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MOMENTO DA OCORRÊNCIA DO FATO GERADOR PARA FINS DE
TRIBUTAÇÃO DOS ATIVOS E PASSIVOS FINANCEIROS SETORIAIS
Antonio Ganim
Sócio do escritório Ganim Advogados Associados; Ex-superintendente da SFF
da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL); Autor de livros e artigos
sobre temas do Setor Elétrico.
I. INTRODUÇÃO
As concessionárias de serviço público de distribuição de energia
elétrica possuem contabilizados em contas patrimoniais, na contabilidade
regulatória estabelecida pela Resolução Normativa ANEEL n° 396/2010, a título
de ativos e passivos financeiros setoriais, diversos valores a serem incluídos
nos reajustes tarifários futuros sendo que, na contabilidade societária, esses
valores não vinham sendo reconhecidos em virtude da sua não
permissibilidade pela norma contábil societária brasileira quando da adoção
das normas internacionais de contabilidade, introduzida pelo § 5°, do art. 177
da Lei n° 11.638, de 28 de dezembro de 2007, abaixo transcrito, devido ao
não posicionamento favorável do International Accounting Standards Board –
IASB, face ao seu entendimento de que não havia garantias de realização
desses valores.
“Art. 177.
§ 5º As normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários a
que se refere o § 3o deste artigo deverão ser elaboradas em
consonância com os padrões internacionais de contabilidade
adotados nos principais mercados de valores mobiliários.”
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Para permitir que esses ativos e passivos pudessem ser
registrados na contabilidade societária, as concessionárias de serviço público
de distribuição de energia elétrica assinaram, em dezembro de 2014, o aditivo
contratual ao Contrato de Concessão, pelo qual passaram a ter a garantia do
recebimento desses ativos e passivos financeiros setoriais durante o prazo de
concessão, bem como de sua indenização, ao final do período da concessão.
Assim, com a assinatura do citado aditivo contratual, dando
garantias de realização desses ativos e passivos, foi publicado pelo Comitê de
Pronunciamentos Contábeis o “OCPC 08”, que dispôs sobre o reconhecimento
desses ativos e passivos nos relatórios contábeis-financeiros de propósito geral
das distribuidoras de energia elétrica, emitidos de acordo com as normas
brasileiras e internacionais de contabilidade, aprovado pelo Conselho Federal
de Contabilidade (CFC) por meio da Norma Brasileira de Contabilidade –
Comunicado Técnico CTG n° 08, de 05 de dezembro de 2014, e pela
Deliberação CVM n° 732, de 09 de dezembro de 2014.
Dessa forma, as concessionárias reconheceram esses valores,
ainda em 2014, na contabilidade societária, que até então eram denominados
de ativos e passivos regulatórios a serem incluídos nos reajustes tarifários ou a
serem indenizados quando do término do prazo do contrato de concessão
assinado com a União Federal.
Assim, considerando que em 2002, quando ocorreu o
racionamento de energia elétrica, em que havia somente uma única
contabilidade para fins regulatório e societário, houve o reconhecimento
contábil de ativos e passivos regulatórios, e os mesmos foram tributados tanto
pelo IRPJ, como pela CSLL, o PIS/Pasep e a Cofins, à medida que ocorria o
fornecimento futuro de energia elétrica e seu respectivo faturamento, nos
termos do parecer emitido pela Coordenação Geral de Tributação (COSIT) n°
26/2002, passaremos a analisar se o reconhecimento dos ativos e passivos,
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nas condições do OCPC 08, pode ser submetido à tributação considerando a
mesma interpretação prevista no citado parecer da Coordenação Geral de
Tributação.
II. ORIGEM DOS ATIVOS E PASSIVOS FINANCEIROS SETORIAIS
(ANTERIORMENTE DENOMINADOS DE REGULATÓRIOS)
Inicialmente se faz necessário esclarecer a formação da tarifa
requerida de uma empresa concessionária de serviço público de energia
elétrica. A “receita requerida”, estabelecida nos contratos de concessão de
serviço público de distribuição de energia elétrica, e “no Módulo 2 – Revisão
Tarifária Periódica das Concessionárias de Distribuição”, que faz parte dos
Procedimentos de Regulação Tarifária (PRORET), corresponde à receita
compatível com a cobertura dos custos operacionais eficientes e com o retorno
adequado para o capital prudentemente investido.
A receita requerida é composta pela soma da “Parcela A” e da
“Parcela B”, sendo que a “Parcela A” corresponde aos custos considerados
como não gerenciáveis, já que não dependem da gestão da concessionária e
sofrem alterações e variações que não são possíveis de serem previstas com
exatidão no momento da fixação da tarifa, quer seja quando da Revisão
Tarifária ou do Reajuste Tarifário. Os componentes da “Parcela A” são: compra
de energia elétrica; custo de uso do sistema de transmissão; taxa de
fiscalização da ANEEL; contribuição ao O.N.S; Taxa de Fiscalização e os
encargos setoriais.
Já os custos da “Parcela B” são aqueles considerados como
gerenciáveis pela concessionária, compostos pelos: custos de operação e
manutenção; cotas de reintegração dos ativos intangíveis e imobilizados em
serviço (depreciação e amortização) e remuneração dos investimentos
aprovados pelo Órgão Regulador.
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Os ativos ou passivos financeiros setoriais (regulatórios) surgem
exatamente dessas diferenças, positivas ou negativas, apuradas entre os
valores fixados na “Parcela A” e aqueles efetivamente incorridos no decorrer do
período de aplicação de determinada tarifa fixada no processo de revisão ou
reajuste tarifário. Esses valores, cobrados a menor ou a maior na tarifa,
precisam ser ajustados no próximo reajuste ou revisão tarifária, de forma a
se recompor o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, seja por
meio da inclusão ou exclusão desses valores na próxima tarifa a ser fixada.
Essas diferenças, positivas ou negativas, a princípio, são repassadas à tarifa
quando do reajuste anual ou da revisão tarifária ordinária.
Esses ativos e passivos financeiros setoriais registrados
contabilmente, para inclusão na tarifa, precisam ser fiscalizados pela ANEEL, o
que ocorrerá somente antes da proximidade do reajuste ou revisão tarifária ou
a posteriori. Essa auditoria segue o Manual de Orientação dos Trabalhos de
Auditoria da Conta de Compensação de Variação de Valores de Itens da
“Parcela A” – CVA e do Manual de Orientação dos Trabalhos de Auditoria dos
Itens Financeiros – IF, aprovados pelos Despachos n° 2.877-SFF/ANEEL, de 01
de agosto de 2008 e n° 3.746-SFF/ANEEL, de 13 de outubro de 2008,
disponibilizados no sítio da ANEEL.
Para tanto, com vistas a disciplinar o repasse dessas variações
de custos da “Parcela A”, de forma a atender ao disposto no art. 1⁰ da Medida
Provisória n⁰ 2.227, de 04.01.2001, que permitiu o repasse anual, foi editada a
Portaria Interministerial MF/MME n⁰ 2961, de 25.10.2001, que em seu artigo
primeiro criou a CVA e estabeleceu os seus componentes de custos.
Atualmente os itens que compõem a CVA estão estabelecidos no art. 1º, da
Portaria Interministerial MF/MME nº 361, de 26.11.2004, que deu nova
1 Revogada pela Portaria Interministerial MF/MME n° 025/2002, alterada pelas Portarias Interministeriais MF/MME n°
116/2003 e 361/2004.
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redação ao art. 1º da Portaria Interministerial nº 0252, de 24.01.2002,
conforme segue:
"Art. 1º Criar, para efeito de cálculo da revisão ou do reajuste da
tarifa de fornecimento de energia elétrica, a Conta de
Compensação de Variação de Valores de Itens da "Parcela A" – CVA
destinada a registrar as variações, ocorridas no período entre
reajustes tarifários, dos valores dos seguintes itens de custo da
"Parcela A", de que tratam os contratos de concessão de
distribuição de energia elétrica:
I. Tarifa de repasse de potência proveniente de Itaipu
Binacional;
II. Tarifa de transporte de energia elétrica proveniente de
Itaipu Binacional;
III. Quota de recolhimento à Conta de Consumo de
Combustíveis - CCC3;
IV. Quota de recolhimento à Conta de Desenvolvimento
Energético - CDE;
V. Tarifa de uso das instalações de transmissão
integrantes rede básica;
VI. Compensação financeira pela utilização dos recursos
hídricos;
VII. Encargos de serviços de sistema - ESS;
VIII. Quotas de energia e custeio do Programa de Incentivo
Fontes Alternativas de Energia Elétrica - Proinfa; e
IX. Custos de aquisição de energia elétrica.”
2 Com nova redação já dada pela Portaria Interministerial MF/MME 116/2003. 3 A Cota da Conta de Consumo de Combustível (CCC) foi extinta por meio da revogação do art. 8° da Lei n°
8.631/1993, pela art. 33 da Lei n° 12.783/2013, sendo que a CDE assumiu os gastos da CCC, conforme art. 23 da Lei n°
12.783/2013 que alterou o art. 13 da Lei n° 10.438/2002.
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Quanto a cada item acima, componente da “Parcela A”, a ANEEL
publicou resolução normativa específica, estabelecendo procedimento e
critérios para repasse às Tarifas de Fornecimento de Energia Elétrica e Tarifa
de Uso do Sistema de Distribuição - TUSD, a seguir relacionadas:
RN 491 – 20.11.2001 – CVA Energia de Itaipu;
RN 492 – 20.11.2001 – CVA CCC;
RN 493 – 20.11.2001 – CVA Transporte Itaipu;
RN 494 – 20.11.2001 – CVA TUST Rede Básica;
RN 495 – 20.11.2001 – CVA CFURH;
RN 089 – 18.02.2002 – CVA ESS;
RN 184 – 09.04.2003 – CVA CDE;
RN 153 – 14.03.2005 – CVA ENERGIA; e
RN 189 - 06.12.2005 – CVA PROINFA (Repasse à TUSD)
O saldo da CVA é definido como o somatório das diferenças,
positivas ou negativas, entre o valor do item na data do último reajuste
tarifário da concessionária de distribuição de energia elétrica e o valor do
referido item na data de pagamento, acrescido da respectiva remuneração
financeira calculada com base na taxa de juros SELIC, sobre o saldo da CVA de
cada item da "Parcela A", desde a data da ocorrência da diferença no valor de
cada item até a data de reajuste tarifário contratual subsequente, conforme
art. 2⁰ da Portaria Interministerial MF/MME n⁰ 025/2002.
Assim, esse mecanismo de definição de tarifa pode originar
diferença temporal entre os custos orçados (“Parcela A” e outros componentes
financeiros) incluídos na tarifa no início do período tarifário, e aqueles que são
efetivamente incorridos ao longo do período de vigência da tarifa. Tal diferença
constitui um direito a receber pela concessionária, nos casos em que os custos
orçados e incluídos na tarifa são inferiores aos custos efetivamente incorridos,
ou configura uma obrigação quando os custos orçados e incluídos na tarifa são
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superiores aos custos efetivamente incorridos. Em síntese, a aludida diferença
é um direito ou uma obrigação, ambos perfeitos e acabados, decorrentes de
uma obrigação de performance totalmente completada (energia efetivamente
entregue para os seus clientes), devendo a ANEEL, em observância ao princípio
do equilíbrio econômico e financeiro estabelecido pelo contrato de concessão
ou permissão, tão somente operacionalizar o seu recebimento ou pagamento,
conforme o caso. Além disso, há outros componentes financeiros oriundos da
atividade de distribuição e que se constituem em direitos ou obrigações que
também integram a composição tarifária.
“Com efeito, o Poder Concedente, com vistas a garantir a
manutenção do equilíbrio econômico e financeiro, reconhece às concessionárias
de serviço público de distribuição de energia elétrica o direito à neutralidade da
“Parcela A”, o que implica no reconhecimento do direito à sua futura
recuperação ou dever de devolução aos consumidores.4” Portanto, o citado
mecanismo tem por objetivo permitir que, ocorrendo uma variação de preço
dos itens que formam essa parcela, a mesma seja recebida junto ao
consumidor por meio do repasse à tarifa futura de fornecimento de energia
elétrica ou à tarifa futura de uso do sistema de distribuição, devidamente
remunerada, quando do reajuste ou revisão tarifária, de acordo com as normas
regulatórias aplicáveis aos reajustes e revisões tarifárias.
III. DA CONTABILIZAÇÃO DOS ATIVOS E PASSIVOS FINANCEIROS
SETORIAIS
Inicialmente, com vistas à análise da possível aplicação do
Parecer Cosit n° 26/2002 à situação que ora apresentamos, principalmente em
relação à parcela dos ativos/passivos regulatórios que provavelmente serão
faturados quando da entrega futura de energia elétrica, discorreremos sobre a
44 Pimenta, André Patrus Ayres. Especialista em Regulação da SFF/Aneel - Tributação no Setor Elétrico – Ed. Quartier
Latin, 2010.p.44.
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fundamentação para o registro contábil desses valores em 2001, bem como
em 2014:
A. FUNDAMENTAÇÃO PARA REGISTRO CONTÁBIL EM 2001
Quando do racionamento de energia elétrica no ano de 2001, a
despeito de a norma internacional americana não aplicável à contabilidade
brasileira, o FAS – 71, editado pelo Financial Accounting Standards Board
(FASB), naquela época, admitir o diferimento dos gastos aceitos na tarifa, o
IBRACON recorreu ao pronunciamento NPC 14 – Receitas e Despesas –
Resultados, para concluir pelo registro da receita ao invés do diferimento da
despesa, quando da emissão do Comunicado IBRACON 01/2002, que
fundamentou o registro contábil do ativo regulatório no Brasil referente à
Recomposição Tarifária Extraordinária, justamente por não serem despesas
antecipadas; senão, vejamos:
“Para dar solução a esse tema, recorreu-se inicialmente à NPC 14 –
Receitas e Despesas – Resultado, pronunciamento emitido pelo
IBRACON, o qual fornece critérios para identificar as condições e
determina as regras para o reconhecimento das receitas e
despesas.
Alguns conceitos desse pronunciamento são:
A receita é reconhecida somente quando for provável que os
benefícios econômicos relativos à transação venham a ser
percebidos pela empresa (a receita foi “ganha” pela empresa).
A receita de venda de produtos ou mercadorias deve ser
reconhecida quando todas as seguintes condições tiverem sido
satisfeitas:
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a. a empresa tenha transferido ao comprador os riscos e
benefícios significativos decorrentes da propriedade dos
produtos;
b. a empresa não mais detenha o envolvimento gerencial
contínuo em grau usualmente associado com a propriedade,
nem o controle efetivo sobre os produtos vendidos;
c. o valor da receita poder ser medido com segurança;
d. é provável que os benefícios econômicos decorrentes da
transação sejam percebido pela empresa; e
e. os custos incorridos ou a incorrer referentes à transação
possam ser medidos com segurança.
À primeira vista, parecerá que não se poderia reconhecer como
receita e redução do custo do exercício de 2001, respectivamente,
a recomposição tarifária e a recuperação assegurada pela Aneel
dos custos da denominada Parcela A (não gerenciáveis).
Entretanto, há que se analisar as características próprias do
produto energia elétrica de que estamos tratando.
Diferentemente de qualquer outro produto (exceto os que têm
características semelhantes, como a produção e o fornecimento de
gás, água, etc.), a energia elétrica tem características próprias,
seja na sua produção, seja na comercialização. Os consumidores
de energia elétrica, nos dias atuais, não têm opção de escolha
entre fornecedores, exceto para os grandes consumidores que
decidirem exercer o direito de escolha do seu fornecedor,
tornando-se consumidores livres. Os consumidores comuns têm à
sua disposição poucos substitutivos à energia elétrica, sendo esse
produto de extrema utilidade fazendo com que seu consumo seja
indispensável (o consumidor poderá reduzir os níveis de consumo,
racionalizá-lo, porém dificilmente cessará o consumo).
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Consideradas as condições atuais do mercado de energia (falta de
oferta que garanta a competição), podemos afirmar que os
consumidores, em larga escala, são cativos.
Para fins de análise, devemos considerar que há um conjunto de
consumidores, e não consumidores individuais, ou seja, as
concessionárias têm uma massa de clientes que variarão seu
consumo individual, porém, no seu conjunto, o consumo tende a
ser uniforme.”
Em 2001, o registro contábil de um efetivo ativo regulatório
sujeito à remuneração pela Taxa SELIC, como contas a receber em
contrapartida com a receita, conforme previsto no Comunicado IBRACON n⁰
01/2002, que tratou do procedimento contábil da Recomposição Tarifária
Extraordinária, que além da perda de margem, tinha também itens da “Parcela
A” e “energia livre” (diferença de preço da energia das geradoras no MAE,
atual CCEE), foi realizado, principalmente, face à conclusão de que o produto
foi entregue por preço inferior ao assegurado às empresas
concessionárias, sustentando que tanto a receita como a despesa
pertenceu ao mesmo período de competência, podendo, assim, ser
registrado no resultado do exercício. Vejamos a conclusão do Comunicado:
“Pode-se afirmar que o produto foi entregue por preço inferior ao
assegurado às empresas concessionárias para lhes propiciar a
margem necessária ou assegurar a recuperação dos custos sobre
os quais não têm controle. Sendo assim, foi estabelecido pelo
governo mecanismo para cobrança dessa diferença da massa de
consumidores, ou seja, foi determinado aumento da tarifa (2,9%
para os consumidores residenciais e 7,9% para os demais
consumidores) de forma que aquelas diferenças de preço sejam
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cobradas desses consumidores, ou seja, estabeleceu-se modo de
cobrança. Tanto isso é verdade que as tarifas voltarão ao patamar
original tão logo seja recuperado o montante calculado pelas
diversas distribuidoras relativo à recomposição tarifária, aos custos
da “Parcela A” e aos custos adicionais da energia livre.
Mais uma vez: o conjunto de consumidores pagará essas
diferenças de 2001, podendo ocorrer que cada um,
individualmente, poderá pagar mais ou menos, se for calculada a
proporção entre seu consumo de 2001 com o que pagará em 2002
e anos seguintes; ou seja, o “acerto de conta” não é individual.”
“Com base nas informações sumariadas (MP nº. 14 e Resolução nº.
91), e considerando o discutido no item Base para o Registro
Contábil, o IBRACON conclui que o montante da recomposição
tarifária extraordinária autorizada pelo governo, dos custos não
gerenciáveis pelas distribuidoras, da denominada “Parcela A” da
composição das tarifas e dos custos adicionais com a compra
de energia livre, caracteriza-se como um ativo e, assim, deve
ser registrado pelas distribuidoras e geradoras de energia elétrica
no resultado do exercício findo em 31 de dezembro de 2001, e que
esse registro atende aos Princípios Fundamentais de
Contabilidade dispostos na Resolução CFC nº. 750, de 29 de
dezembro de 1993, principalmente àqueles que dizem respeito ao
fato, quais sejam: o Princípio da Oportunidade (tempestividade
e integridade do registro do patrimônio e suas mutações); o
Princípio da Competência (as receitas e as despesas devem ser
incluídas na apuração do resultado do período em que ocorrerem,
sempre simultaneamente quando se correlacionarem,
independentemente do recebimento ou pagamento; e o Princípio
da Prudência (adotar o menor valor para os componentes do
ativo e o maior para os do passivo).” (grifos nossos)
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Embasada no Comunicado IBRACON 01/2002, a ANEEL, por meio
do disposto no art. 2º da Resolução nº 72/2002, estabeleceu o registro
contábil do ativo regulatório tendo como contrapartida uma conta de “receita”
no resultado, com vistas a demonstrar a recomposição do equilíbrio econômico
e financeiro, conforme segue:
“Art. 2º - O valor oriundo da recomposição tarifária extraordinária
a que se referem as Resoluções GCE nº 91, de 21 de dezembro de
2001, e ANEEL nº 31, de 24 de janeiro de 2002, deverá ser
registrado no resultado do exercício de 2001, na conta
611.01.3.1.01 – Receita de Operações com Energia Elétrica –
Fornecimento, em contrapartida do Ativo Circulante, na conta
112.01.1 – Consumidores – Fornecimento e do Realizável a Longo
Prazo, na conta 121.01.1 – Consumidores – Fornecimento.
B. FUNDAMENTAÇÃO PARA REGISTRO CONTÁBIL A PARTIR DE
2014
Como é cediço, desde a introdução das normas internacionais de
contabilidade no Brasil, os ativos e passivos regulatórios não vinham sendo
reconhecidos na contabilidade para fins societários, mas tão somente para fins
da contabilidade regulatória em virtude do não posicionamento favorável do
International Accounting Standards Board - IASB.
Dessa forma, na contabilidade societária, até a aprovação do
OCPC 08 pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e pela Comissão de
Valores Mobiliários (CVM), o total dos gastos com a “Parcela A” ficavam
registrados e demonstrados como despesa, no resultado, sem que houvesse o
reconhecimento desses valores no contas a receber decorrente do direito ao
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reequilíbrio econômico e financeiro do contrato de concessão, cuja
contrapartida seria uma receita, também no resultado.
O International Accounting Standards Board - IASB, colocou em
audiência pública, em julho de 2009, uma minuta de Pronunciamento tratando
do registro contábil dos Ativos e Passivos Regulatórios que acabou, porém,
não sendo concluída, tendo sido postergada para 2012 a manifestação da
referida entidade. Mas extraímos um trecho dessa minuta onde podemos
observar algumas condições para reconhecimento de um ativo ou passivo
regulatório, no qual uma das condições é que o custo tivesse sido INCORRIDO
EM PERÍODO ANTERIOR:
“[Minuta da] Norma Internacional de Contabilidade X Atividades
com Tarifas Reguladas
Princípio básico
1 Uma entidade deverá reconhecer em suas demonstrações
financeiras os impactos de suas atividades operacionais de
fornecimento de produtos ou serviços cujos preços estão
sujeitos à regulação por custo do serviço.
2 Esta [minuta] do IFRS exige, especificamente, que a
entidade:
(a) reconheça um ativo regulatório ou passivo regulatório
se o órgão regulador permite à entidade recuperar
custos específicos incorridos anteriormente ou requer
que ela reembolse valores cobrados anteriormente e
obtenha um retorno especificado sobre suas atividades
reguladas mediante o ajuste dos preços cobrados de seus
consumidores.”
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Apesar de toda a argumentação apresentada pelas entidades
brasileiras (CVM, IBRACON, ANEEL e CPC), o IASB não aceitou o registro
contábil dos ativos e passivos regulatórios, ficando o Comitê de
Pronunciamentos Contábeis – CPC, impedido de expedir uma norma que
tratasse do registro contábil desses valores.
No entanto, o mesmo IASB, a fim de atrair o Canadá5 para o
grupo dos países que adotaram as normas internacionais (IFRS), abriu uma
exceção, no ano de 2014, com a edição do IFRS 14, quando decidiu permitir
que as empresas que adotarem o IFRS pela primeira vez, a partir de agora,
mantenham o reconhecimento dos ativos e passivos regulatórios no balanço,
ao passo que a mesma prática é vedada para aquelas que já usam o padrão
contábil internacional há mais tempo, como é o caso das empresas brasileiras.
Apesar de os valores correspondentes aos ativos e passivos
regulatórios no setor elétrico brasileiro serem um direito ou uma obrigação
junto ao Poder Concedente, implicitamente garantido pela cláusula de
equilíbrio econômico-financeiro prevista nos contratos de concessão, a única
forma encontrada pelos representantes brasileiros junto ao IASB, para
convencer seus membros, no sentido de que fosse permitido o registro desses
valores na contabilidade brasileira, foi a de provocar um aditivo aos Contratos
de Concessão, reconhecendo que esses valores seriam indenizados ao final do
prazo da concessão. Importante lembrar que, por vários anos, esses valores já
vêm sendo reconhecidos na tarifa pela ANEEL em cada reajuste ou revisão
5 Sitio do IBRACON: “O Iasb decidiu permitir que as empresas que adotarem o IFRS pela primeira vez a partir
de agora mantenham o reconhecimento dos ativos e passivos regulatórios no balanço, ao passo que a mesma prática é
vedada para aquelas que já usam o padrão contábil internacional há mais tempo, como é caso das empresas
brasileiras.
Embora os membros do Iasb não digam isso abertamente, todos na comunidade contábil sabem que a norma foi feita
para atrair o Canadá, que não aceitaria a migração de padrão contábil sem essa possibilidade. A mudança também
agrada aos Estados Unidos, que permitem o registro dos ativos regulatórios. Mas se o objetivo do IFRS é estimular a comparabilidade dos balanços ao redor do mundo, essa exceção para os novos usuários não parece fazer sentido.
"Estou indignado", declarou o professor Eliseu Martins, integrante do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) e
que estava como diretor da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) na época em que o Brasil adotou o novo padrão
contábil. "Fizemos a adoção relativamente rápida do IFRS (em três anos) e por causa disso estamos sendo
prejudicados. Quem atrasou, se beneficiou", disse ele.(sic)
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tarifária, dada a sua condição e necessidade de equilíbrio econômico-
financeiro, já previsto no contrato de concessão.
Dessa forma, considerando que o aditivo ao contrato de
concessão seria a única solução junto ao IASB, a ANEEL colocou em audiência
pública e aprovou o aditivo que foi assinado pelas concessionárias de serviço
público de distribuição de energia elétrica, no qual constou:
CLÁUSULA PRIMEIRA - DO OBJETO
O objeto do presente Termo Aditivo é incluir dispositivo que
garanta que valores registrados na Conta de Compensação de
Variação de Valores de Itens da “Parcela A” – CVA e outros itens
financeiros sejam incorporados no cálculo da indenização, quando
da extinção da concessão, correspondente às parcelas dos
investimentos vinculados a bens reversíveis, ainda não
amortizados ou não depreciados, na forma das alterações
efetuadas na redação da Cláusula Décima Primeira do Contrato de
Concessão de Distribuição de Energia Elétrica nº 000/0000-ANEEL,
que trata da reversão dos bens e instalações vinculados,
estabelecidas na Cláusula Segunda deste Termo Aditivo.
CLÁUSULA SEGUNDA – DA REVERSÃO DOS BENS E
INSTALAÇÕES VINCULADOS
Inclui-se a Subcláusula Décima Primeira, com a redação abaixo, na
Cláusula Décima Primeira – Extinção da Concessão, Reversão dos
Bens e Instalações Vinculados do Contrato de Concessão de
Distribuição de Energia Elétrica no 0000/0000-ANEEL:
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“Subcláusula Décima Primeira - Além dos valores indenizados
referentes aos ativos ainda não amortizados dos bens
reversíveis, também serão considerados, para fins de
indenização, os saldos remanescentes (ativos ou passivos) de
eventual insuficiência de recolhimento ou ressarcimento pela
tarifa em decorrência da extinção, por qualquer motivo, da
concessão, relativos a valores financeiros a serem apurados
com base nos regulamentos preestabelecidos pelo Regulador,
incluídos aqueles constituídos após a última alteração tarifária.”
Com a assinatura do aditivo contratual, o Comitê de
Pronunciamentos Contábeis, após a análise de toda a situação e considerando
o advento do aditamento aos contratos de concessão, entendeu não mais
haver incerteza significativa que seja impeditiva para o reconhecimento dos
ativos e passivos decorrentes da metodologia de definição da tarifa de
distribuição de energia elétrica nos relatórios contábil-financeiros de propósito
geral dessas entidades em relação às normas internacionais de contabilidade
(IFRS). Assim, foi expedida a Orientação Técnica OCPC 08, que tratou do
Reconhecimento de Determinados Ativos e Passivos nos Relatórios Contábil-
Financeiros de Propósito Geral das Distribuidoras de Energia Elétrica emitidos
de acordo com as Normas Brasileiras e Internacionais de Contabilidade.
Importante descrever aqui algumas disposições contidas no
OCPC 08, que traduz a situação que procuramos retratar acima:
IN6. As normas contábeis vigentes no Brasil até 2009 permitiam o
reconhecimento de ativos e/ou passivos decorrentes dessa
diferença temporal e, dessa forma, permitiam que as
concessionárias de distribuição registrassem, no mesmo período
de competência, tanto os custos efetivamente incorridos com os
itens da Parcela A e outros componentes financeiros, quanto o
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seu direito ou obrigação de receber/pagar o diferencial ainda
não incluído na tarifa e, portanto, demonstrassem que as
flutuações entre os valores contemplados nas tarifas e os
efetivamente incorridos tinham efeitos temporários.
IN7. Quando da adoção das normas internacionais de contabilidade
– IFRS – no Brasil, a partir de 2010, os relatórios contábil-
financeiros de propósito geral dessas concessionárias passaram
a não mais contemplar o reconhecimento desses ativos e/ou
passivos com base no entendimento de que esses direitos e
obrigações não atendem plenamente às definições de ativo e
passivo contidas na Estrutura Conceitual para Elaboração e
Divulgação de Relatório Contábil-Financeiro. Tal entendimento
decorre de que (i) sua realização ou exigibilidade dependeriam
de evento futuro não totalmente controlável pela entidade – a
entrega futura de energia elétrica; e (ii) não é praticável saber,
no momento do surgimento desses direitos ou obrigações, se e
quais os efetivos compradores dessa energia no futuro que
pagariam essas diferenças ou as teriam devolvidas em suas
contas de energia elétrica.
IN8. Adicionalmente, não havia consenso quanto a se a legislação
em vigor garantia, de forma objetiva, o direito ao completo
recebimento nos casos em que o mecanismo de tarifa não fosse
suficiente para realizar o direito ou, ainda, nos casos em que a
concessão cessasse por qualquer motivo. Da mesma forma, não
havia consenso quanto à provável saída de recursos
econômicos da entidade, nos casos em que o mecanismo de
tarifa não fosse capaz de devolver aos consumidores a
totalidade dos recursos ou, ainda, nos casos em que a
concessão cessasse por qualquer motivo. Tais aspectos davam,
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no entendimento predominante até então, um caráter
contingente a tais direitos e obrigações.
IN9. Foi com base nesse cenário que, a partir da adoção das IFRS,
esses ativos e passivos passaram a ser reconhecidos
exclusivamente nas demonstrações contábeis para fins
regulatórios exigidos pela ANEEL, e não mais nos relatórios
contábil-financeiros de propósito geral formalmente emitidos e
aprovados pelos órgãos de administração, auditados e
divulgados a todos os interessados.
IN10.Para reduzir incertezas relevantes quanto ao reconhecimento e
à realização ou liquidação dos ativos e/ou passivos regulatórios
e, consequentemente, qualificá-los como passíveis de
reconhecimento nos relatórios contábil-financeiros de propósito
geral das concessionárias de distribuição de energia elétrica
brasileiras, a ANEEL decidiu, em 25 de novembro de 2014, e
com a plena aceitação posterior de cada empresa
concessionária e permissionária que quiser a isso aderir, aditar
os contratos de concessão das companhias de distribuição de
energia elétrica brasileiras.
IN11. Essa alteração nos referidos contratos, da forma como
aprovada pela diretoria da ANEEL na 13ª reunião pública
extraordinária realizada em 25 de novembro de 2014, resulta
na redução de incerteza relevante quanto à mensuração,
realização e o respectivo prazo de recuperação ou liquidação
das diferenças temporais decorrentes da definição da tarifa de
distribuição de energia elétrica – Parcela A e outros
componentes financeiros. Ressalte-se, que as alterações
aprovadas para os contratos das distribuidoras abrangem não
19
somente os ativos e passivos financeiros relativos aos itens da
Parcela A, mas, também, outros componentes financeiros que a
ANEEL venha a homologar como direito ou obrigação da
empresa distribuidora.
(grifos nossos)
Dessa forma, as concessionárias de serviço público de
distribuição de energia elétrica, que assinaram o aditivo ao contrato de
concessão, puderam realizar, já em 2014, o registro contábil desses ativos e
passivos regulatórios em sua contabilidade societária, que recebeu o mesmo
tratamento contábil determinado no ano de 2001 pela Resolução ANEEL n°
72/2002, o que também está previsto no OCPC 08 e no Manual de
Contabilidade do Setor Elétrico (Versão 2015), ou seja, os ativos e passivos
regulatórios, atendidas as disposições do OCPC 08, terão a sua contrapartida
em conta de resultado na receita de fornecimento de energia elétrica,
conforme previsto no item 14 do citado OCPC, abaixo transcrito:
14. Posteriormente ao reconhecimento inicial, os ativos e/ou
passivos financeiros originados das diferenças apuradas de
itens da Parcela A e outros componentes financeiros em cada
período contábil devem ter como contrapartida a adequada
rubrica de receita de venda de bens e serviços, no resultado
do período.
Portanto, a fundamentação para o registro do ativo ou passivo
financeiro setorial (regulatório) realizado em 2001 para o registro em 2014,
suportado pelo OCPC 08, tem como diferenciação a assinatura do aditivo ao
contrato de concessão que estabeleceu a garantia, por parte da concessionária
de serviço público de distribuição de energia elétrica, o recebimento desses
valores ao final da concessão a título de indenização.
20
Em nosso entendimento, S.M.J, essa garantia sempre existiu
face à cláusula de equilíbrio econômico e financeiro prevista nos contratos de
concessão. A norma regulatória, ao adicionar ou excluir estes valores quando
do reajuste ou revisão tarifária, já o fazia em função do equilíbrio econômico e
financeiro da concessão prevista em contrato e na própria norma do Direito
Administrativo. Assim, independentemente da existência desse aditivo
contratual, nos parece que não restavam dúvidas de que esses valores seriam
indenizados, ao final da concessão, à luz do princípio administrativo e
constitucional do equilíbrio econômico e financeiro.
IV. DA TRIBUTAÇÃO DOS ATIVOS E PASSIVOS FINANCEIROS
SETORIAIS REGISTRADOS NA CONTABILIDADE COM BASE NO
OCPC 08. APLICAÇÃO DO PARECER COSIT N° 26/2002.
Verifica-se que o registro dos ativos e passivos regulatórios com
base no OCPC 08, tendo como contrapartida uma conta de receita, em nada
difere daquele registrado em 2001, suportado pelo Comunicado IBRACON
01/2002. Ou seja, além de terem o mesmo tratamento contábil, correspondem
também a valores a serem recebidos, decorrentes da necessidade contratual
de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro a serem faturados por
futuro fornecimento de energia elétrica, sendo que o saldo não faturado será
recebido por meio de indenização ao final do prazo da concessão.
No entanto, diferentemente do ocorrido em 2001, cujos valores
para registro contábil já estavam fiscalizados e homologados pela ANEEL, os
valores dos ativos e passivos financeiros setoriais que serão incorridos até o
prazo final da concessão, deverão, antes de ser incluído na tarifa, ser
submetidos à fiscalização da ANEEL para fins de inclusão na tarifa de energia
elétrica a ser homologada quando do reajuste ou revisão tarifária, ou até
mesmo para fins de indenização ao final da concessão, quando será observado
21
o disposto na Cláusula Segunda do aditivo ao contrato de concessão assinado
em dezembro/2014.
Naquela ocasião, a Secretaria da Receita Federal, por meio de
sua Coordenação-Geral de Tributação, emitiu o Parecer COSIT n⁰ 26, de 26 de
setembro de 2002, pelo qual, considerando o Comunicado IBRACON 01/2002,
analisou a questão à luz das Normas Gerais de Direito Tributário, concluindo
que o registro contábil desses valores não configurava o fato gerador de
tributo, pois não criava a disponibilidade jurídica e econômica inerente ao fato
gerador do IRPJ e dos demais tributos reflexos a esse (CSLL, COFINS e PIS),
confirmando, assim, a inexistência da ocorrência do fato gerador. Vejamos a
solução dada:
Parecer COSIT 26/2002
“13. Inicialmente, cabe salientar que os motivos que levaram o
poder público a autorizar a cobrança da sobretarifa são
despiciendos para fins de investigação da ocorrência do fato
gerador, principalmente quando verificado que se trata,
conforme expresso na lei, de uma recomposição tarifária para
fins de restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro
dos contratos de concessão (...)
14 O fato gerador do imposto de renda não é um ato, mas, sim,
um fato econômico que cria uma disponibilidade jurídica ou
econômica. Ou seja, o fato imponível do imposto de renda é
o fato concreto, localizado no tempo e no espaço, acontecido
efetivamente no universo fenomênico, que – por
corresponder rigorosamente à descrição prévia,
hipoteticamente formulada pela hipótese de incidência legal –
22
dá nascimento à obrigação tributária6.
15 Assim, quando o § 1° do art. 113 do CTN estatui que “a
obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador”,
“fato gerador” quer dizer fato concreto, ocorrido no mundo
dos fenômenos, pois a existência de uma hipótese de
incidência, isoladamente, não faz surgir nenhuma obrigação
tributária. Para o surgimento da obrigação é necessária a
ocorrência de um fato concreto que se subsuma na hipótese
abstratamente descrita na lei.
16 Diante disso, fica claro que uma lei que institui uma
sobretarifa a ser cobrada sobre um consumo futuro de
energia, ainda que esse possa ser estimado com precisão,
não se configura fato gerador do imposto de renda. Ora, essa
própria lei, enquanto não ocorrer os fatos concretos que se
subsumam na sua própria hipótese de incidência, restará com
sua eficácia latente, ou seja, sequer os seus próprios efeitos
surtiram, quanto mais os efeitos tributários daí advindos. O
que se está a dizer é que, enquanto não ocorrer o
consumo de energia sobre o qual incidirá a sobretarifa,
nenhum efeito concreto terá surtido o art. 4º, § 1º, da
Medida Provisória nº 14, de 2001.
17 ................................................................................
18 Ocorre que as disposições quanto à inobservância do regime
de competência pressupõem, pelo menos, a ocorrência, no
mundo fenomênico, do aspecto material da hipótese de
incidência tributária. Ou seja, para que se configurasse a
inobservância, pelo contribuinte, do regime de competência
(aspecto temporal), era necessário que já tivesse ocorrido o
6 Ataliba, Geraldo. Hipótese de Incidência Tributária, ed. Malheiros, 5º ed., pág. 61.
23
fato econômico gerador da disponibilidade jurídica de renda
(aspecto material). Ora, os fatos econômicos geradores da
disponibilidade de renda só começaram a ocorrer a partir de
janeiro de 2002 – consumo mensal de energia sobre o qual
seria cobrado a sobretarifa, razão pela qual não poderia
haver reconhecimento, no ano de 2001, de uma receita que
sequer existia, já que, tanto na compra e venda como na
prestação de serviço, a disponibilidade jurídica de renda só
surge para o fornecedor com a entrega do bem ou com a
prestação do serviço.
19 Destarte, são os faturamentos resultantes da aplicação da
sobretarifa autorizada pela lei sobre o consumo de energia
que se constituem em fatos econômicos juridicamente
relevantes para a legislação do imposto sobre a renda, por
serem eles fatos concretos que geram disponibilidade jurídica
de renda para as concessionárias de energia elétrica.
20 .........................................................................
21 Melhor sorte, também, não têm aqueles que defendem, no
caso em tela, a aplicação do art. 117 do Código Tributário
Nacional - CTN, seja para sustentar a ocorrência, em
31/12/2002, de um fato gerador sob condição resolutória,
seja para asseverar que se trata de um fato gerador sob
condição suspensiva, em virtude da ulterior homologação da
cobrança da sobretarifa, a cargo da Aneel. O art. 117 do CTN,
tanto no inciso I como no II, trata da ocorrência de um
negócio jurídico, que fica com os seus efeitos, no mundo
fenomênico, submetidos, respectivamente, ou a uma
condição suspensiva ou a uma resolutiva. Logo, como não se
pode, sob pena de ofensa aos mais elementares cânones da
boa exegese, considerar uma medida provisória como um
24
negócio jurídico – ato de cunho privado, resultante das
vontades das partes – verifica-se a total improcedência de
tais entendimentos.
22 Ademais, a mera expectativa de ganho futuro, causado pela
referida medida provisória, não pode se consubstanciar em
fato gerador de renda das concessionárias de energia no ano
de 2001, pois, ainda que seja possível estimar com certa
precisão o valor do incremento de receita nos anos seguintes,
este não é líquido nem certo em 31/12/2001. Com efeito, o
valor faturado dependerá de fatos econômicos futuros e
incertos, pois variará de acordo com os consumos mensais de
energia de cada consumidor final, logo, impossível precisar,
em 31/12/2001, qualquer acréscimo patrimonial definitivo de
tais empresas.
23 Mutatis mutandis, todas as considerações expendidas, valem
também, para a Contribuição Social sobre o Lucro (CSL),
Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade
Social (Cofins) e para a Contribuição para o PIS/Pasep, já
que os seus fatos geradores, também, são fatos econômicos
que devem ocorrer no mundo fenomênico.
24 Em face do exposto, conclui-se que a receita gerada pela
aplicação da sobretarifa, de que trata o § 1º do art. 4° da
Medida Provisória nº 14, 2001, deverá compor a apuração
das bases de cálculo do imposto sobre a renda, da CSL, da
Cofins e da contribuição para o PIS, referentes aos períodos
em que ocorrer o efetivo consumo de energia sobre o qual
incidiu a cobrança da sobretarifa, à medida e na proporção de
sua efetivação, sendo os tributos apurados de acordo com a
25
lei vigente em cada um desses períodos, por força do art.
144 do Código Tributário Nacional.”
Importante observar que mesmo existindo uma cláusula no
contrato de concessão que visava assegurar o seu equilíbrio econômico e
financeiro, o que garantiria o recebimento desses ativos até então
denominados de “regulatórios”, ao final da concessão, constou do Parecer
COSIT que existia uma “mera expectativa de ganho futuro”, o que não poderia
se consubstanciar em fato gerador de renda das concessionárias de energia,
pois esses valores não eram líquidos nem certos, já que o valor a ser faturado
dependeria de fatos econômicos futuros e incertos, sujeitos a variação de
acordo com os consumos mensais de energia de cada consumidor final.
Portanto, o que precisa ser analisado e enfrentado é se as
disposições constantes do Aditivo ao Contrato de Concessão, que
garantiu o recebimento desses ativos ao final da concessão,
considerando ou não o Parecer Cosit n° 26/2002, gerará uma
disponibilidade jurídica e/ou econômica imediata, inerente ao fato
gerador do IRPJ e demais tributos a ele reflexos.
Nos contratos de concessão das concessionárias de serviço
público de distribuição de energia elétrica, além da cláusula de equilíbrio
econômico e financeiro, também está prevista a indenização dos ativos
reversíveis, vinculados à concessão do serviço público, ainda não amortizados.
No entanto, com o aditivo ao contrato de concessão assinado pelas
distribuidoras, e conforme as cláusulas abaixo transcritas, passou a ser
garantida a indenização dos valores dos ativos reversíveis, ainda não
amortizados, bem como dos valores registrados na Conta de Compensação de
Variação de Itens da “Parcela A” e de outros itens financeiros, a ser paga
quando da extinção da concessão.
26
CLÁUSULA PRIMEIRA - DO OBJETO
O objeto do presente Termo Aditivo é incluir dispositivo que
garanta que valores registrados na Conta de Compensação de
Variação de Valores de Itens da “Parcela A” – CVA e outros itens
financeiros sejam incorporados no cálculo da indenização, quando
da extinção da concessão, correspondente às parcelas dos
investimentos vinculados a bens reversíveis, ainda não
amortizados ou não depreciados, na forma das alterações
efetuadas na redação da Cláusula décima primeira do Contrato de
Concessão de Distribuição de Energia Elétrica nº 000/0000 -
ANEEL, que trata da reversão dos bens e instalações vinculados,
estabelecidas na Cláusula Segunda deste Termo Aditivo.
CLÁUSULA SEGUNDA – DA REVERSÃO DOS BENS E
INSTALAÇÕES VINCULADOS
Inclui-se a Subcláusula Décima Primeira, com a redação abaixo, na
Cláusula Décima Primeira – Extinção da Concessão, Reversão dos
Bens e Instalações Vinculados do Contrato de Concessão de
Distribuição de Energia Elétrica no 000/0000-ANEEL:
“Subcláusula Décima Primeira - Além dos valores indenizados
referentes aos ativos ainda não amortizados dos bens
reversíveis, também serão considerados, para fins de
indenização, os saldos remanescentes (ativos ou
passivos) de eventual insuficiência de recolhimento ou
ressarcimento pela tarifa em decorrência da extinção, por
qualquer motivo, da concessão, relativos a valores financeiros a
serem apurados com base nos regulamentos preestabelecidos
27
pelo Regulador, incluídos aqueles constituídos após a última
alteração tarifária.” (grifamos)
Assim, a partir da assinatura desses aditivos ao contrato de
concessão, as distribuidoras passaram a ter duas situações que permitirão o
recebimento ou devolução dos ativos e passivos regulatórios, respectivamente,
que ocorrerão em dois momentos distintos, ou seja:
a) Quando do consumo futuro de energia, cujo faturamento ocorrerá
até o término do prazo da concessão outorgada pela União Federal,
previsto nos contratos de concessão;
b) Quando do recebimento do saldo remanescente, a título de
indenização, que ocorrerá após o término do prazo da concessão
outorgada pela União Federal, previsto nos contratos de concessão.
Citaremos, como exemplo, uma concessionária de distribuição de
energia elétrica, em que a última revisão ocorreu em setembro/2013, e cujo
reajuste tenha ocorrido no mês de setembro/2014, sendo que o término do
prazo da concessão ocorrerá em setembro/2016, ou seja, em tese, serão
objetos de indenização ao final da concessão os saldos remanescentes de
ativos e passivos a serem incorporados na tarifa quando do reajuste em
setembro/2015, cujo prazo restante da concessão não venha a ser suficiente
para o seu ressarcimento via faturamento, e os ativos e passivos financeiros
setoriais que ocorreram após setembro/2015 e que não foram incluídos na
tarifa.
Resta, portanto, analisar em que momento ocorrerá o fato
gerador de cada uma dessas alternativas para fins de incidência do IRPJ, CSLL,
PIS/Pasep e Cofins, lembrando que os ativos e passivos serão incluídos na
tarifa ou serão indenizados, sempre com a fiscalização antecipada ou a
posteriori da ANEEL, com base nos regulamentos preestabelecidos.
28
Os ativos e passivos financeiros setoriais serão reconhecidos
contabilmente a medida em que eles forem incorridos, devendo ser registrados
como tais tendo como contrapartida a receita. Neste mister, entendemos que
a remuneração dos ativos e passivos regulatórios deveriam ser registrados na
mesma conta de receita em que se registraram os ativos e passivos
regulatórios, e não como receita ou despesa financeira, pois estes valores se
realizarão como “receita de fornecimento de energia elétrica” ou como “outras
receitas”, no caso de indenização, mas nunca como receita ou despesa
financeira.
Com referência à primeira situação, que seria o faturamento dos
valores dos ativos e passivos financeiros setoriais no prazo restante da
concessão, o que dependerá do consumo de energia elétrica que ocorrerá
futuramente, entendemos que é semelhante à situação já analisada no Parecer
COSIT n° 26/2002, quando da edição da Medida Provisória n° 14/2001 que,
em seu art. 4° estabeleceu o reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos
de concessão de serviço público de distribuição de energia elétrica, por meio
da recomposição tarifária extraordinária, que teve seu registro contábil como
contas a receber no ativo (circulante/longo prazo) em contrapartida no
resultado (receita), tendo a Receita Federal do Brasil, por meio desse Parecer,
concluído que a receita gerada pela aplicação da sobretarifa deveria compor a
apuração das bases de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS/Pasep e da Cofins somente
nos períodos em que ocorresse o efetivo consumo de energia sobre o qual
incidiu a cobrança da sobretarifa.
O simples reconhecimento contábil desses ativos e passivos
financeiros setoriais, e até mesmo a garantia contratual de seu recebimento,
não são suficientes para a ocorrência do fato gerador7, pois o aspecto temporal
de sua ocorrência se dará no momento da aquisição da disponibilidade
7 O valor desses ativos e passivos será revertido contabilmente à medida que ocorrer o faturamento pelo fornecimento
futuro da energia elétrica, momento em que ocorrerá o fato gerador.
29
econômica ou jurídica. Para Vittorio Cassone8, a econômica “é a faculdade de
usar, gozar e dispor de dinheiro ou de coisas nele conversíveis, entrados para
o patrimônio do adquirente por ato, fato ou negócio jurídico. É o ter de fato
(concretamente)”, e a disponibilidade jurídica “é a obtenção de direitos de
crédito, não sujeitos à condição suspensiva (representados por títulos ou
documentos de liquidez e certeza, que podem ser convertidos em moeda ou
equivalente). É o ter.”
Com referência a segunda situação, é importante repisar que a
assinatura do aditivo contratual garantiu o recebimento dos ativos e passivos
financeiros setoriais; no entanto, não se sabe exatamente qual o valor a ser
recebido, a título de indenização, ao final da concessão9. Além do mais, esse
valor precisará ser apurado com base nos regulamentos preestabelecidos pelo
Regulador, incluídos aqueles constituídos após a última alteração tarifária,
conforme consta da Cláusula segunda do Aditivo ao Contrato de Concessão. O
recebimento se dará por meio de INDENIZAÇÃO, o que só ocorrerá após a
aprovação do valor desses ativos e passivos em conjunto com o valor dos bens
reversíveis, que se submeterá à prévia fiscalização da Agência Nacional de
Energia Elétrica (ANEEL), momento este em que ocorrerá a disponibilidade
econômica e jurídica da renda.
Ressalte-se que a cada mês serão gerados novos ativos e
passivos financeiros setoriais, ou seja, não será o valor registrado em 2014,
que provavelmente será indenizado ao término da concessão, até mesmo
porque parcelas desses ativos e passivos regulatórios estarão sendo incluídos
nos faturamentos de consumos futuros até o último reajuste que venha a
ocorrer durante o prazo final da concessão, observado o disposto no art. 10 da
8 Direito Tributário – Ed. Atras, 15ª. Ed. – 2002 – P. 257. 9 Dependendo da data da indenização da concessão, os ativos e passivos a serem indenizados ao final da concessão
ainda irão incorrer, já que o término dos prazos da concessão, no exemplo citado, será em setembro/2016.
30
Lei n° 8.631/199310. Assim, somente os ativos que não foram recebidos por
meio da tarifa serão objeto de tributação quando da indenização.
A seguir abordaremos a questão relacionada à disponibilidade
econômica e jurídica da renda, que caracteriza o fato gerador, de forma a
fundamentar nosso entendimento manifestado acima, referente às duas
situações que poderão ocorrer. Inicialmente, é essencial recorrer a conceitos
básicos da legislação tributária, especialmente do Código Tributário Nacional –
CTN, senão vejamos:
“Art. 113 - A obrigação tributária é principal ou acessória.
§ 1 - A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador,
tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e
extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
(...)”
Na seqüência, o art. 114 do CTN consagra o seguinte:
“Art. 114 - Fato gerador da obrigação principal é a situação
definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.”
A expressão fato gerador, consagrada pelo Código Tributário
Nacional, apesar da oposição de parte da doutrina, “há que
significar, sempre, a descrição normativa de um evento que,
concretizado no nível das realidades materiais, fará irromper o
10 Art. 10. O inadimplemento, pelas concessionárias, pelas permissionárias e pelas autorizadas no recolhimento das
parcelas das quotas anuais de Reserva Global de Reversão - RGR, Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica - PROINFA, Conta de Desenvolvimento Energético - CDE, Conta de Consumo de Combustíveis -
CCC, compensação financeira pela utilização de recursos hídricos e outros encargos tarifários criados por lei, bem
como no pagamento pela aquisição de energia elétrica contratada de forma regulada e da Itaipu Binacional, acarretará
a impossibilidade de revisão, exceto a extraordinária, e de reajuste de seus níveis de tarifas, assim como de
recebimento de recursos provenientes da RGR, CDE e CCC.” (grifo nosso)
31
vínculo abstrato que o legislador estipulou na conseqüência”.11
(grifos nossos)
Trazendo tal definição para o âmbito do Imposto de Renda, por
exemplo, partimos da hipótese normativa da disponibilidade econômica ou
jurídica da renda, para que, então, já na realidade fática, verificando-se a
ocorrência concreta da referida disponibilização, nos moldes previstos pela
regra-matriz de incidência tributária, aplique-se a consequência nela prevista.
O art. 43 do CTN, que define o fato gerador do Imposto de
Renda, é do seguinte teor:
“Art. 43 – O imposto, de competência da União, sobre a renda e
proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição
da disponibilidade econômica ou jurídica:
i. De renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho
ou da combinação de ambos;
ii. De proventos de qualquer natureza, assim entendidos os
acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso
anterior.”
Ocorre que o conceito de disponibilidade, utilizado no dispositivo
acima transcrito, não está formalizado em nenhum dispositivo legal, não foi
transportado de construções doutrinárias preexistentes ao Código Tributário
Nacional, nem tampouco se trata de um conceito próprio da Ciência
Econômica. Trata-se de um conceito meramente jurídico, que nasceu com o
CTN, sem qualquer referência anterior no âmbito do Direito. Por isso, a fim de
examinarmos o seu conteúdo, recorremos, inicialmente, a dicionários da
11 CARVALHO, Paulo de Barros – Curso de Direito Tributário, Saraiva, 10ª ed., São Paulo, 1998.
32
Língua Portuguesa. A definição ali encontrada diz respeito “à qualidade do que
pode ser negociado e convertido para o patrimônio do comprador”.
No entanto, cumpre distinguir o que é economicamente
disponível do que é financeiramente disponível. Para o primeiro conceito,
basta que a riqueza seja passível de conversão em dinheiro; para o segundo, a
possibilidade de conversão deve ser imediata.
“Portanto, renda disponível economicamente seria toda a riqueza
nova, em bens ou em dinheiro, livre e usualmente negociada no
mercado”.12
Nesse sentido, importante trazer à baila a jurisprudência do C.
Superior Tribunal de Justiça – STJ, a respeito do conceito, in verbis:
[...]
TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DE CRÉDITOS DE ICMS DA BASE DE CÁLCULO
DO IRPJ E DA CSLL. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
3. Conforme dispoe o art. 43 do CTN, o fato gerador do imposto de
renda é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda,
proventos de qualquer natureza ou acréscimos patrimoniais.
4. “Não se deve confundir disponibilidade econômica com disponibilidade
financeira da renda ou dos proventos de qualquer natureza. Enquanto
esta última se refere à imediata ‘utilidade’ da renda, a segunda está
atrelada ao simples acréscimo patrimonial, independentemente da
existência de recursos financeiros.
[...]
(AgRg noREsp 1.266.868/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,
SEGUNDA TURMA, DJe de 10/05/2013)
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211/STJ. EXCLUSÃO DOS
12 LEMKE, Gisele – Imposto de Renda: os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. Dialética, São
Paulo, 1998.
33
CRÉDITOS DE ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA
PESSOA JURÍDICA – IRPJ E DA CONSTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O
LUCRO LÍQUIDO – CSLL. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
2. O fato gerador do imposto de renda é a aquisição da disponibilidade
econômica ou jurídica de renda, proventos de qualquer natureza ou
acréscimos patrimoniais (art. 43, do CTN).
3. “Não se deve confundir disponibilidade econômica com disponibilidade
financeira da renda ou dos proventos de qualquer natureza. Enqanto
esta última se refere à imediata ‘utilidade’ da renda, a segunda está
atelada ao simples acréscimo patrimonial, independentemente da
exisência de recursos financeiros” (REsp. Nº 983.134 – RS, Segunda
Turma, Rel Min. Castro Meira, julgado em 3.4.2008)
[...]
(REsp 859322/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, DJe de 06/10/2010).
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O
LUCRO. EMPRESAS CONTROLADAS SITUADAS NO EXTERIOR.
DISPONIBILIDADE ECONÔMICA E JURÍDICA DAS RENDA. ARTS. 43, §2º,
DO CTN E 74 DA MP 2.158-35/2001.
(...)
4. Não se deve confundir disponibilidade econômica com disponibilidade
financeira da renda ou dos proventos de qualquer natureza. Enquanto
esta última se refere à imediata “utilidade” da renda, a segunda está
atrelada ao simples acréscimo patrimonial, independentemente da
existência de recursos financeiros. [...]
(Resp 983.134/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe
de 17/04/2008).
A disponibilidade jurídica, por outro lado, diz respeito à
disponibilidade econômica presumida por força de lei, e existe, tão-somente,
quando o beneficiário dos rendimentos possui título que lhe permite obter a
respectiva realização em dinheiro.
34
A conjugação das expressões “disponibilidade econômica” e
“disponibilidade jurídica” permite, em última análise, que os princípios
informadores do Sistema Tributário sejam atendidos. Neste sentido temos:
“(...)
[que exista] um consenso segundo o qual os contribuintes
consentem numa tributação que incide sobre a renda representada
por moeda ou por bens e direitos facilmente (mesmo que não
imediatamente) negociáveis no mercado (para troca por moeda),
mas não na tributação de direitos de crédito, a não ser quando seja
razoável presumir, por alguma razão concreta, que estes venham a
ser convertidos em pecúnia na data aprazada”. 13
Neste cenário, não é possível entender que os ativos e passivos
financeiros setoriais, cuja cobrança ocorrerá no período restante da concessão
sobre o consumo futuro de energia elétrica14, represente um direito passível de
ser convertido em dinheiro ou exigido do devedor, mesmo porque não se
conhece o devedor, dado que o direito ao referido faturamento só se realizará
se ocorrer consumo futuro; tal não ocorrendo, teremos o seu recebimento
por meio da INDENIZAÇÃO, que possui natureza jurídica distinta, e que
ocorrerá somente ao final do prazo da concessão, cujo valor dependerá de
apuração com base nos regulamentos preestabelecidos pelo Órgão Regulador.
Os fatos econômicos geradores da disponibilidade de renda só
começarão a ocorrer a partir do consumo mensal de energia sobre o qual será
aplicada uma tarifa, na qual estará incluso esses ativos e passivos. Tanto na
compra e venda como na prestação de serviço, a disponibilidade jurídica de
renda só surge para o fornecedor com a entrega do bem ou com a prestação
do serviço.
13 LEMKE, ob.cit., p. 116 14 Além do mais, estes valores, registrados como ativos e passivos financeiros setoriais, serão revertidos contabilmente à
medida que ocorrer o fornecimento futuro da energia elétrica com a tarifa na qual estarão incluídos. Neste momento
ocorrerá o fato gerador.
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Nesse sentido, Harada15 assim aborda a questão: “Pela própria
conceituação constitucional e legal do imposto, o elemento objetivo de seu fato
gerador só pode ser a renda ou proventos no sentido de riquezas novas, de
acréscimos patrimoniais, que decorrem de algo preexistente: a fonte
produtora.16 Isso não significa ignorar a disjunção estabelecida em lei entre as
duas espécies de disponibilidade. A disponibilidade econômica consiste no
acréscimo patrimonial decorrente de uma situação de fato, ocorrendo no
instante em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias
a que produza esse efeito (art. 116, I, do CTN), ao passo que a
disponibilidade jurídica consiste no direito de usar, por qualquer forma,
da renda e dos proventos definitivamente constituídos nos termos do
direito aplicável (art. 116, II, do CTN).17”.
Para Hugo de Brito, “Entende-se por disponibilidade econômica a
possibilidade de dispor, possibilidade de fato, material, direta, da riqueza.
Possibilidade de direito e de fato, que se caracteriza pela posse livre e
desembaraçada da riqueza. Configura-se pelo efetivo recebimento da renda ou
dos proventos. Como assevera Gomes de Sousa, na linguagem de todos os
autores que tratam do assunto, “disponibilidade econômica corresponde a
rendimento (ou provento) realizado, isto é, dinheiro em caixa””.18 Já a
disponibilidade jurídica, na lição do mesmo autor, configura-se, em princípio,
pelo crédito disponível da renda ou dos proventos. Enquanto a disponibilidade
econômica corresponde ao rendimento realizado, a disponibilidade jurídica
15 Harada, Kiyoshi e Harada, Marcelo Kiyoshi – Código Tributário Nacional Comentado – Ed. Rideel – 2012. P. 61. 16 Rubens Gomes de Souza, autor do anteprojeto da lei que se converteu no CTN, afirmou a respeito: “Explicitado o
dispositivo transcrito (art. 43 do CTN), sublinho que, tanto se tratando de “renda” como de “proventos”, o elemento
essencial do fato gerador é aquisição de disponibilidade de riqueza nova, definida em termos de acréscimo patrimonial” (Pareceres 3 – Imposto de Renda. São Paulo: Resenha Tributária, 1975. P. 277). 17 A EC n° 3/1993 acrescentou o § 7° ao art. 150 da CF, pelo qual “a lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação
tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer
posteriormente, assegurado a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador
presumido”. 18 MACHADO, Hugo de Brito. Comentários ao Código Tributário Nacional. 2ª ed. Atlas, 2007, p. 448.
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corresponde ao rendimento adquirido, isto é, ao qual o beneficiário tem título
jurídico que lhe permite obter a respectiva realização em dinheiro.
A exemplo do recebimento dos ativos, durante o prazo restante
da concessão, que dependerá do fornecimento futuro da energia elétrica,
momento em que entendemos que ocorrerá a disponibiliade econômica e
jurídica, da mesma forma, entendemos que a garantia de indenização ao final
do prazo de concessão também não é um direito passível de ser convertido em
dinheiro ou exigido da União Federal de imediato, que possa caracterizar a
ocorrência do fato gerador.
Além do mais, os ativos e passivos financeiros setoriais
registrados em 2014, não deverão ser aqueles a serem apurados ao final do
prazo da concessão com base nos regulamentos preestabelecidos pelo
Regulador, já que haverá novos ativos e passivos que surgirão a cada mês e
também após a última alteração tarifária que venha a ocorrer, conforme
previsto na ,Cláusula Segunda do Aditivo Contratual bem como ocorrerá
faturamentos futuros nos quais estarão inseridos parte desses valores.
Isto ocorre porque, conforme visto, o fato gerador em questão
não é um ato, mas um fato concreto, que deve ocorrer no mundo dos
fenômenos e que, para operar seus efeitos, não pode ser presumido como
ocorrido em função da efetivação de um ato contratual que assegurou às
concessionárias de distribuição o direito à indenização dos valores dos saldos
remanescentes (ativos ou passivos) de eventual insuficiência de recolhimento
ou ressarcimento pela tarifa em decorrência da extinção, por qualquer motivo,
da concessão.
A simples garantia de recebimento ou devolução desses ativos e
passivos, respectivamente, não é suficiente para a ocorrência do fato gerador,
pois não gera uma disponibilidade econômica ou jurídica. Aliás, a ausência de
disponibilidade jurídica e econômica é consequência natural da aplicação do
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disposto no art.116, I do CTN19, já que, enquanto inexistente, não se poderá
considerar ocorrido o fato gerador.
V. CONCLUSÃO:
De todo o exposto, concluímos que:
a) Os consumos de energia futuros sujeitos à tarifa, na qual terá a
inserção dos ativos e passivos financeiros setoriais nos reajustes
e revisões tarifárias, observando o disposto no art. 10 da Lei n°
8.631/1993, bem como o crédito ou o recebimento do valor da
indenização, após a apuração, por meio de fiscalização, com
base nos regulamentos preestabelecidos pelo Regulador, é que
se constituirá em fatos econômicos juridicamente relevantes
para a legislação do imposto de renda, por serem eles fatos
concretos que geram disponibilidade jurídica de renda para as
concessionárias de serviço público de distribuição de energia
elétrica, já que apenas a partir da ocorrência dessas situações
tornar-se-a passível a conversão em dinheiro e de ser exigido,
seja do consumidor ou da União Federal, que serão os
devedores.
b) Os valores registrados na contabilidade societária em 2014 e em
períodos subsequentes, a título de “Ativos e Passivos Financeiros
Setoriais (Regulatórios)”, em contas a receber no ativo circulante
ou contas a pagar no passivo circulante, tendo como
contrapartida conta de receita, em atendimento ao OCPC 08 –
Reconhecimento de Determinados Ativos e Passivos, aprovado
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Art. 116 - Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos: I - tratando-se de situação de fato, desde o momento em que se verifiquem as circunstâncias materiais necessárias a que
produza os efeitos que normalmente lhe são próprios;
(…)
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pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC) por meio da
Norma Brasileira de Contabilidade – Comunicado Técnico CTG n°
08, de 05 de dezembro de 2014, e pela Deliberação CVM n° 732,
de 09 de dezembro de 2014, serão tributados, pelo IRPJ, quando
da concretização do seu fato gerador pela aquisição da
disponibilidade econômica e/ou jurídica que se dará em dois
momentos distintos:
Quando do faturamento do consumo futuro de energia
elétrica20, com a tarifa que contemplará os ativos e passivos
financeiros setoriais face aos reajustes e revisões tarifárias,
que ocorrerá até o término do prazo da concessão outorgada
pela União Federal, previsto nos contratos de concessão, ou
após a prorrogação da concessão, caso venha a ocorrer;
Quando do crédito ou recebimento, o que ocorrer primeiro, do
valor da indenização apurado com base nos regulamentos
preestabelecidos pela ANEEL, que ocorrerá após o término do
prazo da concessão outorgada pela União Federal, incluídos
aqueles constituídos após a última alteração tarifária,
conforme previsto na Cláusula Segunda do Aditivo Contratual.
c) A remuneração dos ativos e passivos financeiros setorial,
independentemente de estar contabilizado como receita ou
despesa financeira, ou na mesma conta de receita na qual está
registrado o próprio ativo e passivo financeiro setorial, também
serão oferecidos à tributação no mesmo momento em que
ocorrer a tributação do ativo e passivo que lhe deram origem,
conforme citado na letra “b” acima;
20 Nesse momento é que ocorre o fato gerador, tanto é que ocorrerá a reversão contábil dos valores dos ativos e passivos
registrados com base no OCPC 08.