mosaiko inform17

20
INFORMAÇÃO SOBRE OS DIREITOS HUMANOS E O TRABALHO DO MOSAIKO | INSTITUTO PARA A CIDADANIA 17 FREI JOSé SEBASTIÃO MANUEL, OP Figura em Destaque, Pág. 08 FREI MáRIO RUI, OP Entrevista, Pág. 13 APRENDER A SER CIDADÃO Reflectindo, Pág. 17

Upload: mosaiko-instituto-para-a-cidadania

Post on 31-Mar-2016

224 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

 

TRANSCRIPT

Page 1: Mosaiko inform17

INFORMAÇÃO SOBRE OS DIREITOS HUMANOS E O TRABALHO DO MOSAIKO | INSTITUTO PARA A CIDADANIA

17

FREI JOSé SEBASTIÃO MANUEL, OPFigura em Destaque, Pág. 08

FREI MáRIO RUI, OPEntrevista, Pág. 13

APRENDER A SER CIDADÃOReflectindo, Pág. 17

Page 2: Mosaiko inform17

editorialJúlio Candeeiro, op

informandoAlguns traços da filosofia de trabalho do MosaikoAntónio Ebo

estórias da históriaCaminhada histórica do MosaikoJosé Sebastião Manuel, op

figura de destaquefrei José Sebastião Manuel “Zeca”Humberto Alves

construindoOs Direitos Humanos na perspectiva do MosaikoMary Daly

Depoimentos sobre o trabalho do Mosaiko

entrevista frei Mário Rui | Hermenegildo Teotónio

reflectindo Aprender a ser cidadão | Luís de França, op

A minha voz conta | Ban Ki-moon

breves

índice

Enquanto as PEssoas são imPEDiDas DE ExERcER sEus DiREitos básicos, a luta PEla DigniDaDE humana DEvE continuaR. DEvEmos assEguRaR quE as vozEs quE FoRam silEnciaDas sEjam ouviDas – silEnciaDas PoRquE são maRginalizaDas, sujEitas à DiscRiminação, vivEm Em PobREza, não sabEm ou não PoDEm ExERcER sEus DiREitos.

Ficha Técnica

ProPriedadeMOSAIKO | Instituto para a Cidadania

niF: 7405000860nº de regisTo: MCS – 492/B/2008

direcçãoJúlio Candeeiro, opLuís de França, op

Mário Rui Marçal, op

redacçãoDesidério Segundo

Florência ChimuandoHermenegildo Teotónio

colaboradoresAntónio Ebo

Humberto AlvesJosé Sebastião Manuel, op

Mary Daly

MonTageM gráFicaGabriel Kahenjengo

assessoriaHelena Osório

conTacTosBairro da Estalagem - Km 12 | Viana

Fax: (00244) 222 371 598TM: (00244) 912 508 604TM: (00244) 923 543 546

Caixa Postal 2304 - Luanda | AngolaE-mail: [email protected]

www.mosaiko.op.org

iMPressãoDamer Gráficas SA – Luanda

TirageM: 2500 exemplares

disTribuição graTuiTa

Os artigos publicados expressam as opiniões dos seus autores, que não

são necessariamente as opiniões do Mosaiko | Instituto para a Cidadania.

coM o aPoio

Mosaiko inForM nº 17 - MARçO 2012 TeMa: 15 AnOS DO MOSAIkO

PÁG. 03

PÁG. 04

PÁG. 06

PÁG. 08

PÁG. 09

PÁG. 10

PÁG. 13

PÁG. 17

PÁG. 19

PÁG. 20

Ministério dos Negócios EstrangeirosRepública Federal da Alemanha

Irina Bokova

Page 3: Mosaiko inform17

03

editorial

estimado leitor/a

No mês de Setembro 2012, o Mosaiko celebrou 15 anos de trabalho – bodas de cristal - com o lançamento do DVD Ser Humano - que retrata histórias de Direitos Humanos em Angola -, um concerto ao vivo e a solo de Paulo Flores, que brindou a festa com a sua participação.

Esta edição olha para o passado, analisa o momento actual e abre algumas perspectivas sobre o futuro do Mosaiko.

Depois de 15 anos de presença em Angola, o sonho dos Dominicanos era contribuir com o seu trabalho para promover a reconciliação da sociedade então dividida pelo conflito armado. Ainda poucos em número, uma equipa liderada pelo saudoso frei João Domingos tornou este sonho realidade, contando para isso com o apoio de várias pessoas e instituições, dentro e fora de Angola.

Passados 15 anos, o Mosaiko pode olhar para o passado com a alegria de ter contribuído no melhor das suas capa-cidades para a construção de uma cultura de respeito, gozo e protecção dos Direitos Humanos em Angola. O Mosaiko nota com alegria que hoje, pelo menos ao nível do discurso, os Direitos Humanos e a cidadania vão conquistando um espaço cada vez maior no seio da sociedade angolana.

Hoje, o principal desafio é passar das palavras às acções, abrindo espaços e criando oportunidades para que a o contributo de cada cidadã(o) para uma Angola melhor seja exigido e se torne uma realidade.

E A bOdA dE crIStAl cONtINuA…!

Júlio Gonçalves Candeeiro, op

Os diversos colaboradores deste número reflectem sobre estes 15 anos... O frei Zeca, membro fundador e primeiro Director Geral do Mosaiko partilha connosco a caminhada histórica do Mosaiko e é a figura de destaque desta edição. O António Ebo escreve sobre os traços fundamentais da filo-sofia de trabalho do Mosaiko. O frei Mário, um dos membros fundadores do Mosaiko, fala, em entrevista exclusiva ao Mosaiko Inform, dos 15 anos de história do Mosaiko.

Os frutos do trabalho, particularmente através de dezenas de Grupos Locais de Direitos Humanos, tornam o futuro desa-fiante e promissor. Todavia, este continua ensombrado pelas dificuldades em obter meios que permitam dar continuidade ao trabalho, numa fase em que vários financiadores inter-nacionas deixam de operar em Angola, muitas empresas e muitos cidadãos ainda não estão sensibilizados para apoiar as organizações nacionas e os critérios de atribuição do “es-tatuto de utilidade pública” - e consequentemente de acesso a fundos públicos - continuam sem ser claros e acessíveis a muitas organizações que trabalham por uma Angola melhor.

Termino com um sincero agradecimento a todos os/as que torna(ra)m possível o sonho e a realidade do Mosaiko. Um agradecimento especial a cada Dominicano; a cada funcioná-rios e ex-funcionário; a cada financiador, parceiro e amigo/a, pois temos a consciência de que cada um(a) contribuiu para que o Mosaiko fosse o que é e, também do contributo de cada um depende a continuidade do sonho de uma Angola melhor para todos!

Festas Felizes!

AdQuIrA JÁ

o dVd + cd

apenas 2.000 Akz

Page 4: Mosaiko inform17

Na realidade, o que se pretende com este tema é apresentar alguns traços da mesma filosofia que o MOSAIKO | Instituto para a Cidadania tem preservado ao longo de 15 anos de trabalho e que, à primeira vista, nos parecem ser boas referências para a pro-moção e divulgação dos Direitos Humanos.

Na prossecução deste fim, o MOSAIKO realiza inú-meras actividades ligadas à divulgação da Declara-ção Universal dos Direitos Humanos, da Constituição Angolana e demais legislações relativas aos direitos fundamentais dos cidadãos; coopera com as autori-dades locais do Estado, e outras instituições, para a salvaguarda dos mesmos direitos; participa, reclama e denuncia as violações de Direitos Humanos junto das autoridades competentes para, em conjunto com estas e no quadro dos mecanismos disponíveis, satis-fazer as exigências de um Estado cada vez mais pró-ximo da realização dos ideais subjacentes à Declara-ção Universal dos Direitos Humanos.

Deste modo, o MOSAIKO, com o seu trabalho, preten-de contribuir activamente para a paz e a reconcilia-ção nacional entre os Angolanos, criar um clima que favoreça o surgimento de iniciativas capazes de abrir caminhos concretos para uma Angola mais justa, próspera e inclusiva, prestando uma atenção especial aos mais desfavorecidos ou discriminados: as mulhe-res, crianças, órfãos, analfabetos, desempregados ou subempregados, entre outros.

Recuando no tempo e recordando os pilares da sua fundação em 1997, como Centro Cultural MOSAIkO, aos quais se mantém fiel: «O Centro procura inves-tigar as causas profundas destas situações e princi-palmente criar um espaço de reflexão e de debate, inclusivo e participativo, sobre caminhos concretos que permitam superar o ‘caos’ da sociedade ango-lana», difundindo, o mais amplamente possível, tais trabalhos de modo a contribuir na afirmação de uma

opinião pública forte e de uma sociedade civil com um maior espírito de iniciativa.

O MOSAIKO, no seu trabalho, não pretende «trabalhar para» os grupos e comunidades, quer sejam rurais ou urbanas, mas sim «‘trabalhar com’ as forças vivas da sociedade angolana (…)» de modo a promover um de-senvolvimento nos grupos e comunidades para que sejam «ao mesmo tempo o escultor, o barro e a es-cultura acabada» (Calendário de Direitos Humanos 2009, texto central, ed. ADRA e MOSAIKO).

Tendo em conta a missão, no processo de desenvolvi-mento do seu trabalho, o MOSAIKO | Instituto para a Cidadania procura realizar os objectivos estratégicos abaixo enunciados, e pensados aquando da sua fun-dação, não como valores em si mesmos, mas como uma conjugação de factores que configuram o seu modus faciendi, de forma a:

w Promover a credibilidade pelo rigor na reflexão e difusão dos Direitos Humanos;

w Assegurar a credibilidade e a isenção do Mosai-ko – o que é fundamental para que a reflexão produzida tenha como base uma investigação rigorosa e documentada. As exigências de cla-reza e acessibilidade associadas à difusão da mensagem, não podem ceder a simplismos ou lugares comuns;

w Atender ao contexto angolano na reflexão e di-fusão dos Direitos Humanos. Tanto a reflexão elaborada como a sua difusão, mesmo quan-do se baseie no que aconteceu noutros países, não pode deixar de ter em conta a situação concreta de Angola;

w Promover um estudo interdisciplinar sistemáti-co. Isto é, o estudo dos problemas não se limita à perspectiva independente de cada disciplina. Pretende-se estabelecer um diálogo interdis-

04

informandoalguns Traços da FilosoFia de Trabalho do Mosaiko

António Ebo

Page 5: Mosaiko inform17

ciplinar em que, por exemplo, a abordagem económica seja interpelada pela abordagem cultural e vice-versa. Cada assunto será reflec-tido, conjuntamente, de forma sistemática, a partir das diferentes perspectivas de análise;

w Desenvolver o intercâmbio com organizações congéneres. O intercâmbio com diferentes or-ganizações congéneres (nacionais e estrangei-ras) permite concretizar vários aspectos para que o Mosaiko realize a sua missão: obter e difundir informação rigorosa e actualizada, partilhar experiências e promover o intercâm-bio de colaboradores, participar em iniciativas conjuntas a nível nacional ou internacional, etc.;

w Efectuar uma difusão qualificada da reflexão elaborada. O êxito do trabalho do Mosaiko de-pende muito da capacidade para transmitir amplamente, de uma forma clara e acessível, a reflexão elaborada. A difusão tem de atender à especificidade dos meios utilizados (confe-rências, colóquios, programas de rádio, revis-tas, folhetos, etc.), sendo assistida por técnicos que garantam uma difusão profissionalizada e qualificada, tendo como padrão, para cada um dos meios utilizados, o que de melhor se faz em Angola;

w Contar com colaboradores comprometidos e dedicados, que acreditem e se empenhem no trabalho a desenvolver, sentindo-se realizados por o efectuar;

w Promover o desenvolvimento das aptidões de cada membro da sua equipa de trabalho e com-partilhar responsabilidades, de modo a que os resultados obtidos produzam satisfação e re-conhecimento, fomentando uma dedicação sempre maior ao projecto assumido por todos. Além dos membros da equipa de trabalho, o Mosaiko associará uma rede de ‘colaborado-res’ que apoie a sua actividade como peritos em determinadas iniciativas ou durante deter-minado período;

w Maximizar os recursos. Conjugando equilibra-damente relevância, eficiência e eficácia, o Mosaiko procurará maximizar os recursos dis-poníveis tirando o máximo proveito das capa-cidades disponíveis.

Estes 15 anos de trabalho reflectem, também, o es-forço que o MOSAIKO tem feito para se manter fiel aos objectivos de base sem perder de vista toda uma filosofia que ilumina a sua visão de desenvolvimento rumo a uma Angola cada vez mais justa.

05

Page 6: Mosaiko inform17

Em finais de 1982, chegaram a Angola os freis João Domingos, Gil Filipe e José nunes, os primeiros dominicanos estabelecidos no País, a convite do então bispo de Novo Redondo, D. Zacarias kamwenho. Cruzando a acção pastoral, com uma dimensão fortemente social, este grupo foi o viveiro do que veio a dar o Vicariato dos Dominicanos em Angola. Desde o início, foi-se adensando a ideia de que, tão logo tivesse membros novos disponíveis, o Vicariato iniciaria algo especificamente inspirado no carisma dominicano e que, ao lado de tantos outros compromissos (na altura, o ICRA já tinha dado grandes saltos com a acção do frei João Domingos), respondesse inovadoramente aos desafios sociais, políticos, económicos e jurídicos, assim como aos religiosos do País. Os freis Mário Rui Marçal e José Sebastião Manuel, a frequentarem os últimos anos das suas licenciaturas em Teologia, em Lisboa, foram os tais novos que, em conjunto com o frei João Domingos, e a partir de 1994, começaram a fazer fermentar progressivamente a

06

estórias da históriacaMinhada hisTórica do Mosaiko

José Sebastião Manuel, op

tal ideia inicial, estruturando-a num projecto que se institucionalizaria no centro cultural Mosaiko (1997) – o qual, em 2011, adoptou o nome de Mosaiko | Instituto para a Cidadania.

A 20 de Setembro de 1997, foi inaugurada a sede do MOSAIKO e esta data foi adoptada como a do seu nascimento, embora a implementação do trabalho tivesse parcialmente começado antes. O MOSAIKO adoptou os Direitos Humanos como quadro de referência metodológica e substancial do seu trabalho. Optando por uma perspectiva mais analítica do que normativa – e, por isso, multidisciplinar –, o Instituto foi procurando dar, por um lado, realce à formação para que as pessoas tivessem sempre presente, no espírito, os Direitos Humanos; por outro lado, esforçou-se por alcançar a reabilitação de vítimas de violação desses direitos. Sobretudo, a partir de 2003, com advogados disponíveis a tempo inteiro no MOSAIKO, tal reabilitação passou a incluir o tratamento de casos, tanto em instâncias judiciais

Page 7: Mosaiko inform17

07

como em administrativas. Porém, a formação e o tratamento de casos nunca foram as únicas actividades do MOSAIKO.

A respeito da formação, bastam três situações para ilustrar a aplicação do princípio do trabalho e do envolvimento de todas as partes relevantes: num seminário (1999) em que participavam militares, polícias e respectivas chefias, mas também professores, profissionais de saúde, representantes de igrejas, e outros, como cidadãos anónimos. Uma senhora de idade perguntou, a uma alta patente da Polícia de Intervenção Rápida, se as vendedeiras de fuba na praça, cujas bacias eram destruídas a pontapé – em nome da «ordem pública» –, estavam numa posição, socialmente, muito diferente daquela que beneficiaria a sua mãe. Emocionado e embaraçado o Polícia não só disse que não, como se comprometeu a nunca mais ser instrumento do que ele qualificou como um sistema de reprodução da repressão. Num outro seminário (2000), um director provincial da Comunicação Social e da rádio local tendo, primeiro, ignorado a pressão das perguntas reprovadoras e dos apupos dos participantes, horas depois voltou com a mensagem de que já não continuaria a ser «caixa-de-ressonância» de um regime corrupto. Num terceiro seminário (2001), um então comandante provincial da Polícia decidiu estabelecer postos de recepção de reclamações da população contra a Polícia, até então caso raro na História de Angola pós 1974. Em cada uma destas situações, as acções subsequentes de cada uma das entidades referidas passaram a contribuir, decididamente, para um progressivo melhoramento da observância dos Direitos Humanos a nível das respectivas localidades.

Quanto ao tratamento de casos, e aplicando a perspectiva do longo prazo – numa lógica de criação de cultura –, de entre os muitos não possíveis de referir aqui, talvez o seguinte baste:

Uma série de casos tratados pelo MOSAIKO levou ao afastamento de dois comandantes municipais da Polícia da mesma província – o que fez ver à população que, afinal, os Direitos Humanos não eram meras palavras, já que «os grandes» podiam pagar pelos seus maus actos contra o povo. Por outro lado, o procurador provincial local (2007) disse que passaria a usar todos os poderes legais, ao seu dispor, para contribuir para a alteração da miserável situação do povo. Desde então, estreitou-se como nunca a colaboração entre a população e as instâncias judiciais e administrativas, todas progressivamente procurando jogar os seus adequados papéis, numa lógica que ainda não conheceu retrocesso.

Muito faltou dizer. Para terminar talvez baste afirmar, em poucas palavras, que o impacto do trabalho do MOSAIKO veio sendo fruto de uma simbiose entre os seus dedicados profissionais e as pessoas de destacada capacidade de liderança pertencentes a igrejas, ONG’s e órgãos do Estado. Em 2012, um novo impulso dado pelo sector da pesquisa social, colocou o MOSAIKO no centro de muitas atenções, dentro e fora de Angola.

estórias da históriacaMinhada hisTórica do Mosaiko

Uma série de casos tratados pelo MOSAIKO levou ao afastamento de dois comandantes municipais da Polícia da mesma província – o que fez ver à população que, afinal, os Direitos Humanos não eram meras palavras, já que «os grandes» podiam pagar pelos seus maus actos contra o povo.

Page 8: Mosaiko inform17

figura em destaqueFrei José sebasTião ManuelHumberto Alves

Frei Zeca ajudou a criar, em 1997, o Centro Cultural Mosaiko, hoje MOSAIKO | Instituto para a Cidadania, do qual foi director por mais de 13 anos.

Frei José Sebastião Manuel, padre dominicano de 43 anos de idade, natural do município da Gabela, pro-víncia do Kwanza-Sul, fez os estudos primários e se-cundários no município do Sumbe entre 1976 a 1987. Em 1985, ingressa no Seminário do Sumbe onde fre-quenta o 1.º e 2.º anos do Propedêutico. Entre 1987 e 1990, frequenta o curso de Filosofia (1.º e 3.º anos) no Seminário Maior do Uíge. Durante o seu noviciado em Abidjan, em 1990 e 1991, trabalhou na promoção hu-mana das vítimas da prostituição. Em 1990, em Abid-jan, como membro da rede RONGEAD-en-Afrique, fez parte da equipa que elaborou os manuais pedagógicos para os agentes de Desenvolvimento. Em 1991, já em Lisboa, iniciou a licenciatura em Teologia na Faculda-de de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, colaborando em diversas iniciativas de associações de estudantes da Faculdade de Teologia. Foi membro fundador da Fraternidade dos Estudantes Cristãos em Angola (FECA), sediada em Portugal. Defendeu a tese de licenciatura, submetida ao tema: «A Intervenção Social do Profeta Oseias».

Em 1999 e 2000, fez parte de uma delegação de an-golanos das igrejas e ONGs que o levaram a visitar o Canadá, Holanda, Bélgica e Reino Unido, em acções de advocacia e lobby pela paz em Angola. Em 2002 e 2003, participou em Genebra, nas secções ordinárias da comissão da ONU para os Direitos Humanos. Em 2003, frequentou o curso de Gestão do Ciclo de Pro-jectos, pelo Hifab Internacional, na Suécia. Já foi pro-motor de Justiça e Paz da Inter-Africana da Ordem dos

Pregadores e responsável pelos estudos e promotor de Justiça e Paz do Vicariato Dominicano de Angola. De 1997 a 1999, foi professor de Doutrina Social da Igreja no Seminário Maior de Luanda e no Instituto Médio de Ciências Religiosas. Em 1995, participou na primeira conferência Dominicana sobre Justiça e Paz em áfrica realizada em Joanesburgo (áfrica do Sul).

Frei Zeca, como é carinhosamente chamado, guiado por um forte compromisso social e preocupado com a dignidade da pessoa humana, ajudou a criar em 1997 – em pleno período de guerra, onde falar de Direitos Humanos ainda não era possível –, o Centro Cultural Mosaiko, hoje MOSAIKO | Instituto para a Cidadania, do qual foi director por mais de 13 anos. Esta organização tem como objectivo garantir o respeito pela dignidade da pessoa humana e o desenvolvimento da sociedade angolana, a partir do contributo de todos, de forma concreta e contextualizada para o desenvolvimento integral e integrado na sociedade angolana.

Integrou inumeras equipas que, se deslocaram pelo País - por aldeias, vilas e cidades - para a realização de Seminários sobre Direitos Humanos e, por conse-guinte, a criação de Núcleos e Comissões de Direitos Humanos em diversas áreas onde o MOSAIKO realiza os seus trabalhos.

Foi ordenado diácono a 9 de Outubro de 2012 e presbí-tero a 12 de Dezembro do mesmo ano. Neste momento, Frei José Sebastião Manuel encontra-se em Londres a frequentar o curso de mestrado dirigido a não juristas sobre o Direito Internacional dos Direitos Humanos.

08

Page 9: Mosaiko inform17

O MOSAIKO | Instituto para a Cidadania convidou-me a escrever uma reflexão sobre o seu trabalho, após 15 anos de actuação como organização. Conheço e acompanho o trabalho social dos Dominicanos, des-de os anos 80, quando iniciaram a sua intervenção, após a Independência, na paróquia de Wako Kungo, na província do Kwanza Sul. Acompanhei os primei-ros passos do Instituto de Ciências Religiojas de Angola (ICRA) – Educadores Sociais e os primeiros «soluços» no estabelecimento do então Centro Cul-tural Mosaiko, como organização actuante, a partir dos «musseques» em Viana. Participei em discus-sões calorosas sobre a finalidade de uma biblioteca de referência, na Estalagem, em Viana, e as vanta-gens e desvantagens, para a missão do MOSAIKO no envolvimento para a promoção de serviços básicos, em Viana. No fim de 2011, tive o privilégio pessoal e intelectual de realizar a avaliação de 12 anos de tra-balho em colaboração com Murielle Mignot.

Desde o princípio da organização, durante a guer-ra, no período dos anos 80, o que mais marcou os esforços e a filosofia do trabalho dos missionários dominicanos foi o forte compromisso para trabalhar a dignidade humana de todos, como indivíduos, e o empenho na criação de espaços para o desenvolvi-mento da sociedade angolana, a partir do contributo informado de cada um(a), aprendendo a trabalhar em colaboração activa com os seus pares. As inter-venções primaram sempre na formação e educação dos grupos excluídos e vulneráveis da sociedade an-golana. Todavia, o que faz com que, hoje em dia, o MOSAIKO continue a ser uma organização relevante, passa pelo facto de ter aprendido e de se ter adapta-do ao contexto nacional. À medida que o contexto se transforma e que as prioridades e preocupações dos seus parceiros e beneficiários evoluem para novos

rumos e novas ambições, o MOSAIKO sabe sempre acompanhar as mudanças, procurando transformar e melhorar as suas próprias capacidades para res-ponder às necessidades dos grupos que serve.

cONtExtO dA GuErrA: os primeiros trabalhos fo-ram realizados num clima de guerra, num contexto no qual o argumento de soberania dos interesses da nação se sobrepunha em relação à defesa dos Direi-tos Humanos e, muitas vezes, o trabalho em defesa dos Direitos Humanos era percebido como uma im-posição de organizações estrangeiras sem relevância para o contexto nacional. Ouvia-se, frequentemen-te, da parte da população e dos líderes, o desabafo, «Direitos Humanos não enchem barrigas». O desa-fio para o MOSAIKO foi introduzir um discurso de Di-reitos Humanos que pudesse abrir um espaço para que a população começasse a tomar consciência que o Estado tinha uma responsabilidade inalienável para garantir os direitos fundamentais, económicos, sociais e culturais de cada individuo, incluindo o di-reito a viver em paz. Nesta fase, o Centro Cultural Mosaiko investia em formação para grupos ligados à Igreja e outros grupos na sociedade civil.

construindoos direiTos huManos na PersPecTiva do Mosaiko

Mary Daly

09

o que mais marcou os esforços e a filosofia do trabalho dos missionários Dominicanos foi o forte compromisso para trabalhar a dignidade humana de todos, como indivíduos, e o empenho na criação de espaços para o desenvolvimento da sociedade angolana, a partir do contributo informado de cada um(a), aprendendo a trabalhar em colaboração activa com os seus pares.

Page 10: Mosaiko inform17

trANSIçãO PArA uM PAíS EM PAz: no princípio da década 2000, o Centro Cultural Mosaiko começou a desenvolver uma abordagem de trabalho com Grupos Locais de Direitos Humanos. Todos os grupos apre-sentavam como ponto de partida, problemas especí-ficos de abuso de direitos que aconteciam nas res-pectivas comunidades e solicitavam apoio ao Centro para encontrar caminhos e soluções dentro da Lei. Estes grupos marcavam os primeiros passos na rea-lização dos objectivos do Mosaiko e certificavam que «trabalhar Direitos Humanos contribua para encher barrigas», assim como a defesa dos Direitos Hu-manos constitua um exercício de cidadania. Foram duas dinâmicas que influenciaram, fortemente, a relevância contínua do trabalho do Centro: primeiro, os grupos bem sucedidos, à medida que aprendiam a lidar com a lei nas formações facilitadas pelo MO-SAIKO e fossem concretizar soluções para problemas de conflitos na comunidade e na família e problemas de indevido uso de poder pelas autoridades locais, foram ganhando confiança nas suas competências e em contrapartida recebiam, cada vez mais, maior número de solicitações vindo de pessoas singulares, sobas e instituições de Estado; em segundo plano, o MOSAIKO não insistiu e nem persistiu em formar os grupos que não demonstrassem a capacidade e von-tade interna de se organizarem para prestar servi-ços às respectivas comunidades. Em consequência, a parceria entre o MOSAIKO e um Grupo Local é ba-seado num interesse mútuo. O grupo presta um ser-viço à sua comunidade. À medida que o trabalho do grupo se torna mais complexo, mais o MOSAIKO se vê forçado a melhorar os seus produtos de formação e as suas publicações para documentar os trabalhos feitos e levá-los ao público. Por outro lado, alimenta

os grupos com os materiais e formações que neces-sitam para continuar a crescer em termos de conhe-cimentos e capacidade de actuação.

cONStItuIçãO – lEI fuNdAMENtAl dO PAíS: Os deputados eleitos, em Setembro de 2008, tinham poderes constituintes. Até 2010, concluiu-se que a «lei suprema e fundamental da República de Ango-la», que apontou como objectivo «a construção de uma sociedade livre, justa, democrática e solidária, de paz, igualdade e progresso social». O MOSAIKO contribui nos debates para elaboração da Constitui-ção e contribuiu para educação e mobilização de in-teresses da população não somente através de for-mações locais mas em várias fóruns realizados ao nível nacional. No decorrer da avaliação do trabalho de MOSAIKO em 2011, foi notória a capacidade de Grupos Locais explicarem, em língua nacional, a su-premacia e legalidade da Constituição. O contexto de existir uma Lei hierárquico-normativa, ocasionou a crescente confiança dos grupos locais, abriu espa-ço para o MOSAIKO elaborar um curso de Formação Jurídica Básica que visa aumentar a capacidade dos participantes a actuarem dentro da Lei e prepararem defensores oficiosos para defender casos judiciais quando nomeados pelos juízes do Tribunal. Os pri-meiros cursos começaram em 2011 e, desde finais de 2011, os formandos são chamados a várias pro-víncias para actuarem como Defensores Oficiosos, nomeados pelo Tribunal.

PErSPEctIVAS PArA O futurO: Pessoalmente, não tenho dúvidas de que a relevância do MOSAIKO está estreitamente ligada com a relevância do trabalho feito pelos Grupos Locais. Vejo um papel diferencia-do para o MOSAIKO que presta serviços de formação, documentação e pesquisa, a uma rede de Grupos Lo-cais que se empenha em solucionar problemas con-cretos ao nível da comunidade. Esta parceria entre MOSAIKO e Grupos Locais poderá contribuir para a monitoria continua do acesso à justiça em Angola. Com base nas experiências concretas, o MOSAIKO continuará a trabalhar abordagens inovadoras de ensino de Direitos Humanos para instituições aca-démicas e instituições de Estado que actuam, direi-tamente, nesta área.

10

construindoos direiTros huManos na PersPecTiva do Mosaiko

Esta parceria entre MOSAIKO e Grupos Locais poderá contribuir para a monitoria continua do acesso à Justiça em Angola. Com base nas experiências concretas, o MOSAIKO continuará a trabalhar abordagens inovadoras de ensino de Direitos Humanos para instituições académicas e instituições de Estado que actuam, direitamente, nesta área.

Page 11: Mosaiko inform17

construindo

Que continue a inspirar cada um de nós, a fazer a sua parte e a dobrar o arco que é Angola. Vamos curvar o arco na direcção da justiça e da paz, da oportunidade e do progresso social, vamos cur-vá-lo na direcção do bem comum.Barros Manuel, colaborador do Mosaiko

Admiro muito o respeito, o carinho que existe entre nós. O respeito que temos pelo trabalho de cada um. Isso é muito bom.Faustina Navita, colaboradora do Mosaiko

O Richard mostrou-me o trabalho do MOSAIKO e deixou-me bastante orgulhoso de fazer parte, de divulgar o trabalho que o MOSAIKO faz.

E neste filme SER HUMANO a generosidade das pessoas e o exemplo delas dão-nos coragem. Foi a principal inspiração e eu acabei por fazer música para o filme, da qual também resultou um CD, e a cantar as músicas com a voz e o violão.

Temos ainda um longo caminho a percorrer, no capítulo dos Direitos Humanos, na educação cívica e em geral. Viemos de um tempo complicado de guerra, mas sinto que já podíamos ter feito mais neste sentido, e acho que nós, o MOSAIKO e os cidadãos interessados, vamos continuar a fazer o máximo para que as coisas melhorem para todos.

Paulo Flores, Músico e compositor

dePoiMenTos sobre o Trabalho do Mosaiko

11

Foi-nos solicitada uma dedicatória a favor do MOSAIKO e, apesar de a considerar uma mis-são difícil, entende-mos ser também um desafio nobre, já que se trata de uma honra merecida e justa por-que reflecte um real exemplo de incansá-

vel entrega à defesa dos Direitos Humanos durante estes longos anos de trabalho cheio de sucessos e insucessos.

A transparência da efectividade dos seus progra-mas pode ser percebida através de vários níveis de conhecimento e tomada de consciência das dife-rentes comunidades. O MOSAIKO, hoje, constitui um Instituto de referência a nível nacional, por ter criado uma rede forte de Núcleos de Direitos Huma-nos comunitários.

A palavra de ordem: «Promoção dos Direitos Hu-manos e Acesso à Justiça em Angola» permite-nos perspectivar o grande propósito do MOSAIKO em dar resposta a demandas específicas identificadas localmente e facilitando soluções que possam ser implementadas a nível local para benefício da socie-dade civil e dos cidadãos.

O trabalho desenvolvido pelo MOSAIKO tem conse-guido fazer com que as pessoas das comunidades comecem a reconhecer-se titulares, detentoras de direitos e prontas para reclama-los junto dos orga-nismos responsáveis pela aplicação da Lei.

Por todas as conquistas e desafios que se esperam concretizar, desejamos felicidades e muita prospe-ridade.

Ana Celeste Januário, Directora Nacional de Direitos Humanos

Page 12: Mosaiko inform17

12

Vejo e sinto um crescer e amadurecer, quer da Instituição como aqueles/as com quem trabalha. Oxalá aprendamos com os nossos erros a fazer melhor para o engrandecimento de Angola.

Ana Cristina Alves Cardoso, Colaboradora do Mosaiko

A primeira vez que ouvi falar do MOSAIKO foi em 2003. Encontrei o frei Zeca a caminho do lançamento do filme ‘Angola Saudades de quem te ama’. Algum tempo depois, numa viagem com o frei Zeca visitei vários Grupos Locais e aos poucos comecei a entender qual era a situação dos Direitos Humanos, o papel dos Grupos Locais e do MOSAIKO. Muito anos

depois fizemos juntos (comunidades e o pessoal do Mosaiko) o filme ‘SER HUMANO: Histórias de Direitos Humanos em Angola’.

Enquanto realizador, é um privilégio fazer parte da vida das pessoas maravilhosas que aparecem no filme. O meu desejo é que elas inspirem mais angolanos, com a mesma força com que me inspiraram. O trabalho de produzir um filme, criar um diálogo em Angola foi facilitado pelo MOSAIKO que constituiu a equipa de produção.

Uma referência especial ao Paulo Máquina que foi o assistente de produção sem nunca ter trabalhado na área. Durante toda a discussão com os freis Mário Rui, Zeca, Júlio, Luís e toda a equipa do MOSAIKO, bem como durante a edição do filme e a produção das músicas com Paulo Flores – foi lindo notar como todas as ideias e a história real em que o filme se baseia criaram um filme, fortemente, angolano.

Fui profundamente tocado pelas pessoas que encontrei com a minha câmara nas mãos. Muito obrigado a cada uma das pessoas envolvidas neste filme.

Richard Pakleppa, Cineasta

Faz um trabalho importante, porque ajuda-nos a conhece as leis, os Direitos Humanos.

Josefina Venâncio, colaboradora do Mosaiko

Que o MOSAIKO se dedique mais aos seus trabalhos, que continue sempre, e não deixe de trabalhar.

Moisés António, colaborador do Mosaiko

Os 15 anos do MOSAIKO representam a luz no fundo do túnel. Não é razão do acaso mas, sim, de muito sacrifício, dedicação e compromisso para com o próximo, acima de tudo, para com Deus em prol da edificação de um mundo melhor. MOSAIKO nunca esqueça que não importa o quão forte nos atinjam, mas sim o quanto somos felizes por salvar vidas.

Mauro Rui Calado, colaborador do Mosaiko

Trabalhar no MOSAIKO, foi uma reintegração na sociedade angolana, depois de muito tempo ausente do País, permitiu-me tomar contacto com muitas dificuldades que ainda se vivem no interior de Angola e não só...

Maria de Jesus, colaborador ado Mosaiko

Trabalho no MOSAIKO há 10 anos. Para mim, constitui uma escola para a vida, um lugar de aprendizagem contínua, de intervenção social. É verdade que a formação do curso médio de Educadores Sociais, no ICRA, deu-me um pouco desta visão humana. Mas com o MOSAIKO, com o trabalho concreto em Direitos Humanos, trabalhar com as pessoas e despertar nelas o interesse e consciência pelos seus direitos e deveres junto das instituições, é um sentimento que podemos considerar como sendo nobre e único.

Ao MOSAIKO quero dizer que tem estado a trilhar um caminho que não tem sido fácil, porque trabalhar com Direitos Humanos de forma expressa é um trabalho que podemos considerar complexo. Felizmente, o MOSAIKO nunca baixou a cabeça, nem os braços, nos momentos piores do seu percurso, sempre se manteve persistente e os 15 anos do seu trabalho demonstram claramente o sentido de persistência, os rastos que deixou ao longo desse tempo.

Paulo Máquina, colaborador do Mosaiko

Page 13: Mosaiko inform17

O Mosaiko | Instituto para a Cidadania é uma organização da sociedade civil que vela pela promoção dos Direitos Humanos em Angola. no passado mês de Setembro, celebrou 15 anos de existência marcados com uma série de actividades, das quais se destacaram o lançamento do filme ser huMano: histórias de direitos humanos em angola, realizado por Richard Pakle-ppa com música de Paulo Flores. O docu-mentário com histórias reais, foi produ-zido com o apoio da CORDAID, TROCAIRE, Embaixada da Holanda em Angola, OSISA e MISEREOR, espelhando a coragem e a determinação das pessoas que vão trans-formando Angola num país melhor.

O frei Mário Rui recorda como tudo come-çou e como foi avançando até aos dias de hoje, em que cidadãos das várias provín-cias angolanas já aprenderam a fazer valer os seus direitos e os direitos dos outros.

o Mosaiko foi criado em 1997. o que esteve na base da sua criação? como era o contexto político-social na altura?

Apesar de só ter sido criado nos anos 90, o sonho do projecto que viria a dar origem ao Mosaiko, é dos anos 80. Os Domi-nicanos chegaram a Angola em 1982, assumindo a paróquia do Waku Kungo. A Igreja, durante o regime monopartidário não podia ter um papel social relevante, não podendo, por exemplo, assumir a direcção de escolas ou postos de saúde reconhecidos pelo Estado. Apesar dessas limitações, que tentavam empurrar a acção dos cristãos apenas

entrevistaFrei Mário rui, oP

Hermenegildo Teotónio

FREI MáRIO RuI MARçAL, CO-FunDADOR E MEMbRO DA DIRECçãO DO Mosaiko | InSTITuTO PARA A CIDADAnIA, Dá uMA EnTREvISTA ExCLuSIvA AO MOSAIkO InFORM, nO âMbITO DAS COMEMORAçõES DOS 15 AnOS DA InSTITuIçãO AnGOLAnA.

“Esta experiência suscitou e alimen-tou o desejo de que os Missionários Dominicanos criassem um Centro - marcado pelo estudo e a ligação à vida das comunidades - que per-mitisse desenvolver uma forma de evangelização tocasse em todos os domínios da vida e não ficasse apenas fechada na prática religiosa.”

13

Page 14: Mosaiko inform17

para a esfera estritamente religiosa, os missionários Dominicanos deram também uma grande atenção à promoção humana. Quase todas as comunidades cris-tãs - que se espalhavam, numa zona muito vasta com cerca de 80 km de diâmetro - possuíam alfabetizado-res, promotores de saúde, responsáveis pela promo-ção da mulher e um sistema de governo baseado no ondjango, onde participavam casais e não apenas os homens, havendo um grande esforço para as pessoas participassem na vida das suas comunidades.

Esta experiência suscitou e alimentou o desejo de que os Missionários Dominicanos criassem um Centro - marcado pelo estudo e a ligação à vida das comu-nidades - que permitisse desenvolver uma forma de evangelização tocasse em todos os domínios da vida e não ficasse apenas fechada na prática religiosa.

uma ideia a concretizar quando fosse possível e opor-tuno…

Sim. O MOSAIKO acaba por corporizar esta e outras ideias que faziam parte desse sonho antigo. Desde 1995, foi possível começar a esboçar os contornos concretos deste sonho e a criar as condições para que se tornasse realidade, o que veio a acontecer em Setembro de 1997, quando foi possível que alguns ir-mãos dominicanos se dedicassem a um projecto que procurava começar a pensar em criar condições para que algumas causas da guerra fossem revertidas, no-meadamente a falta de respeito pela dignidade das pessoas. Apesar de algumas intervenções corajosas dos Bispos da CEAST, a Igreja mantinha uma prática predominantemente assistencialista, centrada em curar as feridas da guerra e em rezar pela paz.

Quais as maiores dificuldades que então se viviam?

Para podermos ter uma ideia das dificuldades do con-texto de então, devo referir que houve algumas pes-soas que, com muita amizade e sinceridade, nos dis-seram: «É melhor não falarem de Direitos Humanos, talvez seja melhor abordarem apenas Educação Moral ou Cívica», ou algo mais neutro que não levante mui-tos problemas. Mas apesar disso, consideramos que, acima de tudo, era importante que as pessoas pudes-sem compreender que, ao contrário do que se pensava na altura (e nalguns meios ainda hoje...), os Direitos

Humanos não foram criados por um país para impor ideias aos outros, nem eram contra o Governo, mas ti-nham a ver com o respeito devido à dignidade de cada pessoa, pelo facto de ser uma pessoa humana. Creio que essa foi uma grande descoberta que se foi fazen-do em muitos dos Grupos Locais de Direitos Humanos (GLDH), os quais foram surgindo ao longo destes anos, dinamizando processos de transformação positiva nos seus contextos locais. Ora, juntando estes pequenos grãos de areia, vamos transformando o rosto da socie-dade angolana, embora muitas vezes haja pouco co-nhecimento destas actividades ao nível dos meios de comunicação social e da informação em geral.

o que representam estes 15 anos para o Mosaiko?

Representa um longo caminho. Um caminho em que o MOSAIKO foi crescendo, mas também a noção de Direitos Humanos e de Cidadania, foi evoluindo na sociedade angolana, tal como hoje se pode verificar. São noções que já vão entrando no nosso vocabulá-rio corrente e, se recuarmos no tempo até há 15 anos atrás, eram expressões praticamente inexistentes ou que tidas como expressões tabu sobre as quais era melhor não falar. De facto, ao longo destes 15 anos, tivemos a oportunidade de acompanhar a evolução da sociedade angolana e, ao mesmo tempo, contribuir para que estas mudanças fossem acontecendo com a colaboração de inúmeras pessoas e instituições.

na altura, o contexto era muito difícil. e hoje, com que desafios se depara o Mosaiko?

Muitos dos desafios da altura em que começamos continuam presentes na sociedade de hoje. é verdade que houve progressos realizados na nossa sociedade. O fim do conflito armado constitui uma grande vira-gem no trabalho pela promoção dos Direitos Huma-nos e, com ele, uma maior abertura do espaço público do ponto de vista da participação dos cidadãos.

Hoje, os conceitos de Cidadania e Direitos Humanos já entram nos discursos sociais e políticos, a Secreta-ria de Estados dos Direitos Humanos tem muito mais visibilidade no Executivo, e tudo isso é muito bom. Mas o grande desafio coloca-se na aplicação práti-ca. A apropriação do discurso é um passo, mas ainda somos chamados e desafiados a fazer com que es-

entrevistaFrei Mário rui, oP

14

Page 15: Mosaiko inform17

tes discursos não fiquem na teoria, que se traduzam na vida concreta dos cidadãos e das instituições.

Outro desafio de hoje é a partidarização do discurso dos Direitos Humanos. Ainda é notório, nalguns círcu-los, a acusação de que uma organização que trabalha para os Direitos Humanos está “do outro lado do muro”, como se existisse apenas para acusar e criticar.

Face a estas situações de acusação, qual tem sido a abordagem do Mosaiko?

O MOSAIKO tem tentado cultivar, ao longo destes anos, a convicção de que o País se (re)constrói com o esforço de todos e com o contributo de cada um(a). Procuramos estimular iniciativas para encorajar as comunidades e os grupos a terem presente esta ideia: o País é nosso e ele faz-se com o contributo de todos, não apenas de alguns... Continua a ser um desafio falar de Direitos Humanos, porque ao evocar um di-reito reconhecemos que ao direito de “alguém” cor-responde o dever de outro “alguém”, seja este um(a) cidadã(o), uma instituição ou o próprio Estado.

Há o risco de pretender que o discurso ou a lei muda a realidade... De facto, temos um longo caminho a per-correr para desenvolver práticas e mecanismos que garantam o respeito pelos Direitos Humanos. Esta tem sido uma das linhas de acção do Mosaiko: não es-tamos contra pessoas ou instituições, mas queremos ajudar a que façam bem o seu trabalho, cumprindo o que devem para que os direitos dos outros (e também os seus) sejam respeitados.

como sobrevivem as instituições como o Mosaiko?

Para continuar e melhorar o seu trabalho, o MOSAI-KO e outras instituições similares - que não têm fins lucrativos e trabalham principalmente com pessoas, grupos e instituições que não têm capacidade para suportar os custos dos serviços que lhes são presta-dos - têm de procurar financiar o seu trabalho através de da elaboração e implementação de projectos. Con-tudo, com a crise económica internacional e a con-solidação da paz, o volume de financiamento deste tipo de trabalho em Angola tende a diminuir conside-ravelmente. Por isso, tal como já acontece em mui-tos países, os critérios de acesso aos fundos públicos pelas organizações da sociedade civil deveriam ser

transparentes, assim como a fiscalização sobre a sua aplicação e a respectiva prestação de contas.

Mas obviamente que o financiamento de projectos não é suficiente e, tanto o Mosaiko como outras orga-nizações similares, precisam de vários tipos de apoio, com destaque para as competências das pessoas e os recursos financeiros. As pessoas que o desejarem po-dem contribuir (pontualmente ou de forma mais re-gular) com as suas competências profissionais e hu-manas através de sessões de formação, assessorias, artigos, conferências, etc. que apoiem o trabalho ou reforcem as capacidades do Mosaiko. Embora a nos-sa sociedade ainda não esteja sensibilizada para ac-ções deste tipo, pequenas contribuições financeiras podem fazer um grande diferença - por exemplo, se conseguirmos que mil pessoas doem 1.000 AKZ por mês ou 10.000 AKZ por ano - isto permitiria manter a continuidade dos programas de acção entre projec-tos... Por outro lado, as pessoas que fazem doações têm direito a saber como os fundos obtidos são apli-cados e, pelo menos no caso do Mosaiko, as contas são anualmente sujeitas a auditoria externa. A esse respeito gostaria de agradecer aos que, de uma for-ma ou de outra, contribuíram para que o MOSAIKO chegasse até hoje e se mantivesse até hoje, abrindo perspectivas de continuidade para o futuro, apesar de todos os constrangimentos. Ao celebrar os 15 anos do Mosaiko, gostaria de destacar e agradecer a colabo-ração especial do Paulo Flores - e da sua equipa - que além de ter aceite produzir a banda sonora do filme SER HUMANO: Histórias de Direitos Hu-

entrevistaFrei Mário rui, oP

15

Page 16: Mosaiko inform17

manos em Angola, aceitou apoiar o MOSAIKO com a gravação de um CD acústico e a realização de alguns concertos, sem quaisquer contrapartidas financei-ras. Este agradecimento sincero é também extensi-vo a todos os colaboradores do MOSAIKO, os Grupos Locais de Direitos Humanos e a todas as instituições que, de longe e de perto, têm tornado possível o nos-so trabalho.

na celebração dos 15 anos, o Mosaiko procedeu ao lançamento do filme ser huMano. o que é que este filme nos trás de novo?

O que pode ser mais “novo” para as pessoas é desco-brir como, fora daquilo que é o discurso habitual, há muitas coisas que estão a mudar em Angola e que são protagonizadas por pessoas que, muitas vezes, pen-samos que não têm uma palavra a dizer ou que não são importantes.

Nós temos a noção clara que a dignidade das pessoas passa pelo reconhecimento do direito que têm à pala-vra e do dever de participar – o que, aliás, vem do Evan-gelho. Não podemos desenvolver o País só com elites, vindas não sei de onde. Temos de desenvolver o País com as pessoas que somos, com o Povo que somos, e creio que o filme ajuda a perceber que têm voz não só as pessoas que se destacam sob o ponto de vista aca-démico, económico, social ou político. Essas pessoas simples são muito importantes na transformação e no desenvolvimento humano da nossa sociedade. E creio que a descoberta dessa Angola esquecida, mui-tas vezes oculta aos nossos “olhos mediáticos”, é fun-

damental para um país que vive, principalmente, da transformação das pessoas e não só da transforma-ção das infra-estruturas, que também é, obviamen-te, necessária. Creio e espero que o filme possa ser inspirador, quer para os decisores públicos, para que tenham mais em conta a capacidade de participação, de intervenção de desenvolvimento das pessoas que, muitas vezes, não são consideradas nas tomadas de decisão; quer para os próprios cidadãos, para que digam: “Afinal, nós também poderíamos fazer algo se nos organizássemos, se procurássemos conhecer melhor os nossos direitos, se tivéssemos uma atitude mais participativa e construtiva”.

Para terminar, olhando para a realidade de angola de hoje, quais são as perspectivas de trabalho que o Mo-saiko tem?

O MOSAIKO tem vários desafios. Um dos que me pare-ce mais importante e que gostaria de partilhar é a con-solidação da experiência até aqui adquirida. Foram 15 anos de trabalho árduo e de caminho que precisamos de manter como memória viva e criativa, inspiradora para o futuro. Um segundo desafio passa por procurar crescer, para não ficarmos estáticos no caminho, que-rermos avançar. A este nível, temos de destacar a ne-cessidade de crescimento/aprofundamento em algu-mas áreas-chave. Uma delas é, por exemplo, podermos desenvolver mais – necessariamente em colaboração e com o apoio de outras instituições –, todo o trabalho que já iniciamos na formação de membros dos Grupos Locais de Direitos Humanos que, nas zonas onde não há advogados, podem ser nomeados pelos juízes como defensores oficiosos. Esperamos, pois, poder melho-rar e trabalhar mais e melhor esse aspecto.

o que mais pode mudar e melhorar?…

Tudo! Podemos melhorar no trabalho que vimos desen-volvendo, mas também precisamos de melhorar muito no envolvimento das pessoas, das instituições e da so-ciedade angolana neste tipo de trabalho. é importante encontrar novos caminhos para que quem não traba-lha directamente no Mosako possa contribuir - com o seu saber, com o seu tempo, com algum apoio finan-ceiro ou de outra maneira - neste trabalho que é uma forma de construímos juntos uma Angola melhor!

“Temos de desenvolver o País com as pessoas que somos, com o Povo que somos, e creio que o filme ajuda a perceber que têm voz não só as pessoas que se destacam sob o ponto de vista académico, económico, social ou político. Essas pessoas simples são muito importantes na transformação e no desenvolvimento humano da nossa sociedade.”

16

entrevistaFrei Mário rui, oP

Page 17: Mosaiko inform17

Costuma-se dizer que «ninguém nasce ensinado». Ou seja, todos temos de aprender e de apreender tudo aquilo que somos. Muito se estuda na escola quando há a possibilidade de a frequentar, mas muito se aprende, também, na família e na convivência com os outros. Contudo, existem aspectos da vida que geralmente não se aprendem na escola. Esse é o caso dos Direitos Humanos. Mesmo que todas as crianças angolanas frequentassem a escola – o que, infelizmente, não é verdade –, a maioria (senão todos) nunca ouviria falar de Direitos Humanos e, menos ainda, da dignidade da pessoa humana.

Por isso, existem no País organizações que se dedicam a abordar estes assuntos novos e raros para a maioria da população. «Ninguém nasce ensinado», quer dizer, neste caso, que ninguém nasce com a ideia de «dignidade da pessoa humana». Esta, na história da Humanidade, é uma ideia muito nova, que levou (e leva) muito tempo a entrar nas cabeças – sobretudo,

no coração das pessoas. Ou seja: tarda em se converter numa convicção.

Aceitar a dignidade da pessoa humana como uma ideia, um princípio pelo qual devo orientar a minha vida, significa muito. Significa que eu acredito, e acei-to, que todos os seres humanos só pelo facto de nas-cerem, neste mundo, são iguais perante os direitos e a lei – neste caso, do meu país. Ninguém pode ser posto de lado, porque é deficiente, porque veio do Sul ou do Norte, porque não é do meu agrado, ou até per-tence a outra etnia ou cor. Logo aí, começa a necessi-dade de aceitar todos.

Dignidade da pessoa humana é respeitar os outros nas suas ideias, nas suas crenças. é perceber que se eu luto por um lugar, no mundo, e os outros têm tam-bém direito a estar neste mundo. Se eu tenho direito a ter uma lavra, uma propriedade privada para mim, tenho de respeitar a lavra do outro e não a invadir. Respeitar a dignidade do ser humano é saber que, se eu estou numa situação de superioridade, quando por exemplo conduzo um veículo, tenho de respeitar aquele que vai a pé, e é mais vulnerável na estrada. Para tal, se inventaram as passagens de peões nas cidades. Mas, quantos as respeitam? São, portanto, muitos os exemplos que se podem dar quando se co-meça a falar do respeito da dignidade da pessoa hu-mana na vida em sociedade.

Ora acontece que, numa sociedade, nem todos estão de acordo com o respeito ou com o modo de respeitar a dignidade do seu semelhante. Alguns, consideram até que não têm nada a respeitar. Têm de se afirmar, e ponto final, com ou sem consequências. Por estas e outras razões, a Humanidade acabou por orga-nizar um «regulamento» com vista a meter um

Aceitar a dignidade da pessoa humana como uma ideia, um princípio pelo qual devo orientar a minha vida, significa muito. Significa que eu acredito, e aceito, que todos os homens só pelo facto de nascerem, neste mundo, são iguais perante os direitos e a lei – neste caso, do meu país. Ninguém pode ser posto de lado, porque é deficiente, porque veio do Sul ou do Norte, porque não é do meu agrado, ou até pertence a outra etnia e cor. Logo aí, começa a necessidade de aceitar todos.

reflectindoaPrender a ser cidadão

Luís de França, op

dignidade da Pessoa huMana é o resPeiTo Pelas ideias e crenças dos ouTros. se eu luTo Por uM lugar no Mundo, os ouTros TaMbéM TêM esse direiTo.

17

Page 18: Mosaiko inform17

18

pouco de ordem nas relações entre os homens e as mulheres que vivem nas sociedades. Esse «regula-mento», fruto de muitos séculos de lutas e buscas de homens e mulheres de boa vontade, acabou por se concretizar na chamada Declaração Universal dos Direitos Humanos. Foi aprovada, como se sabe, há pouco mais de 60 anos. é, pois, muito nova na História da Humanidade e, por isso, ainda tantos, e tantas, nunca ouviram falar desta carta de prin-cípios.

O MOSAIKO | Instituto para a Cidadania, fundado há 15 anos, em Angola, escolheu como campo de trabalho dar a conhecer às populações do País os direitos aprovados nessa Declaração. E o primeiro passo na aprendizagem é fazer descobrir que, se todo o homem e mulher, deve ser respeitado na sua dignidade, ele tem direitos. O direito, numa primei-ra compreensão, quer dizer que eu posso exigir dos outros que me respeitem. Mas, como a vida é muito complexa, isso não chega. Preciso descobrir, nas si-tuações concretas da vida, como é que os direitos se descortinam, se aprendem, se defendem e se promovem em todas as situações da vida.

Esse é o trabalho pedagógico que o MOSAIKO rea-liza, ao longo dos anos, sobretudo através dos seus seminários de formação. Aí as pessoas, ouvem fa-lar de realidades que nem a escola, nem a família, e muitas vezes nem as igrejas, lhes falaram. Por outro lado, o facto deste trabalho dos seminários ser feito em comum, provoca por efeitos da chamada dinâmi-ca de grupo, um reforço de adesão aos princípios aí apresentados e logo um reforço das convicções. Se os

outros pensam assim, e aceitam, também eu posso aceitar. Esta é uma das vantagens da aprendizagem em grupo, e que tem efeitos que nenhuma catequese individual ou programa de televisão pode transmitir. O trabalho de formação é completado com a publica-ção e divulgação de muita informação escrita sobre as temáticas à volta dos Direitos Humanos. Assim, muitos cidadãos angolanos, quer através da leitura, quer através da aprendizagem em formação conjun-ta, e até quer através da audição destes assuntos em programas de rádio, vão-se familiarizando com os Di-reitos Humanos como parte da vida comum em so-ciedade.

Os valores da cidadania, que se apoiam na prática dos Direitos Humanos, em geral, vão-se assim sedimen-tando na sociedade até se tornarem prática habitual da maioria da população. E, no dia em que todos os Angolanos se souberem respeitar, já não será preciso haver institutos para a cidadania, porque toda a so-ciedade se transformou em sociedade-cidadã.

Todos temos de aprender e de apreender tudo aquilo que somos. Muito se estuda na escola quando há a possibilidade de a frequentar, mas muito se aprende, também, na família e na convivência com os outros. Contudo, existem aspectos da vida que geralmente não se aprendem na escola. Esse é o caso dos Direitos Humanos.

Page 19: Mosaiko inform17

Todos têm o direito de serem ouvidos e de participar em das decisões que afectam a sua comunidade. Este direito está consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e totalmente integrado no direito internacional, especialmente no artigo 25º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

Ao longo do século passado, fizemos progressos inegáveis no caminho da inclusão. No entanto, mui-tos grupos e pessoas enfrentam muitos obstáculos. As mulheres têm o direito de votar em quase toda parte, mas permanecem extremamente sub-repre-sentadas nos parlamentos e processos de paz, em cargos do governo e salas de reuniões corporativas e em outros lugares de decisão.

Povos indígenas frequentemente são vítimas de dis-criminação que lhes nega a oportunidade de fazer pleno uso dos seus direitos garantidos ou que não leva em conta suas circunstâncias. Minorias étnicas e religiosas – bem como pessoas com deficiência ou com uma orientação sexual ou opinião política dife-rente – são muitas vezes impedidas de tomar parte em instituições-chave e processos. Instituições e o discurso público precisam representar as socieda-des em toda a sua diversidade.

De modo mais geral, em várias partes do mundo, temos visto ameaças alarmantes para os ganhos duramente conquistados durante a governação de-mocrática. Em alguns países, grupos da sociedade

“A minha voz conta”MensageM do secreTário-geral das nações unidas Para o dia dos direiTos huManos - 10 dezeMbro 2012

civil enfrentam crescentes pressões e restrições. Legislações foram introduzidas visando especifica-mente as organizações da sociedade civil e tornan-do quase impossível para elas agirem. “Campeões da democracia” têm encontrado novas medidas de confronto. Devemos todos ser incomodados por este retrocesso.

Mesmo nas sociedades com um bom histórico, há espaço para melhorias. Nenhum país conseguiu ga-rantir que todos os seus habitantes sejam capazes de participar plenamente na vida pública, incluindo o direito de ser eleito para um cargo público e de ter igual acesso aos serviços públicos. Promulgar novos direitos ou remover leis injustas nem sempre é su-ficiente. Muitas vezes, a discriminação persiste na prática, criando barreiras e mentalidades que po-dem ser difíceis de superar.

Grupos da sociedade civil vibrantes estão entre as chaves para o bem-estar e o funcionamento de qualquer nação, e as Nações Unidas deploram me-didas tomadas para reprimi-los. Por isso, neste Dia de Direitos Humanos, as Nações Unidas destacam o direito de participar e os direitos associados que tornam possível a liberdade de expressão e de opi-nião, bem como de reunião e associação pacíficas.

A lei internacional é clara: não importa quem és, ou onde vives, a tua voz conta! Neste dia, vamos unir- -nos para defender o teu direito de ser ouvido.

www.mosaiko.op.org

Mulherguia PaRaEncontRosDE FoRmação

NOVA PublIcAçãOAdquira já!direitos humanos da

19

Page 20: Mosaiko inform17

20

breves

A convite da Di-recção Pedagógica do Instituto Médio Normal de Educa-ção (IMNE – Maris-ta), na pessoa do Irmão António da Silva, o MOSAIKO orientou um Semi-nário sobre Direi-tos Humanos, que

decorreu de 10 a 14 de Dezembro, nas instalações da referida instituição escolar.

A formação teve como objectivo “capacitar os futu-ros professores para terem uma pedagogia de ensino que tenha em atenção a educação para cidadania”.

Fizeram-se presentes 47 participantes (27 homens e 20 mulheres). De referir que, os participantes no se-minário, representavam diferentes cursos, nomeada-mente: Língua Portuguesa, Educação Moral e Cívica, Matemática-Física e Pré-escolar.

Durante os cinco dias houve uma grande participação dos jovens no debate dos temas abordados: «Cidada-nia e Declaração Universal dos Direitos Humanos»; «Direitos Fundamentais à luz da Constituição da Re-pública de Angola»; «Direitos Civis e Políticos»; «Di-reitos Económicos Sociais e Culturais»; «Instituições Defensoras dos Direitos Humanos em Angola».

A facilitação do seminário esteve a cargo de uma equipa do MOSAIKO constituída por Lima de Oliveira (Jurista/ Formador) e Tresor Lundoloka (Monitor em Direitos Humanos).

MOSAIKO fAcIlItA fOrMAçãO SObrE dIrEItOS huMANOS AOS EStudANtES fINAlIStAS dO ENSINO MédIO