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R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 23, n. 2, p. 247-267, jul./dez. 2006 Mudanças recentes no perfil da distribuição ocupacional da população brasileira Anita Kon * Este estudo visou contribuir com subsídios para a análise das transformações recentes no perfil da estruturação do trabalhador brasileiro, segundo a segmentação setorial e em grupos específicos de ocupações, particularmente na década de 90. Foram examinadas inicialmente questões teóricas sobre as causas da segmentação do mercado de trabalho na atualidade. Em seqüência, analisaram-se aspectos empíricos relacionados às mudanças estruturais da distribuição no mercado de trabalho em economias mundiais, procurando situar o Brasil neste contexto internacional. Para o Brasil, foram elaborados Índices de Estruturação Ocupacional e de Quocientes de Diferenciação Regional. Os resultados da análise mostram que, apesar de transformações ocupacionais significativas constatadas, as mudanças estruturais foram intra e não inter- regionais. Palavras-chave: Trabalho. Ocupações. Setores. Regiões. * Economista, professora titular da PUC/SP, Doutora em Economia pela FEA/USP. Coordenadora do Grupo de Pesquisas em Economia Industrial, Trabalho e Tecnologia – EITT da PUC/SP. Introdução A distribuição ocupacional brasileira sofreu, nos últimos anos, os reflexos dos problemas macro e microeconômicos estru- turais e conjunturais, pelos quais vem passando o país, que exigiram políticas públicas restritivas voltadas para a esta- bilização. A estas questões se associaram os novos requisitos exigidos para a contratação da mão-de-obra, tendo em vista os renovados processos produtivos e organizacionais, bem como os impactos da situação de aumento da competitividade e mundialização das economias. A esse respeito, verifica-se que as tecnologias da informação e das comuni- cações têm conduzido à industrialização dos serviços, à inovação organizacional e a novas formas de comercialização de bens e serviços, no que se refere aos relaciona- mentos entre produtor e consumidor, acarretando novas modalidades ou formas modificadas de serviços. Na economia fordista, o modo de produção prevalecente se caracterizava pela produção em massa de uma longa série de bens manufaturados. Os mercados eram homogêneos, mais intensamente dentro de fronteiras nacionais e as regulações keynesianas e os sistemas

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R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 23, n. 2, p. 247-267, jul./dez. 2006

Mudanças recentes no perfil da distribuiçãoocupacional da população brasileira

Anita Kon*

Este estudo visou contribuir com subsídios para a análise das transformaçõesrecentes no perfil da estruturação do trabalhador brasileiro, segundo asegmentação setorial e em grupos específicos de ocupações, particularmentena década de 90. Foram examinadas inicialmente questões teóricas sobre ascausas da segmentação do mercado de trabalho na atualidade. Em seqüência,analisaram-se aspectos empíricos relacionados às mudanças estruturais dadistribuição no mercado de trabalho em economias mundiais, procurando situaro Brasil neste contexto internacional. Para o Brasil, foram elaborados Índices deEstruturação Ocupacional e de Quocientes de Diferenciação Regional. Osresultados da análise mostram que, apesar de transformações ocupacionaissignificativas constatadas, as mudanças estruturais foram intra e não inter-regionais.

Palavras-chave: Trabalho. Ocupações. Setores. Regiões.

* Economista, professora titular da PUC/SP, Doutora em Economia pela FEA/USP. Coordenadora do Grupo de Pesquisas emEconomia Industrial, Trabalho e Tecnologia – EITT da PUC/SP.

Introdução

A distribuição ocupacional brasileirasofreu, nos últimos anos, os reflexos dosproblemas macro e microeconômicos estru-turais e conjunturais, pelos quais vempassando o país, que exigiram políticaspúblicas restritivas voltadas para a esta-bilização. A estas questões se associaramos novos requisitos exigidos para acontratação da mão-de-obra, tendo em vistaos renovados processos produtivos eorganizacionais, bem como os impactos dasituação de aumento da competitividade emundialização das economias.

A esse respeito, verifica-se que astecnologias da informação e das comuni-cações têm conduzido à industrializaçãodos serviços, à inovação organizacional ea novas formas de comercialização de bense serviços, no que se refere aos relaciona-mentos entre produtor e consumidor,acarretando novas modalidades ou formasmodificadas de serviços. Na economiafordista, o modo de produção prevalecentese caracterizava pela produção em massade uma longa série de bens manufaturados.Os mercados eram homogêneos, maisintensamente dentro de fronteiras nacionaise as regulações keynesianas e os sistemas

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de barganha coletiva de saláriosasseguravam estabilidade e previsibilidade.As empresas se desenvolviam para gran-descorporações através de integração verticalde produção.

Na atualidade, após a mudança doparadigma fordista para o toyotismo, osmodos de produção se transformaram con-sideravelmente. Embora ainda permane-çam economias de escala em algumasproduções, a produção em série tende adiminuir. Já as economias de escopo torna-ram-se mais relevantes e os parâmetros decompetição passaram a ser a qualidade ea adaptação à demanda a partir de altasegmentação de mercado, ou seja, ofornecimento de serviços através dadiferenciação do produto adquire muitasvezes maior peso do que os preços, noatendimento do mercado. A interação entreserviços e produção manufatureira tornou-se a força impulsionadora da criação deriqueza (ILLERIS, 1996).

Neste contexto, a inovação e a tecno-logia ganham relevância na busca damelhoria da produtividade e das vantagenscompetitivas nos serviços, assim como já im-pactavam as atividades manufatureiras. Apadronização, os ganhos de produtividadee a automação fazem parte destastransformações industriais, bem como osimpactos resultantes da flexibilidade dasinstalações e do trabalho, que permitam aadaptação à crescente personalização daoferta. A mesma utilização da automação,robótica ou informática feita pelas ativi-dades de transformação industrial pode serrealizada no setor de serviços. Neste caso,a informática desempenha um papel-centralcomo matéria-prima dos serviços, cada vezmais baseados no conhecimento e indivi-dualização (TÉBOUL, 2002).

Desde os anos 80 e mais intensamentena década de 90, o processo de aceleraçãodas mudanças tecnológicas que permitiu adifusão da globalização mundial tornounecessário que os países se preparassempara o dinamismo das trocas internacionaisque começava a se instaurar. O processode reestruturação produtiva que se ampliouprimeiramente nos países desenvolvidos,difundindo-se não tão rapidamente para

aqueles em desenvolvimento, resultou e foiresultado destas transformações tecnoló-gicas, nas condições de mercado então vi-gentes, e das características das empresas,que tinham como objetivo restaurar a com-petitividade industrial. Uma das conseqüên-cias diretas foi a modernização de serviços,visando possibilitar aos produtores de todosos setores de atividades a implementaçãodas trocas internacionais de forma acele-rada. Este texto analisará os impactos doprogresso tecnológico e da conseqüentereestruturação produtiva do período, sobrea reformulação e intensificação das caracte-rísticas da produção de serviços.

Este estudo visou contribuir com subsí-dios para a análise das transformaçõesrecentes no perfil da estruturação do traba-lhador brasileiro, segundo a segmentaçãosetorial e em grupos específicos de ocupa-ções, em decorrência da situação estruturale conjuntural pela qual passou o país desdea década de 90. São examinadas, inicial-mente, questões teóricas sobre as causasda segmentação do mercado de trabalhona atualidade, tendo em vista a aceleraçãoda inovação tecnológica e a evolução dosserviços no mundo, que deram origem aocrescente processo de transformaçõesprodutivas das economias e como resultadoda intensificação da transnacionalizaçãodas atividades econômicas. Em seqüência,analisam-se aspectos empíricos relaciona-dos às mudanças estruturais da distribuiçãono mercado de trabalho em economiasmundiais, procurando situar o Brasil nestecontexto internacional.

Com relação à segmentação do merca-do de trabalho brasileiro, a avaliaçãoempírica prossegue examinando estastransformações do ponto de vista setorial ede grupos ocupacionais específicos. A partirdos dados da Pesquisa Nacional porAmostra de Domicílio – PNAD e de outrasinformações do IBGE, para o período de1990 a 2004, serão examinadas asmudanças nesta segmentação. A análiseempírica incluiu as diferenças regionais nacomposição e na evolução deste perfil dostrabalhadores, a partir da elaboração deÍndices de Estruturação Ocupacional e deQuocientes de Diferenciação Regional.

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Inovação tecnológica, evolução dosserviços e reestruturação produtiva

O crescimento do setor de serviços esuas implicações sobre a reestruturaçãodas economias apresentam diferentesimpactos sobre as estruturas produtivas, deacordo com o nível de desenvolvimento eco-nômico das economias, bem como reflexosna capacidade de aumentar os investimen-tos em modernização tecnológica e naqualificação da força de trabalho, a fim deenfrentar as necessidades de novas tarefastécnicas dos processos modernos de produ-ção e organizacionais. Como salientadoanteriormente, as estruturas produtivas têmse transformado rapidamente nos paísesdesenvolvidos, desde a crescente industria-lização a partir da década de 30, com ocrescimento do processo de urbanização ecom a intensificação da inovação tecno-lógica. Algumas economias menos desen-volvidas iniciaram as mesmas transforma-ções estruturais a partir dos anos 50 e outrasapenas recentemente começaram esteprocesso, como se verificou através dosdados empíricos.

Algumas pesquisas mostram a reestru-turação do setor de serviços como funda-mentada na divisão espacial de trabalho,que afeta o número e as características dosempregos encontrados em diferentes locais(MARSHALL e WOOD, 1995). Esta divisãode trabalho refere-se ao padrão de es-pecialização de trabalho na produção,desenvolvido ao longo do tempo para asse-gurar o uso eficiente do investimento emcapital. Distintos países e regiões de um paíssão especializados em produtos e setoresparticulares, que apóiam as formas locaisdominantes de relação capital/trabalho,qualificação da mão-de-obra e padrõessociais e comunitários (KON, 1995).

Durante as décadas de 50 e 60, a cres-cente dominância das grandes empresasmanufatureiras, nos países desenvolvidos,moldou os padrões da especializaçãoindustrial regional. Na busca de metas delucro, estas empresas distribuíram recursosem uma escala inter-regional ou interna-cional, procurando novas oportunidades deexplorar o trabalho em diferentes locais.

Puderam não apenas transferir a produçãopara localizações onde o trabalho era maisbarato, mas também tiveram a tendência aseparar vários tipos de trabalho adminis-trativo e burocrático (inclusive funções decontrole e pesquisa) dos trabalhos manuaisda produção. O pano de fundo desta ten-dência foi a possibilidade de especializaçãoflexível, que se desenvolveu para enfrentara persistente crise econômica que sucedeuo longo boom da economia mundial do perío-do posterior à Segunda Guerra Mundial.

Dessa forma, durante os anos 70 eparticularmente na década seguinte, umanova espécie de reestruturação e de divisãointernacional do trabalho se desenvolveu,devido às mudanças tecnológicas basea-das nas formas flexíveis de organização dotrabalho e dos processos produtivos, quenecessitavam de uma mão-de-obra maisqualificada, tendo em vista que o trabalhomais barato e menos qualificado não maismostrava vantagens comparativas. Nestesentido, o movimento de internacionaliza-ção do capital, no caminho de investimen-tos na produção, começou a procurareconomias que oferecessem serviçosespecializados mais sofisticados. Comoresultado, a maior parte dos países de-senvolvidos e em desenvolvimento estápassando por transformações considerá-veis na estrutura produtiva de suas eco-nomias, de acordo com a capacidade deoferecer a estes novos investimentos a infra-estrutura básica para o apoio destastransformações.

O emprego nas indústrias manufatu-reiras está declinando devido, principal-mente, a certas formas de reorganizaçãoda produção que afetam os níveis deemprego: a intensificação do trabalho; aracionalização da produção e do inves-timento; e a mudança técnica. A reestru-turação foi estendida também aos serviçosde consumo privado e ao setor de serviçospúblicos, adicionalmente aos serviçosvoltados ao produtor (MARSHALL e WOOD,1995; KON, 2004a). Quando são examina-das as diferenças na representatividade dascategorias ocupacionais entre os períodosdas décadas de 70 e 90, observam-se, paratodos os países de diferentes níveis de

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renda, um decréscimo nas ocupações daagricultura e rurais e um aumento nas outrascategorias. Além disso, o crescimento nasocupações de serviços é ainda superior aodas categorias de ocupações industriais ede transportes; em países de alta renda, arepresentatividades destas categorias temdiminuído, mostrando os resultados da rees-truturação industrial e da terceirização deserviços, bem como a mudança na classifi-cação de certos serviços, anteriormenteconsiderados ocupações manufatureiras,antes das mudanças tecnológicas eorganizacionais.

Em resumo, é possível apontar as mu-danças significativas pelas quais passaramas economias avançadas nos anos re-centes, incluindo, entre outros aspectos,particularmente: a internacionalização dasatividades econômicas; a reorganizaçãodas firmas dominantes; a integração daindústria manufatureira com a de serviços;o uso crescente da tecnologia microele-trônica; o aumento da demanda na indústriapor uma força de trabalho mais qualificada,porém com muitos trabalhos rotineiros sen-do eliminados pela mudança tecnológica;a maior complexidade e volatilidade doconsumo; e uma mudança no papel daintervenção governamental. Estas transfor-mações foram interpretadas como umamodificação da sociedade fordista baseadana produção e consumo de massa emgrande escala, apoiada pela demanda dosgastos governamentais para o gerencia-mento de suas funções e para a previdênciae saúde (principalmente nas nações maisavançadas em que prevalecia o WelfareState). Como visto, as formas pós-fordistasde produção emergiram desde os anos 70,quando a indústria passou a utilizar novatecnologia e uma força de trabalho maisflexível para responder com maior rapidezàs mudanças do mercado e à competiçãointernacional, encorajadas por novasformas de governo que se retirava defunções empresariais e restringia suasfunções produtivas (MARSHALL e WOOD,1995).

Marshall e Wood enfatizam que acrescente proeminência dos serviços e suascontribuições relevantes e multifacetadas

para a mudança estrutural têm comoorigem:

• a importância da crescente interde-pendência entre a produção de bense de serviços, como já visto, pelo fatode qualquer produto material ou deserviço ser criado por uma seqüên-cia complexa de trocas materiais e deserviços, que envolvem fornecedorese consumidores, incluindo subcon-tratados e consultores;

• o valor da especialização em serviçosno capitalismo dos finais do século 20,que contribui para a manipulação dematérias-primas, informação, capital etrabalho, em qualquer atividade deprodução ou consumo. Interpretar omundo tornou-se uma tarefa maiscomplexa, a produção de bens eserviços tornou-se mais capital-intensiva e o papel destes serviçosespecializados então se intensificou;

• a maneira pela qual as qualificaçõese especializações para atividades deserviços que estão presentes na forçade trabalho influenciam significa-tivamente os padrões locacionais. Acomplexidade e diversidade damoderna especialização em serviçosencorajam a aglomeração, ao menosdas funções de alto nível; as funçõesmais rotineiras podem ser maisdispersadas, embora controladas deforma centralizada. Estas tendênciastêm dominado a evolução das regiõesurbanas nos anos mais recentes,além de influenciarem os padrões dalocalização manufatureira, enquantoa especialização em serviços ofereceum conhecimento técnico e materialnão apenas para os processos pro-dutivos em constante transformação,mas também para qualificaçõesorganizacionais ou gerenciais (KON,1994);

• a forma pela qual as mudanças técni-cas criam novas oportunidades paraa exploração da especialização emserviços.

Como salientado por alguns autores(MILES, 1993; NORMANN, 1991; TÉBOUL,

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2002; KON, 2004a), as tecnologias da infor-mação e das comunicações têm conduzidoà industrialização dos serviços, à inovaçãoorganizacional e a novas formas de co-mercialização dos serviços, no que se refereaos relacionamentos entre produtor econsumidor, como, por exemplo, nas ativi-dades bancárias, de venda e turísticas, viatelefone. Resumindo as principais caracte-rísticas dos serviços e da inovação técnicacomo exemplos da dinâmica da reestru-turação dos serviços, é possível observaralguns aspectos relacionados às transfor-mações na produção dos serviços, noproduto, no consumo e nos mercados.

No entanto, estas características não seaplicam igualmente nos setores públicos eprivados de serviços, devido à naturezaespecífica dos serviços públicos, por umlado, e aos objetivos diversos de lucro oude função social, por outro.

Diferenças na distribuição da força detrabalho entre economias mundiais

Esta forma de reestruturação teve dife-rentes dinâmicas, nas diversas economias,dependendo do grau de modernizaçãotecnológica nos processos produtivos e docorrespondente nível de qualificação daforça de trabalho. Nos países menos adian-tados, o excedente de trabalho do setoragrícola, que emigrou para áreas urbanas,freqüentemente tinha baixa qualificaçãopara oferecer e, mesmo quando o setormoderno de atividades se expandia, astaxas de absorção do trabalho nestasatividades podiam ser modestas em relaçãoàs necessidades da oferta de trabalho(KON, 1995). Em uma economia urbana emexpansão, supõe-se que as atividades deserviços que estão correlacionadas aoaumento da renda também se ampliem.Como resultado, outras oportunidades deserviços voltados para o consumo diretotambém se expandem de acordo com osmultiplicadores de emprego urbano. Estaexpansão de oportunidades de empregoem serviços é considerada um efeito, maisdo que como uma causa, da expansãourbana, o que quer dizer que é mais sintomado que causa de desenvolvimento.

Nos mercados de trabalho urbanos dospaíses em desenvolvimento, a absorção demão-de-obra não tem sido capaz deacompanhar o fluxo contínuo de pessoasque aumenta a oferta de trabalhadores.Desde que os salários no setor moderno sãoinflexíveis para baixo, o fluxo de imigrantescontinua fundamentado em expectativasnão razoáveis de emprego e os novosentrantes ao mercado de trabalho urbano,na maior parte das vezes, não comportamas qualificações para o emprego nos setoresmais dinâmicos da economia, como já visto.Assim, à medida que o excedente de imi-grantes se dirige às atividades menosmodernas, os salários médios são depri-midos e estas economias enfrentam umproblema contínuo e crescente deexcedente de mão-de-obra e de baixaremuneração.

Como as oportunidades de empregono setor moderno são mais difíceis, muitosdos novos imigrantes devem trabalhar ematividades do setor denominado informal, emcondições de sobrevivência (CACCIAMALIe SILVA, 2003; KON, 2004b). Estes traba-lhadores são empregados em circuns-tâncias que negam as vantagens de umcontrato salarial formal. O fluxo contínuo denovos entrantes neste espaço informal –devido não apenas ao excedente de tra-balho no setor agrícola, mas recentementetambém ao excedente no setor manufa-tureiro – mantém os ganhos naquele setorpróximos à subsistência para a maior partedos trabalhadores. Todavia, com o cresci-mento da economia global, a reestruturaçãoprodutiva e a terceirização que vêm ocor-rendo nas grandes empresas oligopolistas,muitos trabalhadores que se ocupavam nasindústrias manufatureiras, dispensados deseus empregos nestas firmas, tentam traba-lhar por conta própria como autônomos;além disso, são encontrados tambémempresários no setor informal, alguns dosquais mostrando progresso econômico.

Mas as oportunidades, para estesempresários, de crescimento através decapitalização são limitadas devido àcrescente competição, bem como ànatureza de seus empreendimentos. Aindaque exista certo inter-relacionamento entre

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os mercados do setor informal e do setormoderno, e parte desta produção informalseja vendida para empresas formais, ocrescimento de muitas empresas informaisé restringido porque sua oferta não seriacomercializável além dos limites de certosdistritos menos privilegiados. Uma parteconsiderável destas atividades informais édirigida para os serviços e alguns membrosdesta força de trabalho desempenhamatividades “invisíveis” ou subterrâneas(underground). Assim, em países menosavançados, a capacidade de absorção dosetor informal de serviços é muito menosuma função da capitalização do setor do queda capacidade da área urbana de fornecersubsistência a trabalhadores de serviçosdomésticos.

Porém, após a intensificação da globa-lização das economias principalmentedesde os finais dos anos 80, estas indústriasapresentam maiores vantagens de realo-carem suas atividades em economiasmodernas, onde são encontrados força detrabalho mais qualificada e outros serviçoscomplementares sofisticados. Em muitoscasos, empresas de serviços tornam-semultinacionais e transnacionais, e os paíseshospedeiros menos desenvolvidos apre-sentam benefícios porque certos serviçosauxiliares às empresas fornecem elos quetornam possível a existência de muitasinstalações manufatureiras.

No âmbito doméstico das economias,as mudanças locacionais refletem ocrescente dualismo da força de trabalho,desde que os investimentos nas manufa-turas se moveram seja para áreas onde sãodisponíveis os escassos trabalhadores maisqualificados administrativos e burocratas(white-collar), seja para áreas de baixossalários e alto desemprego, onde pode serrecrutada uma força de trabalho semiqua-lificada, para desempenhar principalmenteatividades rotineiras da produção emplantas das filiais.

A Tabela 1 apresenta as mudanças nadistribuição setorial da força de trabalho depaíses de vários níveis de desenvolvimento,na década de 90, de acordo com a classi-ficação do Banco Mundial para a determi-nação dos níveis de desenvolvimento.Observa-se, para os países de Baixa Ren-da, que a concentração considerável detrabalhadores no setor Primário (Agrope-cuário e atividades afins), no início doperíodo, sofreu considerável transformaçãocom a emigração de mão-de-obra para ossetores do Terciário (Comércio e Serviços),durante a década, com a diminuição relativatambém do setor Secundário. O mesmomovimento verificou-se entre países deRenda Média Baixa, porém com maiorintensidade da emigração de trabalhadoresoriundos do setor industrial. O aumento dosetor Terciário nestes países se deu

TABELA 1Distribuição da força de trabalho mundial, por setor de atividade, segundo nível de renda dos países

1990-2001

Fonte: World Development Report, Banco Mundial, 1996 e 2004.Nota: Os grupos de renda são divididos pelo Banco Mundial com base na renda per capita como: Renda Baixa, US$ 875 ou menos;Renda Média Baixa, US$ 876 a US$ 3.465; Renda Média Alta, US$ 3,466 a US$ 10.725; e Renda Alta, US$ 10.726 ou mais.

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particularmente em atividades de baixarelação capital/trabalho voltadas paraconsumo pessoal dos indivíduos (KON,2006).

Estas mudanças estruturais resultaramda difusão do processo de mundializaçãoeconômica e da dispersão do processo deprodução em vários países, através datransnacionalização das indústrias eserviços.

Embora o mesmo direcionamento dasmudanças estruturais em direção ao au-mento do setor Terciário tenha se verificadotambém para os países de Renda MédiaAlta e Renda Alta, a qualidade dos serviçoscriados nestes dois últimos grupos é consi-deravelmente diferenciada dos anteriores.Isto se verifica porque englobam serviçosmodernos em que a relação capital/trabalhoé superior e que se destinam mais inten-samente ao consumo das empresas e àinfra-estrutura de Transportes e Teleco-municações, característicos de economiasde aglomeração (KON, 2006).

Observe-se que estes dados informama distribuição entre os setores de atividade,porém não revelam a segmentação ocupa-cional segundo grupos de ocupações queapresentam comportamento e caracterís-ticas diversas das setoriais, tendo em vistadiferentes formas de agregação dasvariáveis. Os grupos ocupacionais podemser encontrados em diferentes setores,como, por exemplo, as ocupações de pro-fissionais liberais e técnicas, as gerenciais,as administrativas e de serviços, e se distri-buem por todos os setores mencionadosna Tabela 1. Dessa forma, não existecomparabilidade entre as informações dadistribuição da força de trabalho segundosetores, com os resultados segundo gruposocupacionais, conforme apresentados naTabela 2, que analisa as transformações narepresentatividade de grupos ocupacionaisespecíficos no período de 1989 a 2001.

Como é possível inferir a partir daTabela 2, observa-se que, aos diversosníveis de desenvolvimento econômico daseconomias, são associadas condições es-pecíficas de composição da estruturaocupacional, o que é resultado das ca-racterísticas das respectivas estruturas

produtivas, sejam mais especializadas nosetor agrícola ou nos setores urbanos, etambém de acordo com diferentes graus deprogresso tecnológico nos processosprodutivos.

Observa-se que, à medida que aumentao nível relativo de renda per capita dospaíses, decresce a concentração de traba-lhadores nas ocupações rurais ou outras queexigem menor nível de qualificação e deprodutividade. Paralelamente, é crescentea participação de grupos ocupacionaisrepresentados pela mão-de-obra mais qua-lificada, como de profissionais liberais etécnicos e as administrativas, bem como nasocupações industriais e de transportes.

Por outro lado, observa-se que a repre-sentatividade das ocupações de serviçoscresce à medida que aumentam os proces-sos de modernização. Embora o percentualde trabalhadores em categorias ocupa-cionais mais qualificadas de funçõesprofissionais, técnicas e gerenciais sejatambém mais elevado nos países comrendas per capita superiores, verifica-se quenestes países as reformulações ou achamada “reengenharia” (downsizing) nasestruturas organizacionais na década de 90,com o intuito de enfrentar os custos cres-centes, resultou na diminuição da represen-tatividade de ocupações administrativas, damesma forma que o avanço tecnológicoresultou em maiores investimentos capital-intensivos, diminuindo postos de trabalhoe aumentando a relação capital/trabalho dasocupações industriais e de transportes.

Já outras informações sobre serviçosmostram a criação de funções ocupacionaisde serviços não existentes anteriormente,conforme cresce a modernização nos anos90, ou seja, em torno de 21% nos países deRenda Baixa, 25,5% nos de Renda MédiaBaixa, 37% nos de Renda Média Alta e 49%nos de Renda Alta (KON, 2004a).

Salienta-se que as repercussões doprocesso de modernização das economiastambém tiveram impactos nestes países demenor renda per capita, no período demodernização da década de 90, pois, comomostra a Tabela 2, em 2001, a represen-tatividade de trabalhadores nas ocupaçõesagrícolas apresentou queda, enquanto os

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grupos ocupacionais de maior escolaridadee qualificação mencionados anteriormenteregistraram participação consideravelmentemaior, acima de 10%.

Neste sentido, os países de Renda Baixasão grandemente concentradores detrabalhadores no setor primário, onde selocalizavam, em 1989, cerca de 57% da forçade trabalho. As ocupações que exigemmaior qualificação representadas porprofissionais liberais e técnicos, nesse ano,tinham participação pouco significativa (de3% a 4%), enquanto as industriais e detransportes e as de serviços, embora repre-sentadas respectivamente por mais de 17%e de 10% dos trabalhadores, eram caracte-rizadas por baixo nível de escolaridade e deprodutividade.

Os países de Renda Média Baixa apre-sentam distribuição ocupacional e modifi-cações estruturais, no período analisado,similares à dos de menor renda, porém aparticipação das ocupações que exigemmenor qualificação é relativamente menore, em contrapartida, as ocupações de maior

qualificação são relativamente maisrepresentativas.

Com relação à mencionada reestru-turação entre grupos ocupacionais, quandose observam as diferenças de represen-tatividade das categorias ocupacionaisentre os períodos, o decréscimo maisimportante e muito significativo é encontradonas ocupações de agricultura e rurais, paratodos os países de vários níveis dedesenvolvimento (devido à modernizaçãodos processos produtivos ou à capitali-zação como já observado). Isto é contra-balançado por aumentos inferiores nasdemais categorias. Além disso, o aumentonas ocupações de serviços é ainda maiordo que nas ocupações ditas industriais (dosetor secundário) e de transportes. Nospaíses de Renda Alta e de Renda MédiaAlta, a representatividade deste grupoocupacional também decresceu, revelandoos impactos ocorridos sobre a estruturaocupacional como resultado da reestrutu-ração industrial, terceirização de atividadesde serviços e mudança na classificação de

TABELA 2Estrutura ocupacional dos países, por nível de desenvolvimento (1), segundo categorias de ocupação

1989-2001

Fonte: Yearbook of Labour Statistic., ILO Geneve, 1989 e 2002. Elaboração da autora.(1) Composição média de países selecionados.(2) Incluem trabalhadores não classificáveis por ocupação.

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certos serviços (que eram anteriormenteconsiderados categorias de ocupaçõesindustriais antes que as mudanças tecnoló-gicas e organizacionais ocorressem).

Embora muitos países em desenvolvi-mento tenham mais de 50% de suapopulação economicamente ativa ematividades de serviços, o papel positivo dosserviços no processo de desenvolvimentoainda é discutido. Alguns pesquisadoresacreditam que apenas se forem abertasoportunidades de emprego nos setoresmodernos e os salários médios seelevarem, à medida que a renda cresce e omercado interno é encorajado, novossetores de atividades e novas ocupaçõesde serviços serão introduzidas interna-mente, o que dará início à criação das inter-relações usufruídas pelas economias dasnações desenvolvidas.

Por outro lado, como já visto, os papéisdos serviços e das atividades secundárias naeconomia estão se tornando crescente-mente interdependentes, o que quer dizerque o relacionamento tradicional entre asmanufaturas e os serviços, em que asprimeiras demandam insumos e os segun-dos os fornecem, não mais se mantém parauma parte importante dos dois setores. Emcertas indústrias manufatureiras, a divisãoentre a produção e os serviços é difícil deser estabelecida. Por exemplo, na manufa-tura que utiliza equipamentos de processa-mento de dados, os insumos de serviços(software) não só são necessários paratornar operacional o processo produtivo,como também têm uma grande influênciasobre o sucesso do produto no mercado.

Outro exemplo pode ser mencionadona produção de jornais, em que ocomponente de serviços de propagandatornou-se a maior fonte de renda e o produtotem que competir com outros meios dedivulgação (mídia), tais como televisão erádio. A competição surge entre asempresas de produção e de serviços, àmedida que a diversificação e o consumopermitem a penetração em mercadostradicionalmente pertencentes às demaisáreas. Além disso, algumas atividades maissofisticadas de serviços, tais comotransportes, serviços de distribuição de bens

e financeiros, estão se tornando crescente-mente capital-intensivas, como as indústriasprodutoras de bens.

Em suma, o crescimento do setor deserviços e suas implicações sobre areestruturação das economias apresentamdiferentes impactos sobre as estruturasprodutivas, de acordo com o nível dedesenvolvimento econômico das economiase a capacidade de aumentar os investimen-tos na modernização tecnológica e naqualificação da força de trabalho. Estascondições são prementes para que asempresas consigam enfrentar as necessi-dades de novas tarefas técnicas dosprocessos modernos de produção eorganizacionais.

As estruturas produtivas têm se transfor-mado rapidamente nos países desenvol-vidos, desde a crescente industrialização apartir da década de 30, com o crescimentodo processo de urbanização e a intensi-ficação da inovação tecnológica. Algumaseconomias menos desenvolvidas iniciaramas mesmas transformações estruturais apartir dos anos 50 e outras apenas recen-temente começaram este processo, comose verificou a partir dos dados empíricos.

Algumas pesquisas mostram areestruturação do setor de serviços comofundamentada na divisão espacial detrabalho que afeta o número e as caracte-rísticas dos empregos encontrados emdiferentes locais (MARSHALL e WOOD,1995; KON, 2004a). Esta divisão de trabalhorefere-se ao padrão de especialização detrabalho na produção, desenvolvido atravésdo tempo para assegurar o uso eficiente doinvestimento em capital. Distintos países eregiões de um país são especializados emprodutos e setores particulares, que apóiamas formas locais dominantes de relaçãocapital/trabalho, qualificação da mão-de-obra e padrões sociais e comunitários.

A reestruturação produtiva no Brasil:mudanças setoriais

A reestruturação da distribuição dotrabalho no Brasil retrata os aspectosconsiderados na seção anterior, para ospaíses de Renda Média Alta, nível em que se

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enquadra o país. Ao lado de um parqueindustrial diversificado, que na década de 90perdeu o dinamismo dos anos 70, a grandeconcentração de trabalhadores se agrupaem ocupações de serviços e o aumentorelativo de pessoal ocupado verificou-setanto em ocupações mais modernas(profissionais e técnicas, gerenciais eadministrativas), quanto naquelas menosavançadas em relação à exigência deconhecimentos tecnológicos e com menorrelação capital/trabalho.

Se no período de maior crescimentoindustrial do final da década de 70 até 1980as atividades manufatureiras e da construçãocivil absorviam de forma mais significativaa mão-de-obra liberada pelas atividadesrurais, em toda a década de 80 o aumento

de trabalhadores no setor de serviçosesteve consideravelmente acima doverificado no setor manufatureiro. Nos anos90, a produtividade teve um comportamentopositivo nos setores Agropecuário e Secun-dário, com maior intensidade no primeiro,embora a população ocupada neste últimomostrasse taxas anuais negativas, ou seja,diminuição de postos de trabalho dispo-níveis. No entanto, no setor Terciário daeconomia, a absorção de trabalhadores sedeu a taxas anuais superiores às observa-das nos demais setores, mas o produto portrabalhador apresentou decréscimo, o quesignifica que os postos de trabalho geradosse revestiram de baixa remuneração equalidade.

TABELA 3Distribuição da população ocupada, segundo setores de atividade

Brasil – 1990-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.

GRÁFICO 1Participação da população ocupada, segundo setores de atividade

Brasil – 1970-2005

Fonte: IBGE.

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O exame da Tabela 3 e dos Gráficos 1e 2 revela que a diminuição da populaçãoocupada no setor rural ocorreu a partir daabsorção mais intensa de trabalhadores nosetor de serviços que em 1990 já absorviamais da metade da mão-de-obra brasileira.Porém, regionalmente, verificam-se diferen-ças na direção do aumento do contingentede trabalhadores de serviços.

No entanto, no período mais recente,observa-se que o decréscimo de postos detrabalho na indústria teve repercussõesimportantes na composição do produto, umavez que, em 1999, a representatividade dostrabalhadores neste setor decresceu paramenos de 20%. Porém, em 2005, já severificou recuperação desta participação,em detrimento de trabalhadores na Agro-pecuária, cuja representatividade se moveuem sentido contrário, ou seja, mostrou ele-

vação e diminuição para quase 21% nesteúltimo ano pesquisado. Também o setor Ter-ciário absorveu parte do aumento da forçade trabalho não incorporada na indústria,chegando a uma participação de mais de5% do total de trabalhadores em 2004.

A análise das mudanças estruturais nadivisão do trabalho brasileira, nos anos maisrecentes, requer uma visualização da décadaeconômica anterior, para melhor avaliaçãoda intensidade da reestruturação. Emseqüência são analisados indicadores docrescimento da população ocupada e doproduto por trabalhador, em períodos deforte crise da década de 80, até o início donovo século.

O exame do produto do trabalhadorcomo indicador da produtividade setorial,para o Brasil, retratado na Tabela 4 e nosGráficos 2 e 3, permite verificar que as taxas

TABELA 4Taxas anuais de crescimento real do Produto Interno Bruto por trabalhador e da população ocupada, segundo

setores de atividadeBrasil – 1980-2005

Fonte: Fundação Getúlio Vargas; IBGE. Elaboração da autora.

GRÁFICO 2Taxas anuais de evolução do Produto Interno Bruto por trabalhador, segundo setores de atividade

Brasil – 1980-2005

Fonte: IBGE. Contas Nacionais e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.

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médias anuais de crescimento da produti-vidade no setor de serviços, que corres-ponde ao setor mais absorvedor da mão-de-obra no país, estiveram sempre abaixoda média global do país, em quase todo operíodo (com exceção da década de 70), oque confirma as constatações de que, ape-sar das taxas consideráveis de aumento detrabalhadores – que em períodos recessivosou de menor nível de atividades ultrapassamconsideravelmente as do setor Secundá-rio –, o produto gerado cresceu menos queproporcionalmente, em virtude de o setorTerciário brasileiro absorver parcelarepresentativa de ocupados com baixaqualificação, em ocupações de menorremuneração e pouca intensidade decapital. Haja vista que nos anos posterioresa partir de 1984, em que se observou certaretomada nas atividades econômicas emrelação ao período de crise do início dadécada de 80, a produtividade dos serviçosapresentou maior taxa de decréscimo,embora os demais setores também tenhamregistrado queda deste indicador.

Dessa forma, é necessário salientar queas transformações setoriais relevantes quevêm ocorrendo no país e caracterizaram umareestruturação produtiva considerável foraminiciadas desde os primeiros meados dadécada de 50 até o final da de 70. Nos anos80, as constantes situações de crise econô-

mica por que passou o país retardaram acontinuidade das transformações, o quecontribuiu para o crescimento da defa-sagem de desenvolvimento entre o Brasil eoutras economias que se encontravam namesma situação de emergência, comoalguns países asiáticos. A continui-dade decrescimento do setor de serviços no país,desde os períodos econômicos contur-bados, deveu-se mais à possibilidade de osetor absorver indivíduos que não en-contraram oportunidades nos demaissetores, do que à busca da modernizaçãoeconômica.

Na década de 90, observa-se aretomada do crescimento da produtividadesetorial, particularmente no setor Primário,em que a modernização foi relativamentemais intensa e as taxas anuais decrescimento da população ocupada seelevaram acima de 2%, contrariando atendência tradicional de queda. No setorSecundário, o crescimento da produtividadese deu às custas da absorção da mão-de-obra, que se dirigiu ao setor Terciárioinformal, resultando, como conseqüência,decréscimo considerável da produtividadedeste setor. A tendência de redução daprodutividade se intensificou considera-velmente a partir do final do século 20 até2005, desde que o aumento da populaçãoocupada em todos os setores verificou-se

GRÁFICO 3Taxas anuais de evolução da População Economicamente Ativa, segundo setores de atividade

Brasil – 1980-2005

Fonte: IBGE. Contas Nacionais e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.

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com elevação da informalidade e baixocrescimento do PIB.

As transformações na distribuiçãoocupacional

A Tabela 5 e o Gráfico 4 retratam, paraperíodos temporais selecionados de 1990 a2005, a distribuição de ocupados em gruposocupacionais específicos. Em todo o perío-do, as ocupações da produção direta debens e serviços concentraram o maior nú-mero de trabalhadores. No entanto, estarepresentatividade, que em 1990 era de52,4%, veio decrescendo até 2005, quandosituou-se em 48,2%, em decorrência decerto grau de modernização nos processos

produtivos, que diminuiu os postos de tra-balho nestes grupos ocupacionais.

Isto pode ser confirmado pelo aumentogradativo da participação de ocupaçõestécnicas e científicas, que incluem pro-fissionais liberais e outros ocupados maisqualificados. Por outro lado, a moderni-zação produtiva no período tambémapresentou a característica da diminuiçãode níveis hierárquicos gerenciais e admi-nistrativos nas empresas. Esta perdaoriginou-se da implementação de novosmodelos gerenciais aplicados no país, adenominada “reengenharia” (downsizing).O resultado desta redução de represen-tatividade, de 1990 a 2005, foi de quase18% em relação ao total dos ocupados.

TABELA 5Distribuição do pessoal ocupado, segundo grupos ocupacionais

Brasil – 1990-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.Nota: As informações foram compatibilizadas para permitir a comparabilidade entre os anos, tendo em vistas as modificaçõesrealizadas nas classificações das PNADs desde 1992.

GRÁFICO 4Distribuição do pessoal ocupado, segundo grupos ocupacionais

Brasil – 1990-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD 1990, 1996, 2001 e 2005. Elaboração da autora.Grupos Ocupacionais: 1 = Técnicas, científicas e assemelhadas; 2 = Administrativas; 3 = Agropecuárias e extrativas; 4 = Indústriade Transformação; 5 = Construção; 6 = Comércio; 7 = Transportes e Comunicação; 8 = Outras.

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Apesar do período de poucos investi-mentos, os postos de trabalho da Indústriada Construção Civil também aumentaram,porém grande parte alocava-se emautoconstrução ou atividades informais. Poroutro lado, observa-se aumento signifi-cativo, em 2001, da representatividade detrabalhadores no grupo do Comércio, parti-cularmente correspondendo a atividadesvoltadas para consumo pessoal e de baixarelação capital/trabalho, porém com novaredução em 2005, como decorrência daconstante situação de contenção econô-mica e baixos investimentos durante osanos seguintes.

A evolução anual da representa-tividade dos trabalhadores nos váriosgrupos ocupacionais é apresentada noGráfico 5, para períodos selecionados entre1990 e 2004. Observa-se, inicialmente, queno total do período a maior taxa decrescimento de trabalhadores ocorreu paraas ocupações do Comércio (16,3%), astécnicas, científicas e assemelhadas(9,8%), o grupo de Outras ocupações (9,9%)e os Transportes e Comunicações (7,8%).Note-se que, nestes grupos, existe umaheterogeneidade de processos produtivosde maior ou menor relação capital/trabalho,não sendo possível, a partir destes dados,

a observação de alguma relação direta entreo aumento da absorção e o grau demodernização das ocupações.

Nos dois primeiros períodos analisa-dos,de 1990-1996 e de 1996-2001, astransformações estruturais foram menores.As mudanças mais consideráveisocorreram de 2001 a 2004, quando seressalta a queda de 4% nas ocupações daIndústria de Transformação e a elevaçãomuito significativa em Transportes eComunicações e da categoria Outrasocupações.

As transformações regionais nadistribuição do pessoal ocupado

Embora na seção anterior tenha sidoverificada a existência de mudanças estru-turais significativas da representatividadede ocupações, segundo grupos selecio-nados, o exame das diferenças regionaisnesta distribuição mostra que não acon-teceram transformações na concentraçãoregional, como verificado na Tabela 6 e noGráfico 6.

Em todo o período, as mudanças forammuito pouco significativas, podendo-seconsiderar que a mesma representatividaderegional se repetiu, mostrando que cerca

GRÁFICO 5Evolução do pessoal ocupado, segundo grupos ocupacionais

Brasil – 1990-2004

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.Grupos ocupacionais: 1 = Técnicas, científicas e assemelhadas; 2 = Administrativas; 3= Agropecuárias e extrativas; 4 = Indústriade Transformação: 5 = Construção; 6 = Comércio; 7 = Transportes e Comunicações; 8 = Outras.

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de 43% da população ocupada concentrou-se na Região Sudeste e 28% no Nordeste.Apenas no Norte foi verificado crescimentona participação, passando de 3,3% em 1990para 7,4% em 2005.

O aspecto qualitativo do trabalho nasdiferentes regiões pode ser avaliado, parao período recente, na Tabela 7 e Gráfico 7,que revelam a participação dos ocupadoscom carteira de trabalho assinada e suaevolução, segundo a região.

Observa-se que, em 1992, as divergên-cias foram muito significativas, pois noNordeste e no Norte urbano apenas 11,3%e 13,4% dos ocupados, respectivamente,tinham registro em carteira, enquanto noSudeste a representatividade era superiora 27%. A tendência para o período posteriorfoi de crescimento desta participação emtodas as regiões. As pesquisas da RegiãoNorte incluíram, pela primeira vez em 2004,

o levantamento para a zona rural. Dessaforma, a perda da representatividadeobservada através das informações de2005 deve-se a esta inclusão e não hápossibilidade de comparação com a sérieanterior. De qualquer maneira, a represen-tatividade dos ocupados com carteira emtodas as regiões continua considera-velmente baixa em relação à condiçãonecessária de proteção ao trabalhador.

A Tabela 8 permite a avaliação do graude diferenciação regional na representa-tividade dos trabalhadores com carteiraassinada, tendo como base a média dopaís. Os indicadores acima e abaixo daunidade representam respectivamentesituações melhores e piores em relação àmédia nacional.

A Região Sudeste mostra um grau desuperioridade em torno de 29% em 2005em relação à média brasileira, enquanto o

TABELA 6Distribuição do pessoal ocupado, segundo regiões

Brasil – 1990-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD.

GRÁFICO 6Distribuição do pessoal ocupado, segundo regiões

Brasil – 1990-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD.

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Nordeste e o Norte situam-se, respectiva-mente, em torno de 46% e 40% abaixo destamédia e o Sul mostra um diferencial superiorconsiderável de mais de 14%. O aumentoda representatividade de trabalhadores comcarteira assinada não significou umaconvergência do grau de desenvolvimentoentre as regiões.

Para detalhar as diferenças na estrutu-ração ocupacional entre as Unidades daFederação, foi elaborado um indicador querecebeu a denominação de Índice Regionalde Estruturação Ocupacional (Ireo), visandorepresentar o grau de modernidade ouatraso da estrutura regional. O Ireo é defi-nido como:

TABELA 7Participação dos ocupados com carteira assinada, segundo regiões

Brasil – 1992-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD.(1) Inclui zona rural.

GRÁFICO 7Participação dos ocupados com carteira assinada, segundo regiões

Brasil – 1992-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD.

TABELA 8Quociente de Diferenciação Regional da participação de ocupados com carteira assinada, segundo regiões

Brasil 1992-2005

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.(1) Inclui zona rural.

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Ireo = ∑R [ (POij x p1) x (POij x p2) ] / POR , onde:

R = UF; PO = número de pessoas ocupa-das; i = grupos de anos de estudo; j = faixasde rendimentos médios; p1 = participaçãoda população ocupada na faixa derendimentos médios; p2 = participação dapopulação ocupada no grupo de anos deestudo; POR = população ocupada total daregião.

Os resultados são interpretados demodo que os índices superiores significamestruturas ocupacionais mais desenvol-vidas, compostas por um maior percentualde trabalhadores com maior nível de esco-laridade e maiores rendimentos médios. ATabela 9 apresenta estes resultadosclassificados em ordem decrescente, combase no ano de 2002. Como era esperado,os maiores indicadores são verificados paraas regiões do Distrito Federal, São Paulo eRio de Janeiro e os menores em Alagoas,Maranhão e Piauí. Uma observação impor-

tante está no comportamento temporaldestes indicadores, com melhora conside-rável em todas as regiões entre 1990 e1996, porém, em 2002, as estruturaçõessofreram perda de qualidade, conformeapresentado na Tabela.

A Tabela 10 mostra os Quocientes deDiferenciação Regional da EstruturaçãoOcupacional (QREO), que permitem avaliaro grau de intensidade de diferenciaçãoentre as estruturações ocupacionais, tendocomo base a média do país. Este quocienteé calculado através da relação:QREO = IreoR / IreoBR , onde R = UF eBR = Brasil.

A média brasileira é representada peloquociente igual à unidade e os resultadosacima e abaixo de 1 significam os graus deintensidade respectivamente superiores ouinferiores à média. Observe-se, inicialmente,que o Distrito Federal apresenta a estrutura-ção mais vantajosa, correspondente a

TABELA 9Índice Regional de Estruturação Ocupacional (Ireo)

Unidades da Federação – 1990-2002

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.(1) Classificadas em ordem decrescente, com base em 2002.

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melhores salários e níveis de escolaridade,que se situam quase 130% acima da médiaem 2002. Os Estados de São Paulo e Riode Janeiro mostram também considerávelintensidade acima da base do país, emcerca de mais de 50% e 40%, respectiva-mente. Acima da média brasileira situam-

se poucas regiões, além das citadas, ouseja, Santa Catarina, Paraná e Rio Grandedo Sul. Para efeito analítico, os quocientesforam agrupados em quatro níveis: (a) Alto,com indicadores entre 0 e 30% superioresà média, englobando as regiões acimamencionadas; (b) Médio Alto, cujas inten-

GRÁFICO 8Índice Regional de Estruturação Ocupacional (Ireo)

Unidades da Federação (1) – 1990-2002

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.(1) Classificadas em ordem decrescente, com base em 2002.

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sidades situam-se entre 0,1% e 20% abaixoda média; (c) Médio Baixo, com resultadosentre 21% e 40% abaixo da média, incluindoos Estados do Amazonas, Pará, Rio Grandedo Norte e Sergipe; e (d) Baixo, comindicadores entre 41% e 70% abaixo,agrupando os demais Estados do Nordestee o Tocantins.

Dessa forma, observou-se que osEstados que pertencem a cada um dosquatro níveis acima determinados são osmesmos correspondentes a quatro gruposhierarquizados de forma decrescente, tendocomo base a variável renda per capita,mostrando a forte relação entre o nível deestruturação ocupacional e o nível dedesenvolvimento regional (KON, 2004).

Considerações finais

O processo de aceleração das mu-danças tecnológicas no mundo que permitiua difusão da globalização mundial – ocor-rida desde os anos 80 e mais intensamentena década de 90 – tornou necessário que ospaíses se preparassem para o dinamismodas trocas internacionais que começava ase instaurar. O processo de reestruturaçãoprodutiva que se ampliou primeiramentenos países desenvolvidos, difundindo-senão tão rapidamente para os em desen-volvimento, resultou e foi resultado destastransformações tecnológicas, nas condi-ções de mercado então vigentes e nascaracterísticas das empresas, que tinham

TABELA 10Quociente de Diferenciação Regional da Estruturação Ocupacional (QREO), segundo níveis de desenvolvimento

Unidades da Federação –1990-2002

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD. Elaboração da autora.(1) Classificadas em ordem decrescente, com base em 2002.

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como objetivo restaurar a competi-tividadeindustrial.

No caso específico do Brasil, além deenfrentar os impactos destas transforma-ções mundiais, a distribuição ocupacionalsofreu, nos últimos anos, os reflexos dosproblemas macro e microeconômicos estru-turais e conjunturais pelos quais vempassando o país, que exigiram políticas pú-blicas restritivas voltadas para a estabiliza-ção. A estas questões associaram-se osnovos requisitos exigidos para a contra-tação da mão-de-obra, tendo em vista osrenovados processos produtivos e organi-zacionais, bem como os impactos dasituação de aumento da competitividade emundialização das economias.

Este estudo visou contribuir com subsídi-os para a análise recente das transforma-ções no perfil da distribuição ocupacionaldo trabalhador brasileiro, segundo asegmentação setorial e grupos ocupacionaisespecíficos. Os resultados empíricosapontam para as constatações iniciais de queo Brasil apresenta evolução semelhante aosdemais países do grupo classificado peloBanco Mundial como de Renda Média Alta,no que se refere à tendência à reestruturaçãoocupacional relacionada às taxas relativa-mente mais elevadas de crescimento detrabalhadores no setor Terciário, quandocomparados a países de Renda Alta (KON,2004), porém com características qualitativa-mente diferentes destes últimos, tendo emvista menor modernização e produtividade.

Desde os últimos anos da década de90, a população brasileira ocupada nos se-tores Primário e Secundário vem decres-cendo anualmente, e a elevação considerá-vel de trabalhadores no setor Terciário vemse dando em taxas superiores às do produtosetorial gerado, resultando em decrescenteprodutividade do trabalho. Por sua vez, adistribuição de trabalhadores em ocupa-ções específicas no país também veiosofrendo mudanças consideráveis, a partirdos anos 90. Estas favoreceram maiorconcentração de trabalhadores em ocupa-ções de Transportes e Comunicações enaquelas técnicas, científicas e asseme-lhadas, que apresentam trabalhadoresmais qualificados e melhores condições detrabalho, mas também da Construção Civile de Outras ocupações (pessoais, sociais,etc.), que têm um caráter global de baixarelação capital/trabalho e baixa remune-ração. Estas transformações refletem asmudanças organizacionais traduzidas nareengenharia (diminuição de trabalhadoresadministrativos), mas também decréscimono setor da Indústria de Transformação, emum período atribulado da conjuntura nacional.

Apesar destas transformações ocupa-cionais constatadas, a análise das mudan-ças regionais na distribuição do trabalhorevela que, entre as regiões, não houvealterações significativas, permanecendo asconsideráveis disparidades regionais emtodo o período. Dessa forma, as mudançasestruturais foram intra e não inter-regionais.

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MARSHALL, J. N.; WOOD, P. A. Servicesand space: key aspects of urban andregional development. England, Harlow:Longman Group Limited, 1995.

Abstract

Recent changes in the profile of occupational distribution of the Brazilian population

This article analyzes recent changes in the profile of the Brazilian labor structure, according tosector segmentation and specific occupational groups, especially during the 1990s. Theoreticalaspects on the causes of the segmentation of the labor market are first examined. Empiricalinformation related to structural changes in labor markets in the worldwide economy are thendiscussed, in order to locate Brazil in this context. Specifically, Indexes of Occupational Structureand Regional Difference Quotients for Brazil were drawn up. The results show that, besidessignificant occupational transformations, structural changes occurred in the regions, but notamong them.

Key words: Labor. Occupational Structure. Sector. Region.

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Recebido para publicação em 25/08/2006.Aceito para publicação em 06/11/2006.

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