melanie

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Uma história de amor e superação. Melanie

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Page 1: Melanie

UM MICROCOSMO

DENTRO

DE MIM

Maxwelll dos Santos

Uma história de amor e

superação.

Melanie

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Melanie

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MelanieMaxwell dos Santos

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Copyleft 2016 Maxwell dos SantosAlguns direitos reservados.

(27) 99943-3585(27)3100-8333

[email protected]

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP),Ficha Catalográfca feita pelo autor

Índices para catálogo sistemático:1. Literatura infanto-juvenil 028.52. Literatura juvenil 028.5

S237v Santos, Maxwell dos, 1986–

Melanie[recurso eletrônico] / Maxwell dos Santos. – Vitória:Do Autor, 2017.

Modo de acesso: World Wide Web

<htp://maxwelldossantos.com.br>

1. Literatura infantojuvenil. I. Título.

CDD 028.5

CDU 087.5

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A regra da igualdade não consiste senão emquinhoar desigualmente aos desiguais, na medidaem que se desigualam. Nesta desigualdade social,

proporcionada à desigualdade natural, é que se achaa verdadeira lei da igualdade… Tratar com

desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade,seria desigualdade flagrante, e não igualdade real.

Rui Barbosa(1849-1923)

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Para Fernanda Nunes Fernandes.

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SumárioCapítulo 1 | A gênese de um sonho.......................10Capítulo 2 | Eu passei no PUPT.............................19Capítulo 3 | O primeiro dia de aula.......................29Capítulo 4 | A vida é ligeira....................................35Capítulo 5 | Sorte grande.......................................49Capítulo 6 | Entre amigas......................................57Capítulo 7 | No Lamarck........................................62Capítulo 8 | No sítio dos avós................................70Capítulo 9 | Quarenta versus 60............................78Capítulo 10 | O vestibular tá aí..............................90Capítulo 11 | A hora da verdade.............................97Autor e Obra.........................................................103

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CAPÍTULO 1 | A GÊNESE DE UM SONHO

O GRANDE SONHO DA VIDA de Melanie era ser médica,mas não tinha condições de pagar a faculdade de Me-dicina, tampouco pagar um cursinho para que pudes-se ajudá-la alcançar esta meta.

Até novembro de 2006, ela estagiava de manhã naclínica Femina e fazia o 3° ano do Ensino Médio à tar-de, na EEEM Fernando Duarte Rabelo. Após o térmi-no do contrato, trabalhou com contrato temporáriona loja de calçados Cometa. Ela queria juntar dinhei-ro para pagar um cursinho.

Para isso, abriu uma poupança na Caixa. Mesesdepois, após tirar o extrato no caixa eletrônico, viuque o valor acumulado só daria para pagar as aposti-las, o uniforme e o material. Pensou em voltar a tra-balhar para pagar o cursinho, mas desistiu, porque ocurso de Medicina é o mais concorrido da UFES (Uni-versidade Federal do Espírito Santo), com relaçãocandidato/vaga superior a 40 e para passar, teria quese dedicar integralmente e se trabalhasse, não teria

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tempo para estudar.Melanie morava uma casa de alvenaria, perfil clas-

se média para baixa, de três quartos, sala, cozinha,banheiro, área de serviço e varanda, localizada naAvenida Hermínio Blackman, no Bairro da Penha, emfrente à EMEF Zilda Andrade. O imóvel era de sua fa-mília.

Quando tudo parecia perdido, soube por uma ami-ga a respeito do último dia das inscrições para o pro-cesso seletivo do Projeto Universidade para Todos1,mantido pela FCAA que deveriam ser feitas na agên-cia da Caixa da UFES.

Após tomar um demorado banho de meia hora, le-var mais uns dez minutos para se arrumar, maisquinze para procurar seus documentos e pô-los nabolsa, Melanie estava pronta para ir ao banco fazer ainscrição. Antes de ir, aproximou-se de Juninho, seuirmão mais novo, branco, cabelo liso, 12 anos, porta-dor da Síndrome de Down e falou com ele:

– Juninho, meu amor, eu vou ao banco resolver um

1 Projeto social surgido em 5 de agosto de 1996, a partir da inicia-tiva de três estudantes da UFES (José Vasconcelos Maria e os ir-mãos Rodrigo e Rodrigo Trazzi), que visava preparar alunos hu-mildes e de escola pública ao vestibular da Universidade. Eramantido pela FCAA(Fundação Ceciliano Abel de Almeida) até oencerramento das atividades da entidade em 2014.

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problema e volto mais tarde, tá? Um beijo.– Um beijo, Mel – disse Juninho, dando um beijo

no rosto de Melanie.Melanie seguiu para o ponto de ônibus, na Aveni-

da Maruípe. Fazia um calor escaldante naquele dia 07de fevereiro de 2007. O ônibus 184(Jardim da Penha-Rodoviária) chegou e ela entrou nele.

O trânsito estava muito lento, em virtude de umacidente automobilístico, envolvendo um caminhãoda Brahma e uma picape Dodge RAM, ocorrido nasproximidades do campo do Caxias Esporte Clube. Jápassava de 13h30min e o ônibus ainda estava no localdo acidente, deixando a jovem angustiada.

Rapidamente, chegaram as viaturas da GuardaMunicipal e a ambulância do Corpo de Bombeirospara socorrer as vítimas do horrendo, porém cotidia-no acidente de trânsito. Por sorte, os ocupantes dosveículos só tiveram ferimentos leves e em vinte minu-tos, os agentes da Guarda Municipal normalizaram ofluxo de trânsito.

– Graças a Deus! Eu vou conseguir chegar a tempoao banco – disse Melanie.

No coletivo, embarcou Márcio, um jovem que ven-dia doces dentro do ônibus. Ele falou:

– Boa tarde, senhores passageiros. Sou soropositi-

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vo e por isso, não consigo emprego em lugar ne-nhum. Eu podia tá matando, tá roubando, mas tôaqui trabalhando honestamente. Tô vendendo setepaçocas por um real. Também tenho cinco jujubas,por 1 real. Quem puder me ajudar, eu agradeço.

Vários passageiros se comoveram com a históriado vendedor, inclusive Melanie, comprando-lhe osdoces.

– Eu sei que é pouco, mas é o que eu posso ajudar –respondeu Melanie, olhando para o vendedor comum sorriso, acariciando-lhe as mãos e dando o di-nheiro.

– Obrigado. Você é um anjo – respondeu Márcio,admirado e recolhendo o dinheiro.

O ônibus chegou ao ponto da UFES. Melanie atra-vessou a Avenida Fernando Ferrari para entrar nocampus e ir fazer a inscrição da prova do PUPT, naagência da Caixa.

Ela se espantou com a quantidade de pessoas den-tro da agência e fora dela que vieram pagar a taxa deinscrição, preencher a ficha de inscrição e entregá-lano posto de atendimento próximo à agência. Na fila,ela encontrou um ex-colega de escola que não via hámuito e também estava na fila para a inscrição.

Era Rodrigo, 18 anos, negro, cabelo black power,

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terminando o 3° ano do Ensino Médio no CEFET-ES2

e pretendia tentar Engenharia Elétrica. Como Mela-nie, ele não tinha condições de pagar um cursinho epor isso, queria uma vaga no PUPT. Entediada comaquela fila, Melanie começou a puxar conversa comRodrigo:

– Rodrigo, quanto tempo!– Nossa, Melanie. Eu também não te vejo há uma

cara! O que tem feito da vida?– Por enquanto, tô sem fazer nada. Vim aqui pra

fazer a inscrição do Projeto. Quero tentar Medicina,mas tô sem grana pra pagar um cursinho e por isso,vejo no PUPT uma oportunidade de realizar meu so-nho.

– Eu quero fazer Engenharia Elétrica. Meus paisnão têm condições de arcar com um cursinho e eu,muito menos. Falaram pra mim que o Projeto eramuito bom e decidi disputar uma vaga.

– E sua mãe, já tá melhor?– Ela morreu. Quando a gente achava que ela tava

curada, o câncer voltou devastador. Deu metástase, seespalhou pros outros órgãos e ela não resistiu.

– Meus sentimentos, que Deus a tenha num bom

2 Atual Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia doEspírito Santo.

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lugar. Há seis meses, papai também morreu de cân-cer no intestino e ainda sofro com isso. Toda noite, euchoro de saudade dele. Ele foi o melhor pai do mun-do.

Rodrigo começou a chorar e disse:– A minha angústia é a mesma. Penso em mamãe

em tudo o que eu faço. Vaso ruim não quebra mesmo.Por que o destino tem que ser cruel com as pessoasque a gente mais ama?

– É o que me pergunto também. Não fica assim,querido. Um dia, você vai superar essa dor – respon-deu Melanie, abraçando e afagando Rodrigo.

Chegou a vez de Melanie entregar a ficha de ins-crição no posto de atendimento do PUPT. Para ela, foium alívio sair da fila, que estava enorme. Depois, che-gou a vez de Rodrigo entregar sua ficha. Antes de sairdali, perguntou à Melanie:

– Mel, me passa seu MSN e Orkut.– Passo sim, Rodrigo. Só preciso de um papel –

respondeu Melanie.– Aqui tá o papel – falou Rodrigo entregando o pa-

pel.– Rodrigo, foi um prazer te ver, mas tenho que ir.

Um beijo – disse Melanie, abraçando e beijando oamigo.

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– Um beijo, Melanie – respondeu Rodrigo, retribu-indo o gesto da amiga.

Rodrigo, fora da agência, pensou em Melanie. Sur-giram em seu pensamento imagens de Melanie emflashback do tempo da escola, com destaque ao bailede formatura da 8ª série, onde ele foi par de Melanie.Ele dise:

– Desde a época de escola, tenho uma queda porMelanie, mas sou tímido demais pra mandar a realpra ela. Uma menina linda por dentro e por fora, comolhar que encanta a qualquer pessoa, tem a voz maisdoce que eu já escutei, tão educada e meiga! Estásempre de bom humor, disposta a ajudar às pessoas!Ela abria mão das férias pra ajudar os alunos que fica-vam de NOA. Por que, cargas d'água, os carinhas pa-gam pau pra essas piriguetes, por fora, uma bela vio-la, mas por dentro, pão bolorento, têm forma, masnão têm conteúdo. Mas fazer o quê? Cada um tem oseu gosto e eu gosto muito da Mel.

Desde a época de escola, Rodrigo tinha uma quedapor Melanie, moça de 1,53 m, branca, olhos verdes elongos cabelos castanhos, uma verdadeira bonequi-nha que encantava os meninos e homens barbados doBairro da Penha com sua doçura e graça. Pretenden-tes não faltavam. Era Rodrigo e as torcidas dos Qua-

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tro Grandes do Rio (Flamengo, Vasco, Botafogo e Flu-minense)3. Porém, Rodrigo era tímido demais para sedeclarar àquela menina.

Melanie, após ter chegado da agência da Caixa, to-mou banho e foi para o quarto, onde conversava comseu namorado Bebeto, branco, 21 anos, cabelos pretose estatura mediana. Ela estava de robe e ele, de cami-sa e calça da Cyclone, sentado na cama dela. Bebetofez um convite:

– Melanie, que tal a gente ir à sorveteria Kiabai to-mar um sorvete?

– Hoje não, Bebeto. Tô com uma dor de cabeça.Fica pra outro dia.

– Pára de show, Melanie! É só tomar um Paraceta-mol. É tiro e queda.

– Ô meu amor, hoje tô mal mesmo. Na geladeira,tem um pote de sorvete. Pode pegar ele e as colherespra gente comer aqui.

– Tudo bem se você quer assim.Bebeto pegou o pote de sorvete na geladeira e as

colheres no armário. Passou um carro na rua, com

3 Coloquei esta hipérbole para demonstrar o quanto Melanie eradesejada pelos homens daquele bairro e para criticar o provincia-nismo do capixaba, que geralmente não valoriza as coisas daterra.

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um som altíssimo, tocando Mulher de Fases, do Rai-mundos.

“Essa música fala o que é a Melanie: complicada eperfetinha, que vive fazendo charme pra irritar a gen-te” – pensou.

Bebeto voltou da cozinha, com o pote de sorvete eas colheres. Sentou na cama de Melanie e abriu opote. Entre uma colherada e outra, eles se beijaram. Oclima esquentou e Bebeto passou a mão nas coxas deMelanie, que cortou na hora e disse:

– Que é isso, Bebeto? Já falei pra você que só voutransar depois do casamento. Quem ama, espera, Be-beto.

– Droga, Melanie! Há seis meses que a gente na-mora e ainda tá nesse zero a zero. Pra mim já deu.Nosso namoro termina por aqui – gritou Bebeto.

– Bebeto, por favor, não vá – implorou Melanie.– Adeus, Melanie – reiterou Bebeto, furioso, baten-

do a porta.Melanie chorava sem parar.

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CAPÍTULO 2 | EU PASSEI NO PUPT

AO LONGO DOS ANOS, o Projeto Universidade para To-dos ficou conhecido e a disputa para a vaga aumen-tou a cada ano, a ponto de existir um pré-PUPT4, ouseja, um preparatório para o Projeto. Não havia limi-tes para a indústria dos cursinhos lucrar cada vezmais com os vestibulandos, ainda que seja em cimade um projeto social, que só existe por causa das defi-ciências de seus alunos, majoritariamente oriundosdo ensino público estadual.

A prova era composta por questões de Língua Por-tuguesa, Matemática, História, Geografia e Ecologia.Havia pontos de corte distintos para alunos da comu-nidade (que já terminaram o Ensino Médio) eSEDU5(que ainda estão no 3º ano do Ensino Médio).

4 O preparatório pertencia a um professor do PUPT, que tambémmantinha um pré-vestibular e os congressos específicos de cadamatéria (Congresso de História. Congresso de Literatura, Con-gresso de Redação).5 O número de vagas para o PUPT a cada ano dependia do apoiodado pelos patrocinadores, que geralmente, grandes empresas,como Vale, ArcelorMittal Tubarão e Aracruz Celulose(atual Fi-bria). As prefeituras da Grande Vitória, do Interior e a própria

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Sabendo disso, Melanie esqueceu definitivamentede Bebeto e começou a estudar todas as tardes no seuquarto. Só tinha um pouco de dificuldades em Mate-mática, e por isso, chamou seu primo Pedro, aluno deEngenharia Mecânica da UFES para ajudá-la nessasmatérias em casa.

No dia 04 de março de 2007, um domingo, Mela-nie chegou ao Centro de Línguas da UFES para fazera prova de seleção do PUPT. Ela trouxe o comprovan-te de inscrição, o RG, a pochete com caneta, lapiseirae borracha e uma garrafinha com água.

– Poxa, hoje tá fazendo um solzão, daqueles queanima a gente sair de casa e ir pra praia. Mas, pelo so-nho da universidade, eu faria qualquer renúncia eesta seria a primeira delas – disse Melanie.

A sala onde a prova do PUPT era aplicada estavacheia de candidatos, bastante ansiosos por uma vaga.O fiscal distribuiu as provas aos candidatos, que sópodiam abri-las após sua autorização. Três minutosdepois, o fiscal autorizou o início da prova. Melanieabriu aprova e se assustou.

“Essas questões de Língua Portuguesa tão cheiasde pegadinhas. Tá explicado porque elas têm maiorpeso. Vou deixá-las pro final” – pensou.

SEDU também patrocinavam o projeto.

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Melanie começou a responder as questões de His-tória, Geografia e Ecologia. Respondidas tais ques-tões, ela foi para as questões de Matemática e LínguaPortuguesa. Ela preencheu o gabarito, entregou-o aofiscal e saiu da sala, levando a prova.

– Agora, é só aguardar o resultado e que Deus meabençoe e abençoe àqueles que fizeram essa prova –disse Melanie.

18 de março de 2007, um domingo: o dia da verda-de. Foi divulgado o resultado da prova de seleção doProjeto, publicado na portaria da FCAA e nos jornaisde maior circulação no Espirito Santo. Melanie, aover seu nome entre os aprovados no jornal, chorou dealegria no seu quarto e ela ouvia no computador Dosenamorados, de Laura Pausini. Saiu do quarto, abra-çou a mãe, Darlene, 40 anos, morena clara, cabelopreto, baixinha como a filha, que estava na sala e dis-se:

– Mãe, eu passei na prova do PUPT! Vou poder rea-lizar meu sonho.

– Parabéns, minha filha. Quando você vai se matri-cular?

– A partir de amanhã. Só fico preocupada comovou conseguir a tempo o histórico escolar. Terça àtarde, vou passar na escola pra tentar, pelo menos,

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pegar a declaração de conclusão do Ensino Médio.Acontece que quem fica na secretaria é a Gerusa, queé muito antipática. Meu Deus, que mulher mal-ama-da!

– Essa aí parece que nunca viu macho, com essegênio, ela vai mesmo é ficar pra titia.

– Mãe, vou precisar de R$ 60,00 para pagar asapostilas do Projeto.

– Agora não tenho, mas vou passar no caixa ele-trônico e você pega comigo mais tarde.

– Te amo, mamãe. Você é tudo pra mim.Na terça-feira à tarde, Melanie foi à sua antiga es-

cola requerer a declaração de conclusão de 3º ano doEnsino Médio. Mas para sua surpresa, a Gerusa seaposentou.

“Essa aí já era pra ter se aposentado faz tempo. Erauma mulher muito amargurada” - pensou Melanie.

Em poucos minutos, a nova secretária escolar digi-tou a declaração na jurássica máquina de escreverelétrica Olivetti, carimbou, assinou a declaração e aentregou à Melanie. Ela saiu da escola e no ponto emfrente ao Boulevard da Praia, pegou um ônibus para aUFES, onde funciona a sede da FCAA, mantenedorado PUPT.

Na porta da Fundação, havia uma fila de cem pes-

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soas para a matrícula. Uma funcionária fazia a tria-gem dos documentos para verificar se estavam em or-dem. Se o classificado estivesse com os documentosconforme o edital, seria encaminhado para a matrí-cula na sala do PUPT. Enquanto aguardavam sua vez,uns jogavam baralho, outros conversavam banalida-des.

– Ainda não acredito na derrota do meu Mengãopro Volta Redonda. Um timaço perdendo prum time-co – reclamou Udson.

– Acontece, meu chapa, que os jogadores do seuMengão só têm amor ao dinheiro e não honram omanto rubro-negro. Preferem cair nas baladas cario-cas e por isso, não têm disposição pra treinar, se éque eles pisam os pés lá na Gávea. Por causa disso, oVoltaço mandou aquela goleada – respondeu Michael,vestido com a camisa do Fluminense.

– Falou e disse, parceiro. Há muito, o futebol brasi-leiro, principalmente o carioca, anda numa situaçãolamentável. Os bons jogadores são vendidos pros ti-mes da Europa ou do Oriente Médio. Ficam aí só ospernas de pau, que não jogam nada e fazem extrava-gâncias fora do campo – observou Nelson.

Após uma hora e meia, chegou a vez de Melanie,com os documentos ir à sala do PUPT fazer sua ma-

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trícula. A secretária perguntou e digitou os dados nocomputador:

– Nome?– Melanie Coser Pignaton.– Nascimento?– 01 de julho de 1988.– Nome da mãe?– Darlene Silva Coser Pignaton.– Nome do pai?– Genésio Leonardo Pignaton.– Endereço?– Avenida Hermínio Blackman, 690.– Bairro?– Bairro da Penha.– Cidade?– Vitória.– Identidade?– 933.255– CPF?– 051.344.266-45.– Telefone fixo?– 3324-5353– Telefone celular?– 9821-5866– Certificado de conclusão do Ensino Médio?

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– Não consegui, mas tenho declaração da escola.– Turno que vai estudar?– Vespertino.– Os R$ 60,00 da primeira apostila?– Aqui estão.– Obrigada e boa sorte.Ao chegar da FCAA, Melanie deparou-se com uma

situação desagradável, onde dona Zelmínia, senhorade 68 anos, baixa e cabelo grisalho, judiava de Juni-nho, porque ele derrubou seu cesto de pães. Desafo-rada, ela gritou:

– Só podia ser uma droga de mongoloide pra fazeressa desgraça. Sai daqui, aberração da natureza! Fi-lhote de cruz-credo com ave-maria! Aborto malfeito!

Isso magoou demais Melanie, que foi em direção àsenhora e disse:

– O que é isso, dona Zelmínia? Larga o meu irmãojá!

Fabinho, um amigo de Juninho, que estava na rua,falou com Melanie:

– Mel, essa velha feia bateu no Juninho, porque ele,sem querer, derrubou um cesto de pães.

– É mesmo, meu lindo? – perguntou Melanie, fa-zendo um carinho na cabeça do menino.

– É – respondeu Fabinho.

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– Ela me bateu, Mel – disse Juninho.Os outros meninos confirmam a versão dele.

Melanie falou umas verdades para Dona Zelmínia:– Dona Zelmínia, me responde uma pergunta: a

senhora acha certo ofender um portador de Síndro-me de Down por este ter derrubado um cesto? Se a se-nhora tivesse um filho seu com problema igual ao domeu irmão, a senhora o amaria ou o consideraria umestorvo em sua vida, abandonando-o nesses córregosde rios, como fazem muitas mães por aí?

Dona Zelmínia, apontando um dedo em riste paraMelanie, saiu irritada dali, dizendo desaforos:

– Menina abelhuda! Que o diabo que a carregue!Quem estava ali, achou um máximo a lição de mo-

ral que Melanie deu naquela senhora e os meninosmais engraçadinhos gritaram:

– Melanie pra presidente!Ela respondeu com carinho às manifestações:– Obrigada, gente. Era a hora de dar um basta nes-

sa situação. Dona Zelmínia tinha que ouvir umas ver-dades. Não é a primeira vez que ela age assim com oJuninho, usando termos grosseiros. Até mais, meni-nos. Vem Juninho, vamos pra casa.

Melanie chegou à cozinha com Juninho. Darleneestava na mesa jantando, antes de pegar o plantão no

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Hospital Santo Antônio, onde trabalhava como técni-ca de enfermagem. Eram dezoito horas e trinta mi-nutos. O céu estava limpo, sem nuvens e a Lua mos-trava seu resplendor. Ela e Juninho sentaram à mesacom Darlene. Para o jantar, tinha arroz, feijão, ma-carrão, batatinha, salada e costelinha de porco. Mela-nie serviu-se de comida e depois disso, falou com amãe:

– Mamãe, acredita que Dona Zelmínia voltou aagir com grosseria com Juninho?

– O quê? Daqui a pouco, eu vou descer o pau nessavelha enxerida e carcomida!

Quem ela pensa que é? Ela vai aprender com umaquente e duas fervendo a não judiar com os filhos dosoutros!

– Não faz isso, mamãe. Eu tive uma conversinhacom dona Zelmínia, mas ela reagiu com desaforos. Sea anciã age assim com Juninho na minha presença,imagina o que ela faria se não tivesse por perto?

– Eu tenho que ir pro hospital assumir o plantãoda noite. Hoje promete ser tenso. Cuida bem do Juni-nho, hein? Um beijo.– Um beijo, mãe.Ao terminar o jantar, Melanie lavou as vasilhas e

foi para a sala ler o livro Um amor para recordar, de Ni-

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cholas Sparks.

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CAPÍTULO 3 | O PRIMEIRO DIA DE AULA

MELANIE ESTAVA TODA CONTENTE, PORQUE era o seuprimeiro dia de aula no PUPT. As aulas aconteciamnuma das salas do CCJE, na UFES, das 13h30min às18h30min. A primeira aula naquela segunda-feira foide História Geral. O professor era Jackson, 22 anos,branco, olhos castanhos e cabelos pretos. Ele está ves-tido com uma camisa de Che Guevara, com a frase nafrente “HAY QUE ENDURECERSE, SIN PERDER LATERNURA JAMÁS”. Ele estava explicando o perfil dasociedade espartana:

– Os esparciatas, ligados ao exército, formavam aelite. Os periecos (habitantes da periferia) formavamo que a gente chama atualmente de classe média, comhomens livres e sem direitos políticos. Eles viviam daagricultura, do comércio e do artesanato, atividadesproibidas à aristocracia espartana. Os hilotas eram aralé, viviam como escravos do Estado.

Márcio, negro, 17 anos, cabeça raspada, baixinho emusculoso, fez uma pergunta:

– Professor, como era o sistema político de Espar-ta?

– Esparta tinha dois reis, vindos de duas famílias,

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os Ágidos e os Euripôntides, sendo a primeira,aqueia, e a segunda, dória. Mas os poderes estavamconcentrados na Gerúsia, com 28 membros com maisde 60 anos e presidida pelos dois reis. No século VIIa.C, foi criada a Assembleia dos Cidadãos, com livreparticipação de todos os espartanos com mais detrinta anos, onde eram discutidas e aprovadas as pro-postas de governo enviadas pela Gerúsia. Os geron-tes, embora eleitos, eram vitalícios, e o Eforato, guar-dião da tradição, detinha um poder sem limites. Oséforos vigiavam de perto não só os costumes, mastambém a atuação dos reis, agindo como policiais,juízes e supervisores da administração.

A segunda aula foi ministrada por Luís Roberto,moreno, porte atlético, 40 anos, cabelo grisalho e pro-fessor de História do Brasil, que explicou acerca dosgrupos políticos do Período Regencial:

– A renúncia de Dom Pedro I provocou a disputado poder entre os dois grupos políticos do Brasil Im-pério: liberais exaltados e liberais moderados. O gru-po dos exaltados era formado pela classe média, en-quanto os moderados eram constituídos pelos lati-fundiários. Estas duas correntes políticas formavamo Partido Brasileiro, e se aliaram para constranger oImperador, porque se sentiam insatisfeitos com a

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maneira autoritária que o herdeiro do trono portu-guês administrava o Brasil. Os membros do PartidoPortuguês, apoiavam o autoritarismo de Dom PedroI. Houve um confronto entre os Partidos Brasileiro ePortuguês, conhecido como a Noite das Garrafadas,ocorrida no Rio de Janeiro, em 1831.

A terceira aula foi de Matemática, com Amarildo,25 anos, moreno claro, baixo e cabelo liso. A aula erade Trigonometria e para que os alunos decorassem osvalores de 30, 45 e 60 graus de seno e cosseno, ele can-tou6 uma paródia de uma música da Xuxa, Tindolelê.Ele começou pelos senos.

– Todo mundo 1,2,3, 1,2,3/todo mundo na raiz, naraiz/todo mundo sobre dois/todo mundo sobre dois/todomundo sobre dois.

E depois, Amarildo foi para os cossenos:– Todo mundo 3,2,1, 3,2,1/todo mundo na raiz/na

raiz/todo mundo sobre dois/todo mundo sobre dois/todomundo sobre dois.

Acerola, de Biologia, deu a última aula, sobre ofuncionamento do sistema excretor dos animais, can-tou uma paródia7 de uma cantiga de roda, Ciranda Ci-

6 Canção extraída do Blog Nenhum dia é inútil<http://vai.la/eOEi>. Acesso em 27 de outubro de 2015.7 Canção extraída do site Vestibular 1 <http://vai.la/eOEk>

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randinha, acompanhada de pandeiro:– Camarão tem glândula verde/para amônia liberar/a

minhoca tem nefrídias que usa para excretar/nos insetos tu-bos de Malpighi/ácido úrico vão eliminar/nas planarias cé-lulas flama/nas aranhas glândulas coaxais/o homem pro-duz amônia/no meio intracelular/o fígado muda paraureia/que o rim vai excretar.

Ao terminar as aulas no PUPT, Melanie foi para oTurcão Tattoo Studio e falou com Turcão, 35 anos,branco, alto e careca. Ele tinha várias tatuagens nocorpo. O estúdio estava cheio de fotos de tatuagens epiercings.

– Turcão, meu anjo, eu quero que você faça essedesenho de borboleta que achei superfofo por cimado nome Bebeto, que eu fiz nas costas. Terminei comele e não faz sentido manter a lembrança de um amordo passado – disse Melanie.

– Beleza, Mel. Mas isso pode levar várias sessões –respondeu Turcão.

– Tá bom. Pode fazer – respondeu Melanie.No fim de tarde, Rodrigo estava no quarto, deitado

na cama. O telefone tocou na sala. Seu pai, Marcelo,negro, alto, 43 anos, atendeu.

Ele chamou o filho:

Acesso em 27 de outubro de 2015.

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– Rodrigo, é ligação pra você. Venha atender.– Tô indo já.Ele foi atender a ligação:– Alô, quem fala?– É a Shirley, secretária do TU. É que no último sá-

bado você fez o bolsão para o pré-vestibular para aturma de março, acertou mais de setenta e cinco porcento das questões e você conseguiu uma bolsa de100%. Estou ligando pra perguntar se você tem inte-resse na matrícula.

– Claro que tenho. Quando posso passar aí pra fa-zer a matrícula?

– A partir de hoje. Só precisa levar o RG, CPF, com-provante de residência e os R$ 70,00 da 1ª apostila.

– Tá bom. Obrigado.– De nada.Marcelo se aproximou de Rodrigo e perguntou:– Era o quê, meu filho?– Pai, ganhei uma bolsa integral no TU – respon-

deu Rodrigo.– Parabéns, Rodrigo. Que Deus te abençoe – disse

Marcelo.– Obrigado, pai – respondeu Rodrigo.Rodrigo colocou o telefone no gancho e para co-

memorar a conquista da bolsa, ele pegou o violão que

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estava em cima do sofá, tocou Apenas mais uma deamor, de Lulu Santos.

Melanie, em seu quarto, ouvia música em seu mp3player da Vicini com 1 gigabyte de capacidade. Seu V3tocou. Vendo que era Bárbara, atendeu a ligação:

– Oi, Bárbara. Tudo bom?– Tudo ótimo. E você?– Vou bem, Bárbara– Tá a fim de sair comigo pra comer pizza na

Mamma Mia?– Claro que quero. Eu amo pizza. Posso levar o Ju-

ninho?– Claro que pode. Tô com muita saudade dele.

Amanhã, às sete, passo aí pra buscar vocês.Um beijo.– Outro, meu bem.

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CAPÍTULO 4 | A VIDA É LIGEIRA

MELANIE E JUNINHO FORAM DE CARRO com Bárbara àPizzaria Mamma Mia, em Jardim da Penha. Barbara eMelanie puseram a conversa em dia:

– Bárbara, faz um tempão que eu não como umapizza aos quatro queijos ou uma portuguesa.

– Jura, Mel?– É verdade. A última vez que fui comer uma pizza

foi no meu aniversário, no ano passado, numa pizza-ria em Itararé, com meus amigos.

– Nem me lembro mais de quando comi uma piz-za.

– Nossa, você tá melhor do que eu!– É verdade, Mel.O garçom trouxe a pizza maracanã de calabresa e

a Coca-Cola de dois litros. Melanie cortou uma fatiada pizza e serviu a Juninho.

– Se quiser mais pizza, é só pedir pra mim, tá meubem? – disse Melanie.

– Sim, Mel – respondeu Juninho, com a pizza naboca.

– Babi, eu tô fazendo cursinho no PUPT. Eu voutentar o vestibular pra Medicina – disse Melanie.

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– Que legal, Mel. Tá gostando do cursinho? – per-guntou Bárbara.

– Tô achando maravilhoso. Os professores são tãobacanas. Alguns deles dão aulas no TU e no Lamarck,os cursinhos mais badalados e caros de Vitória – disseMelanie.

– A propósito, você viu algum gatinho nesse cursi-nho? - perguntou Bárbara.

– Ai, Bárbara. Que pergunta! – respondeu Melanie,corada de vergonha – Depois que eu e o Bebeto termi-namos o namoro, decidi me concentrar nos estudos.

– Desculpa se te constrangi, querida – disse Bárba-ra.

– Não precisa se desculpar, meu amor – respondeuMelanie, afagando o braço de Bárbara.

Ao terminarem a pizza, os primos foram ao caixa,pagaram a conta e foram para o carro. Eles voltavampara casa. No caninho, Bárbara parou no Posto 3 Ir-mãos, no cruzamento da Reta da Penha com a RuaDona Maria Rosa para abastecer.

De repente, um Golf GTI e um Audi A3, que vi-nham a 140 km/h, invadiram o posto, atropelandoBárbara, Juninho, Melanie, que havia saído do postode conveniência onde comprou guloseimas para o ir-mão e Carlinhos, o frentista.

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Com a violência do atropelamento, Juninho foi ar-remessado a uma distância de 5 metros do posto eteve morte instantânea, assim como o frentista Carli-nhos, que teve afundamento de crânio e perda demassa encefálica.

Leandro, o gerente do posto, acionou o Samu, oCorpo de Bombeiros e a Polícia Militar. Várias ambu-lâncias chegaram ao local.

Os policiais do Batalhão de Trânsito da Polícia Mi-litar abordaram, no local do acidente, Lucas Hans vonKrüger e Robson Juarez Barrios Lopez, respectiva-mente motoristas do Golf GTI e do Audi A3.

Lucas, 19 anos, loiro, olhos azuis, 1,90 m de altura,musculoso, estudante de Direito da FVD. Ele era filhode Claudio von Krüger, sócio do maior escritório deadvocacia do Estado, o von Krüger, Barreira e Lourei-ro Advogados Associados. Robson, 20 anos, morenoclaro, bombado, ostentava cordões de prata, era cole-ga de turma na mesma faculdade.

Eles participavam de um racha na Reta da Penha eestavam visivelmente alterados e seus carros cheiosde cocaína, lança-perfume e uísque. O capitão Da-masceno conversou com os rapazes, acompanhadodos aspirantes Juliano e Kleber.

– Gostaria que os senhores soprassem o bafômetro

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– disse o capitão Damasceno, aproximando o equipa-mento na boca de Lucas.

– Eu não vou soprar bafômetro nenhum. Ninguémé obrigado a gerar provas contra si mesmo. Tá escritona Constituição. Não me enche a droga do saco – gri-tou Lucas.

– Polícia para quem precisa/Polícia para quem precisade polícia – cantou Robson, a canção Polícia, dos Titãs.

– Você com revólver na mão é um bicho feroz/Sem ele,fica rebolando/Até muda de voz – debochou Lucas, can-tando o samba Bicho Feroz, de Bezerra da Silva, apon-tando o dedo para a pistola 380 que estava no coldredo capitão Damasceno.

– Eu bebo sim/E vou vivendo/Tem gente que não bebe etá morrendo – cantou Robson, cambaleando, a músicaEu bebo sim, de Elizeth Cardoso.

– Com a marvada pinga/É que eu me atrapaio/Eu entrona venda e já dou meu taio/Pego no copo e dali numsaio/Ali memo eu bebo/Ali memo eu caio/Só pra carregar éque eu dô trabaio/Oi lá – cantou Lucas, Marvada Pinga,de Inezita Barroso, tropicando pelo posto.

– O espetáculo tá lindo! Que vozes! Queremos queos senhores colaborem e soprem o bafômetro – res-pondeu o capitão Damasceno, já perdendo a paciên-cia.

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– Qual foi a parte do não vou soprar essa desgraçade bafômetro que você não entendeu, soldadinho demeia tigela? – gritou Lucas, dando um empurrão nocapitão Damasceno.

– O senhor está preso por desacato à autoridade eagressão – respondeu o capitão Damasceno.

– Meu irmão, toma cuidado. Você não sabe comquem tá mexendo. Meu pai é amigo do comandanteda Polícia Militar. Se eu parar na delegacia, você táferrado – ameaçou Lucas.

– O tio da minha noiva é desembargador do Tribu-nal de Justiça. Você não sabe com quem tá falando,seu arrombado – ameaçou Robson dando um chutenas costas do capitão Damasceno.

O capitão Damasceno e os aspirantes Juliano eKleber tiveram que usar a força para colocar os ma-chões na viatura da PM e levá-los ao DPJ de Vitória.Na delegacia, os rapazes fizeram ameaças aos polici-ais e aos jornalistas presentes e ainda debochandodos crimes que cometeram.

– Quando eu sair daqui, eu vou acertar as contascom vocês, seus policiais de meia tigela. Só porquetem uma arma e um distintivo, pensam que são algu-ma coisa – disse Robson, fazendo o gesto de umaarma em direção aos policiais.

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– Nesse montinho de fezes chamado Brasil, só vaipra cadeia pobre, preto e prostituta. Eu sou rico, in-fluente, filho do maior advogado do Estado. Não vaidar nada, não. No fim das contas, a gente só vai pagaralgumas cestas básicas – zombou Lucas.

– Eu, preso? Vai sonhando…Só porque peguei meucarango, botei pra quebrar a 140 por hora, mas poruma fatalidade qualquer, atropelei um frentista, umretardado mental do olho puxado e uma loira do ca-belo curtinho que é a maior gata e uma tampinha queé um piteuzinho – ironizou Robson.

– Eu juro por tudo que mais sagrado em minhavida que eu vou descobrir onde esses policiais morame vou acabar com a família deles. Eu tô falando sério,desgraça! – gritou Lucas.

– Tô indo preso porque atropelei um mongoloideretardado que se jogou no meu carro – disse Robson,friamente.

– Você não sente remorso de ter matado três vidasnum racha – perguntou Juvenal Noberto, repórter doprograma Hora da Bronca, da TV Moxuara para Lu-cas.

– Rapaz, desliga essa câmera. Eu não te autorizei afazer imagens minhas. Eu me reservo no direito denão te dar declarações. Velho, se isso for pro ar, eu

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boto você e a emissora no pau – gritou Lucas.– Eu sou jornalista e tô exercendo o meu direito à

liberdade de imprensa – respondeu Juvenal.– Seu programa é lixo, sensacionalista e mundo

cão. Se alimenta das desgraças alheias. Jornalistas sãoabutres, não tem o menor respeito com a imagem e aprivacidade das pessoas – gritou Lucas, empurrandoo microfone de Juvenal.

– E você, que é um playbozinho mimado que usa ocarro pras suas estripulias e agora tem três mortesnas costas – respondeu Juvenal.

– Jornalista de quinta categoria! Eu juro que voufazer de tudo pra te mandarem embora da TVMoxuara. Eu tenho amigos que trabalham na direto-ria. No que depender de mim, eu vou te perseguir,você não vai arrumar emprego em lugar nenhum, voutransformar a sua vida num inferno – gritou Lucas,dando um chute na câmera que estava na mão de To-bias, o repórter cinematográfico.

– Ai, que medinho de você. Tô me borrando todi-nho – debochou Juvenal.

– Cê tá avisado. Se sair alguma coisa em relação aomeu nome e minha imagem, você será mais um nafila dos desempregados. Emprego pra jornalista tá di-ficil hoje em dia, sabia? – ameaçou Lucas.

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– Vai na fé, irmão – respondeu Juvenal, ironica-mente.

Os rapazes foram indiciados por embriaguez aovolante, triplo homicídio com dolo eventual e tentati-va de homicidio com dolo eventual. Eles fizeram exa-me de sangue no Departamento Médico Legal paradetectar traços de álcool, que deu positivo. Apóspagaram uma fiança de 5 mil reais, cada um, eles fo-ram liberados no dia seguinte.

Bárbara e Melanie foram levadas para o HospitalSão Lucas. A prima de nossa heroína não resistiu aosferimentos e morreu quando estava recebendo os pri-meiros socorros. O corpo de Juninho foi removidopara o Departamento Médico-Legal.

Darlene foi comunicada do atropelamento e come-çou a chorar:

– Meu Deus, me diz que isso não é verdade. Isso sópode ser um pesadelo.

Ao ver o cadáver de Juninho dentro da gaveta doDML, Darlene desmaiou. Ela começou a cuidar dospreparativos para o sepultamento de seu filho queri-do.

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O corpo de Juninho foi velado em sua casa. O climaera de tristeza e revolta. Darlene não saía do caixãoonde estava seu filhinho.

– Meu filho, meu filhinho querido. Volta pra mim,por favor. Mamãe te ama e te quer bem – disse Darle-ne, acariciando o rosto do filho morto.

Dona Zelmínia apareceu de supetão e se aproxi-mando de Darlene, disse:

– Darlene, meus sentimentos.– O que a senhora faz aqui? Exijo que a senhora se

retire da minha casa e respeite a minha dor – disseDarlene, subindo o tom da voz.

– Eu vim prestar minha solidariedade – respondeudona Zelmínia, hipocritamente.

– Solidariedade? Alguma vez na sua vida, a senho-ra soube o que é isso? Desde que conheço a senhora,sempre vi uma mulher egoísta e mesquinha. A senho-ra discriminou e maltratou meu filho por ele ser espe-cial e vem aqui dizer que é solidária com a minhador? A senhora é mentirosa e hipócrita. Saia da mi-nha casa agora – gritou Darlene.

– Eu tô arrependida – respondeu dona Zelmínia.– Sai daqui, sua velha patife! Me deixa em paz! -

gritou Darlene, empurrando dona Zelmínia.Em Joana D’Arc, o corpo de Carlinhos foi velado na

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Igreja Pentecostal Brasas no Altar. Sua mãe, dona Se-bastiana, desmaiou e teve que ser amparada.

– Eu quero meu filho! O que vai ser de mim semvocê, Carlinhos? – disse dona Sebastiana, chorando.

Cleidiane, a agora viúva, chorava inconsolável.Eles foram casados e tiveram duas filhas, Viviane, de18 anos e Cecília, de 17 anos.

– Carlinhos era um homem tão bom, trabalhador,temente a Deus, não tinha inimigos. Porque ele mor-reu dessa maneira? – gritou Cleidiane, chorando.

Às 14 horas, o corpo de Juninho saiu da Igreja Ca-tólica e foi colocado dentro do carro funerário, ondeseguiu para o cemitério de Maruípe. O ônibus da fu-nerária levou parentes e amigos da família de Juni-nho. No mesmo horário em que o corpo chegava aocemitério, o corpo de Carlinhos descia à sepultura,sob aplausos e clamores de justiça.

Às 15:30, o corpo de Juninho foi enterrado. Ele es-tava vestido com a fantasia do Homem-Aranha e umboneco do personagem ia com ele dentro do caixão.

Bárbara foi sepultada às 16 horas, no cemitérioAlém do Rio Azul, em Laranjeiras, na Serra. Sua mãe,Salomé e seu noivo, Igor, desmaiaram e foram ampa-rados. O caixão desceu sob aplausos.

Melanie estava internada na enfermaria do Hospi-

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tal São Lucas. Ela teve fraturas no braço esquerdo e aperna direita teve fratura exposta com a violência doatropelamento. Sua mãe foi à enfermaria conversarcom ela.

– O que aconteceu. Por que eu tô aqui? – pergun-tou Melanie, ainda um pouco tonta.

– Você, a Bárbara e o Juninho foram atropeladosnum posto de gasolina – respondeu Darlene.

– Cadê a Bárbara e o Juninho? – perguntou Mela-nie.

– Eles estão com o Senhor – respondeu Darlene,chorando.

– Meu Deus, por que fez isso comigo? Me tirou aspessoas mais caras da minha vida. Por quê, meu Pai?Por quê? – gritou Melanie, pondo as mãos no rosto –Eu queria ter morrido junto com eles.

– Não fala isso nem de brincadeira, minha filha.Você é o meu único tesouro. Eu te amo muito – disseDarlene.

– Eu também te amo – respondeu Melanie, abra-ando a mãe.

…Um mês depois, os parentes e amigos de Bárbara,

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Juninho, Melanie e Carlinhos, fizeram uma caminha-da pedindo paz no trânsito e cobrando mais empe-nho nas investigações, pois sentiam que estavammuito lentas e os assassinos estavam soltos.

A caminhada saiu da Rodovia Serafim Derenzi, emJoana D’arc, passou pela Avenida Maruípe e foi para aRua Dona Maria Rosa e lá fizeram orações.

Após isso, Cleidiane fez um discurso:– Meu peito tá sangrando. Minha vida já não é

mais a mesma, desde que o Carlinhos morreu. Eu eminhas filhas passamos necessidades, o aluguel dobarraco onde a gente mora tá atrasado e a dona medeu prazo até hoje pra quitar a dívida, senão vai des-pejar a gente. Ninguém do posto apareceu pra daruma assistência. Ainda não pagaram pra gente os di-reitos trabalhistas do Carlinhos. Ninguém da famíliados atropeladores ou eles mesmos apareceu pra per-guntar se a gente tá precisando de alguma coisa. Jáfaz mais de um mês da morte de três vidas nesse pos-to. As investigações não andam e os assassinos, eudigo, assassinos, pois quem pega o carro e dirige amais de 140 km/h, assume o risco de matar. São pes-soas ricas e influentes. Se fosse o Carlinhos que tives-se atropelado e matado esses dois rapazes, ele já tavanuma cela fria e suja.

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Darlene também falou:– Minha filha ainda tá internada no hospital. Ela já

sabe que não verá mais o irmãozinho e a prima queela tanto amava. Tive que enterrar meu filho. Saiu domeu bolso. Ninguém me deu assistência. Três vidasforam arrancadas daqui por causa do desejo egoístade dois moleques que encheram a cara e pegaramseus carros e dirigiram perigosamente. Nada vai tra-zer meu filho e minha sobrinha de volta. A dor é gran-de demais. Minha alegria será quando eles saírem dotribunal do júri, condenados por triplo homicídio, al-gemados, entrando no camburão pro presídio.

Os manifestantes começaram gritar: Justiça! Justi-ça!

…Dona Guiomar, uma senhora morena, de cabelo

grisalho, acompanhada de três homens fortes, invadi-ram a casa da viúva de Carlinhos e expulsaramCleidiane suas filhas Tatiane e Cecília. Os rapagõespuseram todas as coisas que pertenciam a elas noquintal.

O aluguel estava atrasado há dois meses e ela avi-sou que se os débitos não fossem quitados até o dia

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anterior, poria as coisas para fora de casa.Cecília foi tirar satisfações com Dona Guiomar:– Dona Guiomar, pelo amor de Deus, tenha pena

da gente. Eu e a Tatiane estamos estagiando num ór-gão público. Mamãe vai começar no serviço de ser-vente amanhã na Prontolimpeza. Gostaria que tivesseum pouco mais de paciência.

– Minha paciência com sua mãe acabou. Eu preci-so de dinheiro pros meus remédios de pressão alta edepressão e o prazo venceu ontem – respondeu donaGuiomar.

– A senhora vai se arrepender do que tá fazendo –ameaçou Cecília.

– Eu não tenho que me arrepender de nada. A casaé minha e eu tô na minha razão – respondeu donaGuiomar.

– Dona Guiomar, tudo que a gente faz, tem volta.Deus haverá de pesar a mão sobre a senhora pela suaavareza – advertiu Tatiane.

– Não acredito na lei do retorno. Fiz o que eracerto - respondeu dona Guiomar.

– Cecília, minha filha, deixe dona Guiomar em paze vem me ajudar a recolher as coisas e levar pra casada sua avó – disse Cleidiane.

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CAPÍTULO 5 | SORTE GRANDE

APÓS DEZ DIAS, MELANIE RECEBEU alta do hospital, an-dando de muletas e com o braço enfaixado. Seu olharera triste e vazio. Estava visivelmente arrasada. Aindanão se conformava com a morte de Juninho e de suaprima, Bárbara.Como terapia para tentar superar essa dor, ela se

esmerava cada vez mais nos estudos, a fazer pergun-tas nas aulas e fora delas. Por consequência, ela obte-ve as primeiras colocações nos simulados do Projeto enos simulados discursivos de Química e Biologia.Mas ela não via nada de mais naquilo tudo. Tudo

que fazia, lembrava o irmão e prima queridos. Erauma dor difícil de cicatrizar e que somente Deus, comSeu bálsamo, poderia sarar.Num determinado momento, Melanie sentiu von-

tade de jogar tudo para o alto e desistir. Porém, Ro-drigo a incentivou para prosseguir em frente. Todosos dias, ele a visitava no hospital e levava palavras deconforto.Enquanto isso, um cursinho enxergava nela as pri-

meiras colocações em Medicina, quiçá o primeiro lu-gar geral no curso. A história de Melanie chegou aos

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ouvidos dos sócios do colégio e cursinho Lamarck, lí-der absoluto em aprovações em Medicina desde 1990.Os cursinhos têm uma política agressiva de capta-

ção de alunos. Organizam bolsões (provas que me-dem conhecimento tradicional, onde o número deacertos define o percentual de desconto, que podechegar a 100%), dão bolsas integrais a alunos do IFES(antigo CEFET-ES, principalmente para quem vaitentar Engenharia, bolsas para alunos que tiveramboa pontuação na 1ª etapa da UFES e numa sutilezamaquiavélica, roubam alunos de outros cursinhosprivados e até mesmo do Projeto Universidade paraTodos com proposta de bolsa integral.Era como um grande clube brasileiro da 1ª divisão

que usou um olheiro para buscar seu craque lá nosrincões do Brasil. Esse olheiro se chamava Paulo An-dré, que além de dar aula no PUPT, era professor doLamarck nas unidades de Colatina, Linhares e Cacho-eiro de Itapemirim e dava aulas discursivas na unida-de de Jardim da Penha. Ocorreu uma reunião na sala de Marcelo, 55 anos,

branco, alto e careca. Ele era diretor pedagógico e só-cio do Lamarck. Além de Marcelo, estava presentePaulo André e Flamarion, 58 anos, branco, baixo, gor-do e barbudo. Ele era o sócio majoritário do Lamarck.

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Flamarion olhou fixamente para Paulo André e disse:– Encontre essa menina e a traga pra cá. Nós que-

remos conhecê-la. Daremos uma bolsa integral para aturma integral de Medicina.Paulo André, após atender alguns alunos que esta-

vam com dúvidas, se aproximou de Melanie e disse: – Melanie como você e a maioria dos alunos do

Projeto sabe, eu dou aula nas unidades do Lamarckno interior e as discursivas de sábado, em Jardim daPenha. Os diretores querem conhecer você, no objeti-vo de te dar uma bolsa integral pra turma de Medici-na. Eles souberam de seu esforço e desempenho nossimulados.

Melanie ficou perplexa. Ela pediu uma bolsa no La-marck, mas o pedido foi indeferido. Para concorrer auma bolsa, o candidato teria que apresentar o boletimde resultados da 1ª etapa na UFES. Com base nele, oLamarck definia o percentual de desconto. Se o alunotirasse 48 pontos de 60 pontos possíveis, teria gran-des chances de obter bolsa integral. Mas a turma inte-gral de Medicina era seleta, só entrava nela aquelesalunos com pontuação acima de 45 pontos na 1ª etapae era a única que não concedia bolsas e descontos.Mas toda a regra tem sua exceção e a abriram paraMelanie, que perguntou:

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– Deixa ver se entendi: O Lamarck tá querendo medar uma bolsa para a turma de medicina, que coisaincrível. Eu tinha pedido uma bolsa lá dias depois daprova do PUPT, mas me negaram. Parece que tô so-nhando acordada, Não dá pra acreditar.

– Pois é, Melanie. Você tirou a sorte grande de ga-nhar uma bolsa integral no curso campeão de aprova-ção em medicina. Não é todo dia que a sorte sorri pragente. Meu sonho era ser médico, mas como eu erapobre e não tinha como me manter nesse curso, fizCiências Biológicas.

– É mesmo?– É. O PUPT, apesar das boas intenções em demo-

cratizar o acesso de alunos de escola pública à UFES,não tem estrutura para preparar os alunos que que-rem tentar Medicina. É triste dizer isso, mas é verda-de.

– Se eu fosse rancorosa e tivesse amor-próprio, eurecusaria na hora. Mas o meu sonho é fazer Medicinae você tem razão quando diz que o Projeto deixa a de-sejar no que tange à estrutura para quem vai tentaressa carreira. Quando posso ir lá pra conversar comesses sócios?

– Eu vou ligar agora pra secretária do Marcelo, di-retor pedagógico do Lamarck, pra ver a disponibilida-

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de dele de te atender amanhã.Paulo André ligou de seu celular para a secretária

de Marcelo, solicitando um horário para Melanie en-contrar com ele. Eles conversaram durante minutos.

Depois, Paulo André repassou o recado para Mela-nie:

– Melanie, marcaram pra você às 15 horas pra vocêencontrar com Marcelo.

– Obrigada.No dia seguinte, Melanie estava na recepção do

Lamarck, onde lia a Época para passar o tempo. Logoveio Sandra, a secretária do Marcelo para chamá-la:

– Melanie, o Professor Marcelo está na sala. Podeme acompanhar?

– Sim – disse Melanie.Sandra levou a moça até a sala de Marcelo, onde

também estava Flamarion.– Então você é a famosa Melanie?– Sim, sou eu – respondeu Melanie, vermelha de

vergonha.– Meu nome é Marcelo, sou o diretor pedagógico e

um dos 16 sócios do Lamarck. Este é o Professor Fla-marion, o sócio principal e dono do Michelangelo –disse Marcelo.

– Prazer em conhecê-lo, Professor Flamarion – dis-

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se Melanie.– O prazer é todo meu – respondeu Flamarion.– Melanie, nós sabemos que seu grande sonho é

ser médica. Por que escolheu essa profissão? - per-guntou Marcelo.

– Em primeiro lugar, Marcelo, muito obrigada pelaoportunidade. Eu quero ser médica pelo objetivo deajudar o próximo e salvar vidas. Pra mim, o dinheiroque se pode ganhar e o prestígio que se pode ter sãoaspectos secundários. Muita gente quer fazer Medici-na movida pelo dinheiro e pelo prestígio, mas acabase decepcionando. Pra fazer Medicina, a gente temque ter amor pelas pessoas, por amor naquilo que faz– respondeu Melanie.

– Você tem consciência que Medicina é um cursomuito concorrido, especialmente aqui na UFES, não?O Lamarck é um cursinho voltado em biomédicas, es-pecialmente Medicina. Como o professor Paulo An-dré frisou, o PUPT não tem estrutura para prepararseus alunos para essa carreira. Foi ele que falou devocê pra nós, de sua história e seu empenho nos si-mulados objetivos e discursivos. O que motivou estareunião foi a decisão de te conceder uma bolsa inte-gral para turma integral de biomédicas – disse Flama-rion.

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Melanie desabou no choro. Ainda não acreditavana chance que teria naquele momento.

– E tem mais. O Lamarck também vai arcar com ouniforme, as apostilas e três inscrições de vestibula-res para Medicina. A única preocupação que você vaiter de hoje em diante é só estudar. E muito. Boa sortee bem-vinda ao Lamarck – disse Marcelo.

Melanie saiu da sala da diretoria e fez a matrículapara a turma integral de biomédicas.

Os diretores do Lamarck se encantaram com a in-teligência e graciosidade de Melanie. Mas o que elesestavam fazendo não era filantropia, era investimen-to a curto e médio prazo, com vistas a um 1º lugar ge-ral em Medicina ou pelo menos, as primeiras coloca-ções.

Naquele momento, Melanie assinava um contratode prestação de serviços educacionais e assim, vestin-do a camisa azul e branca em lugar da camisa rosa doPUPT. Estava trocando a sala ventilada doCCJE/UFES por uma sala com ar-condicionado, datashow, cadeiras acolchoadas e uma equipe de profes-sores de biomédicas campeã de aprovação.

Melanie foi até a sua agora ex-turma no CCJE des-pedir-se dos colegas. Eles ficaram muito consterna-dos, mas felizes pela oportunidade que ela teve na-

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quele momento. Todos lhe abraçaram, desejando-lheboa sorte naquela nova fase de sua vida.

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CAPÍTULO 6 | ENTRE AMIGAS

NO ÔNIBUS, MELANIE ENVIOU UM torpedo às amigasNani, Bebel, Marina e Dominique, convidando-aspara irem à sua casa comerem frango à passarinha epôr a conversa em dia. Ela passou no supermercadoCosmos, na Rua Aerobaldo Bandeira, para comprarfrango para fritar e os refrigerantes de limão, uva eguaraná, que estavam em promoção.

Na cozinha, Melanie pôs os pedaços de frangopara fritar na fritadeira, enquanto aguardava suasamigas chegarem. Em poucos minutos elas chegarama sua casa e bateram a porta. Melanie abriu a portapara atendê-las e disse:

– Que bom rever vocês. Vamos entrar?Melanie tirou uma porção de frango da fritadeira e

pôs num recipiente com papel toalha para que as me-ninas comessem, enquanto colocava outra porçãopara fritar. Ela pediu à Bebel que abrisse a geladeira epegasse o refrigerante Coroa de limão e o pusesse namesa.

Dominique falou com Melanie:– Mel, você tá melhor?– Domi, eu tento levar a vida da melhor forma pos-

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sível, tentando me manter sempre ocupada. Esse ano,tô focada no vestibular. Mas não consigo arrancar domeu coração a saudade que tenho do Juninho e daBabi. Eu os amava muito – respondeu Melanie, come-çando a chorar no colo de Dominique.

– Não fica assim não, amiga. Um dia, vocês vão seencontrar – respondeu Dominique, abraçando a ami-ga.

Nesse momento, a Nani entrou na conversa:– E aí, Melanie, já superou a dor da traição do Be-

beto?– Há um velho ditado que diz "águas passadas não

movem moinhos. Não consigo sentir raiva, mas penadele. Soube por alto que o relacionamento dele com aMelina vai de mal a pior. Todo dia eles brigam e os vi-zinhos não conseguem dormir. Tudo por causa dociúme doentio dela e de seus ataques de histeria. Va-mos comer o franguinho, senão ele esfria – respon-deu Melanie.

– Nunca vi uma mulher tão barraqueira como aMelina. Mas Bebeto também colheu o que plantou,com aquela pinta de conquistador barato. Melina viveprocurando pelo em ovo, desse jeito, ela nunca vai serfeliz no amor, vai acabar na solidão total. E olha queela é bonitona. Imagina se fosse um dragão… Eu lem-

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bro que na festa junina lá no Otto Ewald Junior, na 7ªsérie, ela deu uns tapas na Gigi só porque ela tavaconversando com o Paulinho, que era namorado dela– disse Bebel.

– Melina tem um gênio forte e tanto, tenho medodela, que chego a evitar conversar com o Bebeto, queé meu primo por parte de mãe, pra não arrumar con-fusão. Na última vez que a gente se encontrou, eledisse que ia tentar o concurso da Polícia Militar e quenão aguenta mais o lerê-lerê da vidraçaria, onde tra-balha muito e ganha pouco. Apesar dele ser mulhe-rengo, ele é um cara esforçado e trabalhador – obser-vou Nani.

Marina também participou da conversa:– Nossa, Mel. Você tirou a sorte de ganhar uma

bolsa integral num cursinho onde só tem grã-fino.– Pois é, Marina. Acho que tô sonhando acordada.

Por isso que aceitei a proposta de bolsa do Lamarck.Eles vão me dar o uniforme, as apostilas e três inscri-ções de vestibulares pra Medicina. Eu começo ama-nhã mesmo – respondeu Melanie.

– Tô estudando em casa pra tentar uma vaga deTecnólogo em Saneamento Ambiental no CEFET-ES.O que me mata é a redação – disse Bebel.

– Que legal, Melanie. Quisera eu ter essa oportuni-

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dade. Eu tive que largar a escola no 1° ano por causado nascimento do meu filho e voltei a estudar agora,no supletivo do Hildebrando Lucas – comentou Mari-na.

– Vocês sabiam que a Melina tá grávida? O quemais me preocupa na Melina é o fato dela ter maisuma de suas crises de histeria e sofrer um aborto –disse Melanie.

– Que horror, vira essa boca para lá, Melanie – fa-lou Bebel.

– Deixa de ser recalcada. Isso não combina comvocê – repreendeu Marina.

– Eu acho que você, por não ter se deitado com Be-beto, tá morrendo de inveja por não esperar um filhodele e taí de recalque, né? Confessa, Mel, você tavalouquinha pra ter uma noite de amor com Bebeto, terum filho e se casarem, mas na hora H, você vacilou eele foi procurar Melina e…bingo! Ela ficou grávida –comentou Nani.

– Eu quero ter uma noite de amor e dela gerar umnovo ser. Mas não agora. Cada coisa no seu tempo. Sódepois do casamento. Bebeto sabia das minhas con-vicções religiosas, mas não as levou a sério. O quequis dizer é que Melina tem que ter cuidado com es-sas crises de fúria nesses primeiros três meses de gra-

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videz, que são os mais críticos. Apesar de tudo, eu te-nho pena dela – observou Melanie.Após o animado bate-papo, as meninas foram em-

bora. Melanie lavou os pratos e foi dormir, porque ti-nha que acordar cedo para a aula no Lamarck.

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CAPÍTULO 7 | NO LAMARCK

MELANIE CHEGOU AO LAMARCK, JÁ como aluna. En-quanto sua carteirinha não ficasse pronta, o seguran-ça passou o crachá para que ela entrasse. A sala deaula tinha data show ligado a um computador comacesso à Internet, ar-condicionado e sistema de sono-rização, onde os professores faziam suas explanaçõescom microfone sem fio.

Em poucos minutos, entrou Maria Célia, negra,alta, magra, 25 anos, cabelo cacheado e professora deLiteratura Brasileira, falando do livro Quincas Borba,de Machado de Assis:

– Quincas Borba é um romance em terceira pes-soa, mas que se manifesta em primeira pessoa, onis-ciente e onipresente. Conta a história de Rubião, umex-professor, que se torna rico capitalista ao receber aherança de Quincas Borba, o filósofo. A obra temcomo características a descrição exata e crítica depersonagens e a sua vida social, denuncia dos valoresda burguesia, crítica à hipocrisia e à moral aparente.

Em seguida, Tio Faisão, branco, alto, 41 anos e decabelos loiros e olhos azuis falou sobre os ácidos:

– Os ácidos são todas as substâncias que, em água,

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liberam única e exclusivamente íons H+. Eles têm sa-bor azedo. Se íons hidrônio são encontrados em umasolução, a solução é ácida em natureza. Íons hidrônio(ou hidroxônio) são os únicos íons com carga positiva(cátions) formados quando um ácido é dissolvido emágua. Todas as propriedades de um ácido se devem àpresença destes íons. A fórmula química de um íonhidrônio é H3O1+. Ácidos são conhecidos como “doa-dores de prótons”.

No recreio, Melanie foi à cantina e pediu um lan-che:

– Quanto custa esse quibe?– R$ 3,20 – respondeu a atendente da lanchonete– E a Coca Cola em lata? – perguntou Melanie.– R$ 2,80 – respondeu a atendente.– Taí o dinheiro. Pode me dar os dois – respondeu

Melanie, dando o dinheiro à atendente.Com o lanche nas mãos, Melanie indignou-se com

o preço dos lanches da cantina do Lamarck.– Benza Deus! Que lanches caros! Amanhã vou tra-

zer meu lanche de casa – disse Melanie, indignada.Camilla, uma patricinha loira, alta e de olhos cas-

tanhos, que estava na cantina não via Melanie combons olhos. Falou do vestuário e da aparência dela:

– Nossa, que tênis mais emo. E essa calça, parece

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que foi comprada no bazar da Igreja ou nessas liqui-dações dessas lojas de departamentos. Sem falar docabelo dela, que não vê uma hidratação faz um tem-pão. Que horror!

Roger, um playboy musculoso, moreno, de estatu-ra mediana, que não parava de olhar para Melanie.Ele disse:

– Que princesinha, brother. Ah, se ela me dessecondição… Ela é um piteuzinho, uma bonequinha deluxo.

Os alunos do integral voltaram à sala para a auladupla de Geografia 2, com Ronaldo, 35 anos, branco,baixo, gordo, cabelo castanho. Ele falava sobre aque-cimento global, tema vestibulável naquele ano. Mela-nie, entediada com a aula, dormiu.

Para finalizar as aulas da manhã, Acerola, 31 anos,negro, de estatura mediana e usando uma perucacom cor acerola, professor de Biologia, deu uma belaexplicação sobre os artrópodes:

– Os artrópodes têm aparelho digestório completoe peças bucais com mandíbulas laterais adaptadaspra mastigação ou sucção. O corpo dos Artrópodes érevestido por um exoesqueleto à base de quitina, sen-do que na maioria dos crustáceos, além da quitina,este exoesqueleto é constituído de carbonato de cál-

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cio. Por ser uma armadura externa e rígida, apesar dearticulada, ela não deixa o animal crescer.

Melanie, a convite de Marcelo, foi almoçar no VixGourmet, uma churrascaria chique na Enseada doSuá.

– Como foi o seu primeiro dia no Lamarck? – per-guntou Marcelo.

– Ótimo, incluindo os professores. Só fiqueichateada guerrinha do abaixa-aumenta do ar-condi-cionado que os alunos do integral fizeram hoje e quea coordenadora do andar deu cabo dela, confiscandoo controle remoto – respondeu Melanie.

– Não repara. É assim mesmo. Tá gostando da co-mida? -perguntou Marcelo.

– Tá uma delicia, principalmente coraçãozinho degalinha –respondeu Melanie.

Melanie voltou para a turma de biomédicas, ondeteria aulas de resolução de exercícios com os profes-sores. Ela ficou estudando até 21:00. Ao chegar emcasa, Melanie tomou uma ducha quente para relaxar.Ela cantou músicas do Roupa Nova:

– Te dou meu coração/Queria dar o mundo/Luar do meusertão/Seguindo no trem azul (…)Sei, não é questão de acei-tar/Sim, não sou mais um a negar/A gente não podepedir/Se a vida cansou de ensinar/Sei que o amor nos dá

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asa/Mas volta pra casa(…)Linda, só você me fascina/Te de-sejo muito além do prazer/Vista meu futuro em teu corpo/Eme ama, como eu amo você.(…)Eu te amo e vou gritar pratodo mundo ouvir/É você o meu desejo de viver/Sou meninoe teu amor é que me faz crescer/Me entrego corpo e alma pravocê.

Melanie, vestida com o baby-doll, abriu a geladeirae pegou arroz, feijão, macarrão e uns pedaços defrango. Ela pôs para esquentar no micro-ondas pordois minutos e depois se sentou à mesa para comer,assistiu um pouco de TV e depois dormiu ao sofá.

…Melanie sofria com uma cólica menstrual e na basedo Atroveran, entrou no segundo horário, na aula deFísica 2, com Brutus, 29 anos, branco, alto, de cabeçaraspada e musculoso, que cantou uma música8 do Pa-checão, conhecido professor de pré-vestibulares emBelo Horizonte:

– Calor, calor, calor/Calor eu vou te dar/Se você não setocar/Que essa matéria cai no vestibular/Calor é a energia

8 Canção extraída do site Vestibular 1<https://goo.gl/K9kT3z>.Acesso em 27 de outubro de 2013.

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que transita/entre corpos com temperaturas diferentes/Ca-lor eu vou te dar se você não se lembrar/Primeiro você preci-sa saber/que um corpo não possui calor, possui energia in-terna/Pequena, quando frio e grande quando quente/Se amolécula vibrar é condução/Se deslocar é convecção/Se foronda eletromagnética é radiação/Que nesse troca-troca decalor/Você poderá calcular/Com qual macete (Q =m.c.DT)/Se a temperatura variar/Que nesse troca-troca decalor/Você poderá calcular/Com quem mela(Q = m.L)/Se amatéria de estado mudar.

Chegou o intervalo. Os alunos saíram para o lan-che. Melanie ficou na sala estudando. Mas foi adverti-da pela auxiliar de coordenação para que saísse dasala para ir ao intervalo. Ela saiu. Ao fim do intervalo,os alunos voltaram para a sala da turma integral debiomédicas.

A cólica de Melanie voltou mais forte. Ela saiu dasala e levou um copo e um frasco de Atroveran e foi aobebedouro tomar o remédio. Marcola, de Biologia,deu uma aula onde explicou o funcionamento do sis-tema excretor dos animais, cantou uma paródia9 deuma cantiga de roda, Ciranda Cirandinha, acompa-nhada de pandeiro:

9Canção extraída do site Vestibular 1 <https://goo.gl/6YExob>.Acesso em 27 de outubro de 2013.

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– Camarão tem glândula verde/para amônia liberar/aminhoca tem nefrídias que usa para excretar/nos insetos tu-bos de Malpighi/ácido úrico vão eliminar/nas planarias cé-lulas flama/nas aranhas glândulas coaxais/o homem pro-duz amônia/no meio intracelular/o fígado muda paraureia/que o rim vai excretar.

Demóstenes, 45 anos, branco, estatura mediana ecareca, professor de Física 4. Eis a sua aula de Magne-tismo, com uma paródia10 de YMCA, do Village Peo-ple:

– Imã/Vou falar pra vocês/de um imã/as linhas de indu-ção/saem do pólo norte e chegam no pólo sul/Quando umacorrente elétrica/percorre um fio condutor surge/um campomagnético/dado pela regra/Essa é a Regra da mãodireita/O dedão pra corrente/Os dedos pro ponto/e o sentidodo campo é o do Tapa!

Melanie não parava de rir.A cólica de Melanie deu trégua e ela estava com

mais ânimo para a última aula da manhã, de Física 3,com Flora, 25 anos, branca, loira de cabelo curto e deolhos verdes. Para explanar sobre gravitação, Floracantou uma paródia11 de Garganta, de Ana Carolina,

10Canção extraída do site Scribd <https://goo.gl/IjqnH0 >.Acesso em 27 de outubro de 2013.11Canção extraída do site Vestibular 1 <https://goo.gl/cPhsHt >.

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com voz e violão.– Minha cabeça estranha se Física vejo/me vem um dese-

jo doido de gritar/minha cabeça arranha se fórmula vejo/quando penso em tanta coisa que vou calcular/Venho poressa agora lhe falar de gravidade, gravidade universal, tam-bém vou contar/Sente-se bem em tua carteira, se revire peloavesso/porque essa matéria você tem que estudar/São trêsleis de Kepler/vou lhe falar na cara dura/elas dizem comternura sem te complicar/Em torno do sol os planetas giramem forma elíptica sem se desviar/Se do sol aproxima a velo-cidade aumenta/ então diminui quando se afastar/O cuboda distância sobre o quadrado do período/ em que os plane-tas se põem a girar/Entre duas partículas existe um par deforças de atração proporcional/ao quadrado da distância einversamente proporcional/inversamente proporcional...

Acesso em 27 de outubro de 2013.

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CAPÍTULO 8 | NO SÍTIO DOS AVÓS

MELANIE FOI PASSAR UNS DIAS em João Neiva para des-cansar. O ônibus saiu da Rodoviária passando pelaregião da Vila Rubim, Centro de Vitória, Av. Vitória,Reta da Penha, Av. Fernando Ferrari até a BR 101,onde parou em Carapina para pegar mais passagei-ros. A linha prosseguiu seu trajeto na rodovia federal,onde alguns trechos estavam repletos de buracos.

Em compensação, Melanie encantou-se com a vi-são de vacas, bois e bezerros e cavalos pastando nasfazendas às margens da BR 101, entre Fundão e Ibira-çu. O ônibus parou em Ibiraçu para pegar mais gente.Era mais de meio-dia e o sol estava a pino quando eladesembarcou na rodoviária da cidade e começou aandar pelas ruas até chegar ao Bar do Chico para to-mar um refrigerante e comer um salgado.

Lá encontrou Ciro, branco, 46 anos, baixo, cabelogrisalho e olhos castanhos e seu tio por parte de mãe.Ele era dono de uma loja de material de construção eestava vestido com a camisa “COSER MATERIAL DECONSTRUÇÃO”.

Melanie conversou com seu tio:– Oi, tio Ciro.

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– Mel, que bom te ver aqui. Veio passear aqui nacidade?

– Na verdade, vim visitar o vovô e a vovó. Você meleva até lá?

– Claro que sim. Eu também preciso conversarcom ele. Deixa eu só acertar a conta aqui no bar praeu ir.

Ciro pagou o torresmo que consumiu ao dono dobar, seu Chico, 74 anos, caboclo, baixinho, gordo e umtanto mal-humorado.

Ciro levou Melanie para a caminhonete D-20, e fo-ram até o sítio de seu Giuseppe. Era uma propriedadede dez hectares, com vários pés de manga, cajá, mara-cujá, mamão, limão, um chiqueiro com dez porcos,um galinheiro com um galo reprodutor, quinze gali-nhas caipiras poedeiras e quinze frangos de corte.

Havia também plantações de milho, ervilha, taio-ba, salsa e cebolinha. Havia dois jumentos de carga etrês cavalos para sela. Para completar, o sítio contavatambém com quatro vacas leiteiras. Em poucos minu-tos, chegou a caminhonete de Ciro no sítio de seuGiuseppe. A alegria tomou conta daquele vovô quan-do viu sua neta.

– Melanie, que bom te ver de novo – disse seu Giu-seppe, abraçando a neta.

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- Eu também me sinto feliz de te encontrar, vovô.Vim aqui pra descansar alguns dias. Quando venhopro interior, me sinto no céu e me esqueço dos pro-blemas da vida e da rotina frenética da cidade gran-de. Após operar a hérnia, o senhor já se sente melhor?– perguntou Melanie, afagando as mãos do avô.

– Sim, Mel. Eu já me sinto melhor, com disposiçãopara o que der e vier. Sua mãe me contou que vocêpassou em medicina – comentou seu Giuseppe.

– Passei sim, vovô. Mas numa faculdade parti-cular, a FCMV. Fiz a pedido do cursinho pra ver comome sairia numa situação real de vestibular. Eu jamaisteria condições de pagar o curso. Por isso que tenhoestudado pra passar em Medicina na Federal ouconseguir uma bolsa integral pelo ProUni, que é umprograma do governo federal de bolsas de estudos aalunos carentes – disse Melanie.

– Vamos entrar pra comer, Mel. Daqui já sinto ocheiro da galinha ensopada – observou seu Giuseppe.

Melanie, Ciro e seu Giuseppe entraram em casa.Dona Zilda, 70 anos, branca, baixa, um pouco acimado peso e avó de Melanie servia o almoço: galinha cai-pira ensopada com batata e quiabo, macarrão, arroz,feijão e salada. Para refrescar, um suquinho de cajá.Quando viu a neta, fica contente e a abraçou.

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– Vovó, a senhora não tem noção de quanto tempoesperei pra revê-la novamente e comer essa galinhacaipira ensopada com batata e quiabo. A senhora temmãos divinas – disse Melanie, abraçando dona Zilda.

– Obrigada, Melanie. Quando a gente faz as coisaspondo o coração, tudo fica melhor – respondeu donaZilda.

- Ai, vovó, galinha caipira é tudo de bom. É muitomais gostosa, porque é criada solta no terreiro nabase do milho, bem ao contrário da galinha de granja,que em escala industrial é criada confinada e recebehorrores de hormônios pra ganhar peso e ir pra oabate em menos tempo. É a lógica capitalista do re-sultado a todo custo – comentou Melanie.

– É vero, minha filha – respondeu dona Zilda.Dona Zilda serviu os pratos à Melanie, seu Giusep-

pe e a si mesma. O almoço em família seguiu harmo-nioso.

Durante toda a tarde, Melanie cavalgou no Mon-tesquieu, um pangaré que morava no sítio, subiu namangueira, chupou várias mangas e ficou pensandona vida. De repente, ela começou a se lembrar de Ju-ninho, de Bárbara e dos bons momentos que eles pas-saram naquele sítio, como encontros da Família Pig-naton, das viradas de ano feitas naquele lugar. Uma

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nuvem de lágrimas inundou o rosto daquela jovem.Ela pôs para fora todo o seu pranto. Era apegadíssimaao irmão e à prima.

No fim da tarde o celular de Melanie tocou. Elaatendeu:

– Ei, Bebel. Como é que você vai, minha flor?– Vou muito bem. Fui aprovada no CEFET-ES, no

tecnólogo de Saneamento Ambiental. – Que legal, Bebel! Parabéns. Quando é que come-

çam as aulas?– Semana que vem. Eu soube que você passou em

sétimo lugar em Medicina na FCMV. É uma pena quenão vai poder fazer o curso, né?

– Não mesmo. Só se eu tivesse um pai rico prabancar. Mas eu posso tentar a FCMV pelo ProUnicomo uma alternativa se eu não passar nasuniversidades que escolhi pra tentar Medicina.

– Quais universidades?– A UFES, a UFF e outra a definir. – Não dá pra ficar presa numa só opção.– Mel, você tá aonde?– Tô aqui no sítio de vovô, em João Neiva. É um

milagre que meu celular esteja pegando na zona rurale você tenha conseguido falar comigo. Cheguei aqui evou ficar uns cinco dias.

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– Às vezes homem é atraso na vida da gente.– Depende do homem, Bebel. Isso é muito relativo.

A gente tem que saber escolher bem pra não dar decara com pessoas que só querem uma aventura ebrincar com nossos sentimentos. Como disse, meufoco é no estudo agora.

– É verdade, mas a gente não pode controlar o co-ração.

– Ai, Bebel, como que a gente quer controlar o co-ração, mas não consegue. Na época da escola, lembraquando a gente comprava as revistas de celebridadese essas revistas de adolescentes só pra pegar os pôste-res os atores da TV?

– Nossa, eu pregava as fotos do Henri Castelli naporta do guarda-roupa e as do Sérgio Marone na pa-rede do meu quarto. Enquanto isso, minhas colegasde escola colecionavam pôsteres desses pagodeiros,como Waguinho, Vavá, Belo, Salgadinho, AlexandrePires, Rodriguinho, Chrigor e principalmente Neti-nho, que as meninas sonhavam ter um dia de prince-sa. Como a gente tá ficando velha, né?

– É mesmo. E eu, Bebel, que suspirava por BrunoGagliasso. Meu Deus, que homem lindo! Aquelesolhos claros me fazem delirar. Pena que um monu-mento daquele só pode ficar no plano da nossa imagi-

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nação. Porque ele já é comprometido.– Aí, Mel, ficou sabendo que Bebeto e Melina tive-

ram uma briga feia e por causa disso ela sofreu umaborto?

– Meu Deus, eu temia que isso pudesse acontecer.Como que foi isso, Bebel?

– Foi por causa dos ciúmes da Melina, por acharque Bebeto tava chifrando ela. Quando Bebeto che-gou em casa, a briga começou, Melina fez um montede acusações. Bebeto se defendeu. A briga pegou fogoquando Melina pegou um vaso e quis atirar contraBebeto, que se esquivou. Então Melina pegou um pu-nhal e foi detida por Bebeto. Então ela viu que seuvestido tava manchado de sangue. Ele saiu de casa edeixou Melina sozinha Depois disso, Melina botouBebeto pra fora de casa, jogando as coisas dele nomeio da rua.

– Sinto muito pela Melina. Ela deve tá muito arra-sada. Perder um filho nessa situação não é brincadei-ra!

– Pois é, Mel. Sonhar não custa nada, nem tira pe-daço. Fico pensando em você, vestida de jaleco aten-dendo as pessoas. Você já escolheu a sua especializa-ção?

– Fico na dúvida entre pediatria e oncologia, que é

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o estudo do câncer.– Oncologia, por causa do seu pai, Mel?– Sim, se eu fosse médica, faria o possível para sal-

vá-lo. Mas o destino das pessoas pertence a Deus enesses casos, a medicina não pode intervir na Suavontade.

– Mel, agora tenho que desligar. Um beijo.– Outro, meu amor.

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CAPÍTULO 9 | QUARENTA VERSUS 60

MELANIE ESTAVA COM RODRIGO TOMANDO café da ma-nhã em sua casa. Na mesa, havia leite, achocolatado,um saco de pães, manteiga, queijo minas, presunto eaçucareiro. Ela lia lendo o jornal, na matéria sobre areserva de 40% das vagas para alunos de escola públi-ca. Ela falou com o amigo:

– Rodrigo, tá sabendo que na UFES vai ter cotas de40% para alunos de escola pública?

– Já não era sem tempo. Lembra quando no anopassado a gente protestou lá na UFES a favor das co-tas de 26% pra negros, 25% pra escola pública e 1%pros indígenas foi rejeitada duas vezes no CEPE. Deuaté quebra-pau entre os pró e anticotas.

– Apesar de estudar num cursinho que é o bam-bambã em aprovação em medicina, eu não me esque-ço de onde vim e de onde estudei. Todos os dias agra-deço a Deus pela oportunidade neste cursinho, quevai me ajudar a realizar o sonho de ser médica.

– Eu também agradeço a Deus por estudar no TU.Mas não dá pra aturar todo ano os cursinhos dispu-tando pra ver quem aprova mais na UFES, quemaprova mais em Medicina na UFES, quem ai tirar o

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primeiro lugar geral na UFES ou quem vai tirar o pri-meiro lugar em Medicina na UFES. O que seria dosdonos de cursinhos se o vestibular acabasse? As cotassão um freio nessa ganância dos tubarões do ensino.

– Lógico que os donos de cursinhos tão se descabe-lando, porque vão aprovar menos alunos e aprovandomenos alunos, terão menos material publicitário pradivulgação. É como a teoria do Tostines, onde se quersaber se os biscoitos Tostines vendem mais porquesão fresquinhos ou são fresquinhos porque vendemmais.

– E pensar que tem uma cláusula contratual queobriga a gente a ceder voz e imagem ao cursinho setirarmos o primeiro lugar geral.

– Faço ideia como a galera do PUPT e dos outroscursinhos populares tão felizes com esta vitória. Umavitória dos movimentos sociais. Tão importantequanto a implantação das cotas, esses mesmos movi-mentos não podem ficar acomodados a elas. Eles têmque lutar por uma educação de qualidade, mesmo agente sabendo que isso pode levar anos, quiçá déca-das.

– Creio que as cotas pra alunos de escola públicasão uma forma de valorizar o ensino público. E com avalorização da escola pública, por consequência, a

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qualidade do ensino melhorará. Flamarion estava impaciente, fumando charuto e

andando de um lado para outro da varanda de suamansão, na Ilha do Frade e falou alto:

– Maldita hora que vieram essas cotas. Porque ogoverno não melhora o ensino público, assim os alu-nos da rede pública poderiam disputar com os alunosda rede particular de igual pra igual? Isso é mais umamedida populista e assistencialista com fins eleitorei-ros.

Ele abriu a garrafa de Ballantine's, encheu o copo,pôs dois cubos de gelo, tomou e murmurou:

– A UFES tem que ser um centro de excelência,onde somente os melhores alunos devem estudarnela, pelos seus méritos pessoais e não se transfor-mar em um escolão de terceiro grau, onde alunos deescola pública, muitas vezes sem base para acompa-nhar os ensinamentos, vão acabar sucateando a uni-versidade, nivelando por baixo o ensino. Não é fun-ção da universidade promover justiça social.

Flamarion tornou a encher o copo de uísque e gri-tou:

- As cotas são uma migalha do governo aos pobres!Sem contar que essa decisão dos infernos vai fazer oLamarck perder muito dinheiro, pois com as cotas,

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teremos menos aprovações, principalmente emmedicina, nossa menina dos olhos e o pessoal daclasse média e média-baixa vai tirar seus filhos doLamarck e de outros colégios pra botar na escolapública. É o fim da picada!

Melina, a ex-namorada do Bebeto, morena clara,1,67 m, 20 anos, cabelos pretos, olhos castanhos e co-xas grossas, estava no salão para pintar o cabelo deacaju e fazer hidratação. O salão, chamado Neide'sCoiffeur, localizado em Santa Lúcia, estava cheio demadames e patricinhas cortando o cabelo, fazendoescova, fazendo luzes e hidratando o cabelo. Era sába-do, dia de maior movimento.

Neide, 40 anos, branca, baixa, magra e de cabelopretos e longos, mostrou o catálogo à Melina para queela escolhesse a tonalidade de acaju que ela pintaria.Ela falou com Melina:

– E aí, Melina, que tonalidade você vai pintar?– É essa aqui. Quero ficar poderosa pro casamento

da minha prima – respondeu Melina, apontando a coracaju.

– Mais uma vez a classe média se ferra. Agora comessa palhaçada de 40% de cotas pra alunos de escolapública, a três meses do vestibular e com renda fami-liar de R$ 2.660,00. 40% a três meses do exame? É

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uma sacanagem com os pais de alunos das escolasparticulares, que como eu, que se matam pra pagar asmensalidades pra garantir um bom ensino, já que aescola pública tá sucateada. Eu tenho uma filha, aDandara que tentar Direito e ela tá desesperada porcausa dessa presepada do governo – disse Neide, in-dignada.

– Com todo o respeito, Neide, acho que a UFES tácertíssima em implantar as cotas, porque lá só entrafilhinho de papai, principalmente nos cursos de Me-dicina, Direito e Engenharia. O ensino público tá su-cateado e os alunos que lá estudam ficam em desvan-tagem com os alunos de escola pública. Esse ano, tôfazendo vestibular pra Direito na UFES e até entreino cursinho TU, na turma de revisão intensiva à noite– respondeu Melina.

– Quem faz a escola é o aluno. Ele que faça poronde pra passar na UFES. O governo quer, atravésdas cotas estimular o comodismo e a vagabundagemdos alunos de escola pública, que não querem nadacom o estudo e ficam matando aula pra namorar oufumar maconha. Agora sabendo que tem cotas, nãovão mover uma palha pra se esforçar. E o mérito,onde fica? – disse Neide.

– Pensa naqueles alunos que têm que trabalhar pra

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sustentar a casa, naqueles alunos que tem encargosde família. Que tempo eles vão ter pra estudar? Hã?Você tá redondamente enganada. As cotas vão incen-tivar a galera da escola pública a estudar mais, vai ele-var a autoestima deles. Sabe de uma coisa, vamos dei-xar esse assunto de cotas pra outro dia e se concentreno meu cabelo. Hoje quero ficar poderosa e quemsabe, pegar algum gatinho – respondeu Melina?

Neide pôs o rabo entre as pernas e continuou pin-tando o cabelo de Melina.Nesse momento, chegouDandara, 17 anos, branca, estatura mediana, cabelospretos e cheia de curvas. Ela é a filha da Neide.

– Mãe, eu vou pro shopping passear com umasamigas – disse Dandara.

– Tá bom, filha. Mas vê se não chega muito tarde-respondeu Neide.

– Sim, mãe. Um beijo – disse Dandara.No estacionamento da UFES, havia uma grande

concentração de alunos de escolas privadas protes-tando contra a implantação de 40% de cotas para alu-nos de escola pública. Muitos estavam com narizes depalhaço, e vários alunos carregavam cartazes assimescritos:

"60% DAS VAGAS PARA OS PALHAÇOS", com odesenho de um palhaço indignado, com um capelo

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escrito em cima: UFES;“TODOS SÃO IGUAIS PERAN-TE A LEI”;

“Não somos contra as cotas, mas contra a reservade 40% a três meses do vestibular”

Um carro de som tentou entrar no campus, masfoi barrado pelos seguranças da Universidade e omesmo fica pelo lado de fora.

Jean, 20 anos, branco, estatura mediana, cabeloslisos era o representante dos alunos de escola priva-da, aluno do TU e candidato a uma vaga em Medici-na. Ele estava no carro de som, lendo o manifesto dasescolas privadas:

– Nós, estudantes aspirantes do ensino superiorpúblico e de qualidade, estamos cientes da dificulda-de encontrada pelos alunos da escola pública para al-cançar esse objetivo. Sabemos, contudo, que boa par-te dessa dificuldade é fruto da inoperância e da inefi-cácia do Estado em gerir uma escola pública de quali-dade. Nesse contexto, surgiu a política de cotas, queembora não seja a solução, pode amenizar um poucoessa problemática. Entretanto, reservar 40% das va-gas para alunos da escola pública, além de permiti-losconcorrer os outros 60% iniciais, é um equívoco…

Os alunos de escola pública vaiaram durante o ma-nifesto dos alunos da rede privada.Eles saíram do

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Teatro Universitário, que fica em frente ao estaciona-mento. Jean tentou retomar a leitura do manifesto:

- …ainda mais se analisarmos o fato de a decisãoser tomada há apenas três meses do vestibular. Assimsendo, apresentamos como contrapropostas: 1º – Re-definição para 10% na porcentagem das cotas; 2º –Rendimento familiar de até três salários-mínimospara concorrer às cotas; 3º – O candidato deve optarpelas cotas ou pelo sistema geral; 4º – Investimentono ensino fundamental e médio, por parte do gover-no; 5º – Fazer valer o artigo 208, cláusula V que diz:“acesso aos níveis mais elevados de ensino, (…) segun-do a capacidade de cada um”. Contamos com o apoioda sociedade, especialmente dos pais e alunos emprol da nossa manifestação.

Mais uma vez, os alunos de escola pública vaiaramo conteúdo do manifesto. Um carro de som chegoucom microfone para os alunos da escola pública. Co-meçou o confronto de alunos da rede pública e priva-da, respectivamente representados por Melina eViviane, cada qual em seus carros de som:

– Vocês são um bando de filhinhos de papai que ti-veram tudo de mão beijada, estudaram sempre emboas escolas. Pequenos burgueses de classe médiamimados e cheios de vontades. E porque não, reacio-

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nários? Tão desesperados, porque agora só vão ter60% de chances de entrar na UFES e a gente vai ter40%, que ainda tá pouco. Na verdade, tinha que ter100% de cotas pra escola pública! Vocês falam quetem que investir na base pra que todos os alunos pos-sam ter pé de igualdade. Mas esquecem que essas me-didas levam muito tempo e vocês acham que a gentepode esperar? Não dá pra esperar mais. Cotas já!

– Nem todo mundo que estuda em escola particu-lar é filhinho de papai, querida. Muitos pais passamum arrocho violento pra pagar as mensalidades numaboa escola, chegando a se privar de coisas pra si pró-prios. Outros, pelos méritos acadêmicos, por seremfilhos de professores ou funcionários ou por serematletas conseguiram bolsa integral ou de 50%. Eu voutentar Direito. Meus pais não teriam condições de ar-car com as mensalidades. Acho que a UFES não pen-sou nesses casos, por isso sou contra cotas para escolapública e sim a favor das cotas por renda.

– Acontece que vocês tiveram boas oportunidadeseducacionais que a gente não teve. É uma disputa de-sigual. Muitos tem que trabalhar e estudar e não temtempo pra ter uma boa preparação pro vestibular.Perguntar não ofende: cadê os donos dos cursinhosque vocês estudam? Porque eles não vieram pra pro-

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testar? Horda de alienados, massa de manobra! Des-culpa, galerinha da particular. Perdeu, playbozada!Perdeu, pattyzada!

– E daí? Impor cotas a três meses do vestibular ésacanagem. A cota é desculpa do governo pra não me-lhorar a qualidade do ensino público. E outra: inde-pendente de ser escola pública ou privada, dependeda força de vontade do aluno passar na UFES.

– Faça-me o favor! Se força de vontade fosse fatorindispensável para aprovação em vestibulares, nãoexistiriam cursinhos pré-vestibulares que se alimen-tam dos sonhos de jovens que querem entrar nas uni-versidades, tampouco existiriam cotas! Você acha quetô fazendo cursinho pra passar o tempo? Não! É praatenuar as deficiências de base no ensino público es-tadual. Afinal, você sabe pra que serve o vestibular?Serve como um funil social para não para selecionaros alunos mais aptos, mas sim para favorecer o candi-dato treinado pela escola privada top ou que fez umcursinho caríssimo. Das duas uma: a prova da UFES épautada no conteúdo das escolas particulares ou oscurrículos das escolas particulares são pautados pelovestibular da UFES, mas seja o que for, o conteúdo éextenso, cansativo e beneficia quem estudou na redeparticular. E lá vem outra lapada: porque boa parte

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dos alunos de escola particular não passa de primeirano vestibular? Porque no terceiro ano não têm matu-ridade pra escolher uma carreira e fazer o vestibular.E os donos de cursinhos agradecem, porque pra elesvestibular é igual carnaval: tem todo ano.

Os estudantes da rede pública fizeram uma peque-na assembleia no estacionamento, o movimento darede particular seguiu para o prédio da reitoria. Às 17horas, com os ânimos mais calmos, um segurança daUFES anotou nomes das lideranças das duas redes,que escolheram representantes conversar com o vice-reitor. Melina e Jean foram os escolhidos. Enquantoaguardavam o fim da reunião, alunos organizaramum debate, com dois minutos para que cada interes-sado defendesse seu ponto de vista.

Melanie chorava no banheiro feminino, bastantemagoada. Entrou Flávia, 19 anos, negra, pequenini-nha, magrinha, cabelo cacheado. Ela era bolsista daturma de humanas e tentaria Direito na Ufes e Rela-ções Internacionais na UFF e encontrou Melanie na-quele estado.

– O que aconteceu, Mel? Porque você tá aqui cho-rando? - perguntou Flávia.

– Não é nada, não – respondeu Melanie – que nãoconseguia disfarçar as lágrimas.

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– Fala a verdade, amiga. Pode desabafar comigo –disse Flávia.

– Promete não comentar a ninguém, nem mesmopro Marcelo? - perguntou Melanie.

– Prometo – respondeu Melanie.– Passei pelo corredor e ouvi as meninas falando

que jamais se consultariam com qualquer médico queentrou na faculdade de Medicina por causa das cotas,que nós, cotistas vamos nivelar por baixo o curso deMedicina, aumentando o número de maus médicosque cometem erros e que cotistas são sinônimo de in-competência – disse Melanie, chorando.

– Essas patricinhas fúteis falam muita besteira, sótem dois neurônios. Pra elas é fácil julgar quando sepode estudar em boas escolas, fazer viagens à Disney,ter curso de inglês, intercâmbio no exterior, mesadatoda semana pras micaretas. Pra você ter ideia, só fuinuma, porque minha irmã trabalha na empresa orga-nizadora o evento. Desconhecem o fato de você ser defamília humilde, moradora de um bairro periférico ede ter estudado toda a vida em escola pública. Vocêquer ser médica porque ama a profissão. Elas só que-rem fazer medicina só pra fazer a vontade dos pais oupra ter status e poder – respondeu Flávia, indignada.

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CAPÍTULO 10 | O VESTIBULAR TÁ AÍ

A ROTINA MASSACRANTE DOS ESTUDOS para o vestibulare as pressões por resultados dentro do Lamarck afe-tou seu comportamento, deixando-a insuportável, aponto de gritar com a mãe, porque ela havia entradono quarto. Sem contar que ela engordou uns dez qui-los. Ela que sempre foi magrinha, sentia que estavaem forma de baleia.

Mudanças de comportamento ocorreram em vir-tude do ano de vestibular, ainda mais quando a can-didata tentaria curso mais concorrido da UFES e apressão é maior quando ela é bolsista. Até a mais gra-ciosa das meninas estava sujeita a ter acessos de fúriaem razão do vestibular.

Melanie empenhava-se ao máximo com os estudospara o ENEM. Ela tinha consciência da importânciadeste exame, pois ele valia 25 % da nota do vestibularda UFES ou até mesmo uma bolsa integral para Medi-cina pelo ProUni ou Nossa Bolsa. Todos os dias, Mela-nie lia jornais e revistas para estar atualizada, umavez que o conteúdo do ENEM se pautava nas atuali-dades.

Todos os finais de semana que antecederam o

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ENEM, os alunos tiveram aulões preparatórios. Acada simulado do exame federal, Melanie demonstra-va bons resultados, às vezes nas primeiras colocações,o que a deixava muito mais confiante para o vestibu-lar.

Conforme combinado, Melanie entregou os bole-tos de inscrição da UFES e da UFF para pagamento àsecretária do Marcelo.

Começou a revisão para a primeira etapa da UFES.A sala estava cheia e Melanie estava atenta às explica-ções. Acerola resolvia com a turma os exercícios deBiologia:

– Abram na página 144, na questão 12, da PUC deMinas...

No TU, Rodrigo ouvia as explicações dos professo-res, principalmente de Física e Matemática. Quandochegou a aula de História com Rosemary, 44 anos,branca, baixa e loira, Rodrigo dormiu na aula. Rose-mary corrigiu questões objetivas.

Melina, que estava à sua frente percebeu e o cutu-cando, disse:

– Rodrigo, você dormiu bem hoje?– Dormi, por quê?– Você tava deitado na aula de Rosemary.– A aula de História é um pé no saco e com ela fica

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pior ainda. Tomar vodca dá mais prazer que essa por-caria dessa loira falsificada e sua matéria.

– Eu não gosto dela, mas sou obrigada a assistirsua aula pra passar na UFES. É normal, que por vocêser da área de exatas, não ligar pras matérias de hu-manas, mas infelizmente elas são cobradas no vesti-bular e podem ser a diferença entre a classificação ounão pra segunda etapa.

– Eu não deixo de estudar as matérias de huma-nas, só não gosto de estudar História e dessa tal Rose-mary. Tomara que nenhum engraçadinho tenha mefilmado e posto no YouTube.

– Tá bom, então. Só quis te dar um toque pra teajudar.

– Valeu, Melina.Melanie, vestida com a camisa azul-marinho com

o logo do Lamarck e a inscrição abaixo: VEST 2008,estava almoçando na mesa e tomando refrigerante.Ela escovou os dentes e passou o fio dental. Abriu agaveta da cômoda, pegou a ficha de inscrição, o RG, apochete com caneta, borracha e lapiseira, passou umcreme de pentear, penteia o cabelo, passou brilho noslábios e calçou um tênis.

Ela chegou ao seu local de prova, no CT 3 da UFES.Logo, foi abordada pelos professores do CCC, que lhe

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dão a famosa sacolinha com informativos e gulosei-mas. Os candidatos começaram a chegar. Melanieveio em seguida.

Minutos depois, o fiscal distribuiu a prova.Em se-guida, o fiscal pôs alguns avisos no quadro sobre oinício e término da prova.Quando deu 14 horas, ele fa-lou:

– Podem começar a prova.Melanie começou a prova pelas questões de huma-

nas, que ela julgava ser as mais fáceis, conseguiu re-solver com aparente tranquilidade. Baixinho, ela fa-lou:

– Essas questões de História com essas exigênciasde datas, troço nada a ver. Não é à toa que os profes-sores do Lamarck criticam a banca da UFES.

Quando entrou nas questões de exatas e biomédi-cas, a situação complicou. Melanie começa a suar frio.

“A prova objetiva da UFES tá o cão chupando man-ga. As questões de Biologia tão cheias de pegadinhas”- pensou Melanie.

Quando terminou de preencher o gabarito ao fis-cal e saiu da sala.

Barracas de vários cursinhos e escolas particularesestavam montadas, no estacionamento da UFES, comágua mineral e picolé de graça. Ela foi à barraca do

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TU e encontrou Rodrigo.– Oi, Rodrigo – disse Melanie, abraçando e bei-

jando o amigo.– Melanie, que bom te ver de novo – respondeu Ro-

drigo.– A prova tava terrível, com muitas questões cabu-

losas. Minha cabeça ia explodir – disse Melanie.– Pra mim, o que pegou foram as questões de His-

tória. Deus me livre! – respondeu RodrigoPaulo André falou com Melanie:– Melanie, eu preciso ver a sua prova. Há duas

questões de Biologia que pediremos anulação. E ain-da temos que corrigir a prova pro jornal de amanhã.

– Pode levar, mas me devolve.– Tá bom, Melanie. No dia seguinte, Marcelo convocou uma reunião

com os alunos de 3º ano e pré-vestibular. Melanie estásentada na frente junto com Flávia. Ela falou:

– Bom dia, gente.– Bom dia.– Tenho duas boas notícias. A primeira é que pro-

vavelmente os pontos de corte poderão cair em virtu-de do nível elevado da prova e a outra boa notícia éque pediremos os anulação de uma questão e mudan-ça de gabarito.

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Burburinho entre os alunos.Dias depois, saiu o resultado da 1ª etapa da UFES.

Rodrigo foi ovacionado pelos colegas e professorespelo primeiro lugar em Engenharia Elétrica. Melinatambém foi aprovada em décimo quinto lugar em Ad-ministração. Ela correu para abraçar Rodrigo.

No Lamarck, Melanie ficou contente quando viuseu nome na lista de aprovados para a segunda etapaem Medicina. Flávia, que estava junto à bonequinha,foi aprovada em Direito. As duas se abraçaram.

De repente, Marcelo chegou com a boa nova:– Melanie, você foi aprovada em Medicina na UFF.

E Flávia, parabéns pelo quinto lugar em Relações In-ternacionais na UFF.

– Meu fim de semana não podia ser melhor. Apro-vada na primeira etapa na UFES e na UFF – disse Me-lanie.

– O meu também, Melanie - respondeu Flávia.Melanie fez as provas da 2ª etapa(Redação, Quími-

ca e Biologia) da UFF. Na redação, haviam dois temase o candidato tinha que escolher um para discorrer.Ela escolheu falar sobre o acesso a bens culturais como advento da internet e das novas tecnologias de re-produção. Na prova de Química, caíram duas de or-gânica, que ela não teve dificuldades pra resolver. A

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primeira questão de Biologia achou complexa de re-solver. As outras quatro conseguiu resolver semmaiores dificuldades.Dias depois, Melanie fez as provas da 2ª etapa da

UFES. No domingo, ela fez a redação. Três temas: pri-meiro, quanto à opinião do candidato quanto às co-tas. A segunda era uma reportagem e a terceira, eraum texto narrativo. A prova de Química, para a baixi-nha foi um pouco puxada, mas a de Biologia, ela tiroude letra.

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CAPÍTULO 11 | A HORA DA VERDADE

MELANIE TINHA INSÔNIA POR CAUSA da ansiedade. Elapassou por uma noite terrível. Tentava lutar contra afalta de sono, mas seus esforços eram em vão.

A UFF liberou há poucos dias o resultado final e elaficou em 296º lugar, ou seja, na lista de suplentes, jáque Medicina na UFF tem 160 vagas. O medo de nãoconseguir passar nem mesmo pela reserva de vagasda Federal capixaba angustiava Melanie. Ela não foiselecionada para Medicina pelo ProUni.

No Enem, Melanie tirou 80 (soma da prova objeti-va com redação dividido por dois). Porém o cortepara bolsa integral em Medicina era superior a 90.Mas ela havia sido selecionada para a bolsa integralpara Enfermagem na FUV pelo Nossa Bolsa. Teve adocumentação aprovada e estava matriculada.

Darlene viu a aflição da filha deitada no sofá, ven-do TV e disse:

– É, Melanie. A sua angústia me angustia. Pelo vis-to você não dormiu direito, né?

Como se pode dormir diante da incerteza da apro-vação. Pra passar o tempo, fiquei vendo TV. A barrigachega a dar embrulho.

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– Eu imagino. Pra você foi um ano terrível, depressões de todos os lados. Chegou uma hora quevocê tava surtando. Ninguém quer saber que você éapenas uma menina. Só querem o resultado e acabou.Uma tremenda máquina de moer gente chamadavestibular.

– Não vejo a hora de liberarem a lista de aprova-dos. Assim diminui o meu suplício.

– Só assim o seu coração aquieta. Como diz GalvãoBueno: é teste pra cardíaco.

– Não sei se o meu coração vai aguentar diante detanta aflição. Acho que ele vai sair pela boca.

– Calma, Melanie. Também não é assim.Melanie misturou o Toddy ao leite para tomá-lo

com a broa de fubá. Era o seu café da manhã.Na UFES, os funcionários da CCV afixaram nas

paredes a relação dos aprovados no vestibular2008/1.Em minutos, candidatos de todos os cursi-nhos chegaram para ver o resultado. Nas paredes, aslistas de aprovados para as vagas oferecidas dos 66cursos oferecidos pela Universidade para aquele anode 2008. Choros de alegria e tristeza para uns e ou-tros.

Dos 10.326 candidatos classificados para a segun-da etapa do vestibular da UFES(de um total de 20.466

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inscritos) foram aprovados 3.015, sendo que 794 pas-saram pelas cotas.

No Lamarck, os alunos de 3º ano e pré-vestibularchegavam muito apreensivos, principalmente, os alu-nos que tentaram Medicina. Boa parte dos colegas(econcorrentes de turma) de Melanie estavam comsemblante de insônia. Melanie foi à parede onde esta-va a lista dos aprovados em Medicina. Seu coraçãoacelerava a cada segundo, prestes a explodir. Quandoviu seu nome na lista de aprovados, em 38º lugar, elachorou de alegria.

Uma nova fase começou na vida de Melanie. Apósum ano de privações e sofrimentos, ela se tornou alu-na da 82ª turma de Medicina da UFES.

Melanie ligou para a mãe:– Alô, mãe. É a Melanie.– Oi, Mel.– Eu passei em Medicina na UFES. Vou poder rea-

lizar meu sonho de ser médica.– Parabéns, Mel. Eu tô tão feliz por você.– Obrigada, mãe. Te amo.– Eu também te amo.Os professores do TU rasparam o cabelo de Rodri-

go. Ele foi fotografado por Luan, o assessor de comu-nicação e marketing do cursinho. Rodrigo tirou o pri-

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meiro lugar em Engenharia Elétrica e o 3º lugar geralem Exatas. Essa foto iria para o anúncio dos jornaisde amanhã, tornando-se o garoto propaganda do cur-sinho.

Melina estava eufórica pela aprovação em Direito.– Cara, não acredito. Se isso é um sonho, alguém

me belisca – disse.Rodrigo ouviu, beliscou Melina e falou:– É verdade sim. Você foi aprovada em Adminis-

tração.– Agora vou de alma lavada pra curtir o carnaval

em Porto Seguro – gritou Melina. – Parabéns pelo primeiro lugar em Engenharia

Elétrica, Rodrigo– Obrigado, Melina.Melina tirou da bolsa a câmera e fez uma foto dela

abraçada com Rodrigo.Na porta do Lamarck, os colegas de Melanie pinta-

ram seu rosto e escreveram com batom em sua testa“MEDUFES”. Flávia a abraçou e disse:

– Parabéns pela aprovação, Melanie. Não passeiaqui na UFES, mas passei na UFF. Serei uma interna-cionalista.

– Obrigada, Flávia – respondeu Melanie.Em seguida, veio Marcelo, que também abraçou

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Melanie e disse:– Parabéns, Dra. Melanie Coser Pignaton. Você sa-

bia que tirou o 1º lugar entre todos os alunos cotistasde Medicina?

– Não. Cadê o Flamarion? – perguntou Melanie.-Ainda tá viajando pela Europa, mas ele já tá sa-

bendo e te mandou os parabéns – respondeu Marcelo.Rodrigo veio do TU para abraçar Melanie, falando:– Deus nos abençoou. Serei engenheiro eletricista

e você vai ser uma médica.– É verdade, Rodrigo. Ele é fiel e infalível – respon-

deu Melanie, chorando.– Foi um ano terrível, mas no fim vencemos – disse

Rodrigo.– E como foi, meu bem. Foi o Senhor que me sus-

tentou pra que eu fosse adiante no meu propósito deentrar na UFES depois que perdi meu irmãozinho eminha prima que amava tanto. Onde quer que elesestejam, ficaram felizes com a vitória que Deus medeu. – disse Melanie.

– Há algum tempo que precisava dizer algo – disseRodrigo.

– Pode falar, querido – respondeu Melanie, comum sorriso.

– Você me encanta com sua voz e seu jeito meigo.

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Eu tô apaixonado por você. Só você faz a minha vidater sentido.Quero construir a minha vida ao seu lado.- disse Rodrigo.

– Ai, que fofo – disse Melanie, acariciando as mãosde Rodrigo.

Rodrigo se aproximou de Melanie e lhe deu umbeijo na boca. Melanie abraçou forte Rodrigo e lhebeijou a boca. Os alunos do Lamarck ovacionaram onovo casal.

FIM

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Autor e Obra

Maxwell dos Santos nasceu em Vitória/ES em 1986 emora na referida cidade, no Bairro da Penha. É jorna-lista (MTE/ES 2605), escritor e roteirista audiovisual.Em 2012, publicou seu primeiro livro impresso, As 24horas de Anna Beatriz. Em 2013, publicou os e-booksIlha Noiada e Melanie – uma história de amor e superaçãoe em 2014, publicou os e-books Amyltão Escancarado eComensais do Caos, lançado posteriormente em livrofísico em janeiro de 2015. Em 2015, lançou o e-book elivro #cybervendetta.

Contribua com o autor

Se você gostou da obra e quer contribuir financeira-mente com o autor para que este contuinue escreven-do, faça um depósito de qualquer valor nas seguintescontas:

Caixa Econômica FederalAg.0823 Op.023 C/C 00008123-3Maxwell dos Santos

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MELANIE

Melanie, uma bonequinha de tão pequena, meiga e carinhosa

com todos que a cercam. Tem 18 anos e mora no Bairro da

Penha. Ela tinha o sonho de cursar Medicina, mas não podia

arcar com os custos de uma faculdade de Medicina.

Certo dia, Melanie e Juninho foram com Bárbara, prima deles

por parte de pai à Pizzaria Mamma Mia, em Jardim da Penha. Na

volta, Bárbara parou no Posto 3 Irmãos, no cruzamento

da Reta da Penha com a Rua Dona Maria Rosa para

abastecer. De repente, um Golf e um Audi A3 que vinham a

140 km/h invadiram o posto, atropelando e matando

Bárbara, Juninho, Carlinhos, o frentista.

Melanie deu a volta por cima, se empenhando nos

estudos e ainda ganhou uma bolsa integral para estudar

na turma de medicina de um curso campeão de aprovações

na área biomédica, o Lamarck.

Este livro visa alertar aos jovens sobre os efeitos devastadores

do binômio álcool-direção elutar contra a impunidade nos

crimes de trânsito.