Descoberta abre caminho para o desenvolvimento de drogas capazes de matar a principal praga que afeta a produo de cacau no pas. Doena derrubou produo de cacau no Brasil (divulgao)Especiais

Pesquisa desvenda ponto fraco da vassourade-bruxa22/05/2012

Por Karina Toledo Agncia FAPESP A estratgia usada pela praga vassoura-de-bruxa principal doena que afeta a produo de cacau no pas para resistir ao ataque da planta hospedeira e aos mais potentes fungicidas do mercado foi desvendada por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A descoberta, publicada na revista New Phytologist, abre caminho para o desenvolvimento de novas drogas capazes de combater a doena de forma efetiva. Causada pelo fungo Moniliophthora perniciosa, a vassoura-de-bruxa tem esse nome porque deixa os ramos do cacaueiro secos como uma vassoura velha. As reas afetadas no conseguem realizar fotossntese e, para piorar, liberam substncias txicas que diminuem a produo de frutos. Os poucos frutos produzidos se tornam inviveis para a fabricao de chocolate. Na fase inicial da infeco, a planta tenta deter a ao do invasor liberando grandes quantidades de xido ntrico (NO), substncia capaz de bloquear a cadeia respiratria do fungo. Mas descobrimos que a vassoura-de-bruxa possui um mecanismo alternativo de respirao que lhe permite resistir a esse ataque, explicou Gonalo Amarante Guimares Pereira, coordenador do Laboratrio de Genmica e Expresso da Unicamp, onde a pesquisa foi conduzida. Ironicamente, a prpria planta acaba sofrendo os efeitos txicos do NO. Os galhos infectados morrem e viram banquete para a M. perniciosa. O fungo tem uma fase biotrfica, na qual vive dentro da planta ainda viva, e outra necrotrfica, em que se alimenta do tecido morto, disse Pereira.

A equipe coordenada pelo pesquisador descobriu que, durante a fase biotrfica, quando est sob o ataque da planta, a vassoura-de-bruxa produz uma enzima chamada oxidase alternativa. Essa protena lhe permite gerar uma quantidade mnima de energia e garante sua sobrevivncia. Nesse perodo o fungo praticamente no cresce, pois a energia disponvel pequena, mas ele consegue resistir ao ataque, disse Pereira. Quando a planta finalmente d a batalha por vencida, envia sinais para as clulas do galho infectado se suicidarem processo conhecido como apoptose. Como o xido ntrico deixa de ser liberado, o fungo desliga o mecanismo alternativo de respirao e entra na fase necrotrfica, passando a devorar vorazmente o tecido morto. Em duas frentes Os cientistas tiveram ento a ideia de testar uma combinao de princpios ativos azoxistrobina e cido salicil-hidroxmico capazes de inibir simultaneamente os dois mecanismos respiratrios da praga. Observamos que quando a respirao principal bloqueada pela azoxistrobina e a respirao alternativa se mantm, o fungo permanece na fase biotrfica. Mas, quando combinamos essa droga com um inibidor da oxidase alternativa, o fungo cessa completamente seu crescimento, contou Pereira. Embora tenha se mostrado promissora nos testes de laboratrio, essa combinao de molculas no pode ser usada como um fungicida comercial. A frmula altamente instvel e se degrada com facilidade. E isso inviabiliza o uso no campo, disse. A equipe agora trabalha, em parceria com a fabricante de defensivos agrcolas Ihara, para achar uma molcula com ao semelhante e capaz de se manter estvel por longos perodos de prateleira. Temos a oportunidade de criar um produto realmente eficaz para fungos tropicais. Hoje no existe fungicida assim em nenhum lugar do mundo. algo de grande importncia tecnolgica, avaliou Pereira. Os pesquisadores esto testando a mesma combinao de molculas capaz de bloquear a enzima oxidase alternativa contra outras espcies de fungos tropicais, como a ferrujem da soja e do caf. Os resultados em laboratrio indicam que estamos na direo certa, disse. Realizada com financiamento da FAPESP, a pesquisa faz parte do projeto de doutorado de Daniela Thomazella e Paulo Teixeira , e est sendo realizada no mbito do Projeto Temtico "Estudo integrado e comparativo de trs doenas fngicas do cacau vassoura-de-bruxa, monilase e mal do faco visando compreenso de mecanismos de patogenicidade para o desenvolvimento de estratgias de controle", coordenado por Pereira..

Os esforos brasileiros para elucidar o mecanismo de ao da doena que h mais de duas dcadas afeta drasticamente a produo de cacau no Brasil comearam por volta do ano 2000, com o mapeamento do genoma da M. perniciosa. Quando chegou ao sul da Bahia, em 1989, provavelmente vinda da regio amaznica, a vassoura-de-bruxa fez com que a produo nacional casse de aproximadamente 400 mil toneladas ao ano para pouco mais de 120 mil. O Brasil, antes um dos maiores exportadores de cacau, passou a importar sementes de pases como a Indonsia, com qualidade inferior. Atualmente, a doena est presente em todos os pases produtores de cacau da Amrica Central e do Sul.