo caracterstico nos media tradicionais. No caso das comunidades regista-se uma

    comunicao bidireccional (muitos para muitos), existindo algum tipo de relao de

    proximidade entre os seus membros (Shirky, 2002a). Neste caso estamos perante um modelo

    caracterstico dos novos meios interactivos.

    Com o desenvolvimento das telecomunicaes e a emergncia da Internet, os media tradicionais

    procuraram juntar comunicao massiva e interactividade (Palcios, 1996), explorando melhor

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    7

    as novas possibilidades dos receptores interagirem com os media. Porm, o processo de

    transformao de audincias em comunidades no depende apenas da abertura de canais de

    retorno do receptor para o emissor. Para alm das questes tcnicas, a existncia de uma

    comunidade implica a existncia de algum tipo de relao horizontal entre receptores que

    reforce os laos que os unem: a comunidade virtual parece enfatizar uma comunidade de

    interesses relacionada com o assunto em discusso que pode conduzir ao fortalecimento do

    esprito comunitrio (Correia, 2002, 4). No se trata apenas da passagem do sistema de um

    para muitos para outro de muitos para um: preciso que exista tambm a alternativa de

    muitos para muitos.

    Para alm disso, o conceito de comunidade est relacionado com a tenso entre dois elementos:

    dimenso e especializao. Como refere Shirky (2002b), possvel ter uma grande comunidade

    no muito focalizada, ter uma comunidade focalizada mas no muito grande, ou um grande

    nmero de pessoas focalizadas nalgum tema, mas jamais ser uma comunidade. Os mainstream

    media enquadram-se nesta ltima opo, mas regista-se um movimento no sentido de evolurem

    para um modelo comunitrio em que as relaes so mais fortes e duradouras. A utilizao de

    ferramentas prprias, como o Eskup (3) do jornal El Pais, e a contratao de gestores de novos

    media, so exemplos da aposta que os media esto a fazer nesta transformao das audincias

    em comunidades virtuais.

    3. Metodologia e problema de investigao

    O aumento da informao na Web est a obrigar o ecossistema meditico a passar de um

    ambiente pull, em que os receptores procuram as notcias, para um ambiente push, em que as

    notcias vo ter com os receptores. Neste novo ambiente, as redes sociais so um canal de

    seleco onde os gatewatchers emergem como elementos dinamizadores de comunidades

    virtuais, pelo que a sua aco dever ter efeitos no consumo de notcias.

    Ao seleccionar uma notcia colocando um link na sua pgina, o gatewatcher est a dar uma

    indicao de leitura, pelo que dever ocorrer um aumento no nmero de leitores dessa mesma

    notcia. Na primeira parte do trabalho emprico procuramos verificar se existe uma relao entre

    a publicao do link para uma notcia e o aumento do nmero de leitores.

    Nos captulos anteriores estabeleceu-se a diferena entre audincias e comunidades,

    distinguindo-as pela dimenso/especializao, mas tambm pelo facto das segundas

    privilegiarem a bidireccionalidade e horizontalidade no processo de comunicao. Na segunda

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    8

    parte do trabalho procuramos avaliar a dinmica comunicacional gerada em torno dos

    gatewatchers, observando as alteraes verificadas no nmero de comentrios notcia e

    comparando a actividade dos utilizadores no site do jornal e nas redes sociais.

    3.1 Participantes

    Participaram como gatewatchers os jornalistas Antnio Granado1 (725 amigos no Facebook e

    4104 seguidores no Twitter), Jos Manuel Fernandes2 (5185 no Facebook e 7204 no Twitter) e

    Paulo Querido3 (4937 no Facebook e 26685 no Twitter)4.

    3.2 Desenho e procedimento

    Entre os dias 27 de Agosto e 14 de Setembro foram seleccionadas 12 notcias Web dos jornais

    Dirio de Notcias, Jornal de Notcias, Ionline e Pblico. Apenas em 4 casos foi escolhida uma

    notcia pertencente edio do dia, mas nestes casos o gatewatcher s publicou o link no final

    da tarde. O objectivo era anular o efeito de outras referncias sem ligao ao nosso trabalho.

    Embora na maior parte dos casos exista um registo de trfego directo, isto , do nmero de

    leitores que chegou notcia a partir do link publicado pelo gatewatcher, optmos por contar

    todas as leituras efectuadas aps a referncia, medindo tambm as leituras resultantes dos

    chamados retuites motivados pela referncia inicial. Devido a erros relacionados com os

    tempos de publicao foram anuladas duas notcias.

    Para responder primeira pergunta de investigao foi registado o nmero de visitas antes e

    depois das referncias efectuadas pelos gatewatchers nas duas redes sociais testadas (Twitter e

    Facebook).

    Para responder segunda foram registados os comentrios notcia antes e depois das

    referncias. Contaram-se ainda os comentrios e os gostos no Facebook para avaliar este nvel

    de interactividade.

    4. Resultados

    4.1 Os primeiros nmeros esto relacionados com o nmero de visitas motivado pela indicao

    da notcia na rede social do gatewatcher. Optou-se pela apresentao dos resultados em

    percentagem porque existe uma grande variao no nmero de visitas, o que poderia induzir em

    erro.

    1 Ex-coordenador do Pblico Online, professor na Univ. Nova de Lisboa e dinamizador do blogue Ponto Media 2 Ex-director do Jornal Pblico e professor na Univ. Catlica 3 Consultor de New Media e dinamizador de vrios projectos online, entre os quais o Certamente que Sim 4 Dados recolhidos no dia 28 de Agosto de 2010

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    9

    Gatewatcher Jornal Aplicao % Antnio Granado

    Pblico Facebook 23% JN Twitter 24% JN Facebook 16% JN Facebook 14%

    Paulo Querido

    Ionline Twitter 12%

    Pblico Facebook 21% DN Facebook + T 35%

    Jos Manuel Fernandes

    DN Facebook 58%

    Pblico Facebook 22% DN Facebook 32%

    Os resultados permitem concluir que, em mdia, a aco dos gatewatchers representa 26% das

    leituras registadas numa notcia referenciada. Os outliers (12 e 58%) resultam de duas situaes

    especiais: no primeiro caso foram consideradas apenas as leituras directas (o jornal em causa

    no disponibiliza estatsticas na sua pgina) e no segundo trata-se de uma notcia que registava

    um baixo nmero de visitas pelo que a referncia teve um peso acima do habitual.

    Dado que visitas foram registadas em quatro perodos (1, 3, 6 e 24 horas depois da referncia)

    foi possvel verificar que no existe um aumento brusco do nmero de visitas, mas uma

    progresso linear. Esta constatao permite dizer que as leituras no resultam de visitas de

    impulso resultantes do surgimento da referncia no mural, mas de uma pesquisa dos

    amigos/seguidores no perfil do gatewatcher.

    Refira-se ainda que no se verificou a existncia de uma proporcionalidade directa entre o

    nmero de amigos/seguidores do gatewatcher e o nmero de leituras induzidas pela sua aco.

    4.2 A redistribuio de notcias usando as redes sociais tem igualmente efeitos ao nvel da

    interaco. Das dez notcias observadas, 3 aumentaram o nmero de comentrios aps a

    referncia. Verifica-se ainda que a interaco no Facebook superior que ocorre no espao de

    comentrios da notcia. No total, as notcias registaram 32 comentrios enquanto no Facebook

    foram recebidos 83 comentrios. Este dado particularmente interessante porque confirma as

    redes sociais como um ambiente mais favorvel interactividade.

    Os dados apurados permitem ainda concluir que as referncias suscitam mais comentrios

    quando o gatewatcher assume alguma posio em relao ao teor da notcia.

    Concluses

    Embora se trate de um estudo preliminar que deve ser aprofundado e replicado com amostras

    maiores, podemos dizer que a utilizao das redes sociais na distribuio de notcias aumenta o

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    10

    nmero de leitores. Com a oferta meditica em contnuo crescimento, os media so obrigados a

    disputar a ateno dos consumidores, procurando gerar trfego nos seus sites e, desta forma,

    aumentar as receitas publicitrias.

    Para alm deste efeito catalisador, as redes sociais facilitam uma transmutao na forma como

    os leitores se relacionam com os media, gerando um maior envolvimento e fortalecendo os laos

    entre media e leitores. Esta aproximao potencia a transformao das audincias em

    comunidades, uma situao que tende a gerar a fidelizao dos consumidores por estes

    reconhecerem que a pertena comunidade uma mais-valia. A intensificao do

    relacionamento, por via da interaco com o gatewatcher e com os restantes leitores, aumenta o

    valor da participao, reforando a fidelidade dos leitores. Neste nvel de relacionamento, os

    media esto melhor posicionados para cobrar o acesso aos contedos uma vez que o leitor

    reconhece valor informao que lhe fornecida por via da participao na comunidade.

    Bibliografia

    Bolter, J. D. y Grusin, R. (1999). Remediation. Understanding New Media. Cambridge: The

    MIT Press.

    Bruns, A. (2003). Gatewatching, not gatekeeping: Collaborative online news. Media

    International Australia Incorporating Culture and Policy: Quarterly Journal of Media

    Research and Resources, 107, pp. 31-44.

    Correia, J. (2002). Novo jornalismo, CMC e esfera pblica. Disponvel em

    http://www.bocc.ubi.pt/pag/correia-joao-jornalismo-cmc-esfera-publica.pdf, acedido a 9 de

    Agosto de 2010

    Goldhaber, M. H. (1997). The Attention Economy and the Net. Disponvel em

    http://www.well.com/user/mgoldh/AtEcandNet.html, acedido a 21 de Agosto de 2010

    Jones, S. G. (1998). Cybersociety 2.0: Revisiting Computer-Mediated Communication and

    Community. Sage: London

    Kovach, B & Rosenstiel, T. (2001). The Elements of Journalism: What Newspeople Should

    Know and the Public Should Expect. New York: Three Rivers Express

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    11

    Palcios, M. (1996). Cotidiano e Sociabilidade no Ciberespao: Apontamentos para Discusso.

    Em Antnio Fausto Neto e Jos Milton Pinto (Orgs), O Indivduo e as Mdias, Rio de

    Janeiro: Diadorim

    Pavlik, J. V. (2001). Journalism and New Media. New York: Columbia University Press:

    Poster, M. (2000). A Segunda Era dos Mdia. Oeiras: Celta Editora

    Reichheld, F. (1996). The Loyalty Effect. Boston. Harvard Business School Press Rheingold, H. (1993). A Comunidade Virtual. Lisboa: Gradiva.

    Retrevo (2010). Is Social Media a New Addiction?Disponvel em

    http://www.retrevo.com/content/blog/2010/03/social-media-new-addiction%3F, acedido a 18 de

    Agosto

    Rosen, J. (2006). The people formerly known as the audience. Disponvel em

    http://journalism.nyu.edu/pubzone/weblogs/pressthink/2006/06/27/ppl_frmr.html, acedido a 17

    de Agosto de 2010.

    Shirky, C. (2002a). Communities, Audiences, and Scale. Disponvel em

    http://shirky.com/writings/community_scale.html, acedido a 12 de Agosto de 2010.

    Shirky, C. (2002b). Broadcast Institutions, Community Values. Disponvel em

    http://www.shirky.com/writings/broadcast_and_community.html, acedido a 12 de Agosto de

    2010.

    The Pew Internet & American Life Project. (2010). Understanding the Participatory News

    Consumer. Disponvel em http://www.pewinternet.org/Reports/2010/Online-News.aspx,

    acedido a 23 de Julho de 2010.

    Notas:

    1. Entrevista ao Jornal El Pas de 5 de Setembro de 2010

    (http://www.elpais.com/articulo/reportajes/medios/deben/aparcar/arrogancia/elpepusocdmg/201

    00905elpdmgrep_5/Tes)

  • Libro Nuevos Medios, Nueva Comunicacin

    ______________________________________________________________________________

    www.comunicacion3punto0.com |[email protected]

    12

    2. http://www.pbs.org/idealab/2010/04/our-friends-become-curators-of-twitter-based-news092.html 3. http://eskup.elpais.com/index.html