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Page 1: Modernismo
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Alguns dos participantes da Semana de Arte Moderna

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Os anos percussores

1912: Oswald de Andrade retorna da Europa impregnado do Futurismo de Marinetti: “estamos atrasados cinquenta anos em cultura, chafurdados ainda em pleno Parnasianismo”

1913: Lasar Segall, pintor lituano, realiza “a primeira exposição de pintura não acadêmica em nosso país” (comentário de Mário de Andrade)

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Os anos percussores

1915: organização da revista Orpheu, com manifestos e poemas do Modernismo português, por Luis Montalvor e Ronald de Carvalho;

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Os anos percussores

1917:Mário publica, em protesto à Primeira Guerra, Há uma gota de sangue em cada poema

Menotti del Picchia publica Moisés e Juca Mulato;

Manuel Bandeira publica A cinza das horas

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Os anos percussores

O músico francês Darius Milhaud, que vive no Rio, entusiasma-se com o maxixe, o samba e os chorinhos de Ernesto Nazaré, encontra-se com o jovem Heitor Villa-Lobos, este já encantado com a moderna música francesa via Stravinski;

Segunda exposição de Anita Malfatti, exibindo quadros expressionistas, criticados duramente por Monteiro Lobato, no jornal O estado de São Paulo

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Há uma gota de sangue em cada poema

Assim como há resquício de barroNas estradas asfaltadasE ruínas pelo impacto das guerras                                             e catástrofesHá em cada poema uma lágrima;

Assim como ecoam aplausos e vaiasDa grande semana!  Onde sobramPedaços mastigados na antropofagiaMário não desperdiçaria uma ideiaSem que esfacelasse fontes, rituais e oferendas.

Há uma gota de suor em cada letraE em cada verso um gozo de dorPor que sempre a dor do poeta?Simples...  É exatamente aí que sucumbiAs mágoas de exprimir pelo dom;E despedir a força vital paulatinamente...

(Mário Sobral/Mário de Andrade)

Page 8: Modernismo

1

Nuvens voam pelo ar como bandos de garças, Artista boêmio, o sol, mescla na cordilheira pinceladas esparsas  de ouro fosco.  Num  mastro, apruma-se a bandeira de São João, desfraldando o seu alvo losango.

Juca Mulato cisma. A sonolência vence-o

Vem, na tarde que expira e na voz de um curiango, o narcótico do ar parado, esse veneno que há no ventre da treva e na alma do silêncio. Um sorriso ilumina o seu rosto moreno.

No piquete relincha um poldro; um galo álacre tatala a asa triunfal, ergue a crista de lacre, clarina a recolher entre varas de cerdos e mexem-se ruivos bois processionais e lerdos e, num magote escuro, a manada se abisma na treva.

Anoiteceu.

Juca Mulato cisma. (Menoti del Picchia)

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Alguns poemas de A cinza das horas

DESENCANTO 

Eu faço versos como quem choraDe desalento. . . de desencanto. . .Fecha o meu livro, se por agoraNão tens motivo nenhum de pranto. 

Meu verso é sangue. Volúpia ardente. . .Tristeza esparsa... remorso vão...Dói-me nas veias. Amargo e quente,Cai, gota a gota, do coração. 

E nestes versos de angústia rouca,Assim dos lábios a vida corre,Deixando um acre sabor na boca. 

- Eu faço versos como quem morre. 

Teresópolis, 1912.

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Alguns poemas de A cinza das horas

EPÍGRAFE

Sou bem-nascido. Menino,Fui, como os demais, feliz. Depois, veio o mau destinoE fez de mim o que quis. 

Veio o mau gênio da vida,Rompeu em meu coração,Levou tudo de vencida,Rugia e como um furacão, 

Turbou, partiu, abateu,Queimou sem razão nem dó -Ah, que dor!Magoado e só,- Só! - meu coração ardeu: 

Ardeu em gritos dementesNa sua paixão sombria...E dessas horas ardentesFicou esta cinza fria.- Esta pouca cinza fria. 

1917. 

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A exposição de Anita Malfatti

A estudante

A boba

Mário

O farol

Fotografia da pintora

Page 12: Modernismo

Paranóia ou mistificação?A propósito da Exposição Malfatti

Monteiro Lobato

 Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêm as coisas e em conseqüência fazem arte pura, guardados os eternos ritmos da vida, e adotados, para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestre.

     Quem trilha esta senda, se tem gênio é Praxiteles na Grecia, é Rafael na Itália, é Reynolds na Inglaterra, é Dürer na Alemanha, é Zorn na Suécia, é Rodin na França, é Zuloaga na Espanha. Se tem apenas talento, vai engrossar a plêiade de satélites que gravitam em torno desses sóis imorredoiros.

     A outra espécie é formada dos que vêm anormalmente a natureza e a interpretam à luz das teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência; são frutos de fim de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz do escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento.

(...)

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Os “festivais”

Foram três os “festivais” da Semana, dias 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922.

1º dia: Graça Aranha profere a conferência A emoção estética na arte moderna.

2º dia: defesa do ideário modernista por Menotti del Picchia.

3º dia: amostras de arte de Vitor Brecheret, conferência de Renato de Almeida.

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1º dia: Graça Aranha profere a conferência A emoção estética na arte moderna

Para muitos de vós a curiosa e sugestiva exposição que gloriosamente inauguramos hoje, é uma aglomeração de "horrores". Aquele Gênio supliciado, aquele homem amarelo, aquele carnaval alucinante, aquela paisagem invertida se não são jogos da fantasia de artistas zombeteiros, são seguramente desvairadas interpretações da natureza e da vida. Não está terminado o vosso espanto. Outros "horrores" vos esperam. Daqui a pouco, juntando-se a esta coleção de disparates, uma poesia liberta, uma música extravagante, mas transcendente, virão revoltar aqueles que reagem movidos pelas forças do Passado. Para estes retardatários a arte ainda é o Belo.

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Algumas obras de Tarcila do Amaral

Fotografia da pintora

Abaporu

Operários

Le manteau rouge

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Características: Na poesia:1. Utilização do verso livre;2. Blague (poema piada), bom humor, ironia;3. Livre associação de ideias;4. Irreverência;5. Valorização do cotidiano;6. Incorporação do presente;7. Humor;8. Aproximação com a prosa9. Linguagem coloquial;10. Nacionalismo.

Page 17: Modernismo

Características:

Na prosa:1. Utilização de períodos curtos;2. Apoio na fala coloquial;3. Aproximação com a poesia.

Page 18: Modernismo

A fase heroica (1922-1930) Poesia Pau-Brasil (1924): Oswald de Andrade e Tarsila do

Amaral; Movimento antropofágico (1928): inspi- rado no Abaporu: assimilação crítica de todas as influências estrangeiras (desde a colonização até às vanguardas artísticas europeias) e sua

“digestão” para recriar a história brasileira. Verde-Amarelismo (1925-6) e Grupo Anta (1926-9): defesa

do nacionalismo e da ingenuidade da pátria-mãe – postura conservadora, próxima ao Integracionalismo (nazi-fascimo).

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Principais autores modernistas

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OSWALD DE ANDRADE

Page 21: Modernismo

Manifesto da Poesia Pau-Brasil

"A poesia existe nos fatos. Os casebres de açafrão e de ocre nos verdes da Favela, sob o azul cabralino, são fatos estéticos. [...] (1)

Contra o gabinetismo, a prática culta da vida.[...] (2) A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica.

A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos. (3)

O trabalho contra o detalhe naturalista - pela síntese; contra a morbidez romântica - pelo equilíbrio geômetra e pelo acabamento técnico; contra a cópia, pela invenção e pela surpresa.[...] Nenhuma fórmula para a contemporânea expressão do mundo. Ver com olhos livres.[...](4)

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As propostas modernistas de Oswald

(1) Defesa da liberdade temática e da ampliação dos temas poéticos, destacando as paisagens nacionais pobres e anônimas.

(2) Crítica à cultura elitista, que se isola das massas nos gabinetes e nas academias.

(3) Defesa da liberdade linguística, por meio da aproximação entre fala – cujos “erros” na verdade são possibilidades expressivas – e escrita.

(4) Rejeição ao passadismo literário e à mentalidade de cópia; defesa da conciliação entre a cultura primitiva e a atitude intelectualizada (a síntese, o equilíbrio, a invenção, a surpresa).

Page 23: Modernismo

Vício na fala

Para dizerem milho dizem mioPara melhor dizem mióPara pior pióPara telha teiaPara telhado teiado

E vão fazendo telhados.

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3 de maio

Aprendi com meu filho de dez anosQue a poesia é a descobertaDas coisas que nunca vi.

(Pau-Brasil)

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3 de maio

Aprendi com meu filho de dez anosQue a poesia é a descobertaDas coisas que nunca vi.

(Pau-Brasil)

1. Verso livre

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3 de maio

Aprendi com meu filho de dez anosQue a poesia é a descobertaDas coisas que nunca vi.

(Pau-Brasil)

1. Verso livre2. Tom de prosa

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3 de maio

Aprendi com meu filho de dez anosQue a poesia é a descobertaDas coisas que nunca vi.

(Pau-Brasil)

1. Verso livre 3. metalinguítico2. Tom de prosa

Page 28: Modernismo

3 de maio

Aprendi com meu filho de dez anosQue a poesia é a descobertaDas coisas que nunca vi.

(Pau-Brasil)

1. Verso livre 3. metalinguítico2. Tom de prosa 4. ingenuidade,

surpresa (universo infantil)

Page 29: Modernismo

Pronominais

Dê-me um cigarroDiz a gramáticaDo professor e o alunoe do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom brancoDa Nação BrasileiraDizem todos os diasDeixa disso meu camaradaMe dá um cigarro

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Pronominais

Dê-me um cigarroDiz a gramáticaDo professor e o alunoe do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom brancoDa Nação BrasileiraDizem todos os diasDeixa disso meu camaradaMe dá um cigarro

VALORIZAÇÃO DA LINGUAGEM

COLOQUIAL

Page 31: Modernismo

O capoeira

- Que apanhá soldado?- O quê?- Que apanhá?Pernas e cabeças na calçada.

Page 32: Modernismo

O capoeira

- Que apanhá soldado?- O quê?- Que apanhá?Pernas e cabeças na calçada.

Luta sugerida por um diálogo Relâmpago...

Page 33: Modernismo

O capoeira

- Que apanhá soldado?- O quê?- Que apanhá?Pernas e cabeças na calçada.

...que é tipicamente popular...

Page 34: Modernismo

O capoeira

- Que apanhá soldado?- O quê?- Que apanhá?Pernas e cabeças na calçada.

Uso da metonímia: parte pelo todo, sugerindo o

movimento de uma luta (capoeira)

Page 35: Modernismo

O capoeira

- Que apanhá soldado?- O quê?- Que apanhá?Pernas e cabeças na calçada.

Estilo telegráfico, precursor, segundo Antonio Candido, da montagem na poesia (cinema)

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Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

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Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

Paródia do poema “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias (no Romantismo, o nacionalismo era ufanista e idealizador)

Page 38: Modernismo

Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

Paródia do poema Canção do Exílio, de Gonçalves Dias (no Romantismo, o nacionalismo era ufanista e idealizador)

Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá; As aves, que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá.Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores.(...)Não permita Deus que eu morra, Sem que eu volte para lá; Sem que disfrute os primores Que não encontro por cá; Sem qu'inda aviste as palmeiras, Onde canta o Sabiá. De Primeiros cantos (1847)

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Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

Nacionalismo crítico:Referência à Zumbi Palmares (personagem histórico que

denuncia as feridas da pátria)

escravidão

Page 40: Modernismo

Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

Valorização do pregresso em

vez da valorização da

natureza (como era no texto

original)

Page 41: Modernismo

Canção de Regresso à Pátria

Minha terra tem palmaresOnde gorjeia o marOs passarinhos daquiNão são como os de lá

Minha terra tem mais rosasE quase que mais amoresMinha terra tem mais ouroMinha terra tem mais terra

Ouro terra amor e rosasEu quero tudo de láNão permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para São PauloSem que eu veja a Rua 15E o progresso de São Paulo

Sem pontuação. Observe “Ouro terra

amor e rosas”

Relativização do nacionalismo

romântico

Page 42: Modernismo

Outros textos de Oswald:

Crônica

Era uma vezo mundo

Page 43: Modernismo

Amor: humor

Page 44: Modernismo

Serafim Ponte Grande (1929)

Romance experimental, por colagem, causando estranhamento no leitor;

Fragmentado (sem capítulos tradicionais); Mistura de vários estilos:

prosa...poesia...carta...cartilha escolar... Satirização de vários estilos literários

(Romantismo, Realismo-Naturalismo, Parnasianismo)

Page 45: Modernismo

Enredo de “Serafim Ponte Grande”

Um homem aparentemente “comum” que se casa na polícia e se torna funcionário público de uma repartição de saneamento chamada Escarradeira. Rouba, contudo, o dinheiro da Revolução, viaja à Europa e ao Oriente, onde “libera” toda sua energia e depois volta a São Paulo, onde é morto enquanto a polícia o persegue por um raio. A família e os amigos constroem um hospício em homenagem a Serafim e seu melhor amigo, Pinto Calçudo, continua a viagem-erótica indefinidamente, num navio fantasma chamado EL Durasmo ...

(O enredo absurdo do romance aproxima a proposta de Oswald ao Dadaísmo)

Page 46: Modernismo

Serafim é um anti-herói da literatura brasileira (ao lado de outras figuras da literatura nacional como Leonardo e Macunaína):

É individualista;

Page 47: Modernismo

Serafim é um anti-herói da literatura brasileira (ao lado de outras figuras da literatura nacional como Leonardo e Macunaína):

É individualista;Sensual;

Page 48: Modernismo

Serafim é um anti-herói da literatura brasileira (ao lado de outras figuras da literatura nacional como Leonardo e Macunaína):

É individualista;Sensual;Malandro.

Page 49: Modernismo

Romance antropofágico:

Devorador do que corrompe a felicidade do homem e

propõe:

Epicurismo(prazer como bem

supremo)

Iconoclastia(destruição dos mitos)

Hedonismo(saúde do corpo e sossego através da

luxúria)

Page 50: Modernismo

Tom jocoso (vide trecho de Serafim abaixo)

Primeiro contato de Serafim e a malícia:a- e – i – o – u ba – be – bi – bo – bu ca – ce – ci – co - cu

Page 51: Modernismo

MÁRIO DE ANDRADE

Page 52: Modernismo

Prefácio interessantíssimo (fragmentos)Leitor:  

Está fundado o Desvairismo.   Este prefácio, apesar de interessante, inútil. 

[...]

Aliás muito difícil nesta prosa saber onde termina a blague, onde principia a seriedade. Nem eu sei.   E desculpem-me por estar tão atrasado dos movimentos artísticos atuais. [...] Ninguém pode se libertar duma só vez das teorias-avós que bebeu [...]

Não sou futurista (de Marinetti). Disse e repito-o. Tenho pontos de contacto com o futurismo. [...]

A inspiração é fugaz, violenta. Qualquer impecilho a perturba e mesmo emudece. Arte, que, somada a Lirismo, dá Poesia, não consiste em prejudicar a doida carreira do estado lírico para avisa-lo das pedras e cercas de arame do caminho. Deixe que tropece, caia e se fira. Arte é mondar mais tarde o poema de repetições fastientas, de sentimentalidades românticas, de pormenores inúteis ou inexpressivos. [...]

Belo da arte: arbitrário, convencional, transitório - questão de moda. Belo da natureza: imutável, objetivo, natural - tem a eternidade que a natureza tiver. [...]  

Page 53: Modernismo

As propostas modernistas de Mário

(1) Tom irônico do texto, aproximando-o do Dadaísmo.

(2) Incorporação crítica das Vanguardas, uma vez que nelas o lirismo constitui apenas uma das faces da criação artística, antecipando o conceito de escrita automática do surrealista André Breton (1924).

(3) Criação, a partir de termos emprestados da música, da polifonia poética: um poema deve combinar melodias (estruturas gramaticais lineares) e harmonia (estruturas associativas que dão impressão de simultaneidade) tornando-o polifônico.

(4) Proposta de criação de uma linguagem brasileira, por meio da incorporação de elementos da oralidade da fala popular ao texto literário.

(5) Ênfase no tom niilista da vanguarda dadaísta (“desvairismo”), por meio da negação da criação de escolas poéticas, discípulos etc.

Page 54: Modernismo

Pauliceia desvairada (1922)

Minha Londres das neblinas finas! Pleno verão. Os dez mil milhões de rosas paulistanas.

Há neves de perfume no ar Faz frio, muito frio...

E a ironia das pernas das costureirinhasParecidas com bailarinas...O vento é como uma navalhaNas mãos de um espanhol. Arlequinal!Há duas horas queimou o Sol.Daqui a duas horas queima o Sol

Page 55: Modernismo

“Eu sou um escritor difícil Que a muita gente enquizila, Porém essa culpa é fácil De se acabar duma vez: É só tirar a cortina Que entra luz nesta escurez.”

Page 56: Modernismo

"Brasil amado não porque seja a minha pátria,Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der...brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventurosoo gosto dos meus descansos,o balanço das minhas cantigas, amores e danças.brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,porque é o meu sentimento muito pachorrento,porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir."

(trecho de "O poeta come amendoim“, de Clã do Jaboti, 1927)

Page 57: Modernismo

"Brasil amado não porque seja a minha pátria,Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der...brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventurosoo gosto dos meus descansos,o balanço das minhas cantigas, amores e dansas.brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,porque é o meu sentimento muito pachorrento,porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir."

Ortografia criativa

Page 58: Modernismo

"Brasil amado não porque seja a minha pátria,Pátria é acaso de migrações e do pão-nosso onde Deus der...brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventurosoo gosto dos meus descansos,o balanço das minhas cantigas, amores e dansas.brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,porque é o meu sentimento muito pachorrento,porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir.“ nacionalismo crítico

Page 59: Modernismo

Eu sou trezentos...

(...) Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta,

Mas um dia afinal eu toparei comigo... Tenhamos paciência, andorinhas curtas, Só o esquecimento é que condensa, E então minha alma servirá de abrigo.

Remate dos males, 1930

Page 60: Modernismo

Macunaíma (1928) Publicado numa tiragem de apenas oitocentos

exemplares (Mário de Andrade não conseguira editor), Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, é uma das obras pilares da cultura brasileira. Numa narrativa fantástica e picaresca, ou, melhor dizendo, “malandra”, herdeira direta das Memórias de um Sargento de Milícias (1852) de Manuel Antônio de Almeida, Mário de Andrade reelabora literariamente temas de mitologia indígena e visões folclóricas da Amazônia e do resto do país, fundando uma nova linguagem literária.

Page 61: Modernismo

Macunaíma (1928) Nas lendas de heróis taulipang e

arecuná, apresentadas por Koch-Grünberg, Mário de Andrade encontrou o herói Macunaíma, que, segundo o estudioso alemão,“ainda era menino, porém mais safado que todos os outros irmãos.”

Page 62: Modernismo

Macunaíma (1928)

A Carta pras Icamiabas

Com seu estilo pomposo, Macunaíma enuncia, na Carta pras Icamiabas, o slogan que irá adotar para definir os problemas do Brasil: “Tudo vai num descalabro sem comedimento, estamos corroídos pelo morbo e pelos miriápodes! Em breve seremos novamente uma colônia da Inglaterra ou da América do Norte!... Por isso e para eterna lembrança destes paulistas, que são a única gente útil do país, e por isso chamados de Locomotivas, nos demos ao trabalho de metrificarmos um dístico, em que se encerram os segredos de tanta desgraça:

"POUCA SAÚDE E MUITA SAÚVA, OS MALES DO BRASIL SÃO."

Page 63: Modernismo

Macunaíma (1928)

Enredo: Macunaíma sai do mato e chega a São Paulo em busca do seu precioso amuleto – o Muiraqutã – presente de Ci, a mão do mato, e presente que fora roubado por Vanceslau Pietro Pietra, o gigante Paimã, caçador de gente.

Page 64: Modernismo

MANUEL BANDEIRA

Page 65: Modernismo

Características gerais da obra:

O exílio causado pela doença obrigou o poeta a viver profundamente sua sensibilidade, levando-o a gostar das antíteses, manifestando em seus poemas uma serenidade melancólica e uma revolta imponente...

Page 66: Modernismo

O lirismo impregnado das descobertas do cotidiano

“...a poesia está em tudo – tanto nos amores como nas chinelas, tanto nas coisas lógicas como nas disparatatas”

Page 67: Modernismo

Poética

Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportadoDo lirismo funcionário público com livro de ponto expedienteprotocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionárioo cunho vernáculo de um vocábulo.

(...)

Page 68: Modernismo

Os Sapos

Enfunando os papos, Saem da penumbra, Aos pulos, os sapos. A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra, Berra o sapo-boi:

- "Meu pai foi à guerra!" - "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro, Parnasiano aguado,

Diz: - "Meu cancioneiroÉ bem martelado.

Vede como primo Em comer os hiatos!

Que arte! E nunca rimo Os termos cognatos.

(...)

Page 69: Modernismo

Estrela da Manhã (1936)

(...)Digam que sou um homem sem orgulho

Um homem que aceita tudoQue me importa?

Eu quero a estrela da manhã (...)

Pecai com malandrosPecai com sargentos

Pecai com fuzileiros navaisPecai de todas as maneiras

Com os gregos e com os troianosCom o padre e o sacristão

Com o leproso de Pouso AltoDepois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas [comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples

Que tu desfalecerás

Procurem por toda à partePura ou degradada até a última baixeza

Eu quero a estrela da manhã.

Page 70: Modernismo

Estrela da Manhã (1936)

(...)Digam que sou um homem sem orgulho

Um homem que aceita tudoQue me importa?

Eu quero a estrela da manhã (...)

Pecai com malandrosPecai com sargentos

Pecai com fuzileiros navaisPecai de todas as maneiras

Com os gregos e com os troianosCom o padre e o sacristão

Com o leproso de Pouso AltoDepois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas [comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples

Que tu desfalecerás

Procurem por toda à partePura ou degradada até a última baixeza

Eu quero a estrela da manhã.

humildade

Page 71: Modernismo

Estrela da Manhã (1936)

(...)Digam que sou um homem sem orgulho

Um homem que aceita tudoQue me importa?

Eu quero a estrela da manhã (...)

Pecai com malandrosPecai com sargentos

Pecai com fuzileiros navaisPecai de todas as maneiras

Com os gregos e com os troianosCom o padre e o sacristão

Com o leproso de Pouso AltoDepois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas [comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples

Que tu desfalecerás

Procurem por toda à partePura ou degradada até a última baixeza

Eu quero a estrela da manhã.

Linguagem barroca: Erotismo=estrela: mulher, sedução, pecadora e pura

Page 72: Modernismo

Estrela da Manhã (1936)

(...)Digam que sou um homem sem orgulho

Um homem que aceita tudoQue me importa?

Eu quero a estrela da manhã (...)

Pecai com malandrosPecai com sargentos

Pecai com fuzileiros navaisPecai de todas as maneiras

Com os gregos e com os troianosCom o padre e o sacristão

Com o leproso de Pouso AltoDepois comigo

Te esperarei com mafuás novenas cavalhadas [comerei terra e direi coisas de uma ternura tão simples

Que tu desfalecerás

Procurem por toda à partePura ou degradada até a última baixeza

Eu quero a estrela da manhã.

Ultrapassa o maniqueísmo com que os

românticos viam a mulher

Page 73: Modernismo

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três... trinta e três... - Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. - Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Page 74: Modernismo

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três... trinta e três... - Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. - Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Poema tematiza a doença que assombrou a

vida de Bandeira, causando a expectativa

de morte

Page 75: Modernismo

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três... trinta e três... - Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. - Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

Os versos intercalam causa e consequência e

o preço pago.

Page 76: Modernismo

Pneumotórax

Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse.

Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três... trinta e três... - Respire.

- O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. - Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

O episódio da visita do médico , retratada pelo eu-lírico, culmina com o sarcasmo, ironia trágica desesperada – ao invés

de uma coisa, a aceitação, o assumir

poeticamente uma cura (até então) impossível

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Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra PasárgadaLá sou amigo do reiLá tenho a mulher que eu queroNa cama que escolherei

Vou-me embora pra PasárgadaVou-me embora pra PasárgadaAqui eu não sou felizLá a existência é uma aventuraDe tal modo inconsequenteQue Joana a Louca de EspanhaRainha e falsa dementeVem a ser contraparenteDa nora que nunca tive(...)

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Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra PasárgadaLá sou amigo do reiLá tenho a mulher que eu queroNa cama que escolherei

Vou-me embora pra PasárgadaVou-me embora pra PasárgadaAqui eu não sou felizLá a existência é uma aventuraDe tal modo inconsequenteQue Joana a Louca de EspanhaRainha e falsa dementeVem a ser contraparenteDa nora que nunca tive(...)

Pasárgada = “campo dos persas”, no

poema, espécie de arquétipo,

transposição poética de um sonho

coletivo.

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Irene no Céu

Irene pretaIrene boaIrene sempre de bom humor.

Imagino Irene entrando no céu:- Licença, meu branco!E São Pedro bonachão:- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.

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Poema do Beco

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?- O que eu vejo é o beco.

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Poema do Beco

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?- O que eu vejo é o beco.

1. micro-poema

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Poema do Beco

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?- O que eu vejo é o beco.

1. micro-poema2. texto condensado

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Poema do Beco

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?- O que eu vejo é o beco.

1. micro-poema2. texto condensado3. verso livre

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Poema do Beco

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?- O que eu vejo é o beco.

1. micro-poema 2. texto condensado3. verso livre4. linguagem coloquial5. realidade / “tédio”, “desesperança”

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Teresa

A primeira vez que vi Teresa Achei que ela tinha pernas estúpidas Achei também que a cara parecia uma perna 

Quando vi Teresa de novo Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo (Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse) 

Da terceira vez não vi mais nada Os céus se misturaram com a terra E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas. 

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Poema Tirado de uma Notícia de Jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e [morava no morro da Babilônia num barracão [sem número Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu Cantou Dançou Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e [morreu afogado. 

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Poema Tirado de uma Notícia de Jornal

João Gostoso era carregador de feira livre e [morava no morro da Babilônia num barracão [sem número Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro Bebeu Cantou Dançou Depois se atirou na lagoa Rodrigo de Freitas e [morreu afogado. 

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“coisas mais simples e menos intencionais”

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referências bibliográficas

AMARAL, Emília; ANTÔNIO, Severino; PATROCÍNIO, Mauro Ferreira do. Português: redação, gramática, literatura, interpretação de texto. São Paulo: Nova Cultural, 1999