mosaicoprimevo abilio pacheco

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    Abilio Pacheco, nasceu em

    Juazeiro (BA), viveu a primeira

    infncia em Coroat (MA), dos 07

    aos 27 morou em Marab, e hoje

    reside em Belm (PA). Estudou

    Eletricidade no SENAI-Marab,

    fez Magistrio na Escola Estadual

    Dr. Gaspar Vianna, cursou

    Licenciatura Plena em Letras na

    UFPA-Marab e Mestrado em

    Letras Estudos Literrios na

    UFPA-Belm. Trabalhou como

    eletricista, foi bibliotecrio por

    cinco anos e h dez atua no

    magistrio. H quatro anos

    leciona no Centro Federal de

    Educao Tecnolgica do Par,

    onde atualmente coordena o

    Curso de Letras. Aos 17 anos

    obteve o primeiro destaque em

    certames literrios com o poema

    Elegia de Maria. Publicou

    Poemia (poesia) em formato

    semiartesanal em 1998. Escrevetambm contos e crnicas, e est

    com uma idia de narrativa longa

    em gestao.

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    mosaico primevo

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    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Fundao Cultural do Par Tancredo Neves

    ______________________________________________________

    P116m Pacheco, Abilio

    Mosaico primevo / Abilio Pacheco. Belm: Edio doautor, 2008.53p.

    ISBN: 978-85-908905-0-8

    1. Poesia Paraense. 2. Literatura Paraense. I. Ttulo.

    CDU: 869.0 (811.5-1)_______________________________________________________

    mosaico primevo by abilio pacheco

    Projeto grco, editorao eletrnica e capaElizabete N. R. Lopes

    Desenho da capaRosineide Lourinho

    Fotograa da capa: Mosaico de uma praa de BraganaAbilio Pacheco

    RevisoAbilio Pacheco

    Impresso e acabamentoGrca da UFPA

    Todos os direitos reservados.Proibida a reproduo total ou parcial

    desta obra sem autorizao por escrito do autor.

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    abilio pacheco

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    No tenho certeza se uso comum ou vulgar escrever algoao leitor nos dias de hoje, mas o fao pois assim desejo, ecomeo lembrando oprlogo de Gonalves Dias aos seus PrimeirosCantos, especialmente porque gosto desse vate que de um modoou de outro me conterrneo, segundo porque senti vrias vezeso desejo de pr no ttulo de meu livro uma espcie de parfraseao ttulo do primeiro livro dele, s no o z porque descobri

    que outro autor de Marab fez o mesmo, e terceiro porque noprlogo h algo muito importante para os versos deste livro: elesforam compostos em pocas diversas debaixo de cu diverso e sob a inuncia de impresses momentneas, por isso notm unidade de pensamento entre si, alm disso, certo queesses poemas escrevi para mim e que carei feliz se algum seagradar deles, mas se no se agradarem... sempre certo que tiveo prazer de ter composto.

    Disse para algumas pessoas prximas que estava reunindo ospoemas que escrevi desde os 15 ou 16 anos at hoje com a intenode publicar alguns deles: os melhores eu iria guardar e os pioresseriam publicados. imperioso que eu acrescente exatamente isto:so poemas de qualidade literria oscilante; provvel que algumleitor crtico escolha um ou outro para sua antologia pessoal, mastambm provvel que esse mesmo leitor se chateie por ler cincoou dez poemas pssimos. As pessoas que me so mais prximas(e que conhecem um pouco da minha verve crtica) devem seperguntar o porqu de alguns poemas to ruins estarem nestapublicao. A estes e aos leitores crticos respondo que algunsfazem parte de minha histria pessoal como (pretenso) escritor evou dar apenas um exemplo.

    O poemaElegia de Maria, alm de ter sido musicalizado pelo amigoPaulo Cardoso (de Marab), o que confere (e conferiu) ao texto

    uma outra interpretao nesse caso ampliada do texto, foi

    ao leitor, leitora,

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    o primeiro poema com que obtive algum destaque em certamesliterrios. Com ele quei em 1 lugar no concurso nacional depoemas Irene Santini, organizado pela Casa do Poeta Brasileiro

    de Praia Grande, litoral de So Paulo, quando tinha 17 anos. Sehoje o poema no me agrada (pelo menos no tanto quanto napoca) e desejo no mais v-lo ou l-lo, nem por isso devo exclu-lo, assim como no posso tirar do leitor o benefcio da dvida e oprazer do julgamento.

    No m deste volume, resolvi pr uma segunda edio doPOEMIA, que em 1998 publiquei 300 exemplares em forma delivro semiartesanal, ou seja, z capa em cartolina cortada em A4, omiolo em folha de papel sulte e z toda a tiragem em impressorajato de tinta para depois (eu mesmo) grampear e vender.

    Muito gostaria ainda de conversar sobre os poemas que seguem,mas cada linha que escrevo aqui para voc ler um tempo que lhefurto e que voc poderia usar para ler logo-de-uma-vez os textosou quem sabe fazer algo de til e importante. Anal, o soldoira sem literatura.

    Abilio Pacheco

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    Mosaico primevo traz-nos poemas que interrogam sobretudo apalavra potica (minha palavra a minha busca / de umavida inteira, em todo mundo / e ela dorme encantada sombra),a memria afetiva e a paisagem urbana. A cidade, como na poesiade Baudelaire e de Age de Carvalho, interpelada em poemascomo Noturno: H noite em mim! H noite em ti, Cidade/ E nesta noite imensa Solido / Que desliza pelo meu corpo

    em vo / Enquanto a tua poesia me invade., fazendo do eulrico um novo neur, sempre a errar, brio de luz, pelas ruas(Deambulo em trapos pelas ruas...)

    O tempo outro tema importante deMosaico primevo leiam-sepoemas como Dezembros, Rquiem ao tempo presente eRquiem for Rmulo No primeiro texto citado, a passagemdo tempo reveste-se de uma suave melancolia, na interrogaoda existncia humana e sua relao constitutiva com a fugacidade

    das horas: Quando Dezembro chegar / Estarei na face fria /Do mesmo espelho que h anos / A rir de mim para mim / Vemsempre me revelar / O que o tempo vem esculpindo / Em meusrosto dezembral.

    No plano da linguagem, h trechos que nos apresentam achadosimagticos, sem os quais no se alcana a poesia noturna emelanclica de Mosaico primevo. no trtaro do tinteiro / o sono

    das trevosas Frias.; A morte uiva no cio / faminta noitefria; o crdio relgio da vida; Um dia, ave liberta em nuvens/ colorindo o brilho silente;. O plano imagtico, contudo, nofaz seno ressaltar a interrogao do humano, sua fragilidade, suaangstia diante do tempo e da morte, o amor e a ausncia dele.Sem tal indagao, no que no se seja poeta, no se homem,a falta que ama de que nos fala Drummond.

    Associados a essa busca pela imagem, tm-se experimentos que

    evocam a tradio concretista e sua tentativa de abandonar o

    prefcio

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    mosaico primevo 8 abilio pacheco

    verso tradicional por uma poesia verbivocovisual, como se vem Epigramagrrio e Epigramalone. No falta, ainda, umapotica, que Escritura: Tecer versos , por fora, fazer

    sulcos em penedos, / Singrar as pedras todas do mar de si aoavesso, / Derramar suores em gotas no fero vigor do remo. [...] navegar por entre as rochas / E extrair exangues lascas verges por dentro e por fora. Nessa potica vibra um otimismopelo poder de o verbo potico proporcionar, ao leitor, umadesmineralizao das horas: Para que tu, s tu possas sugaro cerne dos versos / Acumulados em poas pelos teus olharesttricos / Que desmineram as horas e se desmentem eternos.

    Assim, o Mosaico primevo, montado pela argcia e pelo labor deAbilio Pacheco, incita-nos, pela beleza imagtica, a reavivar nossointeresse pela poesia, dimenso verbal interrogante por excelncia,e pela vida.

    Prof. Slvio Holanda

    (Professor de Literatura Portuguesa da UFPA)

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    mosaico primevo

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    epigramagrrio

    a p lavra em terrao sono.

    a palavra em terrao sonho.

    a palavra enterrao nome.

    a p lavra, enterrao homem.

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    mosaico primevo 12 abilio pacheco

    No Prelo

    Se a minha palavra a minha busca

    de uma vida inteira, em todo mundo

    e ela dorme encantada sombra

    de um livro raro, quiencontr-la-ei num alfarrbio,

    num sebo, numa biblioteca pblica...

    Quem sabe minha resposta ainda

    esteja no prelo.

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    mosaico primevo 13 abilio pacheco

    Ernias

    Fatigado escrevo em transe

    imerso em denso sono,

    entre alaridos e vozes

    e sob luzes vertiginantes.

    Escrevo, mas s no basta!

    Garatujo! Esgaravato

    no trtaro do tinteiro

    o sono das trevosas Frias.

    Tremo e temo, porm teimo.

    Que perigos reservados

    para quem avana em vo

    na tarefa de acord-las?

    Entretanto, insisto: escrevo!

    E elas, por meus esgaravos

    soltam gritos ensurdantes

    uivando injrias infames.

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    mosaico primevo 14 abilio pacheco

    Aborrecidas e em garras

    levantam-se as justiceirasavanam-me sem retardo

    e roubam-me de toda voz.

    Tento ainda um verso toa

    mas, de mim despertas, dizem

    que nenhum mortal como eu

    tem direito de invoc-las.

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    mosaico primevo 15 abilio pacheco

    Escritura

    A Eliton Moreira e Ademir Braz

    Tecer versos , por fora, fazer sulcos em penedos,

    Singrar as pedras todas do mar de si ao avesso,

    Derramar suores em gotas no fero vigor do remo.

    ferir, quilha da fragata, as artrias espumosas

    Das altas internas vagas. navegar por entre as rochasE extrair exangues lascas verges por dentro e por fora.

    talhar a cerrados pulsos as pedras nas, mas duras.

    E lapidar relevos pulcros em fendas pouco profundas.

    um rduo trabalho infruto, que s lega palmas sujas.

    Mas preciso faz-lo! Algum deve abrir as ostras

    Abismadas em seu peito para junt-las a outras

    Iguais na casca e no meio, mesmo que estejam ocas.

    Por m: crer que vale a pena mineralizar as lavras

    Como fulcros ao poema e inertes todas deix-las

    Inativas pelas fendas palavras amortalhadas.

    Para que tu, s tu possas sugar o cerne dos versos

    Acumulados em poas pelos teus olhares ttricos

    Que desmineram as horas e se desmentem eternos.

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    mosaico primevo 16 abilio pacheco

    Tessitura Noturna

    A Joo Cabral de Melo Neto

    Um latido apenas

    no protege a rua

    ele precisar sempre

    que os ces o apanheme o lancem a outros ces

    e a outros latidos

    tal que somados todos

    (latidos e ces) na noite

    formem (no arca-

    bouo da matilha)uma redoma protetora

    em torno da rua.

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    mosaico primevo 17 abilio pacheco

    Brevssimo Ensaio sobre a Cegueira

    A Jose Saramago

    Am I blind?

    Vejo, (enx) ergo sum

    meu olho, se nego

    (c)ego

    !

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    mosaico primevo 18 abilio pacheco

    Retrato II

    A Ceclia Meireles

    Eu tambm no tinha este rosto

    assim tenso, assim denso, assim calvo,

    nem olheiras e rugas

    nem cabelos alvos.

    Eu no tinha estes olhos de agora

    to rubros, to turvos, to vagos,

    nem esta mo incerta,

    nem dedos fracos.

    Mal venho notando esta mudana

    que lenta, constante e suave

    do espelho vem desbotando

    a minha face.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 19 abilio pacheco

    O largo (do) buraco da Palmeiranunca mais pelos [telhados] da palmeira

    que recendiam a po

    Age de Carvalho

    I

    Da Palmeira, no tenho lembrana

    e onde havia um grande buraco,

    agora existe um Largo.

    II

    Antes, o buraco da Palmeiras,

    Antes ainda, a Fbrica de biscoitos,

    Antes mais antes ainda,

    os caboclos tiravam aas das palmeiras,Antes mais antes que antes,

    os jesutas rezavam missas sob as palmeiras,

    Antes mais antes que antes-antes,

    os ndios espreitavam as onas por trs das palmeiras.

    III

    Hoje, no h ndios, jesutas, caboclos,

    aas ou biscoitos ou mesmo a Fbrica.

    S o buraco.

    Um buraco (de) concreto,

    em que as palmeiras se queixam da falta de vento.

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    mosaico primevo 20 abilio pacheco

    IV

    Na belle poque de Belm,

    os telhados recendiam a po.

    Na belle poque da casa de po,

    os telhados recendiam...

    ah! po!

    VVagarei pela inexistncia da cidade,

    pelos quintais da memria do menino de sonhos.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 21 abilio pacheco

    Ru(g)as

    Flanarei pela existncia da cidade

    por sobre as guas

    (nunca mais pelas caladas,

    hoje submersas nas ruas)

    sobre a vida que sua da peledos meus poucos tantos anos.

    J nem ano mais (com o corao

    exilado de mim) por entre os transeuntes.

    Talvez eu que no exista (nem resista)

    nesta cidade, nesta praa (quem sabenoutra praa doutra cidade), como este vo

    entre as pessoas nos bancos, este vo

    do canudo num copo de guaran.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 22 abilio pacheco

    Escribaria

    ...

    e surgem-me alguns garatujos,

    caambas roem o lixo,

    riscam o asfalto bas de rolim,

    comuta a chuva com o sol cegante,trilam buzinas e sirenes,

    brinda-se nas mesas a saideira da saideira,

    ecoam mesmssimas msicas...

    A rua das gaivotas... arruadas gaivotas,

    primeiro de maro.

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    mosaico primevo 23 abilio pacheco

    Memrias de Maro

    A Paulo Cardoso

    Quando amanheo... leito manso e lento

    Nesta manh sob este sol silente

    A cidade desperta calmamente

    Ao meu olhar atnito e em tormento.

    Uma canoa tangida pelo vento

    Com as lembranas da ltima enchente

    Em mim desliza e a cidade sente,

    margem, nos degraus, um leve alento.

    Mas a tristeza morre neste instante

    Quando, no Pontal, o Itacainas

    Vem, farto de canoas, desaguar...

    E sou, portanto, este olhar brilhante

    Cheio de lembranas, de botos, de buinas...

    Que corre lento assim de encontro ao mar...

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    mosaico primevo 24 abilio pacheco

    Noturno

    A Marab

    H noite em mim! H noite em ti, Cidade

    E nesta noite imensa Solido

    Que desliza pelo meu corpo em vo

    Enquanto a tua poesia me invade.

    Negra noite em ns, terra to querida

    E enquanto as guas reetem a lua

    E meu peito tenro arde nesta rua

    Esta noite nos serve de guarida.

    E este colar de luzes sobre as guas

    Brilha e mergulha nos olhos de mim

    E o vento lento tange o tempo e assim

    Vai tangendo tambm as minhas mgoas.

    E j no h mais em mim Solido

    Nem tantas trevas na alta madrugada

    Que nos enche de luz enluarada

    E banha de lirismo esta cano.

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    mosaico primevo 25 abilio pacheco

    Mas o sol vem quebrando a noite agora

    E despertam os galos nos quintais

    Que lanam acordes a tantos maisTangendo de ns dois a noite embora.

    Fico aturdido e ento olhar-te tento

    Com esses olhos brios de luzes tuas,

    Sigo andando atnito pelas ruas

    Na espera de encontrar um novo alento.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 26 abilio pacheco

    Andana

    Carrego meus males todos

    juntos no mesmo bolso,

    juntos do mesmo lado no peito esquerdo.

    Sigo assim meio de ladopuxando de uma perna

    e arrastando meu corpo torto

    pela rua muda.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 27 abilio pacheco

    Procura

    Entre os silncios noturnos,

    grito-me o teu nome

    que mal vaga em vo

    pelas paredes de mim;

    pois tantas so as vozes,entrecortadas, entrecruzadas,

    vozes s vezes bablicas,

    buzinas, apitos e roncos,

    miados, latidos e urros,

    todas vivendo em mim,

    que o meu grito se perde

    pelas frestas da porta

    rompe a rua silente

    e desperta os olhos de mim.

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    mosaico primevo 28 abilio pacheco

    Nereida em Salinas

    A nereida Deurilene Sousa

    ...seguro tua mo e contigo navego

    (corpo velido) pelas alvssimas

    planuras ondulantes dos lenis

    de areia da enseadado quarto do chal

    pelos vagas: ondas suaves,

    sussurros de sereia,

    corais em solo e em si bemol!

    Deixemo-nos levar por este canto navegante

    e nenhum arrecife nos h de avariar a nave.

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    mosaico primevo 30 abilio pacheco

    Revisita Casa Bipaterna

    Aos meus pais-avs Ezequiel e D. Nen

    A mesma rua ainda observa imvel porta,

    janela e paredes da casa,

    onde moram os nossos velhos, pai e me,

    onde as aranhas pacientes esperam, teia urdida intacta,

    pelos insetos que tardam a vir,onde pandora parece nunca ter aberto sua caixinha,

    onde, porm, o relgio de hora em hora

    nos lembra que tempo passa,

    onde ns moramos sempre meninos

    a brincar de enterrar tesouro,

    fazer mapas, armar arapucas e pegar pombos,

    onde tarde ouvimos as histrias

    que nosso velho sargento ainda conta,

    onde h galinhas, marrecos, patos, perus,

    capotes, porcos, ces, gatos

    e uma gara de asa quebrada,

    onde h uma laranjeira, uma mangueira, um jenipapeiro,

    uma s saudade dentro de dois coraes

    e uma solido abissal, que s eles conhecem.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 31 abilio pacheco

    Cantiga de Ninar Alyne

    A minha flha Alyne

    Vejo-te assim,

    minha menina,

    to pequenina,

    de olhos em mim.

    Fico a te olharmeio embasbaque

    teu rosto to lindo

    sempre sorrindo

    vem me alegrar.

    do teu sorrisoque eu preciso

    para sonhar

    e ver que a vida

    tem outro sentido

    do lado de c.

    Mas se tu choras

    parece que eu choro

    te ponho no colo

    te fao um carinho

    te dou um beijinho.

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    mosaico primevo 32 abilio pacheco

    Se vou me embora

    Papai no demora!Volta logo ou ca aqui!

    o meu corao

    Que te ouve

    Falar assim para mim.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 33 abilio pacheco

    Inteligncia Artifcial

    (ou Pinquio ps-moderno)

    Minha fada cor de cu,

    Por mil pares de anos

    Repito-te o mesmo pedido:Faze comigo o que zeste

    com o lho de Gepeto.

    Mas, acima de nossas cabeas

    Toda nova era glacial passou

    E com ela os lhos de Japeto.

    Por mil pares de anos te peo...

    Para que me transformes no que sempre fui,

    Sem que nunca tenha sido de verdade.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 34 abilio pacheco

    A demanda do Pssaro Azul

    Pela oresta de grutas e rochedos,

    noite a dentro, vida a fora, ambas inteiras,

    comigo meus ces, meus gatos, meus medos e desejos

    e do candeeiro, a luz, em corpo esguio de mulher.

    Onde o pssaro azul?

    No cemitrio? No vale? Nalgum arvoredo?

    A coruja sbia... silente.

    Os mortos sonsos... sabentes.

    O pssaro em canto algum da oresta,ou da noite, ou da vida.

    Sequer uma dica, sequer uma pista.

    E durante a noite toda, a busca v.

    Mas, pela manh, bem vista

    no lugar de sempre engaiolado

    e tmido, o pssaro em casa.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 35 abilio pacheco

    Luzes da Cidade

    A Charles Chaplin

    Deambulo em trapos pelas ruas...

    E vejo voc, serena e cega, alva e bela,

    com uma cesta plena de ores claras.

    Sbito amo-te! como uma criana a outra.

    Simples como a rosa branca

    que recebo e ponho na lapela.

    Fao de tudo para que mesmo vendo-me trapalho

    voc contemple as luzes da cidade.

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    mosaico primevo 36 abilio pacheco

    Brincadeira

    No teu telhado, miam gatos

    e os demnios brincam com anjos de pega-pega.

    No teu quintal, ladram ces

    e os demnios brincam com anjos de corre-corre.

    No teu silncio, roncam homens

    e os demnios brincam com anjos de esconde-esconde.

    Mas, na tua ausncia:

    acordam-se os homens, emudecem-se os ces,adormecem-se os gatos

    e os demnios correm dos anjos;

    quase so pegos no trisca.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 37 abilio pacheco

    Habitao

    H um silncio seco percorrendo as paredes da casa:

    Ratos roem roupas sujas esquecidas nos sofs,

    fazem seus ninhos entre os nossos tecidos

    e mijam nas louas adormecidas sobre a pia;Baratas revoam sobre a mesa da sala

    so insetos burocrticos, biblilos, alfarrbicos

    que se fartam nos papis, cartas, revistas e jornais

    que h dias esto reunidos na mesa de jantar;

    Grilos entoam acordes de rias desanadose muriocas lhes riem nos gargalhos;

    Formigas carregam as migalhas da ltima ceia

    da ceia de ontem, da ceia de sempre;

    Uma nica mariposa tenta a morte em vo na luz da sala;

    E aranhas ressecadas nos telhados podres

    permanecem estticas teia urdida

    Enquanto os gatos, os ces,

    os homens esto perdidos pelo mundo.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 38 abilio pacheco

    Habitat

    Sempre so meus os olhos que habitam esta casa:

    paredes de tbuas despregadas,

    ratos podres pelos cantos,

    sapatos empoeirados nos tapetes,

    comida estragada nos lixeiros,caibros comidos por cupins,

    telhas quebradas no telhado,

    vrias trancas nas janelas,

    teias de aranha nos portais,

    fogo engordurado por descuido,

    quadros mal pregados nas paredes,livros espalhados pelo cho,

    roupas sujas sobre a mesa,

    porta e fechadura arrombadas a tiro;

    e os meus olhos assustados e despertos

    j no habitam mais em mim.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 39 abilio pacheco

    Casa ou in-Habitat

    telhados em srie srios

    cumeeiras retilneas ou bifurcadas

    portas solenemente trancadas

    janelas ad eternum cerradas

    mudas paredes surdasolhares trancaados, prisioneiras bocas, gritos retidos

    gente!?

    muros

    mundo(s)

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 40 abilio pacheco

    Construo

    Na tarde quente de sol

    areia pedra barro

    tnue terra tenra

    ocas cores curas

    duro muro nu

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 41 abilio pacheco

    Dezembros

    Ao meu irmo Ezequiel Pacheco Neto

    Quando Dezembro chegar

    Meu mano e uns conhecidos

    Reunidos todos em festa

    De copos cheios na mo

    Cantaro, me abraaro

    E ho de quebrar

    Em meio a risos e risos

    Uns ovos em meus cabelos.

    Quando Dezembro chegar

    No serei mais o mesmo

    Contarei mais umas rugasUns tantos os a menos

    E outros claros a mais.

    Quando Dezembro chegar

    Estarei na face fria

    Do mesmo espelho que h anosA rir de mim para mim

    Vem sempre me revelar

    O que o tempo vem esculpindo

    Em meus rosto dezembral.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 42 abilio pacheco

    Quando Dezembro chegar

    Terei juntas mais duras

    Movimentos mais lentos

    Mos um pouco mais trmulas

    Cansados olhos castanhos

    Ralos cabelos grisalhos

    E no entenderei gria alguma

    Que os meus lhos disserem.

    Quando Dezembro chegarOnde estaro os amigos?

    Os ovos? Os copos?... Quebrados!?

    Os lhos estaro casados.

    O espelho velho embaado.

    Os lhos dos lhos crescendo.

    E os olhos de mim... quebrados.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 43 abilio pacheco

    Rquiem ao Tempo Presente

    Aos familiares dos amigos que partiram

    preciso enterrar nossos mortos

    J no ouvimos mais os fogos de artifcio

    estourando luzes nos olhos do cu

    preciso enterrar estes corposJ no ouvimos mais o som dos taris,

    dos surdos, dos tan-tans, nem dos pratos

    preciso enterrar nossos vizinhos

    seu co atropelado, seu gato baleado,

    seu jardim pisoteado, suas crias envenenadas

    J no ouvimos mais tantos tirosou melhor ouvimos, ouvimos uma saraivada

    gritos de uma aurora baleada

    despertamos em plena guerra

    preciso enterrar nossas asas, nossas penas,

    instrumentos de nossos mais belos vos

    J no ouvimos mais o som das trombetas

    o som das desanadas trombetas

    que os anjos, os demnios e os anjos tocam

    preciso enterrar nossos entes

    J no ouvimos mais os troves

    prenunciadores de chuvas invernais

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 44 abilio pacheco

    alis, ouvimos os troves, ouvimos

    nossas lgrimas que se quebram

    nossos prantos, dentes que se rangem preciso enterrar estas horas

    J no mais ouvimos os relgios

    nem as pedras que se precipitam

    nem os tiques do tempo (taque) porta

    nem mesmo as ores que morrem murchas

    preciso. preciso enterrar nossos olhos,nossos dentes, nossas lnguas, nossos tmpanos.

    J no mais nos ouvimos a ns

    J no mais nos ouvimos

    J no mais...

    preciso!

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 45 abilio pacheco

    Rquiem for Rmulo

    Para Rmulo Santana

    No dia que Rmulo morreu,

    caiu uma chuva semelhante a esta

    e a cidade como de praxe

    tentava nas ruas reetir o cu.

    Ser que anjos choravam?

    E outros tocavam trombetas?

    No dia que meu colega de sala morreu,

    a tarde inteira pesava em mim sua grande mo.

    No entanto, eu no me dera de acordo com o ocorrido,nem me dera conta do peso daquelas guas.

    No dia que meu amigo morreu

    meu Deus, por que tanta gua? ,

    a Presidente Vargas era um charco s,

    um enorme espelho dgua para nada.

    No era a rua da tarde no sonho

    em que todo de branco ele me veio visitar.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 46 abilio pacheco

    Quando Rmulo morreu, no chorei.

    Nem no dia, nem depois. (Chorarei ainda?)

    que... Ser que... Talvez seja porquea lembrana que me h dele vivo!

    Deve ento de ele no ter morrido.

    Mas toda vez que chove como agora

    pesa em mim as lgrimas no carem!

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 47 abilio pacheco

    Elegia de Maria

    Maria deitada na cama

    na lida profana da noite

    na noite soturna do quarto

    olha as horas paradas

    e espera o brilho da aurorae espera o sol de amanh.

    No corpo frgil o sustento

    frtil odor de hortel,

    nos beijos, pancadas na cara

    gemidos, carcias e dor;estranhos estames ncados

    (vibrante delrio frentico)

    gros de plen gozados,

    nas entranhas carne em or.

    Depois de tanto sofrer

    no martrio noturno,

    o vrus maldito da morte

    lhe leva a um longo suplcio

    na solido do seu quarto,

    na solido da espera.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 48 abilio pacheco

    Maria velha levada

    ao m dos dias to cedo.

    No existe mais sonho.No existe mais quimera.

    No existe mais fantasia.

    No existe mais ... Maria.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 49 abilio pacheco

    Elegia da Noite

    Entre penumbras e sombras

    sobras e restos de cores

    de luzes ausentes...

    abertas asas de ave emsecreto luar de estrelas

    : vives!

    Entre orvalhos de aurora

    cantares de galos e galosem matinais cores...

    claros horizontes abertos

    estrelas falecidas

    : morres!

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 50 abilio pacheco

    Aurora Frrea

    A morte uiva no cio

    faminta noite fria

    e h demnios insanos

    tocando suas trombetas

    em desanados acordes(explosivos sons exangues).

    A morte noite que nda

    devora os corpos em chamas

    entre ferros contorcidos

    na locao trinta e nove.E o sangue nos lbios da morte

    mistura-se ao brilho da aurora

    numa cinza manh de Sexta.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 51 abilio pacheco

    ltimo Ocaso

    No lento passar das horas

    (amargo silncio da tarde)

    o sangue corre nas veias

    do homem no leito de dor.

    Na brevidade das horas

    o crdio relgio da vida

    bombeia o sangue no corpo

    do homem no leito de dor.

    Na brevidade da vidacontadas horas de espera

    contadas horas de angstia

    contados minutos de dor.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    mosaico primevo 52 abilio pacheco

    Ocaso

    Um pssaro sob o sol da tarde:

    Um dia, ave liberta em nuvens

    colorindo o brilho silente;

    Hoje, um olhar tmido entre grades

    e um desejo pulsando no peito.

    Mas o tempo vai se apertando

    contra o vazio do ventre

    e o passarinho triste

    sob o sol da tarde a pino

    entre fortes grades denha.

    Ento,

    ao som dos raios solertes

    a ave liberta em vo

    bate as asas da alma

    pelo azul do innito...

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    mosaico primevo 53 abilio pacheco

    epigramalone

    O sonho vai e eu fco s.

    O sonho vo e eu s fco.

    Os sonhos vo e s eu fco.

    Os sonhos vos e s fco eu.

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  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    p o e m i a

    abilio pacheco

    2 edio

    A Ezequiel Pacheco Neto,

    Pedro Leite e Pombo (Janari).

    2008

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    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Fundao Cultural do Par Tancredo Neves

    _____________________________________________________

    P116m Pacheco, Abilio

    Poemia / Abilio Pacheco. Belm: Edio do autor,

    2008.

    27p.

    1. Poesia Paraense. 2. Literatura Paraense. I. Ttulo.

    CDU: 869.0 (811.5-1)

    _____________________________________________________

    poemia by abilio pacheco

    Projeto grfco e editorao eletrnica

    Elizabete N. R. Lopes

    Reviso

    Abilio Pacheco

    Impresso e acabamento

    Grfca da UFPA

    Todos os direitos reservados.

    Proibida a reproduo total ou parcial

    desta obra sem autorizao por escrito do autor.

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    Prefcio primeira edio

    [...]

    Poemia revela-nos um poeta com gosto pela linguagem

    clara, contida, reetida que busca desvendar os mistrios da

    soturna noite urbana com um olhar que apenas se insinuapor entre personagens meio perdidas. O anonimato dos seres

    que povoam esse universo, as conversas captadas de raspo,

    as sucessivas imagens aliadas ao condensamento dos textos

    do uma rapidez de caleidoscpio ao poema, instigando-nos

    a procurar nas entrelinhas, lendo e relendo, aquilo que no

    localizvel de imediato na superfcie.Poemia pode ser lido como mero passatempo sem

    maiores conseqncias mas certamente se presta a algo muito

    maior a quem se aventurar a extrair dele signicaes universais.

    Na verdade, um poema que trata de sensaes sentidas em

    pretrito imperfeito: que se prolongam e no param nunca.

    Eliane Machado SoaresProfessora de Lingstica do

    Campus Universitrio do Sul do Par

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    Quarta capa da primeira edio

    O tema principal deste livro gira em torno do olhar do

    eu-potico, durante uma noite, para a cidade, com todos os seus

    encantos e desencantos.

    A idia que durante a noite muita coisa acontecenas cidades. As pessoas se mostram mais. O que chamamos

    de conscincia cede espao espontaneidade, ao ilgico, ao

    popular. Em sntese: um olhar humano durante a noite.

    H no texto, talvez por focalizar bares, casas noturnas,

    vrios elementos carregados de signicado, imagens que

    denotam um homem bastante regional. E essas caractersticaslingsticas fazem o perl de nossa regio: uma gelada, tira-

    gosto, e os traos da garonete no poema IV.

    Os versos so irregulares, mas h uma simetria no

    que diz respeito a distribuio dos mesmos, assim como no

    tamanho do poema.

    A metfora noite pode estar sendo construda com

    a seguinte carga semntica: A noite enquanto um espao

    propcio ao encontro, ao devaneio, espontaneidade, mas

    tambm noite pode signicar a falta de perspectiva, a curta

    viso daqueles que valorizam o externo, o aparente, por falta

    de condies reais de percepo. a chamada morte em vida.

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    A escurido da noite, a impossibilidade de uma viso ntida das

    coisas, o elemento comum ente noite, espao do dia sem luz

    do sol, e a falta de senso crtico das pessoas.Para nalizar uma imagem forte: ...olhares em retinas

    brias por sobre os copos que beijam lbios dormentes.

    Gilson PenalvaProfessor de Teoria Literria do

    Campus Universitrio do Sul do Par

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    poemia 61 abilio pacheco

    B O M I A

    B O E M I A

    P O E M AP O E S I A

    P O E M I A

    P O E S I AP O E M A

    B O E M I A

    P O E M I A

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    poemia 64 abilio pacheco

    IV

    A garonete com outra gelada

    Usa uma blusinha de ala (sem suti)Um cabelo castanho avermelhado,Um batom seduo eUma mini-saia colada

    Para agradar os clientes.

    V

    A Noite devora no barum tira-gosto salgado

    mal temperado e cru:entorna mais uma garrafa

    e lambe nos lbios midosum amargo lquido etlico.

    VI

    Voc por aqui!O amigo conseguiuuma carta de alforria?Hum! Para todos os efeitosfui bater uma redondacom a turma no clube.Entendeu?Fique tranqilo.

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    poemia 65 abilio pacheco

    VII

    A Noite arrota no bar

    (como um trovo)e tic do relgio d tiqueno tempo (tac).

    VIII

    Tem-se que ser moderna.Eu se fosse voc, Fulana,Fazia isto... e oFulano, do lado, ferve.

    IX

    A Noite dana no barUm bolero, uma salsa, um merengue,Um shot, uma valsa, um rock-and-rollDepois suada e cansada

    Senta-se entre nuvens clarasOuvindo uma MPB.

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    poemia 66 abilio pacheco

    X

    Uma mulher chora num canto

    E outra lhe d conselhos:... presta ateno numa coisa:Homem pisa quando sabeQue a mulher t gostando dele.Tu tem que fngir

    que no gosta...vai por mim!...

    XI

    A Noite observa no barque os olhos se lanam

    olhares em retinas briaspor sobre os coposque beijam lbios dormentes.

    XII

    Quem falar de amorexplicitamente,

    sobre a mesa do barentre um copo e outro

    entre uma cerveja e outra?Talvez (no) seja precisoConsultar as entrelinhas...

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    poemia 67 abilio pacheco

    XIII

    A Noite depara-se no bar

    com um relgio hipnotizantenu, na parede suja,tocando ponteiros tontos,

    E ca olhando espantadaa nudez incansvelque move os ponteirospor vezes repetidas vezes

    repetidas hipnticas...

    XIV

    Um indo amigo

    Depois de um gole,Faz um gesto eSolta um sorriso breve ePodre de falsidade.O outro que ouveRevolve uns trapos recentes

    Entre muitos outros em

    Meio s traas de umBa de lembranas:Ela me disse quehavia bebido muitoe ele tambm. Pinto clima. No deupra controlar. Rol.Fica puto,

    Esbraveja e sai.

  • 7/30/2019 Mosaicoprimevo Abilio Pacheco

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    poemia 68 abilio pacheco

    XV

    A Noite vomita no bar,

    Depois de tanto beber,E o relgio devora o tempoL e n t a m e n t ePouco a pouco h horas.

    XVI

    Sai com aquela menina ali,chegando de moto.Cara, mas boa.A gente fez isto assim...T vendo que a mulher

    L em casa no topaUm negcio desse.E o outro responde: uma base.

    XVII

    A Noite ressurge no barAtnita, trpega e tonta

    Com seu vestido de lua

    Com pernas de vara verde

    E olhos enrubrecidos

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    poemia 69 abilio pacheco

    XVIII

    A rua, em frente,

    escura, porm plida,adormece asfltica.De repente: um carrorasga o silncio do asfalto,pneus cantam ao longe,

    gritam os vidros num poste,

    geme a cara no volante exangue

    e resta um tom fnebrena buzina chorandopela madrugada a dentro.

    XIX

    Enquanto o relgio lentoTange as estrelas que brilhamNo toldo azul-marinhoQue nos cobre,A noite boceja no bar,Abre uma boca de escuridoE seus olhos incandescentesMarejam orvalhos plvios.

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    poemia 70 abilio pacheco

    XX

    A conta paga com cheque,

    Mas no importa o valor,Pois a noite esta ganha,Os problemas esquecidosE a solido vencida.Abre a porta do carroCom o peito estufado de orgulhoSe sentindo mais macho

    E querendo que todos o vejamE quem morrendo de inveja.

    Entra no carro e sorri

    Pensando no que certamenteOuvir na manh seguinte.

    XXI

    A Noite adormece no barAmarrotada, assanhada e tristeDebruada sobre a mesa;O vento lhe faz um afagoE o tempo, no relgio, lhe acalentaCom sua eterna cantiga de ninar:Tic tac

    Tic tacTic tac

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    poemia 71 abilio pacheco

    Um breve passeio pelas imagens pomicas

    da poesia noturna de Abilio Pacheco

    Inicialmente gostaria de armar que no estou aquipara sugerir matizes ou condies de leitura para os poemas deAbilio Pacheco que ora se apresentam e dos quais detive umolhar mais atento sobre os que fazem parte de Poemia.Estouaqui unicamente na condio de leitora, tentando capturar parasi os modos como o poeta construiu sua teia criativa.

    Nesse conjunto de poemas, o poeta consegue colocar doavesso o cotidiano, na medida em que o dia-a-dia torna-se noite.Logo, a Noite e, por oposio simblica, o Dia, expressam-se,em Poemia, enquanto alegorias de uma forma mais sensvel de contemplar o mundo. A interseo entre estes dois locusalegricos o Tempo, pois o tempo da Noite pomica o tempoda bomia: algo aparentemente em suspense, contudo, medidopelas horas que marcam seu comeo e seu m.

    Em Seis Propostas para o Prximo Milnio, ItaloCalvino diz que Paul Valrie a personalidade que em nossosculo melhor defniu a poesia como tenso para a exatido.Mas, o que seria essa exatido? Segundo Calvino, a evocaode imagens visuais ntidas, incisivas, memorveis, ou por outrolado, a linguagem trabalhada da forma mais precisa possveltendo por norte a traduo das nuanas do pensamento e da

    imaginao. Nos poemas de Abilio Pacheco essa exatidomarca cada estgio de transio da Noite no espao da bomia,ou se nos permite o trocadilho, da poesia, expressa no tempo deviver o bomio e no tempo do olhar quase onipresente, quasecomo epifania, de algum que espreita: o eu-potico.

    Nesse espreitar, o no-dizveldesse espao, por ser,talvez, muito desnudamente comum e visvel no dia-a-dia daNoite, torna-se dizvelpela via de uma linguagem lacunar:

    viver a Noite como morrer um pouco para o Dia, sendoeste o lado apolneo da existncia, territrio das regras que

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    poemia 72 abilio pacheco

    o presidem. Assim, a Noite dionsiaca seu oposto, mas aomesmo tempo sua complementao. Sendo dionisaca, a Noitese torna criao e se coloca distante da verdade apolnea, pois

    igualmente territrio do desviado, do brio e do louco. E defato, a Noite o locus do eterno retorno, da des-represso, doxtase e dos estados hipnticos, onricos ou fronteirios entre oreal e a imaginao.

    Contudo, a Noite no aniquila o Dia. Quando tomaseu lugar no discurso social abre as portas para a possibilidadede reinventar o cotidiano solar, ou antes, lanar sobre ele umolhar especulativo sobre as diferenas entre os dois locus. Essa

    relao suplementar Dia-Noite, na produo de Pacheco, jse antecipa em poemas como epigramagrrio, conformetrecho a seguir:

    a p lavra em terrao sono.

    a palavra em terrao sonho.

    E em Ernias:Fatigado escrevo em transe

    imerso em denso sono,

    entre alaridos e vozese sob luzes vertiginantes(...)Garatujo! Esgaravatono trtaro do tinteiroo sono das trevosas Frias.

    Em ambos, o teor especulativo da relao estamalgamada com o prprio fazer potico. A relao Dia-Noite se faz na ambivalncia entre termos como terra-sonoe terra-sonho no epigramagrrio. Aqui, os termosfuncionam como imagens poticas estabelecendo limites paracada territrio, mas tambm evocam o processo construtivodo poema: o jogo com a expresso lavrar a terra estabelececonjuntos signicativos ligados constituio da palavra e,conseqentemente do poema.

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    poemia 73 abilio pacheco

    Processo parecido ocorre em Ernias. A relao Dia-Noite est mais uma vez na busca pela intermediao entreos dois locus (Fatigado escrevo em transe/ imerso em denso

    sono,/ entre alaridos e vozes). Termos e expresses comotranse e denso sono estabelecem a associao penumbrosa entreduas zonas: a do real (representado por um eu oculto, mas quese coloca efetivamente como sujeito) e a da imaginao (quese cumpre justamente pela imposio das imagens onricas queinvadem a ao da escrita). Mas a mesma relao Dia-Noitese faz na prpria natureza noturna das Ernias. Habitantes doTrtaro como entidades punitivas, lhas da deusa Nix (Noite)

    na verso de squilo, essas criaturas representam a foravingativa contra o deslocamento da Ordem. O trao da escritase faz na necessidade de expor o processo criador mergulhadonesse universo noturno, como metfora da diculdade em lidarcom o carter fugidio, orgistico e libertador, mas por vezespavoroso, que a Noite condensa.

    Vale ressaltar ainda que muitas vezes a produo deAblio Pacheco se deixa sulcar profundamente pelas correlaes

    intertextuais. No conjunto dos poemas, dos quais fazem parte osque compem Poemia, destaco o poema Tessitura Noturna,homenagem do poeta a Joo Cabral de Melo Neto. Cumpreobservar que nesse caso a intertextualidade se efetiva comobusca pela natureza noturna das coisas (veja pgina 16).

    O jogo entre galo (do poema de Melo Neto) e co(no poema de Pacheco), com o segundo tomando o lugar doprimeiro, modicando-o sem anul-lo, ultrapassa a conotao

    simblica o co como guia e guarda na noite e na morte,da mesma forma que se faz companheiro no dia e na vida e encadeia signicaes que perpassam pela dimenso social(tal que somados todos/(latidos e ces) na noite/ formem (no arca-/bouo da matilha)/ uma redoma protetora/ em torno da rua) e peladimenso psquica incrustada (redoma protetora). Os latidoscaninos se constituem (tambm) como rastros do tempo e no tempo.E nesse sentido resta dizer que o uxo do tempo sem dvida

    umas das marcas dessa produo, tal qual marca na produo de

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    outro poeta, Age de Carvalho, com o qual Pacheco tambm dialogaintertextualmente em outra oportunidade. Na economia dessasrelaes, imprescindvel destacar que h um poema de Carvalho,

    verdadeiro exerccio intertextual com a obra de Melo Neto, que decerta forma expressa consideravelmente os dilemas insuperveis,trazidos pelo (e no) tempo. Trata-se do poema Canto de Galo:

    Na madrugada dormida,onde a chama

    (agora apagada) do diareclama o fogo das manhs,um galo canta

    (apodrecendo rgido ao passar das horas)

    Para alm dos dilogos entre os poetas minha inteno observar que, justo ou no, o tempo passa e nesse passar tudoapodrece, at mesmo o incansvel galo cabralino e ageano, masnesse processo, prevalece a repetio de cada noite a reclamarpor novas manhs e de cada nova manh que, uma vez cansadasda azfama cotidiana, reclamam sucessivamente por umanova noite. Essa idia de uxo contnuo igualmente vlidapara a produo de Pacheco, mas aqui a sede de especulaoprocura localizar o problema desse uxo a partir do cartermais profundo e ao mesmo tempo mais visvel das condies esituaes que constituem a Noite.

    Desse modo, como dito antes, os poemas de Pachecoesto aqui marcados por tempos de contemplao, masestes se enfeixam em outras possibilidades, ampliandoconsideravelmente o universo das signicaes, pois essestempos se traduzem em objetos-signos representativos de umterritrio, o da Noite: uma porta, um balco, uma mesa de bar.Assim, Poemia no apenas a incurso do olhar humano porentre as frestas da noite nos bares. Poemia um mosaico,construdo pela dilacerao da experincia diurna que se re-fazna cadncia noturna: dilogos lanados ao lu, que pairam notempo e tornam-se signos compostos em estilhaos, simulacros

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    das vozes pomicas da Noite, arrebatadas da memria ao belprazer do eu-potico: vozes que ressoam nas impresses dessesujeito espreitador das vozes de outrns.

    Nesse processo de espreitamento, a base tcnica dessaescritura a sinestesia. A polissemia sgnica , sem dvida,instaurada de maneira mais evidente a partir do recursoda percepo cuidadosa, porm contnua e aparentementedesavisada dos sentidos: so as impresses captadas queinseminam a signicao das palavras pescadas no universobomio das cidades. E na construo dos sentidos vale auniversalidade das palavras-efeitos. Assim, a contamelhor

    seria dizer a noite paga com cheque, percebida segundoos tons e semi-tons dos rudos e dos silncios da Noite, desdeo crepsculo:

    O sol sobre a cidadeLana seu ltimo olharCom um aceno de adeus.

    A Noite surge no barCom seu relgio douradoDe estrelinhas, sons e tons.

    Esses sons e semi-tons pousam igualmente sobre outrasformas perceptivas, como por exemplo, os movimentos dosobjetos, que se confundem aos sentimentos (poema XII).

    EmPoemia, o poeta , de fato, um exato espreitador de

    iluses. Das iluses construdas no labor do Dia e despojadasno alvorecer da Noite. Assim, cumpre-se um dilogo discretoe por vezes doloroso entre a poesia e a psicologia de um dadocotidiano noturno, pois a Noite, enquanto smbolo representa olocus do grotesco, do fantasmagrico, das tenses misteriosasdo inconsciente. Vista por esse prisma, a Noite torna-serepositrio e expresso do recalcado. No espao do bar dessaNoite pomica, os indivduos materializam esses recalques e

    vo purgar as suas desiluses, como no poema III e em:

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    A Noite vomita no bar,depois de tanto beber,e o relgio devora o tempo

    lentamentepouco a pouco h horas.

    Contudo o bar tambm o territrio da procura por tudoaquilo que cou em suspenso ou se tornou presa de adiamentosno decorrer do Dia. Desse modo, o mesmo espao de deglutioe de excreo das misrias o mesmo que alimenta a dimensodos desejos e da possibilidade de gozo em relao ao outro:

    Parece to sugestivoAquele cigarro acesoCom dentes nos lbios rosados

    E um olhar de serpenteRemetido via sensitivaDe uma mesa a outra.(...)

    A Noite observa no bar

    que os olhos se lanamolhares em retinas brias

    por sobre os coposque beijam lbios dormentes.

    Esse , enm, o espao-tempo que se espraia em Poemia:universo noturno dos bares, quiosques, bodegas e semelhantes.Nesse caso, no importa bem o gnero do local, pois so

    solcitas nessa obra as imagens e atores arquetipicamente bemcolocados em seus papis. Contudo, o desejo de individuao deslocado e prevalecem imagens de vrios eu-universais,alegorias dos tantos indivduos que circulam na noite, comoaquele que senta no bar/Pede uma gelada e comea a beber,beber, beber.... Ou do indivduo que traduz a constituio daNoite sob outro vis: o de quem forja sua movimentao apartir dos estatutos da consumio. Na concepo de Pacheco

    a garonete que:

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    usa uma blusinha de ala (sem suti)um cabelo castanho avermelhado,um batom seduo e

    uma minissaia coladapara agradar os clientes.

    Essa garonete to imediatamente reconhecvel namemria, tal qual aquele amigo que conseguiu uma cartade alforria da Esposa, da Ordem diurna, de Si mesmo cuja incurso na Noite uma forma de purgar o Dia, mas,paradoxalmente a Noite ainda a extenso de seu exlio,

    pois o tempo, como ceifeiro, logo se coloca entre ele e asindeterminaes to prprias do territrio da noturnidade:A Noite arrota no bar(como um trovo)e tic do relgio d tiqueno tempo (tac).

    Sendo universo transformado em texto, Poemia convocaos elementos da Noite para ler o Dia. O verbo encarna-se de

    experincia humana tornando-se aquilo que, em Signos emRotao, Octvio Paz chama depoesia prtica.

    Por outro lado, em Poemia, o Amor uma espcie devetor da busca (Uma mulher chora num canto / e outra lhe dconselhos). Os indivduos aqui so nivelados a partir das pulsesinerentes personicao que alcanam perante o amor, assim,nsia, carncia, tristeza, frustrao ou raiva so sentimentosto interagentes no mbito indivduo-ambiente, nesses poemas,que passam a ser o prprio registro desses indivduos no espaopotico. Anal, como arma ainda Octavio Paz em A OutraVozo amor, a inveja e a clera so paixes que, por meio deuma operao de linguagem se transformam em pessoas, node carne e osso, mas imaginrias...

    Assim, essa Noite pomica e bbada de lcoois edesejos o topos da purgao: inventrio do amor querido,do amor preterido, do amor procurado, do amor que se quermaterializado no corpo do outro. Essa noite tambm o

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    Trs palavras mais sobre o Poemia

    Abilio Pacheco (...) anexa um exemplar de Poemia, querecebemos com uma agradvel dedicatria. O nome sugestivo. Ummisto, talvez, de poema x Bomia. Da leitura que estamos fazendo,deduzimos que Abilio pretende, em seus versos descompromissados,louvar a noite e os momentos de descontrao em um bar qualquer,

    procurando sentir a vida e os seus motivos. H doze anos que fugimosa esses momentos feiticeiros.

    Humberto Del Maestro emLiteratura & Arte Maro de 1999 n 411, Serra ES

    Com muita alegria recebi seu excelente Poemia. Suaspoesias so timas, mostrei para algumas pessoas que gostarambastante. Acho que estamos no mesmo barco, ou seja, fora da grandemdia massicante, lutando por idias que acreditamos.

    Guido Viaro Curitiba PR

    O tempo e a impermanncia dos atos, das pessoas, dosmomentos. A quase gratuidade de tudo, a frivolidade que transparecenos dilogos e atitudes do homem comum, formando verdadeiromosaico humano/urbano, que tem como fundo a noite. Porm,no uma noite qualquer, a noite de Abilio constitui um alter egodo poeta-observador, que, numa atitude socrtica, capta o visvel

    e invisvel que o cerca. Enquanto o relgio implacvel alimentao escoar do tempo. Em seu primeiro livro solo, Abilio demonstrasegurana no manuseio da linguagem, lapidando cuidadosamentecada poema, explorando a fora do verso curto, num trabalho deminuciosa colagem, que resulta no poema maiorPoemia, que conferettulo Obra. No deixa de ser curioso, observar que essa estruturacorresponde tanto ao nome do Alternativo quanto ao da Editora doAutor, o que indica sua forma de perceber e revelar o mundo.

    Ricardo Alfaya Rio de Janeiro RJ

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    sumriomosaico primevo5 Ao leitor / leitora7 Prefcio11 Epigramagrrio12 No Prelo13 Ernias15 Escritura16 Tessitura Noturna17 Brevssimo Ensaio sobre a Cegueira18 Retrato II19 O largo (do) buraco da Palmeira21 Ru(g)as

    22 Escribaria23 Memrias de Maro24 Noturno26 Andana27 Procura28 Nereida em Salinas29 Horas passadas30 Revisita Casa Bipaterna31 Cantiga de Ninar Alyne33 Inteligncia Articial34 A demanda do Pssaro Azul35 Luzes da Cidade36 Brincadeira37 Habitao38 Habitat39 Casa ou in-Habitat40 Construo41 Dezembros43 Rquiem ao Tempo Presente45 Rquiem for Rmulo47 Elegia de Maria

    49 Elegia da Noite50 Aurora Frrea51 ltimo Ocaso52 Ocaso53 Epigramalone

    poemia57 Prefcio primeira edio59 Quarta capa da primeira edio61 Poemia71 Um breve passeio pelas imagens pomicas...79 Trs palavras a mais sobre o Poemia

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    Ablio,

    Os desenhos iniciais,

    penso, quero, sinto, gosto

    da folha 45:

    metamorfo de fluidos

    smen, lgrimas, chuva,sangue, lquido amnitico...

    ciclo, corpo se desfazendo

    Cores: branco, preto, vermelho.

    O melhor seria o fundo

    preto como num sonho.

    Espero para melhor o risco

    Rose Lourinho

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