mestrado auto conceito positivo
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Autoconceito Positivo
Bruce A. Bracken
A importância do autoconceito é
reconhecida desde os estudos de
precursores da psicologia, como James
(1890). Este, com certeza, ainda é um dos
temas de maior interesse de pesquisadores
e profissionais da área de saúde e
educação, bem como de políticas públicas,
especialmente nos EUA.
A razão para a grande ênfase dada
ao tema é simples: comparados à
indivíduos que possuem visões negativas
de si mesmos, pessoas que se vêem de
forma positiva tendem a ser mais felizes,
ser mais bem ajustados, possuir um melhor
senso subjetivo de bem estar, ter maior
satisfação com a vida, entre outras coisas.
É de conhecimento de profissionais da
área, bem como da população em geral,
que ajudar crianças, adolescentes e adultos
a cultivar autoconceitos positivos vale a
pena.
O objetivo deste capítulo é
apresentar formas de promover e
desenvolver auto-imagem positiva de
forma a favorecer autoconceitos positivos
em si mesmos e em outros. Para isso é
importante possuir base teórica adequada
bem como participantes informados e
planejamento de ações.
Termos como autoconceito, auto-
estima, auto-imagem são utilizados como
constructos diferentes por alguns
estudiosos, mas outros afirmam que as
diferenças entre eles são mínimas. Neste
capítulo, Bracken os utiliza como
sinônimos, uma vez que é difícil diferenciá-
las nas aplicações do dia-a-dia, além de
serem atualmente medidos pelas mesmas
escalas.
Um modelo de autoconceito:
Compreendendo as interrelações entre o
“self” e fatores ambientais
O “Self” é um constructo fértil para
a psicologia e possui longa história de
estudos, desde James (1890). Para este,
auto-estima é o resultado da razão entre as
competências e habilidades de um
indivíduo e suas realizações (objetivas ou
percebidas), gerando assim a metáfora de
uma equação. Entretanto, essa metáfora é
falha ao não considerar as influências de
fatores ambientais. Por colocar destaque
somente no fator individual, James
instaura um sistema cognitivo-afetivo que
enfatiza o “self” como uma importante
entidade. Autores contemporâneos, como
Harter (1983) reforçam que o “self” é
responsável por manter o controle,
regulação, disciplina e o alcance de certos
níveis de estima e segurança. Outros
autores, como Watson e Skinner defendem
os efeitos do ambiente no
desenvolvimento, sendo necessário um
ambiente acolhedor para o florescimento
do indivíduo.
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De uma perspectiva
comportamental, pode-se definir o “self”
como um “padrão de comportamentos que
são suficientemente únicos para
caracterizar o indivíduo” (p. 90). “Em
outras palavras, o ‘self’ não pode ser
observado, mas psicólogos, professores e
pais podem inferir o autoconceito de
crianças e adolescentes através de seus
comportamentos individuais” (p. 90).
Global X Domínios Específicos
As pesquisas de James propiciaram
além de um modelo cognitivamente
orientado a concepção de que
autoconceito é um constructo global que
inclui todos os aspectos de auto-avaliação.
Embora muitos teóricos entendam o
autoconceito como um constructo
multidimensional, o senso-comum o trata
como global.
As primeiras escalas formuladas
para avaliar autoconceito refletem as
perspectivas teóricas mais amplas e geram
um escore global de autoconceito, que
variam em magnitude de escala para
escala, além de serem criticadas em suas
propriedades psicométricas. Algumas delas
ainda são bem conhecidas e utilizadas por
seu histórico em estudos longitudinais.
Entretanto, Wylie (1974, 1979) critica
muitos destes instrumentos, pois eles
falham em nos proporcionar entendimento
em autoconceito e gera uma literatura com
muitos equívocos empíricos, perpetuando
concepções equivocadas em profissionais e
no público em geral sobre autoconceito.
Entretanto, até hoje pouco se fez perante
as criticas levantadas por Wylie há cerca de
quatro décadas. É importante ainda
mencionar que novas escalas foram
construídas adotando as perspectivas de
Wylie, sendo, portanto, embasadas
teoricamente, de natureza
multidimensional, com características
psicométricas, subdomínios com pesos
iguais e algumas com amostras nacionais
normativas.
Autoconceito multidimensional
Atualmente reconhece-se que o
equilíbrio, ajustamento e o autoconceito
são dependentes do contexto do indivíduo,
tornando-se assim aceito que este é um
conceito multidimensional. Bracken (1992)
propõe seis domínios específicos retirados
da literatura: social, competência, afetivo,
físico, acadêmico e familiar.
Outra concepção atual sobre
autoconceito é a de sua estruturação
hierárquica. Essa organização teórica
apresenta o autoconceito global como
englobando todos os domínios juntos e de
forma que várias dimensões de base inter-
relacionadas formam os subdomínios.
Segue abaixo uma pequena
descrição de cada um dos domínios:
Acadêmico: diz respeito a como uma
pessoa se sente a respeito dela mesma em
um ambiente acadêmico. Pode ser afetado
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por influências externas como sucessos e
fracassos, facilidade e dificuldade com
determinadas matérias, capacidades
cognitivas e intelectuais, relacionamentos
com outras pessoas do ambiente
acadêmico, etc.
Afetivo: é uma consciência auto avaliativa
e de aceitação dos próprios estados
afetivos e das condições que contribuem
para que tais estados sejam
experimentados pelos indivíduos. Além
disso, inclui as habilidades de lidar com
sentimentos negativos e ser resilientes
frente a esses de forma a manter um
autoconceito afetivo positivo.
Competência: é a avaliação que um
indivíduo faz das suas capacidades de
suprir suas necessidades básicas.
Familiar: como pessoas se sentem sobre
elas mesmas como membros de um grupo
familiar. Depende de elementos como
características familiares e estilos
parentais. Também depende de
características intra individuais.
Físico: Como o indivíduo se sente sobre si
mesmo como uma pessoa física. Inclui
aspectos como aparência física, limitações
físicas e de saúde e destreza.
Social: como uma pessoa se sente sobre
sua habilidade de interagir com outros,
participar socialmente e ser aceito em
ambientes sociais. Como em todos os
domínios, há subdomínios, como
relacionamentos com pessoas do mesmo
sexo, sexo oposto, com adultos, etc.
Relacionamentos sociais e interpessoais
são chaves para a saúde mental.
Quando há sobreposição de dois
domínios, subdomínios híbridos são
formados. A área representada na figura
em preto, autoconceito global, inclui toda
a variância dos domínios primários. Esse
modelo faz sentido sob uma perspectiva
ecológica e lógica e ainda possui suporte
empírico. Entretanto, esse modelo deixa
lacunas ao não explicar em qual extensão e
como domínios se sobrepõe.
Aquisição de auto-conceito
O modelo de Bracken (1992)
incorpora a teoria do aprendizado
comportamental para explicar como
crianças adquirem autoconceito em função
de suas interações diretas e indiretas com
elementos do ambiente. “Especificamente,
pessoas recebem feedbacks positivos ou
negativos sobre seus comportamentos ou
atributos a partir de dois modelos de
feedback ou perspectivas: perspectiva
pessoal e outras perspectivas.
Perspectivas de Autoconceito
A perspectiva de James do
desenvolvimento do autoconceito é
interna. Já a de Cooley (1902) é
predominantemente externa, afirmando
que o indivíduo tende a se ver como o
reflexo de suas características e
comportamentos. O modelo de Bracken
(1992) incorpora as duas perspectivas.
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A partir dos feedbacks recebidos
do ambiente (ambos da perspectiva
pessoal e dos outros), avalia-se a
informação obtida a partir de quatro
padrões de avaliação: absoluto,
comparativo, ipsativa e ideal.
Autoconceito é um constructo do
desenvolvimento na medida em que
conforme a pessoa vai crescendo, seu
comportamento e, consequentemente, sua
auto-imagem vão tornando-se cristalizada
dentro dos domínios individuais e
diferenciada entre domínios.
Correlatos do autoconceito
Pesquisadores têm investigado a
relação entre características humanas
básicas ou condições e autoconceito.
Estudos relacionando idade e autoconceito
vem sendo há muito tempo pesquisado.
Resultados encontrados são inconsistentes,
alguns apontam que adolescentes
possuem autoconceito mais positivos
comparados com crianças, alguns estudos
mostram que o constructo é relativamente
estável ao longo da vida e outros concluem
que o conceito diminui durante a
adolescência. Wylie (1979) conclui que não
há evidências suficientes de efeitos
relacionados à idade. Com relação à raça, a
crença comum de educadores é de que
alunos pertencentes às minorias
desenvolvem autoconceito negativos.
Entretanto, estudos são inconsistentes em
direção e magnitude. Também há
inconsistências no que tange às questões
de gênero, com poucas evidências de
diferenças significativas, sistematizadas e
confiáveis.
Autoconceito acadêmico – o artigo em
questão foca no subdomínio acadêmico ou
em intervenções realizadas em ambientes
escolares que visem promover o
autoconceito. No passado, educadores
acreditavam que o autoconceito de
estudantes estava diretamente vinculado a
conquistas acadêmicas. Estudos, como os
de Hattie (1992), Bear et al. (1997) e Hoge
e Renzuli (1993) trabalham tais paradigmas
em diferentes populações, obtendo
resultados diferentes.
Em todas as áreas de conquistas
acadêmicas, o autoconceito acadêmico de
estudantes se desenvolve em função dos
padrões de avaliação utilizados e a
perspectiva que a influencia. Dessa forma,
é possível que alunos com menos
resultados positivos na escola possam
sentir-se melhores a respeito deles
mesmos por causa de um padrão mais
saudável de comparação e perspectiva.
Reparação do autoconceito – educadores
acreditam que o autoconceito de alunos
com necessidades educativas especiais
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podem ser aprimorado por programas de
educação especial. Elbaum e Vaughn
(2001) e Hattie, Biggs e Purdie (1996)
conduziram estudos de meta-análise de
amostras que avaliavam programas
educacionais e seus resultados, obtendo
baixos tamanhos de efeito.
Desenvolvendo autoconceitos saudáveis –
Através da utilização sistemática do
modelo de Bracken (1992) para o
desenvolvimento, manutenção e reparação
do autoconceito da criança pode-se obter
resultados consistentes e favoráveis. Para
colocá-lo em prática, é importante saber
algumas questões importantes:
Reconhecer que o autoconceito é multi-
dimensional e que é mais fácil trabalhar
domínios do que o autoconceito global;
Entender o autoconceito como um
“medidor internalizado” das percepções
de sucesso e fracasso do indivíduo.
Portanto, a pessoa responsável pela
intervenção deve auxiliar o indivíduo a
tornar-se ou perceber-se mais
competente e/ou bem sucedido;
Considerar o conceito de Cooley (1902)
de que o autoconceito funciona como
reflexo do feedback oferecido pelos
outros como importante. Portanto,
educadores, pais, terapeutas devem
julgar menos, ser menos punitivos, mais
encorajadores e reforçadores – ou seja,
aplicar padrões e perspectivas
apropriadas de forma a facilitar a auto-
avaliação positiva;
Considerar que as percepções da criança
sobre si mesmo podem não ser corretas
ou seguir um padrão realístico. O
responsável pela intervenção deve
auxiliar na reformulação ou ajuste das
expectativas, percepções e crenças da
criança;
Criar um ambiente rico em
oportunidades de sucesso para a
aquisição de confiança;
Utilizar os quatro padrões de avaliação da
melhor maneira possível;
Conclusão – O autor retorna à metáfora do
semeador para descrever o processo de
desenvolvimento do autoconceito positivo.
Referência:
Gilman, R.; Huebner, E. S.; Furlong, M. J.
(2009). Handbook of Positive Psychology
in Schools. Nova Iorque: Rutledge.
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