médico. omissão de socorro

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Limites e Consequências Criminais Acerca da Omissão de Socorro no Exercício Profissional da Medicina * Clessius Cavassin Jayme Sumário: 1 Introdução; 2 Os Principais Episódios Históricos para o Aclaramento do Atual Panorama Legislativo Médico; 2.1 O Código de Hammurabi; 2.2 Grécia; 2.3 Direito Romano. Lex Aquilia de Damno; 2.4 França; 2.4.1 Parecer do Procurador-Geral da Câmara Civil da Corte de Cassação de Paris, André Marie Jean-Jacques Dupin, 20 De Maio De 1836; 3 Da Evolução Histórica dos Crimes de Omissão de Socorro; 3.1 Apanhado Desde d Metade do Século XX; 3.2 Abordagem nos Dias Atuais; 3.2.1 Crimes Omissivos Impróprio/Comissivo por Omissão; 3.2.2 Crimes Omissivos Próprios; 3.3 Atual Situação do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro; 4 Interpretação do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro e Artigo 33 do Código de Ética Médica; 4.1 Análise Literal do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro; 4.2 Análise Literal do Artigo 33 do Código de Ética Médica; 4.3 Interpretação Combinada dos Artigos 135 do Código Penal e do Artigo 33 do Código de Ética Médica; 5 Interpretação do Tipo mais Benéfico ao Denunciado; 6 Conclusão; 7 Referências. ___________________________ * As páginas seguintes tem como origem a monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito no ano de 2013, sendo atribuída nota máxima, tendo como orientação a Profª Patrícia Regina Piasecki.

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Limites e Consequências Criminais Acerca da Omissão de Socorro no Exercício

Profissional da Medicina *

Clessius Cavassin Jayme

Sumário: 1 Introdução; 2 Os Principais Episódios Históricos para o Aclaramento do

Atual Panorama Legislativo Médico; 2.1 O Código de Hammurabi; 2.2 Grécia; 2.3

Direito Romano. Lex Aquilia de Damno; 2.4 França; 2.4.1 Parecer do Procurador-Geral

da Câmara Civil da Corte de Cassação de Paris, André Marie Jean-Jacques Dupin, 20

De Maio De 1836; 3 Da Evolução Histórica dos Crimes de Omissão de Socorro; 3.1

Apanhado Desde d Metade do Século XX; 3.2 Abordagem nos Dias Atuais; 3.2.1

Crimes Omissivos Impróprio/Comissivo por Omissão; 3.2.2 Crimes Omissivos Próprios;

3.3 Atual Situação do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro; 4 Interpretação do Artigo

135 do Código Penal Brasileiro e Artigo 33 do Código de Ética Médica; 4.1 Análise

Literal do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro; 4.2 Análise Literal do Artigo 33 do

Código de Ética Médica; 4.3 Interpretação Combinada dos Artigos 135 do Código Penal

e do Artigo 33 do Código de Ética Médica; 5 Interpretação do Tipo mais Benéfico ao

Denunciado; 6 Conclusão; 7 Referências.

___________________________

* As páginas seguintes tem como origem a monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito

da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel

em Direito no ano de 2013, sendo atribuída nota máxima, tendo como orientação a Profª Patrícia Regina

Piasecki.

1. Introdução. A omissão de socorro nunca esteve sedimentada na dogmática jurídico

penal. Durante os séculos, tal instituto esteve na corda bamba entre a moral social e os

princípios penais. Quando a omissão de socorro se encontra com a medicina, pratica

profissional com alto grau de peculiaridades, causa instabilidade na sociedade. Ao

médico, que além da pressão inerente a profissão, acaba se vigiando em suas ações

devido aos ordenamentos que o observam e regem, no caso o Código Penal e o

Código de Ética Médica. Dois ordenamentos distintos, e também a interpretação da

omissão de socorro. O primeiro mais rigoroso o segundo, aplicado pelos pares do

profissional, mais brando, e sociedade julgadora, geralmente posta como vítima da

situação, resta as duras críticas a ambos ordenamentos. Através das doutrinas e

jurisprudências, tanto dos tribunais de justiça, quanto dos éticos-disciplinares, buscou-

se a melhor interpretação e aplicação da omissão de socorro especificamente aos

médicos. Após uma análise separada do Art. 135 Código Penal e do Art. 33 Código

Ética Médica, ambos foram interpretados conjuntamente, após, foi aplicado as três

grandes especialidades da medicina, interpretando de forma distinta o disposto legal

para cada uma, sempre observando o caso em concreto. Palavras-chave: Omissão de

Socorro. Medicina. Código Penal. Código de Ética Médica.

2. Os Principais Episódios Históricos Para O Aclaramento Do Atual Panorama

Legislativo Médico. Passados pouco mais de uma década do novo século,

começamos a ‘olhar para trás’ e observar as diversas consequências do século XX.

Dentre elas, uma espantosa explosão tecnológico/científico, nunca vista na história

humana, nos levou, dentre outras diversas conjunturas, a uma modificação significativa

das relações sociais, consequentemente, essa geração que agora entra no mercado de

trabalho cresceu escutando de seus pais uma frase curiosa: ‘na minha época’.

Referida expressão, praticamente tem local e tempo certo para ser pronunciada

pelos pais aos filhos, seja qual, a sala de espera de um consultório médico após uma

consulta de durou aproximadamente 10(dez) minutos, que irá continuar: ‘antigamente,

o médico conhecia toda a família, era de casa, passava a tarde toda atendendo seus

avós e tias, sabia do problema de cada um como seu fosse... ’, e por ai se alastrava a

explanação da antiga relação entre médico e paciente.

Porém, os acontecimentos nos levaram a uma proximidade instantânea com o

outro, ao mesmo tempo, as relações sociais em algum momento foram esquecidas,

forçando as relações que historicamente eram familiares, na amplitude da expressão,

para mera prestação de serviço. A afinidade do médico com o paciente foi modificada,

quase que esquecida, transformando o paciente de ontem no cliente do amanhã.

Não se trata aqui de aferir culpa a alguma das partes e sim visualizar os fatos. O

paciente a se ver na condição de cliente, somado a sua atual capacidade de chegar a

uma brutal carga de informação, consequentemente o levou a um exercício

questionador, exigente na qualidade do serviço que lhe seria prestado, enfim, um

sujeito de direito e com disposição efetiva para exercê-lo, se deparou com um Poder

Judiciário de portas abertas, lhe oferecendo advogados gratuitos (defensoria pública) e

isenção total de custas processuais. O palco estava armado, atores prontos e ao abrir

das cortinas o público testemunhava a “Cataratas do Iguaçu” dos processos, na versão

Paciente versus Médico.

Dados do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP)

apontam que entre 2001 e 2011 o número de processos médicos por infrações ético-

disciplinares aumentou 302%1, dentre as principais causas, acreditam estar à maior

conscientização da população e pacientes em buscar seus direitos.

Não obstante, a classe médica foi para defesa de seus pares, alegando as

condições precárias de trabalho, baixos salários e as demais situações que estariam

prejudicando consideravelmente o seu rendimento. Dentre todas as admoestas, uma

angariou destaque no ranking das esburgas apontadas pela classe para o seu melhor

desempenho, o amontoado de leis, normas, diretrizes dentre outras que regulam a

atividade médica.

Os médicos pedem um tratamento diferenciado dos normativos legais devido as

peculiaridades da atividade, além de um tribunal especializado, composto por médicos

para julgar as causas que estariam envolvidos devido ao seu exercício profissional.

Tais demandas vêm acompanhadas de um discurso que atualmente haveria uma

vontade social para legislar o tema.

1 Disponível em: <<

http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=NoticiasC&id=2574>>. Acesso em: 13 de agosto de 2013 às 17h40m.

Porém, a vontade de legislar a prática médica remonta ao tempo mais primórdio,

praticamente nasceu junto com a atividade profissional, a polêmica que nos deparamos

hoje é apenas uma decorrência natural da nova relação entre médicos e pacientes. O

que colocou o atual arcabouço legislativo vigente a prova das novas demandas sociais,

mas não que agora tenhamos nos deparado com uma “vontade legislativa”.

Muito embora que em épocas longínquas o exercício da medicina estava ligado

às questões religiosas, estando o médico a ser condicionado a uma vontade divina,

estando na posição de intermediário entre homem e Deus, daí a ser chamado de

“semideus”, essa atividade nunca passou despercebida pela lei. Assim vejamos.

2.1. O Código de Hammurabi. Muitos são aqueles que creditam ao Código de

Hammurabi como o primeiro marco para o início da legislação médica, disciplinando os

honorários e sanções aos erros cometidos no exercício médico.

Porém, muito antes, diversas comunidades já haviam demonstrado interesse em

buscar uma normatização para à atividade “divina”, como apresenta exemplar

ensinamento da Professora HildegardTaggesellGiostri:

Pelo trabalho dos arqueólogos e historiadores sabe-se, hoje, que o

código de HAMMURABI não é a mais antiga codificação de que se tem

notícia; bem assim, que ele porta não apenas sentenças concretas

ditadas por aquele rei, mas, também, formulações legais recebidas por

tradição de outros ordenamentos que lhe precederam.

E ainda, complementa:

O corpo de Leis do rei URUKAGINA de Lagos, no terceiro milênio da

era pré-cristã3; a coleção de Leis do rei UR-NAMU (2111-2084 a.C.),

que no seu artigo 625, referia-se à responsabilidade médica4; o código

de LIPSIT ISTHAR de Isin (1934-1924 a.C.) e, por último, as Leis de

Eshnumma, do rei DADUSHA (1875-1787 a.C.)5, são ricos exemplos

que precederam a codificação de HAMMURABI e, com certeza, lhe

serviram de base compilatória para posterior desenvolvimento.2

Por óbvio, o Código de Hammurabi, não abrangeu o pioneirismo do tema, e sim

foi uma consequência natural de todo o movimento que buscava a melhor maneira para

tratar da atividade médica.

As penalidades aplicadas no Código de Hammurabi, se vistas aos olhos do

século XXI podem até parecer bastante severas, mas, se olharmos como os médicos

eram punidos anteriormente e em outras localidades, observará que o referido código

se adéqua aos critérios temporais, então vejamos:

Entre os povos antigos, há notícias de que os visigodos e os ostrogodos

entregavam o médico à família do doente falecido por suposta imperícia

para que o justiçassem como bem entendessem. Outros códigos

antigos, como os livros dos Vedas e o Levítico, já estabeleciam penas

2GIOSTRI, HildegardTaggesell. Erro médico à luz da jurisprudência comentada. 1

a ed., 2

a tir. Curitiba:

Juruá. 1999. Pg.27

para os médicos que não aplicassem com rigor a medicina da época. E,

assim, poderiam eles ter as mãos decepadas ou perder a própria vida

se ficasse cego ou viesse a falecer o paciente, quando este fosse um

cidadão e, se escravo fosse, indenizariam o senhor com outro servo.

Entre os egípcios, havia a tradição de punir o médico quando ele se

afastava do cumprimento das normas e, ainda que o doente se

salvasse, estaria o médico sujeito a penas várias, inclusive a de morte.3

Dessa forma, fica impossível crivar o exato momento histórico em que o Direito,

como instrumento normalizador, se deparou com a necessidade de tutela da atividade

médica.

De qualquer forma, o Código de Hammurabi teve fundamental importância para

a legislação médica, pois dos seus duzentos e oitenta e dois artigos, dedicou nove para

o tema.

Entre os artigos 215 a 2234 do Código, podemos observar a característica da Lei

de Talião “olho por olho e dente por dente”, porque se um médico causasse danos para

3Gomes, Júlio Cézar Meirelles, José Geraldo de Freitas Drumond, e Genival Veloso de França. Erro

Médico. 4. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. Pg. 7

4215. Se um médico fizer uma grande incisão com uma faca de operações e curar o paciente, ou se ele

abrir um tumor (em cima do olho) com uma faca de operações, e salvar o olho, o médico deverá receber

10 shekels em dinheiro. 216. Se o paciente for um homem livre, ele receberá cinco shekels. 217. Se ele

for o escravo de alguém, seu proprietário deve dar ao médico 2 shekels. 218. Se um médico fizer uma

larga incisão com uma faca de operações e matar o paciente, ou abrir um tumor com uma faca de

operações e cortar o olho, suas mãos deverão ser cortadas. 219. Se um médico fizer uma larga incisão

no escravo de um homem livre, e mata-lo, ele deverá substituir o escravo por outro. 220. Se ele tiver

aberto o tumor com uma faca de operações e Ter tirado o olho (do tumor) ele deverá ser pago a metade

um homem livre perderia a mão,assim ficando impedido de prejudicar mais alguém,

caso o dano fosse causado em um escravo, o médico ficaria obrigado a reparar na

medida do dano causado.

O Código de Hammurabi deixou a sua considerável contribuição para o avanço

da legislação médica, além de trazer um destaque em seu código ao tema, enfrentou

assuntos como o da remuneração pelos serviços prestados pelo médico, tentando

objetivar o serviço prestado e o shekel5 correspondente. Essa característica influenciou

as decorrentes legislações como veremos.

2.2. Grécia. Foi na Grécia onde se deu uma passagem histórica da penalidade do

médico por omissão de socorro, imagina ser a maior punição e a mais conhecida por

tal crime:

Conta-se que a mando de Alexandre Magno foi crucificado Glauco,

médico de Efésio, por haver este sucumbido em consequência de uma

infração dietética enquanto o médico se encontrava num teatro.6

do valor contratado.221. Se um médico curar um osso quebrado ou uma parte maleável do corpo

humano, o paciente deverá pagar ao médico cinco shekels em dinheiro. 222. Se ele for um homem

libertado, ele deverá pagar três shekels. 223. Se ele for um escravo, seu dono deverá pagar ao médico

dois shekels.

5 “... shekels eram uma unidade de peso, usado assim como outras unidades, como gramas e onças,

para negociação antes do surgimento das moedas.” Disponível em:

<<http://pt.wikipedia.org/wiki/Shekel>>. Acesso em: 14 de março de 2013. 6Gomes, Júlio Cézar Meirelles, José Geraldo de Freitas Drumond, e Genival Veloso de França. Erro

Médico. 4. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002. Pg. 7

Porém, a Grécia se redimiu da decisão arbitrária de maneira histórica, foi nessa

mesma época onde a razão se afastou dos fatores místicos e começou a se olhar por

ela mesma, buscando a ciência como fonte independente para solução e explicação do

mundo.

Momento em que a medicina, a partir das doutrinas filosóficas, foi se afastando

do empirismo e buscando a racionalidade. Dessa forma, a revolução do saber teve

fundamental importância na responsabilização do médico, assim ilumina Eduardo

Vasconcelos dos Santos Dantas:

Antes culpado pelo insucesso de suas interferências sob qualquer

condição, o profissional da medicina – sob a égide dos ensinamentos de

Platão e Aristóteles – passou a ser responsabilizado não mais pelo

resultado em si, mas por sua conduta profissional, por sua atitude de

acordo com cada caso concreto.A culpa médica, para ser atestada,

deveria ser objeto da análise de outros profissionais que, em colegiado,

emitiriam seu parecer. A culpa, portanto, só seria declarada se

houvesse desatenção aos preceitos ou descumprimento das práticas e

procedimentos médico-sanitário usualmente aceitos à época.7

Esse foi o marco inicial para visualizarmos que a obrigação de fazer do médico

era de meio, e por ela estaria responsabilizado. Visualizamos que os atos médicos tem

7Disponível em: <<http://jus.com.br/artigos/4288/aspectos-historicos-da-responsabilidade-civil-

medica#ixzz2b81waOn8>>. Acesso em: 02 de agosto de 2013.

limites, além da diversidade biológica de cada indivíduo, em outras palavras, cada

sistema biológico pode reagir de forma diferente ao mesmo tratamento médico.

Foi apenas nessa fase que adquirimos essa percepção, que o médico não era

um “semideus” e quando não curava, mesmo seguindo toda a literatura, o tratamento

poderia falhar por vontade alheia.

Percebemos, a partir de então, que mesmo passados cerca de dois mil e

quinhentos anos, esse critério para chegarmos ao médico como responsável

permanece vivo em nossas legislações.

2.3. Direito Romano. Lex Aquilia De Damno. A Lex Aquiliaé conhecida pelos avanços

na disciplina da responsabilidade civil, e é nessa época, que começam os traços de

uma relação contratual entre médico e paciente.

Quando a lei foi tratar da responsabilidade médica, aboliu como uma das

penalidades a pena de morte, contudo, a grande novidade era a deportação de um

médico culpado por erro no seu exercício profissional. Atentamo-nos para o momento

histórico, ser apenado a morte, ou, ser deportado do Império Romano eram penas

muito próximas.

Aludida legislação, concretizou a obrigação de indenização pelos erros

cometidos pelo médico, assim:

A Lei Aquilia, embora se reconheça que não continha ainda uma regra

de conjunto, nos moldes do direito moderno, ao se referir ao damnum

injuria data estabeleceu, enfim as bases para as legislações modernas

sobre a responsabilidade dos médicos, ao obriga-los a pagar uma

indenização por todo o escravo que falecesse em suas mãos, e ao

abolir a pena de morte, preconizando em seu lugar, o exílio ou a

deportação (interdictioacquae et igni) ao profissional culpado de

negligência ou imperícia no exercício da arte de curar.8

Notória são as transformações que a lei trouxe sobre o ponto. Estabeleceu que o

erro médico fosse culposo, entendimento ainda pacífico. Acerca da reparação do dano,

este não seria mais reparado com a mutilação corporal do errante, a reparação se daria

através da pecúnia e o impedimento do exercício profissional naquele local.

Ambas as penalidades, reparação pecuniária e impedimento do exercício

profissional prevalecem ainda hoje como penas aplicadas aos erros médicos, a

primeira, essencialmente, em âmbito judiciário e a segunda em âmbito administrativo,

através de procedimento ético-disciplinar perante os Conselhos Regionais.

2.4. França. Ao chegarmos à era moderna, disciplinada pelo iluminismo na literatura de

Montesquieu, a doutrina e jurisprudência francesa trouxeram-nos uma linha de

entendimento pela qual a comunidade médica ainda hoje luta em sua sedimentação.

8CROCE, Delton. Delton Croce Junior. Erro Médico e o Direito. São Paulo: Editora Oliveira Mendes,

1997, p.5

Argumentos tais como a carga excessiva de conhecimento que deviam dominar,

e escolher dentre eles qual o correto a ser aplicado a cada caso de maneira certeira,

sem margem para erros, tudo isso somado a urgência das situações, além do

conhecimento de que cada corpo humano poderá responder ao mesmo tratamento de

maneira diversa, compreendendo a imperfeição da ciência hipocrática, foram os pavês

da pratica médica na época.

Nesse contexto, as particularidades da arte foram fatores determinantes para a

compreensão da doutrina e entendimento dos tribunais do momento. Os médicos

tinham finalmente convencido os juristas de que a sua profissão era dessemelhante

das demais. Registra sobre a época Eduardo Vasconcelos dos Santos Dantas que:

Os franceses assumiram postura bastante peculiar quanto à

responsabilidade médica, tendendo à imputabilidade, em virtude da

multiplicidade de fatores – e do caráter subjetivo da maioria deles –

capazes de influenciar os resultados de um procedimento médico. Havia

uma forte corrente doutrinária que defendia a necessidade de que não

só o dano fosse efetivamente comprovado através de perícia, realizada

por profissionais destacados, mas que também se provasse que este

mesmo dano decorreu de manifesta imprudência, imperícia ou

negligência.

Continua:

O próprio ato de questionamento e pedido de ressarcimento era por

vezes encarado como uma tentativa de enriquecimento ilícito, ou ainda

como uma forma torpe de buscar vingança contra o médico, em virtude

de um resultado desfavorável, causado de forma não intencional por

parte do mesmo. Alegava-se que o profissional não poderia ser

responsabilizado pelo acaso, pelos acontecimentos causados pelo

destino, e que nenhum médico – em princípio – laboraria em busca do

fracasso.9

Prevalecendo esse entendimento, poucos foram os casos em que houve médico

no polo passivo da demanda, porque além da parte ativa estar debilitada

psicologicamente, quando mais fisicamente, esta deveria juntar um arsenal probatório

que desqualificasse notoriamente a conduta médica, que ao máximo infringiria em

conduta culposa, porque um médico jamais teria dolo para prejudicar um paciente.

Dentre os arsenais de prova, por óbvio encontrava os pareceres de outros

médicos atestando a conduta de seu “irmão de profissão”, porque a demanda necessita

do caráter técnico, do qual juristas ficam impossibilitados de compreender. Podemos

crer que, tais atestados teriam um preço razoável, afastando grande parcela da

população, além de que, as condições para investigação a posteriori da conduta

profissional alheia dificultava um atestado fiel e qualitativo.

Mesmo assim, algumas condenações de médicos marcaram a época e foram

registradas como históricas, tais como:

9 Disponível em: <<http://jus.com.br/artigos/4288/aspectos-historicos-da-responsabilidade-civil-

medica/2#ixzz2b84ZTtqt>>. Acesso em: 05 de agosto de 2013.

1596, o Parlamento de Bordeaux condenou um médico a pagar 150

francos de indenização por dano a um cliente16. Em 1696, o Parlamento

de Paris declarou que os médicos e cirurgiões não eram responsáveis

por faltas decorrentes do exercício profissional, mas, em contrapartida,

novamente o Parlamento de Bordeaux responsabilizou um cirurgião,

imputando-lhe o pagamento de pesada indenização17. Em 1768 o

Parlamento de Paris, submetendo-se aos fatos, mudou seu parecer

pronunciando-se, então, pela interdição do exercício da profissão para

os médicos incriminados por falta profissional. 1810

No ano de 1830, o Tribunal de Domfront compreendeu que deveria consultar a

Academia de Medicina de Paris, acerca da responsabilização por atos médicos. Esta

disciplinou que as responsabilizações pelos erros médicos deveriam ser apenas moral,

e não econômica, tanto no âmbito civil quanto penal, contrariando o Código de

Napoleão de 1804 que definia que os danos ocasionados por erro médico deveriam ser

reparados.

Tal posicionamento da Academia de Medicina de Paris sucumbiu após o

inovador entendimento do Procurador-Geral da Câmara Civil da Corte de Cassação de

Paris, em histórico parecer.

2.4.1. Parecer do Procurador-Geral da Câmara Civil da Corte de Cassação de

Paris; André Marie Jean-Jacques Dupin; 20 de maio de 1836. Impossível

entendermos o atual panorama legislativo médico brasileiro sem citarmos o famoso

10

GIOSTRI, HildegardTaggesell. Erro Médico à luz da jurisprudência comentada. Curitiba: Juruá,

2000. Pg. 32/33.

arresto do Procurador-Geral Dupin. A barreira sustentada pela Academia de Medicina

de Paris para a responsabilidade dos médicos por seus atos não durou muito tempo. O

entendimento da Academia era de que o médico sempre agiria pelo bem do paciente e

que os eventuais erros estariam alheios à capacidade do profissional.

O fato de o profissional ser médico era como se fosse uma excludente de

responsabilidade objetiva, inatingível. Por óbvio, um critério objetivo estranho à teoria

geral do direito, que, por conseguinte, após alguns casos de notoriedade popular, o

Procurador-Geral da Câmara Civil da Corte de Cassação de Paris, André Marie Jean-

Jacques Dupin, em 20 de maio de 1836, emitiu um histórico parecer, influindo não só

no entendimento doutrinário e jurisprudencial francês, mas como de todo o mundo

ocidental, assim transcreve o parecer segundo Hildegard Taggesell Giostri:

o médico e o cirurgião não são indefinidamente responsáveis, porém o

são às vezes; não o são sempre, mas não se pode dizer que não o

sejam jamais. Fica a cargo do juiz determinar cada caso sem afastar-se

dessa noção fundamental: para que um homem seja considerado

responsável por um ato cometido no exercício profissional é necessário

que haja cometido uma falta nesse ato; que tenha sido possível agir

com mais vigilância sobre si mesmo ou sobre seus atos e que a

ignorância sobre esse ponto não seja admissível em sua profissão. Para

que haja responsabilidade civil, não é necessário precisar se existiu

intenção: basta que tenha havido negligencia, imprudência, imperícia

grosseira e, portanto, inescusáveis.

E termina dizendo:

Que os médicos se confortem: o exercício de sua arte não está em

perigo; a glória e a reputação de quem a exerce com tantas vantagens

para a humanidade não serão comprometidas pela falta de um homem

que falhe sob o título de doutor. Não se sacam conclusões e dificilmente

se conclui partindo do particular ao geral e de um fato isolado a casos

que não oferecem nada de semelhante. Cada profissão encerra, em seu

meio, homens dos quais ela se orgulha e outros dos quais ela renega.11

Se esse parecer fosse juntado em qualquer processo médico em trâmite hoje,

ainda assim estaria adequado. Foi a primeira vez que a jurisprudência falou

expressamente em negligencia, imprudência e imperícia.

Institutos que estão presentes de antemão a qualquer processo médico, pois

partimos do pressuposto de culpa médica e não dolo médico. Porém esta não está

blindada a força judiciária para que se responsabilize apenas em cunho moral.

Tal parecer-nos fez olhar para o médico como qualquer profissional, com direitos

e obrigações, e a notória peculiaridade de sua profissão seria ponderada nas normas

técnicas de sua academia. Assim não só o profissional teria segurança quando agiria,

pois se cumpriu as normas de sua academia não poderia ser responsabilizado, além do

11

GIOSTRI, HildegardTaggesell. Erro Médico à luz da jurisprudência comentada. Curitiba: Juruá,

2000. Pg. 32-33. ApudFRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. 4a ed. Sao Paulo: Fundo Editorial

Byk, 1997, p. 193-4.

novo entendimento, trazer critérios objetivos aos juízes, pois superariam as normas

técnicas, ao passo que se a academia diz para o médico em determinada situação

tomar a atitude ‘A’, basta que o judiciário se convença da prova ou não do

preenchimento desse critério objetivo para responsabilizar o acusado. Demais, aplicar

ia-se todos os institutos comuns do direito, aproveitados a todos os demais cidadãos.

A importância de tal parecer para o aprimoramento do entendimento do Direito

Médico foi exemplarmente apontado na doutrina de Hildegard T. Giostri:

Com tal postura, a França não só saiu na frente dos demais países

quanto à responsabilidade civil e penal daquele profissional, como

serviu de escola e parâmetro para o direito comparado de muitas

nações, que foram buscar na sua experiência e pioneirismo o

direcionamento para seus respectivos julgados e doutrinas.12

Talvez hoje não tivéssemos a segurança na medicina caso prevalecesse o já

citado entendimento da Academia de Medicina de Paris. Pois da mesma forma como

uma ameaça constante de seus atos serem questionados a posteriori por alguém

alheio ao conhecimento médico e vindo a ser obrigada a reparação do dano na forma

pecuniária, mesmo que injustamente, possa ter colocado o médico sob um forte

estresse durante a sua atuação, por outro lado, fez com que o médico tomasse mais

cuidados no atendimento de seu paciente.

12

GIOSTRI, HildegardTaggesell. Erro Médico à luz da jurisprudência comentada. Curitiba: Juruá,

2000. Pg. 36

3. Da Evolução Histórica dos Crimes de Omissão de Socorro. A omissão de

socorro penalmente tutelada nunca esteve em uma sólida constituição dogmática ao

longo dos séculos. Imputar ao cidadão o polo passivo na relação penal por uma falta de

ação é de extrema complexidade.

Por vezes tal título ocupou a causalidade, outras, a tipicidade, evidenciando a

dificuldade doutrinária para se encontrar o concreto convencimento da necessidade da

previsão em texto legal.

Até que se encontrasse uma teoria adequada para a omissão punível,

várias tentativas foram feitas, merecendo referência: a)as atividades

neuromusculares que o indivíduo desenvolve para não praticar o ato

exigido; b) o fazer algo diferente no momento em que se exigia a ação;

c) a da ação esperada, fórmula mais tarde substituída por outra: a ação

que era de se esperar. As duas primeiras procuram explicar o fenômeno

à luz de uma coordenada naturalista, enquanto a última é

compreensível sob uma visão normativa.13

Como explicitado, as duas primeiras, tinham por objetivo uma unidade entre

ação e omissão. A previsão de uma omissão, como ação delituosa, não despertava

unicamente um interesse no âmbito da teoria do delito, mas de sua punibilidade14.

13

Dotti, René Ariel. Curso de direito penal. 2a ed. Rio de Janeiro: Forense. 2004. Pg. 310.

14Tavarez, Juarez. Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 32.

No campo doutrinário, coube a Feuerbach e Spangerber traçarem,

pioneiramente, as regras gerais fundamentadoras da punibilidade dos delitos

omissivos15. Assim, superada a “crise dogmática dos delitos omissivos”, coube à

tipicidade abarcar a omissão, configurando o crime uma violação ao dever de agir.

Em face da violação do dever de agir, que só subsistiria na omissão e

não na ação, tornava-se impossível a unidade natural entre ação e

omissão; tal unidade só poderia se dar no plano normativo, no âmbito

da contrariedade ao direito. A omissão estaria, como a ação,

caracterizada como uma infração violadora de direito subjetivo. Essa

será a fórmula mágica de justificação para sua inserção no âmbito

jurídico.16

Até então, os povos antigos, ao sancionarem severamente a não assistência a

vítimas de crimes, não buscavam estimular o desenvolvimento do sentimento de

solidariedade humana, antes visaram evitar a prática de fatos puníveis17.

Na legislação romana o princípio vigorante era de que “nullumcrimenpatituris, qui

non prohibet, cum prohiberepotest”. Excepcionalmente impunha-se o dever jurídico de

15

Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 223, 224

16Tavarez, Juarez. Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 33.

17Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10

a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 223, 224.

se intervir para evitar um crime contra outrem, sob pena de aplicação de penalidade

capital18.

Séculos após, mais precisamente no século XIX, a grande maioria das

legislações – Códigos austríacos (1803), bávaro (1813), francês (1810) e alemão

(1871) – consignou como ilícito penal o não impedimento da prática de crimes, exigindo

algumas, como requisito essencial, convocação anterior feita pela autoridade

competente19.

Porém, pouco antes do código alemão de 1871, no regulamento toscano de

polícia punitiva, de 1853, foi que apareceu, pela primeira vez, a norma, posteriormente

generalizada, do dever jurídico de assistência a quem quer que se encontre em perigo,

seja qual for à origem deste20. O ProfessorLuis Regis Prado ainda conclui:

18

Périas, Osmar Rentz. Omissão de Socorro. São Paulo: Cl Edijur, 2001. Pg. 15.

19Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10

a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 223, 224.

20Périas, Osmar Rentz. Omissão de Socorro. São Paulo: Cl Edijur, 2001. Pg. 16. Para melhor

compreensão, Tavares, Juarez, Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 38, 39:

“A verdadeira ascensão dos delitos omissivos impróprios só começa a marcar presença quando se

passa a substituir a lesão ao direito subjetivo, gradativamente, pela responsabilidade decorrente do

resultado produzido. Em lugar da lesão ao direito subjetivo, insere-se na estrutura do delito a lesão de

bem jurídico. Essa mudança de estrutura pode parecer como se fora uma evolução natural da

dogmática, mas, na verdade, ela deriva de uma alteração de rumos no âmbito da política criminal. Os

preceitos da liberdade de contratar, que serviam de base para eliminar os resquícios do Estado feudal e

assegurar a livre concorrência, cedem terreno para os fins próprios da produção industrial. Da mesma

forma, a pena que tinha uma natureza puramente compensatória – valia como restauração do direito –

se vincula a um fim preventivo. Diante desse quadro, era compreensível que o direito penal se

transformasse para admitir, primeiramente, uma nítida separação entre ação e resultado e, depois, que

esse resultado, que correspondia a uma lesão de bem jurídico, também pudesse ser produzido por

omissão. Isso conduz ao fortalecimento das bases normativas para justificar a responsabilidade pelo

Essa diretriz foi adotada, em seguida, pelo Código sardo de 1859 (arts.

507 e 686, n.4), pelo Código Penal holandês de 1881 (art. 450) e pelo

Código Penal italiano de 1889 (art. 389). Tem-se, portanto, que a ideia

de um dever geral de prestação de socorro foi sendo guindada – com

extensão variada – a dever jurídico exigível, com o escopo de garantir a

segurança individual.21

A necessidade para tipificação de tais crimes era argumentação primordial, em

face de sequencial derrocada doutrinária, antes, se a omissão configuraria tipo de

ação, outra, a onde enquadrá-la na teoria do delito. Como elucida Juarez Tavarez:

resultado e, consequentemente, ao incremento dos delitos que incorporam violações de proibições e

deveres. 28

Como decorrência dessa reformulação de perspectiva da política criminal e, por extensão, do

direito penal, os códigos penais do século XIX e a respectiva dogmática penal começam a tratar, a

princípio, timidamente e, depois, em larga escala, dos delitos omissivos impróprios.” E continua:“É

bastante significativo observar, para se entender o panorama da política criminal, que a diferenciação

dos delitos omissivos próprios e impróprios implica, também, uma reorientação da estrutura normativa.

Ao lado das normas mandamentais, que disciplinariam os delitos omissivos próprios, subsistiria uma

norma proibitiva, que poderia ser violada tanto por ação quanto por omissão. Com isso se abre caminho

para individualizar a responsabilidade em função de contextos específicos nos quais o sujeito se deveria

encontrar. Vale dizer que a responsabilidade penal já não mais depende exclusivamente da atuação do

Estado, que configura o dever de agir, mas do próprio sujeito que não realiza a ação devida. Parece,

assim, que a individualização da responsabilidade penal, que tantos frutos gerou no positivismo,

encontra seu filão básico na compreensão dogmática da omissão. Ainda que se reconheçam delitos

omissivos nos códigos do século XIX e que a doutrina se tenha debruçado, com afinco, na sua

regulamentação, seu maior incremento se dá, porém, por força de três momentos essenciais da

evolução política do século XX: a instituição do Estado social, a falência do modelo social e a

globalização. Desses três momentos defluem, distintamente, três modelos de atuação no âmbito da

política criminal e, por consequência, do direito penal.” 21

Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 224.

Tendo em vista a rudimentariedade de sua incidência prática, o delito

omissivo ficou, durante muito tempo, desligado da dogmática. Lançando

os olhos sobre a evolução do conceito analítico de delito, pode-se

constatar que a omissão não passava, inicialmente, de modalidade

secundária de ação. Acolhida a norma incriminadora como

manifestação direta da proibição, importante era a identificação da ação

positiva, da qual deveria resultar a omissão.

Continua:

Ainda que concebido, legislativamente, em algumas hipóteses como

delito autônomo desde o século XIV, seu grande passo dogmático só

começa a se manifestar sob um regulamento próprio a partir do século

XIX, quando se manifesta a necessidade de uma regra geral da

omissão e, em face da diversidade normativa, se procede à distinção

entre delitos que resultam da violação da proibição e delitos

sedimentados sobre a infração de um comando.22

No Brasil, podemos dizer que a primeira vez que a omissão apareceu em nossa

legislação, não foi propriamente a omissão de socorro, mas, sim, a omissão de

notificação, o dever de dizer, contudo, aparecia às raízes, a necessidade23 legislativa

22

Tavarez, Juarez. Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 31.

23 Acerca da necessidade de legislar a omissão de socorro, e o distanciamento da dogmática penal,

afirmaríamos que a omissão de socorro está, nessa época, muito mais próxima da política criminal,

assim: “Ao verificar com maior rigor como se deu a evolução da ciência moderna, pode-se constatar que

quase todos seus enunciados nasceram, em conjunto, de varias ordens de necessidade: da necessidade

prática de encontrar solução aos problemas que afligiam determinada sociedade; da necessidade teórica

de definir como esses enunciados deveriam ser propostos; da necessidade política de ajustar o trabalho

científico às suas finalidades, a ponto de comprometê-lo, teórica e praticamente, como instrumento de

acerca da matéria. As Ordenações Filipinas (1603) obrigavam a denúncia prévia de

delito a ser praticado por terceiros (Livro V, Título CV, “Dos que encobrem os que

querem fazer mal”), mas nada dispunham acerca da omissão de socorro24.

Duzentos anos mais tarde, o Código Criminal do Império (1830), a seu turno,

arraigado às ideias liberais, silenciava a respeito de um amplo dever legal de

assistência aos periclitantes25; enquanto que no de 1890, a punição era exclusivamente

para quem “encontrando recém-nascido exposto, ou menor de sete anos abandonado

em lugar ermo” o não o apresentasse ou não desse aviso à autoridade pública mais

próxima26. Conforme explica Cezar R. Bitencourt:

O Código Criminal do Império, de 1830, não disciplinava o crime de

omissão de socorro, enquanto o Código Penal republicano, de 1890,

somente a criminalizava quando a vítima fosse recém-nascido ou menor

de sete anos (art. 293, § 4o), ao contrário do Código Penal italiano, de

poder. Todos esses componentes se entrelaçam, também, na atividade da ciência jurídica, daí se pode

dizer que seus conceitos somente poderão ser compreendidos, se colocados como objetos de discussão

não apenas do direito penal, mas da política criminal e de seus pressupostos.”ver Tavarez, Juarez.

Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 36.

24Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10

a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 224.

25Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10

a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 224; ainda: “Conforme se observa, mais do que a integridade física da vítima, o

legislador da época buscava resguarda a personalidade civil. Por essa razão, circunscreveu a tutela

conferida aos menores de sete anos e inseriu o crime no Título IX (Dos crimes contra a segurança do

estado civil), e não no Título subsequente (Dos crimes contra a segurança de pessoa e vida).”

26Périas, Osmar Rentz. Omissão de Socorro. São Paulo: Cl Edijur, 2001. Pg. 16.

1889 (Código de Zanardelli), que já contemplava essa figura delituosa

(art. 389).

E continuar, acerca do Código Penal de 1940:

Nosso Código Penal de 1940 adota a seguinte tipificação: “Deixar de

prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à

criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao

desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos,

o socorro da autoridade pública.27

Conforme demonstrado, a história dos crimes omissivos sempre esteve em uma

constante batalha da dogmática para permanecer nos Códigos penais, passando pela

assimilação da omissão a ação, ao seu enquadramento na conduta, vindo mais tarde

se consolidar na tipicidade28. É como se encontra a redação do Código penal brasileiro

de 1940,somada a reforma de 1984.

27

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 257.

28 Sobre: “Antes do tipo, isto é, em nível da conduta, não há omissões, pois todas são ações. E assim é

porque “omitir” não é puro “não fazer”: “omitir” é apenas “não fazer”o que se deve fazer, e este dever não

poderá ser conhecido enquanto não se chega à norma, ou seja, enquanto não se chega à tipicidade.

Todas as tentativas de fundar uma omissão antes da tipicidade fracassaram: ou acabaram suprimindo a

conduta como caráter genérico do delito, ou remeteram a um nebuloso dever ético geral ou a uma ainda

mais nebulosa “ação esperada”. Todas essas soluções são artificiais e desnecessárias, e terminam por

confundir o conceito de delito. Para os primeiros, é a tipicidade que passa a ocupar o primeiro lugar entre

3.1. Apanhado desde a Metade do Século XX. No mundo, diversas formas foram

aderidas para tratar da omissão, tanto na posição de garante quanto no socorro,

porém, a posição de garante foi a mais tipificada, deixando ao cargo da doutrina

estabelecer os critérios de quem e quando estariam naquela posição, assim:

Apesar de que todos os códigos latino-americanos reconheçam a

existência de delitos de ação e omissão, são poucos os delitos de

omissão que estão expressamente tipificados e, ainda assim, alguns

dos mais característicos, como o de omissão de socorro é, em certos

códigos, uma simples contravenção ou falta (C.P. chileno, art. 494, n.

14; equatoriano, art. 604, n.36, hondurenho, art. 575, n.10)29.

No Brasil, no Código Penal de 1940, optou pela generalidade da omissão, 13, §

2.ºgarantidor, e pela previsão expressa dos crimes omissivos conforme o art. 135 do

referido diploma.

os caracteres do delito e aquela que, evidentemente, cria a conduta, deixando de lado toda a

consideração ôntico-ontológica da mesma. Para os segundos, a omissão é “omissão de uma ação

esperada”, variante que alguns parecem sustentar no sentido de que é “esperada” pela ética social, e

outros de que é “esperada” pelo direito. A primeira solução é inadmissível, porque embora a ética social

não “espere” a realização da conduta, nada impede que a sua omissão seja delito. A segunda proposta é

igualmente falha, porque o direito não “espera” ações, e sim as proíbe ou as ordena. (...) Quando

chegamos no nível de análise da tipicidade, encontramos tipos que nos descrevem as condutas

proibidas e que são expressos em normas com enunciado proibitivo, chamados tipos ativos, e outros que

nos descrevem a conduta devida e que se expressam através de normas com enunciado preceptivo,

chamados tipos omissivos.” emZaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito

penal brasileiro: parte geral. 5a. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 511, 512.

29Conde, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Porto Alegre: Fabris, 1988. Pg. 37, 38.

A figura do garantidor apareceu não no texto original e sim na reforma de 1984,

o qual a lei penal definiu os fundamentos do dever jurídico de evitar o resultado (art. 13,

§ 2.º, CP), mas não determina os resultados de lesão dos bens jurídicos atribuíveis ao

garantidor, com fundamento nos deveres jurídicos definidos30.

3.2. Abordagem nos dias Atuais. Atualmente os crimes omissivos estão divididos em

próprio e impróprio. Repartindo-se dessa forma em duas vertentes, uma que define

expressamente quem estará sujeito ao tipo penal e a outra que especifica quando

qualquer pessoa poderá estar no tipo.

3.2.1. Crimes Omissivos Impróprio/Comissivo por Omissão. O problema mais

grave suscitado pela omissão imprópria está em que, de acordo com a doutrina

dominante, nem todos os tipos de omissão imprópria – nem mesmo os mais

importantes – estão expressos nas leis31.

Tal capítulo previsto no art. 13, § 2.º CP, não faz parte do objeto de estudo do

presente trabalho, porém cabe destacar que o comportamento omissivo não é

mencionado expressamente no tipo, que só descreve e proíbe um determinado

comportamento ativo; contudo, a mais elementar sensibilidade jurídica obriga a

30

Santos, Juarez Cirino dos. Direito penal parte geral. 3.a ed. Curitiba: ICPC; Lumem Juris, 2008. Pg.

208. 31

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.

5a. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 514.

considerar-lhe equivalentes, do ponto de vista valorativo e a incluir, portanto, também

na descrição típica do comportamento proibido, determinados comportamentos

omissivos, que igualmente contribuem para a produção do resultado proibido32.

3.2.2. Crimes Omissivos Próprios. Para a configuração deste, basta que o agente

cumpra os requisitos previstos no tipo penal, trata-se de visualização puramente

normativa, a qual uma análise naturalística torna-se inócua, essa forma foi construída

aos longos dos anos, assim:

A omissão, até receber a influencia dos postulados hegelianos e do

positivismo no direito penal, exprimia-se na forma de delitos omissivos

próprios. O enunciado dominante na ordem jurídica daquela época era

de que o delito constituiria um fato puramente jurídico. O importante não

era a conduta em si mesma, mas sua configuração normativa.

E continua:

Esse modo de pensar correspondia ao modelo do Estado contratual,

que tinha como preocupação delinear, em confronto com o Estado

feudal, os contornos da proibição, com o objetivo de preservar os

direitos da pessoa e a sua liberdade econômica33.

32

Conde, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Porto Alegre: Fabris, 1988. Pg. 33.

33Tavarez, Juarez. Teoria dos crimes omissivos. São Paulo: Marcial Pons, 2012. Pg. 36, 37.

Este tipo, omissivo próprio, assim tratado pela doutrina, art. 135 CP, consiste no

fato de o agente deixar de realizar determinada conduta, tendo a obrigação jurídica de

fazê-lo; configura-se com a simples abstenção da conduta devida, quando podia e

devia realizá-la, independentemente do resultado. A inatividade constitui, em si mesma,

crime (omissão de socorro)34.

3.3. Atual Situação do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro. Após a simplificada

demonstração da evolução dos crimes omissivos, tanto doutrinária quanto

jurisprudencial, o Art. 135 do Código Penal brasileiro encontra-se assim disposto:

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem

risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa

inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não

pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Parágrafo único - A pena é aumentada de metade, se da omissão

resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.

Pretendeu o legislador, nesses termos, tutelar como bem jurídico a proteção da

vida e da saúde por meio da solidariedade humana, que, como dever geral, obriga a

34

Bitencourt, Cezar Roberto. Teoria Geral do Delito. São Paulo: Revista dos Tribunais: 1997. Pg. 35.

intervenção de todos quando o sujeito passivo, qualificado no tipo penal, encontrar-se

nas condições descritas35.

Desmembrando doutrinariamente, tal dispositivo se dividiria nos seguintes

parâmetros. Trata-se de crime de ato único, unissubsistente, que não admite

fracionamento. Se o agente deixa passar o momento em que devia agir, consumou-se

o delito36.

Assim tem se posicionado os tribunais quanto à tentativa em crime omissivo

próprio:

TACRSP: “O crime de omissão de socorro constitui infração

instantânea, que não admite tentativa, consumando-se no instante em

que o sujeito omite a prestação de socorro” (JTACRIM 35/152)37.

Portanto, em que pese posicionamento minoritário em sentido contrário,

sustentamos a posição de que o crime omissivo próprio não comporta tentativa, porque

a situação precedente independe da vontade do agente, este que se não tomar atitude

prevista, configurada estará a tipicidade penal.

35

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 257

36Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9

a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 267

37Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6

a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1075

O sujeito ativo do delito poderá ser qualquer pessoa, que tem a clara

possibilidade para atuar em defesa do bem jurídico do sujeito passivo, portanto, se

houver um impeditivo, justificável, para atuação do sujeito este não poderá incorrer no

crime, assim:

(...) o sujeito, autor da omissão, deve estar em condições de realizar a

ação; se não existir tal possibilidade de ação, por qualquer razão que

seja, não se pode falar da omissão: o paralítico não pode omitir-se da

salvação de uma pessoa que se está afogando no rio. Omissão não é

um simples não fazer, mas o não fazer uma ação a qual o sujeito está

em condições de poder fazê-la. Todas as qualidades que constituem a

ação em sentido ativo (finalidade e causalidade), devem estar à

disposição do sujeito para poder falar de omissão. As causas que

excluam a ação são também, ao mesmo tempo, causas de exclusão da

omissão (...)38

Aos olhos dos tribunais, esse tem sido o posicionamento adotado para o sujeito

ativo que, por alguma circunstância alheia a sua vontade não conseguiu suprir o

mandamento legal, no caso, o médico foi absolvido, pois, o tratamento que o paciente

necessitava era impossível de ser ministrado naquele hospital, vejamos:

38

Conde, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Porto Alegre: Fabris, 1988. Pg. 29, 30

TACRSP: “Não se pode responsabilizar o médico pela morte da vítima

se necessitava ela de tratamento especializado, impossível de lhe ser

ministrado no hospital em que aquele trabalhava” (RT 514/386)39

O sujeito passivo também poderá ser qualquer pessoa, que esteja em grave e

iminente perigo de vida. Observa-se que o tipo equivocou-se a abranger grave e

iminente perigo de vida de forma conjunta, caso a pessoa esteja em ou em outro,

estará abrangida como sujeito passivo do tipo penal, assim:

qualquer pessoa, independentemente de ser criança abandonada ou

extraviada ou pessoa inválida ou ferida, desde que se encontre em

grave e iminente perigo. Não basta a mera possibilidade ou simples

presunção de perigo, mas é necessária a probabilidade da sua

ocorrência; por outro lado, é indispensável que seja grave, isto é, que

exponha efetivamente a perigo a vida ou a saúde da vítima, e, ademais,

além de grave tem de ser iminente, isto é, prestes a acontecer40.

Em que pese esse não ser o entendimento do Tribunal paulista:

39

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1072.

40Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9

a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 261

TACRSP: “Basta alguém estar ferido para nascer a obrigação de outrem

socorrê-lo, não exigindo a lei penal a gravidade da lesão” ( JTACRIM

51/414).

TACRSP: “Basta estar a pessoa ferida para nascer a obrigação de

outrem de socorrê-la. Não fala alei em gravidade do ferimento. Fala, é

certo, em grave e iminente perigo. Mas é de se ver, nesse passo, que

se refere a algo que está por acontecer, a um risco grave” (RT

520/397)41

Aderimos à posição doutrinária em detrimento da jurisprudencial, visto que, em

se tratando de penalizar alguém por falta de conduta, o sujeito passivo deverá estar

notoriamente em grave perigo, não deverá restar qualquer dúvida, aos olhos do sujeito

ativo, que o sujeito está em uma grave situação.

Entre o sujeito ativo e passivo não precisará haver qualquer vínculo, basta

ambos estarem na posição abrangida pelo tipo. O sujeito ativo, também, não estará

configurado no ilícito penal caso tenha que expor sua integridade em risco, seja ela

física ou psicológica.

Quanto à participação, o crime irá abranger tal atuação. Porém cabem algumas

ressalvas, com o fim de superar equívocos e duvidas, conforme esclarece Bitencourt:

41

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1070

Não se pode confundir participação em crime omissivo com participação

por omissão em crime omissivo. A participação no crime omissivo

ocorre normalmente por meio de um agir positivo do partícipe que

favorece o autor a descumprir o comando legal (tipificador do crime

omissivo)42.

Portanto, o partícipe, será abrangido pelo tipo penal. Porém, ao invés de ser

tipificado por omissão, este se enquadrará na comissão, o agente deverá tomar alguma

atitude que impeça o sujeito passivo da iniciativa mandamental.

Em relação ao dolo há fortes divergências tanto doutrinárias quanto em âmbito

jurisprudencial, assim:

No aspecto conativo, o dolo na estrutura omissiva tem acarretado sérios

problemas, não sendo a finalidade o mais simples deles. Há autores

que sustentam que na omissão não há dolo, e sim um “equivalente” do

dolo. Essa afirmação baseia-se em não existir na omissão a causação

do resultado, isto é, na omissão a conduta proibida não causa o

resultado (tricotar meias não causa a morte da criança; fumar, enquanto

outro se afoga, não causa a morte do outro). Devido a isso, sustenta-se

que a finalidade não dirige a causalidade, e, por conseguinte, não se

pode falar de dolo propriamente dito.43

42

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 265 43

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.

5a. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 517, 518.

Essa visão se sustenta na questão dogmática de, não foi o agente ativo que

colocou o agente passivo na situação de perigo, e assim sendo, caso o agente ativo

assim estivesse agido, estaria incorrendo em outro tipo penal, que não o omissivo. Isso

também se aplicaria a omissão imprópria:

No aspecto cognoscitivo, dentro da estrutura típica omissiva o dolo

requer o efeito conhecimento da situação típica e a previsão da

causalidade. Quando se trata de uma omissão imprópria, requer ainda

que o sujeito conheça a qualidade ou condição que o coloca na posição

de garantidor (pai, enfermeira, guia etc.), mas não o conhecimento dos

deveres que lhe incumbem, como consequência dessa posição.44

Com o passar dos anos, a visão da ausência do dolo na omissão foi sendo

superada, porque a vontade subjetiva seria após a constatação da situação de fato que

geraria perigo, e não pré-existente a situação.

O dolo não se estrutura sobre uma causação, mas é finalidade típica no

sentido de que dirige a causalidade, tendo como base uma previsão da

mesma. O que é fundamental para o dolo é a previsão da causalidade,

que na omissão existe da mesma maneira que na tipicidade ativa.

Assim como na estrutura típica ativa pode ser dolosa ou culposa,

também pode sê-lo a estrutura típica omissiva. O conceito geral de

culpa não sofre alteração significativa na omissão. Invariavelmente,

deve estar presidido pelo elemento fundamental da violação do dever

de cuidado.

44

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.

5a. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 517.

E continua:

A culpa, dentro da estrutura omissiva, pode assumir tanto a forma de

culpa consciente como inconsciente. Na omissão, a culpa inconsciente

dá lugar aos chamados “delitos de esquecimento”, tais como o de quem

causa lesões, ou morte, porque esquece a chave de gás aberta, ou de

fazer um sinal de trânsito, ou de colocar um aviso que anuncie o perigo,

ou acender as luzes para sinalizar um obstáculo etc.45

A evolução do entendimento de que haveria dolo na conduta omissiva,

possibilitou que toda a aplicação do dolo já existente fosse aplicada as condutas

omissivas, tanto próprias quanto imprópria, assim:

O elemento subjetivo desse crime é o dolo (de perigo), representado

pela vontade de omitir com a consciência do perigo, isto é, o dolo deve

abranger a consciência da concreta situação de perigo em que a vítima

se encontra. O dolo poderá ser eventual, por exemplo, quando o

agente, com sua conduta omissiva, assume o risco de manter o estado

de perigo preexistente. É necessário que o dolo abranja somente a

situação de perigo; o dolo de dano exclui o dolo de perigo e altera a

natureza do crime. Esse crime não exige elemento subjetivo especial do

tipo, qual seja, o especial fim de agir, que, se existir, poderá

45

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral.

5a. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 518, 519.

descaracterizar a omissão de socorro, dando origem a outro tipo

penal.46

Para enquadrar o agente no tipo penal, deverá existir o dolo de perigo, este terá

que ter a vontade consciente de deixar o agente passivo em situação de perigo ou na

iminência deste, ou seja, o dolo deve abranger a consciência da concreta situação de

perigo em que a vítima se encontra47.

Seguindo os passos doutrinários, acertadamente a jurisprudência seguiu o

mesmo entendimento, que para configurar a omissão, o agente deveria ter total

consciência da situação de perigo do agente passivo, e partir daí não querer socorrer,

mesmo com todas as possibilidades para tal, assim:

“Necessidade do dolo – TJSP: “O elemento subjetivo do crime de

omissão de socorro é a vontade consciente e livre de não prestar

assistência a quem o agente saber estar necessitado. O delito em

apreço somente é punível a título de dolo, direto ou eventual” (RT

568/262).

E mais:

46

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 265. 47

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 265.

TACRSP: “Omissão de socorro como ilícito penal tão-só se configura

ante a existência do dolo, direto ou eventual, do omitente” (JTACRIM

60/2090).48

A jurisprudência entendeu que o dolo estaria superado mesmo quando o agente

não tem capacidade técnica para socorrer, porque o dolo não irá abranger a superação

efetiva do perigo, e tão somente, a vontade de agir, vejamos:

TACRSP: “O delito de omissão de socorro só é punível a título de dolo e

não o comete quem, por insuficiência formação científica, ou

inexperiência, não avalia corretamente a gravidade do perigo e não

determina providência que profissional mais capaz e atento

eventualmente adotaria.(RT 580/357)49

Concretizando a correta decisão, caso aja possibilidade técnica no polo ativo, e

mesmo assim, o caso concreto impeça que todas as habilidades técnicas existentes

supere o perigo do agente passivo, o tipo penal, no que tange ao dolo, não poderá

ocorrer, pois superado este estaria, então:

48

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1074.

49Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6

a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1072.

Iniciado o atendimento, não mais se configura o crime por falta de dolo.

Dado provimento ao Recurso, com a absolvição da ré” (RJEDFT

11/147).

E mais:

TACRSP: “Omissão de socorro. Médico que se recusa a atender

doente, que vem a falecer. Ausência, porém, de dolo. Morte inevitável

na espécie, face à gravidade do caso. Absolvição decretada. Revisão

deferida. Inteligência do art. 135, parágrafo único, do CP” (RT 525/378). 50

Assim sendo, o dolo deverá estar presente para configuração do crime de

omissão de socorro, e este estará configurado no exato instante em que o sujeito ativo

tinha perfeita noção e percepção da situação de perigo que se encontrava o sujeito

passivo, e mesmo com todas as capacidades disponíveis para agir a fim de evitar o

resultado, este se esquivou da obrigação mandamental. Inclusive, mesmo que o perigo

não cause danos ao sujeito passivo, o dolo já está superado.

Dessa forma, podemos simplificadamente descrever a omissão de socorro

como:

50

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1074.

A omissão de socorro é crime omissivo próprio e instantâneo,

consumando-se com a simples abstenção da conduta devida no

instante em que o sujeito omite a prestação de socorro,

independentemente da produção de qualquer resultado; trata-se de

crime de perigo, pois se visar dano será alterada a tipificação da

conduta; crime comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa,

independentemente de condição ou qualidade especial do sujeito ativo;

doloso, não havendo previsão da modalidade culposa. O erro, porém,

quanto à existência de risco pessoal exclui o dolo.51

Superado todas as divergências acerca da omissão, após séculos de férteis

discussões das mais brilhantes mentes, encontramos a omissão de socorro como um

meio político-criminal para atender aos anseios sociais pela vingança.

A sociedade ao deparar-se com a não ação de uma pessoa frente ao sofrimento

de outra indignasse de tal forma que aquele deve ser tratado em sede penal, a partir

daí, juristas se dobram para encontrar uma sustentação que fosse capaz de fazer com

que o direito penal tipificasse não um agir, mais simplesmente uma falta deste.

Atendendo mais aos anseios sociais do que acadêmicos, a omissão de socorro

hoje é um crime instantâneo, de consumação rápida e não mitigada, no exato instante

em que o mandamento legal manda o sujeito agir e esse assim não o faz,

independente de qualquer dano real que essa omissão cause. Adiante, analisaremos

esse mandamento frente ao específico exercício da Medicina.

51

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 267.

4. Interpretação do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro e Artigo 33 do Código

de Ética Médica. Como vimos anteriormente, houve uma dificuldade secular em tratar

da omissão de socorro, tanto em âmbito social quanto doutrinário, a seguir,

analisaremos a dificuldade em submeter o dispositivo legal omissivo frente à

especificidade do exercício profissional da medicina.

A prática médica detém diversas peculiaridades concretas atualmente, e

veremos como essa atividade prática se relaciona com dispositivos gerais e genéricos,

mais especificamente a omissão de socorro, tipificada no Código Penal brasileiro.

4.1. Análise Literal do Artigo 135 do Código Penal Brasileiro. Os dispositivos

penais podem ser interpretados sob duas perspectivas, a objetiva e subjetiva, a

subjetiva consiste em analisar o dolo do agente e se este será analisado na conduta. A

conduta objetiva visa à análise factual do fato e a sua subsunção a norma. No caso dos

crimes omissivos, dizemos que:

O tipo omissivo tem um aspecto objetivo e um subjetivo, que

apresentam características diferentes, posto que é uma estrutura

diversa do tipo ativo doloso. No aspecto objetivo do tipo omissivo

encontramos, antes de mais nada, uma situação típica, que no art. 135

do CP é o encontrar-se frente a uma pessoa necessitada de auxílio, e

em outros casos é uma situação em que a lesão do bem jurídico

equivaleria à de uma estrutura típica ativa. Nesse sentido, o tipo objetivo

omissivo sempre é um tipo circunstanciado.

E continua:

Nessa situação típica concreta deve também ocorrer a exteriorização de

uma conduta distinta da vontade realizadora da conduta devida.

Ademais, o tipo objetivo omissivo requer que a conduta devida seja

fisicamente possível, o que encontra fundamento no princípio geral de

direito que impede que este ordene o impossível. Não há conduta

devida de auxílio quando não existe possibilidade de prestá-lo.52

O diploma legal trouxe a literalidade da conduta devida, qualquer outra que não

seja aquela positivada em âmbito penal estaria o agente incorrendo na criminalização:

O art. 135, caput, do CP pune aquele que “deixar de prestar assistência,

quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou

extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e

iminente perigo”. Como se pode observar, trata-se de uma descrição de

conduta que o sujeito deve ter nessas ocasiões: prestar o auxílio

necessário ou, no caso de haver risco pessoal, imediatamente avisar a

autoridade pública. A proibição é realizar qualquer conduta distinta

dessas. Este é o tipo omissivo.53

52

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5a.

ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 512. 53

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5a.

ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 510.

Portanto, após leitura simples do texto legal, cabe estabelecer a quem coube

estar incluso como sujeitos do tipo, e quando haveria a inocorrência da tutela penal. A

doutrina e a jurisprudência couber a má função de especificar quem seriam as vítimas

elencadas no disposto legal, assim concordamos com a posição de que:

No que se refere às vítimas desse delito, entende-se por criança a

pessoa com até doze anos de idade incompletos (art. 2.o, Lei

8.069/1990). Abandonada é a criança que, privada de assistência por

parte de seus responsáveis, acha-se entregue à própria sorte e, de

conseguinte, despojada de meios para atender à sua defesa.

Considera-se extraviada a criança quando eventualmente perdida ou

desorientada, privada do contato ou da vigilância daqueles que devem

protegê-la.

E continua, para tratar das vítimas inválidas:

Pessoa inválida é aquela que, em razão de suas peculiares condições

físicas, biológicas ou psíquicas, precisa da assistência de outrem, sendo

incapaz de prover por si mesma a própria segurança. A invalidez pode

advir de várias causas (v.g., doença, deficiência física ou mental, idade

avançada etc.). Pessoa ferida é a que apresenta ofensa à integridade

corporal - provocada por terceiro, por acidente, caso fortuito ou por ato

próprio -, ainda que leve, desde que hábil a provocar perturbação

funcional que requeira o auxílio alheio. Inválida ou ferida a vítima, é

preciso que se encontre ao desamparo, isto é, privada de socorro e

incapaz de arrostar a situação de perigo sozinha. Por fim, pode ser

sujeito passivo qualquer pessoa em grave e iminente perigo. Exige-se,

portanto, que se trate de perigo de grandes proporções, prestes a

acontecer.54

Como vimos o crime em questão é tanto de perigo abstrato quanto perigo

concreto a depender do sujeito passivo em questão. Assim, devemos analisar a real

posição do sujeito passivo em relação ao perigo, o qual irá definir a tipificação do

sujeito ativo, conforme Luis Regis Prado:

As condutas alternativamente incriminadas consistem em deixar de

prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, ou não

pedir o socorro da autoridade pública, ao se deparar com criança

abandonada ou extraviada, ou com pessoa inválida ou ferida, ao

desamparo ou em grave e iminente perigo (tipo misto alternativo).

E continua:

O crime de omissão de socorro é delito de perigo. Na hipótese de

assistência omitida a criança extraviada ou abandonada, ou a pessoa

inválida ou ferida, ao desamparo, o perigo é abstrato. Consuma-se

ainda que no caso concreto não se tenha produzido qualquer perigo

54

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 229.

para o bem jurídico tutelado. Já no caso da pessoa em grave e iminente

perigo, é indispensável sua efetiva demonstração (perigo concreto).55

Mesmo a vítima estando em um ou outro quadro de perigo, abstrato ou concreto,

caberá ao sujeito ativo estar em plenas condições de agir e mesmo qual possa agir, tal

ato influenciará no resultado de forma direta, não sendo possível a tipificação com base

em suposições quanto a real eficácia da conduta, portanto, o agente ativo deve estar

em condições para que sua conduta essa efetiva, assim:

No tipo omissivo não se requer um nexo de causação entre a conduta

proibida (distinta da devida) e o resultado, e sim um nexo de evitação,

isto é, a probabilidade muito grande de que a conduta devida teria

interrompido o processo causal que desembocou no resultado. Esse

nexo de evitação é estabelecido por uma hipótese mental similar à que

empregamos para estabelecer o nexo de causação na estrutura típica

ativa: se imaginarmos a conduta devida e com isto desaparece o

resultado típico, haverá um nexo de evitação; enquanto que, se

imaginamos a conduta devida e o resultado típico permanece, não

existirá um nexo de evitação.56

Dessa forma os tribunais tem aplicado o tipo penal, que exige a real

possibilidade de se evitar o resultado com a conduta devida, assim vejamos:

55

PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. Vol. 2. 10a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2011. Pg. 230. 56

Zaffaroni, Eugenio Raúl, José Henrique Pierangeli. Manual de direito penal brasileiro: parte geral. 5a.

ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004. Pg. 513.

Necessidade da possibilidade de evitar o resultado - TARS:“Nos crimes

comissivos por omissão não basta demonstrar que o sujeito descumpriu

o dever jurídico de evitar o resultado, para que surja a responsabilidade

penal. É preciso comprovar que a conduta devida teria impedido o

resultado. Em se tratando de tarefa perigosa, quando o perigo é

determinado pela comprovada negligência do agente, o fato é típico.

Todavia, se o fato é, objetivamente, perigoso, a eventual ocorrência de

um resultado danoso torna a conduta do agente atípica, devendo o

mesmo ser debitado à fatalidade.” (JTAERGS 75/45).57

Porém, o agente ativo deverá tentar todos os meios possíveis para evitar o

resultado, uma única ação de várias possíveis não afasta o dolo omissivo, assim tem

entendido corretamente os tribunais:

Necessidade de esgotarem-se os meios disponíveis – TJMS:“Tendo

ocorrido morte, a omissão de socorro fará com que a pena seja

triplicada. O crime de omissão caracteriza-se não apenas quando o

agente não intervém contra o autor de crime de homicídio, mas também

quando deixa de esgotar todos os meios de que dispõe para prestar

auxílio à vítima” (RT 688/346).58

57

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 161.

58RT 688/346) (Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6

a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg.

1073.

Caso a possibilidade de agir exista, e seja visualizada a sua efetividade para

assegurar do perigo eminente o sujeito passivo, assim que este esteja em posição

factual de garante ou legal, o crime estará configurado. A partir daí, o magistrado

utilizará o caput do art. 135 CP como base, e verificar se a majorante está presente de

forma objetiva, como assim demonstra:

A sanção aplicável é, alternativamente, detenção de 1 a 6 meses ou

multa, para a conduta tipificada no caput do art. 135. Se em razão da

omissão sobrevier lesão corporal de natureza grave, a pena será

majorada de metade; se sobrevier a morte, será triplicada. Essas

majorações são fixas, não permitindo ao magistrado adotar outros

percentuais de aumento, para mais ou para menos. Sua faculdade,

portanto, limita-se à dosimetria penal em relação ao caput, que constitui

a figura básica, e ao reconhecimento ou não da majorante. Assim,

fixada a pena ao crime de omissão de socorro, se reconhecer uma das

majorantes, o limite de elevação está fixado ope legis. A ação penal é

pública incondicionada, sendo desnecessária qualquer condição de

procedibilidade.59

Diversamente, os tribunais com receio de tornar inócua a majorante do parágrafo

único, entenderam que basta a configuração da possibilidade de se evitar o resultado,

afastando o nexo causal, assim:

59

Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, 2: parte especial: dos crimes contra a pessoa. 9a

ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pg. 268, 269.

Existência da qualificadora – TAMG: “Para que se configure a omissão

de socorro em sua forma qualificada, dispensável a prova do nexo

causal entre morte da vítima e a conduta do agente, bastando tão

somente à existência da possibilidade de que a atuação deste poderia

evitar o evento letal, sob pena de tornar inócuo o disposto no parágrafo

único do art. 135, do CP” (RT 707/345).60

Mais ainda:

Contra – TACRSP: “Ainda que a morte da vítima não resulte da omissão

de socorro, é suficiente para que se configure o delito em sua forma

qualificada que se comprove que a atuação do sujeito ativo poderia

evitar o resultado, tanto mais tratando-se o agente de médico no

exercício dessa atividade” (RT 636/301).61

Seguindo a doutrina de Cezar Roberto Bitencourt, porém em sentido diverso na

jurisprudência dominante:

Inexistência de nexo causal – TACRSP: “Não autorizando a prova

coligida uma conclusão segura sobre a relação de causalidade entre a

60

RT 707/345). (Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg.

1075.

61Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6

a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1076.

omissão de socorro e o êxito letal, é de ser cancelada a agravante

prevista no parágrafo único do art. 135 do CP” (RT 459/384).62

4.2. Análise Literal do Artigo 33 do Código de Ética Médica. A grande malha

legislativa brasileira acerca do direito médico não encontra na visão desses

profissionais o necessário para tutelar suas ações. Coube a eles próprios, em âmbito

administrativo, buscar um código adequado e orientador a suas atividades, assim

causando divergências doutrinárias das mais diversas:

Ainda que a elaboração de um Direito Médico seja reservadamente à

esfera legislativa, e não às representações médicas, pois as questões

jurídicas não são do domínio dos médicos, é evidente que o espírito

dessa legislação não poderia fugir da conveniência e da tradição

consagradas e impostas pela Medicina.

E continua:

Por outro lado, mesmo tendo os médicos o seu Código de Ética, as

obrigações, nessa codificação, são simplesmente morais e muito vagas

até certo ponto. Essas normas de virtude não garantem, por si sós, uma

ordem na sociedade. A moral propriamente dita não é um ponto

62

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1076.

decisivo que proporcione ao médico soluções para todos os seus

problemas.63

Dentro desse cenário, onde diversas esferas normalizadoras abrange atividade

da mais complexa como a medicina, à primeira vista nos deparamos com panorama de

difícil compreensão, cabe dessecar essa estrutura normativa a fim da melhor análise

possível, assim:

O NCEM possui um complexo sistema normativo, composto por

normas-regras e normas-princípios, que regulam e institucionalizam

juridicamente o fenômeno político e social da Medicina, presente onde

quer que um médico atue, no exclusivo exercício de sua profissão.

E continua:

Como qualquer regra jurídica intenta a sua máxima concretização fática,

estabelecendo diretrizes, fins e programas de ação presente e futura,

sem esquecer da tentativa de se manter permanente passível de

63

FRANÇA, Genival Veloso de. Direito Médico. – 6. ed. – São Paulo: Fundação BYK, 1994. pg. 18.

atualização por outras resoluções eventualmente emitidas pelos

próprios Conselhos.64

Em muitas ocasiões, o mesmo dispositivo encontrasse da mesma forma em

outro diploma legal, como é o caso da omissão de socorro. Após dois anos de análises

o sexto Código de Ética Médica entrou em vigor no ano de 2010, constando em seu

Capítulo V Relação com Pacientes e Familiaresno Art. 33 a figura omissiva, que assim

se apresenta:

Art. 33. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados

profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja

outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo.

Em comparação com o preceito da omissão de socorro no quinto Código de

Ética Médica, o qual se encontrava no Art. 58 do respectivo diploma, fora adicionado

além do estado de urgência, o paciente poderia estar em estado de emergência, como

podemos observar:

64

Júnior, Edmilson de Almeida Barros. Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará,

Concurso de Monografias Prof. DalgimarBeserra de Menezes, O novo código de ética médica.1a

ed., Vol. V. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2012. Pg. 38.

Art. 58 - Deixar de atender paciente que procure seus cuidados

profissionais em caso de urgência, quando não haja outro médico ou

serviço médico em condições de fazê-lo.

Corretamente foi adicionado ao sexto código a palavra emergência, porque na

medicina tal expressão é aquela que necessita de ato médico instantâneo, caso

contrário, o paciente corre sério risco de vida. Por outro lado, a urgência é quando o

paciente deve ser atendido o quanto antes, pois pode piorar a qualquer momento,

assim:

Neste artigo não se trata do médico em seu horário de serviço na

emergência de um hospital ou qualquer outra instituição. É, isto sim, o

caso de médico que, não estando em seu horário normal de trabalho, é

procurado ou chamado a atender em emergência. Se ele recebe

telefonema, em sua residência, para um chamado urgente, poderá

recomendar simplesmente que levem o paciente para um hospital. Se

ele reside numa localidade destituída de hospital, e mesmo de outro

médico, não poderá recusar. Ou se ele for o único especialista que o

caso requer, também não poderá recusar seus serviços.65

65

Coutinho, Léo Meyer. Código de Ética Médica Comentado. 4a ed. Florianópolis: OAB/SC Editora,

2004. Pg. 161.

A forma pela qual o médico é avisado e solicitado para atendimento da urgência

deverá ser comprovado, sob pena de absolvição do sujeito ativo, assim, corretamente

entende o TSEM:

Número: 19/1994. Origem: CRM-PR. Tribunal: Câmara. Relator: Cons.

Jocy Furtado de Oliveira. Ementa: “EM HAVENDO INSUFICIENCIA DE

PROVAS QUE CONFIRMEM O CHAMADO TELEFONICO AO

DENUNCIADO, IMPOE-SE A SUA ABSOLVIÇÃO.” Acórdão: “A 2ª

Camara do TSEM do CFM, por unanimidade, deu provimento ao

recurso interposto pelo apelante, reformando a decisão do CRM-PR,

que lhe aplicou a pena de CENSURA PUBLICA EM PUBLICACAO

OFICIAL, prevista na letra “c” do art. 22 da Lei 3.268/57, por infração ao

art. 58 do Código de Ética Medica, para absolvição, nos termos do voto

do Conselheiro Relator.” Em 08/06/95. Publicação: D.O.U.

08/JUN/1995 SECAO I PAG 8600.

Isto posto, podemos dizer que a urgência está um nível a baixo da emergência,

esta que apesar de mais grave não era abrangida pelo quinto Código de Ética Medica,

vindo a ser incluída acertadamente a posteriori.

A título de informação cabe destacar a figura omissiva no Código de Ética

Médica de 1957, Lei n 3.269, que assim se dispunha:

Art. 47 O médico não é obrigado por lei a atender ao doente que

procure seus cuidados profissionais; porém cumpre-lhe fazê-lo em

casos de urgência ou quando não haja na localidade colega ou serviço

médico em condições de prestar assistência necessária.

Percebesse que ao ler o artigo supra citado observasse a relação jurídica, tanto

legislativa quanto administrativa, com a omissão de socorro no começo da segunda

metade do século XX.

Haveria ao médico a obrigação mandamental em casos muito restritos, quais

sejam, urgência, ou quando não há na localidade outro profissional capaz de atender

as necessidades assistenciais do paciente, assim:

A omissão de atendimento não é crime quando efetuada dentro das

prescrições legais. Não seria lícito de outra forma, desde que se trata de

profissão liberal e existam elementos que exoneram a responsabilidade

de atender. Consideramos que deve haver um justo motivo para tanto.

E continua:

A avaliação de urgência nem sempre é consolidada com precisão, e

pode ensejar desagradáveis consequências quando subestimada.

Aceitar que o profissional em disponibilidade, sem indicar outro colega,

não atenda a uma solicitação não merece, mesmo dentro de

parâmetros legais, o aplauso de quem quer que seja.66

Vislumbrasse o caráter altamente patrimonial dos serviços médicos da época,

pois o código ético dava a liberdade para o médico escolher o grupo de pessoas que

irá desfrutar de suas capacidades, assim excluindo casos emergenciais e necessários,

mesmo não sendo moralmente aceito, eticamente o era.

Com essa breve introdução podemos observar como a omissão foi sendo

incorporada nos códigos de ética médica, cada vez mais abrangendo situações que se

encontram os sujeitos passivos e aumentando o leque dos sujeitos ativos. Essa

mudança de paradigma claramente foi seguindo o cenário jurídico e social da época

em que eram formulados, como demonstrado nos capítulos um e dois desse trabalho.

No atual Art. 33 a palavra atender significa que o médico deverá se dedicar a

pessoa, aplicando seus conhecimentos profissionais. Esse atendimento deverá

perdurar tempo suficiente para que a pessoa não se encontre mais no estado de

perigo.

Assim caso o atendimento seja na rua, o médico deverá realizar procedimentos

técnicos adequados, todos os quais forem possíveis sem equipamentos, além de

66

Panasco, Wanderby Lacerda. A responsabilidade Civil, Penal e Ética dos Médicos. 2a ed. Rio de

Janeiro: Forense, 1984. Pg. 231.

solicitar uma ambulância no local ou levar o paciente até o estabelecimento de saúde

mais próximo, ou o que julgar melhor para o sujeito passivo.

Caso já esteja no hospital, clínica e etc. o médico deverá atender o paciente até

que este já não mais necessite de seu olhar profissional e que esteja nas mãos de

outro profissional da saúde capaz de mantê-lo fora do perigo, por exemplo: aos

cuidados dos enfermeiros.

O sentido do paciente aqui descrito não pode admitir ser aquele que já está em

tratamento médico, porém é qualquer pessoa em grave e iminente perigo de vida, sob

o ônus de limitar significativamente o sujeito tutelado pelo no art. 33 do Código de Ética

Médica.

Caso entendermos ser aquele o sentido da palavra paciente, estaríamos sob os

olhos da responsabilidade administrativa, aceitando a inércia do profissional médico de

utilizar sua capacidade técnica para aquela pessoa que encontrasse em grave e

iminente perigo, porém não é seu paciente.

Seguindo o dispositivo, visualizamos que o referido artigo 33 tentou limitar

significativamente a abrangência do sujeito passivo, assim, além de descrever o sujeito

como paciente, descreveu a situação em que este deveria estar, assim

sendo:“...procure seus cuidados profissionais em casos de urgência ou emergência...”.

Segundo o disposto, o médico a princípio deve ser procurado pelo paciente,

afastando a sua posição de “garante social” que sua capacidade técnica o coloca para

si. O médico deve ser aquele que não se afasta quando a pessoa alheia está em perigo

de vida e as capacidades profissionais do médico é apta para retirar-lhe daquela

situação.

Caso assim fosse, em um restaurante, o médico estaria legitimado a se abster

de atender alguém que passe mal naquele local. Conduta que, além de ter um alto grau

de imoralidade, dessa forma os tribunais tem entendido a omissão de socorro:

Vítima socorrida por terceiros – TACRSP: “O dever de prestar socorro

toca a todos que estão em condições de fazê-lo sem risco pessoal. Se a

vítima de acidente foi acudida por terceiros, imediatamente, não há

como se pretender configurado o delito do art. 135 do CP” (RT

588/335).67

Não estando o médico correndo risco de sua vida, este estará sempre obrigado

a prestar socorro, independentemente do local e horário, médico é médico vinte e

quatro horas por dia, não abdicando de seus conhecimentos técnicos no momento em

que sai do local de trabalho.

67

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1073.

Ponto negativo ainda se faz na continuidade da leitura do Art. 33 do CEM, o qual

entendeu por bem a manutenção da descrição “...quando não haja outro médico ou

serviço médico em condições de fazê-lo....”.

Assim, o caráter emergencial da atividade fica a margem da previsão ética,

porque, caso tenha outro médico ou serviço médico com condições de prestar o

socorro, fica clara a legitimidade da escolha médica em postergar ou não o

atendimento.

Além do mais, abre margem para discussão quanto a quem cabe a

responsabilidade, porque visualizando um caso prático, o médico acaba por se omitir

com o dolo de que há outro médico na localidade, porém este outro não recebe

qualquer informação acerca.

Por óbvio aquele estará incorrendo na conduta omissiva, pois não basta haver

outro médico na localidade, caso assim fosse, em grandes cidades impossível seria a

ocorrência do tipo ético.

O médico deve ao mínimo encaminhar o paciente em estado de perigo para

outro médico sob quatro requisitos: a) aquele não tiver condições de agir, b) aquele não

for capacitado tecnicamente, c) este tiver condições de agir, e d) este for capacitado

tecnicamente.

Aquele deverá conhecer e confiar plenamente que o paciente estará mais

seguro aos cuidados deste, pois os requisitos “a” e “b” são alternativos, assim como “c”

ou “d”. Por outro lado, “a” e/ou “b” são complementares a “c” e/ou “d”.

Caso contrário, por mais que haja outro médico ou serviço médico na localidade,

tanto dentro de um hospital quanto na rua ou lugares públicos, o médico que não

cumpri aqueles quatro requisitos estará configurado na conduta omissiva ética

administrativa.

4.3. Interpretação Combinada dos Artigos 135 do Código Penal e do Artigo 33 do

Código de Ética Médica. O médico, assim como a maioria dos profissionais, quando

está atuando em seu exercício, simultaneamente estará sendo regido sob diversos

diplomas, sendo de âmbito legislativo, administrativo e executivo.

No âmbito legislativo, comum é a ocorrência da atividade medica no Código

Penal, mais precisamente da Omissão de Socorro, art. 135 (da periclitação da vida e

da saúde):

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem

risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa

inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não

pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena - detenção,

de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único - A pena é aumentada

de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e

triplicada, se resulta a morte.

Não excluindo a abrangência legislativa do Código Penal, e sim a

complementando, especificando-a, coube ao Conselho Federal de Medicina publicar o

Código de Ética Médica, nele prevendo os princípios norteadores da atividade medica e

especificando os direitos e deveres do profissional, dentre eles, o dever de agir, assim:

Art. 33. Deixar de atender paciente que procure seus cuidados

profissionais em casos de urgência ou emergência, quando não haja

outro médico ou serviço médico em condições de fazê-lo.

O art. 33 está sustentado por diversos princípios que o próprio CEM o traz

elencado em seus primórdios, poderíamos citar esse como sendo:

Capítulo I

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

I - A Medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da

coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza

II - O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em

benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua

capacidade profissional.

IV - Ao médico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da

Medicina, bem como pelo prestígio e bom conceito da profissão.

V - Compete ao médico aprimorar continuamente seus conhecimentos e

usar o melhor do progresso científico em benefício do paciente.

VI - O médico guardará absoluto respeito pelo ser humano e atuará

sempre em seu benefício. Jamais utilizará seus conhecimentos para

causar sofrimento físico ou moral, para o extermínio do ser humano ou

para permitir e acobertar tentativa contra sua dignidade e integridade.

VII - O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo

obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua

consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de

ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou

quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.

XII - O médico empenhar-se-á pela melhor adequação do trabalho ao

ser humano, pela eliminação e pelo controle dos riscos à saúde

inerentes às atividades laborais.

XIII - O médico comunicará às autoridades competentes quaisquer

formas de deterioração do ecossistema, prejudiciais à saúde e à vida.

XIV - O médico empenhar-se-á em melhorar os padrões dos serviços

médicos e em assumir sua responsabilidade em relação à saúde

pública, à educação sanitária e à legislação referente à saúde.

XVII - As relações do médico com os demais profissionais devem

basear-se no respeito mútuo, na liberdade e na independência de cada

um, buscando sempre o interesse e o bem-estar do paciente.

XIX - O médico se responsabilizará, em caráter pessoal e nunca

presumido, pelos seus atos profissionais, resultantes de relação

particular de confiança e executados com diligência, competência e

prudência.

O princípio trazido no inciso VII está relacionado diretamente com o art. 33, os

outros são norteadores gerais em relação a omissão. Todos esses princípios devem

ser observados integralmente pelo médico na sua atuação profissional, assim:

Em matéria de ética médica, por muito tempo, desde a vigência do

diploma de 1988, houve uma discussão acirrada sobre o fato de o

médico poder ou não ser responsabilizado por descumprimento de

algum dos princípios fundamentais. Para uns, desrespeitar uma norma

princípio significaria a possibilidade de responsabilização e apenação

ética; para outros; as normas princípios não poderiam ser utilizadas

para punir um médico, ainda que claramente uma dessas normas tenha

sido desrespeitada.

E continua:

Pois bem, depois de muita discussão, finalmente o CFM chegou a um

consenso e determinou uma imediata uniformização. Em reunião

plenária realizada em 12/04/10 (véspera da entrada em vigor do

NCEM), ficou definido que os princípios fundamentais que no CEM de

1988 eram considerados para apenar o médico, mas que agora, com o

NCEM (capítulo I – incisos I a XXV), esses não mais poderiam ser

aplicados para fins de punição.68

A pena poderá estar entre uma advertência, pública ou privada, até o

descredenciamento do médico, ou seja, com esse posicionamento, as penas éticas-

administrativa dos médicos deveriam estar previstas de forma concreta, e não

abstratas e genéricas, como os princípios. Para cada conduta proibida deveria estar

descrita a sua pena, ou parâmetros para tal, mais isso não aconteceu, e no CEM não

68

Júnior, Edmilson de Almeida Barros. Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará,

Concurso de Monografias Prof. DalgimarBeserra de Menezes, O novo código de ética

médica.1aed, Vol. V. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2012. Pg. 45, 46.

faltam esforços para os leitores encontrarem as penas relativas aos princípios ou

infrações, assim observa:

Equivocou-se o CFM em atestar explicitamente a impunidade ética por

desobediência principiológica. Da forma que decidiu, desprezou seus

próprios esforços normativos. Reconheceu que parte dos ditames do

NCEM é meramente decorativa; uma ilustração; um ideal a ser

alcançado, mas jamais passível de responsabilização.69

A sociedade poderia esperar que, aqueles que tem conhecimento da prática e

da técnica pudessem julgar da melhor forma possível a atividade de seus pares, como

aquele que conhece ao fundo o dia-a-dia dessa arte, e não aquele que conhece o

artista.

Assim não foi da maneira adequada que o CEM veio dispor quanto as

penalidades, e sim de forma abstrata ao seu final, dando liberdade para conselheiros

por bem optarem a pena a ser aplicada ao caso concreto, é o disposto:

Capítulo XIV

DISPOSIÇÕES GERAIS

69

Júnior, Edmilson de Almeida Barros. Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará,

Concurso de Monografias Prof. DalgimarBeserra de Menezes, O novo código de ética

médica.1aed, Vol. V. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2012. Pg. 47.

II - Os médicos que cometerem faltas graves previstas neste Código e

cuja continuidade do exercício profissional constitua risco de danos

irreparáveis ao paciente ou à sociedade poderão ter o exercício

profissional suspenso mediante procedimento administrativo específico.

Podemos observar o alto grau de subjetivismo do Código quando trata das

penalidades, abrangendo-as de forma abstrata e genérica, em relação às infrações

cometidas, a sua repercussão/consequência em relação à sua gravidade.

Ficou ao cargo dos conselheiros membros do Tribunal de Ética do CFM, aplicar

a sanção ao caso concreto, o médico infrator, até a decisão final tinha a angústia da

advertência até o desespero da exclusão dos quadros.

Dentro das raras decisões administrativas em processos disciplinares com

sentença condenatória pela pratica do delito omissivo, podemos observar como a

Omissão de Socorro tem sido penalizada por aqueles que compartilham das mesmas

dificuldades profissionais dos denunciados, assim:

Número: 3/1988 Origem: CRM-PR Tribunal: PLENO Relator: CONS.

GABRIEL PAULO SKROCH Ementa:"PACIENTE

POLITRAUMATIZADO ATENDIDO EM HOSPITAL POR

ESPECIALISTA QUE EFETUOU O ATENDIMENTO NECESSARIO

DENTRO DE SUA ESPECIALIDADE, SOLICITANDO, INCLUSIVE,

EXAMES - CHAMAMENTO DE MEDICOS NEUROLOGISTAS DE

PLANTAO PARA PROSSEGUIREM NO ATENDIMENTO TENDO EM

VISTA LESOES NA CABECA - NEGATIVA DE ATENDIMENTO POR

PARTE DOS DOIS NEUROLOGISTAS - OMISSAO DE SOCORRO -

OBITO SUPERVENIENTE - ARTIGOS 57 E 29 DO CODIGO DE ETICA

MEDICA IMPUTADOS AO ORTOPEDISTA E ARTIGO 58 DO CODIGO

DE ETICA MEDICA AOS NEUROLOGISTAS - DENUNCIA

IMPROCEDENTE EM RELACAO AO PRIMEIRO E PROCEDENTE

QUANTO AOS OUTROS. ///// O ATENDIMENTO PRESTADO PELO

ORTOPEDISTA FOI REALIZADO DENTRO DAS NORMAS E

TECNICAS EXIGIVEIS AO CASO, COM REALIZACAO DE EXAMES

ESPECIFICOS PARA AVERIGUACAO DE POSSIVEIS PROBLEMAS

ORTOPEDICOS, NAO SE PODENDO, ASSIM, IMPUTAR AO MESMO

QUALQUER INFRINGENCIA A NORMA ETICA EM SEU

PROCEDIMENTO, SENDO IMPOSITIVA A SUA ABSOLVICAO.

REFERENTEMENTE AOS NEUROLOGISTAS, REGULARMENTE

CONVOCADOS PARA EFETUAREM O ATENDIMENTO,

COMPROVADA A SUA NEGATIVA DE COMPARECIMENTO AO

HOSPITAL, TIPIFICADO RESTOU A FIGURA DELITUOSA DA

OMISSAO DE SOCORRO, CAPITULADA NO ARTIGO 58 DO

CODIGO DE ETICA MEDICA, COM O AGRAVANTE DO OBITO

SUPERVENIENTE, SENDO PROCEDENTE A DENUNCIA CONTRA

AMBOS.".Acórdão: Os membros do CRM-PR, por maioria, na forma

do voto do Senhor Revisor, não acolheram a imputação feita ao

denunciado MZN, de infração aos artigos 57 e 29 do Código de Ética

Medica, ABSOLVENDO-O, e, por maioria, na forma dos votos dos

Senhores Relator e Revisor, acolheram a imputação feita aos

denunciados MPC e WC, de infração ao art. 58 do Código de Ética

Medica, aplicando-lhes, também por maioria e na forma dos votos dos

Senhores Relator e Revisor, a pe8na de CENSURA PUBLICA EM

PUBLICACAO OFICIAL, prevista na letra "c", do art. 22, da Lei

3.268/57, conforme Ata no. 700, de 20 de setembro de 1993.

Publicação:(GRIFO NOSSO)

Podemos observar pela ementa que, in casu, ficou configurada a omissão de

socorro, com o agravante do óbito superveniente, ou seja, com o nexo causal

diretamente vinculado ao resultado morte, e a pena aplicada foi à censura pública em

publicação oficial, aquela censura que se torna pública.

Os nobres conselheiros tinham em seu alcance as seguintes penalidades da Lei

3268/57 para serem aplicadas:

Art. 22. As penas disciplinares aplicáveis pelos Conselhos Regionais

aos seus membros são as seguintes:

a) advertência confidencial em aviso reservado;

b) censura confidencial em aviso reservado;

c) censura pública em publicação oficial;

d) suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias;

e) cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho

Federal.

Data vênia aos excelentíssimos senhores conselheiros, mas esse caso

demonstra a fragilidade do código de ética quando não elenca a penalidade para

determinada infração, trazendo-a em outro diploma de forma genérica e abstrata a ser

aplicada a todas as infrações a depender do caso concreto.

Isso se demonstra inviável, tanto para o denunciado, que não tem a menor ideia

da penalidade que irá sofrer, quanto para os conselheiros, os quais, na melhor das

hipóteses ficaram à deriva no texto legal. Sem contar que, aos olhos da sociedade

pode vir a causar uma grande aparência de pessoalidade e corporativismo, por mais

que isso não venha a ocorrer, dessa forma:

O processo administrativo disciplinar esgota-se no âmbito da matéria

disciplinar por si só, não gerando efeitos de ordem civil ou penal, sendo

toda a sua repercussão no campo da moral e da atividade profissional.

Quando o médico, no exercício da profissão, infringe os postulados

éticos, e em consequência fica sujeito a uma sanção moral, há uma

quebra da norma de conduta aceita pelos seus pares e pela

sociedade.70

Diferentemente do âmbito administrativo, no judiciário o mesmo caso teria

repercussões muito adversas, porquanto preceitua o Art. 135 CP em seu parágrafo

único que a pena é triplicada caso a omissão resulta a morte, ou seja, enquanto a pena

administrativa é uma censura, no judiciário no mínimo 3 meses de detenção.

Essa grande diferença de visão das infrações acarreta uma nítida insegurança

social e dos profissionais. Não podemos afirmar qual que está mais correta, porém, o

que se torna equivocado é a grande diferença entre censura e detenção mínima de três

meses.

Fato que deve ser reparado a fim de que se aproximem as interpretações da

gravidade da omissão, seja para maior penalidade ou menor, e sempre dentro dos

limites legais de cada esfera, seja ela administrativa ou judicial.

70

Arnt, Priscila Zambonato. Um estudo sobre a responsabilidade penal por erro médico na

legislação brasileira.Monografia. Curitiba: 2007, pg. 38.

5. Interpretaçãodo tipo mais benéfico ao denunciado. O denunciado que trata o

presente trabalho é o profissional da medicina, o médico, esse que será diferenciado

conforme a sua especialidade. As três especialidades escolhidas contemplam um

grande número de profissionais e práticas distintas.

Anestesiologia, Cardiologia e Diagnóstico por Imagem, as duas primeiras com

certa experiência em urgências e emergências a última com pouca experiência, porém

a semelhança é que todas são altamente dependentes de infraestrutura.

O tribunal de São Paulo, em decisão exemplar, já citada no presente estudo,

entendeu que não cabe a criminalização da omissão de socorro caso falte o

conhecimento técnico e experiência para que o sujeito ativo realize a uma conduta

adequada, assim:

TACRSP: “O delito de omissão de socorro só é punível a título de dolo e

não o comete quem, por insuficiência formação científica, ou

inexperiência, não avalia corretamente a gravidade do perigo e não

determina providência que profissional mais capaz e atento

eventualmente adotaria.” (RT 580/357).71

Interpretando tal decisão, podemos aplicá-la dentro da mesma formação

cientifica. A quantidade de informações e conhecimento que cada área exige chegou a

tal o nível de especialização que raras às vezes que o profissional ainda se lembra do

71

Mirabete, Julio Fabbrini. Código Penal interpretado. 6a ed. São Paulo: Atlas, 2007. Pg. 1072.

básico da outra área de conhecimento, ainda mais em momentos de emergências e

urgências, em que não há tempo para pesquisa, apenas para agir, dessa forma:

O progresso, ocorrido nas ultimas décadas, proporcionou soma tal de

conhecimentos que impede seu domínio por um só homem. O médico

de hoje, para conhecer em profundidade uma área, é levado cada vez

mais a reduzi-la em extensão. Assim vão aparecendo as

especialidades. Com o aumento do conhecimento estas vão se

subdividindo, resultando novas especialidades decorrentes desse

fracionamento.72

Concordamos com tal posição, de que hoje o conhecimento especifico chegou a

tal ponto que impede determinadas áreas de prestar o atendimento adequado ao

paciente que necessite de especialidade diversa daquela presente, a recusa não

poderá configurar omissão por ausência de dolo, então:

OMISSÃO DE SOCORRO – Médico que, procurado durante madrugada

para atender criança enferma em sua residência, escusa-se com a

afirmação de não dispor de aparelhagem adequada – Ausência de dolo

– Inteligência do art. 386, III, do CPP – Absolvição. O dolo, no crime de

omissão de socorro, consiste na vontade de omitir assistência ao

periclitante, devendo o agente ter consciência de que a vitima se

encontra numa das hipóteses previstas pela lei. A conclusão do médico

que, procurado durante a madrugada para atender criança enferma,

sem chegar a vê-la, escusa-se com a afirmação de não dispor, em sua

residência, de aparelhagem adequada, embora possa não merecer

72

Moraes, Irany Novah. Erro medico e a lei.3a ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995. Pg.

56.

aplausos, não interessa à órbita penal se despida de dolo (TACrimSP,

rel. Juiz Ercílio Sampaio, JTACrimSP-Lex 81/538).73

Concordamos com posicionamento acima, de que a interpretação da omissão de

socorro se deve dar especificamente ao caso concreto valorando a especialidade do

sujeito ativo e as condições para que tal exerça a sua atividade.

Vamos supor que uma médica de Diagnóstico por Imagem, com nível e tempo

considerado de especialização, a qual possui insuficiente experiência em urgências e

emergências, ao sair para almoçar, já no restaurante, outro cliente enfarta. Tal medica

nada poderá fazer, caso ela se sinta insegura de seus procedimentos e consciente de

que uma atitude sua possa piorar o quadro clínico do agente passivo.

O mesmo poderá acontecer com o médico Anestesiologista, que mesmo com

certo grau de experiência em quadros de emergência e urgência, está altamente

dependente de matérias/estrutura hospitalar.Diferentemente, o cardiologista, estará

altamente capacitado para o atendimento até certo ponto, onde precisará de matérias

médicos, assim:

Sobre tais reflexões, proponho perceber que a culpa do médico deve

ser olhada com largueza de sentimentos. Em Medicina não existem

métodos obrigatórios de exames e tratamentos. Tudo está relacionado

as circunstâncias, uma vez que se trata da hermenêutica, afinal, este

processo da doença está inexoravelmente preso ao modelo médico-

73

Neto, Miguel Kfouri. A responsabilidade civil do medico. 6a ed. São Paulo: Editora Revista dos

Tribunais, 2010. Pg. 465.

ideativo adotado. Ao exercitar a Medicina, o médico (como qualquer

cientista) coloca-se como “fiador” de uma determinada tradição.

E continua:

Não “compreende” a doença, no sentido de captar todos os seus sinais,

mas “interpreta-a”, valendo-se dos signos que supõe serem

determinantes para o tratamento: “compreender e interpretar são uma e

a mesma coisa”. Os recentes desenvolvimentos técnicos e tecnológicos

da ciência médica, sem dúvida alguma, tornam mais acurado o “olhar

clínico”, mas, nem por isso, fazem-no inconfundível.74

Lembramos que a todos que está a obrigação de solicitar a emergência, chamar

uma ambulância, e que tais profissionais tenham a consciência de suas limitações

técnicas para o atendimento ao paciente, o profissional saiba que uma ação sua seja

potencialmente causadora de lesão maior da atual, assim:

É certo que nem sempre se trona fácil, em certas circunstâncias aceitar

a intervenção de normas numa profissão que encerra aspectos morais,

éticos, ocasionais e pessoais, como na Medicina, onde as relações

médico-jurídicas nem sempre se apresentam de claro entendimento. A

lei e a ética, a norma e a consciência, representadas nas figuras do

médico e do legislador, podem entrar em conflito em determinadas

situações concretas da medicina corrente.Assim tem-se de admitir que,

74

Coutinho, Luiz Augusto. Responsabilidade penal do médico. Curitiba: Juruá, 2010. Pg. 19.

em certas ocasiões, é o médico o único árbitro capaz de entender até

que ponto sua conduta pode trazer benefício ao doente.75

Não podemos obrigar a todos esses profissionais que tenham a plenitude do

conhecimento técnico, e que andem 24 horas por dia com equipamentos para

eventualmente prestar socorro a algum potencial paciente que esteja por perto. A

liberdade de atuação do médico abrange em si a não ação caso essa seja a melhor

atitude a ser adotada para saúde do paciente, nesse sentido:

É consenso na sociedade e, especificamente na comunidade científica,

que o médico possui a completa liberdade de escolha, desde que atue

em consonância com a denominada lexartis, podendo adotar o método

de tratamento que entender adequado ao caso específico, sendo de sua

livre opção, independentemente de ser um critério majoritário, ou não.

Ademais, não cabe ao operador do Direito e em especial ao Estado,

através do juiz, fazer apreciações para fins condenatórios, em favor ou

contra a orientação científica de determinada escola médica, posto que

tal ação violaria a liberdade do médico.76

Isto posto, podemos observar que a melhor interpretação e aplicação do Art. 135

CP para o exercício profissional da medicina, não está apenas nos liames do CP, mas

na completude do direito, como nos dizeres de Rui Barbosa na Oração aos Moços é

tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se

desigualam.

75

França, Genival Veloso de. Direito Médico. – 6. ed. – São Paulo: Fundação BYK, 1994. pg. 21

76Coutinho, Luiz Augusto. Responsabilidade penal do médico. Curitiba: Juruá, 2010. Pg. 29.

A necessidade de aplicar distintamente o tipo penal para os médicos se baseia

na claridade da realidade dessa profissão, a qual não pode ser visualizada como algo

uno pelos demais, daí reside a interpretação distinta para a arte médica e se

aprofundando conforme a especialização daqueles profissionais.

6. Conclusão. Durante séculos os profissionais da arte da Medicina foram

considerados por toda a sociedade como “semideuses”. Sua

palavra/opinião/diagnóstico era incontestável, praticamente virava Lei, ao passo que a

única alternativa era obedecer, pois ninguém contestaria pessoa com tamanho grau de

instrução.

Acontece que na última metade do século XX, diversos fatores tais como, o

grande aumento do número desses profissionais no mercado e a maior acessibilidade

da população para adquirir informações a respeito da pratica médica, fez com que

diversas lides envolvendo o Médico e o paciente, chegassem para o crivo do Poder

Judiciário.

Este que por sua vez, se deparava com uma nova situação, pouco estudada por

eles e pelo resto da doutrina brasileira, além de todos os operadores do Direito se

verem na necessidade de se aprimorarem, e de adequar os dispositivos legais

existentes as situações específicas. Mais comum era, e ainda são, as lides no âmbito

civil, porém não demorou a que os penalistas se encontrassem com assuntos

envolvendo a pratica médica.

Entre muitas questões, uma de notável importância encontra-se no artigo 135 do

Código Penal, referente ao artigo 33 do Código de Ética Médica, a Omissão de

Socorro.

A linha tênue entre a vida e a morte e lesões permanentes no “objeto” de

trabalho do Médico é inerente à profissão, somado a precária estrutura da

administração da saúde brasileira tem se tornado um verdadeiro tormento para esses

profissionais que vive o dia-a-dia dessa verdadeira “espada de Dâmocles”.

Devido às inúmeras e notáveis peculiaridades envolvendo tal arte, o presente

estudo possibilitou o aprofundamento da matéria, embasou aqueles que acreditam que

a omissão de socorro deve ser interpretada e aplicada de uma forma diferenciada a

depender da especialidade de cada profissional, e não indistintamente, sem a

observância ao caso concreto.

7. Referências. ARNT, Priscila Zambonato. Um estudo sobre a responsabilidade

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