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Mensagem e Os Lusíadas ² Umdiálogo entre dois poetas
Retrato de Camõesconsiderado por
alguns comobastante fiel e
assinado «Fernando
Gomez fêz, em L.ª»
Última fotografia de FernandoPessoa. Tirada por Augusto
Ferreira Gomes
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
Pontos da Apresentação
1. Fernando Pessoa1.1. Fernando Pessoa e os outr os poetas;1.2. A poesia e a identidade nacional.
2. Mensagem (1934) e Os Lusíadas (1572)2.1.O ´desenhoµ
A ¶arquitectura perfeita· de Mensagem e a estrutura épica sui generis d·Os Lusíadas;
2.2. A visão da História A ¶predestinação· no poema de Pessoa e o ¶alto valor lusitano· em Camões;O dado matricial da cultura grega;Os diferentes critérios de selecção das figuras histórias em Pessoa e em Camões; D. Sebastião ² objecto de desejo em Pessoa / razão de esperança em Camões.2.3.O amorO amor sonhado em Mensagem e o amor vivido (e poeticamente celebrado) n·Os Lusíadas ;2.4.O marO mar sem fim de Pessoa e o mar ¶experimentado· de Camões;OMostrengo e o Adamastor ² figuras do medo.2.5.O Império (im)possívelO imperialismo sem matéria sonhado por Pessoa e o império cantado em Camões; ´Que farei com esta espada?µ ² o misto de tristeza e esperança no final dos dois poemas.3. Notas finais
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Mensagem e Os Lusíadas ² Um diálogo entre dois poetas
1.
Fernando Pessoa (1885-1935)
Retrat o de Fernand o Pess oa ,
por Almada Negreiros (1954)
Caricatura de Fernand o Pess oa ,
por David Levin (1972)
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1.1. Fernando Pessoa e os outr os poetas
Fernando Pessoa e a poesia como ´passagem a limpoµ ou reescrita
Passar a limpo a MatériaRepor no seu lugar as cousas que os homens desarrumaramPor não perceberem para que serviamEndireitar, como uma boa dona de casa da Realidade,
As cortinas nas janelas da Sensação
E os capachos às portas da Percepção Varrer os quartos da observaçãoE limpar o pó das ideias simplesEis a minha vida, verso a verso.
Alberto Caeiro. P oemas Inc onjunt os (Alberto Caeiro. P oesia . Ed. de Richard Zenith e Fernando Cabral Martins.
Lisboa, Assírio & Alvim, 2.ª ed. corrigida, 2004, p. 102)
Mensagem é, em certo sentido, uma ¶passagem a limpo·, para uma versão moderna,do poema Os Lusíadas , de Luís de Camões.
Século XIX: época de mitologização da figura de Camões.
A publicação do poema Camões (1825), de Almeida Garrett,
marca o início deste processo de mitologização.
Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
1.1. Fernando Pessoa e os outr os poetas (continuação)
Mensagem (1934) como ¶resposta· a Camões
A criação poética em Pessoa que tem por base um mecanismo de disputa
com outras obras, uma imaginaçã o
ciumenta (Eduardo Lourenço)
Para Eduardo Lourenço,
«toda a obra de Pessoa é uma disputa concreta com outra obra sobre a qual se apoia para a
transcender ou lhe imprimir um desvio que inteiramente a desloca, na forma e na substância,
do seu lugar matricial.»(Eduardo Lourenço, ´Camões e Pessoaµ, in revista Br otéria ,
Lisboa, n.º 7-9, 1980, Julho-Agosto, p. 59).
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
1.1. Fernando Pessoa e os outr os poetas (continuação) Em 1912, com vinte e quatro anos, Pessoa escreve na revista Á guia:
A nossa poesia caminha para o seu auge: o grande Poeta proximamente vindouro, queencarnará esse auge, realizará o máximo equilíbrio da subjectividade e da objectividade.[...] Supra-Camões lhe chamamos, e lhe chamaremos, ainda que a comparação implícita,por muito que pareça favorecer, antes amesquinhe o seu génio, que será, não de grau
superior, mas mesmo de ordem superior ao do nosso ainda-primeiro poeta.Fernando Pessoa. «A Nova Poesia Portuguesa»
( A Á guia , n.os 4, 5, 9, 11 e 12, 2.ª série, Porto, 1912), in Fernando Pessoa.Text os de Crítica e de Intervençã o. Lisboa: Edições Ática, 1993
[« ] só a escolha deste Poeta [i.e. Camões] como elemento de comparação coloca-o [i.e. a Pessoa] no ponto mais alto em relação a todos os que o precederam eseguiram, até ao momento da enunciação.
C. Berardinelli. ́ Os Lusíadas e Mensagem : um jogo intertextualµ, Estud os Cam onian os .Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2000.
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Mensagem e Os Lusíadas
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1.2. A poesia e a identidade nacional
Toda a obra de Pessoa é uma tentativa de superar Camões.
Mas é com Mensagem (1934) que a ¶relação angustiada· relativamente ao poeta d·Os Lusíadas se torna
particularmente visível. Mensagem é uma resposta(leitura) ́ modernaµ ao(do) poema de Camões.
± Resposta que tem consequências ao nível da ́ Portugalidadeµ,do que define Portugal e os Portugueses.
Pessoa propõe uma nova forma de pensar o que somos como
Portugueses e o que poderá vir a ser Portugal
(´Portugalµ foi de facto o primeiro título pensado para a obra Mensagem ).
Ou seja: aquilo a que chamamos ́ identidade nacionalµ é reavaliado em Mensagem .
Segunda metade do século XIX ² é o momento em que os escritores
reflectem seriamente sobre o que é Portugal?
(cf. Eduardo Lourenço, ́ Da literatura como interpretação de Portugalµ (1975).
O Labirint o
da Saudade . Lisboa: Gradiva, 2001 [1.ª ed. 1978]
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
1.2. A poesia e a identidade nacional
Para Pessoa, o artista ² e o poeta em especial ² tem um papel muito importante na vida cultural de uma
nação. É ao poeta que cabe a criação de mit os .
Em Páginas Íntimas e de Aut o- Interpretaçã o, encontramos um fragmento onde se lê:
«Desejo ser um criador de mitos, que é o mistério mais
alto que pode obrar alguém da humanidade».
E na resposta ao inquérito P ortugal Vast o Impéri o (1926, 1934) Pessoa afirma claramente:
«Há só uma espécie de propaganda com que se pode levantar a
moral de uma nação ² a construção ou renovação e a difusão
consequente e multímoda de um grande mito nacional. [« ] Temos,
felizmente, o mito sebastianista, com raízes profundas no passado e na alma portuguesa».
O mito é para Pessoa a ¶semente· de toda a possibilidade, o poder de fecundar a realidade.
A regeneração da Pátria depende da existência de um mito nacional -
ideias que constituem a base filosófica de Mensagem , a ¶equação de que resulta a obra·
(Fernando Cabral Martins, prefácio à edição de Mensagem , Assírio & Alvim, 1997)
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.
Mensagem (1934) e Os Lusíadas (1572)
Capas das primeiras edições
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
Da leitura d·Os Lusíadas ressalta [ ] a busca de uma solução real para
reverter a situação da pátria; dos poemas de Mensagem , ressai, intensificada nopoema final, ´Nevoeiroµ, a proposta de uma solução não mais de dimensãohumana, mas transcendente.
C. Berardinelli, ´Os Lusíadas e Mensagem : um jogo intertextualµ, 2000
A comparação entre Os Lusíadas e a Mensagem impõe-se pelo próprio facto deesta ser, a alguns séculos de distância e num tempo de decadência, o novocanto da pátria portuguesa.
Silvina Rodrigues Lopes, ´Apresentação Críticaµ,Mensagem de Fernand o Pess oa , Lisboa: Editorial Comunicação, 1986
Dois excertos para ter em mente...
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.
Mensagem (1934) e Os Lusíadas (1572)
2.1.
O Desenho
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ Mensagem (1934)
«[« ] uma das obras mais perfeitamente realizadas da Literatura Portuguesa do século XX [« ]»
(C. Berardinelli. ´Mensagem: Poemas in Fieriµ, Fernand o Pess oa: outra vez te revej o. Rio de Janeiro: Lacerda, 2004 )
Estamos perante uma «arquitectura pensada e harmónica, que torna este livro umaconstelação de poemas.»
(Fernando Cabral Martins, 1997)
Abrindo com uma proposição latina ( Benedictus Dominus Deus N oster qui dedit n obis signum ),
a obra está dividida em três partes:
Primeira Parte ² Brasão
Segunda Parte ² Mar Português
Terceira Parte ² O Encoberto
Proposição queaponta, desde logo,
para o carácterevangélico da obra
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² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação) Primeira Parte ² Brasão
- Tempo1 de preparaçã o(apresentação de figuras mitológicas e históricas que ¶criaram· Portugal)
- Estabelecimento da essência (nobreza) de Portugal
Esta essência criou obra no passado (Mar Português)e pode criar no futuro, no porvir ( O Encoberto)
Tempo da preparação para a construção do Império;a primeira parte da obra apresenta a «caminhada da terra
para o mar» como missão confiada a Portugal (C. Berardinelli, 2004)¶Bellum sine Bell o· (trd. ¶a guerra sem guerrear·)
A epígrafe latina desta primeira parte avisa-nos que a nova Distância não se alcança pela força±
Mensagem é um poema de fraternidade e de paz(simbolismo rosa-cruciano e templário)
1 ² A ideia de uma divisão de Mensagem em tempos é sugerida em C. Berardinelli, 2004.
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² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação)Primeira Parte ² Brasão
Brasão real português
utilizado no século XV
I ² Os Campos
Primeiro:O dos Castelos
Segundo:O das Quinas
II ² Os Castelos
Primeiro: Ulisses
Segundo: Viriato
Terceiro: O Conde D. Henrique
Quarto: D. Tareja
Quinto: D. Afonso HenriquesSexto: D. Dinis
Sétimo (I): D. João o Primeiro
Sétimo (II): D. Filipa de Lencastre
III ² As Quinas
Primeira: D. Duarte, Rei de Portugal
Segunda: D. Fernando, Infante de Portugal
Terceira: D. Pedro, Regente de PortugalQuarta: D. João, Infante de Portugal
Quinta: D. Sebastião, Rei de Portugal
IV ² A Coroa
Nun·Álvares
V ² O Timbre
A cabeça do Grifo: O Infante D. Henrique
Uma asa do Grifo: D. João o Segundo
A outra asa do Grifo: Afonso de Albuquerque
19 poemas
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² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação)Primeira Parte ² Brasão
Brasão real português
utilizado no século XV
I ² Os Campos
(dois poemas)
II ² Os Castelos
Sete poemas + um
III ² As Quinas
Cinco poemas
IV ² A Coroa
Um poema
V ² O Timbre
Cabeça (um poema)
Asas (dois poemas)
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2.1. O ´desenhoµ (continuação)Segunda Parte ² Mar Português
Tempo de realização e da queda;
tempo em que se conquista um Império que depois se perde.±
É preciso buscar uma nova Distância, um outro mar ( P ossessi o Maris« ).12 Poemas
I.O Infante
II. Horizonte
III. Padrão
IV.O Mostrengo
V. Epitáfio de Bartolomeu Dias
VI.Os Colombos
VII.Ocidente
VIII. Fernão de Magalhães
IX. Ascensão de Vasco da Gama
X. Mar Português
XI. A Última Nau
XII. Prece
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² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação) Terceira Parte ² O Encoberto
Tempo de espera;
Tempo de esperança na realização de um projecto indefinível, transcendente,
para lá do espaço e do tempo ( Pax in Excelsis ), do que é dado à razão humana conhecer.
Terceira Parte/ 13 Poemas / Três Partes(( Ideia de unidade contida na estrutura do poema)
I. Os Símbolos
Primeiro: D. SebastiãoSegundo:O Quinto Império
Terceiro:O DesejadoQuarto: As Ilhas Afortunadas
Quinto:O Encoberto
II. Os AvisosPrimeiro:O Bandarra
Segundo: António Vieira Terceiro: (Screvo meu livro à
beira-mágoa)
III. Os Tempos
Primeiro: NoiteSegundo: Tormenta
Terceiro: CalmaQuarto: AntemanhãQuinto: Nevoeiro.
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação)Os Lusíadas (1572)
Ouvi, que não vereis com vãs façanhas,
Fantásticas, fingidas, mentirosas,
Louvar os vossos, como nas estranhas
Musas, de engrandecer-se desejosas.
Os Lusíadas (I, 11)
A obra de Camões, publicada 75 anos depois da chegada de Vasco da Gama à Índia,apresenta uma estrutura não menos rigorosa que a de Mensagem . Assim, temos:
Estrutura externa:
Dez CantosOitavas (1102 estrofes)
10 sílabas métricas
Verso heróico
Estrutura interna:
ProposiçãoInvocação
Dedicatória
Narração ¶in medias res ·
Camões segueregras do
género épico
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (continuação)
Os Lusíadas (1572)
A obra desenvolve-se em quatro planos fundamentais que se entrecruzam na narrativa. Sãoeles: PLANO DA VIAGEM (viagem de Vasco da Gama à Índia); PLANO DOS DEUSES (que intervêm na viagem dos Portugueses); PLANO DA HISTÓRIA DE PORTUGAL (encaixado no plano da viagem); PLANO DAS CONSIDERAÇÕES DO POETA (com reflexões filosóficas e morais,
lamentações, críticas ou exortações).
Sobre a unidade do projecto camoniano, escreve António José Saraiva:
Seguindo esse modelo [i.e. o de Virgílio], h á uma acçã o c om a qual se ligam t od os os ac onteciment os passad os e futur os : a viagem acidentada de um herói guerreiro e navegante, e sua chegada àterra onde funda um novo reino; o herói é protegido por certos deuses e perseguido por
outros, de modo que aquela acção se desenrola conjuntamente no plano humano e noplano divino. A narrativa começa no meio da viagem (´in medias resµ), os acontecimentosanteriores são relatados por discursos dos protagonistas humanos ou por obras de arteplástica evocativa; os acontecimentos futuros são anunciados por deuses ou outraspersonagens dotadas do dom da profecia.
Saraiva, Introdução a Os Lusíadas (1978, 1999), Porto: Livraria Figueirinhas, itálicos meus
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.1. O ´desenhoµ (conclusão) Mensagem e Os Lusíadas
Sobre a classificação dos dois poemas:
Apontando as preocupações arquitectónicas comuns às duas obras, omesmo autor [i.e. Jacinto do Prado Coelho] ressalta o carácter mais abstracto
e interpretativo de Mensagem em relação a Os Lusíadas . A dominante mística é,no poema de Pessoa, solidária da desvalorização da narração e da descrição,características da epopeia, dando relevo a um pensamento unificador,ostensivo na proliferação de símbolos em detrimento da acção e conferindoao poema uma dimensão mais emblemática do que épica.
Silvina R. Lopes, ´Apresentação Críticaµ,Mensagem de Fernand o Pess oa , 1986
Enfim, dois poemas épicos ² ou épico-líricos? ² ´de espécie complicadaµ,diria Pessoa, e digo eu: como convinha a Portugal.
C. Berardinelli, ´Os Lusíadas e Mensagem : um jogo intertextualµ, 2000
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Mensagem (1934) e Os Lusíadas (1572)
2.2.
A visão da História
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.2. A visão da História Mensagem e Os Lusíadas ²
Poemas sobre Portugal e a n ossa história (dimensão épica)
( Os dois poemas estabelecem um laço entre o geográfico e ohistórico (a posição geográfica de Portugal ´apontaµ o caminho
para o mar e para o Ocidente, para a aventura)
Tanto Pessoa como Camões seleccionam, a seu jeito, a história, destacando asfiguras que mais lhes interessam para o projecto global da sua obra.
Nos dois poemas, é sublinhado o dado matricial da cultura grega (Ulisses écolocado ao lado de figuras históricas);
No tratamento dos reis de Portugal, encontramos diferenças importantes
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² Um diálogo entre dois poetas
2.2. A visão da História (continuação) Em Mensagem , Pessoa selecciona ´figuras de pensamentoµ, de contemplação ²
Figuras dotadas de uma capacidade visionária singular
(ex. D. Dinis, o ¶plantador de naus a haver·)
N·Os Lusíadas , Camões (ou os seus narrad ores ), selecciona reis que se destacaram pelasua ´feição activaµ ²
Figuras que se destacaram pela sua acção bélica(ex. D. Afonso III e D. Afonso IV)
Pessoa valoriza a dimensão contemplativa;Camões valoriza a actividade real, combativa.
Ambos os poetas destacam a figura de Nun·Álvares Pereira:ele é a C or oa no poema de Pessoa, e o ¶fortíssimo leão· n·Os Lusíadas .
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² Um diálogo entre dois poetas
2.2. A visão da História (continuação) Em Mensagem , a história de Portugal é pensada à luz de um plano de divino. O quesomos resulta de um acto de c om - sagraçã o, de algo que é predito por Deus:
O h omem e a h ora sã o um só Quand o Deus faz e a h istória é feita .
O mais é carne, cuj o
pó A terra espreita .Poema ´D. João o Primeiroµ (1os quatro versos)
N·Os Lusíadas , a intervenção divina aparece como c omplement o do valor dosPortugueses, valor supremo capaz de escapar à lei da morte.
E aqueles que por obras valer osas Se vã o da lei da M orte libertand o; Cantand o espal h arei por t oda a parte,
Se a tant o me ajudar o engen h o e a arte .Os Lusíadas (I, 1)
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.2. A visão da História (conclusão) D. Sebastião, Rei de Portugal
À distância de quase quatro séculos, Pessoa recria a figura/mito de D. Sebastião de modo aconciliar a ideia de que o Rei pôs a pátria em perigo com o enaltecimento da sua loucura.
Em Mensagem , D. Sebastião é o símbolo da loucura positiva, da sede de
infinito que caracteriza o ser humano que pretende ultrapassar a sua própria natureza.
¶Ser homem é ser descontente· (poema ´O Quinto Impérioµ)
N·Os Lusíadas , D. Sebastião é o ´herói épico em potênciaµ (C. Berardinelli, 2000), uma vez
que o sonho de conquistar o Norte de África ainda povoa as mentes da época. Na sua
dedicatória, Camões incentiva o rei a novas empresas bélicas
Fazei, Senhor, que nunca os admirados Alemães, Galos, Ítalos e Ingleses,
Possam dizer que são pera mandados,
Mais que pera mandar, os Portugueses
Os Lusíadas (X, 152)
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2.3.
O Amor
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2.3. O Amor
Em Mensagem , Pessoa não inclui um dos ´mitosµ que Camões ajudou a criar: o mito deInês de Castro (só duas mulheres têm lugar no poema de Pessoa: D. Tareja e D. Filipa deLencastre).
Em Pessoa, o amor e o sentimento são transpostos para uma
esfera transcendente ² o desejo, em Mensagem, é o desejo de um mit o.
Não encontramos em Mensagem o tratamento poético do amor entre um homem e umamulher, e muito menos um tratamento da sensualidade, como encontramos, num nívelsublime, em Camões:
Num vale amen o , que os outeir os fende,
Vin h am as claras águas ajuntar - se,Onde a mesa fazem, que se estende Tã o bela quant o pode imaginar - se .
Os Lusíadas (IX, 55)
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2.4.
OMar
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2.4. O Mar
Sobre o ´Marµ em Pessoa e em Camões, Eduardo Lourenço caracteriza destemodo aquilo que separa os dois poetas:Evocando o poema Os Lusíadas , José Régio escreveu que «o mar entrou nele e coube». Podia caber em
oitava rima esse mar nunca dantes navegado que nos sagrou como nautas modernos porque era um
mar ao mesmo tempo vivido e revisitado graças à intercessão poética de Virgílio. O mar de Pessoa,
menos vivido que o de Camões e plural na sua essência de abismo da natureza e do espírito, inundou,como nem antes nem depois acontecera na odisseia pouco marítima do imaginário português, toda a
poesia do autor de Mensagem , mas não coube nela.
Eduardo Lourenço, ´Os Mares de Pessoaµ. O Lugar d o Anj o. Ensai os Pess oan os . Lisboa: Gradiva, 2004
O mar n·Os Lusíadas é possibilidade de realização, coisa presente e exterior; em Mensagem , significa promessa e desafio, o Horizonte por buscar.
Como o mar de Álvaro de Campos, o mar de Mensagem é feito da
«Distância Absoluta», do «Puro longe» ( Ode Marítima )
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2.4. OM
ar
Sobre os perigos do mar, Pessoa e Camões imaginam duas figuras querepresentam a mesma essência perigosa de toda a aventura, do desejo de partir
Mostrengo ( Mensagem ) ²
figura ameaçadora e agressiva, sem traços de humanidade
Adamastor ( Os Lusíadas ) ²
Monstro dotado da capacidade de amar
É a palavra (a capacidade de Vasco da Gama falar com o monstro)
e o amor que nos libertam do Adamastor.
Ao recordar o desgosto de amor que lhe causara a bela Tétis,
o Adamastor desaparece e dá passagem para o Oriente.
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Mensagem (1934) e Os Lusíadas (1572)
2.5.
O Império (Im)possível
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2.5. OImpério (im)possível
N·Os Lusíadas , o poeta prevê o definhamento da pátria, a decadência do Império. Mas,ao mesmo tempo, aponta a possibilidade um renascimento, a que a acção de D. Sebastião
deveria dar início.
A esperança de Camões é também a de um poeta ² a de um homem que deseja voltar a cantar os ¶feitos valerosos· de Portugal.
Para Camões, a vitalidade da poesia não se desliga da vida da Pátria.
Em Pessoa, a ideia de um novo Império ¶feito de Matéria· ² um império terreno aalcançar pela acção bélica dos homens ² é posta de parte.
Num conjunto de textos reunidos sob o nome S obre P ortugal .
Intr oduçã o a o Pr oblema Naci onal (1978), encontramos um texto onde Pessoa diz:
´Todo o Império que não é baseado no Império Espiritual
é uma Morte de pé, um cadáver mandado.µ
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2.5. OI
mpério (I
m)possível
O elemento lírico em Mensagem e n·Os Lusíadas evidencia-se no pendor subjectivo dos
dois poemas ² i.e. na importância da voz do poeta. Essa voz faz-se ouvir, no caso da obrade Camões , em momentos de auto-reflexão (que não existem em Mensagem ) e na crítica à
gente da Pátria, à ´gente surda e endurecidaµ (X, 145).
De facto, é num tom marcadamente crítico que Pessoa e Camões
terminam os seus poemas Diál o g o na despedida
Camões:
N o g ost o da c obiça e na rudeza
Dhü a austera, apagada e vil tristeza .
«
Pessoa:
«
Este fulg or baç o da Terra
Que é P ortugal a entristecer
«.
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
2.5. OI
mpério(I
m)possível
O tom de tristeza (tom de requiem ) comum ao final dos dois poemas mistura-se com uma
leve esperança de renovação. Vejamos: Verso final de Mensagem : ´É a Hora!µ
(seguido de Valete Fratres , uma saudação mística associada à fraternidade Rosa-Cruz) Três versos d·Os Lusíadas:
Fic o que em t od o o mund o de vós cante,De s orte que Alexandre em vós se veja,
Sem à dita de Aquiles ter enveja .
Duas soluções diferentes
Os Lusíadas Solução real
Mensagem Renovação espiritual, literáriaou poética ² império imaterial
(onde não são ¶precisas colónias·)
´ O mit o é o nada que é tud oµ
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
3. Mensagem e Os Lusíadas
² Notas Finais
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Mensagem e Os Lusíadas
² Um diálogo entre dois poetas
Semelhanças essenciais:
o desej o de superar e a c onsciência d o val or da poesia
É comum a Pessoa e a Camões o desejo de superar ²
Camões quer superar os ¶antigos· substituindo a ficção pela verdade;
Pessoa quer superar Camões e conferir novo ânimo à Pátria
É comum a Pessoa e a Camões a afirmação do valor supremo da poesia ²
Camões sabe que só o canto dos poetas
transforma os homens em seres imortais
(só o poeta liberta da lei do Esquecimento;
por isso, o rei D. Sebastião deve ¶baixar-se· e contemplar a ¶pintura· de Camões );
Pessoa sabe que só a criação de mitos (tarefa do poeta)
assegura a vitalidade da Pátria, porque a poesia é o Império vivo.
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