mercosul - centrodoscapitaes.org.br · dois estágios anteriores, quais fossem: zona de...

62
MERCOSUL Comte. (Adv.) Rômulo Augustus Pereira de Souza – CLC [email protected] INTRODUÇÃO A ideia do Mercosul surgiu em 1960 com a Associação Latino Americana de Comércio (ALALC). Aguardaria um quarto de século, até 1985, quando Argentina e Brasil assinaram a Resolução do Iguaçu, estabelecendo uma comissão bilateral. Em 1988 foi fixada como meta o estabelecimento de um mercado comum no cone sul do continente, através de um Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento assinado por esses dois países. Em 1991, Paraguai e Uruguai tornaram-se membros, tornando-se também signatários do Tratado de Assunção, que estabelecia o Mercado Comum do Sul, uma aliança comercial que visava dinamizar a economia regional, movimentando entre si, mercadorias, pessoas, força de trabalho e capitais. As instituições integrantes do Mercosul foram revistas pelo Protocolo de Ouro Preto, de 1994. Nele se contém que cada país-membro tem um voto e as decisões necessitam ser unânimes. Três são as instâncias decisórias: Um Conselho com funções políticas, um Grupo com funções educativas e uma Comissão Técnica. Em 1995, o organismo evoluiu de instrumento de livre comércio, sendo instituída uma União Aduaneira, na qual, todos os signatários poderiam cobrar as mesmas alíquotas nas importações dos demais países (tarifa externa comum). No ano seguinte a Bolívia e o Chile adquiriram a condição de membros associados. Em 2002, problemas da economia argentina chegaram a enfraquecer o Mercosul, acreditando alguns críticos que a posição então assumida pelo governo Bush em relação a esse país, visava de fato atingir o Mercosul. Muitos consideram este bloco, como o maior obstáculo às 1

Upload: vuongmien

Post on 18-Jan-2019

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

MERCOSUL

Comte. (Adv.) Rômulo Augustus Pereira de Souza – [email protected]

INTRODUÇÃO

A ideia do Mercosul surgiu em 1960 com a Associação Latino Americana de Comércio (ALALC). Aguardaria um quarto de século, até 1985, quando Argentina e Brasil assinaram a Resolução do Iguaçu, estabelecendo uma comissão bilateral. Em 1988 foi fixada como meta o estabelecimento de um mercado comum no cone sul do continente, através de um Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento assinado por esses dois países.

Em 1991, Paraguai e Uruguai tornaram-se membros, tornando-se também signatários do Tratado de Assunção, que estabelecia o Mercado Comum do Sul, uma aliança comercial que visava dinamizar a economia regional, movimentando entre si, mercadorias, pessoas, força de trabalho e capitais. As instituições integrantes do Mercosul foram revistas pelo Protocolo de Ouro Preto, de 1994. Nele se contém que cada país-membro tem um voto e as decisões necessitam ser unânimes. Três são as instâncias decisórias: Um Conselho com funções políticas, um Grupo com funções educativas e uma Comissão Técnica.

Em 1995, o organismo evoluiu de instrumento de livre comércio, sendo instituída uma União Aduaneira, na qual, todos os signatários poderiam cobrar as mesmas alíquotas nas importações dos demais países (tarifa externa comum). No ano seguinte a Bolívia e o Chile adquiriram a condição de membros associados.

Em 2002, problemas da economia argentina chegaram a enfraquecer o Mercosul, acreditando alguns críticos que a posição então assumida pelo governo Bush em relação a esse país, visava de fato atingir o Mercosul. Muitos consideram este bloco, como o maior obstáculo às

1

intenções hegemônicas norte americanas de monopolizar o comércio das Américas através da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), bem como de acordos bilaterais. Também nesse ano foi assinado o Protocolo de Olivos, criando o Tribunal Arbitral permanente de Revisão do Mercosul, com sede na cidade de Assunção. remédio jurídico a uma das fontes de insegurança jurídica do bloco.

Em 2004 foi criado o Tribunal Arbitral de Revisão do Mercosul. A Venezuela protocolou seu pedido de adesão e foi aceita como membro em 2006. Também são hoje associados, a Colômbia, Equador e Peru. Passou vigorar o protocolo de Olivos (2002), tentativa de remédio jurídico a uma das fontes de insegurança jurídica do bloco.

No mesmo ano a Declaração de Cuzco, lançando as bases da Comunidade Sul Americana de Nações, entidade que unirá o Mercosul e o Pacto Andino numa zona de livre comércio continental. O México foi admitido na condição de país observador.

Estão em curso negociações visando a formação de acordos pelos quais os países-membros se obriguem a pôr em prática medidas efetivas para a cooperação judicial, com homologações mais rápidas de sentenças estrangeiras e de medidas cautelares, bem assim de ações envolvendo o direito de integração e demais situações de controvérsia.

Como país-membro do Mercosul, o Brasil é signatário de uma série de Tratados versando sobre temas clássicos do Direito Internacional Privado e modificadores desse ramo de direito, implicando numa atualização da Lei de Introdução ao Código Civil de 1942.

Apesar das dificuldades que se antolham, o Mercosul traduz a única possibilidade concreta de uma confederação econômica e jurídico-política, de força plurinacional uniforme e solidária.

Pois, além de integrar com os Estados Associados cerca de 365,6 milhões de pessoas em dez nações soberanas -, mais Suriname e Guianas-, com PIB anual de aproximadamente três trilhões de dólares e renda per capita de US$ 6.996 -, numa área de 13.000.000 Km2 -, os laços de união entre seus membros se configuram mais sólidos do que aqueles que sustentam v.g., a União Européia ou o Nafta. * (fontes: IBGE, ONU, OIT e OMC).

Para exemplificar -, enquanto a União Européia se debate com mais

2

de doze idiomas, alguns incompatíveis entre si -, nos países do Mercosul existem apenas três – dois deles muito próximos um do outro. O guarani, com cerca de sete milhões de falantes no continente, foi incluído como língua oficial, também por razões de natureza histórico-cultural.

Em relação à formação de grandes blocos asiáticos, é ainda mais patente a diversidade idiomática. Aponte-se o chinês, o japonês, o coreano, o malaio, o árabe-indonésio, o vietnamita, além de tantos outros.

Quanto ao inglês como “língua universal”: esse idioma sofre grandes resistências de caráter nacionalista entre os próprios povos que o utilizam, inclusive no seio da União Européia. E, como é cediço, a língua é um grande fator de aproximação ou distanciamento entre as pessoas.

Assim, sob o aspecto da identidade idiomática o Mercosul está em vantagem sobre os demais blocos existentes e possíveis. O mesmo ocorre em relação às tradições nacionais e as suas possibilidades de harmonização no seio de uma reunião de países. Basta ver que possuímos em comum, tanto a etnia como as origens culturais. Do Caribe até a Patagônia.

Para dissipar qualquer duvida sobre a nossa potencialidade, seria suficiente considerar os avanços feitos na Europa, em termos de integração, por povos historicamente inimigos -, em apenas uma geração.

Observe-se que o Mercosul na fase de União Aduaneira, já superou dois estágios anteriores, quais fossem: zona de preferência tarifária e zona de livre comércio. Falta atingir a fase do Mercado comum, e, finalmente, a da união econômica e monetária.

É sim possível, pretender a integração completa, a livre circulação de bens e serviços com moeda unificada de âmbito continental. Não é sonho, tampouco, perseguir-se uma legislação comum de defesa do consumidor.

Há, entre nós, brasileiros, quem duvide do futuro do Mercosul. A estes, basta apontar alguns indicadores econômicos. O Brasil mais que dobrou os serviços e produtos exportados para a região do bloco nos últimos quatro anos, apesar da resistência devida ao receio de uma expansão assimétrica da nossa economia em detrimento dos demais parceiros * Vide apêndice, Pág. (58).

3

E, apesar de inegáveis problemas oriundos, v.g., do superávit comercial e daqueles de ordem diplomática, muitas empresas brasileiras se instalaram em países vizinhos. Apenas três construtoras já operam em treze países vizinhos.

Para os autores, todavia, um fato apenas seria suficiente para convencê-los de que algo mudou, e de forma irreversível: Na camisa consagrada (sagrada, para sua “hinchada”) do clube de futebol River Plate -, nosso rival tradicional -, pode-se ver o logotipo da Petrobras, companhia estatal brasileira de petróleo e derivados... o que mais seria preciso?

O Mercosul traduz, reitere-se, a oportunidade concreta de um bloco tão homogêneo quanto possível, inclusive apto à defesa dos interesses e da soberania dos seus membros, diante da avassaladora onda de globalização, que, em definitivo, não atende aos interesses e valores dos povos da América do Sul.

Tarefa de cada um e de todos, numa das grandes questões que se põem para atingir tais metas, é a da compatibilização das estruturas jurídicas internas de seus membros, naquilo que seja necessariamente objeto de integração jurídica comunitária. Tal tarefa deve ser levada a efeito, de imediato.

O intercambio de experiências e culturas jurídicas de graduados em direito, oriundos do Brasil, Argentina e demais países do bloco -, de que ora participamos -, é exemplo do papel que incumbe às comunidades e à iniciativa privada, na sedimentação dessa nova mentalidade no continente.

A crença nesse futuro trouxe os autores ao Prata, na esperança de contribuir, ainda que minimamente, para torná-lo realidade.

Nessa região histórica, a luta já não se trava pela liberdade, conquistada pelo heroísmo dos seus maiores. Mario Midón, na dedicatória do seu livro “Derecho de la Integración”, aponta para a batalha a ser travada:

Al empreendimento mercosuriano:Un proyecto inteligente

para administrar interdependência

4

PARTE PRIMEIRA

PROLEGÔMENOS

A Banda Oriental – Breve HistóricoConforme a Ótica Luso-Brasileira

Para melhor conhecer as origens remotas dos povos e das chamadas nações do Prata, é necessário retroceder ao início das chamadas “grandes navegações” e relembrar aspectos relativos aos primeiros Tratados entre Portugal e Espanha, acerca dos territórios que viessem a ser descobertos no novo mundo.

Desde logo, vislumbra-se o embrião das futuras disputas, na omissão do astuto rei português D. João II aos reis católicos de Espanha D. Fernando de Aragão e Dna. Isabel de Castela, quanto ao conhecimento que possuía do subcontinente brasileiro.

Tal omissão foi mantida através dos tempos, inclusive no registro histórico oficial do descobrimento do Brasil no ano de 1500 pela frota de Pedro Álvares Cabral.

Sendo certo, todavia, que doze anos antes da chegada formal de Cabral, já residia no território brasileiro o famoso “bacharel de Cananéia”, português que se fixara na região que leva esse nome, divisa entre os atuais Estados de São Paulo e Paraná.

Também o famoso mapa de Cantino de 1502, e o livro Esmeraldo de Situ Orbis, escrito entre 1502 e 1508 pelo herói português D. Duarte Pacheco Pereira, desmentem as versões oficiais, descrevendo viagens anteriores, inclusive aquela feita pelo autor, em 1498, a mando direto do Rei de Portugal. * (1) (Morrison, Samuel Eliot, Southern Voyages, Oxford Press, 1ª Edição, Pgs. 234 e 275)** (2) Nogueira da Silva, Paulo Napoleão, in Revista de Direito do Mercosul)

A vantagem de tal conhecimento geográfico propiciou à coroa portuguesa negociar tratados altamente vantajosos, mais célebre e

5

importante dentre eles o de Tordesilhas, que ampliou para oeste os direitos portugueses sobre qualquer nova descoberta. Ainda assim, a bacia do Prata permanecia geograficamente sob o domínio espanhol.

Todavia, a rápida descoberta de ouro e prata no Peru e a percepção pouco clara das dimensões e possibilidades dos territórios descobertos, levaram os conquistadores espanhóis a transportar pelo oceano Pacífico até o istmo do panamá, as riquezas produzidas por sua ação predatória. Depois de cruzar o istmo por terra eram reembarcadas para a Europa, utilizando as rotas marítimas recém descobertas, onde correntes oceânicas e ventos favoráveis reduziam em muito a viagem de regresso.

Prejudicial ao desenvolvimento espanhol na região foi também o chamado esquema de “frotas e galeões”, sistema comercial adotado durante os séculos XVI e XVII, pelo qual, somente alguns portos enviavam e recebiam mercadorias originárias das colônias no novo mundo. Diante de tal confinamento econômico, Buenos Aires viu-se obrigada ao comercio, mesmo ilegal, com o Brasil.

A isso, somaram-se os insucessos da fundação de Buenos Aires na primeira tentativa de colonização do Rio da Prata*(Em 2 de fevereiro de 1536, Pedro Mendoza chegava ao Rio da Prata com uma das maiores frotas saídas de Espanha (11 navios), e todo o necessário para a conquista e colonização da região. Trazia com ele quatrocentos homens, mulheres, duzentos escravos e 72 animais de montaria que haviam sobrevivido à viagem. Após fundar a colônia de Buenos Aires, ao usar as práticas normais de violência dos espanhóis contra os índios, foi rudemente repelido, perdendo, em 24 de junho de 1537, apenas na primeira refrega, seu irmão, duzentos soldados e 37 cavalos. Mendoza viu-se forçado a abandonar Buenos Aires e seguir rio acima. Muito doente, voltou para a Espanha, morrendo em viagem. Irala, o segundo substituto eleito, em julho de 1539, levou os sobreviventes para local mais seguro à montante do Prata. Em meados de 1541, de Buenos Aires restavam apenas ruínas. Os cavalos restantes retornaram ao estado selvagem. Em cem anos seriam milhões. Os nativos logo se tornariam os primeiros cavaleiros do novo mundo, antes mesmo dos sioux norte-americanos.), redundando no abandono da alternativa de usar os portos do Prata e do sul do Brasil, e na menor assistência da metrópole à região, expondo-a à colonização portuguesa. Disso resultariam inúmeras disputas e conflitos que deixariam cicatrizes. Algumas ainda visíveis nos

6

dias atuais, quando se discute a integração física e econômica do continente.

Ainda um pouco mais de história:

Com a reunião de Portugal à coroa espanhola em 1580, até mesmo o Tratado de Tordesilhas deixou de ser um referencial jurídico e diplomático. Além disso, nos próprios termos da reunião, a administração dos territórios de ultramar continuou sendo exercida pelos portugueses. Em conseqüência, não apenas os espanhóis não vieram para o Brasil, como -, os desbravadores e colonizadores portugueses passaram a ignorar a linha demarcatória de Tordesilhas, avançando mais para oeste as fronteiras do Brasil.

Quando, em 1640 foi integralmente restaurada a soberania portuguesa sob D. João IV, o traçado fronteiriço e a ocupação do território brasileiro estavam definidos em sua maior parte, exceto quanto às vizinhanças do Rio da Prata.

Desde então, dois fatores deram causa às tentativas da colonização do Rio da Prata pelos portugueses. O primeiro, a necessidade de precisar a delimitação dos territórios mantidos e ocupados, sobretudo, ao sul do Brasil. Tratava-se do fator geopolítico, impondo à diplomacia portuguesa fixar tão definitivamente quanto possível, as conseqüências causadas à linha de Tordesilhas pela “era dos Filipes” -, o período da reunião das duas coroas. Nesse sentido, outros tratados vieram a modificar as linhas fronteiriças, dentre os quais o de Madrid (1750) e de Santo Ildefonso (1777).

A meta da diplomacia portuguesa era situar o Brasil entre os rios Paraguai, da Prata e o oceano Atlântico. Tudo, aliás, conforme uma representação dirigida, ainda em 1675, pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro a Lisboa, sugerindo a ocupação da margem setentrional do Rio da Prata – a banda oriental – da qual, desde 1531 Martim Afonso de Souza se havia apossado em nome da coroa. Alegava-se que a ocupação daria ao Brasil uma fronteira natural ao sul, contribuindo para a derrocada espanhola na região, já em andamento desde Carlos II.

O outro fator era a importância econômica que a ocupação da margem setentrional do Prata possuía, de vez que os ancoradouros locais eram entrepostos comerciais em relação ao Peru. Também, durante o período 1580/1640, muitos portugueses se haviam radicado em Buenos

7

Aires, tornando lucrativo o contrabando que exploravam, de acordo com os espanhóis. Depois de restabelecida a independência portuguesa, tais agentes foram submetidos às leis fiscais espanholas, residindo aí os verdadeiros motivos da citada representação da Câmara Municipal do Rio de janeiro, recomendando a criação de um estabelecimento comercial na margem setentrional do Rio da Prata.

Foi para defender tais interesses que Portugal chegou a ocupar por quatro vezes, e -, por quatro vezes perdeu -, territórios situados na bacia do Prata, inclusive a Colônia de Sacramento, pomo de discórdia durante séculos, desde que fundada em 1680 por D. Manoel Lobo, visto situar-se a apenas dez léguas de Buenos Aires.

É que o senso objetivo dos antigos colonizadores de S. Paulo e S. Vicente havia percebido nessas regiões de condições topográficas e vegetativas tão adaptadas aos seus usos pastoris, aquelas para onde deviam orientar suas correntes povoadoras. A que primeiro atingiu as savanas foi a que seguiu a linha da costa e chegou a Laguna nos fins do século XVII. Dali se organizou o assalto aos campos do extremo sul e de lá é que partiam as hordas de exploradores da grande planície.

Em frente a Buenos Aires, à margem do Prata, a colônia de Sacramento deixara entre ela e Laguna uma imensa extensão despovoada, calculada pelos antigos sertanejos em 180 léguas ao longo da linha da costa. Sobre essa imensa extensão vagavam, desde o século da descoberta, incontáveis manadas de gado bravio, desde o estuário platino até os campos fertilíssimos do vale do Uruguai – “Os campos não têm fim, o número de gado é de milhões!” – diz Simão de Vasconcelos.

Era bem assim. Ao longo de mais de um século, sem inimigos naturais, nas melhores pastagens do mundo, exemplares desgarrados haviam-se reproduzido como nunca fora visto, a partir dos cavalos e muares trazidos por D. Pedro de Mendoza para Buenos Aires em 1535. O mesmo sucedera com o gado bovino que D. Juan Torres de Vera Y Aragon trouxera do Peru em 1587.

Para o instinto pastoril daqueles paulistas, o acesso a essa mina inexaurível de tropa e boiadas equivalia aos filões de ouro das minas de Sabará exploradas por seus irmãos da corrente norte. Entre 1680 (data da fundação da colônia de Sacramento) e 1726 – data em que se realiza a primeira exploração historicamente reconhecida da planície platina, bandos de aventureiros haviam corrido todo o litoral até a Colônia de

8

Sacramento.

Admitindo, desde logo, que nenhum fato ou ato pode ser avaliado fora do contexto da sua época, cabe registrar: a história, conforme se ensina nos bancos escolares brasileiros, cultua o perfil heróico dos bandeirantes, cogitando menos dos seus motivos e da crueldade com que agiam. Mesmo historiadores de nomeada não evitam a admiração pelos feitos épicos dos antigos paulistas:

“Na sua diversão pela Mesopotâmia, à caça de índios, eles chegaram com as hordas guerreiras de Fernão Paes, até a colônia de Sacramento. Esse caudilho formidável bateu os índios aldeados dos jesuítas; bateu os índios selvagens da campanha; bateu os espanhóis, que ameaçavam o pequeno presídio lusitano de Sacramento, e percorreu, de um a outro extremo, de espada na mão, seguido de sua horda bravia de mamelucos belicosos, toda a campanha cisplatina”. (Viana, Oliveira. Op.cit.).

É, porém, Bartolomeu Paes, poderoso caudilho paulista, quem concebe o audacioso plano de exploração das campinas:

Seu ponto essencial é libertar a nossa ligação com a colônia de Sacramento do estéril roteiro litorâneo e chegar, pelo sertão, ao âmago da planície platina. Sua carta ao Rei de 23 de maio de 1720, mostra a confiança que tem no poder de suas armas. Ele diz: “Acho-me com talentos e cabedais para, com força de um avultado grupo de armas, fazer entrada ao Rio Grande, sem a menor despesa da fazenda real, talar aquele vasto sertão e abrir caminho pelo centro dele, desmandando o rumo da comarca de São Paulo”. * Cf. Oliveira Viana “Populações Meridionais do Brasil – vol. 2”.

É que, de toda aquela riqueza, das incontáveis manadas – pela falta de caminhos interiores -, nada se aproveitava além do couro. Essa carta ao Rei mostra, sobretudo, o mesmo espírito predador que arremessou as hordas de Antonio Raposo e Manoel Preto -, da corrente do Itu -, sobre os bugres das missões, forçando os jesuítas espanhóis a descer o Paraná para fixar-se na Mesopotâmia argentina, entre os rios Paraná e Uruguai.

E -, da corrente de Taubaté -, levou os bandos de Paes Leme e Borba Gato a se abaterem sobre as jazidas auríferas de Cataguazes, numa irresistível expansão para o sul. *(Todos, ou a sua maioria, contavam com o beneplácito real, o que mostra não estar alheia a coroa

9

portuguesa à essas ações predatórias. Os vice-reis espanhóis do Peru alarmavam-se com a expansão dos paulistas –, “Los portugueses de San Pablo”. O presidente da audiência de Charcas, D. Juan de Lizarazún, escrevia de Potosi, em 1637, “que era preciso acabar com essa raça terrível de aventureiros, sem religião nem brio...” (Oliveira Viana, op. cit. Apud Taunay). Foi até mesmo pedida a intervenção do Papa, junto ao rei de Portugal para por cobro a tal situação. O avanço dos paulistas para oeste teria, provavelmente, conquistado o Paraguai e as grandes planícies bolivianas, não fosse o deslocamento das reduções jesuíticas de La Guaira para a mesopotâmia argentina, bem como as missões, desviando as bandeiras daquela diretriz e atraindo-as para a extremadura platina. As entradas e as bandeiras terminaram por dar ao Brasil as dimensões continentais que possui.).

Então, seis anos mais tarde, em 1726, um grupo de sertanistas consegue realizar esta grande aspiração. Atravessando -, apesar de grande oposição do gentio -, toda a campanha rio-grandense até a planície cisplatina. Com a incursão do clã guerreiro dos Magalhães, abrem-se, no sul, dois ciclos históricos: o da preia ao gado, com um século de duração, e o grande ciclo da colonização, que dura até os nossos dias. * (Apud Viana, Oliveira, op.cit.).

Chega-se ao século XIX e ao tempo da vinda do Príncipe Regente D. João para o Brasil. Na Espanha José Bonaparte substituía os reis Carlos IV e Fernando VII, que mais tarde, por sua vez, sucederia a José Bonaparte. Nesse período começa a sobrelevar a importância da banda oriental como “pivô” dos movimentos políticos que resultaram na sedimentação das soberanias do Prata.

Tanto que, uma vez em solo brasileiro, o Príncipe regente do trono português, dentre medidas de ordem política e estratégica, determinou a ocupação da Guiana Francesa e da “Banda Oriental”, porque Portugal estava em guerra com a França, que então ocupava a Espanha.

Quanto à “Banda”, somavam-se as razões da diplomacia internacional com as de natureza regional, que mandavam recuperar domínios por quatro vezes perdidos. Havia ainda, a indicar o uso das armas, as notícias de efervescência política e militar na região do Prata.

A primeira intervenção teve lugar em 1811, para auxiliar espanhóis sitiados em Montevideo e dali repelir Artigas e os revoltosos argentinos.

10

Na segunda, em 1816, já então sagrado Rei D. João VI, este enviou toda uma divisão do Exército, que, sob o comando do General Carlos Frederico Lecor, tomou Maldonado, e, em 1817, ocupou a própria Montevidéo. As guerrilhas de interior, por meio das quais Artigas resistiu, prolongaram-se até o início de 1822. A batalha de Tacuarembó selou, porém, o efetivo domínio do Brasil sobre a “banda oriental”, incorporada como província cisplatina.

Tendo D. João VI retornado a Portugal em 1821, foi sucedido no trono do Brasil por seu filho D. Pedro I, que, em 7 de setembro de 1822, proclamou a independência do Brasil. A nova situação, como evidente, impunha a obtenção de simpatias das províncias portenhas, para melhor enfrentar Portugal e as cortes de Lisboa. Daí a missão de Antonio Manuel Correa da Câmara junto aos Estados do Prata.

Estava ele autorizado a propor o reconhecimento pelo Brasil da independência dos Estados do Prata, antes mesmo dos demais países. Como também a assegurar que o Brasil não mais cogitaria da recolonização da banda oriental, assim como entabular negociações preliminares sobre a necessidade de um tratado defensivo e ofensivo entre o Brasil e os Estados do Prata. Aspecto peculiar dessa missão é que a mesma devia manter caráter informal, somente exibindo credenciais se fossem de utilidade aos objetivos.

É de ver que, em 1822, a nacionalidade argentina -, resultante de muitos anos de querelas internas -, estava em plena sedimentação. Buenos Aires acabara de firmar o Tratado Quadrilátero com Santa Fé, Entre Rios e Corrientes. Sob a presidência de Martim Rodriguez e com o gabinete de Bernardino Rivadavia, extraordinária figura que dominava então o cenário político portenho, a nação reiniciava o estabelecimento da ordem e da paz internas. Assim, em que pese a recepção cortês dispensada a Correa da Câmara pelo governo das Províncias Unidas, era notória a oposição da opinião pública argentina.

Melhor exemplo do cenário político da região é o fato de que, em Assunção, o emissário brasileiro sequer logrou ser recebido pelo Dr. Francia, para examinarem o “Tratado de paz, Amizade e Comércio”. * (Embora sem qualquer possibilidade de êxito, dentro do panorama da época, a missão Câmara e sua proposta informal, representaram, historicamente, a primeira intenção de um pacto entre as nações da região.).

11

As razões da desconfiança argentina fundavam-se, sobretudo, num ponto nuclear: A questão da Cisplatina era uma cunha profunda nas aspirações republicanas do Prata, barradas pela regência e logo depois pela coroa de D. Pedro. A tal respeito, o governo de Buenos Aires dirigira ao Príncipe diversas súplicas e mais tarde ameaças: Dentre outras providências enviara ao Rio de Janeiro – em vão – Valentim Gomes para tratar da restituição da “banda oriental” do Uruguai.

Havia três hipóteses para a solução do problema: A criação de um Estado soberano na Cisplatina; sua anexação às Províncias Unidas; ou, finalmente, sua manutenção como parte integrante do Brasil. Este considerava a primeira hipótese quase inexeqüível pela falta de garantias contra o retorno da situação de 1816. Havia também o senso comum de que a segunda opção enfraqueceria o império, que ainda lutava para afirmar sua independência. Por outro lado, a manutenção da “Banda Oriental” como parte do território brasileiro, feria os sentimentos republicanos dos platinos.

Sentimentos esses, aliás, justificados pela ambigüidade da política de D. Pedro I, opondo-se ás cortes portuguesas, mas fiel a seu pai, D. João VI. Ou ainda: rebelião contra o rei, sem abdicar dos seus direitos como sucessor do trono português.

Entrementes, os Caballeros Orientales buscavam e conseguiam apoio em Buenos Aires contra uma injusta administração brasileira que lhes esvaia as riquezas. Assim que, o governo argentino terminou por aceitar a incorporação da “Banda” às Províncias Unidas. Rivera, Rosas, Lavalleja e outros, já buscavam adesões para uma campanha.

Do Rio de Janeiro, o representante da Áustria, Barão de Mareschal, mandava informar Matternich da oportunidade de uma “intervenção” britânica para manter a paz, mantendo-se a Cisplatina anexada ao Brasil. Todavia, outras eram as intenções da Inglaterra. Canning queria a separação da “Banda”. Os “Trinta e Três” desembarcaram em Agraciada e uma assembléia se reuniu em Florida, proclamando a Banda Oriental -“livre e independente do rei de Portugal ou de qualquer outro poder do universo”.

O consulado brasileiro em Buenos Aires foi atacado e o cônsul mudou-se para Montevidéo. O governo de Buenos Aires enviou nota conciliadora ao Rio de Janeiro, mas apoiou com tropas a ofensiva dos rebeldes. Um decreto do governo imperial reconheceu “o estado de

12

guerra” que lhe movia o governo de Buenos Aires.

Aos insucessos militares brasileiros em Sarandy, Passo do Rosário, e na invasão do território das Missões, corresponderam aparentes sucessos diplomáticos em seu favor. Da Grã-Bretanha veio a recomendação de Canning aos representantes diplomáticos para a não intervenção no conflito entre Brasil e Províncias Unidas. O secretario de Estado americano Jay, ponderou que se tratava de uma guerra estritamente americana “pelo seu objetivo e pelos seus fins”.

Finalmente, em 1826, mostrando onde estava seu real interesse, o governo britânico “sugeriu” a cessão da “Banda Oriental” mediante indenização ao Império brasileiro, paralelamente à declaração de sua independência. Alguns historiadores entendem que a posição inglesa deveu-se também ao receio de uma aliança franco-brasileira que pusesse em risco a sua hegemonia na região. Conforme afirmou nessa ocasião o Visconde de Itabaiana: “a Inglaterra quer dar a Montevidéo a forma de cidade hanseática sob sua proteção, para ter ela a chave do Rio da Prata, como tem a do Mediterrâneo e do Báltico”.

Como ainda perdurasse o conflito, apesar da disposição do general Puyerredón para continuar a guerra, Rivadavia preferiu a paz. Mandou ao Rio de Janeiro D. Manoel Garcia, para conferenciar com o Marquês de Queluz. Curioso no episódio é que, a convenção assinada por estes, acabou sendo rejeitada pelo próprio governo que enviara D. Manoel!

Finalmente, o embaixador Gordon conseguiu obter do Imperador D. Pedro I a renúncia do Brasil aos seus direitos sobre a Cisplatina. Concomitantemente, Ponsomby impunha um quase-ultimato a Buenos Aires: a independência da Banda Oriental com entrega de todas as praças fortes ao seu governo e proibição de voltar a ser incomodada por qualquer outro Estado.

Assim mesmo, como as Províncias Unidas haviam aceito o pedido da incorporação da “Banda” ao seu território, o governo de Buenos Aires chegou a instruir seus generais Guido e Belcarce a recusar obediência a um Tratado que concedesse independência absoluta à Banda Oriental. Tais militares, porém, ponderaram em contrário.

Diante disso, a 27 de agosto de 1828, firmada por Guido, Belcarce, pelo Marquês de Aracati, e José Clemente Pereira, passou a vigorar a “Convenção Preliminar da Paz”, que, “sob a mediação de S.M.

13

Britânica”, serviria de base a um Tratado definitivo. O seu Art. I constituía o Estado livre e independente da Cisplatina, separado do território brasileiro; paralelamente, pelo Art. III, as Províncias Unidas reconheciam a nova independência. Diga-se que o Tratado definitivo nunca chegou a ter vigência, diplomaticamente. Mas, instituída estava a independência da “Banda” que veio a se chamar República Oriental do Uruguai.

É certo que a Convenção de 1828 não teve o dom de evitar os percalços e sofrimentos que depois viriam pesar sobre a vida e a soberania da jovem República Oriental:

A política de Rosas, tendente à anulação dessa Convenção com a incorporação da “Banda Oriental”; a neutralização diplomática do Império e a obstrução do Rio Paraná com a tomada da Ilha Martin Garcia; as divergências entre Lavalleja e Rivera, depois entre Rivera e Oribe; a intervenção francesa do Almirante Leblanc; o bloqueio do Almirante Brown; as intervenções anglo-francesas (uma das quais tomou as fortificações de Obligado); enfim, todos esses eventos históricos traduzem os problemas enfrentados pelo Uruguai, depois da Convenção de 1828*. (O processo de emancipação política da América do Sul, acentuou os contrastes existentes entre os países da região. Nesse período ocorrem capítulos decisivos na história do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Cite-se a Guerra da Cisplatina, a independência do Uruguai, a Grande Guerra Uruguaia, a Revolução Farroupilha, a disputa entre Unitários e Federalistas na Argentina, a Guerra do Paraguai, o Pacto do ABC. Alianças, intervenções e conflitos, forjaram a formação dos Estados nacionais platinos. Note-se também a fragilidade das novas soberanias na América do Sul, sujeitas aos interesses e intervenções das nações poderosas da época. Nada de novo sob o sol.).

Acrescente-se: - desde 1850 o Império Brasileiro, que não queria ver seu território cercado ao sul, pelo governo de Buenos Aires, dispusera-se a defender a independência do Uruguai. Inclusive - fato pouco conhecido – prestando socorro financeiro mensal a Montevidéo. Tais contribuições tinham, à época, caráter secreto, conforme ajustado entre o empresário e financista Soares de Souza, o Barão de Mauá, Rodrigues Torres e Andrés Lamas*. (Eram notórias as relações de negócios entre o Barão de Mauá e a banca inglesa Rothschild, que lhe financiou inúmeros empreendimentos; sendo, afinal, segundo consta, a

14

responsável maior pela ruína daquele titular. Não há, assim, que estranhar o fato de que, certos investimentos de caráter nebuloso, feitos por Mauá na recém soberana República Uruguaia, precisassem permanecer desconhecidos dos argentinos.).

De outro lado, o reconhecimento da independência do Paraguai pelo Império Brasileiro, em 1844, despertara grande repulsa por parte de Rosas. Este, embora tenha passado à crônica (brasileira) como um ditador sanguinário – foi, igualmente, um herói platino. E a tal ponto que o venerável San Martin legou-lhe em testamento sua espada*. (É necessário dizer-se: Os ideais e a ação de Rosas parecem ter lançado raízes na maneira de pensar e sentir dos argentinos. E, por que não? Também entre os brasileiros.).

De tal sorte, embora pouco mais tarde o Brasil, a Argentina e o Uruguai tivessem constituído a Tríplice Aliança contra Solano Lopez, isso em nada alterou as raízes sentimentais de antagonismo e rejeição que se foram sedimentando entre Buenos Aires e Rio de Janeiro, e que iriam perdurar por mais de um século*. (Nas escolas militares de ambos os países estudavam-se -, ou ainda se estudam -, as possibilidades táticas de conflitos armados nas fronteiras do sul. Não por acaso as principais unidades blindadas do Exercito Brasileiro eram sediadas no Rio Grande do Sul, assim como os governos brasileiros nunca estimularam ou mesmo permitiram, até recentemente, a industrialização nas proximidades das fronteiras com a Argentina.

Nem mesmo a admiração e amizade recíproca entre Bartolomeu Mitre -, que chamava o Brasil de “democracia coroada” -, e o Imperador D. Pedro II foram capazes de alterar tais sentimentos negativos nesses povos. A mesma desconfiança que permanece desde Rosas, quando as Províncias Unidas foram forçadas a renunciar do pedido de incorporação a elas, feito pela Banda Oriental e aceito por Buenos Aires.

A primeira metade do século XX assistiria ao progresso da região platina, especialmente da Argentina. Buenos Aires, uma das maiores cidades do mundo, seria chamada no Brasil de “A Londres da América doSul”. No mesmo passo o Uruguai tornava-se conhecida como -, “a Suíça americana”.

De toda sorte, ao final da Segunda Guerra mundial, já se fazia sentir a necessidade da interação entre Brasil e Argentina. Note-se que,

15

em 1941, no auge da guerra, os dois países haviam entabulado negociações que não vingaram, no sentido da criação de uma União Aduaneira. Em parte por fatores ligados às pressões das grandes potências quanto às políticas externas dos dois países. A idéia da integração deveria aguardar ainda trinta anos, até a declaração bilateral de Argentina e Brasil em Foz do Iguaçu, em dezembro de 1985. Após longo período ditatorial esses países enfrentavam a necessidade de reorientar suas economias.

Persistem, todavia, até os nossos dias, embora atenuados, resquícios dessa rivalidade entre os dois maiores parceiros do Mercosul: em ocasiões recentes, diga-se, tal atavismo histórico com sua carga de desconfianças chegou mesmo a influenciar atitudes que prejudicaram ou retardaram o desenvolvimento da união aduaneira, e conseqüentemente sua evolução no rumo da futura integração.

Hoje, a “Banda Oriental” existe como registro histórico, fonte riquíssima para trabalhos de pesquisa acadêmica e científica. A colônia de Sacramento, o território das Missões, as intervenções européias, os bloqueios navais, são também lembranças da perspicácia política, do heroísmo, das alianças que se faziam e quebravam ao sabor dos objetivos maiores do Império e das Províncias Unidas, dos interesses paraguaios e dos patriotas uruguaios que contribuíram para a realidade atual das soberanias da Bacia do Prata.

16

O tempo e a história se encarregaram de evidenciar, de forma final, o papel da região como fundamental para os interesses de todos os países do continente. Quanto ao Brasil, o fato do seu território chegar ao Caribe -, ao invés de elidir sua condição de país integrante da Bacia, propicia a todos os países vizinhos o aproveitamento dessa peculiaridade em prol da integração: Não é outro o escopo do Mercosul.

17

PARTE SEGUNDA

A QUESTÃO DA SOBERANIA

O fenômeno a que se convencionou chamar de globalização está a exigir uma releitura do significado de - soberania nacional -, como daquele do seu agente específico – o Estado. O mercado globalizado e as necessidades econômicas obrigam os sistemas políticos a se organizarem em direção às macro formas estatais.

São evidentes os sinais de que uma pretendida “autoridade do mercado globalizado” – figura abstrata que ninguém define com exatidão, tende a impor aos Estados a perda, em essência, das soberanias nacionais.

Também, tudo parece indicar que somente um crescimento acentuado, físico, político e econômico, pode gerar uma expansão capaz de contrapor-se ao assédio jurídico-político do mundo globalizado. Privilégio, como evidente, de pouquíssimos países de grande população e extensão territorial. Tal fenômeno se observa hoje com a China, e, em menor escala, com a Índia.

Historicamente, a expansão dos estados nacionais se deu através daquilo a que se convencionou chamar de “imperialismo”: o turco-otomano, o britânico, o norte-americano, o francês, o italiano, belga, o espanhol e o português. Considerado apenas o período que medeia das grandes navegações até o começo do século XX.

O conteúdo físico-político e militar desse tipo de imperialismo cedeu passo aos componentes econômicos ou culturais. É mesmo possível afirmar que na atualidade os maiores instrumentos são a mídia e o “comercial”. No mais das vezes, já não há necessidade de armadas ou exércitos para controlar um território e submeter seus habitantes. Basta controlar a economia e modificar valores culturais.

Para expandir-se -, além do imperialismo e das citadas exceções -, resta aos Estados a alternativa da associação, criando entidades ou contextos juridico-políticos fortes o suficiente para preservarem as soberanias representadas, bem como, resistirem às investidas desnacionalizadoras.

18

O que implica na construção de um direito comunitário. O qual, por sua vez envolve a admissão de princípios que à primeira vista traduzem cessão parcial de soberania por parte dos respectivos membros. Cujo efeito peculiar, todavia, é aumentá-la em relação a terceiros, ou seja, aos Estados não-membros de tais associações.

Existe, portanto, uma cessão de soberania aparente, que permite aos integrantes desse tipo de associação expandir seu potencial de autoridade nacional em face do mercado globalizado.

Todavia, qualquer que seja a visão do direito comunitário, é certo que ele há de conduzir a uma concepção jurídica semelhante àquela do Mercosul -, associação de Estados nacionais destinada a proteger imediatamente a economia dos seus membros e mediatamente a sua soberania nacional em face da chamada economia global.

Reflita-se também sobre as restrições à ampliação da União Européia em decisão de 1999 do Tribunal Constitucional alemão. Tal aresto baseou-se em que a pretendida ampliação não traduziria a homogeneidade característica da formação de um povo, ou comunidade internacional. Em virtude desse julgamento, levantou-se à época a discussão, hoje superada no âmbito da CE, de um deficit de legitimidade -, eis contestada a própria institucionalização da entidade supranacional -, suscitando como corolário, a necessidade de uma Constituição supranacional na Europa.

Em relação ao Mercosul, afirme-se -, é bem menor a falta de homogeneidade referida pela corte alemã. Em relação a este, é concebível, senão viável a edição de uma Constituição comum, respeitando os postulados jurídicos de cada um, mas integrando a todos em uma só ordem constitucional supranacional.

Em tese, a questão das soberanias nacionais entre os membros do Mercosul, ficaria adequadamente resolvida. A rigor, a soberania de todos seria a de cada um, no mesmo passo em que todos estariam protegidos contra a desnacionalização política, econômica e cultural. A alternativa é, num futuro não muito remoto, assistirem os povos do continente sul americano ao desaparecimento das suas identidades nacionais, juntamente com o patrimônio histórico-cultural comum.

Em certa medida, além do significado como instrumento inaugural

19

do Mercosul, pelo próprio conteúdo e propósito, o Tratado de Assunção representa o primeiro passo na direção de uma integração em nível constitucional. Entretanto, a integração jurídica e a internalização, nos termos do Tratado, dependerá de específicas adequações constitucionais, por parte dos países signatários.

No caso do Brasil, por exemplo, a Constituição exige que as sentenças proferidas por autoridade judiciária estrangeira só tenham validade e eficácia internas, depois de homologadas pelo Supremo Tribunal Federal. Embora tal disposição seja afirmativa da soberania nacional, é manifestamente obstativa à integração do Mercosul.

Tal óbice já não produziria os mesmos efeitos impeditivos à integração, por exemplo, em relação às decisões de última instância proferidas por um eventual tribunal supraconstitucional. Nesta hipótese, conceitualmente, não haveria que falar de autoridade judiciária “estrangeira”. Evidentes, todavia, os atritos e resistências oponíveis e fatalmente serão opostos à materialização de tal instrumento.

Em suma: será preciso atuar decididamente no sentido de vencer as resistências internas que fatalmente surgirão. Não apenas de natureza cultural, mas, sobretudo aquelas cartoriais e corporativas. Assim como substituir conceitos, embora tradicionais alguns, conquanto certamente superados pela realidade universal.

Tais providências -, não há que confundir -, sobre manterem o conceito de soberania nacional, viriam agregar a esta um novo elemento, qual fosse, o aumento do grau de sua eficácia externa juntamente com as dos demais países membros.

20

PARTE SEGUNDA II

SOBERANIA E INTEGRAÇÃO

AS CONSTITUIÇÕES DOS PAÍSES-MEMBROS:

O problema tratado precedentemente em relação à soberania, está diretamente relacionado com aquilo que é a razão de ser e condição de existência do Mercosul: A integração jurídica, administrativa, e a político-econômica em face do exterior. Vimos também que o caminho a ser seguido é pleno de obstáculos constitucionais, embora a consecução do projeto passe, necessariamente, pelas reformas nesse campo; assim como a implementação de uma cultura comunitária sem desprezo às características sócio-culturais de cada um dos povos envolvidos.* Nota: Mario Midón observa com acuidade que “ lo significativo de los efectos sociales de la integración tiene, a nuestro modo de ver, su cenit em la participación que en el proceso asociativo le cabe a los integrados.

Podremos tener la más firme decisión política y la más pulida instrumentación económica y jurídica, pero cualquier intento integrativo que prescinda de la participación de los habitantes de los espacios integrados está condenado al fracaso. Al menos, ésta es la lección que brindan numerosas experiencias. Por eso la integración requiere una tarea de docencia que no se agota en la aula, en los escritos de especialistas, ni en el discurso de los políticos; debe expandirse hacia la todos los rumbos de la sociedad para difundir sus contenidos y crear una conciencia sobre su importancia.

Un pueblo que ignora su valor es la más embarazosa e insuperable valla que debe sortearse para el éxito de la integración”. * (Permitimo-nos acrescentar: Parece existir nos povos a como que presciência dos seus destinos. Se assim é, os governantes obedecem ao relógio da história, que não pode ser adiantado nem atrasado.

Reflexos das realidades e aspirações das sociedades humanas em determinado momento das suas histórias, são as constituições. Cujo estudo revela, não apenas aspectos jurídicos, como subjacentes a eles os anseios e objetivos dos povos.

Sob essa ótica, examinemos -, com as limitações inerentes à

21

presente pesquisa -, as Constituições dos Estados-membros do Mercosul. Que guardam entre si -, ousam os autores afirmar -, certa homogeneidade, muito embora bastante diversas, em suas origens fáticas.

Antes de iniciar a análise, cumpre lembrar - embora pioneira na história das lutas pela soberania e integração dos países hispano-americanos -, somente em 2006 a Venezuela tornou-se país-membro do Mercosul. Não teve, portanto, oportunidade de marcar efetivamente sua participação na instituição. Ademais, com a outorga pelo Congresso daquele país, de poderes ao Presidente reeleito para governar por decreto -, entendemos prematuro avaliar os efeitos de tal transição jurídica na política externa venezuelana, e mesmo continental.

AS CONSTITUIÇÕES DO URUGUAI

Historicamente integrante do Vice-Reinado do Rio da Prata, o Uruguai foi posteriormente incorporado (1819) como Província Cisplatina ao território brasileiro. Tal incorporação, como visto anteriormente, foi o resultado da guerra declarada à Espanha -, então submetida ao poder de Napoleão I -, pelo Príncipe D. João, Regente do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves.

Em 1828, devido às ações revolucionárias e pressões inglesas, o Imperador D. Pedro I abriu mão de quaisquer pretensões sobre a Cisplatina que veio a se constituir na República Oriental do Uruguai. Assim, a sua fase pré-constitucional pode ser estabelecida entre 1828 e 1830, quando entrou em vigor a primeira Constituição do país, garantida por diversas potencias, dentre as quais o Brasil.

Em 1919, nova Constituição veio à luz, estabelecendo um sistema colegiado de governo, nos moldes da Suíça. Em 1934, nova Constituição aprimorou o sistema, prevendo um Conselho de Ministros que atuava junto ao Presidente, além de dar competência ao legislativo para destituir o Conselho e de proferir voto de censura aos ministros do Executivo.

A Constituição de 1934 foi substituída pela de 1966. O novo texto imprimiu maior operacionalidade ao Poder Executivo. O voto de censura aos ministros foi mantido, embora com diferenças em relação ao sistema anterior.

22

Em 1967, nova alteração constitucional. Sua eficácia e efetividade, porém, sofreram entraves e percalços a partir de 1971 e até 1984. A partir daí, recuperada a normalidade constitucional, duas grandes reformas foram realizadas, resultando no texto vigente.

O Art. 4º da mesma estabelece a separação entre a Igreja e o Estado, declarando livres os cultos religiosos embora reconhecendo à Igreja católica o domínio sobre os templos construídos com fundos do erário federal. * (Na Constituição Uruguaia, o Art. 8º cuida do princípio da igualdade -, conforme julgam os autores -, de forma bem mais explícita e adequada do que -, ainda uma vez -, a Constituição brasileira. Para a Constituição Uruguaia, se todos são iguais perante a lei, esta reconhece expressamente a desigualdade e distinção como conseqüência de talentos e virtudes de cada indivíduo, não deixando margem à criação de mais uma contracultura -, como ocorreu no Brasil -, da igualdade absoluta a igualar os desiguais.

Ao tratar do princípio da reserva legal, o Art. 10º determina que ficam fora da autoridade dos magistrados as ações privadas que não ataquem a ordem pública ou prejudiquem a terceiros, explicitando ainda que ninguém será privado daquilo que a lei não proibir. No que concerne à responsabilidade objetiva, a Constituição estatui como civilmente responsáveis o Estado nacional, os governos departamentais, os entes autônomos, os serviços descentralizados e quaisquer órgãos públicos pelos prejuízos que sua atuação causar a terceiros.

Assim, no que respeita à condição pessoal dos cidadãos, e nas relações entre a sociedade e o Estado, é possível vislumbrar na Constituição Uruguaia, os melhores textos fundamentais da atualidade. Quanto à estrutura do Estado, o aspecto mais relevante nos aparece como sendo a existência de um Conselho de Ministros, integrado pelo Presidente da República e pelos ministros de estado, convocado por qualquer destes, presidido por aquele, mas deliberando por maioria absoluta de votos, com faculdade de desempate atribuída ao Presidente. Além disso, o Legislativo pode aprovar censura a qualquer ministro, ou, coletivamente, ao próprio Conselho de Ministros. Em um e outro caso, importando a censura em renúncia forçada do censurado.

Em sua essência, portanto, estamos diante de um sistema quase parlamentarista, só não o sendo integralmente por atribuir o Poder

23

executivo ao presidente da República.

Quanto á adequação da Constituição uruguaia aos compromissos assumidos frente ao Mercosul como estado-membro:

De certeza o seu Art. 6º, Capítulo IV proclama o princípio segundo o qual, em relação aos Tratados internacionais, todas as diferenças que surjam entre as partes contratantes serão decididas por arbitragem ou outros meios pacíficos:

“La Republica procurará la integración social y económica de los Estados Latinoamericanos, especialmente en lo que se refiere a la defensa común de sus productos y materias primas. Asimismo, propenderá a la efectiva complementación de los servicios públicos”.

“A República procurará a integração social e econômica dos Estados latino-americanos, especialmente no que se refere à defesa comum de seus produtos e matérias-primas. Além disso, propenderá à efetiva complementação dos seus serviços públicos”.

Tal, aliás, o espírito do Tratado de Assunção que criou o Mercosul em 26 de março de 1991, aprovado no Uruguai pela Lei 16.196, de 22 de julho seguinte. O mesmo sentido seguiu o Protocolo de Brasília sobre solução de controvérsias, em 17 de dezembro seguinte, internalizado no Uruguai pela Lei 16.348 de 01.04.1993. O mesmo ocorreu quanto ao Protocolo de Ouro Preto, sobre estrutura institucional, personalidade e fontes jurídicas do Mercosul, de 17 de dezembro de 1994, internalizado em 01.09.1995 pela Lei 16.712.

Todavia, o Art. 85, § 7º, da Constituição Oriental, defere à Assembléia Geral do Uruguai a competência exclusiva para aprovar ou reprovar os Tratados “de comércio, e as convenções ou contratos de qualquer natureza celebrados pelo Poder Executivo com potências estrangeiras.”, o que encontra correspondência no seu Art. 168, inciso 20.Conquanto tais preceitos não se constituam em obstáculos intransponíveis à integração, têm eles sede no próprio texto constitucional, implicando em futura necessidade de sua revisão, para adequar-se aos compromissos assumidos em relação ao bloco.

24

A CONSTITUIÇÃO DA ARGENTINA

A venerável Constituição da Confederação Argentina surgiu em 1º de maio de 1853, produzida por um Congresso Geral Constituinte, reunido em Santa Fé. Pela falta de adesão da Província de Buenos Aires, não foi, de início, Constituição nacional, mas, somente da maior parte do país. Teve como antecedentes uma série de pactos entre as diversas outras “Províncias Unidas do Prata”.

Segundo as fórmulas clássicas, os mesmos não chegavam a ter uma significação jurídico-institucional de âmbito geral ou nacional. Traduziam a ótica política e libertária dos povos das mencionadas províncias, representados por seus governadores: mais que isso -; significaram verdadeiras e inconfundíveis manifestações de vontade política soberana. Embora, seja certo que em alguns casos, representaram manifestação de caudilhismo, comum à época e à situação, fazendo mesmo com que governantes locais, entre 1820 e 1821, recusassem instrumentos de governo liberais.

É de ser notado que aqueles pactos continuaram sendo produzidos e firmados, mesmo depois de sancionada a Constituição de 1853. Exemplos, dentre outros, foram o Acordo de São Nicolau, e alguns meses depois o Convênio de Paz e União (1860). Este último, aliás, foi o trabalho de uma assembléia que funcionou durante nove dias, mas reformou diversos artigos e incisos do texto original de 1853.

De qualquer modo, em semelhança com a Constituição brasileira de 1824 e em sentido contrário à de 1891, e as que lhe seguiram no Brasil, o texto argentino de 1853 representou, reitere-se, a manifestação da vontade soberana dos povos das províncias representadas quando da sua elaboração. Portanto legitima, do ponto de vista do direito constitucional e da Ciência Política.

Em 1860 aconteceu sua primeira reforma, então com a adesão da Província de Buenos Aires. Resultando desse fato, inclusive, ser o texto reformado em setembro de 1860 a primeira Constituição nacional do país, passando a denominar-se: Constituição da Nação Argentina. Por tal razão, alguns autores preferem identificá-la como Constituição de 1853-1860.

Uma pequena reforma ocorreu em 1866 (três artigos). Outra muito restrita, em 1898. Somente em 1949 houve outra; esta, inclusive, ao cabo

25

de sete anos desconfirmada e abolida, retornando o texto de 1853 com a reforma de 1860. Em 1957, sob a silenciosa rejeição da comunidade jurídica, foi imposta uma outra reforma, esta de inspiração do governo militar de então. * apud Nogueira da Silva, Paulo Napoleão: “A Chefia do estado” Pg. 47.

Finalmente, em 1994, foi realizada uma última reforma, publicada em 23 e 24 de agosto daquele ano. Assim, em cento e quarenta e seis anos de vigência, a Constituição Argentina sofreu apenas seis reformas -, aliás, nem tão amplas -, o que representa a média de uma a cada vinte e quatro anos, demonstrando uma estabilidade muito maior do que a das constituições brasileiras.

Tal fato parece indicar que a mesma, desde a sua primeira versão até a atualidade, exprimiu a vontade de autores e destinatários. Enquanto, no Brasil, o mesmo só ocorreu, cronologicamente, com a Constituição de 1824, que vigorou durante sessenta e quatro anos com uma única emenda.

Vale registrar ainda, que a Constituição Argentina é extremamente detalhada, nisso se assemelhando às brasileiras, de vez que contém elevado número de matérias que poderiam ser ordenadas por legislação infraconstitucional, como decorrência dos ordenamentos magnos. É um exemplo de texto “dirigente”, embora silencie quanto à ordem econômica.

Em suma; se comparada à Constituição brasileira, a que aparece ao lado da paraguaia como a menos radical em relação aos obstáculos à integração -, é a Constituição Argentina: os seus Arts. 31 e 75, inciso 22 -, talvez uma herança político-cultural da antiga visão confederativa -, propiciam facilidades à uma eventual integração supranacional.

Todavia, em que pese o mencionado elenco de fatores positivos existente -, tanto na tradição daquele povo, como na própria Constituição Argentina, a favor do processo de integração do continente -, cumpre mencionar o capitis diminutio existente em relação a essas metas, mesmo após a reforma constitucional de 1994.

É que, pela hierarquia legal argentina, os Tratados de Integração se submetem à sua Constituição. Em outros termos: os Tratados são supra legais e infraconstitucionais.

Mario Midón (op. Cit.) assim refere tal fator: “Si examinamos el nuevo orden de prelación existente en el Derecho argentino advertiremos que

26

en su cúspide, en un esquema bifronte que tiene sus propias relaciones, se ubican la Constitución y once documentos internacionales sobre derechos humanos con jerarquía de leyes supremas. Luego se suceden los tratados (de cualquier tipo) y a continuación aparecen las leyes. Este esquema contradice la esencia de lo que es el Derecho comunitario en lo tocante a su primacía en relación a todo el ordenamiento de lo Estado, incluyendo a la propia Constitución”.

E cita ainda Oteiza, Eduardo y Tempesta, Guillermo, El desafío del Mercado Único. Su significado en la experiencia del CEE y las perspectivas del MERCOSUR, en J.A. 1991-IV-805:

“La Creación del constituyente argentino es llamativa. No hay precedentes de un Derecho Comunitario en que su nota de preeminencia esté ausente. De lo contrario, ese Derecho así emitido será cualquier cosa menos Derecho Comunitario.

A raíz de esta inexplicable disminución, cuando avancemos en el proceso de Mercosur o cualquier otro que en el futuro lleve adelante la Argentina con miras a implementar Derecho de la Integración en su faz superior o comunitaria, será necesaria, indispensable, otra reforma constitucional que confiera al Derecho Comunitario lo que ha negado el constituyente del ‘94”.

AS CONSTITUIÇÕES DO PARAGUAI

Embora iniciada de fato, como conseqüência dos acontecimentos na metrópole espanhola, a vida autonômica do Paraguai recebeu seu primeiro estatuto em 1813, com a criação de um Regulamento de Governo, investindo dois cônsules e prevendo a reunião de um Congresso. Realizado tal certame, um dos cônsules foi nomeado “Ditador”, e, em 1816, declarado “Ditador Perpétuo”. Esse período que se estendeu até 1840 -, pode-se talvez definir como uma etapa pré-constitucional.

Em 1840 foi criada com caráter fundamental a Lei de Administração Política do Paraguai, estabelecendo, pela primeira vez, a tripartição do poder. Criava um sistema marcadamente presidencialista, inclusive, com poucas reuniões ordinárias do Legislativo. Quanto ao Judiciário, como é regra nos regimes ditatoriais (v. Constituição Brasileira de 1937), não tinha competência para decidir sobre questões de

27

natureza política. Em tais casos, o juiz era o próprio Executivo.

Em 1870, com o fim da guerra entre o Paraguai e a Tríplice Aliança, foi adotada uma Constituição moderna, proclamando os princípios do devido processo legal e da supremacia constitucional das liberdades públicas, além de aperfeiçoar o sistema de divisão entre os Poderes e a rotatividade dos mandatos.

Em 1937 foi derrogada a antiga Constituição e substituída por uma de natureza fundacional. Logo em seguida (1940), em virtude de um ato de força, foi adotada uma nova Lei Fundamental de caráter ditatorial e corporativo. Seus mais enfáticos aspectos foram a reeleição indefinida do Presidente e a impossibilidade de sua responsabilização política; a censura prévia da imprensa; a nomeação política de juízes pelo Executivo; a faculdade de dissolução do Legislativo; economia semi-estatizada e discricionariedade no veto às leis.

Em 1967 ocorreu uma pequena reforma que cuidou somente de aspectos relativos à reeleição presidencial.

A atual Constituição foi promulgada em 20-06-1992, produto do trabalho da Convenção nacional Constituinte. Tal Carta Magna declara “fora da lei” a ditadura; estabelece o Estado Unitário descentralizado; proclama pertencer ao povo a titularidade da soberania, exercida através do sufrágio; enfatiza a independência e recíproco controle entre os Poderes do Estado; é detalhada no proteger os direitos à vida – abolida a pena de morte – e à liberdade nas suas variadas formas. Cuida do equilíbrio do meio ambiente, condena a tortura e o genocídio; não admite a prisão por dívidas, salvo as alimentares, ou como substituição de multas e fianças judiciais. Proíbe o exercício arbitrário das próprias razões; protege a personalidade, a liberdade de imprensa, o direito à informação, a igualdade, os direitos de família e, enfim, toda a gama de direitos reconhecidos pelo Direito Constitucional contemporâneo. Assegura, também, os direitos dos povos indígenas, reconhecendo-os como grupos de cultura anterior à formação do Estado.

Peculiar pelo interesse na preservação da cultura indígena, é o contido em seu Art. 77: o ensino primário ou básico será ministrado na língua materna. Com isso se afirmam o idioma guarani e as raízes históricas da sociedade paraguaia.

Vai mais adiante o empenho do texto constitucional nessa direção: na segunda parte do mencionado dispositivo, estabelece que no caso das

28

minorias étnicas cujo idioma não seja o guarani, um dos dois idiomas poderá ser escolhido para o lecionamento do ensino básico.

Um outro aspecto merece especial atenção na Constituição paraguaia: seu Art. 72 reconhece expressamente a participação da Igreja Católica na formação histórica e cultural da Nação*. (Não se trata, na hipótese, de uma união entre Estado e Igreja, com adoção de religião oficial, mas de reconhecimento da posição moral e opinativa da Igreja, no encaminhamento das grandes questões nacionais. De observar que também a Constituição argentina não estabelece uma união entre Estado e Igreja. Todavia, em seu Art. 2º, dispõe que o governo Federal “sustenta” – no sentido de garantir por todos os meios -, o culto católico apostólico romano. Trata-se de situação de efeitos quase idênticos aos produzidos pelo Art. 82 da Constituição paraguaia.

Os dois dispositivos apontados acima, por sua profunda correspondência com o âmago social do país e por traduzirem uma cultura política sedimentada desde os seus primórdios na sociedade paraguaia, talvez expliquem a razão de ser o povo paraguaio, na América do sul, um dos mais imbuídos do sentido de nacionalidade.

Outro aspecto de magna importância é aquele relativo à reforma agrária, de que cuidam os arts. 114 e 116. Poucas Constituições de países com problemas fundiários, são tão expressas como a paraguaia, ao detalhar e especificar os objetivos dessa reforma e seu modus faciendi.

No que respeita ao Mercosul, seus Arts. 137 e 141 estabelecem um sistema que não cria maiores impedimentos à participação do país na entidade.

Por último, note-se que o Art. 145 da Carta sob exame, abre expressamente as portas à integração, quando prescreve:

“La republica del Paraguay, em condiciones de igualdad com otros Estados, admite un orden juridico supranacional que garantice la vigencia de los derechos humanos, de la paz, de la justicia, de la cooperación, de lo desarrollo económico, social y cultural. Dichas decisiones sólo podrán ser adoptadas por la mayoría absoluta de cada Cámara del Congresso”

A Constituição paraguaia foi, portanto, a primeira na região a

29

assinalar o primado dos Tratados sobre a legislação interna. Conforme também se observa na Constituição argentina, depois da reforma de 1994.

AS CONSTITUIÇÕES DO BRASIL

As Constituições republicanas brasileiras, de modo geral, representam uma evolução natural do que foi estabelecido na primeira dentre elas, em 1891. Não seria demais registrar, que também nesta permaneceram alguns poucos resquícios do regime anterior.

Diga-se, a propósito que o Brasil tem sido fértil em Constituições frustradas, a mostrar que o regime político e o sistema de governo implantados em 1889 não têm encontrado completa correspondência nem se adaptado ao longo de mais de um século, à maneira de ser e de sentir da sociedade brasileira, segundo julgam os autores.

Formalmente, foram seis os Textos Magnos em menos de cem anos. 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988, numa média de um para cada dezesseis anos. Isso, sem contar a reforma de 1926, o Decreto 19.398, um ato constituinte que institucionalizou a revolução de 1930 e a “Emenda Constitucional” nº. 1/69. Esta, na verdade, uma nova Constituição -; o que indicaria, se considerada, um total de nove e uma média de um para cada dez anos!

Aliás, na consideração de tais números, há que adicionar as seguintes Emendas Constitucionais: uma à Constituição de 1934; vinte e cinco, à de 1937; vinte e uma, à de 1946; vinte e sete, à de 1967; e, até agora, quarenta e cinco à de 1988. No total, portanto, mais de cem emendas constitucionais.

Sem falar dos Atos Institucionais editados durante o chamado “ciclo militar” (1964-1985), no total de dezessete. Assim, além de oito Constituições, uma grande reforma constitucional (1926), mais de cento e onze alterações constitucionais, em cerca de cem anos. A rigor, cento e vinte e uma manifestações constituintes, o que significa uma a cada oito meses. Indício do desconcerto entre o substancial e o adjetivo -, ou seja -, entre a natureza da sociedade brasileira e a estrutura formal do seu Estado.

30

Talvez, o sistema de Constituição de 1891, copiado aos Estados Unidos e transposto às Constituições seguintes, não tivesse encontrado no Brasil um solo fértil para vingar. É de ver (opinião dos autores) que a sociedade norte-americana foi forjada à base da ética protestante que consagra o individualismo, enquanto a brasileira deitou raízes no catolicismo ibérico, de índole marcadamente comunitarista. * (Obviamente, os mencionados eventos devem guardar relação com o antagonismo entre os mencionados vetores, acrescentando-se a eles a origem fragmentária da sociedade americana (treze colônias), em contraposição à origem unitária do Brasil.). Ademais, as sociedades devem ser regidas por leis saídas de sua raça, da sua história, do seu caráter, do seu desenvolvimento natural, enfim.

A tal propósito, vale lembrar, que nesse período o País registrou três comoções (1893, 1930 e 1964) revolucionárias de abrangência nacional, dezoito golpes de Estado, três presidentes renunciantes (1892, 1961 e 1992), quatro deposições presidenciais (1930, 1945, 1955 e 1964), um impedimento à posse de presidente eleito (1930), um impedimento à sucessão por vice-presidente (1969), cerca de dez mil pessoas exiladas, banidas, ou com os direitos políticos suspensos, e sessenta e cinco anos com censura da imprensa. E, insista-se, cento e vinte e uma manifestações constitucionais.

Em qualquer hipótese, cumpre aqui examinar o sistema constitucional brasileiro, embora sem a profundidade, que o presente trabalho não permite:

Como é cediço, os eventos político-constitucionais caracterizam-se por sua natureza pendular. Todo novo regime ou sistema busca ser, exatamente, o oposto do anterior, ao qual desbancou e desconfirmou. Assim foi com todas as Constituições: a de 24-02-1891, procurando apagar os vestígios do parlamentarismo monárquico. A de 16-07-1934, procurando neutralizar a ditadura implantada pela revolução de 1930. A de 10-11-1937, negando as franquias democráticas previstas na anterior. A de 18-09-1946 tratando de liquidar com os conceitos estabelecidos pela ditadura de 1937. A de 24-01-1967, perseguindo a correção dos desvios ultraliberais de 1946. Finalmente, a de 05-10-1998, querendo expungir da ordem política brasileira, vez por todas -, o autoritarismo e, sobretudo, a interferência militar nos assuntos públicos -, prática dominante ao longo de mais de vinte anos.

O Texto atual (1998), prima pelo detalhamento, inclusive

31

albergando um grande número de matérias e disposições de natureza ordinária, distanciando-se, assim, da técnica legislativa tradicional, que consagra a generalidade dos princípios. Trata-se, portanto, de “Constituição dirigente”. Todavia, do ponto de vista doutrinário, a caracterização inicial do seu “dirigismo” foi bastante imprecisa, embora -, há que reconhecer -, tenha apresentado, no conjunto, consideráveis avanços, de par com aspectos de ótica superada.

Quanto ao princípio democrático, a atual Constituição logrou extinguir ao menos uma das cláusulas pétreas anteriores que vigorava desde 1891 e tornava imutável o regime republicano. Manteve outras quatro (Art. 60 § 4º.), sendo certo que somente uma delas se subdivide em setenta e sete itens (direitos e garantias individuais, Art. 60 § 4º. IV, remetendo ao Art. 5º.). Além disso, a maioria dessas cláusulas poderia ser objeto de legislação infraconstitucional -, se é que disso necessitariam -, o voto direto, secreto, universal e periódico para todos os cargos eletivos e separação entre os Poderes do Estado, e o sistema federativo, embora não tão óbvia a imutabilidade deste último.

De outro lado, no que respeita ao controle da constitucionalidade das leis e atos normativos, a Constituição de 1998 ampliou significativamente o rol dos legitimados a arguí-la, o que traduz sensível avanço na fiscalização da atuação do Poder Público e, portanto, no efetivo exercício da democracia.

No campo econômico, porém, a Constituição manteve, originariamente, o país numa “camisa de força”, conservando antigos ranços e isolando-o do restante do mundo. No mesmo passo, reduziu a já antes irrisória autonomia estadual, e, concretamente, abriu caminho à corrupção eleitoral e administrativa. Felizmente, no que respeita à economia e à Administração Pública, tais problemas vieram a ser corrigidos em grande parte por posteriores emendas constitucionais que, atualmente, raiam as cinqüenta. Não bastasse, discute-se uma ampla reforma política, visando especificamente o comportamento eleitoral, político e parlamentar.

Princípios essenciais na Constituição Brasileira

No preâmbulo do Texto, os Constituintes estatuíram princípios que, por sua natureza e localização no próprio corpo constitucional positivo, deveriam ser considerados como essenciais. São eles os direitos sociais, os individuais em geral, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o

32

desenvolvimento, a igualdade, a justiça, a fraternidade como princípio e procedimento, o pluralismo sem preconceitos, a harmonia social e a solução pacífica das controvérsias.

Os direitos sociais vêm depois enumerados no Art. 6º, os individuais no Art. 5º. E os demais encontram especificação ao longo do Texto.

Princípios Fundamentais na Constituição Brasileira:

São aqueles doutrinariamente conseqüentes aos essenciais e neles contidos. A Federação e indissolubilidade da união entre os Estados, Municípios e Distrito Federal (Art. 1º. Caput), o Estado democrático de Direito (Art. 5º. Caput), a soberania (Art. 1º. I), a cidadania (Art. 1º. II), a dignidade da pessoa humana (Art. 1º. III), os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (Art. 1º. IV), o pluralismo político (Art. 1º. V), a titularidade do Poder (Art. 1º parágrafo único), e a separação entre os Poderes do Estado (Art. 2º.).

Princípios Constitucionais Estabelecidos:

Embora não especificamente indicados no Texto, sua identificação decorre do próprio exercício da hermenêutica constitucional. Trata-se princípios resultantes do sistema de direitos erigidos pela Constituição, de par com o “modelo” das instituições em nível federal, que se devem projetar nos demais níveis, em âmbito nacional. Embora sem adentrar prerrogativas autônomas dos Estados e Municípios, tais modelos servem às instituições e aos procedimentos juridico-políticos estaduais e municipais.

Dentre aqueles modelos destacam-se o regime republicano e o sistema presidencialista, a organização do Poder Legislativo, a duração do mandato de seus membros e de seus órgãos diretores, a organização e independência do Judiciário, além de outros. Tais princípios não são cláusulas pétreas, até porque hão de respeitar-se as autonomias estaduais. Mas atuam como se fossem, em virtude da inadmissibilidade convencional e mesmo jurisprudencial de estruturas e procedimento que representem contrariedade a eles, em nível local. Assim, qualquer modificação no modelo deve provir do nível federal.

Por último, passemos à uma análise expedita da Carta Magna

33

brasileira, face à ordenação jurídica do Mercosul e aos compromissos que implica, na ordem jurídica internacional:

É na Constituição Brasileira que nos deparamos com os maiores empecilhos à concretização de uma integração de caráter supranacional. Senão vejamos:

No § único do seu Art. 4º, a Constituição Brasileira estabelece que “ a República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América latina, visando a formação de uma comunidade latino-americana de nações”.

Entretanto, no seu Art. 102, I, “h” -, atribui ao Supremo Tribunal Federal a já mencionada competência para homologar sentenças estrangeiras, e para conferir exequatur às cartas rogatórias. Por óbvio, tal dispositivo inibe a autoridade e certeza de sentenças oriundas dos Poderes Judiciários dos demais parceiros do Mercosul, constituindo-se num sério obstáculo à integração do Cone Sul. Ademais, em tese, também se sobrepõe às próprias sentenças oriundas de um Tribunal Internacional, cuja criação é condição sine qua non da integração.

Convenha-se: a livre circulação das pessoas de bem das diversas nacionalidades em todos os países do Mercosul, é outro dos elementos primordiais da integração, tal como ocorre na União Européia. É de ver que isso não acontece em sua plenitude nos parceiros do Cone Sul. Pior que tudo, porém, é o impedimento à livre circulação dos efeitos judiciais de um país em outro.

De lembrar -: o sistema de controle da constitucionalidade adotado no direito brasileiro é assaz complexo, diríamos mesmo, até certo ponto inconsistente e inoperante. Salvo em casos de grande magnitude e repercussão política, o que se observa é uma pletora de julgados conflitantes entre juízes e tribunais dos mais diversos graus de jurisdição, acobertada pelo formalismo processual e pela demora quase insuportável na prestação jurisdicional -, desservindo aos princípios de segurança jurídica e da certeza do direito.

Observe-se mais, que além do supracitado Art. 102, I, “h”, da Constituição, há ainda o Art. 5º, XXXI, a traduzir marcado espírito de um superado nacionalismo, no pior dos seus aspectos.

Também o Código de Processo Civil brasileiro dispõe no seu Art.

34

88, I, que é competente a justiça brasileira, quando “o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil”. Dispõe ainda o seu inciso II que será competente a justiça brasileira se “no Brasil tiver que ser cumprida a obrigação”. Finalmente, diz o seu inciso III que será da competência da justiça brasileira processar e julgar “quando a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil”. Com idêntico espírito o Art. 70 §§ 1º e 2º do Código de Processo Penal.

Ora, a participação numa entidade como o Mercosul, implica, necessariamente, não no abandono ou renúncia da soberania. Ao contrário, sua cessão parcial significa, repita-se, a sua ampliação espacial pela aglutinação jurídica de todos numa só unidade.

Fazem-se necessárias modificações no que respeita á soberania (C.F, Arts. 1º , I e 4º, I), como em seus reflexos infra constitucionais, tais como os textos exemplificativos do Código Civil e do Código Penal, dentre muitos outros da legislação brasileira, cuja análise foge ao escopo deste trabalho.

O Brasil, como signatário de uma série de Tratados versando sobre temas clássicos do Direito Internacional Privado e modificadores desse ramo de direito, obriga-se bem assim, dentre outras providências de ordem jurídica interna, a promover a atualização da Lei de Introdução ao Código Civil de 1942 de modo a compatibilizá-la com tais compromissos.

Se, e enquanto tais modificações não ocorram, a prática do dia-a-dia nas relações de operacionalidade com o bloco estarão condenadas a aguardar -, até que o sentimento da sociedade as exija.

AS CONSTITUIÇÕES DA VENEZUELA

Foram muitas as Constituições venezuelanas, desde a “Acta del 19 de Abril de 1910. Nada menos que trinta -, consideradas a Ata de 1910 e a da primeira independência, de 1811 -, até a Constituição da Republica Bolivariana da Venezuela, de 1999. * (Vide Apêndice). Demonstram a inquietação cívica do país que foi berço de duas extraordinárias figuras (Francisco de Miranda e Simón Bolívar), pioneiras nas lutas pela libertação dos povos hispano-americanos.

Francisco de Miranda, já em 1781, em Pensacola, após o cerco aos

35

ingleses, referia-se a uma América espanhola livre e unida.

Bem mais conhecido é o “juramento de Bolívar”, feito em Roma, no Monte Aventino, em 14 de agosto de 1805 -: Libertar a América do jugo espanhol. Desde então a trajetória de sua vida marcou para sempre a história das Américas.

O sonho de Bolívar de uma integração continental não omitira o Brasil, de língua portuguesa, que alcançara sua independência em 1822, vez que o mesmo fora convidado para participar da Conferência de Integração do Panamá*. (Eduardo Prado, no seu livro A Ilusão Americana, publicado pouco depois da proclamação da República no Brasil, e confiscado das livrarias pelo governo que se instalava, narra em detalhes as maquinações norte americanas no sentido de frustrar a Conferência do Panamá organizada por Bolívar, que contrariavam suas ambições hegemônicas no continente, dificultadas pela eventual criação de uma ibero América livre e unida. Pelas mesmas razões frustrou uma tentativa de expedição de Bolívar, com o objetivo de libertar Cuba.).

Todavia, assoberbado por problemas externos e internos oriundos de sua recente independência -, e cedendo à pressões inglesas e americanas, o Brasil não se fez representar na conferência. Enquanto os Estados Unidos se faziam presentes para melhor desvirtuar as finalidades do conclave, insistindo nas questões de natureza econômica.

Também compareceram ao Congresso de Integração do Panamá, em 1826, Venezuela, Colômbia, Equador, México e a Federação Centro Americana. A Bolívia acabara de nascer em 1825 pelas mãos de Bolívar, de quem tomou o nome. Segundo este, além do Brasil, também a Argentina não comparecera, ressentida por não haver recebido ajuda durante a sua guerra contra o Brasil. Observe-se que todos esses países (com a exceção dos Estados Unidos) estão hoje, de alguma forma, comprometidos com o Mercosul, seja como membros, associados ou mesmo, como o México, na condição de observador.

Quanto aos bons propósitos de integração da Venezuela, não bastasse o título de República Bolivariana* (São de Simón Bolívar as palavras seguintes, que lhe conferem a primazia de pensar e lutar por uma América Ibérica livre e integrado. “O novo mundo deve estar constituído por nações livres e independentes, unidas por um corpo de leis em comum que regulem seus relacionamentos

36

exteriores” (Panamá, 1826). (2)(Nota de rodapé) adotado na sua Constituição vigente, de 30 de dezembro de 1999, o constituinte assinalou em seu preâmbulo:

“(...) con el fin supremo de refundar la Republica para establecer una sociedad democrática (.....) promueva la cooperación pacifica entre las naciones e impulsione y consolide la integración latinoamericana de acuerdo com el principio de no intervención y autodeterminación de los pueblos….”

Diz mais, a Constituição venezuelana em seu Art. 15º: “El Estado tiene la obligación de establecer una política integral (…..) de acordo con ele desarrollo cultural, económico, social y la integración”.

Também, o Art. 19º, ao tratar dos direitos humanos, o faz - “de conformidade com esta Constituição e Tratados assinados e ratificados pela República”.

Porém, sentido oposto se subentende do Art. 23º quando -, cuidando ainda dos direitos humanos -, coloca o aspecto de precedência legal dos Tratados, Pactos e Convenções assinados e ratificados, no mesmo nível da Constituição, com prevalência sobre a demais legislação interna – desde que mais favorável. Tal situação jurídica fica, porém, limitada, no mesmo artigo, aos Tratados, Pactos e Convenções relativas aos direitos humanos. Quedando por óbvio, excluídos os instrumentos internacionais versando sobre as demais matérias.

37

PARTE TERCEIRA

Nota do autor:

O tema que encerra esta pesquisa representa o reconhecimento de que, num momento de fundamental importância para o processo de integração da América do Sul, o Mercosul, além do escopo econômico-comercial, já se ocupa, também, do enfrentamento das questões sociais e político-institucionais, relativas ao pleno exercício da cidadania nos povos do continente.

1.0 - O PRINCÍPIO DA IGUALDADE

O princípio da igualdade, a rigor, é a pedra angular dos elementos que integram a substancialidade do próprio princípio democrático, bem como dos procedimentos nesse sistema político. Na verdade, quando uma dada constituição emprega a expressão “todos”, aí estarão implícitos o princípio democrático e a sua operacionalidade, qual seja, a da igualdade relativa.

A lição do eminente Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em sua obra “Estado de Direito e Constituição”, 2ª Edição, 1999, pp. 26/38, manda colocar o princípio da igualdade junto com os da legalidade e justicialidade, como os pilares dos Estados de direito.

À evidência, o princípio exeqüível da igualdade, não é o de que cuida a idealística e antiga concepção de igualdade “absoluta”, mal assimilada pela Revolução Francesa: é impossível igualar fracos e fortes, assim como os bem ou mal dotados física e intelectualmente pela própria natureza, uma vez que tal igualação de desiguais implicaria na negação do próprio princípio igualitário.

Numa outra escala de valores seria impossível pretender a igualação daqueles que, não por circunstâncias naturais, mas como resultado da realidade social -, preço a ser pago pelas sociedades e seus membros, em nome de valores inarredáveis -, tiveram diferentes oportunidades de acesso a cultura e à capacitação pessoal.

38

Obviamente, existe toda uma gama de direitos em relação aos quais o princípio da igualdade absoluta vige e deve produzir efeitos. Tais direitos são aqueles decorrentes da simples e originária condição de pessoa humana, os adequadamente rotulados como ‘direitos humanos’, e não qualquer outro direito: independentemente de qualificação pessoal, a simples condição de pessoa assegura tais direitos. Entretanto, tal condição não basta para a fruição de outros direitos. Para estes, o princípio de igualdade relativa requer a comprovação de determinados requisitos capacitadores. Pretender dar acesso a tais direitos a quem não os comprova equivale a igualar os desiguais.

Em conseqüência, o princípio da igualdade, concretamente, só produz efeitos enquanto separada a igualdade absoluta -, bastante restrita -, da relativa. Conforme a seguir ver-se-á, as Constituições do Mercosul são uniformes no tratamento pelo qual disciplinam a igualdade, nem sempre se atendo à sua própria função didática em proveito das sociedades.

1.1 - A IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

As Constituições traduzem o conjunto homogêneo de princípios e valores consagrados por suas respectivas sociedades, com a observância dos quais pretendem viver. A partir desses referenciais sinalizadores da atuação dos Poderes constituídos é que se constrói e aperfeiçoa a ordem jurídica nacional. É cediço que textos legislativos, atos normativos e provimentos judiciais devem estar em conformidade com tais valores, sob pena de inconstitucionalidade e conseqüente invalidade.

Entretanto, além do seu papel de base e ponto de partida da ordem jurídica, as Constituições têm uma clara função didática na cultura nacional. Diríamos mesmo, sedimentadora do sentimento coletivo de nacionalidade. Assim, a simples inserção de uma palavra num texto constitucional, ou mesmo a sua falta, tem o condão de modificar política e socialmente as crenças e posturas pessoais dos respectivos membros, assim como do seu espectro coletivo.

No caso brasileiro, parece oportuno verificar tal função didática, pela apreciação de dois temas específicos e culturalmente interligados, comparando-os segundo a forma como são tratados nas Constituições brasileira e uruguaia; ambas, obviamente, cuidando de Estados democráticos.

39

No seu Art. 5º. , caput, a Constituição brasileira se ocupa do princípio da igualdade: diz simplesmente que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. E, no inciso I reforça o conceito, com a proclamação da igualdade entre os sexos.

Entretanto, tais disposições são juridicamente inadequadas e insuficientes, na medida em que conduzem a uma inexeqüível igualdade absoluta, demandando, no mesmo passo, o socorro da hermenêutica para que seja explicitado o seu verdadeiro significado: “a lei tratará igualmente aos iguais e desigualmente aos desiguais, em face de uma mesma situação jurídica”.

Ocorre que o povo não conhece hermenêutica constitucional, menos ainda lê a Constituição. Todavia, através da mídia ou de qualquer outro meio tem alguma notícia do princípio da igualdade, tal como aparece literalmente no Art. 5º. Em conseqüência, apesar das provas evidentes em sentido contrário, criou-se uma falsa cultura da igualdade absoluta, como se todos pudessem tudo, todos fossem iguais em tudo.*(Nota dos autores: Segundo tal cultura, não seria de estranhar se os alunos fossem chamados a determinar o conteúdo das disciplinas aos professores, e o próprio procedimento destes na regência de suas cátedras.)

Exceção feita à Constituição monárquica de 1824 - (Art. 179, XIII, “A lei será para todos, quer proteja quer castigue, e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um”) -, todas as demais Constituições brasileiras trataram do assunto segundo a mesma fórmula, ao longo de sucessivas gerações. Logo, a contracultura vem de longe, desde 1891, encastelada como sinalizador de raciocínio na mente coletiva.

A tal propósito -, concessa venia -, o constituinte uruguaio dá uma lição de cidadania e lucidez social. Sua Lei Fundamental, taxativamente, diz (Art. 8º.) que “todas as pessoas são iguais perante a lei, respeitadas as distinções entre os talentos e as virtudes de cada uma”.

Em sentido idêntico suas Constituições de 1830, 1918 e 1934.

Eis a maneira socialmente sincera, jurídica e adequada para enfrentar e assimilar as diferenciações pessoais, determinadas não só pela própria natureza, como também pelo desempenho de cada um em sua vida e diante da sociedade.

40

Como conseqüência, na cultura da sociedade uruguaia, é pacífica a diferenciação entre os direitos inerentes à simples condição humana, e os que decorrem dos talentos e virtudes próprias de cada pessoa. Daí dentre outros fatores, ter sido reconhecido no Brasil como a “Suíça sulamericana”, social, política e mesmo economicamente. Com suas limitações geográficas, não poderia sê-lo, senão com uma sociedade dotada de parâmetros culturais efetivos.

Uma conseqüência direta refere-se à nacionalidade, em relação à qual -, como em todos os demais temas -, o discurso constitucional é e deve ser de suma importância didática. As Constituições brasileiras de 1824, 1891, 1934 e 1937, em elogiável intenção de criar e sempre reforçar no povo de um país ainda jovem e de um Estado historicamente recente a noção simbólica de nacionalidade, enfatizaram nos seus textos a expressão “nação”.

A Constituição de 1946 rompeu com tal programa didático, e ao que tudo indica, fê-lo regredir, sugerindo aos seus destinatários -, assumindo palpável distanciamento do sentimento da nação -, preferiu dar ênfase às expressões: “Estados Unidos do Brasil”, “federação” e “República”, como se tais conceitos tradutores de meras formas de organização político-administrativas fossem superiores ou substituíssem o sentimento de nacionalidade.

As razões psico-ideológicas que presidiram à elaboração do texto de 1946 obedeceram ao conhecido movimento pendular, em geral presente nas mudanças de regimes políticos. Como a Constituição ditatorial de 1937 enfatizara o conceito de ‘nação’, a de 1946 parecia ter necessidade de orbitar em sentido oposto.

Uma válida tentativa de restabelecer a imagem simbólica de ‘nação’, veio com a Constituição de 1967 que enfatizava a palavra “Brasil”, desde logo se denominando “Constituição do Brasil” e só secundariamente se referindo ao regime político e forma de organização político-administrativa.

A tentativa de 1967 foi fugaz. Ao contrário do que fazia esperar sua origem ditatorial, a Emenda Constitucional nº. 1/69 -, na realidade uma outra Constituição -, voltou a privilegiar o regime político em desfavor do conceito das imagens simbólicas de ‘nação’ e “Brasil”.

41

A Constituição de 1988 teve como inspiração política a de 1946. Além de com esta se identificar, por terem ambas sucedido a períodos de ditadura militar ou de situações autoritárias. Em conseqüência também ignorou a expressão ‘nação’, silenciando tal vocábulo.

Tal problema, da enunciação didática da consciência de nacionalidade no texto constitucional e de sua efetividade na respectiva cultura nacional, inexiste nas Constituições dos Estados Unidos da América, da França, da Alemanha, de Portugal, da Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai e inúmeras outras. Visto que nesses países, o significado de ‘nação’ e o sentimento de nacionalidade, estão presentes em cada um dos membros de suas respectivas sociedades.

Enquanto os brasileiros de hoje só se unem solidariamente quando a questão é de conquistas esportivas ou de lauréis artísticos. Mas, distantes, quase indiferentes em face de questões magnas, mesmo respeitantes à manutenção de uma nacionalidade brasileira. Faz-se necessário reconhecer que, tanto em termos de igualdade jurídico-política e social como de consciência nacional -, para a sociedade brasileira em geral, a igualdade e a nacionalidade são pouco mais do que metáforas -; a segunda, mais que a primeira.

Concretamente, em termos de vida social -, o grande número dos denominados “excluídos” dos benefícios oriundos das concepções do mundo moderno, totalmente analfabetos ou semi alfabetizados, sem acesso a um mínimo grau de instrução e educação, sem dispor de infra-estrutura básica ou de cuidados médicos e higiênicos em suas vidas, sem um mínimo de nutrição necessária.

O Brasil é reconhecidamente um dos países com maior disparidade na distribuição de renda, e quem o diz não são apenas os órgãos internacionais, mas os próprios encarregados internos do levantamento e elaboração de pesquisas – fazendo do princípio da igualdade, como antes referido, metáfora quase meramente acadêmica.

Afinal, é impossível vigorar tal princípio, ainda que apenas razoável ou sofrivelmente, entre a minoria das criaturas providas de todos os meios de recursos de riqueza e bem-estar e as maiorias despossuidas dos mais elementares meios de subsistência.

Saber se tais disparidades ainda refletem conseqüências culturais do antigo regime escravocrata, é tarefa de sociólogos e cientistas

42

políticos. De qualquer modo, como conseqüência lógica de tal situação fática, é escasso no seio dessa população, o sentimento de nacionalidade daqueles cujos filhos morrem de desnutrição antes do primeiro ano de vida. Não sabendo sequer como prover o sustento da família, tanto faz que o governo seja o da soberania nacional ou estrangeira.

É, portanto, desconhecido da imensa maioria da população brasileira o princípio da igualdade, e, acrescente-se – também o da nacionalidade. Assim, se o defeituoso enunciado constitucional daquele princípio criou uma errônea cultura sobre os limites concretos e exeqüíveis da igualdade, circunstâncias outras obliteraram a sedimentação do sentimento de nacionalidade, e até mesmo da verdadeira cidadania.

1.2 - A IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO URUGUAIA

Já foi acima referido como a Constituição uruguaia contempla o princípio da igualdade, reconhecendo os talentos e virtudes de cada pessoa, o que consagra explicitamente a igualdade relativa, e já seria suficiente para imbuir a sociedade oriental de um peculiar e altamente valorável padrão de cultura e bem-estar. Além disso, é notório que aquela sociedade não se defronta com desigualdades sociais e contrastes tão lancinantes como os existentes no Brasil.

Há, porém, que mencionar: em relação aos deveres dos cidadãos a Constituição uruguaia é tão silente quanto a brasileira, embora estes estejam, de certa forma, subjacentes, e mais evidentes do que nesta última os dispositivos que cuidam dos direitos.

1.3 - A IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO PARAGUAIA

Tendo em vista o mencionado papel didático das Constituições, no contexto da igualdade, como direito individual, a paraguaia inclui um elemento que, embora até certo ponto óbvio, se levado às suas últimas conseqüências é de grande valia nas relações sociais, assim como naquelas entre o cidadão e o Estado. Tal elemento se traduz na indicação de que as pessoas são iguais não só em direitos, mas, “em dignidade”

43

(art. 46).

O enunciado do supracitado dispositivo, o primeiro do capítulo que cuida da igualdade, à primeira vista parece perfilhar ótica idêntica à das Constituições brasileiras a partir de 1981, tendentes á falsa cultura da igualdade absoluta. Todavia, logo a seguir, ao cuidar das “garantias de igualdade” (Art. 47), o Texto Constitucional paraguaio especifica – embora não exaustivamente – as diversas espécies dos direitos garantidos, o que sugere uma clara distinção entre as diversas naturezas de direitos em relação às quais a igualdade é garantida, afastando-se da ótica genérica e absoluta do Texto brasileiro.

Quanto aos deveres dos cidadãos a Constituição paraguaia faz percuciente enumeração: Arts. 127 a 130.

Merece reflexão a parte final do Art. 48, que enfatiza a proposta de atuação do estado no sentido de afastar obstáculos que impeçam ou dificultem a igualdade e participação do sexo feminino em todos os âmbitos da vida nacional. Tal dispositivo parece traduzir uma efetiva minimização da atuação feminina, sobretudo na política. Contrariamente, a Constituição brasileira, apesar de sobrelevar a igualdade entre os sexos (Art. 5º.I), não parece haver julgado necessário destacar providências do Estado para concretizá-la.

No mesmo sentido da Constituição paraguaia, a segunda parte do Art. 37 da Constituição Argentina.

A propósito, a inexistência de promessa explícita do Estado brasileiro para garantir a igualdade entre os sexos, sugere uma já sedimentada participação feminina em eventos fundamentais. Foi brasileira a primeira mulher a exercer a Chefia do Estado em um país soberano das Américas. Com efeito, a partir de 1870 a Princesa Isabel exerceu em inúmeras ocasiões a Regência do Império brasileiro, totalizando cerca de cinco anos nesse exercício.

44

Antes, a heroína Maria Quitéria tivera significativa participação como comandante militar, nas lutas pela Independência, na província da Bahia. Depois, Anita Garibaldi teve notável participação na guerra dos Farrapos assim como nas lutas pela unificação da Itália. Ada Regato foi a primeira mulher a cruzar o Atlântico pilotando um avião monomotor. Na atualidade uma mulher preside a mas alta corte de justiça brasileira, o Supremo Tribunal Federal. Mais de cem municípios têm mulheres como Prefeito, e mais de mil as têm nas Câmaras Municipais. O Congresso Nacional conta com mais de cinqüenta Deputadas e Senadoras.

1.4 - A IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO ARGENTINA

O princípio da igualdade na Constituição argentina começa a se manifestar explicitamente no Art.14. Este dispositivo, similarmente ao paraguaio, detalha as diversas espécies de direitos individuais reconhecidas a todos os habitantes da Nação. Corresponde, de maneira mais sintética, mas com extensão de certo modo mais abrangente e didaticamente enfatizada, ao rol do Art. 5º da Constituição brasileira.

A similitude com a Constituição brasileira, nesse aspecto, parece se estender. O dispositivo que cuida especificamente da igualdade (Art. 16), limita-se a dizer que “todos os habitantes são iguais perante a lei, e admissíveis nos empregos sem outra condição que a idoneidade”. É precisamente esse enunciado, pelo seu laconismo e generalidade, que realça a apontada similitude das duas Constituições no trato desse direito.

Com certeza, porém, o significado do termo ‘idoneidade’ envolve muito mais que a honestidade pessoal. Além desse atributo, deve-se entendê-lo como correspondente à expressão diferenciadora ‘talentos e virtudes’ – fundamental ao próprio princípio igualitário – da Constituição uruguaia, ou, ainda, com a preocupação da Constituição paraguaia em diferenciar as espécies de direitos individuais, de modo a evitar a aludida cultura do “todos podem tudo”.

Concretamente, se pode ser observada uma equalização muito mais nítida no seio da sociedade argentina, tal circunstancia não deve ser

45

atribuída à citada falsa cultura, mas antes à disseminação e assimilação de uma outra e verdadeira cultura, conduzindo à melhor compreensão da própria igualdade como essência. Tal compreensão decorre, na visão dos autores, da influência de inúmeros elementos que concorreram diferencialmente para a sua formação.

Quando nos referimos a uma diferenciação, não se quer significar uma cultura livresca ou científica, embora incluída. Tal patamar se manifesta, sobretudo, em face de uma consciência e do exercício dos direitos de cidadania e soberania popular, assimilados generalizadamente pela sociedade argentina, direitos aos quais é incito e informa, o princípio da igualdade.

Além daquilo, tal consciência importa na perfeita compreensão dos limites da própria igualdade, e dos momentos e extensão dentro dos quais deve atuar a cidadania e a soberania popular, o que traduz a pragmática questão política de conveniência e oportunidade. Neste sentido, provou essa compreensão a sociedade argentina durante diversas etapas em que conviveu com situações extraconstitucionais na segunda metade do século passado. Na melhor das hipóteses, situações de exceção jurídico-políticas.

É de reiterar, ainda uma vez, a questão do papel didático das Constituições, referido anteriormente, em suas causas e efeitos. Enquanto, desde 1891 -, sem considerar as reformas e emendas constitucionais –verifica-se no Brasil a média de uma nova Constituição a cada dez anos, na Argentina, uma só Constituição – embora com as reformas de 1866, 1898, 1957 e 1994 – vigora desde 1853.

O aludido fator, sugerindo e incutindo na respectiva sociedade a imunização às mudanças constantes de valores, é fundamental para a construção e manutenção da credibilidade de tais valores. Pode-se concluir, afirmando ser este fator fundamental para a alta e sedimentada noção de cidadania e soberania popular da sociedade argentina.

Por último, indagam-se os autores, se a sobrevivência de uma Constituição, após mais de cento e quarenta anos de Independência, atuou didaticamente para a consolidação da consciência e da exata noção do que signifique igualdade jurídica e cidadania -, ou se a cultura natural dessa sociedade é que teria influído decisivamente para a manutenção de uma única Constituição.

São questões mais adequadas à perquirição de historiadores,

46

sociólogos, e cientistas políticos. Qualquer que seja a resposta -, caso exista -, não afastará a realidade dessa consciência.

1.5 - A IGUALDADE NA CONSTITUIÇÃO DAVENEZUELA

A exemplo da Constituição brasileira é também abrangente e absoluto o preceito constitucional contido no Art. 21 do Texto Magno Venezuelano.

“Todas as pessoas são iguais perante a lei”.

Assim soam os seus incisos:

1 – Não se permitirá discriminação baseada na raça, no sexo, na religião, na condição social ou aquelas que no geral tenham por objeto ou resultado anular ou diminuir o reconhecimento, gozo ou exercício em condições de igualdade, dos direitos e liberdades de todas as pessoas.

2 – A lei garantirá as condições jurídicas e administrativas para que a igualdade diante da lei seja real e efetiva. Adotará medidas positivas em favor de pessoas ou grupos que possam ser discriminados, marginalizados e vulnerados. Protegerá especialmente as pessoas que por alguma das condições antes especificadas se encontrem em circunstâncias de manifesta debilidade e penalizará os abusos ou maus tratos que contra eles se cometam.

Para além, o Art. 22 enfatiza que a descrição anterior não exclui outros direitos de mesma natureza não mencionados.

Até o Art. 30, seguem-se outras normas abrangentes, circunstanciando direitos e hipóteses, tornando clara intenção do constituinte de defender a igualdade de direitos dos cidadãos, sobretudo dos menos favorecidos.

47

O Capítulo II da Carta Magna venezuelana cuida da nacionalidade e cidadania (Arts. 31 a 61). Das Constituições dos países do Mercosul, é ela, sem dúvidas das mais caudalosas ao tratar dessas questões, evidenciando o propósito de interagir com a sociedade representada (Arts. 113 até 112).

Ao contrário, porém, das Constituições do Brasil e do Uruguai -, silentes a respeito -, a Constituição da Venezuela se ocupa em minúcias -, dos Deveres do cidadão, Arts. 130 até 135:

Os cidadãos, Art. 130: “.... Devem honrar e defender a pátria, seus símbolos e valores culturais, resguardar e proteger a soberania, a nacionalidade, a integridade territorial, a autodeterminação e os interesses da Nação”.

O Art. 132 fala da responsabilidade do cidadão de participação na vida política do país assim como de defender os direitos humanos. Eis um exemplo de didática constitucional, unindo e integrando objetivos do Estado com os individuais, através de mandamento da Carta Magna.

Peculiar também, é o final do enunciado do Art. 135, ao elencar as obrigações das pessoas em relação ao Estado: “Todavia, as mesmas não excluem ações de solidariedade e responsabilidade social, que correspondem ao cidadão, segundo sua capacidade”. *

*Nota dos autores: Neste Artigo, reconhece o Constituinte venezuelano a impropriedade do conceito “todos podem tudo” -, s.m.j, aparentemente sustentado no Texto Magno. Note-se, por último, que tais ações solidárias podem traduzir-se em serviços comunitários de caráter obrigatório “durante o tempo, lugar e condições que a lei determine”. O que, apesar dos seus louváveis objetivos, de alguma forma confere ao documento um aspecto impositivo

48

comum aos governos de exceção.

49

CONCLUSÃO:

É animador verificar, que, acima de particularidades e regionalismos, todos os Estados-membros do Mercosul, já demonstram através dos seus ordenamentos constitucionais, o desejo e o sentimento, não apenas político, mas respaldado naqueles dos povos da região, de caminharem no rumo da integração.

Assim como é de sublinhar a coincidência de que, as Constituições editadas após a assinatura do Tratado de Assunção (Paraguai, 1992 e Argentina, 1994), sejam as mais adequadas às finalidades integrativas. Assim como, inversamente, as Cartas do Uruguai, 1967 e Brasil, 1988 -, precedentes ao referido Tratado -, apresentem sérios problemas de convivência entre a legislação supranacional e a interna daqueles países.

Neles, sobretudo, é evidente a necessidade de reformas constitucionais mais profundas (no caso brasileiro, como visto, também quanto à aspectos infraconstitucionais), se efetivamente se pretende avançar no processo de integração.

Quanto à Venezuela, frente à sua realidade política e jurídica, não há que perder-se em tecnicismos interpretativos, in casu, meros exercícios futurológicos. O fato inquestionável é que dependerão unicamente da vontade do atual Presidente os futuros posicionamentos políticos do país, bem assim a valoração legal interna, em relação aos compromissos assumidos externamente, inclusive com o Mercosul.

Tudo considerado, ao final, parece razoável algum otimismo quanto ao futuro do Mercosul, sobretudo, após relembrar em rápido bosquejo, as origens históricas dos povos envolvidos -, que os autores julgaram útil adunar à pesquisa. Bem assim diante do fato de não se terem registrado retrocessos irrecuperáveis, nem serem os obstáculos de natureza jurídica de natureza intransponível. A par disso, sobreleva o fato de que a integração faz avanços significativos, inclusive através das comunidades e da iniciativa privada.

50

APÊNDICE

LEIS FUNDAMENTAIS:

Argentina:

Constituição da Nação Argentina (1º de maio de 1853), atualizada pela reforma de 1994.

Brasil:

Constituição Política do Império do Brasil de 25 de Março de 1824.Decreto nº. 510 de 22 de Junho de 1890.Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 24 de Fevereiro de 1891.Decreto nº. 19.398 de 11 de Novembro de 1930.Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 10 de Novembro de 1937.Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 18 de Setembro de 1946.Constituição do Brasil, de 24 de janeiro de 1967.Emenda Constitucional nº. 1, de 17 de Outubro de 1969.Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de Outubro de 1988, atualizada até a Emenda Constitucional nº. 42. Paraguai:

Constituição Nacional do Paraguai (1870)Constituição Nacional do Paraguai (1940) com reforma especial de 1967.Constituição Nacional do Paraguai (20 de junho de 1992)

Uruguai:

Constituição da República Oriental do Uruguai (18 de julho de 1830)Constituição da República Oriental do Uruguai (3 de janeiro de 1918)Constituição da República Oriental do Uruguai (18 de março de 1934)Constituição da República oriental do Uruguai (1966)Constituição da república oriental do Uruguai (texto resultante da Lei Constitucional de 14 de janeiro de 1967, com incorporação das reformas de 1989, 1994 e 1996).

51

Venezuela:

Acta del 19 de Abril de 1810Acta de la Independencia de Venezuela de 1811Constitución Federal de 1811Constitución Política del Estado de Venezuela de 1819Constitución del estado de Venezuela de 1830Constitución de 1857Constitución de 1858Constitución de 1864Constitución de 1874Constitución de 1881Constitución de 1981Constitución de 1893/94Constitución de los estados Unidos de Venezuela de 1901Constitución de 1904Constitución de los estados Unidos de Venezuela de 1909Estatuto Constitucional Provisorio 1914Constitución de 1922Constitución de 1925Constitución de los estados Unidos de Venezuela de 1928Constitución de 1929Constitución de los Estados Unidos de Venezuela de 1931Constitución de 1936Constitución de los Estados Unidos de Venezuela (Reforma) de 1945Decreto de la Junta RevolucionariaConstitución de los Estados Unidos de Venezuela de 1947Constitución de 1952Constitución de los estados Unidos de Venezuela de 1953Constitución de la República de Venezuela de 1961Constitución de la República de Venezuela 1961 con Reformas de 1983Constitución da la República Bolivariana de Venezuela de 1999

52

LEGISLAÇÃO E TEXTOS BÁSICOS DO MERCOSUL

Tratados, Convenções, Protocolos, Decisões e Declarações Conjuntas:

1985-1990

30 de novembro de 1985: Os Presidentes da Argentina e Brasil assinam a Declaração de Foz do Iguaçu, pedra base do Mercosul. No ano de 2004 esses países resolveram comemorar, nos dias 30 de novembro, o Dia da Amizade argentino-brasileira.

20 de julho de 1986: Firmada a Ata para a integração Argentino-Brasileira. Mediante esse instrumento estabeleceu-se o Programa de Integração e Cooperação entre Argentina e Brasil (PICAB) fundado nos princípios da gradualidade, flexibilidade, simetria, equilíbrio, tratamento preferencial frente a outros mercados, harmonização progressiva de políticas e participação do setor empresário. O núcleo do PICAB foram os protocolos setoriais em setores chaves.

6 de abril de 1988: Assinada a Ata do Alvorada, mediante a qual, o Uruguai se junta ao processo de integração regional.

29 de novembro de 1988: Celebra-se o Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento entre Argentina e Brasil, pelo qual se fixa um prazo de dez anos a eliminação gradual das assimetrias.

5 de julho de 1990: Firmada a Ata de Buenos Aires, acelerando o cronograma de integração e fixando a data de 31 de dezembro de 1994 para alcançar o mercado comum.

1991-1995

29 de março de 1991: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai firmam o Tratado de Assunção, que adota o nome de Mercosul, de uma estrutura institucional básica e estabelece uma área de livre comércio.

Junho de 1992: estabelecido o cronograma definitivo da constituição do mercado comum.

17 de dezembro de 1994: Firmado o protocolo de Ouro Preto que pôs em marcha o Mercosul.

53

54

1996-2005

25 de junho de 1996: os países membros assinam a Declaração Presidencial Sobre a Consulta e Concentração Política dos Estados-Partes do Mercosul e, junto ao Chile e Bolívia, a Declaração Presidencial Sobre Compromisso Democrático no Mercosul. Nota: Estes instrumentos referem-se às tentativas de golpe de Estado em abril, no Paraguai e ao decisivo papel desempenhado pelo Mercosul, no sentido de evitá-lo.

24 de julho de 1998: Os quatro países-membros juntamente com Bolívia e Chile, firmam o Protocolo de Ushuaia sobre o compromisso democrático.

10 de dezembro de 1998: É assinada pelos presidentes dos países-membros, a Declaração Sociolaboral do Mercosul.

29 de julho de 2000: São aprovadas as Decisões referidas ao relançamento do Mercosul.

18 de fevereiro de 2002: mediante o Protocolo de Olivos é criado o Tribunal permanente de Revisão do Mercosul. O mesmo tem sede em Assunção, desde 2004.

Regulamento do Protocolo de Olivos para a Solução de Controvérsias no Mercosul (XXV/CMC 15-12-2003).

2003: Pela Decisão CMC Nº. 11/03 cria-se a Comissão de Representantes Permanentes do Mercosul (CRPM) e a figura do seu Presidente. O mesmo permanece dois anos no cargo, podendo a CMC estendê-lo por mais um ano.

Cúpula Presidencial. Dezembro de 2004:

Estabeleceu-se um Fundo para la Convergencia Estrutural do Mercosul (FOCEM). Decisão CMC Nº. 45/04 afim de financiar programas de convergência estrutural, competitividade, coesão social, e infraestrutura institucional.

Criou-se um Grupo de Alto Nível (GAN) para formular uma estratégia para o Mercosul, de crescimento e emprego.

55

Recomendou-se à Comissão Parlamentar Conjunta, a redação de uma Proposta de Protocolo Constitutivo de um Parlamento para o Mercosul.

6 de julho de 2005: Firmado o Protocolo de Assunção Sobre Direitos Humanos do Mercosul

Dezembro de 2005:

Cúpula presidencial em Monteiro

Por Decisão CMC 23/05, foi aprovado o Protocolo Constitutivo do parlamento do Mercosul. A constituição do Parlamento foi prevista para ter lugar antes de 31 de dezembro de 2006.

2006

Julho de 2006

Cúpula dos Presidentes em Cordova:

A Venezuela integrou-se como Membro Pleno do Mercosul

Aprovou-se a Estratégia do Mercosul de Crescimento do Emprego (Decisão CMC Nº. 04/06).

Criou-se o Observatório da Democracia do Mercosul (Decisão 24/06).

Estabeleceu-se a Argentina como sede permanente do Mercosul cultural.

Estados Associados ao Mercosul:

O Mercosul tem como Estados associados a Bolívia (1996), Chile (1996), Peru (2003), Colômbia (2004) e Equador (2004).

Bolívia, Equador, Colômbia e Peru integram a Comunidade Andina (CAN), bloco com que o Mercosul tem acordo comercial.

O status de membro associado se estabelece por acordos bilatérias,

56

denominados Acordos de Complementação Econômica, firmados entre o Mercosul e cada país associado. Através dele se estabelece um cronograma para a criação de uma zona de livre-comércio com os países do Mercosul e uma gradual redução de tarifas. O país associado pode participar como convidado das reuniões dos organismos do Mercosul e efetuar Convênios sobre matérias comuns.

25 de junho de 1996: O Chile formaliza sua associação com o Mercosul durante a Décima reunião da Cúpula do Mercosul, em San Luiz, na Argentina, assinando Acordo de Complementação Econômica Mercosul-Chile.

17 de dezembro de 1996: A Bolívia adere ao Mercosul na qualidade de associada, na Décima primeira reunião da Cúpula do Mercosul, em Fortaleza, Brasil, mediante a assinatura do Acordo de Complementação Econômica Mercosul-Bolívia.

2003: O Peru formaliza a sua associação pela assinatura do Acordo de Complementação Econômica mercosul-Peru (CMC 39/03).

2004: Colômbia, Equador e Venezuela formalizam sua associação ao Mercosul, mediante assinatura do Acordo de Complementação Econômica Mercosul-Colombia, Equador e Venezuela (CMC 59/04).

4 de julho de 2006: A Venezuela ratificou o Protocolo de Entrada. Nota: Durante a XXIX Conferência do Mercosul em Montevidéo, em 9 de dezembro de 2005 ocorrera a outorga de status de Estado Membro em processo de adesão, o que, na prática significa ter voz, mas não voto. Uma vez que a Venezuela adotou o marco legal, político e comercial do Mercosul na metade do ano de 2006 firmou-se o Protocolo para converter-se em estado-Membro (CMC 29/05).

* O México foi admitido como Estado Observador.

FONTE: Ministério das relações exteriores

ASSIMETRIAS DE MERCADO

57

Atualmente o Mercosul possui um PIB de mais de 2.2 trilhões de dólares (base PPC), sendo que cerca de 70% deste valor corresponde ao Brasil. De tal sorte, são grandes as assimetrias de mercados existente no bloco, dando causa a atritos.

O intercambio comercial no âmbito do Mercosul continuam aumentando, batendo, em 2006 um recorde histórico. O Brasil apresentou superávit em relação a todos os países membros.

Além disso, em 2006, seu intercâmbio com os países de menor economia, foi 20 vezes menor do que as trocas com a Argentina, no mesmo período. Em face de tais resultados, Paraguai e Uruguai estão reivindicando concessões de ordem econômica, como forma de compensação.

Em 2006 o comércio entre Brasil e Uruguai totalizou apenas US$ 1,62 bilhão, contra 1,34 bilhão em 2005. Enquanto o fluxo com a Argentina atingiu 19,77 bilhões, contra 16,15 bilhões no ano anterior (2005).

Para o Uruguai, em 2006, o Brasil exportou US$ 1 bilhão, sendo 86% dessas exportações constituídas por manufaturados como óleo diesel, automóveis, autopeças e celulares. Em contrapartida, as importações não passaram de 618,22 milhões. Seus principais produtos foram o malte não torrado, garrafas plásticas, arroz, trigo, carnes desossadas e leite em pó.

Em relação ao Paraguai, o desequilíbrio se acentua. Desde 1985, aquele país só obteve superávit em relação ao Brasil, no ano de 1989. Ainda assim, as exportações brasileiras atingiram 322,9 milhões de dólares, contra importações de ordem de US$ 358,64 milhões.

O desequilíbrio atingiu o ápice em 2006, quando o Brasil teve saldo positivo de 934,6 milhões de dólares numa corrente bilateral de US$ 1,52 bilhões. Os produtos manufaturados brasileiros representaram nada menos do que US$ 1,17 bilhão. Lideraram a pauta o óleo diesel, fertilizantes, pneus e veículos de carga. Dos produtos comprados ao Paraguai, milho em grão, trigo, farinhas, óleo de soja, algodão debulhado, soja em grão, carne bovina e couros.

Sendo o parceiro a Argentina, o cenário é o seguinte: Em 2006 o Brasil exportou para aquele país atingiram a cifra de US$ 11,7 bilhões.

58

Também predominando os produtos manufaturados como automóveis, celulares e autopeças. As importações, que totalizaram US$ 8,05 bilhões deveram-se, principalmente, ao trigo, nafta para a industria petroquímica e automóveis.

No caso da Venezuela, o volume de comércio atingiu os US$ 4,16 bilhões em 2006, contra apenas US$ 2, 47 bilhões no ano anterior, com superávit brasileiro de US$ 2,96 bilhões. Ainda uma vez, os produtos manufaturados lideraram a lista das exportações do Brasil. Apenas aparelhos celulares responderam por nada menos do que 19,68% das vendas. Automóveis, carne de frango e açúcar também aparecem expressivamente na pauta.

Quanto às importações, os querosenes de aviação responderam sozinhos por 27,73%; outros 21,13% se deveram à nafta para a petroquímica. Óleo diesel vem em terceiro lugar, representando 10,95% das compras brasileiras.

Durante a XXXII cúpula do Mercosul, foi proposto pelo Brasil a redução da TEC (tarifa externa comum) para esses países.

Em relação à Comunidade Andina, existe o Acordo de Complementação Econômica firmado entre a Comunidade Andina e o Mercosur em 6 de dezembro de 2002.

Em novembro de 2005, o Congresso Colombiano ratificou um Tratado de Livre Comércio (TLC) com o Mercosul. O tratado permite à Colômbia implantar mecanismos de proteção à sua agricultura, além do acesso de seus produtos ao Mercosul, aumentando seu peso político nas negociações de livre comércio que esse país vem mantendo com os estados Unidos.

Em 30 de dezembro de 2005 o Presidente Colombiano, firmou a Lei 1.000, para a criação de uma zona de livre comércio entre a Comunidade Andina e o Mercosul. Com esse novo acordo, os produtos colombianos conseguiram um acesso preferencial ao Mercosul, vez que a Colômbia obteve a oportunidade de importar matérias primas e bens de capital do Mercosul a custos mais baixos, nos termos estabelecidos pelo Tratado. Fonte: Site do Ministério da Fazenda, fevereiro de 2007.

59

60

BIBLIOGRAFIA:

⦁ Nogueira da Silva, Paulo Napoleão: A Chefia do estado, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais.

⦁ Nogueira da Silva, Paulo Napoleão, in Revista de Derecho del Mercosur, ano 3 nº.1, Febrero de 1999. La Ley, Buenos Aires.

⦁ Morrison, Samuel Eliot, “The European Discovery of America –Southern Voyages – 1492-1516”, Oxford University Press, 1974, New York, Pgs. 234 e 275.

⦁ Calmon, Pedro: “O Rei Filósofo”, 1ª Edição, Cia. Editora Nacional. São Paulo.

⦁ Calogeras, Pandiá: Da Regência à Queda de Rosas, 8º volume da série “Relações Exteriores do Brasil”, 5ª série da Biblioteca Pedagógica Brasileira.

⦁ Viana, Oliveira, Populações Meridionais do Brasil, vol.2 – Edição Paz e Terra, Rio de janeiro, 1974.

⦁ Soares, Teixeira: Diplomacia do Império no Rio da Prata, Rio, 1955, editora Civilização Brasileira.

⦁ A.R. Midón, Mario: Derecho de la Integración – Aspectos Institucionales Del Mercosur, Rubinzal-Culzoni Editores, Buenos Aires.

⦁ Parra Perez, Carraciolo: Historia de la Primera Republica de Venezuela. Caracas -1992- Biblioteca Ayacucho.

⦁ Prado, Eduardo: A Ilusão Americana. Editora Brasiliense, São Paulo, 1957. (A Primeira edição de 1894 foi confiscada por ordem do governo brasileiro).

⦁ Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Estado de Direito e Constituição, São Paulo, Saraiva, 2ª Edição, 1999.

⦁ Mercosul - Legislação e Textos Básicos, 4ª edição, Brasília, 2005.

61

Gráfica do Senado Federal, Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul – Ministério das Relações Exteriores.

62