mestrado2

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Este trabalho teve como objetivo realizar uma análise crítica sobre a Ergonomia como fator eco- nômico no pensamento Enxuto através de uma revisão da produção de artigos científicos da área. disponibilizados em bases de dados eletrônicas. Foram encontradas 45 referências nas bases de dados pesquisadas, das quais foram selecionados oito artigos. Os demais foram excluídos porque abordavam a ergonomia e o pensamento Enxuto em áreas diferentes das propostas no presente es- tudo. Para a análise dos dados, os artigos selecionados foram considerados quanto ao seu conteúdo, sendo então extraídas informações específicas de cada trabalho. Os dados indicaram que todos os artigos eram recentes, pois foram publicados entre 2004 e 2008. Em relação ao tipo de estudo, seis eram Estudos de Caso e dois eram de Levantamento Bibliográfico. O estudo demonstrou que a Ergonomia vem garantindo melhores condições de saúde, segurança, relações interpessoais e cooperação contribuindo com o sucesso técnico, econômico e financeiro das novas organizações e tecnologias. As condições de trabalho podem melhorar em função da Produção Enxuta, tornando o processo de trabalho menos rígido e mais independente, demonstrando que pensamento Enxuto e Ergonomia não estão necessariamente em conflito. Ergonomia. Manufatura Enxuta. Processos. This study has as its objective to make a critical analysis about ergonomics as an economical factor in lean thinking through a revision of various relevant scientific articles available on electronic data bases. Forty five references in the researched databases were found, from which eight articles were selected. The discarded ones were excluded due to the fact that they approached ergonomics and lean thinking through different areas from the ones proposed in this study. For the databases analysis, the chosen articles were considered according to their content and then specific information from each study was extracted. The data indicated that all the works were recent, since they were published be- tween 2004 and 2008. In relation to the type of study, six were case studies and two were bibliographic surveys. The study demonstrated that ergonomics has assured better health and safety conditions, in- terpersonal relations and cooperation contributing to the technical, economical and financial success of new organizations and technologies. Working conditions can improve as a result of lean produc- tion, making the working process less rigid and more independent, demonstrating that lean thinking and ergonomics are not necessarily in conflict. Ergonomics. Lean Manufacturing. Processes. Leonardo Ferreira (UNICAMP – SP/Brasil) - [email protected] • Serra da Mantiqueira, 221, apto 11, Jd. Proença, Campinas-SP Giovana Pimentel Gurgueira (UNICAMP – SP/Brasil) - [email protected] RESUMO Palavras-chave ABSTRACT Keywords Ergonomia como fator econômico no pensamento Enxuto: uma análise crítica bibliográfica FERREIRA, L.; GURGUEIRA, G. P. Ergonomia como fator econômico no pensamento Enxuto: uma análise crítica bibliográfica. GEPROS. Gestão da Produção, Operações e Sistemas, Bauru, Ano 8, nº 3, jul-set/2013, p. 39-51. Recebido: 12/08/2010 Aprovado: 08/08/2013

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  • Este trabalho teve como objetivo realizar uma anlise crtica sobre a Ergonomia como fator eco-nmico no pensamento Enxuto atravs de uma reviso da produo de artigos cientficos da rea. disponibilizados em bases de dados eletrnicas. Foram encontradas 45 referncias nas bases de dados pesquisadas, das quais foram selecionados oito artigos. Os demais foram excludos porque abordavam a ergonomia e o pensamento Enxuto em reas diferentes das propostas no presente es-tudo. Para a anlise dos dados, os artigos selecionados foram considerados quanto ao seu contedo, sendo ento extradas informaes especficas de cada trabalho. Os dados indicaram que todos os artigos eram recentes, pois foram publicados entre 2004 e 2008. Em relao ao tipo de estudo, seis eram Estudos de Caso e dois eram de Levantamento Bibliogrfico. O estudo demonstrou que a Ergonomia vem garantindo melhores condies de sade, segurana, relaes interpessoais e cooperao contribuindo com o sucesso tcnico, econmico e financeiro das novas organizaes e tecnologias. As condies de trabalho podem melhorar em funo da Produo Enxuta, tornando o processo de trabalho menos rgido e mais independente, demonstrando que pensamento Enxuto e Ergonomia no esto necessariamente em conflito.

    Ergonomia. Manufatura Enxuta. Processos.

    This study has as its objective to make a critical analysis about ergonomics as an economical factor in lean thinking through a revision of various relevant scientific articles available on electronic data bases. Forty five references in the researched databases were found, from which eight articles were selected. The discarded ones were excluded due to the fact that they approached ergonomics and lean thinking through different areas from the ones proposed in this study. For the databases analysis, the chosen articles were considered according to their content and then specific information from each study was extracted. The data indicated that all the works were recent, since they were published be-tween 2004 and 2008. In relation to the type of study, six were case studies and two were bibliographic surveys. The study demonstrated that ergonomics has assured better health and safety conditions, in-terpersonal relations and cooperation contributing to the technical, economical and financial success of new organizations and technologies. Working conditions can improve as a result of lean produc-tion, making the working process less rigid and more independent, demonstrating that lean thinking and ergonomics are not necessarily in conflict.

    Ergonomics. Lean Manufacturing. Processes.

    Leonardo Ferreira (UNICAMP SP/Brasil) - [email protected] Serra da Mantiqueira, 221, apto 11, Jd. Proena, Campinas-SPGiovana Pimentel Gurgueira (UNICAMP SP/Brasil) - [email protected]

    RESUMO

    Palavras-chave

    ABSTRACT

    Keywords

    Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica

    FERREIRA, L.; GURGUEIRA, G. P. Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica. GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-51.

    Recebido: 12/08/2010 Aprovado: 08/08/2013

  • Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica

    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-5140

    1. INTRODUOO processo de globalizao produtiva entrou em sua terceira etapa no final da dcada de

    90, levando a uma nova distribuio internacional da produo, do trabalho e das comercializa-es globais. Esta nova etapa decorrente da evoluo da globalizao financeira iniciada na dcada de 70 e da globalizao comercial na dcada seguinte gerou fundamentalmente uma mudana dos parmetros de mercado, pois quem passou a ditar as regras foram os clientes e consumidores (BAUMAN, 1996).

    Dentro desta tica, as organizaes passaram a orientar-se para o cliente e o movimento da qualidade emergiu como um balizador do desenvolvimento empresarial (FLEURY; FLEURY, 2000). Ao criar condies de adaptao da empresa junto ao seu mercado consumidor, onde a ve-locidade das tecnologias e das informaes faz com que produto e servio no se restrinjam apenas a preo, deve-se levar em considerao que existe uma dimenso muito maior na diferenciao perante o cliente.

    Segundo os Critrios de Excelncia do Prmio Nacional da Qualidade (PNQ), valor pode ser definido como:

    Valor o grau de benefcio obtido como resultado da utilizao e das experincias vividas com um produto. a percepo do cliente e das demais partes interessadas sobre o grau de atendimento de suas necessidades, considerando as caractersticas e atributos do produto, seu preo, a facilidade de aquisio, de manuteno e de uso, ao longo de todo o seu ciclo de vida. As organizaes buscam criar e entregar valor para todas as partes interessadas. Isto requer um balanceamento do valor na percep-o dos clientes, dos acionistas, da fora de trabalho e da sociedade (FPNQ, 2004).

    Sobre a definio do PNQ, fica evidente que agregar valor muito mais do que atender requi-sitos tcnicos, e que os clientes no so apenas os consumidores finais, mas todos os steakholders da organizao. No entanto, devem-se estudar os sistemas globalmente, envolvendo todas as interde-pendncias de suas partes, tendo uma viso crtica de que o mundo dividido em diversas reas, sen-do que estas divises so arbitrrias e com fronteiras solidamente definidas (BERTALANFFY, 2008).

    Desta forma, necessrio avaliar o mercado e sua competitividade, e de acordo com Porter (1986) so cinco as foras que influenciam o mercado: a rivalidade entre os concorrentes existen-tes; a entrada de novos concorrentes (entrantes); a ameaa de produtos substitutos; o poder de negociao dos fornecedores; e o poder de negociao dos compradores. Assim, se o cliente no est satisfeito, ele simplesmente trocar a empresa por uma opo mais adequada, que satisfaa suas necessidades. Fazer apenas o que est definido pela organizao como sendo o seu padro de atendimento pode at satisfazer as necessidades do cliente, mas talvez no ultrapasse o normal. J no basta simplesmente satisfazer clientes. necessrio encant-los (KOTLER, 1998).

    A busca pela melhor prtica produtiva essencial, levando em considerao que a produo um sistema que transforma as entradas (input: mo de obra, matria prima, recursos financeiros, mquinas e equipamentos, etc.) em sadas (output: bens e servios) a fim de atender o cliente (BU-FFA; SARIN, 1987), independente da origem comercial ou no da produo, e este processo tende a agregar valor ao produto final (SLACK; CHAMBERS; JOHNSTON, 2002). A Administrao da Produo e das Operaes tem como objetivo principal levar a organizao a uma melhor: a) efi-cincia, atravs da utilizao adequada dos recursos empresariais; b) eficcia, que est ligada aos fins, isto , aos objetivos que a empresa pretende alcanar, por meio de suas operaes.

    Slack et al. (2002) simplificam o conceito de Administrao da Produo dizendo que se trata da maneira pela qual as organizaes produzem bens e servios. O gestor deve estar sempre remodelando o seu processo, procurando aprender e ensinar mais, para sempre estar buscando essas melhorias. Conforme frase de Ohno (1997) um dos criadores da filosofia lean, que acreditava nas melhorias contnuas dos processos, o Guerreiro (Gestor) nunca para de aperfeioar o seu esti-lo (capacidade de administrar) e nunca para de polir a sua espada (produto/processo).

  • Leonardo Ferreira, Giovana Pimentel Gurgueira

    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-51 41

    As constantes mudanas decorridas da incluso de novas tecnologias, das modificaes de-mogrficas, das novas expectativas com relao vida no trabalho, do aumento da competitivi-dade no mercado mundial, entre outras, refletiram em novas realidades do trabalho. Apesar da nfase dada s novas tecnologias de produo, ferramentas da qualidade, etc., cada vez mais os tra-balhadores se queixam de uma maior rotina de trabalho, de uma subutilizao de suas potencia-lidades e talentos, e de condies de trabalho inadequadas. Como consequncias, h um aumento do absentesmo, uma diminuio do rendimento, uma rotatividade de mo de obra mais elevada, reclamaes e greves mais numerosas, tendo um efeito marcante sobre a sade mental e fsica dos trabalhadores e, em decorrncia, na rentabilidade empresarial (FERNANDES, 1996).

    Dentro deste contexto, necessrio ter uma viso holstica do processo, atentando no ape-nas aos recursos mquinas e equipamentos, mas principalmente ao que envolve recurso humano, sendo este o agente principal para a produtividade. O uso dos conceitos da Ergonomia pode ser considerado como mais uma metodologia a ser empregada junto ao planejamento e execuo das atividades produtivas, com a finalidade de se criar condies mais apropriadas e melhores resulta-dos na interao homem versus trabalho.

    O objetivo deste artigo demonstrar que a falta de ergonomia pode ser considerado desperd-cio dentro da filosofia lean thinking (pensamento Enxuto). Desta forma, foi realizada uma anlise crtica sobre o tema Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto atravs de uma reviso da produo de artigos cientficos da rea. Procurou-se demonstrar que a Ergonomia pode ser aplicada em organizaes para aumentar a eficincia atravs de atividades que agregam valor e da eliminao contnua de desperdcios, contribuindo para a ampliao da atuao da Ergonomia para a preveno de agravos aos trabalhadores.

    Este artigo est organizado da seguinte forma: a seo 2 apresenta a reviso bibliogrfica sobre Pensamento Enxuto e Ergonomia e Trabalho; na seo 3 so detalhados o material e mtodo; na seo 4 apresentada a anlise e discusso dos resultados; e por fim, na seo 5 so realizadas as consideraes finais.

    2. REVISO DA BIBLIOGRAFIA

    2.1. Pensamento Enxuto

    O conceito de pensamento enxuto surgiu na indstria japonesa, na fbrica de automveis Toyota Motor Corporation, logo aps a Segunda Guerra Mundial, onde a indstria local tinha uma produtividade muito baixa e os recursos eram escassos devido aos resultados da guerra. Objeti-vando aumentar a eficincia da organizao atravs de atividades que agregam valor e da elimina-o contnua de desperdcios, os principais executivos da empresa conceberam o Sistema Toyota de Produo, sistema de produo diferenciado dos sistemas produtivos de massa idealizado por Frederick Taylor e Henry Ford no incio do sculo XX e que predominava na poca, devido viso de reduzir os custos unitrios dos produtos atravs da produo em larga escala, especializao e diviso do trabalho. No entanto, a Produo em Massa tinha uma viso estreita das condies organizacionais e acarretava outros desperdcios de custos altssimos, a exemplo dos elevados es-toques de matria-prima e produtos acabados. Outro fator considerado neste sistema era a no preocupao com a qualidade do produto e servios prestados (SALZMAN, 2002).

    Ao contrrio do sistema existente, o Sistema Toyota de Produo surge com uma proposta de reduo dos lotes de produo, permitindo uma maior variedade de produtos. Investem nos trabalhadores criando condies para que os mesmos sejam multifuncionais, e possam desenvol-ver mais do que uma nica tarefa e operem mais que uma nica mquina. Busca-se a melhoria contnua, onde priorizada a qualidade dos produtos e servios, e o desenvolvimento de diversas tcnicas e ferramentas para uma melhor eficcia e eficincia (SALZMAN, 2002).

  • Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica

    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-5142

    De acordo com Ohno (1997), os valores sociais mudaram e as organizaes precisam con-quistar seus consumidores, com conceitos e gostos diferentes, por isso, a tendencia de Sistemas de Produo Mltiplos e em pequenas quantidades. Dentro deste novo modelo de gesto, surgiram vrios estudos a respeito dos resultados obtidos pela Toyota, o que levou a criao do termo lean o qual foi cunhado originalmente no livro A Mquina que Mudou o Mundo (WOMACK; JONES, 1998). Trata-se de um estudo sobre a indstria automobilstica mundial realizada pelo MIT (Mas-sachusetts Institute of Technology). Neste trabalho ficaram evidentes as vantagens do desempenho do Sistema Toyota de Produo que traziam enormes diferenas em produtividade, qualidade, de-senvolvimento de produtos, e outros fatores diferencias, e explicava, em grande medida, o sucesso da indstria japonesa. Spear e Bowen (1999) sustentam que o sucesso da Toyota est na coerncia e harmonia existente entre a estrutura, a organizao e a mentalidade das pessoas com relao s tarefas a serem realizadas e denomina esta integrao de DNA do Sistema Toyota de Produo.

    Inicialmente muitas empresas aplicavam o lean apenas rea de produo/manufatura, uti-lizando o termo Lean Manufacturing, buscando a remoo das perdas dentro da empresa e o aper-feioamento da produtividade (CORRA; CORRA, 2005). Segundo Womack e Jones (2003), os desperdcios so classificados em sete principais fatores ocorrentes nas organizaes, sendo eles:

    1. Superproduo: produo antes ou alm do necessrio; 2. Defeitos: erros frequentes nas informaes, problemas de qualidade nos produtos ou desem-

    penho deficiente na entrega; 3. Estoques desnecessrios: armazenagem em excesso, resultando num custo excessivo e um

    atendimento deficiente ao cliente; 4. Processo inadequado: execuo de um processo de trabalho com ferramentas, procedimen-

    tos ou sistemas errados, quando, muitas vezes, um modo mais simples poderia ser mais efi-ciente;

    5. Transporte excessivo: movimento excessivo de pessoas, informaes, materiais ou produtos, resultando em perdas de tempo, esforo e custo;

    6. Espera: longos perodos de inatividade das pessoas, informaes, materiais ou produtos, re-sultando num fluxo deficiente, atrasos e longos prazos de entrega;

    7. Movimentos desnecessrios: organizao deficiente no local de trabalho, resultando numa ergonomia deficiente, por exemplo: movimentos de flexo ou de estiramento excessivos e perdas frequentes de itens.

    Alguns estudos demonstram como oitavo desperdcio o no aproveitamento de ideias, ou seja, a no utilizao do maior recurso disponvel a empresa, o ser humano. Sugestes, opinies, participao de todos os envolvidos e trabalho em equipe so fatores importantes no pensamento Enxuto, onde Hajime Ohba define que: Enxuto no um termo que representa uma lista de coisas a fazer e, sim, uma forma de pensar (MURMAN et al., 2002).

    Dentro deste contexto, a utilizao da imaginao e a experincia dos colaboradores para dar forma a uma soluo prtica e inteligente condizente abordagem kaizen. Palavra japonesa que tem como significado a melhoria contnua (KAI = Modificao + ZEN = Para Melhorar), e surge como um dos pilares do pensamento Enxuto. Os resultados so obtidos atravs da educao siste-mtica dos colaboradores e da conscientizao do trabalho em equipe, na busca de inovaes para o crescimento contnuo da organizao (KILPATRICK, 1997).

    Embora tenha comeado na indstria automobilstica e se tornado o paradigma dominante, h aplicaes em empresas dos mais diferentes setores, de matrias-primas distribuio, de servi-os manufatura. E dentro das organizaes vem ocorrendo a expanso e propagao da filosofia lean, sendo que j so citadas novas terminologias tais como: lean office, lean logistic, lean enter-prise e lean business system; ou seja, a filosofia Toyota aplicada a todas as dimenses dos negcios

  • Leonardo Ferreira, Giovana Pimentel Gurgueira

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    de uma organizao (WOMACK; JONES, 1998). Esta extenso do pensamento Enxuto se faz ne-cessria para servios e para operaes de servios associadas manufatura, conforme citado por Davis, Aquilano e Chase (2001), de forma a reduzir os custos de servios e eliminar atividades que no agregam valor aos clientes. A evoluo do pensamento enxuto pode ser demonstrada atravs do Quadro 1.

    Quadro 1 - Evoluo do Pensamento Enxuto.

    Fases1980-1990 1990 1990-2000 2000

    Conscincia Qualidade Qualidade, custo e entrega Sistema de valor

    Tema na literatura

    Disseminao de prticas do cho-de-fabrica.

    Melhores praticas benchmarking para gerar a competio.

    Mapa de valor, empresas enxutas, colaborao na cadeia de suprimentos.

    Capacidade do sistema.

    Foco

    Just-in-time, custos. Custos, Treinamentos, TQM, reengenharia.

    Custos, processo para suportar o fluxo.

    Valor e custo, estratgia, integrao na cadeia de suprimentos.

    Processos-chave

    Manuteno e cho-de-fabrica.

    Manufatura e gesto de materiais.

    Cumprimentos de encomendas.

    Processos integrados, desenvolvimento de novos produtos.

    Setores

    Automotivo - montagem de veculos.

    Automotivo - montagem de veculos e componentes.

    Empresas de manufatura em geral - manufatura repetitiva.

    Manufatura com alto e baixo volume, aplicao no setor de servio.

    Fonte: Adaptado de HINES et al. (2004).

    Embora a filosofia possa parecer simples e bvia para a sua implementao, necessrio entender que cada empresa possui uma histria e uma cultura prprias. Alm disso, a utilizao de ferramentas desenvolvidas pela Toyota para a diminuio e eliminao de desperdcios, muitas vezes no integrada a um sistema, e em outras situaes as empresas no compreendem clara-mente a filosofia que est por trs das ferramentas; isto impede que algumas organizaes adotem a filosofia lean, ou tenham dificuldades em implementar a filosofia. A cultura difcil de ser mo-dificada e apenas a introduo de algumas ferramentas no significar sucesso na implementao, isto explica por que so poucas as empresas que conseguem replicar o sucesso da Toyota (BHASIN; BURCHER, 2006).

    2.2. Ergonomia e trabalho

    A ergonomia, num conceito geral, o estudo da adaptao do trabalho ao homem. Neste caso, o trabalho abrange no apenas o que executado com mquinas e equipamentos, mas tam-bm toda situao em que h o relacionamento entre o homem e uma atividade produtiva (IIDA, 2005). No Brasil, a Associao Brasileira de Ergonomia (ABERGO, 2010) adota a definio de Er-gonomia como uma disciplina cientfica relacionada ao entendimento das interaes entre os seres humanos e outros elementos ou sistemas, e aplicao de teorias, princpios, dados e mtodos a projetos a fim de otimizar o bem estar humano e o desempenho global do sistema.

  • Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica

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    A Ergonomia inicia-se com o estudo das caractersticas do trabalhador para, posteriormente, projetar o seu trabalho e preservar a sua sade. A adaptao sempre deve ocorrer no sentido do trabalho para o homem (IIDA, 2005). Pode-se dizer que a ergonomia se aplica ao projeto de m-quinas, equipamentos, sistemas e tarefas, com o objetivo de melhorar a segurana, sade, conforto e eficincia no trabalho, sempre focalizando o homem (WEERDMEESTER; DUL, 1995).

    Ao se considerar a organizao do trabalho e sua relao com a sade dos trabalhadores, devem-se citar os fatores presentes na composio das tarefas destes indivduos: trabalho esttico, grande intensidade do ritmo de trabalho, uso de movimentos repetitivos, exigncia de produtivi-dade, ausncia de controle sobre modo e ritmo de trabalho, ausncia de pausas ou pausas insufi-cientes, mobilirios e equipamentos desconfortveis e inadequados para a execuo das tarefas (CEST, 2000). Esses fatores, quando vistos independentemente, no so responsveis por doenas ocupacionais como os distrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT); a associao destes fatores com as caractersticas moduladoras do trabalho (frequncia, durao, intensidade) que propicia a manifestao destas doenas (PONTES, 2006).

    A organizao do trabalho tem por finalidade proporcionar a oportunidade e possibilidade, aos trabalhadores, de realizarem algo que tenha sentido e que permita desenvolver suas competn-cias e, em harmonia com o progresso de seus desempenhos. A tarefa de trabalho deve ter a flexi-bilidade para permitir autonomia e de independncia pessoa, de forma que o trabalhador possa definir a maneira de realiz-la, trazendo consigo o sentimento de responsabilidade pela realizao e pelo alcance dos objetivos (MORIN, 2001).

    A organizao do trabalho deve proporcionar a oportunidade e possibilidade de realizar algo que, no entendimento dos trabalhadores, tenha sentido de praticar e que permita desenvolver suas aptides e, principalmente, de estar em conformidade com o progresso de seus desempenhos. A capacidade de uma tarefa de trabalho admitir uma margem adequada de autonomia e de indepen-dncia pessoa, a tal ponto do trabalhador definir a maneira de realiz-lo, traz consigo o senti-mento de responsabilidade pela efetivao e pelo alcance dos objetivos fixados (MORIN, 2001).

    A Anlise Ergonmica do Trabalho (AET) visa ampliar os conhecimentos da Ergonomia para analisar, diagnosticar e corrigir uma situao real de trabalho (IIDA, 2005). A AET se fun-damenta na anlise das situaes reais de trabalho, o que possibilita sua compreenso e transfor-mao (GURIN et al., 2001). A AET um mtodo composto de trs fases principais: a anlise da demanda, a anlise da tarefa e a anlise da atividade. A anlise da demanda consiste em analisar o problema inicialmente proposto pelos demandantes, delimitar o objeto de estudo e esclarecer suas finalidades. A anlise da tarefa corresponde ao levantamento dos dados referentes aos objetivos e resultados esperados do trabalho e os meios disponveis para realiz-lo. A anlise da atividade consiste em compreender o trabalho que efetivamente realizado, as dificuldades encontradas e as estratgias utilizadas para super-las. No final, os dados levantados permitem formular hipteses de trabalho que delineiam os rumos a serem seguidos, para que, no final da anlise, seja possvel elaborar um diagnstico e fornecer recomendaes ergonmicas (GEMMA et al., 2010).

    3. MATERIAL E MTODOTrata-se de um estudo de Reviso Bibliogrfica, realizado atravs do levantamento de publi-

    caes cientficas disponibilizadas nas bases de dados eletrnicas da Scientific Eletronic Library Online (SCIELO) e do Portal SIBinet - USP. Foram utilizados os seguintes descritores: Ergonomia; Manufatura Enxuta; Processos. Para selecionar a literatura foi realizado cruzamento entre os des-critores. Foram includos todos os artigos publicados em peridicos cientficos nacionais e inter-nacionais que abordassem a Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto.

  • Leonardo Ferreira, Giovana Pimentel Gurgueira

    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-51 45

    Os dados foram coletados no perodo de maio a julho de 2010. Para a anlise dos dados, os artigos selecionados foram considerados quanto ao seu contedo, sendo ento extradas informa-es especficas de cada estudo: inicialmente, os artigos foram classificados quanto a: autor, ano de publicao e tipo de estudo; posteriormente, foi realizada a comparao entre as publicaes, para verificar os pontos em comum e as divergncias.

    Desta forma, foram encontradas 45 referncias nacionais e internacionais nas bases de dados pesquisadas referentes temtica Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto, das quais foram selecionados oito artigos. Os demais foram excludos porque abordavam a Ergonomia e o pensamento Enxuto em reas diferentes das propostas no presente estudo. Dentro da metodo-logia aplicada, no foi encontrada nenhuma referncia internacional.

    4. ANLISE E DISCUSSO DOS RESULTADOS

    4.1. Anlise dos resultados

    No Quadro 2, observam-se algumas caractersticas dos oito estudos analisados.

    Quadro 2 Caracterizao dos artigos selecionados quanto ao ano de publicao, autores e tipo de estudo.

    Ano Ttulo Autor(es) Tipo de estudo

    2004Reviso dos mtodos de Anlise Ergonmica aplicados ao estudo dos DORT em trabalho de

    montagem manual.

    Guimares CP, Naveiro RM

    Levantamento bibliogrfico

    2004 Entre a organizao do trabalho e o sofrimento: o papel de mediao da atividade. Abraho JI, Torres CC Estudo de caso

    2006A metodologia Kaizen na conduo de processos de mudana em sistemas de

    Produo Enxuta.Araujo CAC, Rentes AF Estudo de caso

    2006 Reestruturao industrial, trabalho e (re)qualificao profissional.Amato Neto J,

    Amato RCFLevantamento bibliogrfico

    2007Os primeiros passos de um programa de

    Ergonomia na empresa: duas experincias distintas.

    Soares MM, Silva GGA, Ramos DTF,

    Cabral GG, Cruz JLEstudo de caso

    2008 A Ergonomia como fator econmico e competitivo para pequenas empresas.

    Pegatin TO, Xavier AAP, Pilatti LA,

    Michaloski AOEstudo de caso

    2008Interveno ergonmica em uma fbrica de nibus: montagem de poltronas e painis de

    controle.

    Saurin TA, Guimares LBM Estudo de caso

    2008Diretrizes para avaliao dos impactos da Produo Enxuta sobre as condies

    de trabalho.Saurin TA, Ferreira CF Estudo de caso

    Fonte: Elaborado pelos autores (2010).

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    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-5146

    4.2. Discusso dos resultados

    No presente estudo, procurou-se realizar uma anlise crtica sobre o tema Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto atravs de uma reviso da produo de artigos cientficos da rea, selecionados conforme a metodologia descrita.

    O estudo de Pegatin et al. (2008) expe os resultados de um programa de Ergonomia em uma indstria metalrgica de pequeno porte, responsvel pela fabricao de autopeas para indstria automobilstica. Teve como objetivo caracterizar a relao de custo/benefcio do enfoque preven-tivo, assim como o impacto econmico da sua prtica. Para o estudo das situaes de trabalho foi aplicada a metodologia de AET. Os autores concluram que um programa preventivo embasado na metodologia da Ergonomia e da Engenharia Econmica pode agir como fator competitivo e econmico nas empresas (PEGATIN et al., 2008).

    O campo de atuao da Ergonomia muito amplo, e analisa condies de trabalho no que se refere aos espaos fsicos, ambientes trmicos, rudos, iluminao, vibraes, posturas, desgas-tes energticos, stress, treinamento, comunicaes, trabalho em grupo, cultura organizacional, fadigas, cargas de trabalho, aspectos de manuseio de materiais, de processos, arranjo fsico, etc. Os dados levantados, por intermdio da AET, permitem formular hipteses de trabalho que deli-neiam os rumos a serem seguidos e resultaro em um diagnstico e elaborao de recomendaes ergonmicas. Outros dados, referentes empresa e aos trabalhadores, devem ser levantados.

    Ao longo das ultimas dcadas, as empresas tm sofrido vrias mudanas associadas ao pro-cesso de inovao tecnolgica e de reestruturao produtiva e organizacional. Desta forma, a in-terdisciplinaridade se faz cada vez mais presente e necessria, em todos os nveis hierrquicos das organizaes (PEGATIN et al., 2008). Como cincia que procura compreender o trabalho para transform-lo, a Ergonomia tem sido cada vez mais requerida para garantir a melhoria das condi-es de sade, segurana, das relaes interpessoais e para cooperar com o sucesso tcnico, econ-mico e financeiro das novas tecnologias (GUERIN et al., 2001).

    Arajo e Rentes (2006) aplicaram conceitos de Manufatura Enxuta em uma indstria do setor mdico-odontolgico do interior do estado de So Paulo, sendo na poca a maior fabricante nacional, atendendo mais da metade do mercado com mais 100 diferentes produtos. Os autores realizaram a anlise da movimentao dos trabalhadores (que uma das categorias de desperd-cios) durante o processo de montagem; isto foi feito considerando-se as mtricas de quantidade de movimentaes realizadas, passos e distncia percorrida. Como resultado desta anlise e das melhorias implantadas, a quantidade de movimentao, determinada pela necessidade de sada do montador de seu posto, foi diminuda em 70% (10 vezes para trs vezes) e a quantidade mdia de passos diminuiu de 130 passos para 39 passos. Os autores concluram que, se conduzido de um modo estruturado e vinculado a uma viso estratgica de situao futura ideal, os conceitos de Ma-nufatura Enxuta tornam-se uma ferramenta dinmica e sustentvel para a conduo da mudana.

    A pesquisa realizada por Abraho e Torres (2004) em uma central de atendimento de um de-partamento de trnsito, ao adotar a metodologia da AET, constatou que a sobrecarga de trabalho, a presso da demanda, a necessidade de transgredir para atingir os objetivos do trabalho, dentre outros, aliados ao rigoroso controle da organizao geraram um alto grau de insatisfao entre os trabalhadores.

    A organizao do trabalho influencia o planejamento, a efetivao e a avaliao, estando presente em todas as etapas do processo produtivo. Ela prescreve normas e parmetros que deter-minam o sujeito da ao, o que vai ser feito, como, quando e com que equipamentos/instrumentos, em que tempo, com que prazos, em que quantidade, com que qualidade, enfim, a organizao do trabalho o fator central da produo (ABRAHO; TORRES, 2004).

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    De acordo com a Balance Theory of Job Design (SMITH; CARAYON-SAINFORT, 1989), ou Teoria do Equilbrio da Concepo do Trabalho, cinco elementos compem um sistema de traba-lho: o indivduo, a tarefa, o ambiente, a tecnologia e a organizao. Os cinco elementos do sistema de trabalho interagem para produzir uma carga de trabalho. A interao entre estes diferentes fatores pode causar estresse (fsico e psicossocial) no indivduo e ento produzir uma carga de tra-balho que possui componentes fsicos e psicolgicos. Estas cargas desafiam os recursos biolgicos (gasto energtico, esforo biomecnico, estado fsico), psicolgicos (percepo, cognio, tomada de deciso, emocional) e comportamentais (motivao, comportamentos reproduzidos).

    A carga de trabalho, se mantida no decorrer do tempo e dependendo dos recursos indivi-duais, pode produzir efeitos adversos, tais como problemas de sade e segurana e falta de de-sempenho. As caractersticas da carga produzem consequncias fisiolgicas e psicolgicas como liberao de hormnios, ao muscular, percepes e estados de humor. As respostas carga so influenciadas pela capacidade fsica individual, estado de sade e motivao. O sistema de trabalho tambm pode produzir efeitos positivos, como motivao aumentada e rendimento de qualidade. A Balance Theory of Job Design enfatiza que todos os elementos do sistema de trabalho devem ser considerados para melhorar o rendimento, a sade e a segurana (CARAYON; SMITH, 2000).

    Saurin e Guimares (2008) relataram os resultados de uma interveno ergonmica em uma fbrica de nibus no Rio Grande do Sul, conduzida segundo o mtodo de Anlise Macroergon-mica do Trabalho (AMT). As propostas de melhoria foram: adoo de conceitos de manufatura celular, na qual os operadores desempenhariam todas as etapas do ciclo de montagem da poltrona; mecanizao do transporte das poltronas para reduzir o esforo fsico intenso e a baixa produti-vidade nessa tarefa. Alm disso, a anlise de tempos durante a avaliao do novo sistema indicou reduo do tempo total de montagem na ordem de 7% por operador. Os autores concluram que na medida em que os trabalhadores aprendam o novo sistema de montagem de painis e o setor de submontagem seja otimizado, os ganhos sejam ainda maiores.

    A macroergonomia, uma evoluo natural da ergonomia, entende as organizaes como sis-temas scio-tcnicos e incorpora conceitos e procedimentos da teoria dos sistemas scio-tcnicos ao campo da ergonomia; desta forma une os conceitos da ergonomia e da teoria dos sistemas scio--tcnicos. A macroergonomia entende as organizaes como sistemas abertos, em permanente in-terao com o ambiente e promove o tratamento da interface: mquina, ser humano, e organizao.

    Quando os problemas ergonmicos so identificados, muitas vezes so realizadas apenas aes pontuais de melhoria, como por exemplo, ajuste nas dimenses de uma bancada, ou medidas que atuem apenas sobre os sintomas, como programa de ginstica laboral, isoladamente de outras aes preventivas, dando-se pouca ateno s suas causas fundamentais (SAURIN; GUIMARES, 2008). Dentro deste contexto necessrio ter uma viso holstica do processo, atentando no ape-nas aos recursos mquinas e equipamentos, mas principalmente ao que envolve recurso humano, sendo este o agente principal para a produtividade. O uso dos conceitos da Ergonomia pode ser considerado como mais uma metodologia a ser empregada junto ao planejamento e execuo das atividades produtivas, com a finalidade de se criar condies mais apropriadas e melhores resulta-dos na interao homem versus trabalho.

    O estudo de Guimares e Naveiro (2004) apresentou uma reviso crtica dos sistemas de avaliao ergonmica aplicados ao estudo dos DORT. Os autores concluram que h um grande nmero de mtodos disponveis para a anlise dos fatores de risco ergonmico, e a seleo de um mtodo ou conjunto de mtodos deve levar em considerao alguns fatores: generalidade ou especificidade da situao a ser analisada; preciso; validade; praticidade; custos do mtodo. Essa escolha tambm deve estar de acordo com os objetivos do estudo, os parmetros de interesse e os resultados aplicativos.

  • Ergonomia como fator econmico no pensamento Enxuto: uma anlise crtica bibliogrfica

    GEPROS. Gesto da Produo, Operaes e Sistemas, Bauru, Ano 8, n 3, jul-set/2013, p. 39-5148

    Soares et al. (2007) conduziram um trabalho que teve como objetivo apresentar uma anlise comparativa dos primeiros passos da gesto do programa de Ergonomia em duas empresas de grande porte no Estado de Pernambuco, atravs da criao de um Comit de Ergonomia respon-svel pela implementao de aes ergonmicas em cada empresa. De acordo com os autores, esta estratgia possibilitou uma maior participao dos funcionrios na identificao e soluo dos problemas ergonmicos. A experincia teve um resultado positivo ao demonstrar o envolvimento dos trabalhadores nas solues adotadas e justificou a necessidade de se adequar o mtodo ergon-mico s caractersticas peculiares de cada empresa.

    Um programa de ergonomia costuma ser a melhor soluo para organizar aes gerenciais, pois capta a realidade complexa dos ambientes de trabalho, tornando-a compreensvel, planejvel e manejvel. No entanto, sua implementao depende de como as pessoas que compem a organi-zao encaram o problema de forma organizada, gil e prtica (SOARES et al., 2007).

    De acordo com Soares et al. (2007), as principais vantagens na implantao de programas de ergonomia na empresa so:

    1. Aes mais consistentes, aumentando as chances de parcerias e envolvimento dos benefici-rios, gerando impacto;

    2. Pessoas mobilizadas a participarem de aes promovidas pela empresa, promovendo parce-rias internas;

    3. Aes de melhorias nas condies de trabalho com melhores resultados e menores custos gerando confiana, por parte da organizao e seus colaboradores, gerando sentimento de legitimidade e credibilidade;

    4. Promoo progressiva da reflexo coletiva sobre a experincia, gerando produo de conhe-cimento relevante a outros programas dentro da empresa;

    5. Promoo de espao para negociao e expresso dos agentes, por estar calcado sobre metas, objetivos e critrios de avaliao, gerando negociao de interesses.

    Amato Neto e Amato (2006) apresentaram e discutiram em seu artigo as transformaes provocadas pelo novo modelo industrial de Produo Enxuta e pela revoluo tecnocientfica, em andamento na sociedade atual, na organizao industrial e no mundo do trabalho. De acordo com os autores, o processo de globalizao vem estabelecendo aos formuladores de polticas de desenvolvimento a investigao de novos conceitos e de novas formas de se pensar a organizao produtiva, principalmente em nvel microeconmico, tais como: novos tipos de estruturas organi-zacionais mais enxutas e flexveis, a partir de novas bases tecnolgicas, condicionadas, em par-ticular pela revoluo na microeletrnica; novos princpios e arranjos na organizao do trabalho, priorizando as formas de trabalho em grupo de profissionais multifuncionais; novos modelos de arranjos produtivos, alm de outros conceitos e aplicaes.

    Saurin e Ferreira (2008) realizaram um estudo aplicado a uma empresa com um sistema lean bem desenvolvido. Foram aplicados questionrios junto aos seus colaboradores atravs de amostragem, no intuito de entender qual a percepo da implantao de ferramentas lean s suas atividades de trabalho, analisando dois aspectos: condies atuais de trabalho e sistema antigo versus sistema novo. Os resultados indicaram que os trabalhadores compreendiam de forma ra-zoavelmente positiva suas condies de trabalho e que elas melhoraram em funo da Produo Enxuta, grande parte disso em decorrncia das diferenas entre o trabalho prescrito e o trabalho realizado, tornando-o menos rgido e mais independente. O fato de a fora de trabalho ser com-posta por operadores experientes em suas tarefas tambm pode ter cooperado para que os mesmos fossem menos dependentes do seguimento de padres.

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    5. CONSIDERAES FINAISO Pensamento Enxuto uma filosofia de gesto de negcios que vem se estendendo pelas

    organizaes do mundo, devido necessidade de sobrevivncia perante as exigncias do mercado global. H o enfoque na eliminao dos desperdcios e no acrscimo de maiores valores aos pro-cessos, a busca da melhoria contnua dos produtos e servios prestados, atendendo e satisfazendo as expectativas dos clientes. Dentro desta dinmica apresentada pelo lean thinking (pensamento Enxuto), faz-se necessrio a busca de melhores resultados, e a valorizao dos recursos humanos e das atividades por estes desempenhados, tornando o trabalho mais satisfatrio e oferecendo feed-back imediato sobre os esforos para transformar desperdcio em valor.

    A ergonomia uma metodologia que pode agregar valor dentro do pensamento enxuto, criando condies mais apropriadas e melhores resultados na interao homem versus atividade. A atuao de forma preventiva atravs da Ergonomia e da Engenharia Econmica resulta em fatores competitivos e econmicos para as organizaes. Para tanto, necessrio ter uma viso holstica do processo, atentando para a organizao como um sistema social onde as partes so independen-tes, mas inter-relacionadas. Desta forma, possvel visualizar a organizao no mais como um sistema mecnico onde as partes podem ser mudadas sem um efeito concomitantemente sobre as outras, mas buscando equilbrio entre as partes.

    Esta interao ainda implica na colaborao de todos os envolvidos, onde a participao e iniciativa auxiliam na construo de novos instrumentos na procura de melhores resultados orga-nizacionais. A proposta de implementao do lean deixa de ter uma viso de processo padronizado e fechado, onde a eliminao de desperdcios em virtude de trabalhos montonos e repetitivos, exigindo maior participao dos colaboradores na identificao e soluo dos problemas, incluin-do os ergonmicos. O pensamento Enxuto torna-se um instrumento dinmico e sustentvel para a conduo da mudana.

    O estudo demonstrou que a ergonomia vem garantindo melhores condies de sade, segu-rana, das relaes interpessoais e para cooperar com o sucesso tcnico, econmico e financeiro das novas organizaes e tecnologias. E o sistema de trabalho pode produzir efeitos positivos, como aumento da motivao e da qualidade, em decorrncia principalmente do envolvimento e aprendizado dos trabalhadores.

    O pensamento Enxuto quando bem implementado e gerenciado bem visto inclusive pelos trabalhadores, que deixam de lado o preconceito da eliminao de emprego devido a uma pro-dutividade ao menor custo. As condies de trabalho podem melhorar em funo da Produo Enxuta, tornando o processo de trabalho menos rgido e mais independente.

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