michael hudson - o ataque financeiro aa grécia
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Michael Hudson analisa o ataque financeiro predador à GréciaTRANSCRIPT
15/07/2015 O ataque financeiro à Grécia
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O ataque financeiro à Grécia– Para onde vamos a partir daqui?
por Michael Hudson
O
maior problema financeiro que dilacerou economias ao longo do séculopassado estava mais do lado da dívida oficial intergovernamental do que do dadívida do sector privado. Eis porque a economia global de hoje enfrenta umaruptura semelhante à de 192931, quando ficou evidente que o volume dedívidas oficiais intergovernamentais não podia ser reembolsado. O Tratado deVersalhes impôs reparações impossíveis à Alemanha e os Estados Unidosimpuseram exigências igualmente destrutivas aos Aliados quanto aopagamento de dívidas [pelo fornecimento] de armas utilizadas na I GuerraMundial. [1]
Há procedimentos legais bem estabelecidos para enfrentar bancarrotascorporativas e pessoais. Tribunais cancelam parcialmente (write down) dívidasde pessoas e de negócios tanto sob o procedimento "devedor no controle"como pelo arresto e os credores assumem uma perda sobre empréstimos quecorreram mal. A bancarrota pessoal permite a indivíduos retomarem a vida.
É muito mais difícil cancelar parcialmente dívidas possuídas ou garantidas porgovernos. A dívida de empréstimos a estudantes dos EUA não pode seranulada, mas permanece de modo a impedir os diplomados de ganharem o
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suficiente para terem um salário líquido (depois de o serviço da dívida e aretenção na fonte da contribuição para a Segurança Social ser deduzida dosseus cheques de pagamento) de modo a casarem, constituírem família ecomprarem casas para si próprios. Só os bancos obtêm salvamentos (bailedout), agora que se tornaram efectivamente os planeadores centrais daeconomia.
Acima de tudo, não há estrutura legal para cancelamentos parciais de dívidasao FMI, BCE ou governos credores europeus e americanos. Desde a décadade 1960 nações inteiras foram sujeitas à austeridade e contracção económicaque torna cada vez menos possível livraremse da dívida. Governos sãoimplacáveis e o FMI e BCE actuam por conta de bancos e possuidores detítulos – e estão ideologicamente capturados pelos combatentes financeiros doantitrabalho e antigoverno.
O resultado não é a "economia de mercado livre" que pretende ser, nem aregra da racionalidade económica. Uma genuína economia de mercadoreconheceria a realidade financeira e cancelaria dívidas parcialmente de acordocom a capacidade de serem pagas, mas a dívida intergovernamental cancelamercados e recusase a reconhecer a necessidade de um Quadro Limpo(Clean Slate). A teoria condutora de hoje – apoiada pela teoria económica lixodo monetarismo – é que dívidas de qualquer dimensão podem ser pagas,simplesmente pela redução dos salários e padrões de vida do trabalho mais aliquidação do domínio público de uma nação – sua terra, reservas de petróleo egás, minerais e distribuição de água, estradas e sistemas de transporte,centrais eléctricas e sistemas de esgotos, além de todas as formas deinfraestrutura pública.
Imposta pelo monopólio das instituições financeiras intergovernamentais – oFMI, BCE, Tesouro dos EUA e assim por diante – a alavancagem financeira docredor tornouse o novo modo de travar a guerra no século XXI. É tãodevastador quanto à guerra militar no seu efeito sobre a população: elevaçãodas taxas de suicídio, tempos de vida mais curtos e emigração daqueles emidade de tropa que sempre foram as principais baixas de guerra: adultosjovens. Ao invés de serem conscritos no exército para combaterem inimigosestrangeiros, eles são afastados dos seus lares para procurarem trabalho noexterior. O que costumava ser um êxodo rural da terra para as cidades desde oséculo XVII é agora um "êxodo do devedor" dos países cujos governos devemsomas impagavelmente altas a governos credores e aos bancos e possuidoresde títulos em cujo benefício impuseram sua política.
Ao mesmo tempo que empurra a economia do mundo para um estado deguerra internacional, a alta finança trava também uma guerra contra o trabalho– e em última análise contra governos e portanto contra a democracia. Apolítica do BCE neste ano tem sido brutal em relação à Grécia: "Se nãoreeleger um partido ou coligação de direita, destruiremos o seu sistema
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bancário. Se não vender a preço de saldo o seu domínio público tornaremos avida ainda mais difícil para si".
Não é de admirar que o ministro das Finanças grego Yanis Varoufakis tenhachamado a posição negocial da Troika de "terrorismo financeiro". A sua ideia de"negociação" é a rendição. Eles são inflexíveis. Instituições credoras oficiaisameaçam isolar, sancionar e destruir economias inteiras, incluindo sua indústriabem como o trabalho. Isto transforma a guerra de classe do século XIX numcolapso puramente destrutivo.
Esta é a grande diferença entre os dias de hoje e 192931. Naquele tempo, osprincipais governos do mundo finalmente reconheceram que dívidas nãopodiam ser pagas e suspenderam reparações alemãs e dívidas interaliados. Asituação de hoje está a utilizar a impagabilidade de dívidas como alavanca naguerra de classe.
O objectivo político imediato desta guerra financeira na Grécia é substituir seugoverno eleito (apoiado por uma notável votação no referendo de 5 de Julho de61 a 39%) pelo controle de credores estrangeiros através de "tecnocratas", istoé, lobbyistas de bancos, factótuns e antigos administradores da GoldmanSachs. O objectivo a longo prazo é impor uma guerra contra o trabalho – naforma de austeridade – e contra o poder dos governos de determinarem suaprópria política fiscal, política financeira e política pública regulamentar.
Felizmente, há uma alternativa. Aqui está o que é necessário. (esbocei minhaspropostas numa apresentação perante o Parlamento em Bruxelas no dia 3 deJulho [2] , a seguir a uma defesa anterior na Iniciativa Delphi, na Grécia,reunida pela esquerda do Syriza na semana anterior. [3]
Uma declaração reafirmando os direitos de nações soberanas
Nações soberanas têm o direito de colocar o seu próprio crescimento à frentede credores externos. Nenhuma nação deveria ser obrigada a impor depressãocrónica e desemprego ou a polarizar a distribuição da riqueza e rendimento afim de pagar dívidas.
Toda nação tem o direito ao critério chave da nacionalidade: o direito de emitirsua própria moeda, cobrar impostos e escrever suas leis, incluindo aquelas quegovernam relações entre credores e devedores, especialmente os termos debancarrota e anulação de dívida.
A lógica económica dita o que foi reconhecido no fim da década de 1920:Quando dívidas atingem o nível em que perturbam o equilíbrio económicobásico e desordenam a sociedade, elas deveriam ser anuladas. Uma outraforma de dizer isto é que o volume de dívida – e os custos dos seus encargos –deve ser trazido a uma razoável capacidade para pagar.
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Rejeitando a posição do "hard money" (realmente um "hard credor") deeconomistas antialemães como Bertil Ohlin e Jacques Rueff, Keynesargumentou que credores tês obrigação de explicar à Alemanha simplesmentecomo teriam possibilidade de pagar suas reparações. [4] Ele queria naqueletempo que a França, GrãBretanha e outros receptores de reparações deveriamespecificar exactamente que exportações alemãs deveriam concordar emcomprar. Mas hoje, os credores definem a capacidade de pagar de uma naçãonão em termos de como ela pode ganhar o dinheiro para pagar, mas ao invésque activos do domínio público ela pode liquidar naquilo que é um processo debancarrota nacional. Países devedores devem deixar sua infraestrutura públicaser vendida a extractores de renda para criar uma economia de portagensneofeudal.
Sob o direito internacional, nenhuma nação está legalmente obrigada a fazeristo. E sob a definição moral de nacionalidade, elas não deveriam ser forçadasa assim fazer. O seu direito a resistir é o que as faz soberanas, afinal decontas.
Um fórum internacional para determinar a capacidade (ou incapacidade)de pagar dívidas
O que é necessário para colocar este princípio básico em prática é a criação deum novo fórum internacional para determinar (to adjudicate) quanta dívida poderazoavelmente ser paga – e quanto deveria ser anulada. Em 1929 o PlanoYoung (o qual substituiu o Plano Dawes para tratar mais racionalmente dasreparações alemãs) apelou à criação de uma tal instituição – o que se tornou oBank for International Settlements (BIS), em 1931, para travar a destruiçãoeconómica da Alemanha fazendo com que suas reparações ficassem emconsonância com a sua capacidade para pagar.
O BIS não desempenha mais tal papel, porque se tornou o principal local dereunião para os bancos centrais do mundo e, como tal, adoptou a linha rígidade que "todas as dívidas devem ser pagas" a que originalmente estavadestinada a se opor.
Igualmente o FMI já não pode desempenhar este papel. Ele éirremediavelmente político. Apesar de a sua equipe técnica determinar em201011 que as dívidas externas da Grécia não podiam ser pagas e portantoprecisavam ser anuladas, seus chefes – primeiro Dominique StraussKahn e aseguir Lagarde – actuarem em flagrante conflito de interesse em apoio aosbanqueiros franceses que pediam o pagamento pleno, e aos pedidos dopresidente Obama e do lobbyista da Wall Street Tim Geithner a insistirem emnenhum cancelamento parcial. Aquele foi o preço para o apoio da bancafrancesa à pretensão de StraussKahn de candidatarse à presidência daFrança, e recentemente ao apoio a Lagarde. Dado o poder de veto dos EUA
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pela Wall Street e à insistência dos ideólogos antitrabalho da direita(habitualmente franceses) em serem nomeados chefes do FMI, é necessáriauma nova organização representando a espécie de lógica económica delineadanos anos 1920 por Keynes, Harold Moulton e outros.
A criação de uma tal instituição deveria ser uma plataforma importante dapolítica da esquerda europeia.
Uma lei da transmissão fraudulenta, aplicável a governos
O sector privado desde há muito tem leis que impedem prestamistas deemprestarem a um tomador mais fundos do que o devedor possarazoavelmente reembolsar no decorrer dos negócios. Se um prestamistaavança, digamos US$10 mil como um empréstimo hipotecário contra uma casaque valha mais (digamos, US$100 mil), e então insiste em que o devedorpague ou perca a sua casa, os tribunais podem assumir que o empréstimo foiefectuado com este objectivo em mente e anular a dívida.
Da mesma forma, se uma companhia é atacada por prestatários carregandoacom títulos lixo de altos juros e a seguir toma o seu fundo de pensões e liquidaactiva para pagar suas dívidas, a companhia sob ataque pode processar sob [alei] das transmissões fraudulentas. Assim fizeram na década de 1980.
Este estratagema empréstimoarresto é o jogo que a Troika tem feito com aGrécia. Eles emprestam ao seu governo dinheiro que os economistas do FMIexplicaram bastante claramente em 201011 (e reafirmaram este ano poucoantes do referendo grego) que não podia ser pago. Mas então veio o BCE edisse: "Liquidem vossa infraestrutura, vendam seus portos, seus direitos ao gásno Egeu e ilhas inteiras, a fim de obter o dinheiro para pagar o que o FMI e oBCE tem pago a franceses, alemães e outros detentores de títulos em seunome (enquanto salvavam bancos de investimento e hedge funds dos EUA deperderem suas apostas em que dívidas gregas seriam realmente pagas).
A aplicação deste princípio requer que um tribunal internacional determina emque ponto aquele serviço de dívida se torna intrusivo e consequentementecancele dívidas parcialmente.
Criação de Tesourarias como bancos centrais nacionais para monetizargastos com défice
Os bancos centrais de hoje só emprestam dinheiro a bancos, com o objectivode carregar economias com dívida. A exigência irracional dos banqueiros deimpedir uma opção pública de criação de crédito nos seus próprios teclados decomputador (do mesmo modo como aqueles bancos criam empréstimos edepósitos) destinase simplesmente a criar um monopólio privado para extrairrenda económica na forma de juros, taxas e finalmente arrestos de credores
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que incumprem – tudo garantido pelos "contribuintes".
O Banco Central Europeu não é adequado para este dever. Antes de maisnada, ele baseiase na ideologia de que a criação de moeda pública éinflacionária. A realidade é que a criação de moeda pelo banco central apenasfinanciou a maior inflação da história moderna – a inflação de preços de activosno mercado imobiliário por hipotecas lixo, inflação de preços de acções poremissões de títulos lixo e a Facilidade Quantitative (Quantitative Easing) dobanco central para criar a maior e mais rápida corrida no mercado de títulos dahistória. A experiência pós 1980 com bancos centrais removeu qualquer lógicamoral ou económica do seu comportamento quando lobbyistas de bancoscomerciais, defensores de privilégios especiais, desregulamentadores do crimefinanceiro e extremistas de direita bloqueadores de uma opção pública nabanca a fim fazer com que serviços básicos estejam de acordo com seuscustos reais. Em suma, se sistemas de banca comercial em praticamente todosos países tornaramnos desindustrializado e perversos, seus possibilitadoresforam bancos centrais.
O remédio é substituir estes bancos centrais com o que os antecedeu:Tesourarias nacionais, cuja função adequada é monetizar as despesas dogoverno dentro da economia. O princípio básico de funcionamento deveria serque qualquer necessidade monetária e de crédito da economia deveria sercumprida pelo gasto público e monetização, não por bancos centrais que criamcrédito portador de juros para financiar a transferência de activos (ex.:hipotecas imobiliárias, buyouts e raids corporativos, arbitragem e jogos decasino capitalistas).
Sumário
Toda nação tem o direito de se defender contra o ataque – tanto o ataquefinanceiro como o ataque militar aberto. Isso faz parte do princípio da autodeterminação.
A Grécia, Espanha, Portugal, Itália e outros países devedores têm estado sob omesmo modo de ataque como o do FMI e sua doutrina da austeridade quelevaram a América Latina à bancarrota na década de 1970. O direitointernacional precisa ser actualizado para reconhecer que a finança tornouse omodo de guerra dos dias modernos. Seus objectivos são os mesmos: aquisiçãode terra, matériasprimas e monopólios.
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Um subproduto desta guerra foi tornar a rede financeira de hoje tão disfuncionalque as nações agora precisam de um Quadro Limpo (Clean Slate) financeiro.Aquele que teve mais êxito em tempos modernos foi o Milagre Económicoalemão – a Reforma Monetária dos Aliados após a II Guerra Mundial. Todas asdívidas internas alemãs foram anuladas, excepto dividas salariais deempregados à força de trabalho e balanços básicos. Posteriormente, em 1953,suas dívidas internacionais foram canceladas parcialmente. A lógica que levoua estes actos precisa ser reaplicada hoje.
Em relação especificamente à Grécia, líderes do Syriza disseram que queremsalvar a Europa. Antes de mais nada, da irracionalidade económica destrutivada eurozona ao não ter um banco central real. Este defeito foi construídodeliberadamente na eurozona, a fim de forçar um monopólio de bancoscomerciais e detentores de títulos suficientemente poderosos para ganhar ocontrole de governos, rejeitando a política e os referendos democráticos.
As regras da eurozona – os tratados de Maastricht e Lisboa – destinamse aimpedir governos de incidirem em défices orçamentais injectando dinheiro naeconomia para reviver o emprego. O novo objectivo é apenas resgatardetentores de títulos e bancos de maus empréstimos e mesmo de empréstimos
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fraudulentos, salvandoos a expensas públicas. As economias são obrigadas avoltaremse para empréstimos da banca comercia a fim de obter o dinheiro queprecisam para crescer. Este princípio precisa ser rejeitado pois viola um direitosoberano básico dos governos e da democracia económica.
Uma vez que uma economia está financeira defeituosa por (1) não ter umbanco central para financiar despesa governamental, e (2) pela limitação dosdéfices orçamentais do governo a apenas 3% do PIB, a economia devecontrairse. Uma economia em contracção significará menos receitas fiscais e,portanto, défices no orçamento do governo mais profundos e elevação dadívida governamental.
O supremo assassínio é a exigência do BCE, FMI e CE de que governospaguem suas dívidas através da privatização da infraestrutura pública, recursosnaturais, terra e outros activos no domínio público. Para agravar esta exigência,a Troika impediu a Grécia de vender pela oferta mais alta, se fosse a Gazpromou outra companhia russa. A política financeira tornouse portanto militarizadacom parte da política de Nova Guerrafria da NATO. Economias devedorasestão destinadas a vender a eurocleptocratas – em termos financiados pelosbancos, de modo a que encargos de juros do acordo absorvam todos os lucros,deixando os governos sem muita receita fiscal.
07/Julho/2015
[1] Este é o tema do meu livro Super Imperialism: The Economic Strategy of American Empire (1972,new ed., 2002). [2] O vídeo pode ser visto aqui: www.guengl.eu/... (apareço cerca do minuto 37). [3] resistir.info/grecia/declaracao_delphi.html [4] Resumo este debate entre Keynes e seus antagonistas em Trade, Development and Foreign Debt(new ed. ISLET 2009), chapter 16.
Ver também: Grecia: Críticas pasadas y el camino a seguir , Olivier Blanchard
O original encontrase em www.unz.com/mhudson/thefinancialattackongreece/
Este artigo encontrase em http://resistir.info/ .13/Jul/15