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COLUNA/COLUMNA. 2008;7(1):27-32 Mini-toracotomia vídeo-assistida em doenças da coluna vertebral Vídeo assisted mini-toracothomy in spinal surgery Minitoracotomia vídeo-asistida en patologías de la columna vertebral ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Ernani Abreu 1 Marcelo Simoni Simões 2 Éverton Antônio Pansera 3 RESUMO Objetivo: discutir a aplicação prática da cirurgia torácica vídeo-assistida (VATS) na abordagem de doenças da coluna vertebral. Métodos: avaliação retrospectiva, clínica e radiológica, de 23 casos de pacientes com doenças da coluna torácica, operados pela técnica de mini-toracotomia vídeo-assistida. Na grande maioria dos casos, a doença abordada era de origem neoplásica ou traumática, sendo realizada instru- mentação anterior da coluna em 20 pacientes, utilizando incisões de aproximadamente 6cm. Resultados: em apenas um caso houve a necessidade de conversão para toracotomia convencional. Exceto uma lesão irreversível de nervo intercostal, não ocorreram outras complicações significativas e, em especial, nenhum caso de complicação pulmonar, como atelectasias ou pneumonias. No pós- operatório, os pacientes foram man- tidos sem dor apenas com paracetamol e opióides fracos, e a média de internação após o procedimento foi de cinco dias. Conclusão: a mini- toracotomia vídeo-assistida mostrou ser uma abordagem efetiva para o tratamento de doenças da coluna ABSTRACT Objective: to discuss clinical application of video-assisted thoracic surgery (VATS), in the management of spinal pathology. Methods: retrospective evaluation, clinical and radiological, of 23 cases of patients with thoracic spine diseases, treated by the technique of video-assisted mini-toracothomy. In most cases, the pathology had a neoplasic or traumatic origin, and anterior instrumentation of the spine was done in 20 cases, using incisions approximately 6cm long. Results: Conversion to conventional toracothomy was necessary in only one case. With exception of an intercostal nerve lesion, there were no surgical complications in this series, specially, there were no cases of pulmonary complications, like athelectasia or pneumonia. In the post- operative period, patients had their pain managed with paracetamol and weak opioid drugs, and hospitalization was about 5 days. Conclusion: video- assisted mini-toracothomy showed to be an effective approach to thoracic spine disease, bringing less complications and discomfort, when compared to conventional toracothomy. Besides, the learning curve is relatively RESUMEN Objetivo: discutir la aplicación práctica de la cirugía torácica video- asistida (VATS) en el abordaje de patologías de la columna vertebral. Métodos: evaluación retrospectiva, clínica y radiológica, de 23 casos de pacientes con patologías de la columna torácica, operados por la técnica de minitoracotomía video- asistida. En la mayoría de los casos, la patología abordada era de origen neoplásica o traumática, siendo realizada instrumentación anterior de la columna en 20 casos, utilizando incisiones de aproximadamente 6 cm. Resultados: en apenas un caso hubo la necesidad de conversión para toracotomía convencional. Excepto una lesión irreversible de nervio intercostal, no hubo otras compli- caciones significativas, especial- mente, ningún caso de complicación pulmonar, como atelectasias o neumonías. En el postoperatório, los pacientes fueron mantenidos sin dolor tratados únicamente con paracetamol y opioides leves, el promedio de inter- nación después del procedimiento fue de cinco días. Conclusión: la mini- toracotomía video-asistida mostró ser Trabalho realizado no Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles, Porto Alegre (RS), Brasil. 1 Preceptor do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil. 2 Preceptor do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles e do Serviço de Neurocirurgia do Professor Mário Coutinho - Porto Alegre (RS), Brasil. 3 Estagiário do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Hospital Ernesto Dornelles Porto Alegre (RS), Brasil. Recebido: 02/03/2007 - Aprovado: 31/01/2008 31_col_7_1.pmd 15/3/2008, 11:03 27

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Mini-toracotomia vídeo-assistida emdoenças da coluna vertebral

Vídeo assisted mini-toracothomy in spinal surgery

Minitoracotomia vídeo-asistida en patologías de la columna vertebral

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

Ernani Abreu1

Marcelo Simoni Simões2

Éverton Antônio Pansera3

RESUMOObjetivo: discutir a aplicação práticada cirurgia torácica vídeo-assistida(VATS) na abordagem de doenças dacoluna vertebral. Métodos: avaliaçãoretrospectiva, clínica e radiológica, de23 casos de pacientes com doenças dacoluna torácica, operados pela técnicade mini-toracotomia vídeo-assistida.Na grande maioria dos casos, a doençaabordada era de origem neoplásica outraumática, sendo realizada instru-mentação anterior da coluna em 20pacientes, utilizando incisões deaproximadamente 6cm. Resultados: emapenas um caso houve a necessidadede conversão para toracotomiaconvencional. Exceto uma lesãoirreversível de nervo intercostal, nãoocorreram outras complicaçõessignificativas e, em especial, nenhumcaso de complicação pulmonar, comoatelectasias ou pneumonias. No pós-operatório, os pacientes foram man-tidos sem dor apenas com paracetamole opióides fracos, e a média deinternação após o procedimento foi decinco dias. Conclusão: a mini-toracotomia vídeo-assistida mostrouser uma abordagem efetiva para otratamento de doenças da coluna

ABSTRACTObjective: to discuss clinical applicationof video-assisted thoracic surgery(VATS), in the management of spinalpathology. Methods: retrospectiveevaluation, clinical and radiological, of23 cases of patients with thoracic spinediseases, treated by the technique ofvideo-assisted mini-toracothomy. Inmost cases, the pathology had aneoplasic or traumatic origin, andanterior instrumentation of the spinewas done in 20 cases, using incisionsapproximately 6cm long. Results:Conversion to conventional toracothomywas necessary in only one case. Withexception of an intercostal nerve lesion,there were no surgical complications inthis series, specially, there were no casesof pulmonary complications, likeathelectasia or pneumonia. In the post-operative period, patients had theirpain managed with paracetamol andweak opioid drugs, and hospitalizationwas about 5 days. Conclusion: video-assisted mini-toracothomy showed tobe an effective approach to thoracicspine d isease , br inging lesscomplications and discomfort, whencompared to conventional toracothomy.Besides, the learning curve is relatively

RESUMENObjetivo: discutir la aplicaciónpráctica de la cirugía torácica video-asistida (VATS) en el abordaje depatologías de la columna vertebral.Métodos: evaluación retrospectiva,clínica y radiológica, de 23 casos depacientes con patologías de lacolumna torácica, operados por latécnica de minitoracotomía video-asistida. En la mayoría de los casos,la patología abordada era de origenneoplásica o traumática, siendorealizada instrumentación anterior dela columna en 20 casos, utilizandoincisiones de aproximadamente 6 cm.Resultados: en apenas un caso hubola necesidad de conversión paratoracotomía convencional. Exceptouna lesión irreversible de nerviointercostal, no hubo otras compli-caciones significativas, especial-mente, ningún caso de complicaciónpulmonar, como atelectasias oneumonías. En el postoperatório, lospacientes fueron mantenidos sin dolortratados únicamente con paracetamoly opioides leves, el promedio de inter-nación después del procedimiento fuede cinco días. Conclusión: la mini-toracotomía video-asistida mostró ser

Trabalho realizado no Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles, Porto Alegre (RS), Brasil.

1Preceptor do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles - Porto Alegre (RS), Brasil.2Preceptor do Serviço de Coluna do Hospital Ernesto Dornelles e do Serviço de Neurocirurgia do Professor Mário Coutinho - Porto Alegre (RS), Brasil.3Estagiário do Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Hospital Ernesto Dornelles Porto Alegre (RS), Brasil.

Recebido: 02/03/2007 - Aprovado: 31/01/2008

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torácica, apresentando menos des-conforto e complicações, em relação àtoracotomia convencional. Além disso,sua curva de aprendizado é relati-vamente pequena, se comparada à dainstrumentação por toracoscopia pura.

DESCRITORES: Coluna vertebral/cirurgia; Procedimentoscirúrgicos minimamenteinvasivos; Cirurgia vídeo-assistida; Toracotomia

short, when compared with purethoracoscopic instrumentation.

KEYWORDS: Spine/surgery;Surgical procedures, minimallyinvasive; Video-assistedsurgery; Thoracotomy

un abordaje efectivo para el trata-miento de patologías de la columnatorácica, presentando menos descon-forto y complicaciones, en relación ala toracotomía convencional. Además,su curva de aprendizaje es relativa-mente pequeña, comparándose a la deinstrumentación por toracoscopíapura.

DESCRIPTORES: Columnavertebral/cirurgía;Procedimientos quirúrgicosmínimamente invasivos;Cirugía asistida por video;Toracotomía

INTRODUÇÃOA abordagem cirúrgica da coluna dorsal por via anterior, pormeio de toracotomia, foi utilizada inicialmente por Jacobaeus,em 1910, para conduzir um caso de tuberculose1. Em 1950,Hopkins e Kanapi introduziram o uso de luz fria para ailuminação da cavidade torácica2. Desde essa época, autilização da toracotomia como via de acesso à colunapopularizou-se muito, tornando-se uma das abordagensclássicas, utilizadas por praticamente todos os cirurgiõesde coluna1,3. A principal razão para a disseminação da técnicaé que, dentre as possíveis vias de abordagem às doençasdos discos e corpos vertebrais dorsais, esta é a via queoferece visualização e acesso cirúrgico mais diretos,permitindo descompressões neurais amplas, semnecessidade de manuseio ou afastamento do saco dural,ressecção mais completa de lesões do corpo vertebral, maiorfacilidade de reconstrução da coluna anterior de suporte,através da colocação de enxerto ósseo ou dispositivosintersomáticos, e maior possibilidade de fixação anterior dacoluna, havendo vários tipos de implantes e instrumentaisdisponíveis. Além disso, nos tratamento das deformidades,independente da etiologia, é a via que permite maior liberaçãodo ligamento longitudinal anterior, aumentando a chancede correção da deformidade.

Porém, apesar de suas múltiplas vantagens, muitoscirurgiões ainda são resistentes a este tipo de acesso,principalmente devido a sua grande agressividade. Atoracotomia clássica é uma via de acesso bastante agressiva,que implica em uma incisão extensa na pele e nas camadasmusculares, e afastamento significativo das costelas,relacionadas a muita dor e incapacidade no pós-operatório3.Esta abordagem apresenta riscos significativos de dorcrônica da parede torácica, e restrição ventilatória, com riscomaior de atelectasias ou pneumonia. Em razão destascomplicações, alguns cirurgiões optam por uma abordagemmenos invasiva, utilizando recursos ópticos, para que sejarealizada a cirurgia na cavidade torácica por uma incisão

menor, com menos afastamento dos arcos costais,conseguindo resultados satisfatórios, e, sem dúvida, comum pós-operatório com menos complicações3-6.

MÉTODOSEm nosso serviço, temos utilizado a mini-toracotomia para otratamento de doenças da coluna torácica desde 2003, sendoque, hoje, esta é a via de acesso padrão para estas doenças.Foram realizadas 23 cirurgias, sendo duas por casos dehérnia discal dorsal, uma para tratamento de discite, um casode lesão discal pós trauma, um caso de instabilidade póscirúrgica, 12 por tumores e seis por fraturas (Quadro 1).

Todos os pacientes foram avaliados clínica eradiologicamente, no pré e pós-operatório, com radiografias,ressonância magnética e, algumas vezes, tomografiacomputadorizada. Deste grupo, 14 pacientes são mulheres,e nove são homens. Como abordamos diversos tipos dedoenças, as idades variaram de 37 a 64 anos, com a média de45 anos.

O nível mais alto ser abordado foi T5, e o mais distal foiL1. Em um caso, foi realizada a ressecção de dois corposvertebrais, T7 e T10, pela mesma abordagem. O tempocirúrgico variou de uma hora e meia, no caso de discite, noqual foi realizado debridamento do espaço T12-L1, ecolocação de enxerto tricortical, sem instrumentação anterior,a cinco horas e meia, no caso da corpectomia dupla em umúnico tempo cirúrgico. A média de tempo cirúrgico foi detrês horas.

O sangramento variou de acordo com a doença, sendo omínimo de 50 ml nas hérnias discais e na discite, até 2200mlem uma ressecção de plasmocitoma.

O tempo de internação foi de três a 16 dias, com umamédia de cinco dias. As internações mais longas ocorreramnos casos de pacientes com déficits motores pré-operatórios, e nos que foram encaminhados para quimio-terapia ou radioterapia na mesma internação.

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Dos 12 pacientes comtumores de corpo vertebral,cinco apresentavam déficitneurológico por compressãomedular, e, em todos estes casosfoi conseguida descompressãoanterior adequada, acom-panhada de melhora dos déficitsapós a cirurgia. Nenhum dospacientes operados por fraturaapresentava déficit neurológico.

Foi feita instrumentaçãoanterior da coluna em 20casos, sendo que a constru-ção mais utilizada foi o ci-lindro de substituição decorpo vertebral, associado aplaca anterior, em 17 casos.No caso de discopatia T11-12, pós-fratura de T12, foiusado um cilindro rosqueadono espaço discal, com umaplaca de Stefee e dois pa-rafusos. No caso de insta-bilidade pós-laminectomia,foram usados dois cilindrosrosqueados nos espaçosdiscais, com uma placaanterior convencional, e, emum caso de corpectomia, foiutilizado enxerto tricorticalcom a placa de fixaçãoanterior, por limitação eco-nômica. Apenas a pacientedo caso de ressecção de T7e T10 foi submetida a instrumentação posterior da coluna,para correção de cifose pronunciada. Não houve, nesta série,qualquer tipo de complicações com implantes, como fraturas,deslocamentos ou posicionamento inadequado. (Figura 1)

Técnica cirúrgicaOs pacientes são anestesiados com instalação de um tubo oro- traqueal de duplo-lume e colocados em decúbito lateral sobreuma mesa radiotransparente7-8. Não é necessário o uso do Pillet,uma vez que não será realizado afastamento do gradil costal, etentamos evitar as posições oblíquas, que dificultam aorientação espacial, nos casos de instrumentação9. O nível aser abordado é marcado por radioscopia. Com uma incisão emtorno de 5 a 7cm, aborda-se a costela adjacente, que tem umsegmento ressecado e reservado, para possível utilização comoenxerto. A pleura é aberta, e é feita a seletivação do pulmão. Sãocolocados afastadores adequados, que permitem acesso àlesão, e um portal de vídeo de 10mm é instalado, geralmente umpouco abaixo e à frente da primeira incisão, para introdução deuma óptica convencional, de 0 ou 300, dependendo do caso. Senecessário, outro portal, de 5mm pode ser instalado, porém

normalmente apenas um portal de 10mm é suficiente. Adissecção da pleura parietal sobre a coluna é feita com ajuda debipolar longo, ou bisturi harmônico, quando disponível. Osvasos segmentares são cauterizados nos níveis nos quais issose faça necessário. Os níveis cirúrgicos são conferidos porradioscopia utilizando-se geralmente um fio de Kirchner paramarcar os espaços discais. Na certeza do nível, nos casos nosquais serão usados sistemas de fixação anterior os parafusosque guiam a colocação da placa são colocados nas vértebrasadjacentes antes de ser iniciada a corpectomia. Isto permiteuma visão melhor e um campo com menos sangramento. Acirurgia pode ser feita utilizando-se a visão direta, pela mini-incisão, e a visão da óptica. Quando necessário, resseca-se ocorpo vertebral patológico e descomprime-se a medula, sendofeita reconstrução da coluna anterior com espaçador de titâniopreenchido com enxerto de costela, ilíaco, ou da própria vértebra,conforme o caso. O material cirúrgico utilizado é igual ao dasabordagens convencionais, exceto pelo fato dos instrumentosterem de ser mais longos. Uma pinça bipolar longa éespecialmente útil nestas abordagens. Ao fim do tempo principal,um dreno de tórax é instalado pela incisão do portal de vídeo e

* Caso de paralisia do nervo intercostal, com flacidez unilateral do abdome** Caso que necessitou ampliação da incisão para reposicionamento do afastador

QUADRO 1 - Cirurgias realizadas: distribuição por nível de acesso,sexo, idade e tempo de internação pós-operatoria

Diagnóstico Nível Sexo - idade Internação P.O.

Discopatia pós-TRM T11-12 F – 49 3 dias

Hérnia discal T8-9 M – 41 3 dias

Hérnia discal T10-11 F – 38 3 dias

Discite hematogênica T12-L1 F – 46 14 dias

Instabilidade pós-laminectomia* T10-12 F – 47 3 dias

Metástase de mama T7 F – 47 5 dias

Metástase de mama T5 F – 39 6 dias

Metástase de mama T9 F – 49 4 dias

Metástase de mama T11 F – 40 16 dias

Metástase de mama T7 e T10 F – 41 5 dias

Metástase de próstata T12 M – 64 5 dias

Metástase de pulmão T10 F – 53 6 dias

Metástase de pulmão T9 M – 45 5 dias

Metástase de pulmão T10 M – 51 6 dias

Mieloma múltiplo T11 M – 43 4 dias

Mieloma múltiplo** T8 M – 52 4 dias

Plasmocitoma T8 F – 60 3 dias

Fratura T10 M – 33 3 dias

Fratura T12 M – 23 3 dias

Fratura T12 F – 37 4 dias

Fratura T12 M – 41 3 dias

Fratura T11 F – 34 4 dias

Fratura T12 F – 61 6 dias

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mantido em selo d’água por 48-72 horas, quando, após pre-enchidos alguns critérios ele é retirado. No pós-operatórioimediato, o paciente é mantido com opióides, que são retiradosapós 24 horas e, então, administrados apenas se necessário.

DISCUSSÃOOs primeiros relatos de abordagem vídeo-endoscópica da colunadorsal são de Mack e Regan, em 1993, para tratamento de umahérnia discal torácica1,7,9. Esta técnica é pouco invasiva reduzindoa incidência de dor e restrição ventilatória pós-cirúrgica tornandoa recuperação bem mais fácil e consequentemente com menormorbidade que a toracotomia convencional6,9,12-14.

O uso da toracoscopia na liberação do ligamento longitudinalanterior, para correção de cifose ou escoliose, atualmente estadisseminada nos grandes serviços de cirurgia espinhal3,9,13-14. Otratamento toracoscópico das hérnias discais dorsais, emboratecnicamente mais complexo, e exigindo uma curva deaprendizado maior, também vem ganhando muito espaço1.

Entretanto, para cirurgias que necessitem de corpectomiaou, principalmente, instrumentação da coluna, a toracoscopiaainda apresenta muitas limitações. A curva de aprendizado datécnica é consideravelmente grande1,5,9 e o uso de implantesespeciais, específicos para montagem por toracoscopia, são,via de regra, inacessíveis a pacientes do sistema único desaúde, ou outros planos de saúde mais simples, tornando oprocedimento mais complexo tecnicamente e acessível apenasa uma parcela pequena da população.

Com base nesses dados e aproveitando alguns princípiosdesenvolvidos com nossa experiência na via de acesso retro-peritonial aos discos lombares15, utilizando mini-incisão e técnicavídeo-assistida, junto com alguns princípios da cirurgia torácicavídeo-assistida (VATS – video-assisted thoracic surgery),utilizados para tratamento de doenças pulmonares e cardíacas,decidimos desenvolver uma técnica similar para uso nosegmento torácico, a mini-toracotomia vídeo-assistida11. Atécnica consiste basicamente na realização de uma mini-incisãocentrada na doença, combinada com o uso do vídeo-endoscópio, que fornece uma visualização magnificada docampo, além de uma excelente iluminação. A idéia básica é uniras vantagens da cirurgia minimamente-invasiva, ou seja, incisãopequena, pouca destruição muscular, mínima disfunçãoventilatória e pouca dor incisional, com as vantagens da cirurgiaaberta, como a possibilidade de visualização direta da doença,além da visão endoscópica, e a utilização de material cirúrgicoe implantes ortopédicos normais6,9-11,16.

A técnica cirúrgica utilizada na vídeo-toracoscopia e namini-toracotomia vídeo-assistida é bastante distinta nasabordagens toracoscópicas puras. Nela segue-se os princípiosbásicos da vídeo-cirurgia, com triangulação dos portais detrabalho, fazendo com que o portal para colocação da ópticafique colocado de forma a permitir uma visão mais frontal dadoença, e os outros dois portais de trabalho fiquem colocadoscom um afastamento que permita a manipulação do campo comos instrumentos cirúrgicos vídeo-endoscópicos9, 17-18. Na mini-toracotomia, a técnica cirúrgica é mais semelhante à utilizada

Figura 1Radiografia pré-operatória(A) e ressonância magnética(B) de paciente com mielomade T8. Fotografias intra-operatórias (C) ilustrando oprocedimento realizado.Radiografias pós-operatóriasem perfil (D) e AP (E), easpecto clínico da incisãocirúrgica (F)

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na microcirurgia; trabalha-se em um campo pequeno, com osinstrumentos próximos, por meio de um canal de trabalhocolocado diretamente sobre a doença, e o vídeo-endoscópio écolocado de forma lateral ao campo cirúrgico, servindo comoum instrumento de iluminação e visão auxiliar2,11,19-20.

Para a realização adequada da técnica é vital que o local daincisão seja perfeito, coincidindo exatamente com o local dadoença. Por isso, deve-se posicionar o paciente para radioscopiacom o tronco paralelo ao chão, tomando muito cuidado de evitarangulação das imagens durante a marcação da incisão. Adissecção e a liberação do nervo intercostal, e a ressecção de umsegmento curto de costela, também são muito importantes paraum bom resultado. Estas manobras permitem um acesso maisfácil, com a colocação de um afastador autostático simples, quefica apoiado principalmente nos tecidos moles musculares e nãonas costelas propriamente ditas, o que reduz de modosignificativo a dor e as parestesias incisionais. De fato, este tipode incisão parece ser menos doloroso que as incisões de portaisde vídeo de 10 mm, que podem ficar comprimidos entre as costelas,e provocar neuropatia intercostal.

O fato de se utilizar uma técnica iminentemente similar àmicrocirugia, inclusive com os mesmos tipos de instrumentoscirúrgicos, como bipolar, pinças de Kerrison etc, apenas emcomprimento mais longo, facilita muito a curva deaprendizado. Alguns poucos instrumentos especiais, comopuncionadores angulados e chaves de parafuso tipo cardâ,foram desenvolvidos para maior facilidade de colocação dosparafusos nos extremos do campo cirúrgico, como nasvértebras acima e abaixo da corpectomia.

O limite inferior desta abordagem é o disco L1-2, poisníveis mais baixos necessitam de acesso por abertura dodiafragma, e o nível mais alto que abordamos com esta técnicafoi corpo de T5. As abordagens dos níveis de T8 a T11costumam ser tecnicamente mais fáceis, pois evita amusculatura mais complexa e a escápula, que dificultam aabordagem do tórax superior, bem como o domo diafragmático,que pode dificultar a abordagem aos níveis mais baixos.

Depois da abertura da cavidade pleural, o descolamentoda pleura parietal de sobre a coluna é feito com coagulaçãobipolar e tesouras comuns, ou alternativamente, bisturiharmônico, quando disponível. Os vasos segmentares foramcauterizados com bipolar na maioria dos casos, não sendonecessária ligadura com suturas ou clipes metálicos.

O sangramento proveniente do acesso e da dissecçãopleural foi sempre desprezível. O volume de sangramentoda cirurgia esteve sempre relacionado com a doença em si,sendo que o único caso de sangramento maior que doislitros foi em um caso de mieloma de células plasmáticas,extremamente vascularizado. Nos casos de hérnias discais,discite, ou fixação intersomática sem ressecção do corpovertebral, o sangramento variou de 50 a 200ml.

O tempo cirúrgico também esteve sempre relacionado àdificuldade de manejo da doença propriamente dita, e não aoacesso. De fato, a realização do acesso mini-invasivo é maisrápido que a realização de uma toracotomia clássica, nãotomando mais que dez minutos e, embora a comparação seja

difícil, não nos parece que o tratamento da doença em sitenha se tornado mais demorada com o acesso mini-invasivodo que era quando utilizávamos a toracotomia convencional1,16.

A cirurgia mais longa realizada com esta técnica foi umacorpectomia de duas vértebras não contíguas, T7 e T10,comprometidas por metástases de tumor de mama, feita por umaúnica mini-incisão. Neste caso, a incisão foi posicionada maispróxima à vértebra superior, mais comprometida, e a vértebra inferiorfoi mais trabalhada pelos portais de vídeo. Os corpos ressecadosforam substituídos por cilindros de fusão de titânio, e não foramusadas placas anteriores de fixação. Este procedimento durou 5horas e meia, e foi o único com duração maior que três horas emeia. A média de duração de uma corpectomia por tumor ou fratura,com estabilização por colocação de cilindro de fusão e placa anteriorcom quatro parafusos foi de três horas7.

A única conversão realizada foi em um caso de mieloma de T8,em que o paciente tinha uma musculatura muito desenvolvida naparte alta do tórax, e o afastador não ficou estável, necessitandoreposicionamento constante, e atrapalhando o andamento dacirurgia13,19. A incisão foi ampliada para 15cm, permitindo acolocação de um afastador Finochetto convencional, e o restanteda técnica foi mantido. A colocação dos implantes por esta via nãofoi problemática, utilizando-se cilindros de fusão e placas anterioresde três fabricantes distintos, sendo que nenhum destes materiaisera específico para cirurgia minimamente-invasiva.

As manobras para correção de deformidade cifótica, quandonecessárias, foram baseadas em liberação do ligamentolongitudinal anterior e mobilização externa da coluna, comcompressão da giba, do mesmo modo que costumamos fazernos casos de toracotomia convencional1,7,9,19. Acreditamos queas tentativas de correção de cifose focal baseadas em distraçãointersomática ou sobre parafusos colocados nos corposvertebrais apresentam risco grande de lesão dos platôsvertebrais ou afrouxamento dos parafusos.

Os resultados, em termos de dor e disfunção pós-operatória,foram muito bons. De fato, nossa idéia era realizar as mini-toracotomias vídeo-assistidas como um passo na evoluçãoaté a vídeo-toracoscopia pura, porém, diante dos resultadosobtidos, decidimos adotar esta como nossa técnica padrão.

Após a retirada do dreno de tórax, a maioria dos pacientesapresentou redução imediata da dor incisional4 para níveistratáveis com paracetamol ou opióides fracos. Em todos os casos,duas semanas após o procedimento, a queixa era de desconfortono local da incisão, sem dor. Uma paciente apresentou uma lesãode nervo intercostal, manifesta por flacidez unilateral da paredeabdominal, sem dor. Uma paciente operada por metástase decarcinoma mamário teve uma trombose pulmonar para-neoplásicadiagnosticada no pós-operatório, durante o estadiamento dalesão para tratamento oncológico, sendo anticoagulada a plenoe apresentando hemotórax no lado abordagem cirúrgica comocomplicação da anticoagulação. A anticoagulação foi revertida eo dreno de tórax recolocado, havendo resolução do quadro.

Não tivemos outras complicações, sendo notável a ausênciade pneumonia, atelectasias, ou disfunção ventilatória pós-operatória21. Também não houve casos de dor incisional crônica.

A mini-toracotomia vídeo-assistida proporcionou uma

Mini-toracotomia vídeo-assistida em doenças da coluna vertebral

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facilidade de descompressão dos elementos neurais, juntamentecom possibilidades de reconstrução anterior da coluna, similaresàs apresentadas pela toracotomia convencional, com vantagensnítidas no que concerne ao grau de lesão tecidual, à dor pós-operatória, e às complicações relacionadas a abordagem, todosmuito menores que os apresentados nos casos de toracotomiaconvencional. Em nosso entendimento, este é o ideal a seralcançado pelas técnicas de abordagem minimamente invasiva.

CONCLUSÃOA mini-toracotomia torácica vídeo-assistida demonstrou ser umaabordagem eficaz no tratamento de doenças da coluna torácica,com menos morbidade e custos em relação a toracotomiaconvencional, proporcionando ao paciente um pós-operatóriomenos doloroso e um tempo de internação hospitalar menor.

Correspondência

Éverton Antônio Pansera

Rua Theotisto Piccoli 273 -Colina Sorriso - Caxias do Sul (RS),Brasil

Tels.:+ 54 3211-1282 +55 51 9975-8678

E-mail:[email protected]

Abreu E, Simões MS, Pansera EA

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