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Migração pendular nas fronteiras entre Brasil-Paraguai e Brasil-Bolívia Éder Damião Goes Kukiel 1 Claudia Vera da Silveira 2 Érica dos Santos Oliveira 3 Resumo O presente trabalho tem como objetivo analisar a dinâmica do trabalho pendular que ocorre nas fronteiras entre Brasil e Bolívia entre as cidades de Corumbá-MS e Puerto Quijarro e entre Brasil e Paraguay entre as cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, e como o arranjo espacial pode influenciar essa dinâmica. Como metodologias foram feitas entrevistas com trabalhadores, empregadores e instituições de fiscalização. Como resultado observou-se que que apesar do arranjo espacial da fronteira facilitar ou dificultar o controle de fluxo desses trabalhadores, pelo fato de não existir um interesse por parte dessas entidades de realizar essa atividade, a dinâmica de passagem desses trabalhadores para ambos os lados dessa fronteira ocorre sem impedimentos. Palavras chave: Fronteira, migração pendular, controle, trabalho. Introdução O trabalho tem como objetivo compreender a dinâmica do trabalho pendular que ocorre nas fronteiras entre Brasil-Paraguai e Brasil-Bolívia. São fronteiras com arranjos espaciais singulares que influenciam na forma como esses trabalhadores circulam nesse espaço fronteiriço. Metodologicamente foram feitas entrevistas com trabalhadores e empregadores além de instituições públicas que realizam fiscalizações para com essa atividade. Foram feitas pesquisas bibliográficas relacionadas ao tema, além de confecções de mapas e fotos que ajudem a compreender essa dinâmica. 1 Acadêmico do programa de pós-graduação em Geografia, nível doutorado, da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected] 2 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia, nível doutorado, da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected] 3 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia, nível mestrado, da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected]

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Migração pendular nas fronteiras entre Brasil-Paraguai e Brasil-Bolívia

Éder Damião Goes Kukiel1

Claudia Vera da Silveira2

Érica dos Santos Oliveira3

Resumo

O presente trabalho tem como objetivo analisar a dinâmica do trabalho pendular que ocorre nas fronteiras entre Brasil e Bolívia entre as cidades de Corumbá-MS e Puerto Quijarro e entre Brasil e Paraguay entre as cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, e como o arranjo espacial pode influenciar essa dinâmica. Como metodologias foram feitas entrevistas com trabalhadores, empregadores e instituições de fiscalização. Como resultado observou-se que que apesar do arranjo espacial da fronteira facilitar ou dificultar o controle de fluxo desses trabalhadores, pelo fato de não existir um interesse por parte dessas entidades de realizar essa atividade, a dinâmica de passagem desses trabalhadores para ambos os lados dessa fronteira ocorre sem impedimentos. Palavras chave: Fronteira, migração pendular, controle, trabalho.

Introdução

O trabalho tem como objetivo compreender a dinâmica do trabalho

pendular que ocorre nas fronteiras entre Brasil-Paraguai e Brasil-Bolívia. São

fronteiras com arranjos espaciais singulares que influenciam na forma como

esses trabalhadores circulam nesse espaço fronteiriço. Metodologicamente

foram feitas entrevistas com trabalhadores e empregadores além de instituições

públicas que realizam fiscalizações para com essa atividade. Foram feitas

pesquisas bibliográficas relacionadas ao tema, além de confecções de mapas e

fotos que ajudem a compreender essa dinâmica.

1 Acadêmico do programa de pós-graduação em Geografia, nível doutorado, da Universidade

Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected]

2 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia, nível doutorado, da Universidade

Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected]

3 Acadêmica do programa de pós-graduação em Geografia, nível mestrado, da Universidade

Federal da Grande Dourados. E-mail de contato: [email protected]

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As fronteiras se apresentam como oportunidades, pelas assimetrias

econômicas que esses espaços possuem. Elementos como diferenças cambiais,

ajudam a direcionar o fluxo de pessoas e comércio para um dos lados dessa

fronteira. Também em razão das características de porosidade e fluidez

territorial, há a possibilidade de mobilidade pelo trabalho em busca de uma

melhoria da condição financeira.

Alvarez (2008) trata esse fluxo como uma migração pendular através da

fronteira à procura de trabalho. De modo geral, os que realizam migração

pendular internacional são motivados pela possibilidade de trabalho que, de

forma geral, se realizam na informalidade, sem carteira de trabalho assinada e

sem cobertura previdenciária. Este movimento está associado às dificuldades

transnacionais e expressa a contradição entre a informalidade e a flexibilização

do trabalho, já que essas pessoas não recolhem contribuições para o sistema

previdenciário (ALVAREZ, 2008).

De acordo com Steiman (2010), as oportunidades que o lado mais

dinâmico economicamente da fronteira pode oferecer em relação ao outro, tende

a atrair fluxos de trabalhadores, em especial, em atividades que não exigem

elevado grau de especialização ou relacionado a tarefas pesadas. Esses fluxos

são constituídos de trabalhadores diaristas, desqualificados ou semiqualificados

que buscam oportunidades e possíveis recebimentos de assistência social.

Uma atividade que dinamiza a fronteira é o comércio, fatores cambiais

tendem a beneficiar um dos lados da fronteira. Em Pedro Juan Caballero existe

um fluxo de turistas que visitam esse espaço em buscas desses produtos mais

baratos quando comparados ao Brasil, gerando oportunidades de trabalho tanto

para brasileiros como para paraguaios, dinamizando o fluxo de pessoas nessa

fronteira. Observamos que esse turismo de compras também se realiza na

fronteira Brasil-Bolívia em menor intensidade.

Com isso podemos observar a existência de uma migração pendular

internacional, em busca dessa oportunidade que a fronteira proporciona. Os

trabalhadores transitam nesse limite fronteiriço, trabalhando de um lado e

morando do outro, em busca de uma melhoria de na sua condição social.

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Migração pendular fronteiriça entre Corumbá (BR) e Puerto Quijarro (BOL)

A cidade de Corumbá, situa-se na porção ocidental do estado de Mato

Grosso do Sul, na fronteira do Brasil com a Bolívia. As relações fronteiriças entre

Corumbá e a vizinha área urbana de Puerto Quijarro são processuais, relacionais

e híbridas, produzindo e sendo produzidas por territorialidades, por fluxos, por

câmbios variados e próprios dos interesses de cada indivíduo ou grupo (COSTA,

2012). Portanto se aproxima do entendimento da fronteira como espaço vivido

(NOGUEIRA, 2007).

Souza e Aranha Silva (2011, p. 3) indicam que “a fluidez territorial é a

qualidade do movimento associada à infraestrutura” e “a porosidade territorial é

a qualidade da regulação do movimento”. Pensando nas afirmativas, a fluidez e

a porosidade são indissociáveis e estão diretamente relacionadas aos fixos e

aos fluxos ou ao sistema de objetos e ações (SOUZA; ARANHA SILVA, 2011).

Arroyo (2001) considera a fluidez e a porosidade como atributos do território

fundamentais para a integração e o pressuposto de uma maior coesão entre as

populações de espaços fronteiriços.

Em relação a fronteira entre Brasil-Bolívia, entre os municípios de

Corumbá e Puerto Quijarro, observa-se um arranjo espacial semi-conurbado

Benedeti (2011). Existe uma rodovia, chamada de Ramão Gomes que liga a

cidade de Corumbá (BR) até Puerto Quijarro (BOL). Essa forma espacial permite

que o Estado brasileiro consiga estabelecer seu controle através de suas

instituições de fiscalização como Receita Federal, Anvisa, Polícia Federal e

outras (Figura 1).

Todas essas instituições se localizam ao longo da rodovia Ramão Gomes,

formando barreiras que pretendem estabelecer um controle sobre essa fluidez

fronteiriça.

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Figura 1 – Arranjo espacial na fronteira Brasil-Bolívia entre as cidades de Corumbá e Puerto Quijarro, (Google Earth).

Fonte: E.D.G KUKIEl, 2018.

Pôde-se perceber que o órgão responsável pela fiscalização deveria ser

o Ministério do Trabalho e Emprego, por intermédio dos fiscais do trabalho. No

caso específico de Corumbá existe um posto da Superintendência Regional do

Trabalho e Emprego, mas há algum tempo não existe fiscal no município e que

o posto mais próximo seria em Campo Grande, a 430 km. Em que pese o fato

de que desde o ano de 2013 existir um adicional de 30% no salário por essa

função ser exercida em área de fronteira, não foi suficiente para garantir a

permanência ou mesmo a atração pelo cargo na localidade. A função desse

fiscal é coibir abusos/trabalho ilegal e desrespeito às normas trabalhistas. Com

isso periodicamente o fiscal do trabalho vinha até a cidade de Corumbá para

realizar algumas fiscalizações ou mesmo ver o andamento de alguns processos

sobre irregularidades trabalhistas.

Acerca dos trabalhadores bolivianos que atuam na cidade de Corumbá,

no caso de um fiscal encontrar empresas usando essa mão de obra sem estar

devidamente regularizada, a empresa seria multada por desrespeito às leis

trabalhistas vigentes no Brasil. No caso específico de trabalhadores

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estrangeiros, trazê-los para o país com o objetivo de explorar a mão de obra

irregular, sem cumprimento dos direitos trabalhistas, além da multa pode ocorrer

a interdição da empresa e paralização do serviço que está sendo realizado.

Caso o trabalho irregular seja constatado, o Ministério do Trabalho pode

exigir o pagamento das verbas trabalhistas devidas aos funcionários que estão

sendo explorados. As mesmas penalidades ocorreriam se empresas do setor da

construção civil levasse brasileiros para trabalhar, por exemplo, em Puerto

Quijarro, sem que esses trabalhadores estivem regularmente contratados e

regulados no Brasil, não importando o local onde essa atividade fosse realizada.

Ocorre a mesma situação se uma empresa com sede no Brasil fazer a

contratação de brasileiros dentro do território boliviano, caso o intuito seja pagar

menos direitos trabalhistas, existe aí uma irregularidade, sendo essa empresa

passível de punição. No Brasil, quem pode investigar é o Ministério Público do

Trabalho, o Ministério do Trabalho ou os sindicatos (que podem ajuizar ação em

nome dos trabalhadores prejudicados), mas a fiscalização só cabe a algum

órgão estatal, principalmente aos fiscais do trabalho que podem aplicar multas

caso vejam algo irregular.

Esses trabalhadores atravessam esse limite fronteiriço em vans com

placas bolivianas, tanto com brasileiros indo trabalhar na construção civil da

Bolívia, como de bolivianos que vem trabalhar no Brasil (Figura 2). De acordo

com alguns desse trabalhadores entrevistados, nunca foram parados pelo fato

estarem indo trabalhar em um dos lados dessa fronteira, quando eram parados

por fiscais da Receita Federal, estes estavam sempre em busca de produtos que

poderiam estar sendo trazidos de forma irregular para o Brasil.

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Figura 2 – Vans bolivianas utilizadas para transporte de trabalhadores

Autor: KUKIEL, E.D.G. (2015).

Outros trabalhadores que realizam suas atividades no município de

Corumbá são os feirantes bolivianos, diariamente trabalham nas feiras locais,

vendendo verduras, roupas, eletrônicos, dentre outras coisas.

Parte desses feirantes atravessam o limite fronteiriço de forma diária

trazendo produtos para serem vendidos nas feiras livres que ocorrem nos bairros

tanto de Corumbá como de Ladário. Raramente suas vans são paradas para

fiscalização. Somente quando tais instituições são provocadas, de acordo com

alguns feirantes bolivianos, quando alguns produtos aumentam de preço no

Brasil, como feijão ou tomate que já chegaram a ter seus valores bem elevado

no lado brasileiro da fronteira. Com isso esses feirantes perceberam um

aumento na fiscalização desses produtos que estavam com valores elevados no

lado brasileiro da fronteira. Mas em relação ao fato de irem trabalhar do lado

brasileiro da fronteira, nunca foram questionados ou exigidos apresentação de

documentos ou permissões para trabalhar no Brasil.

Com isso apesar do arranjo espacial facilitar para o Estado estabelecer

sua prerrogativa de gestora de território nessa fronteira. O fato das instituições

que teriam essa função de controle quando falamos do fluxo de trabalhadores

para ambos os lados dessa fronteira não se preocupam com tal fluxo. Por isso

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existe uma fluidez desses trabalhadores que podem exercer suas funções sem

nenhum tipo de fiscalização em relação a sua atividade.

Migração Pendular fronteiriça entre Ponta Porã (BR) e Pedro Juan

Caballero (PY)

Os territórios de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero apresentam como

característica a condição de conurbação, principalmente pela facilidade de

mobilidade, onde é possível passar caminhando esse espaço fronteiriço. O

município de Ponta Porã localiza-se ao oeste do estado de Mato Grosso do Sul

tendo como delimitação territorial a fronteira internacional com o Paraguai, mais

precisamente com o município de Pedro Juan Caballero, capital do

Departamento del Amambay (LAMBERTI, 2006).

Figura 3 – Arranjo espacial na fronteira Brasil-Parguai entre as cidades de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, (Google Earth).

Fonte: C. V. Silveira, 2018.

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A definição do limite internacional, em princípio, deu-se pelo divisor de

águas do Tratado de Limites 1872, resultante de um tratado de paz, posterior a

Guerra da Tríplice Aliança, onde se apresentava os limites do Brasil com o

Paraguai. Diante da pouca especificação desse documento, a própria população

adotou um limite convencional que posteriormente foi oficializado através do

Acordo Condicional (em 1940) com a anuência de ambos os países.

(LAMBERTI, 2006).

Cardona (2008) menciona que a cidade de Pedro Juan Caballero era

conhecida como “Punta Porá” ou “Paraje Punta Porá” entre o final do século XIX

e início do século XX. O autor menciona que a formação desta cidade está

relacionada ao trajeto que os condutores de carretas realizavam ao

transportarem a erva-mate produzida em Mato Grosso (atual sul do estado de

Mato Grosso do Sul) para o porto de Concepción (Paraguai) com destino final

para a Argentina (GOIRIS, 1999). Nessa trajetória existiam fontes de águas

utilizadas principalmente por essas caravanas que transportavam a erva-mate,

onde uma dessas fontes deu origem ao povoado local (ROIG, 1984).

Goiris (1999) afirma que a adoção do nome de Pedro Juan Caballero

substituindo a denominação de Punta Porá, foi uma iniciativa do governo

nacional em homenagear os próceres da independência do Paraguai em 1811,

não sendo uma iniciativa da população local, daí a controvérsia entre vários

políticos, intelectuais e historiadores da época em relação à data de fundação da

cidade, pois em 1899 foi criado por decreto a “Comisaría Policial” em Punta Porá

e, em 1901 outro decreto modificava o nome da cidade para Pedro Juan

Caballero. Somente em meados do século XX inicia-se um processo significativo

de povoamento através da colonização agrícola e da expansão da fronteira

agrícola por meio da fundação de colônias agropecuárias, instalação de

empresas cafeeiras e serrarias (GOIRIS, 1999).

Pedro Juan Caballero é a capital do departamento de Amambay, cabe

mencionar que este departamento possui mais quatro distritos. Em 2000 a

população desse departamento era de 119.660 habitantes, dos quais 86.538

(72%) habitantes residiam em Pedro Juan Caballero, já no ano de 2015 a

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população total do departamento foi 159.263 habitantes, e aproximadamente

71% dessa população o equivalente a 113.872 residia em Pedro Juan Caballero

(DGEEC, 2015).

Observamos que na região fronteiriça formada pela junção das cidades

de Pedro Juan Caballero (Paraguai) com Ponta Porã (Brasil) a migração

pendular da força de trabalho é intensa, tanto de um lado como do outro lado da

fronteira, e podemos associá-la a dois fatores: o primeiro está associado à

formação sócio-espacial dessa região, que surge junto as atividades de

exploração e comercialização de erva-mate nativa, onde trabalhadores

paraguaios já atuavam na extração dos ervais localizados em terras brasileiras;

já o segundo fator vincula-se ao arranjo espacial dessas duas cidades, divididas

apenas por uma avenida situada na linha internacional de fronteira, o que

estimula o deslocamento contínuo e diário de trabalhadores fronteiriços entre

seu lugar de residência (Pedro Juan Caballero, Paraguay) e o local de trabalho

(Ponta Porã, Brasil), e vice-versa. A figura 4 apresenta a linha internacional na

fronteira de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.

Figura 4. Aspecto da linha internacional na fronteira de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.

Fonte: Trabalho de campo 2019

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Verificamos que não existem postos de entrada e saída de pessoas ou

mesmo fiscalização específica ligada a instituições trabalhistas ao longo dessa

linha fronteiriça. A travessia de pedestres e veículos na fronteira ocorre de

maneira natural, “uma hora você está no Brasil e outra no Paraguai” diz um

turista que visita a região por primeira vez, “eu até confundo, se não for pelas

placas das lojas ou o nome das ruas, eu penso que estou no lado brasileiro”

continua.

Averiguamos que existe um posto fixo da Policia Federal no lado brasileiro

da fronteira que registra a entrada e saída de estrangeiros, incluindo os

trabalhadores paraguaios, porém estes trabalhadores devem descolar-se até

essas instituições com a intenção de obter a documentação que permita realizar

trabalhos remunerados no Brasil, o que um custo financeiro que muitas vezes o

trabalhador não dispõe no momento, conforme o relato a seguir:

Yo vivo en Pedro Juan y trabajo en Ponta Porã, todo los días me voy en mi trabajo, antes me iba de mañana y también de tarde, ahora ya me quedo directo en mi trabajo, mi patrona ya me pidió mi documento para registrarme, pero me fui allá en la Federal y me pasó un papel con los requisitos, muchas cosas me pide y caro es, hasta ahora no tengo ese documento, así no más trabajo. Prefiero trabajar en el Brasil porque el real vale más (Entrevista realizada a VM, no dia 26/07/2019).

Também é comum na região fronteiriça da área central da cidade de Ponta

Porã, especificamente nos setores de comércio e serviços, a presença do

trabalhador paraguaio com emprego sem carteira assinada, pois no momento da

contratação ele/a ainda está em fase de experiência e, em acordo mútuo com

empregador, esse trabalhador busca regularizar a sua situação de trabalhador

fronteiriço, por meio da junção de documentação e apresenta o requerimento ao

órgão responsável. Desta forma verificamos que é comum o fato de paraguaios

que residem em Pedro Juan Caballero trabalharem em Ponta Porã, e por todos

os dias efetuam travessias na fronteira, alguns trabalhadores cruzam a linha de

fronteira internacional mais de duas vezes por dia, em algumas situações em até

4 vezes ao dia, que depende da condição em que este trabalhador é contratado,

conforme podemos verificar na entrevista a seguir.

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Yo trabajo en Ponta Porã, hace más de 10 años, soy contadora, me recibí en el Paraguay (Pedro Juan), y luego me fui a trabajar en el Brasil (Ponta Porã), primero trabajé sin la documentación legal, después ya me hice mi documento, ese documento para los que viven en Pedro Juan y trabajan en Ponta Porã, para eso mi patrón escribió una carta en donde decía que yo estoy trabajando en la empresa y eso entregué en la Federal. A mí me conviene trabajar aquí, soy asegurada, tengo mis férias y puedo aposentarme también, ganar en real es mejor (AM, entrevista realizada no dia 25/07/2019).

Da mesma forma verificamos que existem brasileiros residentes em Ponta

Porã que trabalham em Pedro Juan Caballero em diversas atividades

econômicas como, por exemplo: comércio, serviço, hotelaria e indústria.

A maior parte dessa migração pendular na fronteira é realizada em

transporte de carros, motocicletas, motocarrinhos (triciclos motorizados),

bicicletas, os quais constituem-se nos meios de transporte que garantem uma

mobilidade urbana a estes trabalhadores, e neste contexto também estão

presentes os sujeitos que atravessam a fronteira de a pé.

Considerações Finais

As fronteiras analisadas apresentam arranjos espaciais singulares, onde

ocorrem fluxos de trabalhadores para ambos os lados da fronteira. Apesar que

no caso do arranjo espacial entre Corumbá (BR) e Puerto Quijarro (BOL) facilitar

o controle por parte do Estado, as instituições que teriam esse poder de fiscalizar

tal atividade, não o fazem, facilitando essa fluidez de trabalhadores para ambos

os lados desse limite fronteiriço.

No caso da fronteira entre Ponta Porã (BR) e Pedro Juan Caballero (PY)

pelo seu arranjo espacial, acaba por facilitar a fluidez de trabalhadores para

ambos os lados desse espaço fronteiriço. Onde moradores de Ponta Porã podem

trabalhar em Pedro Juan Caballero sem ter que passar por nenhuma instituição

de controle ocorrendo o mesmo com moradores de Pedro Juan Caballero. Com

isso se facilita e se intensifica a migração pendular em busca de trabalho e

melhoria de condição social nessa fronteira.

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Referências

CARDONA, S. A. B. A la sombra de los perobales: Historia del poblado de Punta Porã, génesis de dos ciudades, 1870-1902. Imprenta Salesiana,

Paraguay, 2008.

COSTA, Edgar Aparecido da. Ordenamento territorial em áreas de fronteira. In: COSTA, E.A; OLIVEIRA, M.A.M. Seminário de estudos fronteiriços. Campo Grande: Editora UFMS, 2009. p. 61-78.

DGEEC. Dirección General de Estadística, Encuestas y Censos. Paraguay: Proyección de la Población Nacional, Áreas Urbana y Rural, por Sexo y Edad, 2000-2025.2015.

GOIRIS, F. Descubriendo La Frontera: historia, sociedad y política en Pedro Juan Caballero. Ponta Grossa: INPAG, 1999.

LAMBERTI, Eliana. Dinâmica comercial no território de fronteira: reexportação e territorialidade na conurbação Ponta Porã e Pedro Juan Caballero. (Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação).

Aquidauana /MS, Brasil 2006.

NOGUEIRA, Ricardo José Batista. Fronteira: espaço de referência identitária? Ateliê Geográfico. n. 2, v. 1, Goiânia-GO, p. 27-41, 2007.

PASTORE, C. La lucha por la Tierra en el Paraguay. Asunción: Internacional

Editora, Tercera Edición Corregida. 2013.

RAMÍREZ, J. Amambay: evolución eonómica y potencialidades turísticas. In: BORDA, M.; MAIS, F. Economías Regionales y Desarrollo Territorial. CADEP, 2002.

ROIG, C. M. Q de. Estampas de “Pedro Juan Caballero”. Imprenta Alborada S.R.L. Asunción, Paraguay. 1984.

SOUZA, Edson Belo Clemente de; ARANHA-SILVA, Edima. O ordenamento territorial como instrumento para viabilizar a cooperação transfronteiriça: estudos de caso na fronteira Brasil-Paraguai. V Seminário Internacional da América Platina. Dezembro, 2011.

STEIMAN, R. Zona de Fronteira e Cidades Gêmeas: uma tipologia das interações fronteiriças. Taller Internacional Espacios Urbanos y Sociedades

Fronterizas en la Amazonia. Leticia, Colombia: Universidad Nacional de Colombia, p.154-166, 2010.

Agradecimentos

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Os autores agradecem a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior) pela Bolsa de Estudos no nível de Doutorado.