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FGV DIREITO SP MESTRADO PROFISSIONAL Mecanismos contratuais de solução de impasses em sociedades empresariais - Deadlock Provisions Francisco Loureiro Severien Projeto de pesquisa apresentado ao Mestrado Profissional da FGV Direito SP, sob orientação da professora Lie Uema do Carmo Versão de [11.09.2017] 1. Tema, contexto e delimitação de escopo No Brasil, aproximadamente dois milhões de empresas são criadas todos os anos. Em sua maioria, o tipo societário escolhido é o das sociedades limitadas e por ações de capital fechado. As sociedades por ações têm sua criação, funcionamento e extinção regulados pela Lei n.º 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), ao passo em que a disciplina das sociedades limitadas está inserida no corpo do Código Civil de 2002. Em ambos os diplomas, há regras que estabelecem o quórum de deliberação para determinadas as matérias que o legislador atribuiu maior relevância para o funcionamento das sociedades. No entanto, a legislação não prevê soluções eficientes para os casos de empate ou para os casos em que o quórum legal ou contratualmente previsto para determinada deliberação social não é atingido. Estes impasses, a que a doutrina estrangeira chama de deadlocks, não raro resultam na paralisia do funcionamento da empresa e colocam em xeque a sua própria existência. Neste contexto, a solução proposta pela legislação societária quase sempre acaba por submeter a controvérsia à apreciação judicial (Art. 129 da Lei n.º 6.404/76) ou ao procedimento de dissolução, parcial ou total, da sociedade. Nestes últimos casos (dissolução total ou parcial), as partes devem se sujeitar ao procedimento de liquidação, no primeiro caso, e de apuração de haveres, no segundo. Ambos os procedimentos são demorados e custosos. Além disso, em qualquer dos casos, a paralisia das atividades sociais enquanto não solucionado o conflito, e a incerteza do resultado dos procedimentos judiciais inaugurados no âmbito societário, invariavelmente oneram o custo de transação deste tipo de relação contratual e revelam a ineficiência de nossa regulação a respeito desta matéria. Neste trabalho, nos propomos a examinar modelos de arranjos contratuais que evitem que deadlocks societários conduzam os sócios às portas do Poder Judiciário. A aplicação inteligente de cláusulas de solução de impasses (deadlock provisions), como, por exemplo, a criação de colegiados deliberativos com membros eleitos previamente e em número impar, a utilização de cláusulas como as cláusulas de compra e venda (shotguns, russian roulette, put e

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FGV DIREITO SP

MESTRADO PROFISSIONAL

Mecanismos contratuais de solução de impasses em sociedades empresariais -

Deadlock Provisions

Francisco Loureiro Severien

Projeto de pesquisa apresentado ao

Mestrado Profissional da FGV Direito SP,

sob orientação da professora Lie Uema do Carmo

Versão de [11.09.2017]

1. Tema, contexto e delimitação de escopo

No Brasil, aproximadamente dois milhões de empresas são criadas todos os anos. Em

sua maioria, o tipo societário escolhido é o das sociedades limitadas e por ações de capital

fechado. As sociedades por ações têm sua criação, funcionamento e extinção regulados pela Lei

n.º 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), ao passo em que a disciplina das sociedades

limitadas está inserida no corpo do Código Civil de 2002.

Em ambos os diplomas, há regras que estabelecem o quórum de deliberação para

determinadas as matérias que o legislador atribuiu maior relevância para o funcionamento das

sociedades. No entanto, a legislação não prevê soluções eficientes para os casos de empate ou

para os casos em que o quórum legal ou contratualmente previsto para determinada

deliberação social não é atingido. Estes impasses, a que a doutrina estrangeira chama de

deadlocks, não raro resultam na paralisia do funcionamento da empresa e colocam em xeque a

sua própria existência.

Neste contexto, a solução proposta pela legislação societária quase sempre acaba por

submeter a controvérsia à apreciação judicial (Art. 129 da Lei n.º 6.404/76) ou ao

procedimento de dissolução, parcial ou total, da sociedade. Nestes últimos casos (dissolução

total ou parcial), as partes devem se sujeitar ao procedimento de liquidação, no primeiro caso,

e de apuração de haveres, no segundo. Ambos os procedimentos são demorados e custosos.

Além disso, em qualquer dos casos, a paralisia das atividades sociais enquanto não solucionado

o conflito, e a incerteza do resultado dos procedimentos judiciais inaugurados no âmbito

societário, invariavelmente oneram o custo de transação deste tipo de relação contratual e

revelam a ineficiência de nossa regulação a respeito desta matéria.

Neste trabalho, nos propomos a examinar modelos de arranjos contratuais que evitem

que deadlocks societários conduzam os sócios às portas do Poder Judiciário. A aplicação

inteligente de cláusulas de solução de impasses (deadlock provisions), como, por exemplo, a

criação de colegiados deliberativos com membros eleitos previamente e em número impar, a

utilização de cláusulas como as cláusulas de compra e venda (shotguns, russian roulette, put e

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call), cláusulas de desempate internas e externas, entre outras, caso bem elaboradas e

introduzidas no ambiente societário no momento da celebração do pacto social (ex-ante),

podem dar agilidade à solução de conflitos, reduzindo o custo de transação e minimizando o

risco de insucesso da sociedade.

O objetivo do trabalho é explorar a prática contratual de elaboração destas disposições

contratuais e avaliar a sua adequação à solução dos conflitos societários mais comuns entre

empresas criadas com perfil de participações igualitárias, ou ainda, aquelas em que a formação

de maiorias é insuficiente para a tomada de decisão sobre determinados temas que exigem, por

lei ou por disposição contratual, quórum qualificado.

A ideia é verticalizar o estudo destas disposições contratuais (deadlock provisions),

contextualizando a sua utilização em outros países como os EUA, Reino Unido, Itália e França,

e examinando a sua adequação à realidade brasileira. Neste percurso, procuraremos identificar

problemas de ordem jurídica (validade e eficácia), assim como de natureza prática relativos à

aplicação destas cláusulas contratuais no ecossistema legal nacional.

Como resultado, espera-se que o trabalho possa servir de inspiração para advogados

que estejam elaborando contratos sociais, estatutos e acordos de sócios, relativos à empresas

com características de participação igualitária ou que, por outras razões, apresentem uma

tendência à formação de impasses entre os sócios (deadlocks). Nesta hipótese, o trabalho

poderá servir como ferramenta de auxilio a estes profissionais, pois terão à disposição um

estudo crítico em que poderão se apoiar na elaboração de cláusulas contratuais que minimizem

os prejuízos resultantes da paralisia societária que resulta de situações de impasse.

2. Modelo de pesquisa

O modelo de pesquisa a ser adotado será predominantemente exploratório de uma

prática jurídica pouco formalizada. A partir da observação empírica de que existem milhares

de empresas no Brasil cujos atos constitutivos (contrato social ou estatutos) ou acordos

parassociais (acordos de sócios e acionistas) não dispõem de mecanismos eficientes de solução

de controvérsias internas, o que se pretende é formular um texto doutrinário que apresente

soluções práticas, de perfil contratual, para a dissolução de impasses.

Neste contexto, entendemos que a melhor abordagem para enfrentar o tema é explorar

o ramo do direito societário e contratual em busca das ferramentas que o nosso ordenamento

dispõe para a solução dos problemas anteriormente relatados. Nesta pesquisa, também serão

exploradas as práticas jurídicas afins presentes no ordenamento de outros países,

principalmente nos Estados Unidos da América e Reino Unido, mas também nos países de

tradição continental. A intenção será buscar inspiração em países cuja prática contratual e

societária seja mais consolidada para, na medida do que for compatível com a nossa realidade,

adaptar e sugerir possíveis aplicações práticas na solução de impasses societários no Brasil.

Como o trabalho tem por objetivo apontar de forma crítica soluções contratuais para

controvérsias societárias, é correto afirmar que o objetivo também será o de enfrentar

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problemas práticos presentes no cotidiano dos advogados que militam nesta área. Neste

aspecto, a partir da pesquisa exploratória da prática contratual societária, o trabalho servirá ao

propósito de apontar soluções para problemas concretos, daí porque o modelo de pesquisa

adotado será predominantemente exploratório, mas terá componentes de solução de

problemas práticos.

3. Problemas e quesitos

O problema central a ser endereçado pelo trabalho será o enfrentamento de situações

de impasse societário surgidas no ambiente de empresas cuja participação dos sócios é

igualitária, ou, naquelas em que haja um número maior de sócios, não se consiga atingir

maiorias legais e contratuais que viabilizem a tomada de decisão.

Os casos de impasses ou deadlocks formados entre sócios podem ser motivo suficiente

para levar qualquer empresa à uma situação de paralisia. As decisões envolvendo a nomeação

e destituição de administradores, capitalização da sociedade, transformação do tipo societário,

sucessão hereditária, expansão dos negócios via aquisições de outras companhias, mudança do

objeto social (diversificação dos negócios), dedicação dos sócios ao negócio, realização de

investimentos relevantes e a obtenção de empréstimos podem ser motivos de divergência entre

sócios e, portanto, formação de impasses.

Caso os sócios não tenham preparado e pensado em métodos contratuais de solução

destes problemas, a disputa invariavelmente os conduzirá ao Judiciário, cujos problemas de

instabilidade jurisprudencial, corrupção e morosidade contribuirão, na maior parte das vezes,

ao agravamento da crise instalada no ambiente interno da sociedade, com repercussão perante

seus credores, parceiros e empregados.

Há outras hipóteses de impasses, não vinculados à empresas que detenham participação

societária igualitária, mas cuja estrutura de capital possa inviabilizar a construção de maiorias

que atinjam quóruns qualificados exigidos por lei ou contrato para a tomada de determinadas

deliberações sociais.

É a hipótese, por exemplo, do inciso I do Art. 1.076 do Código Civil de 2002, que

estabelece que somente pelo voto de ¾ dos sócios poderá ser deliberada a modificação do

contrato social e a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade, ou a cessação do estado

de liquidação das sociedades limitadas.

Neste contexto, o trabalho deverá responder aos seguintes quesitos:

O tratamento conferido pela legislação societária Brasileira para a solução de

controvérsias envolvendo impasses (deadlocks) entre sócios é adequada e

abrange as principais hipóteses de problemas enfrentados por empresas

nacionais?

O Poder Judiciário tem sido eficiente no enfrentamento das demandas que lhe

são submetidas? As soluções judiciais são eficientes em termos de custo e tempo?

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Há mecanismos de solução de impasses societários de perfil contratual que

produzam um resultado mais eficiente em termos de custo e tempo? Quais

seriam estes mecanismos?

Em outros países (EUA e Reino Unido), como se solucionam estas controvérsias?

É possível adaptar os mecanismos adotados nestes países à realidade brasileira?

Estas cláusulas são válidas e eficazes no Brasil?

Para os principais problemas envolvendo impasses entre sócios (deadlocks), que

cláusulas contratuais (deadlock provisions) apresentam a melhor solução

contratual para a questão?

Quais os principais riscos, vantagens e desvantagens envolvidos na utilização

destas cláusulas para solução de impasses entre sócios?

4. Justificação da relevância prática e do potencial inovador

O trabalho pretende servir como um texto doutrinário com viés prático, com o objetivo

de verticalizar a análise da aplicabilidade, no país, de deadlock provisions. Neste sentido, o

trabalho poderá servir de importante orientação para advogados que militam na área do direito

societário. Não desconhecemos que existem inúmeros manuais de redação e elaboração de

contratos. Entretanto, não conhecemos algum que seja focado no tema que aqui se pretende

abordar.

Até mesmo no âmbito das grandes empresas nacionais, em que os arranjos societários

são mais sofisticados, não se observa com frequência a aplicação das disposições contratuais

que pretendemos examinar neste trabalho. Neste contexto, entendemos que o aprofundamento

da análise quanto validade e eficácia destas cláusulas pode auxiliar na solução de controvérsias

em empresas de qualquer porte, incluindo as médias e pequenas empresas. Afinal, os impasses

entre sócios podem se manifestar em qualquer tipo de sociedade, independentemente do seu

porte ou tipo.

Portanto, parece-nos que se forem atingidos os objetivos do trabalho, ele servirá de

importante ferramenta de auxílio para a formulação de contratos societários por advogados da

área, revelando-se, assim, o seu perfil prático mais relevante.

No que se refere ao potencial inovador, entendemos que o trabalho abordará um tema

ainda pouco explorado tanto na doutrina como na prática corrente do Direito Societário. Isto

porque, apesar dos problemas que se pretende enfrentar se observarem ordinariamente no

dia-a-dia das empresas nacionais, não se tem visto, na prática disseminada, a construção de

soluções contratuais eficientes para estas questões. Queremos crer que esta constatação revela

uma ausência de textos doutrinários de viés prático, que busquem disseminar a utilização de

mecanismos contratuais voltados para a solução de conflitos societários.

Neste contexto, a produção deste trabalho poderá auxiliar na formação de conteúdo

jurídico que dissemine a prática, e, com isso, sirva para incrementar a eficiência na solução das

controvérsias societárias. Neste aspecto, o trabalho pode representar importante traço de

inovação, sobretudo porque o aprofundamento que pretendemos imprimir na sua elaboração

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seguramente poderá servir de influencia futura na formulação de contratos sociais e estatutos,

ou acordos de sócios, de empresas, especialmente de médio e pequeno porte.

5. Fontes e métodos de investigação

Inicialmente, pretendemos realizar um trabalho empírico de coleta de dados

envolvendo o perfil das empresas brasileiras e a sua classificação por categorias (EIRELI, LTDA.,

S.A. Fechadas e Abertas). O objetivo é fixar a abrangência do objeto do trabalho em relação ao

ambiente societário nacional. O IBGE contém pesquisas sobre esse assunto, razão pela qual

iniciaremos com a análise desta base estatística.

Partindo deste ponto inicial de informação, buscaremos no Departamento Nacional de

Registro de Comércio – DNRC, na Junta Comercial do Estado de Pernambuco e de São Paulo,

obter dados envolvendo o quantitativo de empresas cuja participação societária seja igualitária

ou cuja divisão do capital social não permita a formação de maiorias qualificadas. Em seguida,

pelo método de amostragem, pretendemos examinar o conteúdo dos atos constitutivos destas

sociedades para poder dimensionar com maior precisão a incidência de cláusulas de solução de

impasses (deadlock provisions) nos referidos atos societários. Caso existam, trataremos de

quantificar e classificar as referidas cláusulas por tipo de matéria que pretendem solucionar e

qual o mecanismo previsto para a solução do conflito.

Em um outro vetor de pesquisa, pretendemos acessar os atos constitutivos e acordos de

acionistas relativos às empresas listadas na BMF&Bovespa. A partir deste material, buscaremos

realizar uma classificação destes acordos levando em consideração os mesmos critérios

utilizados para as empresas não listadas, conforme indicado no item anterior. Também neste

ambiente de pesquisa consultaremos a Comissão de Valores Mobiliários - CVM na tentativa de

examinar os acordos de acionistas que tenham sido arquivados perante o órgão regulador do

mercado de capitais. A ideia é traçar um paralelo entre a incidência de cláusulas de solução de

impasses utilizadas por empresas de pequeno e médio porte em comparação com aquelas

estruturas utilizadas pelas empresas de maior envergadura econômica.

Como último elemento de pesquisa empírica, tentaremos buscar perante o Poder

Judiciário de Pernambuco, São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná, Santa Catarina e Rio

Grande do Sul, dados relacionados à quantidade, tipo e tempo de duração das principais causas

envolvendo disputas societárias. Neste ponto, o objetivo é demonstrar que o caminho judicial

para a solução de controvérsias societárias não é o mais eficiente, porquanto o tempo de

duração dos processos judiciais, associado à imprevisibilidade dos seus resultados aponta para

uma elevação dos custos deste tipo de solução.

Do ponto de vista teórico, utilizaremos como fonte de pesquisa, além da legislação

nacional e estrangeira, a doutrina especializada em contratos e direito societário produzida no

país e no exterior. Observamos que existe uma quantidade razoável de literatura,

especialmente nos EUA e Reino Unido, sobre assuntos correlatos com o objeto do trabalho, fato

que contribuirá para a boa fundamentação da pesquisa.

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6. Familiaridade com o objeto, acessibilidade de informações e envolvimento

pessoal

Como profissional atuo na área do direito empresarial, com ênfase no âmbito societário.

Tenho como clientes empresas de médio e pequeno porte, cuja estrutura de formação de capital

social é bastante coincidente com o objeto do estudo. Os problemas que o trabalho pretende

enfrentar são os problemas que os meus clientes vivenciam ou podem vir a vivenciar.

Este contexto profissional me permite ter como laboratório a minha própria prática

profissional. Também acredito que o primeiro beneficiário do resultado do trabalho serei eu

mesmo, uma vez que as soluções contratuais que pretendo propor como resultado do trabalho

serão de grande valor para a formulação dos contratos que são demandados do meu escritório.

Por essa razão, entendo que o meu envolvimento pessoal com a matéria será um móvel que

contribuirá com o direcionamento prático do trabalho, além de garantir que eu não precise

mergulhar em assuntos totalmente novos ao meu cotidiano para elaborar o texto.

As informações que servirão de base empírica para o trabalho estão acessíveis em fontes

públicas (IBGE, Juntas Comerciais, BMF&BOVESPA, CNJ, Tribunais de Justiça), razoavelmente

sistematizadas e cujo acesso é possível pela internet. Tenho bom trânsito no âmbito do

Judiciário Pernambucano e perante a JUCEPE, de sorte que não acredito que terei dificuldades

em acessar as bases de dados destes órgãos para pesquisa. No estado de São Paulo talvez

encontre mais dificuldade. Entretanto, acredito que seja possível obter as informações

necessárias com esforço razoável, até porque são públicas e acessíveis a todos.

Quanto à pesquisa doutrinária e teórica, os textos relativos ao objeto do trabalho estão

disponíveis através dos canais ordinários de pesquisa acadêmica, razão pela qual não creio que

haverá dificuldades intransponíveis neste aspecto. Naturalmente, o exame de eventuais

acordos de sócios de companhias fechadas será um desafio, pois a regra é que estes contratos

permaneçam cerrados no ambiente privado dos sócios. Acredito, no entanto, que não será um

obstáculo à boa fundamentação empírica do texto.

7. Indicação de literatura especializada e obras de referência

A bibliografia para a realização do trabalho partirá da leitura de livros e artigos

especializados, nacionais e estrangeiros, que tratem de acordos de acionistas, métodos de

solução de controvérsias societárias e contratos. Como bibliografia preliminar, apontamos os

seguintes textos:

a) ASCARELLI, Tullio. Problemas das sociedades anônimas e direito comparado.

Campinas: Bookseller, 2001.

b) PRADO, Viviane Muller e VILLELA, Renato. Sociedades limitadas com

participações igualitárias: quando a saída é a solução. Revista de Direito

Empresarial – RDEmp. V. ano 13 n.1 Jan/Abr. 2016. Belo Horizonte: Fórum, 2016.

c) CRAVEIRO, Mariana Conti. Contratos entre sócios: interpretação e direito

societário. São Paulo: QuartierLatin, 2013.

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d) CRAVEIRO, Mariana Conti. Alguns aspectos jurídicos do desinvestimento nas

operações de private equity. In SOUZA JUNIOR, Francisco Satiro (Coord.).

Mercado de Capitais. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 91-117.

e) COX, Marcelo Dourado. Deadlock Provisions. Resolução contratual e conflitos

societários. São Paulo: Almedina, 2017.

f) CAMINHA, Uinie e LIMA, Juliana Cardoso. Contrato incompleto: uma perspectiva

entre direito e economia para contratos de longo termo. Rev. direito GV vol.10 nº.1

São Paulo Jan./June 2014.

g) LANDEO, Claudia M. e SPIER, Kathryn E. Shotguns and Deadlocks, 31 Yale Journal

on Regulation, 31/143, 2014.

h) BULGARELLI, Waldírio. Questões de Direito Societário. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1983.

8. Sumário preliminar

Introdução

Na introdução trataremos de contextualizar o problema a ser abordado. Esta

contextualização será composta pelo resultado das pesquisas empíricas realizadas perante as

Juntas Comerciais consultadas, o IBGE, BMF&Bovespa e do Poder Judiciário. Espera-se que após

essa pesquisa empírica seja possível identificar claramente os problemas mais recorrentes

originados pela falta de definição, nos contratos de sociedade, de mecanismos de solução de

impasses (deadlock provisions).

Também na introdução, e como resultado dos dados empíricos coletados, será possível

delimitar quais os problemas (impasses societários) mais frequentes enfrentados pelas

sociedades que serão objeto de estudo, de sorte que estes problemas sirvam de ponto de

partida para o desdobramento do trabalho.

1. Principais causas de impasse entre sócios (Deadlocks)

Neste item, a proposta é discorrer sobre as principais causas de conflitos entre sócios,

apontando as razões de sua gênese e as repercussões negativas que eles podem ter para o bom

funcionamento da sociedade.

1.1 Desacordos relativos à investimentos

Grande parte dos desentendimentos entre sócios brotam do desalinhamento de

objetivos e de valores empresariais que cada sócio imputa em relação à sociedade. Ainda que

estes objetivos e valores estejam alinhados, há também hipóteses em que a situação financeira

de cada um seja desigual, de forma que as decisões relativas à realização de investimentos na

sociedade, por vezes podem causar inúmeras controvérsias e impasses. Aportar recursos

próprios, fontes de financiamento, venda de ativos, reinvestimento dos lucros, são apenas

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alguns temas que pode gerar incontáveis controvérsias entre sócios e representar a paralisia

da sociedade quando o consenso não é atingido.

1.2 Saída de sócios e desinvestimento

A saída de sócios, sejam eles sócios investidores ou que efetivamente participam da

gestão da sociedade, é um tema que gera controvérsias por vezes infindáveis. Normalmente os

mecanismos de solução de controvérsias dessa natureza não são claramente previstos nos

contratos, de sorte que não é raro que disputas em torno da possibilidade de saída de sócios da

sociedade, e, especialmente, da quantificação dos haveres do sócio que se retira, acabem

chegando ao Judiciário, prejudicando a sobrevivência da própria empresa.

1.3 Morte e incapacidade superveniente de sócio – relação com herdeiros –

sucessão em vida

A morte de sócios, a relação dos sócios remanescentes com herdeiros do falecido ou

incapaz, e a sucessão em vida dos sócios também são temas pouco tratados ou mal disciplinados

em contratos de empresas de pequeno e médio porte, em que boas práticas de governança são

pouco observadas.

1.4 Venda de participações e entrada de novos sócios

A venda de participações societárias também são causa de tensão entre sócios. Cláusulas

de preferência mal elaboradas, acordos de bloqueio quanto à entrada de sócios e a ausência de

disposições a respeito desta matéria são frequentes e causam impasses recorrentes.

1.5 Eleição e destituição de administradores (diretores) e conselheiros

Questão fundamental para o bom funcionamento de uma sociedade é a manutenção de

uma estrutura diretiva alinhada com os objetivos dos sócios. Não raro, os próprios sócios são

os diretores da sociedade, atuando em conjunto ou isoladamente. Em ambas as hipóteses, há

fontes de problemas graves. Impasses na eleição ou destituição de administradores podem

levar empresas à quebra muito rapidamente.

2. Cláusulas de solução de controvérsia (deadlock provisions)

Neste item do trabalho, o objetivo será elaborar uma descrição analítica de cláusulas

contratuais que possam arquitetar mecanismos de solução de controvérsias entre sócios. Cada

subitem corresponderá a uma cláusula, que deverá ter seu conteúdo descrito de forma analítica

e crítica. Neste contexto, trataremos de examinar toda a extensão do conteúdo das cláusulas

sugeridas, problematizando a sua aplicação à luz do ordenamento jurídico brasileiro. Serão

realizados testes de validade e eficácia destas provisões contratuais, bem como exame

comparativo de seu grau de eficiência em confronto com outras formas de solução judicial de

controvérsias societárias.

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2.1 Cláusula de formação de colegiados decisórios (conselhos, mediadores

ou árbitros)

Uma forma eficiente de evitar ou solucionar impasses societários é a criação de órgãos

colegiados com atribuições deliberativas dentro da estrutura de gestão das sociedades.

Obviamente, a hipótese mais comum é formação de conselhos de administração, criados com

membros apontados pelos sócios em número ímpar. É usual que empresas de grande porte,

sejam elas constituídas sob o tipo limitada ou por ações, prevejam em seus atos constitutivos

ou estatutos a formação de conselhos de administração. Dentre os poderes associados ao

respectivo conselho, pode ser atribuído o de arbitrar impasses existentes entre os sócios.

Alternativamente à formação de conselhos de administração aos quais também se

podem atribuir poderes para arbitrar impasses societários, existe a possibilidade de formação

de colegiados ad hoc, sem outras funções de gestão na companhia, mas tão somente de deliberar

acerca de impasses. Nestas hipóteses, o contrato social ou estatuto, ou ainda o acordo de sócios,

poderia prever que em caso de impasse dos sócios quanto à uma determinada deliberação, cada

sócio nomearia um mandatário (árbitro) e os mandatários, presumivelmente em número par,

elegeriam um presidente a quem caberia desempatar eventual deliberação.

Por outro giro, numa cláusula mais simples, os sócios poderiam, desde a formação da

sociedade, ou no próprio acordo de sócios, indicar um árbitro, que, isoladamente resolveria a

questão sujeita ao impasse, desempatando eventual deliberação.

Todas estas modalidades de disposição têm vantagens e desvantagens a depender do

ângulo pela qual sejam examinadas. O seu uso pode vir associado à outras cláusulas que

regulem o direito e a forma de saída do sócio ou grupo de sócios insatisfeitos com a deliberação

da sociedade. A sua validade e eficácia no âmbito do direito brasileiro também podem ser objeto

de discussão, conforme será detalhadamente esmiuçado no contexto deste trabalho.

2.2 Golden shares, voto qualificado ou de qualidade

É possível que os sócios, no ato de formação da sociedade ou em acordos parassociais

definam que para a aprovação de um determinado rol de matérias de interesse da sociedade,

sejam atribuídos a um sócio ou a um grupo de sócios poderes de voto afirmativo ou de veto

diferenciados dos demais integrantes da sociedade. Denominadas com frequência pela

doutrina estrangeira como golden shares, são ações ou quotas a que os sócios atribuem poderes

políticos de maior relevo, dada a importância dos sócios que as detêm, seja pelo fato de terem

fundado a companhia ou por manterem uma posição estratégica para atuar no interesse do

negócio. Aos detentores destas ações ou quotas, é conferido o direito de desempatar uma

determinada deliberação ou mesmo de vetar alguma, ainda que se tenha formado uma maioria

de consenso em torno dela.

No brasil, podemos denominar este tipo de arranjo como votos de qualidade ou

qualificados. A utilização deste tipo de cláusula tem por objetivo principal a proteção os

interesses de determinados sócios, que por diversas razões reservam para si poderes de maior

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relevância na deliberação de matérias estratégicas de interesse social da companhia. No

entanto, caso bem calibrada, a atribuição de poderes de desempate ou de veto a um ou outro

acionista, inclusive de forma alternada, e para a deliberação de matérias mais importantes de

interesse da sociedade, pode representar uma maneira inteligente de dissolver impasses sem

prejudicar o regular funcionamento da sociedade.

2.3 Shotguns Clauses (Russian Roulette, Texas Shoot-out e Mexican Shoot-

out)

Há hipóteses, no entanto, em que os impasses são insolúveis, ou os sócios não

concordam em submeter suas deliberações ao crivo de órgãos colegiados ou árbitros indicados

para esta finalidade. Nos casos em que a solução consensual é impossível e o impasse

demonstra tamanha gravidade que prejudica a própria continuidade da sociedade, a saída de

um dos sócios pode ser a melhor solução em termos de velocidade e eficiência.

O direito americano é rico na utilização deste tipo de disposição. Inclusive, há

precedentes judiciais determinando que a solução de deadlocks societários se dêem mediante

a implementação de alguma cláusula de saída, seja pela compra da participação de um sócio

pelo outro, seja pela venda de uma parcela majoritária do capital a um terceiro e até mesmo a

sua alienação total do negócio. Pelo efeito drástico que elas produzem (a saída de um ou mais

sócios da sociedade), bem como pelo fato de que elas são ativadas mediante a implementação

de algum mecanismo de gatilho (opção formada a partir de determinada condição previamente

estabelecida), a prática contratual atribuiu a este tipo de disposição a alcunha de shotgun clause.

As cláusulas shotgun estão inseridas no contexto das ofertas de compra e venda de

participações societárias (buy-or-sell offers), e tem como principal característica a definição

rápida e justa do preço de um conjunto de quotas ou ações formulada por seus próprios

detentores e não por um terceiro. Em geral, a característica comum de uma cláusula shotgun

pressupõe que um sócio ofereça ao outro uma oferta de compra de suas ações ou quotas de

capital, dando ao sócio que recebe a oferta a opção de vendê-las pelo preço ofertado ou de

comprar a participação do ofertante pelo mesmo valor.

As cláusulas shotgun admitem inúmeras variações, que gravitam em torno tanto

circunstâncias de fato que autorizam a sua execução (condições), quanto em relação à forma de

implementação do mecanismo de posicionamento das ofertas de uma parte para a outra. As

mais comuns são as denominadas Russian Roulette, Texas Shoot-out e Mexican Shoot-out. Esta

última também denominada de Dutch-Auction Clause.

Na Russian Roulette, uma vez implementada a condição que confere a um dos sócios o

direito de promover a sua execução, inicia-se o procedimento mediante o envio à outra parte

de uma oferta de compra de sua participação. A parte que recebe a oferta pode aceitá-la,

concordando em se retirar da sociedade pelo valor e condições propostas ou se obrigar a

adquirir a participação do ofertante nas mesmas condições da oferta.

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É uma cláusula que obriga o ofertante a calibrar sua proposta na busca de uma avaliação

justa do ativo, levando em conta a sua perspectiva sobre o negócio. Isto porque, nesta

modalidade de cláusula, somente uma das partes fornece a sua avaliação do ativo, vinculando-

se a ela, tanto para compra, como para venda. Este mecanismo pressupõe que o ofertante

formalize sua proposta com base em um valor equilibrado para a aquisição da participação da

outra parte, principalmente porque ele poderá ter que vender a sua participação pelo mesmo

valor sugerido para compra.

A lógica indica que o ofertante não avaliará a participação da outra parte por um valor

muito abaixo do que efetivamente vale o ativo, sob pena de estimular o outro a adquiri-lo nestas

condições. Pela razão diametralmente oposta, também se supõe que a proposta não deva conter

um preço muito superior ao valor do ativo, pois nesta hipótese a parte ofertante poderá estar

se obrigando a pagar mais do que o valor justo da participação objeto da disputa.

A cláusula de compra e venda denominada de Texas Shoot-out, prevê um formato

semelhante àquele habitualmente encontrado nas cláusulas Russian Roulette. A diferença

reside no fato de que ambas as partes em disputa devem trocar envelopes lacrados contendo

uma proposta para aquisição da participação societária da parte contrária. Aqui, quem

apresentar a proposta mais alta deve comprar a participação do outro pelo preço de sua própria

oferta.

A lógica desta modalidade de disposição está em garantir àquele sócio que mais enxerga

valor na companhia que se mantenha em seu controle. Esta é uma premissa objetiva e que tem

por pressuposto racional uma avaliação de risco do sócio. O acionista que está disposto à

empregar mais dinheiro na obtenção do controle do negócio, provavelmente estará mais

disposto à correr riscos controlados para recuperar o seu investimento, e, com isso, teria mais

condições de administrar de forma eficiente a companhia.

Por outro lado, este tipo de disposição pode estimular a formulação de propostas que

superem em muito o valor justo da companhia, ocasionando eventuais problemas de liquidez

do ofertante vencedor. A elaboração da cláusula deve deixar clara a estrutura de pagamento do

preço pela aquisição, caso seja diferente da modalidade à vista. Nesta hipótese, também é

importante que se predeterminem as estruturas de garantias oferecidas pelo comprador, com

vistas a minimizar o risco de inadimplemento das obrigações assumidas por ele em favor do

vendedor.

Em sentido ligeiramente diferente do que a Texas Shoot-out, a Mexican Shoot-out clause

ou Dutch Auction clause, pressupõe a mesma mecânica de troca de propostas com envelopes

fechados. Entretanto, ao invés de atribuir ao sócio que a presentar a proposta mais alta o direito

de adquirir a participação da outra parte pelo valor mais alto, a disposição obriga o sócio que

apresentou a proposta mais baixa a vender sua participação pela proposta que ele mesmo fez

(a mais baixa).

A racionalidade desta disposição caminha no sentido de não penalizar o sócio cuja

proposta seja mais arrojada em termos de preço. Isto porque, o pressuposto neste tipo de

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arranjo é o de que ambas as propostas ofertadas são justas. Portanto, aquele que demonstrou

maior apetite e enxergou maior valor na companhia deve ser beneficiado com o direito de

adquirir a participação do outro sócio que avaliou o ativo de maneira mais conservadora.

Seguindo a lógica ligeiramente invertida àquela prevista nas cláusulas Texas Shoot-out, a Dutch

Auction também parece ter o efeito de elevar a avaliação do ativo, contendo, entretanto, uma

solução mais justa, pois deixa de atribuir um prêmio injustificado ao sócio que demonstrar

menor interesse no controle do negócio.

No curso deste trabalho, serão problematizadas tanto as questões de ordem jurídica

envolvendo a utilização destas cláusulas no contexto brasileiro (validade e eficácia), como

também as questões de ordem prática, como, por exemplo, a necessidade de recurso à via

judicial para implementar a sua execução em caso de recusa por parte de qualquer dos

contratantes.

2.4 Put, Call e venda conjunta (problemas quanto à avaliação econômica

dos ativos)

Mais conhecidas do que as cláusulas anteriormente examinadas, as opções de compra e

venda (put e call options) pressupõem uma obrigação de uma das partes de vender ou de

comprar determinado ativo, durante lapso temporal definido, a partir da implementação de

uma determinada condição, ou a partir de um período ou data determinada. As cláusulas put e

call, servem à vários propósitos, dentre os quais o de proporcionar a alienação de participações

societárias a um custo predeterminado ou determinável mediante a aplicação de fórmulas

definidas em caráter antecedente.

Neste sentido, o cláusula put revela em favor de uma das partes o direito de obrigar a

parte contrária a adquirir a sua participação, de acordo com os critérios de preços previamente

definidos. Já a cláusula call, dá a uma das partes o direito de obrigar a outra a lhe vender a sua

participação também de acordo com critérios de valoração da companhia formulados de

maneira antecipada.

Por sua vez, também existe a possibilidade de que, em caso de impasse (deadlock), as

partes decidam alienar em conjunto a sua participação a um terceiro. Em geral são outorgados

mandatos aos representantes de cada uma das partes para que busquem no mercado potenciais

interessados na aquisição conjunta da participação dos sócios envolvidos no impasse.

Todas estas modalidade de solução de saída de sócios esbarram em problemas sérios

que envolvem os critérios de avaliação do ativo objeto de alienação. Tanto nas opções put e call,

quanto na venda conjunta, o segredo para uma execução expedita e eficiente dos ajustes

formulados é ter clareza nos critérios indicativos de preço, bem como nas condições que

servem de pressuposto para o exercício da opção. A intenção é minimizar comportamentos

desleais ou oportunistas de sócios detentores de opções desta natureza, impondo a venda de

participações com prejuízo ao adquirente, ou a compra com extrema vantagem deste em

desfavor do vendedor.

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Problemas como o que ocorreu com a Petrobras no caso da compra da refinaria de

Pasadena são exemplos de cláusulas put mal construídas, cuja execução resultou em graves

prejuízos aos seus acionistas. No entanto, cláusulas desta natureza, bem calibradas e

construídas de maneira objetiva e clara, podem dar velocidade e eficiência à solução de

deadlocks societários.

2.5 Divisão de ativos

A avaliação de ativos das companhias objeto de processos decisórios em que se

materializam deadlocks são uma fonte importante de problemas, e, não raro, o maior obstáculo

na solução destes impasses. O processo penoso de apuração dos haveres mediante

levantamento de balanços específicos, relativos à participação de sócio dissidente ou que

pretende se retirar da sociedade em caso de desentendimento com os demais sócios, pode ser

abreviado a partir da utilização de regras simples de divisão e escolha dos ativos e passivos da

companhia.

Parece óbvio, mas é intuitivo que as pessoas procurem ser tanto mais justas quanto

maior seja o risco de que elas próprias se sujeitem aos reflexos de suas escolhas. Esta lógica é

bastante exacerbada na formulação das cláusulas Shotgun, em especial a Russian Roulette e a

Mexican shoot-out (Dutch Auction). Nestas disposições, a parte que está obrigada a formular

uma proposta de aquisição para a participação da outra é instada à fazê-lo a partir de um

standard de “justeza” tanto simples, quanto eficaz. É o padrão de equilíbrio que a parte deseja

para si que deve prevalecer, uma vez que a avaliação realizada pode servir tanto para submeter

a parte contrária, como também, ao arbítrio desta, submeter o ofertante a aceitar a sua própria

oferta.

Num cenário econômico ideal e altamente eficiente, em que não houvesse escassez de

recursos, seja da poupança dos próprios sócios, seja através de fontes de financiamento

abundantes e competitivas, não restam dúvidas de que as cláusulas Shotgun representam

modalidades altamente eficazes de solução de impasses societários. Entretanto, no mundo real,

em especial no ambiente econômico nacional, os recursos são escassos e existem hipóteses em

que a solução de controvérsias societárias (deadlocks) pela aplicação das cláusulas Shotgun são

inexequíveis pela absoluta falta de funding dos respectivos sócios.

Neste contexto, a alternativa mais eficiente pode ser a divisão dos ativos e passivos da

companhia entre os sócios. Há, no entanto, um problema óbvio embutido nesta solução. Num

contexto em que os sócios não se entendem quanto aos objetivos da sociedade, seria

improvável que passassem a concordar quanto à divisão dos ativos da sociedade.

Invariavelmente a solução desaguaria no Poder Judiciário através da propositura de uma ação

de dissolução da sociedade.

Como alternativa eficaz, entendo que seria possível estipular, no contrato social ou num

acordo de sócios, uma regra contratual que previsse que numa situação de impasse, um dos

sócios seria eleito para fazer a divisão dos ativos e passivos da sociedade, enquanto ao outro

caberia a prerrogativa de escolher entre uma das partes. De forma mais direta, um divide e o

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outro escolhe. O sócio incumbido de fazer a divisão dos ativos seria instado a executar a divisão

de forma racional, imbuído do sentimento de justiça e equilíbrio, porque ele não saberia qual

das partes o outro sócio poderia escolher. Sua inclinação natural seria no sentido de dividir a

companhia em partes iguais, deixando de privilegiar qualquer uma delas, pois o resultado da

escolha da outra parte poderia lhe atribuir a titularidade de uma ou outra indistintamente.

Logicamente, assim como as demais disposições contratuais, este mecanismo enfrenta

problemas de execução que serão igualmente examinados no curso deste trabalho.

3. Análise crítica de adequação das cláusulas de solução de controvérsias

A partir do exame dos impasses mais frequentes e das cláusulas de solução de

controvérsias apontadas, pretendemos fazer uma análise crítica de riscos, vantagens e

desvantagens quanto à aplicação de cada cláusula em relação a cada uma das hipóteses de

controvérsia arroladas. Assim, será possível traçar uma relação de adequação entre o

mecanismo contratual idealizado e a situação em que ele pode ser útil para solucionar

problemas concretos.

4. Conclusão e recomendações práticas

Na conclusão do trabalho, serão endereçadas as recomendações práticas para orientar

os operadores quanto à utilidade concreta dos mecanismos de solução contratual de

controvérsia abordados ao longo do trabalho.

Também pretendemos elaborar um anexo contendo exemplos de cláusulas contratuais

que sirvam de inspiração para que os profissionais da área empresarial elaborem atos

societários contendo estas disposições, contribuindo assim, com a facilitação da disseminação

do que acreditamos ser uma boa prática jurídica no âmbito societário.

10. Cronograma com estimativa de horas

2017 2018 2019

Atividade 10 11 12 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 H

[Leitura da bibliografia]

[90]

[Leitura de julgados]

[30]

Leitura dos acordos de acionistas encontrados em pesquisa

[30]

[Redação do capítulo 1]

[20]

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[Redação do capítulo 2]

[20]

[Redação do capítulo 3]

[20]

[Conclusão da redação]

[20]

[Revisão] [20]

[Depósito] [–]