metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

Upload: ju-pinto

Post on 01-Mar-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    1/9

    Rev Sade Pblica 2008;42(Supl. 2):7-15

    Fernando C BarrosI

    Cesar G VictoraII

    Bernardo L HortaII

    Denise P GiganteII

    I Programa de Ps-Graduao em Sade e

    Comportamento. Universidade Catlica dePelotas. Pelotas, RS, Brasil

    II Programa de Ps-Graduao emEpidemiologia. Universidade Federal dePelotas. Pelotas, RS, Brasil

    Correspondncia | Correspondence:Fernando C BarrosPrograma de Ps-Graduao emEpidemiologia UFPELR. Marechal Deodoro, 116096020-220 Pelotas, RS, BrasilE-mail: [email protected]

    Recebido: 10/10/2007Revisado: 9/10/2008

    Aprovado: 13/10/2008

    Metodologia do estudo dacoorte de nascimentos de 1982a 2004-5, Pelotas, RS

    Methodology of the Pelotas birthcohort study from 1982 to 2004-5,Southern Brazil

    RESUMO

    OBJETIVO: Descrever os mtodos utilizados no estudo longitudinal eacompanhamento das crianas nascidas em Pelotas (RS) em 1982.

    MTODOS: A coorte foi iniciada com um inqurito de sade perinatal detodas as 6.011 crianas nascidas nas maternidades de Pelotas em 1982. As5.914 crianas nascidas vivas foram includas nos estudos de acompanhamento.At 2004-5 foram realizados oito acompanhamentos, com a aplicaode questionrios s mes e/ou aos membros da coorte, conforme a faixaetria. Exames antropomtricos e clnicos foram realizados nas visitas.Os participantes da coorte so descritos conforme variveis demogrficas,socioeconmicas e de sade colhidas nos primeiros acompanhamentos, queso utilizadas como variveis de exposio.

    RESULTADOS:A maior parte dos jovens da coorte foram acompanhadosdurante 23 anos de vida e distintas visitas. Os acompanhamentos que obtiverammaior xito foram aqueles precedidos por um censo da cidade. Com estemtodo foram localizados 87,2% em 1984 (idade mdia de 19 meses), 84,1%em 2006 (mdia 43 meses), e 77,4% em 2004-5 (mdia 23 anos).

    CONCLUSES:Estudos de coorte de nascimentos podem ser realizados comsucesso em pases em desenvolvimento, e a metodologia empregada nessesestudos de ciclo vital permite estudar a influncia de exposies precocessobre a determinao das doenas da vida adulta.

    DESCRITORES: Estudos de Coortes. Mtodos Epidemiolgicos.Mtodos e Procedimentos Estatsticos. Desenvolvimento Infantil.Desenvolvimento Humano. Brasil.

    miolo_42_supl_2 indb 7miolo_42_supl_2.indb 7 2/12/2008 09:47:372/12/2008 09:47:37

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    2/9

    8 Metodologia da coorte de 1982 Barros FC et al

    Em pases desenvolvidos, o estudo de coortes denascimento tem contribudo marcadamente para oentendimento das conseqncias em longo prazo doseventos que ocorrem no incio da vida. O primeiroestudo nacional de uma coorte de nascimento prospec-tiva foi realizado na Inglaterra em 1946,13sendo novascoortes com a mesma metodologia iniciadas naquele

    pas em 1958, 1970 e 2000.10Nos Estados Unidos, oacompanhamento de uma grande coorte de nascimentosfoi iniciada em 2007.a

    Apesar da importncia de estudo de grandes coortes

    de nascimento, esse mtodo raro em pases menosdesenvolvidos, provavelmente pelos custos elevadose pela dificuldade para seguir os participantes nosestudos de acompanhamento. Harpham et al4 recen-temente revisaram estudos longitudinais em pasesem desenvolvimento com amostras de 1.000 crianasou mais. Desses, somente trs coortes de nascimentoforam acompanhadas por dez anos ou mais. Em ordemcronolgica, estas so a Coorte de Pelotas de 1982,com aproximadamente 6.000 nascimentos; o estudo de

    ABSTRACT

    OBJECTIVE: To describe the methods employed in the longitudinal andfollow-up studies of children born in Pelotas (Southern Brazil) in 1982.

    METHODS:The cohort began with a perinatal health survey that included all6,011 children born in maternity wards in Pelotas in 1982. The 5,914 children

    born alive in the city were included in the follow-up studies. By 2004-5, wehad conducted eight follow-ups, which consisted of the administration ofquestionnaires to mothers and/or cohort members, depending on age, in additionto anthropometric and clinical examination. Cohort subjects are described interms of demographic, socioeconomic, and health-related variables collectedduring early follow-up studies, which are used as exposure variables.

    RESULTS:The majority of subjects in the cohort were followed for 23 yearsand on multiple occasions. The most successful follow-ups were those preceded

    by a city census. Using this method, we were able to locate 87.2% of subjectsin 1984 (mean age 19 months), 84.1% in 1986 (mean age 43 months), and

    77.4% in 2004-5, and 77.4% in 2004-5 (mean age 23 years).

    CONCLUSIONS: Birth cohort studies can be carried out successfully indeveloping countries, and the methods employed in this life-cycle study haveallowed us to investigate the influence of early exposures in determiningdisease outcomes in adult life.

    DESCRIPTORS: Cohort Studies. Epidemiologic Methods. StatisticalMethods and Procedures. Child Development. Human Development.Brasil.

    INTRODUO

    aThe National Childrens Study. Bethesda, MD-USA 2000 [citado 2006 dez 07]. Disponvel em: www.nationalchildrensstudy.gov [Bethesda,MD-USA]bCebu Longitudinal Health and Nutrition Survey. Cebu, Philliphines . 1983[citado 2006 nov 13]. Disponvel em: www.cpc.unc.edu/projects/

    cebu/about.html [Cebu, Philliphines]

    Cebu, Filipinas, de 1983-1984, com aproximadamente3.000 recm-nascidos,be o estudo do Nascimento aosdez anos, de 1990, em Johannesburg, frica do Sul,com 4.000 nascimentos (atualmente denominado de

    Nascimento aos 20 anos).8Um estudo com menor n-mero vem sendo conduzido na Guatemala, com cercade 400 pessoas nascidas entre 1969 e 1977 sendo aindaacompanhadas.11 Na ndia, o estudo de Nova Delhiiniciou como uma coorte com cerca de 8.000 crianas,sofrendo uma interrupo at a idade adulta, quando1.526 indivduos foram localizados.9

    A histria das 6.011 crianas da coorte de Pelotas (RS)1982 e cujas mes residiam na rea urbana da cidade foirelatada no livro Epidemiologia da Desigualdade12e

    publicada em 60 artigos com resultados deste estudo.

    Outros dois estudos de coortes de nascimento foramdesenvolvidos em Pelotas, com intervalos de 11 anosentre eles. A primeira comparao dos resultados dasduas primeiras coortes (1982 e 1993) foi apresentadaem um suplemento dos Cadernos de Sade Pblica,

    miolo_42_supl_2 indb 8miolo_42_supl_2.indb 8 2/12/2008 09:47:372/12/2008 09:47:37

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    3/9

    9Rev Sade Pblica 2008;42(Supl. 2):7-15

    em 1996. Em 2008 foi publicado outro suplementocomparando as trs coortes de nascimento de Pelotas(1982, 1993 e 2004).2

    O presente artigo teve por objetivo descrever os m-todos utilizados no estudo longitudinal das crianasnascidas em Pelotas em 1982 e os acompanhamentosque incluram todos os nascimentos realizados nos anosde 1984, 1986 e em 2004-5. apresentada a distribuiodas variveis utilizadas em todos os artigos constantesdo suplemento.

    MTODOS

    O estudo foi realizado na cidade de Pelotas, cuja popula-o urbana cresceu de 214.000 habitantes em 1982 para342.000 em 2005. As principais atividades econmicasda cidade so a agricultura (arroz e pecuria), comrcioe educao (a cidade possui duas universidades). Maisde 90% dos domiclios so conectados a rede pblicade gua e metade ao sistema de esgoto. Ao incio doestudo, em 1982, o coeficiente de mortalidade infantildo municpio era de 40 por mil nascidos vivos.

    Fases iniciais do estudo: 1982-1986

    O estudo iniciou como um inqurito de sade perinatalaincluindo todas as 6.011 crianas nascidas nas trs ma-ternidades, representando 99,2% de todos os nascimen-tos da cidade. Um questionrio incluindo informaessocioeconmicas, demogrficas e de sade foi aplicado

    s mes na maternidade, que tambm foram pesadas emedidas. Os 5.914 recm-nascidos vivos foram pesadoscom uma balana Filizola regularmente calibrada, com

    preciso de 10 g; o comprimento das crianas no foimedido nessa fase do estudo.

    As crianas da coorte foram acompanhadas em dife-rentes momentos (Tabela 1). No acompanhamento de1983, quando as crianas tinham idade de 8-16 meses(mdia de 11,3 meses), aquelas nascidas entre janeiroe abril de 1982 foram visitadas em casa, utilizando-seo endereo fornecido pelo hospital na ocasio do nas-cimento. Porm no foi possvel localizar cerca de 20%das crianas que nasceram nessa poca pelo endereo

    fornecido pelo hospital.

    Assim, para os acompanhamentos seguintes decidiu-sevisitar todos os domiclios da cidade (cerca de 70 mil),

    procurando identificar crianas nascidas em 1982 e quehaviam sido entrevistadas no estudo perinatal. Com essaestratgia foi possvel constatar que menos de 1% dosnascimentos de Pelotas ocorreram fora dos hospitais.

    As fases subseqentes do estudo foram o acompanha-mento de 1984, quando a mdia de idade das crianasera de 19,4 meses (de 12 a 29 meses) e o de 1986,

    quando as crianas estavam com mdia de idade de43,1 meses, variando de 35 a 53 meses.

    Para calcular a proporo de crianas localizadas em

    cada acompanhamento, aquelas que j haviam falecidoforam somadas s visitadas. Por exemplo, em 1983,66 das 1.919 crianas nascidas entre janeiro e abril de1982 haviam falecido; somando s 1.457 cujas mesou responsveis foram entrevistadas, a taxa de locali-zao para o primeiro acompanhamento foi de 79,3%das procuradas. Para esse primeiro acompanhamento,erros na coleta de informao dos endereos foram a

    principal causa de no localizao das crianas. As taxasde acompanhamento das fases subseqentes do estudo

    podem ser observadas na Tabela 1.

    O sub-estudo de mortalidade Horta et al5identificou to-das as mortes das crianas da coorte. Todos os hospitais,

    cemitrios, escritrios de registro civil e a SecretariaRegional da Sade foram visitados regularmente a

    partir de 1982 para detectar os bitos ocorridos entreas crianas da coorte. A partir de 1987 constatou-se queo registro civil detectava todas as mortes, portanto asoutras fontes de monitoramento foram abandonadas.As causas de morte foram investigadas pela revisode pronturios hospitalares e de ambulatrios e porentrevistas com familiares e mdicos que haviam pres-tado atendimento. Durante as entrevistas uma histriacompleta dos eventos que precederam o bito obtida

    por meio de um questionrio. As causas de morte foramclassificadas conforme a edio em portugus da Clas-

    sificao Internacional de Doenas, verso 9.7

    Essas causas foram definidas por dois rbitros inde-pendentes que haviam utilizado as informaes doquestionrio para decidir sobre a causa do bito, emcaso de discordncia, um terceiro rbitro tomava adeciso final.

    Acompanhamentos das sub-amostras: 1995-2001

    No incio de 1995 tentou-se localizar uma sub-amostradas crianas da coorte usando os endereos disponveisat 1986 para avaliar o desempenho escolar e conheci-mento sobre transmisso e preveno de HIV/Aids. A

    alta mobilidade da populao e o tempo transcorridodesde o ltimo acompanhamento foram responsveispela menor taxa de acompanhamento, desde o inciodo estudo.

    Em 1997 e em 2001, nova estratgia de busca foi uti-lizada com o objetivo de identificar sub-amostras dos

    jovens da coorte de 1982. De 265 setores censitriosda cidade, 70 (ou 27% dos domiclios urbanos) foramselecionados sistematicamente e todas as residnciasdesses setores foram visitadas e jovens pertencentes coorte entrevistados.

    aBarros FC. The epidemiology of perinatal health in southern Brazil: a study of perinatal mortality, low birth weight and the utilisation of

    health care [dissertao]. London: University of London; 1986.

    miolo_42_supl_2 indb 9miolo_42_supl_2.indb 9 2/12/2008 09:47:382/12/2008 09:47:38

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    4/9

    10 Metodologia da coorte de 1982 Barros FC et al

    No ano 2000 ocorreu o alistamento militar obrigatriopara todos os jovens do sexo masculino nascidos em1982. Durante o exame mdico militar, os jovens dacoorte foram identificados e entrevistados.

    Nesse perodo tambm foi realizado o estudo etno-grfico para descrever os padres de desenvolvimentoemocional, social e reprodutivo em uma sub-amostrados adolescentes da coorte. O estudo foi baseado emcontatos repetidos e intensivos com os mesmos adoles-centes em duas fases: dos 15 aos 17 anos e, novamente,dos 18 aos 20 anos. Os setores censitrios includos naamostra de 1997 foram divididos em quatro estratos derenda familiar, sendo dois setores selecionados aleato-riamente de cada estrato. Em cada setor, seis jovens dosexo masculino e seis do sexo feminino foram sorteadosentre aqueles localizados no inqurito de 1997, totali-

    zando 96 adolescentes.

    Acompanhamento 2004-5

    O ltimo acompanhamento da totalidade da coorte foiiniciado em agosto de 2004 por meio da realizaode um censo em todos os domiclios da cidade. Cercade 98 mil domiclios foram visitados por uma equipe

    buscando a presena de algum morador nascido em1982 e pertencente coorte de nascimentos. Nessavisita, perguntou-se tambm sobre parentes prximosdos moradores que houvessem nascido no ano de

    1982 e emigrado de Pelotas. Para indivduos nascidosem 1982 foram coletados o nome, data e hospital denascimento, nome do pai, nome da me na poca donascimento, para comparao com os arquivos origi-

    nais da coorte. Esta estratgia foi complementada porbusca nos registros escolares, inscries no vestibulare informaes do Sistema Nacional de Registros de

    Nascimentos (SINASC) para as jovens do sexo fe-minino que tiveram filhos. Indivduos que ainda nohaviam sido identificados foram buscados em seusendereos coletados em fases anteriores do estudo.

    Nos casos em que familiares informaram que o jovempertencente coorte residia em outro municpio do RioGrande do Sul, o jovem foi convidado a ir a Pelotas

    para ser entrevistado, com as despesas pagas peloestudo. Para municpios com um maior nmero de

    jovens pertencentes coorte (Porto Alegre, Caxias do

    Sul e Florianpolis) ou mesmo pequenos municpiosvizinhos a Pelotas houve deslocamento de uma equipepara a realizao das entrevistas.

    Em todos os acompanhamentos durante a infncia,a me ou responsvel foi entrevistada utilizando-seum questionrio padronizado e pr-codificado. Nosacompanhamentos realizados na adolescncia umquestionrio era aplicado ao jovem e outro meou responsvel, exceto no estudo realizado com osrecrutas e no acompanhamento de 2004-5, quandoapenas o jovem foi entrevistado. Para o exame antro-

    Tabela 1.Principais fases do estudo da coorte de 1982. Pelotas, RS.

    AnoPopulao-alvo Principal estratgia

    de buscaMdia de idade

    (amplitude)Populao em estudo Perdas

    (%)Descrio n Entrevistados bitos

    1982Todos os nascidos vivos

    nos hospitais de Pelotas dejaneiro a dezembro de 1982

    5.914Visita diria aos

    hospitaisZero 5.914 0 -

    1983Todas as crianas nascidas

    entre janeiro e abril de 19821.916

    Endereos obtidosno hospital

    11,3 meses(8 a 16)

    1.457 66 20,7

    1984 Todas as crianas 5.914Censo em 70.000

    domiclios19,4 meses(12 a 29)

    4.934 227 12,8

    1986 Todas as crianas 5.914Censo em 80.000

    domiclios43,1 meses(35,4 a 53)

    4.742 237 15,9

    1995 20% de toda a coorte 1.100 Visita aos endereosanteriores 13,1 anos(12,5 a 13,7) 715 47 30,1

    1997 27% de toda a coorte 1.597Visita em 27% dos

    domiclios14,7 anos

    (14,0 a 15,6)1.076 70 28,2

    2000Todos os jovens do sexo

    masculino3.037

    Identificaono servio de

    alistamento militar

    18,2 anos(17,6 a 19,1)

    2.250 143 21,1

    2001 27% de toda a coorte 1.597Visita em 27% dos

    domiclios18,9 anos

    (18,1 a 19,9)1.031 71 31,0

    1997 e2001

    Estudo etnogrfico 96Visita em 8 setores

    localizados em1997 e 2001

    15 a 19 anos 96 - -

    2004-5 Todos os jovens da coorte 5.914Censo em 98.000

    domiclios22,8 anos

    (21,9 a 23,7)4.297 282 22,6

    miolo_42_supl_2 indb 10miolo_42_supl_2.indb 10 2/12/2008 09:47:382/12/2008 09:47:38

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    5/9

    11Rev Sade Pblica 2008;42(Supl. 2):7-15

    pomtrico, os indivduos foram pesados com balanasportteis e medidos com estadimetros construdoslocalmente.3Mtodos padronizados foram utilizadose os entrevistadores foram treinados antes do trabalho

    de campo. Medidas de controle de qualidade foramutilizadas, incluindo a calibragem regular das balan-as, a repetio de 5% das entrevistas e medies porum supervisor de campo, sesses de padronizao eentrada duplicada dos dados.

    Consentimento informado verbal foi obtido dos respon-sveis pelas crianas nas fases do estudo de 1982-1986,como era a prtica comum naquela poca, quandoinexistia um comit de tica na Universidade Federalde Pelotas. Nas fases recentes, o Comit de tica emPesquisa da Universidade, filiado ao Conselho Nacio-nal de tica em Pesquisa (CONEP), aprovou o estudo,

    sendo obtido consentimento informado por escrito. Aconfidencialidade foi assegurada em todas as fases doestudo e os arquivos de computador com os nomesdas mes e dos membros da coorte so guardados emseparado, com acesso restrito.

    Em todas as fases do estudo, pessoas diagnosticadascom problemas de sade foram encaminhadas s cl-nicas da Universidade Federal de Pelotas para recebertratamento.

    RESULTADOS

    As taxas de acompanhamento das fases do estudo va-riaram conforme a estratgia de busca e esto descritasna Tabela 1. Os acompanhamentos que obtiveram maiorxito foram os precedidos por um censo da cidade,quando todas as residncias foram visitadas. Comeste mtodo foram localizados 87% das crianas comidade mdia de 19 meses em 1984, 84% com mdiade idade de 43 meses em 2006, e 77% dos jovens commdia de idade de 23 anos em 2004-5. Dos jovens,2.928 foram localizados por meio do censo e 1.627

    por outros mtodos.

    Cada desfecho foi analisado segundo um modelo hie-rrquico geral, com variveis de exposio obtidas prin-

    cipalmente nos acompanhamentos realizados durante ainfncia, enquanto que as variveis de desfecho foramestudadas no acompanhamento de 2004-5 (Tabela 2).

    O modelo de anlise incluiu em um primeiro nvel hie-rrquico as variveis socioeconmicas e demogrficas

    educao materna e paterna, renda familiar em 1982,mudana de renda entre 1982 e 2004-5 e cor da pele.Os nveis subseqentes das anlises incluram variveisde sade da criana, como peso ao nascer e amamen-tao. Para desfechos especficos, outras variveis deexposio julgadas importantes foram includas; porexemplo, para tabagismo do jovem considerou-se o

    tabagismo materno durante a gestao no segundo nvel

    da anlise. Para asma (presena de chiado), histriafamiliar de asma nos pais foi analisada com as demaisvariveis socioeconmicas e demogrficas includasno primeiro nvel de anlise. E para alguns outros

    desfechos como paternidade/maternidade, situaonutricional e obesidade, utilizao de servios de sade,e iniciao sexual precoce, a escolaridade do prprioindivduo foi levada em considerao.

    Tabela 2.Variveis de exposio e desfecho e ano de coleta.Pelotas, RS.

    Varivel Ano de coleta

    Exposio

    Demogrfica

    Sexo 1982

    Cor da pele 2004-5

    Socioeconmica

    Renda familiar 1982

    Escolaridade materna 1982

    Escolaridade paterna 1984

    Mudana de renda 1982 2004-5

    Escolaridade do jovem 2004-5

    Sade materna/paterna

    Fumo na gestao 1982

    Historia de asma (me ou pai) 2004-5

    Sade da criana

    Peso ao nascer 1982

    Aleitamento materno 1983, 1984 e 1986

    Desfecho

    Socioeconmica

    Trabalho do jovem 2004-5

    Escolaridade do jovem 2004-5

    Nutrio do jovem

    ndice de massa corporal 2004-5

    Servio de sade

    Nmero de consultas 2004-5

    Tipo de servio 2004-5

    Comportamento do jovemTabagismo 2004-5

    Atividade fsica 2004-5

    Iniciao sexual 2004-5

    Consumo de lcool e drogas 2004-5

    Maternidade/paternidade 2004-5

    Sade do jovem

    Presena de chiado 2004-5

    Transtorno psiquitricomenor

    2004-5

    Presso arterial 2004-5

    Glicemia 2004-5

    miolo_42_supl_2 indb 11miolo_42_supl_2.indb 11 2/12/2008 09:47:382/12/2008 09:47:38

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    6/9

    12 Metodologia da coorte de 1982 Barros FC et al

    As caractersticas demogrficas e socioeconmicas dacoorte so apresentadas na Tabela 3. Ao nascimento,a coorte apresentou um discreto predomnio do sexomasculino (51,3%), proporo semelhante quela en-contrada em 2004-5 (51,5%).

    A informao sobre a cor da pele foi obtida em 2004-5

    de acordo com o procedimento adotado pelo InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE); os entre-vistados se auto-classificaram em branco, preto, pardo,amarelo ou indgena. Para fins de anlise essas catego-rias foram recodificadas para branca, preta ou parda, eamarela ou indgena e so apresentadas na Tabela 3. Deacordo com esse critrio, cerca de uma em cada cinco

    pessoas se autoclassificou como pretas ou pardas, sendoessa proporo semelhante para homens e mulheres.

    Para as anlises apresentadas neste suplemento, amaioria das informaes socioeconmicas se refere situao dos entrevistados durante a infncia, como

    de praxe em estudos do ciclo vital. Dessa forma, dados

    sobre escolaridade materna e renda familiar foramobtidos em 1982, enquanto a escolaridade paterna foiincluda em 1984. A escolaridade dos pais foi obtida emanos completos de estudo, categorizada segundo o sis-tema escolar vigente: primeiro grau (0 a 4; 5 a 8 anos),segundo grau (9 a 11 anos) e alm do segundo grau e

    universidade (

    12 anos). A renda familiar ao nascer foicoletada em cinco categorias conforme apresentada naTabela 3, de acordo com o salrio mnimo da poca.Para avaliar o efeito da situao socioeconmica ao lon-go da vida sobre alguns eventos de sade, foi construdauma varivel de mudana de renda familiar no perodode 1982 a 2004-5. Para isso, a varivel renda familiarde 1982 foi transformada em varivel contnua, utili-zando-se um processo de imputao de renda baseadoem caractersticas familiares e domiciliares, com anlisede componentes principais de quatro variveis (filiao

    previdenciria na assistncia ao parto, escolaridade,altura e cor da pele da me da criana da coorte).1Uti-

    lizando-se tercis de renda familiar em 1982 e 2004-5,

    Tabela 3.Distribuio das variveis demogrficas e socioeconmicas. Pelotas, RS,1982 a 2004-5.

    VarivelTotal Homem Mulher

    n % n % n %

    Cor da pele do entrevistado (2004-5) 4.296 2.213 2.083Branca 3.238 75,4 1.658 74,9 1.580 75,9

    Preta ou parda 908 21,1 471 21,3 437 21,0

    Amarela ou indgena 150 3,5 84 3,8 66 3,2

    Escolaridade materna (anos) (1982) 5.907 3.032 2.874

    0 a 4 1.960 33,2 1.008 33,2 952 33,1

    5 a 8 2.454 41,5 1.288 42,5 1.166 40,6

    9 a 11 654 11,1 330 10,9 324 11,3

    12 839 14,2 406 13,4 432 15,0

    Escolaridade paterna (anos) (1984) 4.682 2.398 2.284

    0 a 4 1.315 28,1 676 28,2 639 28,0

    5 a 8 2.069 44,2 1071 44,7 998 43,79 a 11 577 12,3 305 12,7 272 11,9

    12 721 15,4 346 14,4 375 16,4

    Renda familiar-1982 (salrios mnimos) 5.885 3.024 2.770

    1 1.288 21,9 666 22,0 622 21,7

    1,1 a 3 2.789 47,4 1.463 48,4 1.325 46,3

    3,1 a 6 1.091 18,5 544 18,0 547 19,1

    6,1 a 10 382 6,5 184 6,1 198 6,9

    > 10 335 5,7 167 5,5 168 5,9

    Mudana de renda (1982 2004-5) 4.296 2.213 2.083

    Sempre pobre 708 16,5 335 15,1 373 17,9

    No pobre

    pobre 714 16,6 340 15,4 374 18,0Pobre no pobre 665 15,5 360 16,3 305 14,6

    Nunca pobre 2.209 51,4 1.178 53,2 1.031 49,5

    Total 5.913 100,0 3.037 51,4 2.876 48,6

    miolo_42_supl_2 indb 12miolo_42_supl_2.indb 12 2/12/2008 09:47:382/12/2008 09:47:38

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    7/9

    13Rev Sade Pblica 2008;42(Supl. 2):7-15

    os entrevistados foram classificados nas categorias:sempre pobre (aqueles pertencentes ao tercil inferiorde renda familiar tanto em 1982, como em 2004-5);

    pobreno pobre (tercil inferior em 1982 passandopara o tercil mdio ou superior em 2004-5); no pobrepobre (tercil mdio ou superior em 1982 passando

    para o tercil inferior em 2004-5); e nunca pobres (tercilmdio ou superior em 1982 e 2004-5).

    Observando-se a distribuio dessas variveis socioe-conmicas (Tabela 3), nota-se que a maioria dos jovensso filhos de pais e mes com baixa escolaridade, equase um quarto possua alm do ensino fundamental.Quase metade dos entrevistados pertencia a famliascuja renda familiar estava entre um e trs salrios m-nimos em 1982; quase a totalidade (94,3%) pertencia afamlias que recebiam at 10 salrios mnimos mensais,referentes a R$ 3.800,00 atualmente. No que se refere varivel mudana de renda, dois teros dos jovens

    permaneceram no mesmo grupo de renda.

    As caractersticas das crianas ao nascimento, utilizadas

    nos demais artigos deste suplemento, esto apresenta-

    das na Tabela 4. A informao sobre peso ao nascerfoi obtida em 1982 para 5.909 nascidos vivos e 9%desses nascimentos foram de baixo peso (

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    8/9

    14 Metodologia da coorte de 1982 Barros FC et al

    A Tabela 5 apresenta as associaes entre as variveissocioeconmicas descritas anteriormente. No que se re-fere relao entre a renda familiar de 1982 e educaodos pais e do jovem (medidos em 1982 para a me, 1984

    para o pai, e 2004-5 para o jovem) ntida a diferenanos nveis de escolaridade de todos os componentes dafamlia para cada grupo de renda, com os pais mais ricostendo cerca de dez anos a mais de escolaridade do queos mais pobres. Para os jovens observa-se a mesma ten-dncia, mas as diferenas entre os grupos so menores.

    Quando a escolaridade avaliada em relao mudanade renda da famlia entre 1982 e 2004-5, nota-se umpadro mais complexo para as famlias que mudaramde renda no perodo, tanto para as que melhoraram seu

    padro econmico, como para aquelas que pioraram.De maneira geral, o nvel de educao dos pais esteveassociado com a situao financeira de 1982 aquelesque no eram pobres e pioraram a situao econmicatinham melhor nvel educacional do que os que eram

    pobres e depois deixaram de ser. Quanto educao dojovem, os que nunca foram pobres tiveram quatro anosa mais de educao do que os que sempre foram pobres.Os grupos onde houve mudana de renda apresentaramnveis similares de escolaridade.

    DISCUSSO

    Este artigo mostra que estudos de coorte de nascimentopodem ser realizados com sucesso em pases em desen-volvimento. O estudo foi bem-sucedido em conseguiracompanhar a maior parte dos jovens da coorte, em 23

    anos de vida e distintas visitas. A taxa de acompanha-mento de mais de 75% em 23 anos a maior entre osestudos de coorte com mais de 1.000 indivduos em

    pases em desenvolvimento.4

    A taxa de acompanhamento variou conforme a estrat-gia de busca utilizada, sendo particularmente alta nasvisitas precedidas por um censo da cidade. No obstan-te, o censo realizado em 2004 localizou apenas cerca de3.000 indivduos e buscas subseqentes identificarammais 1.600 jovens que no haviam sido encontradosno censo, apesar de eles prprios ou familiares aindaresidirem em Pelotas. Isso possivelmente sugere que as

    pessoas estejam mais relutantes em responder perguntasde desconhecidos sobre a composio de sua famlia,comparativamente dcada de 1980 quando a preocu-

    pao com segurana era menos presente na cidade.

    Como j foi descrito, os artigos deste suplemento souma continuao, agora na juventude, do relato iniciadono livro Epidemiologia da Desigualdade,12 onde a

    principal nfase sempre esteve na anlise do impactodas desigualdades sociais sobre a sade. Nesta srie, asituao socioeconmica foi medida por meio da renda

    familiar ao nascimento, em 1982, a mudana de rendaentre 1982 e 2004-5, e pela educao dos pais. Osestudos do ciclo vital apresentados neste Suplemento

    pretendem contribuir para o entendimento da influnciade exposies precoces na determinao das doenasda vida adulta,6alm de possibilitar uma avaliao doimpacto das desigualdades sociais sobre a situao desade de uma populao.

    Tabela 5.Anos de escolaridade em relao renda familiar em 1982 e a mudana de renda no perodo. Pelotas, RS, 1982 a2004-5.

    Indicador socioeconmicoAnos de escolaridade

    materna em 1982

    Mdia (desvio-padro)

    Anos de escolaridadepaterna em 1984

    Mdia (desvio-padro)

    Anos de escolaridade dojovem 2004-5

    Mdia (desvio-padro)Renda familiar-1982 (salrios mnimos)

    1 3,8 (2,5) 4,4 (2,9) 7,5 (3,1)

    1,1 a 3 5,5 (3,0) 5,9 (3,2) 9,0 (2,9)

    3,1 a 6 8.2 (4,0) 8,1 (3,9) 10,7 (2,4)

    6,1 a 10 11,4 (4,0) 11,5 (4,0) 11,8 (2,3)

    >10 13,8 (3,6) 14,4 (4,0) 13,1 (2,2)

    Mudana de renda (1982 2004-5)

    Sempre pobre 3,2 (2,2) 4,1 (2,6) 6,7 (3,1)

    No pobre pobre 6,3 (3,0) 6,2 (3,4) 8,4 (2,9)

    Pobre no pobre 3,7 (2,2) 4,7 (2,7) 8,6 (2,7)

    Nunca pobre 8,4 (4,2) 8,3 (4,4) 10,8 (2,5)

    miolo_42_supl_2 indb 14miolo_42_supl_2.indb 14 2/12/2008 09:47:382/12/2008 09:47:38

  • 7/25/2019 Metodologia do estudo da coorte de nascimentos de 1982 a 2004-5

    9/9

    15Rev Sade Pblica 2008;42(Supl. 2):7-15

    1. Barros AJ, Victora CG, Horta BL, Gonalves HD, LimaRC, Lynch J. Effects of socioeconomic change from

    birth to early adulthood on height and overweight.Int J Epidemiol. 2006;35(5):1233-8. DOI: 10.1093/ije/dyl160

    2. Barros AJ, Santos IS, Matijasevich A, AraujoCL, Gigante DP, Menezes AM, et al. Methodsused in the 1982, 1993, and 2004 birth cohortstudies from Pelotas, Rio Grande do Sul State,Brazil, and a description of the socioeconomicconditions of participants families. Cad Saude Publ2008;24(Suppl 3):S371-80 DOI: 10.1590/S0102-311X2008001500012

    3. Barros FC, Victora CG. Epidemiologia da sadeinfantil: um manual para diagnsticos comunitrios. 3.ed. So Paulo: Hucitec; 1998.

    4. Harpham T, Huttly S, Wilson I, Wet T. Linkingpublic issues with private troubles: panel studies indeveloping countries.J Int Dev.2003;15(3):353-63.DOI: 10.1002/jid.988

    5. Horta BL, Gigante DP, Candiota JS, Barros FC, VictoraCG. Monitorizao da mortalidade na coorte denascimentos de 1982 a 2006, Pelotas, RS. Rev SaudePublica. 2008;42(Supl 2):108-14.

    6. Morley R, Dwyer T. Early exposure and later health anddevelopment. In: Black RE, Fleisher K, editors. Public

    health issues in infant and child nutrition. Philadelphia:Lippincot Williams & Wilkins; 2002. p.1-21.

    7. Organizao Mundial da Sade. Manual daclassificao estatstica internacional de doenas, lesese causas de bito. Reviso 1975. So Paulo; 1980.

    8. Richter LM, Yach D, Cameron N, Griesel RD, WetT. Enrolment into Birth to Ten (BTT): population andsample characteristics. Paediatr Perinat Epidemiol.1995;9(1):109-20. DOI: 10.1111/j.1365-3016.1995.tb00124.x

    9. Sachdev HS, Fall CH, Osmond C, Lakshmy R, DeyBiswas SK, Leary SD, et al. Anthropometric indicatorsof body composition in young adults: relation to sizeat birth and serial measurements of body mass indexin childhood in the New Delhi birth cohort.Am J ClinNutr. 2005;82(2):456-66.

    10. Smith K, Joshi H. The Millennium Cohort Study. PopulTrends.2002(107):30-4.

    11. Stein AD, Conlisk A, Torun B, Schroeder DG, GrajedaR, Martorell R. Cardiovascular disease risk factors arerelated to adult adiposity but not birth weight in youngGuatemalan adults.J Nutr. 2002;132(8):2208-14.

    12. Victora CG, Barros FC, Vaughan JP. Epidemiologia dadesigualdade. So Paulo: Hucitec; 1988.

    13. Wadsworth MEJ. The imprint of time: childhood,history, and adult life. Oxford: Clarendon Press; 1991.

    REFERNCIAS

    Artigo baseado em dados da pesquisa Coorte de nascimentos de Pelotas 1982, realizada pelo Programa de Ps-graduao

    em Epidemiologia - Universidade Federal de Pelotas.O estudo da coorte de nascimentos de 1982 atualmente financiado pela iniciativa da Wellcome Trust intitulada MajorAwards for Latin America on Health Consequences of Population Change. Fases anteriores do estudo foram financiadaspelo International Development Research Center, pela Organizao Mundial da Sade, pelo Overseas DevelopmentAdministration, pela Unio Europia, pelo Programa Nacional de Ncleos de Excelncia (PRONEX) e pelo ConselhoNacional de Pesquisa e Ministrio da Sade.

    Este artigo seguiu o mesmo processo de reviso por pares de qualquer outro manuscrito submetido a este peridico, sendogarantido o anonimato entre autores e revisores. Editores e revisores declaram no haver conflito de interesses que pudesseafetar o processo de julgamento do artigo.Os autores declaram no haver conflito de interesses.

    i l 42 l 2 i db 15 2/12/2008 09 47 38