metrÔ: agente de transformaÇÕes urbanas na freguesia da ameixoeira, em lisboa

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METRÔ: AGENTE DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS NA FREGUESIA DA AMEIXOEIRA, EM LISBOA SARDINHA NETO, DIAMANTINO A. i (1); CONCEIÇÃO, JOSÉ G. (2) 1. PUC-SP. Departamento de Ciências Sociais [email protected] 2. PUC-SP. Departamento de Ciências Sociais [email protected] Resumo O presente trabalho busca analisar as ações de planejamento urbano para a Freguesia da Ameixoeira e seus resultados. Procura, ainda, verificar possíveis transformações urbanísticas e sociais em função da estação de Metrô da Ameixoeira, a partir de pesquisa em documentos da Câmara Municipal de Lisboa (CML) e do Metropolitano de Lisboa (ML), consulta a material bibliográfico, entrevistas com os Gestores Municipais e com moradores da freguesia, no local e por meio de redes sociais e, ainda, observação de campo. Deste modo, ao apresentar o estudo de caso da Freguesia da Ameixoeira, na Cidade de Lisboa, este trabalho pretende contribuir para a visão estratégica do planejamento urbano, na busca de ações que possam ser aplicadas em outras localidades, por meio de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida das populações, onde o transporte público possui papel fundamental. Palavras-chave: Planejamento Urbano, Transporte metroviário, Bairros Sociais.

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Artigo apresentado no 3º Colóquio Brasil - Portugal ocorrido na semana de 22 a 25 de outubro de 2012, publicado no CD com o material do evento, no Brasil e em Portugal.

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Page 1: METRÔ: AGENTE DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS NA FREGUESIA DA AMEIXOEIRA, EM LISBOA

METRÔ: AGENTE DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS NA FREGUESIA

DA AMEIXOEIRA, EM LISBOA

SARDINHA NETO, DIAMANTINO A.i (1); CONCEIÇÃO, JOSÉ G. (2)

1. PUC-SP. Departamento de Ciências Sociais

[email protected]

2. PUC-SP. Departamento de Ciências Sociais

[email protected]

Resumo

O presente trabalho busca analisar as ações de planejamento urbano para a Freguesia da

Ameixoeira e seus resultados. Procura, ainda, verificar possíveis transformações urbanísticas e

sociais em função da estação de Metrô da Ameixoeira, a partir de pesquisa em documentos da

Câmara Municipal de Lisboa (CML) e do Metropolitano de Lisboa (ML), consulta a material

bibliográfico, entrevistas com os Gestores Municipais e com moradores da freguesia, no local e por

meio de redes sociais e, ainda, observação de campo. Deste modo, ao apresentar o estudo de caso

da Freguesia da Ameixoeira, na Cidade de Lisboa, este trabalho pretende contribuir para a visão

estratégica do planejamento urbano, na busca de ações que possam ser aplicadas em outras

localidades, por meio de políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de vida das

populações, onde o transporte público possui papel fundamental.

Palavras-chave: Planejamento Urbano, Transporte metroviário, Bairros Sociais.

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1. INTRODUÇÃO

As grandes concentrações urbanas convivem, em sua maioria, com contradições significativas

entre a modernidade e o passado, a riqueza e a pobreza, a inclusão e a exclusão social. Os

moradores destes centros sofrem, muitas vezes, com a falta de mobilidade, de segurança, de

moradia e de infraestrutura, que tornam a vida de muitos cidadãos difícil e penosa em diversos

aspectos.

Considerando-se que a classe menos favorecida está localizada, em sua grande maioria, na área

periférica das cidades, podemos entender a dificuldade no acesso aos locais de trabalho e de

serviços, como uma forma de exclusão social ligada à pobreza urbana. A aglomeração de

trabalhadores, nas periferias, motiva o crescimento descontrolado das populações e a expansão de

seus contornos, dificultando ainda mais a chegada das pessoas carentes ao trabalho e aos

aparelhos do Estado. Deste modo, podemos afirmar que o cenário urbano é elaborado com base

nas contradições que se apresentam no espaço das cidades.

Uma questão fundamental nas grandes metrópoles é o transporte, que cumpre uma função

importante para a produção capitalista, na movimentação da mão-de-obra e de mercadorias. “O

Capital é um processo de circulação entre produção e realização” e “no contexto da acumulação

geral, o aperfeiçoamento do transporte é visto como inevitável e necessário” (HARVEY, 2006, pp.

50 e 73).

Dentre as políticas públicasii, para a inclusão, considera-se em particular, que a oferta de um

transporte de massa pode contribuir para a eficiência urbana e a inclusão dos menos favorecidos.

Neste trabalho, a escolha pela Freguesia da Ameixoeira justifica-se por suas características

similares a muitas áreas urbanas carentes, em diversas cidades do mundo, e por possuir pontos

convergentes com bairros periféricos da cidade de São Paulo, principalmente, se observarmos

como era a região, antes das intervenções realizadas pelas autoridades portuguesas. Esta

pesquisa pretende contribuir para a visão estratégica do planejamento urbano, na busca de

inovações que possam ser aplicadas em outras localidades, por meio de políticas voltadas para a

melhoria das condições de vida das populações, onde o transporte coletivo de massa possui papel

fundamental.

1.1 Metodologia

Para alcançar os objetivos deste estudo, optou-se pela metodologia da pesquisa bibliográfica e

documental, apoiadas pela observação de campo. Para a coleta de dados utilizou-se de pesquisa

em documentos da Câmara Municipal de Lisboa (CML) e do Metropolitano de Lisboa (ML), consulta

a material bibliográfico, entrevistas com os Gestores Municipais e com moradores da freguesia no

local e, por meio de redes sociais.

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2. O PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO URBANO

O planejamento urbano e suas análises são instrumentos significativos para o entendimento e a

implantação de ações de melhoria da qualidade de vida nas grandes concentrações urbanas,

principalmente naquelas mais carentes.

A integração com os modos de transporte pode trazer resultados efetivos no atendimento aos

objetivos de um planejamento, que tem a preocupação de fornecer soluções para minorar as

dificuldades das camadas mais necessitadas da população.

O planejamento estratégico, aplicado anteriormente nas cidades, possuía uma abordagem

quantitativa que buscava superar as questões urbanas, apenas por meio do fomento das atividades

econômicas. A perspectiva desenvolvimentista era o foco. Entretanto, estas ações resultaram em

descrédito e fracasso, por diversas vezes. Este modelo determinístico não conseguiu atingir os

objetivos de melhorar a vida nas cidades, mediante aos grandes desafios surgidos a partir da

década de 80.

“A partir dos anos 1980, o chamado planejamento estratégico passou a figurar de maneira proeminente entre as políticas urbanas adotadas... tornando-se muitas vezes nada mais que o sinônimo de uma postura competitiva e empresarial preocupada com a atração de investimentos, eventos e turismo, com a imagem urbana e a reinserção otimizada de cada cidade no panorama europeu e mundial” (LEITE, 2004).

É inegável que a superação das dificuldades das populações das grandes cidades passa pelo

planejamento urbano, porém, as formas tradicionais de planejamento mostraram-se ineficientes e,

de certa, forma só acirraram as contradições e consolidaram a fragmentação do solo e o isolamento

das pessoas mais carentes. A visão empresarial de planejamento leva a um favorecimento dos

interesses do capital. “A integração do projeto urbano ao mercado traz claramente o perigo de

atender às necessidades do consumidor rico e privado, e não do consumidor pobre e público.”

(HARVEY, 1992, p. 78). O planejamento urbano deve conter políticas que fomentem ações

diferenciadas, superando as perspectivas desenvolvimentistas, focadas apenas nos aspectos

econômicos da questão.

Para Craveiro (2008) o “planejamento estratégico é um processo para a definição dos futuros

desejáveis e possíveis para a cidade, das linhas de desenvolvimento econômico e social e a

determinação de estratégias, meios e ações para atingir esses objetivos".

Segundo, ainda, a mesma autora:

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O planejamento estratégico adaptado à cidade se diferencia do clássico planejamento a médio e curto prazo ao pretender considerar novas tendências ou descontinuidades e se fixa mais nas saídas e vias para aproveitar novas oportunidades do que nos pressupostos dos objetivos. (CRAVEIRO, 2008, p. 4).

Uma mudança na abordagem do planejamento para uma visão estratégica e qualitativa se fez

necessária e foi aplicada, inicialmente, nos Estados Unidos e em diversas cidades ao redor do

mundo, como em Barcelona e em Lisboa, entre outras. A adoção do planejamento estratégico

plenamente adaptado para as cidades que se iniciou em fins da década de 70 está, desde então,

ganhando espaço em outros centros urbanos.

Segundo Harvey “a aparência de uma cidade e o modo como seus espaços se organizam formam a

base material a partir da qual é possível pensar, avaliar e realizar uma gama de possíveis

sensações e práticas sociais” (HARVEY, 2006, p. 69).

Atualmente, os esforços do planejamento urbano em busca da efetividade devem considerar todos

os agentes envolvidos, a fim de representar uma mudança real. Envolvem inclusive o apoio da

opinião pública, para ajudar na construção de novas formas de estratégia buscando atender as

expectativas das populações.

Outro aspecto fundamental para a melhoria das cidades e da vida dos cidadãos é a mobilidade

urbana. Pode-se afirmar que a cidade é o motor da economia de um país e “o transporte é o óleo

que evita que esse motor trave” (BANCO MUNDIAL, 2003).

O planejamento, em busca da efetividade, deve considerar estratégias para o transporte como

elemento de integração das cidades e, portanto, parte importante das ações para melhoria

econômica e social das aglomerações urbanas.

O transporte coletivo é a alternativa para desafogar os grandes centros dos congestionamentos e

seus consequentes desperdícios de tempo e de energia. Deste modo, ele é vital para a melhoria da

qualidade de vida das populações, uso do solo, democratização no acesso aos serviços e ao

trabalho, incorporando a dimensão social da mobilidade urbana.

Pode-se acrescentar a essas melhorias os ganhos ambientais, uma vez que o transporte coletivo

polui seis vezes menos, segundo estimativas do Banco Mundial.

Apesar de não haver uma política que, de maneira simples, possa oferecer uma única solução para

todos os problemas do crescimento urbano e do transporte, o planejamento tem o papel de elaborar

alternativas que possam, quando aplicadas, propiciar infraestrutura adequada à demanda imediata

e futura. A coordenação do planejamento e execução das políticas de uso do solo e o

desenvolvimento das práticas de controle municipal são componentes primordiais para o

desenvolvimento urbano.

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Neste estudo verificamos as políticas públicas adotadas em Ameixoeira, as estratégias para a

melhoria na qualidade de vida da população da Freguesia e o papel do Metro de Lisboa neste

contexto.

2.1. Projeto LUDA (Grandes Áreas Urbanas Carentes)

O Projeto LUDA (Large Urban Distressed Areas) desenvolvido entre Fevereiro de 2003 e Janeiro de

2006, pela União Européia, teve por objetivo contribuir para a melhoria da qualidade de vida nas

grandes áreas carentes, por meio de um planejamento e desenvolvimento estratégico sistemático,

tendo em particular consideração a fase inicial do processo de reabilitação (LUDA, 2006).

A análise realizada pelos pesquisadores em Lisboa, uma das cidades parceiras do projeto,

escolheu a área da Ameixoeira, devido esta possuir diversas características que se encaixaram na

proposta do LUDA (Large Urban Distressed Areas).

A região possuía problemas potencias, tais como, exclusão social, ausência de planejamento

urbano, loteamentos ilegais, precariedade dos edifícios e concentração de realojamentos com

pouca participação dos moradores nas decisões.

Diversas ações foram propostas para o local, assim como o acompanhamento efetivo dos

programas em curso. Em seu relatório final, a pesquisa mostrou que esta área necessitava de uma

ação de intervenção integrada:

“dada a sua dimensão e caráter estratégico dentro da cidade, a presença de múltiplas privações e processos de transformação desarticulados e os baixos níveis de qualidade de vida em relação à média da cidade, pela existência de loteamentos ilegais e, ainda, por ser uma área periférica confinante com outros municípios” (CML, 2006).

Dentre as ações possíveis, foram apontadas:

Articular os projetos em curso;

Projetos de inclusão socialiii;

Reabilitação de edifícios, novos espaços públicos, equipamentos e estrutura viária;

Participação da população;

Sistema de monitoração específico.

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Figura 1: área da Freguesia da Ameixoeira em relação à cidade de Lisboa Fonte: projeto LUDA, 2006

Com base nos estudos do Projeto LUDA (Large Urban Distressed Areas), em 2006, a Câmara

Municipal de Lisboa, juntamente com o Departamento de Planejamento Estratégico e o

Departamento de Planejamento Urbano, apresentou um projeto chamado de PAT (Programa de

Ação Territorial), com um plano de ação para a Coroa Norte de Lisboa, que incluía a Freguesia da

Ameixoeira. Apesar de aprovado, por unanimidade, segundo o Departamento de Planejamento

Estratégico da cidade, o programa nunca foi implantado.

3. O METRÔ DE LISBOA

Segundo dados do Metro de Lisboa (2011), foi a partir da 2ª Guerra Mundial com a retomada da

economia e as políticas de eletrificação, com o aproveitamento dos fundos do Plano Marshall, que

se decidiu, efetivamente, construir um sistema de Metrô para a cidade.

Uma foi sociedade foi constituída a 26 de Janeiro de 1948, com objetivo de realizar o estudo técnico

e econômico para a criação de um sistema de transportes coletivos, que fosse baseado no

aproveitamento e uso do subsolo da cidade de Lisboa.

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Os trabalhos de construção foram iniciados em 7 de Agosto de 1955 e quatro anos depois, em 29 de

Dezembro de 1959, o novo sistema de transporte foi inaugurado.

Figura 2: diagrama da rede do Metro de Lisboa Fonte: Metro de Lisboa, 2012

Atualmente a rede conta com quatro linhas (Verde, Amarela, Azul e Vermelha), 55 estações e 43,2

quilômetros de extensão. O Metropolitano de Lisboa (ML) registou durante o ano de 2010 um

crescimento de 3,51 por cento, no volume de passageiros transportados, face ao ano anterior.

Durante o ano de 2010, o Metropolitano transportou cerca de 171 milhões de passageiros. De

acordo com as informações do Metropolitano de Lisboa, o aumento na demanda em relação ao ano

de 2009, tem motivos que merecem destaque: “este crescimento, reflete uma maior utilização do

transporte público em detrimento do transporte individual, tendência que esperamos persista no

futuro, e reflete o empenho do ML em se posicionar como o meio de transporte preferido em Lisboa”

(PEREIRA, 2010).

Ainda segundo a empresa:

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"o valor total de passageiros transportados, nos primeiros 7 meses de 2011, foi de 107 milhões 416 mil e 190, tendo-se verificado um aumento de procura superior a 400 mil passageiros, correspondente a uma taxa de crescimento de cerca de 0,4 por cento, face ao período homólogo de 2010" (METRÔ DE LISBOA, 2011).

4. O CASO AMEIXOEIRA

A Ameixoeira é uma das 53 Freguesias do Concelho de Lisboa. As Freguesias são a menor divisão

administrativa do território português e são geridas por órgãos próprios, eleitos pelos cidadãos do

território da Freguesia. A Ameixoeira está localizada na zona mais ao Norte da Capital e faz fronteira

com o Concelho de Odivelas ao Norte, com a Freguesia do Lumiar a Sudoeste e a Leste, com outra

Freguesia, a de Charneca. A Sudoeste encontra-se, ainda, a Avenida Padre Cruz, delimitando a

área. A estação Ameixoeira do Metrô está localizada mais ao sul, em uma zona urbana recente,

pouco afastada do centro histórico da Freguesia. Foi em Março de 2004, que o Metrô iniciou a

exploração do trecho Campo Grande - Odivelas na Linha Amarela, com cinco novas estações,

Quinta das Conchas, Lumiar, Ameixoeira, Senhor Roubado e Odivelas, que está fora dos limites do

município.

Figura 3: construção da estação Ameixoeira em 2002 Fonte: Metro de Lisboa, 2010

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A área chamada Coroa Norte de Lisboa, na qual a Freguesia da Ameixoeira está inserida, foi alvo

de estudos e intervenções que ocorreram em um passado recente e ainda estão em curso na

Câmara Municipal da cidade. Segundo o Departamento de Planejamento Estratégico da CML, a

Coroa Norte passou, nas últimas décadas, por vários processos de planejamento que foram

interrompidos ou ineficazes.

Mereceu atenção, por parte das autoridades municipais, o LUDA – Large Urban Distressed Areas

(Grandes Áreas Urbanas Carentes), realizado pela União Européia. Projeto que buscou “fornecer

ferramentas e métodos para uma abordagem estratégica tendo em vista a reabilitação urbana por

meio do apoio às cidades, no lançamento e na gestão deste tipo de abordagem” (LUDA, 2006),

conforme destacamos.

Anteriormente, iniciou-se em 2001 na Freguesia, a implantação do programa do Governo Central

chamado PER (Plano Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto).

Este programa que existia desde 1993, visava erradicar as moradias precárias, envolver os

municípios no processo e potencializar, com o realojamento, uma mudança no estilo de vida,

supostamente, associado aos bairros degradados.

Figura 4: edifícios de realojamento Fonte: acervo dos autores, 2010

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Além dos programas de realojamento, que modificaram o cenário da Freguesia, outro tipo de

urbanização existe na região. Chamado de EUROPAN, o bairro social situado ao norte da

Ameixoeira, tem por característica o preço muito abaixo dos praticados pelo mercado imobiliário.

Conforme Rodrigues (2007 p. 149) “o grande objetivo desta promoção imobiliária privada é trazer

novos moradores à região, moradores esses, com um status social superior ao existente na zona,

de modo a promover o convívio entre classes e assim evitar a segregação espacial real dos bairros

sociais”.

A soma destas medidas, porém, não obteve sucesso imediato, “o realojamento antecedeu a

construção de infraestruturas de transporte e equipamentos básicos, aumentando o isolamento da

população com menor capacidade de mobilidade e dificultando o acesso a bens e serviços

essenciais” (COLAÇO, 2010, p. 20).

Outros problemas podem ser verificados nas ações do governo português para a região:

“Atualmente grande parte da intervenção social nesta área procura combater a necessidade imediata dos pobres. Contudo, não cria condições para que os mesmos consigam por si, no futuro, ter acesso a bens e serviços necessários a garantir a sua condigna subsistência. De pouco ou nada ajuda, realojar as pessoas em habitações de custos controlados, retirando as mesmas dos barracos, se não forem instruídas e acompanhadas sobre a boa forma de utilização de uma casa, ou de terem rendimentos para a conservação do respectivo imóvel. Corre-se o risco da ajuda ter sido apenas temporária, e as habitações iniciarem um processo de degradação até se tornarem barracos, como as pessoas viviam inicialmente. A ajuda deve passar também pelo realojamento dos indivíduos pobres em habitações dignas, mas sendo sempre acompanhadas por técnicos especializados, verificando as condições de integração das pessoas numa nova realidade” (RODRIGUES, 2007, p. 30).

Com a inauguração da estação Ameixoeira, em 2004, a questão da infraestrutura adquire uma nova

roupagem. Modificações urbanísticas foram observadas no entorno, com a instalação deste

equipamento. Situado ao sul da Freguesia, o Metrô atende predominantemente a zona histórica da

Ameixoeira. Considerando uma área de influência de 400 metros, padrão para vários estudos, tais

como o LUDA (Large Urban Distressed Areas), a estação não se encontra muito próxima aos

bairros que resultaram do realojamento.

Rodrigues (2007 p. 121) afirma que “a Freguesia da Ameixoeira não pode considerar-se dotada de

quantidade significativa de equipamentos. Porém, ainda assim, a sua grande maioria encontra-se

localizada na parte mais a Sul, abrangendo, por conseguinte, o seu centro histórico”.

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Figura 5: edifícios no entorno da estação Ameixoeira Fonte: acervo dos autores, 2010

Os chamados “bairros sociais”, situados ao Centro e ao Norte da Freguesia, estão mais distantes da

estação do Metrô e, segundo gestores ligados à prefeitura do município, as linhas de ônibus, não

servem todas as zonas da Freguesia.

Em face da não implantação do PAT (Programa de Ação Territorial), em continuação às políticas

públicas para as áreas mais carentes, a CML, por meio do Programa Local de Habitação realiza,

desde 2010, um programa de requalificação dos bairros chamados de BIP (bairros e zonas de

intervenção prioritária) de Lisboa, visando novas intervenções urbanísticas nestes locais. Este

projeto continua em curso e o relatório final, contendo as opiniões dos moradores foi publicado em

novembro de 2010.

5. RESULTADOS DA PESQUISA

Toda a problemática que envolve as cidades do ponto de vista social, principalmente as dificuldades

com a produção e distribuição dos serviços públicos, exige políticas que atendam às necessidades

das populações periféricas que vivem um isolamento espacial.

Após as investigações realizadas no local, consulta a documentos, pesquisa bibliográfica e as

entrevistas com autoridades e moradores da Freguesia, verificamos que o Metrô facilitou o acesso

Page 12: METRÔ: AGENTE DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS NA FREGUESIA DA AMEIXOEIRA, EM LISBOA

ao trabalho e a outros equipamentos do Estado, como creches, escolas, hospitais, museus e

parques.

Também foi possível identificar, na opinião dos moradores, que ocorreu um aumento na oferta de

serviços, motivada pela chegada do Metrô. Em contrapartida, houve também, a valorização das

moradias e do preço do aluguel.

No aspecto transportes coletivos, os agentes municipais apontaram novas necessidades:

“Após a realização de um conjunto de diligências, por parte de alguns parceiros locais, verificou-se

que a resposta de Ônibus, na freguesia, não é favorável. No mínimo, revela ser necessário criar

uma linha que estabeleça a ligação entre o Bairro e o Metrô.” (Gestor Municipal).

Ou como afirma Rodrigues:

“Em relação aos transportes públicos coletivos estes encontram-se localizados também na parte Sul, situação considerada grave ao não abrangerem os Bairros de realojamento. Ponderando que esta parte da população é a mais carente em termos econômicos, tendo por conseguinte menos hipóteses de possuírem veículo próprio, deduz-se que as suas pequenas deslocações são feitas na sua maioria a pé e só quando estritamente necessárias.” (RODRIGUES, 2007, p. 122).

Os cidadãos reportaram, ainda, problemas com a segurança, no entorno da estação, gerando uma

preocupação na utilização do transporte, principalmente, à noite.

“O aparecimento do Metrô na freguesia da Ameixoeira foi acompanhado pelo surgimento de bairros sociais na zona norte da freguesia, mas não foi acompanhado pelo crescimento de segurança e de efetivos na rua, logo o Metrô é potencialmente perigoso na sua utilização, especialmente à noite” (Cidadão).

Na percepção dos cidadãos, a questão da mobilidade, sofreu transformações importantes após a

chegada da estação em Ameixoeira, incluindo a melhoria na emissão de poluentes.

A seguir, apresentaremos o que foi possível inferir, após as observações de campo, a pesquisa

bibliográfica e documental e as respostas dos nossos entrevistados.

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Figura 6: interior da estação Ameixoeira Fonte: acervo dos autores, 2010

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme mostramos nos resultados, a chegada do Metrô na Freguesia trouxe modificações

importantes em termos de mobilidade, impactos ambientais, acesso a equipamentos e de

desenvolvimento urbano.

Entretanto, na opinião dos moradores e gestores municipais, é necessário aumentar a oferta de

ônibus, na Ameixoeira. Existe a preocupação com o isolamento de alguns bairros que formam a

Freguesia. A oferta de mais linhas de pode fortalecer o papel de prover mobilidade, aos que vivem

nos bairros de realojamento, considerados menos favorecidos, ampliando as transformações

sociais positivas que decorreram da chegada da estação Ameixoeira à Freguesia.

Conforme os entrevistados é preciso melhorar a questão da segurança, no entorno da estação

Ameixoeira, para que seu uso seja facilitado, principalmente no período noturno.

Muitas intervenções foram realizadas, alterando significativamente as condições de vida da

população local. Entretanto, alguns projetos, tais como o Programa de Ação Territorial (PAT), foram

negligenciados e outros não obtiveram o êxito esperado.

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Diversos estudos, tais como o LUDA (Large Urban Distressed Areas), apontam à necessidade da

continuidade dos projetos previstos para a região, que possui problemas de isolamento e exclusão

social e, portanto, ainda precisa de cuidados.

Preocupada com as condições das áreas consideradas de intervenção prioritária (BIP), a Câmara

Municipal de Lisboa continua suas ações, por meio do Programa Local de Habitação de Lisboa,

consultando a população da cidade e relatando os principais anseios dos moradores destes bairros,

que apontarão para novas necessidades de planejamento.

As transformações trazidas pelo Metrô na região são perceptíveis e reconhecidas pelos moradores,

apesar de algumas solicitações de melhorias. A mudança na questão da mobilidade e os benefícios

sociais são destacados nas entrevistas e puderam ser notadas em nossa visita à Freguesia.

Estudos, tais como o do Banco Mundial (2003), apontam que o incremento da oferta de transportes

serve melhorar a qualidade do serviço, para os menos favorecidos, e oferecer-lhes mais opções de

residência, emprego e estilo de vida. Pode, ainda que indiretamente, aumentar a renda, pelos

efeitos trazidos com a eficiência do sistema. O Metrô de Lisboa confirma esta tese.

Observando os resultados deste estudo, podemos perceber que apenas com ações envolvendo as

diversas esferas do poder público, atuando em várias questões, tais como, moradia, transportes e a

oferta de equipamentos públicos, é possível realizar projetos que sejam transformadores. O

exemplo da Ameixoeira é considerável neste sentido e mostra que, em São Paulo, e em outras

aglomerações urbanas, esforços somados de planejamento e intervenção podem modificar a

qualidade de vida das populações menos favorecidas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Sumatra Editorial, 2003.

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Prioritária de Lisboa. Gabinete da Vereadora Helena Roseta, CML, 2010.

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Page 15: METRÔ: AGENTE DE TRANSFORMAÇÕES URBANAS NA FREGUESIA DA AMEIXOEIRA, EM LISBOA

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Paulo: Edições Loyola, 1992.

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RODRIGUES, A. F. M. S. V. Urbanismo e Pobreza – Caso Prático da Ameixoeira. Dissertação de Mestrado.

Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, 2007.

i Orientado pela Profa. Dra. Lucia Maria Bogus ii Expressão da postura do poder público em face dos problemas e dos diferentes atores que compõe o

cenário e sua intenção de dar respostas afeiçoadas ao papel do Estado na sua relação com a sociedade.

iii Adotaremos a definição de inclusão social com base na definição de Pochmann (2004), para quem a

exclusão social diz respeito a segmentos populacionais sem acesso a bens e serviços básicos e demais formas de marginalização do desenvolvimento socioeconômico, geralmente apontado pelo afastamento dos direitos humanos, da seguridade social, segurança pública, da terra, do trabalho e renda digna. Em nosso entendimento, a inclusão se dá com o acesso aos bens e serviços básicos e aos direitos humanos citados pelo autor. INSTITUIÇÕES PROMOTORAS:

APOIO: