material de direitos humanos

Upload: cristina-bentes

Post on 10-Feb-2018

212 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    1/230

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    2/230

    DIREITOS H UM AN O S ELIBERDADES PBLICAS5 a e d i o r e v i s a d a e a m p l i a d a

    Jean MorangeP ro f e sso r d a U n i ve rs i t P a n t h o n - ssa s (P a r i s I

    M a n o l e

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    3/230

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    4/230

    C A p T U O

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS

    13 O significado poltico d os direitos humano s no sculo XVIII.A f i losof ia dos di re i tos humanos t r iunfa no f ina l do sculo

    XVIII na Europa oc identa l e na Amr ica do Nor te . Seu sucesso se deveao fa to de es ta r em acordo com o "esp r i to da poca" e por aqui lo queh o j e s e c h a m a r i a d e c u l t u r a d o m i n a n t e . T a m b m Se jus t i f ica po r se rvi ra inte resses pol t icos bem concre tos . Arm a de guer ra ideolgica a servi-o de uma c lasse soc ia l 1 e do impe r i a l i smo d a " G r a nde N a o", 2 os di-r e it o s h u m a n o s f o r a m a p r e s e n t a d o s c o m o u m c o n j u n t o p e r f e i ta m e n t ec oe r e n t e , r e su l t a ndo d e um a e vo lu o i ne lu t ve l e pur a me nte r a c iona l .L igados c ivi l izao oc identa l , e les no a resumem. Expressam a lgunsc ompone n te s de l a c u j a s n t e se pe r ma ne c e se mpr e superficial. Essa am-

    1 Este ponto de vista foi especialmente defend ido pelos marxistas (cf. infra), m asno som ente por eles . Assim e m Le droit et ks droits de 1'homme (Paris, 1983), M. VLLLEYestima que os direitos humanos definidos por L O C K E "so arranjados para o proveitode uma classe social, ao lado da qual eles esto engajados", p. 151. Notar-se-, no entan-to, que a estratificao era particularmente complexa nos sculos XVII e XVJII.

    2 Ttulo da obra de J. G O D E C H O T , La Grande Nation, Aubier-Montaigne, 1983.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    5/230

    4 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    b ig id a de da f i losofi a dos d i r e i tos hum a n os , i gn or a da na poc a , a pa r e -c e p r ogr e s s iva me nte c om sua c on t e s t a o . Cr i t i c a dos e d e n e g r i d o s p o rr a z e s opos t a s , os d i r e i t os huma nos pode r i a m t e r de sa pa r e c ido no s -c u l o XX. V r ios pe nsa dor e s p r e d i s se r a m, n o se m a r gume ntos , sua de -c a d nc i a , ou me smo se u a ba ndono . E , no e n t a n to , pa r a doxa lme nte , osd i r e i t os huma nos v o mui to be m. Se us suc e ssos po l t i c os n o de ve mcontudo mascarar o dec l nio rea l da f i losof ia do sculo X V T I I . Os di re i -t o s h u m a n o s q u e n o s s o s c o n t e m p o r n e o s i n v o c a m n o s o i d n t i c o s que l e s que se us a nc e s t r a i s p r e c on iz a r a m ou c omba te r a m.

    Seo I0 triunfo da fi losofia dos direitos humanos

    A expresso pr ivilegiada da f i losof ia d os di re i tos hu m an o s se s i tuano f inal do sculo X V I I I nas dec la raes de di re i tos . Inte ressa ntes de u mpo nt o de v is t a f o r ma l , el as o s o i gua lme n te po r s e u c on t e d o e pe losd i r e i t os p r oc l a ma dos .

    1 A S D E C L A R A E S D E D I R E I T O S

    " Cons ide r e mos um ins t a n t e os p r e t e nsos d i r e i t os huma nos , e i s sosob sua f o r ma a u t n t i c a , sob a f o r ma que e l es possue m p a r a a que l e s q ueos desc obr i ra m, os no r te - am er ic an os e os f ranceses."3 Pode - se no t a r aho m e na ge m pr e s t a da a e sse s do i s povos po r M a r x , que r e d ige , po r o u-t ro lado, uma c r t ica sobre a qua l se r prec iso re tornar . Efe t ivamente , en u n c a s e r s u f i c i e n t e m e n t e e n f a t i z a d o , o s d i r e i t o s h u m a n o s s o b s u af o r ma mode r na su r ge m e m uma poc a p r e c i sa e num c on te x to po l t i c oe ge ogr f i c o be m de t e r mina do .

    3 K . M A R X , La question jue.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    6/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 5

    14 Os direitos hum anos na Inglaterra. T o p a r a d o x a l q u a n t opossa parecer , n o na Ingla te r ra , no en tanto , co nsi der ada

    ento, e espec ia lmente pe los f ranceses , como a te r ra da l iberdade , quese e nc o n t r a m qua i squ e r de c l ar a e s so le ne s. O r e c on he c im e nto da s l i-be r da de s e r a l, e l pe r m a ne c e , mui to e s t r e i t a me nte v inc u l a do h i s t -r i a do povo ing l s e a s e u e mpi r i smo . El as f o r a m a r r a nc a da s do po de rr e al , qu a n do a s c i r c uns t nc i a s o pe r m i t i a m, e s e e n c o n t r a m e n u n c i a d a se m u m c e r to n m e r o de t e x tos f a mosos : a M a gna Ca r t a de 1215 , a Pe -t io de Direitos de 1627, o Bil l of Rights (ato de direi tos) de 1688 e oAto de Sucesso de 1701.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    7/230

    6 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    do te r reno re l igioso para o te r reno pol t ico, te r - se - a encarar o Estadod a m e s m a m a n e i r a q u e a Igreja, o u seja, c o m o p r o c e d e n d o d e u m c o n -t r a to c onc lu do e m v i r t ude de um d i r e i t o na tu r a l do home m. O s pur i -t a n o s e r a m e s p e c i a l m e n t e p e r s u a d i d o s d e q u e c e r t o s d i r e i t o s d ac o n sc i n ci a h u m a n a s e i m p u n h a m a o E s t ad o .

    A con jun o desses dois e lemen tos dever ia levar convico de qu eos d i r e i t os huma nos r e pr e se n t a m va lo r e s t r a nsc e nde n ta i s a n t e r io r e s esuper iores ao Estado. Sob es te aspec to, a Dec la rao de Independnc iade 4 de julho de 1776 a pr imeira grande manifes tao pol t ica des tesp r inc p ios :

    Ns cons ideramos ser corre to que [ . . . ] quando no decurso dosa co n t e c i m e n t o s h u m a n o s t o rn a -s e n e ce ss r i o p a ra u m p o vo d i sso l -ver os v ncu los po l t i cos que os l igaram a um out ro e tomar, ent re aspotnc ias da terra , o lugar reservado e igua l quele que as le is danatureza e do Deus da natureza lhe do d i re i to , o respei to dev ido o p i n i o d a h u m a n i d a d e o o b r i g a a d e c l a ra r a s ca u sa s q u e o co n d u -ze m o ro m p i m e n t o .

    Temos por ev identes, por s i p rpr ias as seguin tes verdades: to-dos os homens so cr iados igua is ; so dotado s p e lo Cr iador de cer tosd i re i tos ina l ienveis ; ent re estes d i re i tos se encont ram o da v ida, dal iberdade e da busc a pe la fe l ic idade. Os governos esto const i tu dospelos homens para garant i r esses d i re i tos , e seu jus to poder emanado consen t imento d os governados. Todas as vezes que uma forma degoverno se cont rap e a este ob je t ivo , o povo tem o d i re i to de mu d- lae de abol i - la e de estabelecer um novo governo, fundando-o sobreesses pr inc p ios e organ izand o-o da forma q ue lhe parecer mais ade-quad a para dar- lh e segurana e fe l ic idade. A prud nc ia ens ina ver-dade que os governos estabelec idos h mui to tempo no devem sert rocados por mot ivos lev ianos e passagei ros, e a exper inc ia de todosos tempos most rou, de fa to , que os homens esto mais d ispostos ato lerar males suportve is que a fazerem just ia e les mesmos abol in-do as formas s quais esto acostumados. Mas, quando uma longa

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    8/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUM ANO S 8

    seqncia de abu sos e de u surpaes, tend o invariavelmente o mes-mo fim, assinala o propsito de subm et-los ao despotismo absoluto, seu direito, seu dever rejeitar tal governo e providenciar, por novassalvaguardas, sua segurana futura.Co nta d o , e s te t e x to c ons ti t u i a pe na s um a p r oc l a ma o e um a jus -

    t i ficao, despro vidas d e va lor em d i re i to posi t ivo. A pr ime ira m anifes-tao jur dica d a f i losof ia do s di re itos hum an os se encon t ra no c lebreBil l of Rights (a to de di re i tos) que precede o texto da C onst i tu io daVirgnia (1776) . Se is out ros E stados amer icano s fa ro preceder sua con s- .t i tu io de uma ta l dec la rao antes de 1789. 4 Trata-se de textos desti-n a d o s a t r a d u z i r p c a r t e r t r a n s c e n d e n t e d o s d i r e i t o s h u m a n o s n ahie ra rquia das norma s. Em com pensao, a Con st i tuio Federa l de 1787no preced ida de ne nh um a dec la rao. Os di re i tos e as l iberdades so,a pe nas , me n c iona d os na s dez p r ime i r a s e me nd a s p r opos t a s a o Congr e s -so em 21 de se temb ro de 1789 e ra t i f icadas em 15 de de z e mb r o de 1791 .Elas se ro seguidas po r vr ias out ras . Mas sua insp i rao mui to di fe -rente daque la das dec la raes . E las no pre tendem proc lamar di re i tos ,pois , seg un do o Federa l is ta , i sso te r ia s ido ad m it i r qu e o Estado t inh a opoder de neg- los . E las tm um car te r processua l e v i sa m, sobr e tudo ,de f in i r s e u a l c a nc e na s r e l a e s e n t r e E s t a do f e de r a l e os E s t a dosfederados . Ap ena s as dec la raes rea l izadas por es tes l t im os po de mento se r consideradas como precedentes di re tos da Dec la rao Fran-cesa de 1789.

    16 A originalidade da Declarao de 1789. Esta possvel filiaoesteve na or igem de um a cont ro vrs ia qu e teve a sua ho ra deglr ia no inc io do sculo, opondo dois jur i s tas reputados , o a lemo

    Jellinek e o f ranc s Bo utm y. Segund o Je l l inek, a Dec la rao de 1789 se -

    4 Pensilvania, Maryland e Carolina do Norte (1776); Vermont (1777); Massa-chuset ts (1780); New Ham pshire ( 1783) .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    9/230

    8 DIREITOS HU MA NOS E LIBERDADES PBLICAS

    r ia de or ige m essen c ia lmente ge rm nica . Apenas esta c ivil izao hav iac onse r va do a i d ia de l i be r da de i nd iv idua l , r e toma d a pos t e r io r m e ntepe la Reforma. Transposta para o out ro lado do At lnt ico com o Protes-tant i smo, e la se t r aduz iu no di re i to pbl ico amer icano. A Decla raoFrancesa apenas u m a cpia des tes precedentes , sem or igina l idade n emn o fu nd o, nem na form aJSo lado opo sto, a lguns autor .es .f r anceses, de n-t re os qua is Boutmy, quise ram most ra r que os pr inc pios de 1789 es ta -vam na or igem de um mundo novo. Sua gnese te r ia se rea l izado nose io de um povo predest inado pe la his tr ia . Uma e out ra des tas teses ,c u j a f on t e se e nc on t r a no a n t a gon i smo po l t i c o e dou t r i n r io f r a nc o-a lemo, parecem hoje excess ivas .

    A Decla rao de 1789 teve incon tes tave lm ente um a lcance unive r -sa l que n o ha viam t ido as dec la raes am er icanas . Isso se expl ica po rcon sidera es p ol t icas. A Frana era, n o f inal do sculo X V I I I , a p r i m e i r a

    . po t nc i a po l t i c a " oc ide n t a l " por r a z e s de mogr f i c a s , e c onmic a s ecul tura is . Qualquer revoluo na Frana no podia de ixar de te r r eper -cusses no co nju nt o da Europ a . A lngua f rance sa e ra l ida e c o m p r e e n -d ida e m to dos os me ios c u l t os . O s c ons t i t u in t es franceses t i nha m a ss imni t i da me nte o se n t ime n to de a g i r e m nome de t odos os home ns . E s t et i po de a t i t ude n o mu i to f r e qe n te por pa r t e da na o que , s e n t i n -do- se c u l t u r a lme nte domina n te , pe nsa t e r uma voc a o a t r a duz i r a sa sp i r a e s huma na s e m t e r mos un ive r sa i s?

    N o enta nto , a Dec la ra o de 1789 n o teve ta l r epercusso un ica-m e n te po r s er fr a nc e sa . A qua l id a de f o r m a l de sua re da o m ui toim po r tan te . Ta lvez po rq ue e la foi ob ra de jur i s tas plenos de cul t ura l i -te r r ia . Nada impede que es ta obra cole t iva surpreenda pe la conc isodo es t i le e a fora da repercusso de cer tas frmulas . Tanto mais sur -p r e e nde n te que os nume r osos p r o j e tos de de c l a r a e s , que a i nsp i r a -ram, so em gera l mui to mais suaves .

    Quanto ao contedo das dec la raes f rancesa e amer icana , e le amplamente comparve l , seno idnt ico. I s to se deve provave lmente aofa to de os f ranceses te rem, e fe t ivamente , sof r ido a inf lunc ia amer ica-na . E les no se esconderam disso de forma a lguma e as discusses na

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    10/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 9

    Assembl ia Const i tuinte o a tes tam. Os amer icanos , por sua vez , se ins-pi ra ram nas concepes inglesas que mui tos dent re e les re ivindicavam,m as igua lme nte nas id ias f rancesas ve iculadas na Euro pa e na A m r ic ado N or te . De fa to , tan to es tas com o as ou t ras so, in ic ia lm ente , f i lha sdo esp r i to do sculo XVIII e de seu individua l i smo.

    2 O S D I R E I T O S P R O C L A M A D O S

    17 O contedo da Declarao de 1789. A D e c la r a o de 1789contm uma f i losofia da "associao pol t ica" . Toda a socie-

    d a d e f un da d a sobr e uma c ons t i t u i o , o que supe que a ga r a n t i a do sdireito s seja assegurada e a separao dos poderes de te rminada (a r t . 16) .A garant ia de di re i tos necess i ta da manuteno de uma fora pbl ica(a r t . 13) para as despesas da qua l todos os c idados devem cont r ibui rem razo d e suas faculdades . Esta regra va le, a lm disso, para o c on ju n-to das despesas pbl icas . Destac am -se c la ramen te des tes a lguns pr in c -pios de que "o obje t ivo de toda assoc iao pol t ica a con serva o do sdi re i tos na tu ra is e ina l ienve is do h om em " (a r t . 2 o ) . Qua is so esses di -reitos? "... a l iberdade , a propr ied ade , a segurana , e a r es is tnc ia o pres-so" , ac rescenta o mesmo ar t . 2 o . D e f a to , o l t imo n o c or r e spondeve r da de i r a m e nte a um d i r ei t o . Q u a n to a o p r inc p io de i gua lda de , s e mconst i tui r verdade i ramente um dos di re i tos , e le inseparve l de les . Def a to , " os hom e ns na sc e m e pe r ma n e c e m l iv r es e iguais em direitos" , estescr i to desde o a r t . I o . Disso decor rem conseqnc ias jur dicas obje t i -vas . Os di re i tos proc lamados so v l idos para todos os c idados quepodem concor re r formao da le i ( a r t . 6 o ) e s o " igua lme nte a dm is -sveis a todas dignidades , lugares e e mpr e gos pb l i c os se gundo sua c a -pac idade e sem out ra dis t ino a no se r a decor rente de suas vi r tudese de seus talentos" (ar t . 6 o ) . E les so igua lmente submet idos "em razode suas faculdades" ao imposto ao qua l devem consent i r .

    Tod os os cidados so ento igu almen te l ivres. A liberda de de f in i -da pe lo ar t . 4 o . Ela "consis te em po der fazer tud o aq ui lo que n o p re ju di -

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    11/230

    10 DIREITOS HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    ca a ou tre m : assim o exerccio dos direi tos natur ais e de cada h o m em temapenas os limi tes qu e asseguram aos out ro s m em bro s da soc iedade o gozodestes mesmos direi tos" . Certas aplicaes do pr incpio de l iberdade es-to me ncion adas expl ic itamente : assim, a liberdade de opin io, de cons-cincia, de rel igio no ar t . 10 e a l ivre comunicao dos pensamentos edas opinies , inc luindo a l iberdade de imprensa , no a r t . 11.

    Nenhuma l iberdade i l imi tada . Para evi ta r os abusos , prec isode te rmi nar l imi tes . E les se ro f ixados pe la le i igua l para tod os e na for -mao da qua l todos os c idados tm o di re i to de concor re r pessoa l -m ent e ou p or seus representantes , "a le i a expresso da vo ntad e gera l"(ar t . 6 o ) . "Nada que no proibido pe la le i pode se r impedido, e nin-gu m po de se r obr iga do a fazer o que e la n o ord ena " (a r t. 5 o ) . Todavia,a prpria lei sem limites; ela "s tem o direi to de defender as aespre judic ia is soc iedade" (a r t . 5 o ) .

    Garan t ia da l iberdade do c idado, a le i o igua lme nte de sua segu-rana . Algumas frmulas , pe lo menos to c lebres quanto as preceden-t es , d e t e r m i n a m o s p r i n c p i o s f u n d a m e n t a i s : " n e n h u m h o m e m p o d eser acusado , preso ou de t ido a no se r nos casos de te rm ina do s pe la le i esegu ndo as forma s que e la prescreveu" (a r t . 7 o ) . T odo ho m e m " c ons i -de r a d o inoc e n t e a t que t e nha s ido de c l a r a do c u lpa do " ( a r t . 8 o ) . A leideve un icam ent e es tabe lecer pen as es t r i ta e evid entem ente necessr ias,e "a lgum s po de se r pu nid o e m vi r tu de d e u m a lei es tabe lec ida e pro-mulgada ante r iormente ao de l i to , e lega lmente apl icada" (a r t . 8 o ) .

    Enf im, o a r t . 17 consagra a propr iedade pr ivada : "a propr iedade ,sen do u m di re i to inviolve l e sagrado, n o po de se r pr ivad a a nin gu m ,a no se r quan do a necess idade pbl ica , lega lm ente con sta tada , o exigeevidentem ente , e sob a cond io de um a jus ta e prvia indenizao". Estea r t igo , o l t imo da D e c l a ra o , s e r pos t e r io r m e nte u m dos ma i s c on-tes tados . Dec or re , por tanto , ass im com o os out ro s , do esp r i to do scu-l o XVIII.

    18 As caractersticas da Declarao de 1789. As caracter st icasdes te texto pode m ser agrup adas em tor no de qua t ro id ias :

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    12/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HU MAN OS 11

    A transcendncia: e la a pa r e c e pa r t i c u l a r m e nte n o P r e m bulo . AA sse mbl i a N a c iona l n o t e m a i n t e n o de f a z e r obr a c r i a dor a .E la " reconhece e dec la ra , em presena e sob os auspc ios do SerSupremo, os di re i tos . . . do homem e do c idado" . E la expe em"uma dec la rao solene , os di re i tos na tura is , ina l ienve is e sa -g r a dos do home m " . I m po r t a que e s ta dec l a ra o " c ons t a n t e me n -t e a p r e se n t a da a t odos os m e m br o s do c or p o soci a l, l e mbr a - lhe ssem cessar seus direi tos e seus deveres" . Tais direi tos so neces-sa r i a me nte un ive r sa i s .

    O universalismo: os d i r e it os p r oc l a ma d os s o a que l e s do H om e me do C ida d o e n o a pe na s os dos c ida d os f r a nc e se s de 1789?E le s va l e m pa r a t odo se r huma no .

    O individualismo: apenas o indivduo t i tu la r de di re i tos . Ne-nhum gr upo me nc iona do na de c l a r a o , c om e xc e o da N a - o de t e n to r a da sobe r a n i a . Comuna s ou pa r qu ia s , r e g ie s oupr ov nc i a s , c o r por a e s ou o r ga n i smos p r o f i s s iona i s n o s ome nc io na d os . N o fe i t a ne nh um a a luso fa m l i a , e os d i r e i -t os de r e un i o ou de a s soc i a o n o s o r e c onhe c idos . E s t a somisse s s o vo lun t r i a s . T e me - se que os g r upos su f oque m oind iv duo e , s e gu indo o r a c ioc n io de Rousse a u , p r e jud ique m af o r m a o da von ta de ge r a l. O ind iv duo , s er ge n r i c o e n o " s i-tuado" , v- se confer i r d i re i tos abs t ra tos .

    A abstrao: a Assembl ia Nac iona l expe os pr inc pios de l iber -da de , de i gua lda de , de se gur a n a e do d i r e i t o de p r opr i e da de .E s t e s n o s o subme t idos a ne nhuma f i na l i da de . Ca da um usasua l i be r da de e sua p r op r i e da d e c o m o be m e n t e nd e . U m n ic ol imi te ; no pre judicar o di re i to igua l de out rem. Alm disso, soos p r inc p ios q ue s o r e c onhe c id os e n o os me ios ou p r oc e d i -me ntos que pe r m i t i r i a m c o loc - los e m obr a . I s t o pe r m i t i u opo ro e sp r i t o a bs t r a to do f r a nc s a o e sp r i t o c onc r e to do s a n g lo -saxes . Ta lvez no se ja prec iso genera l iza r , mas o mbi to dosdi re i tos hu m an os se r ia ce r tam ente u m a boa i lus t rao disso. Estea r g um e nt o se a c r e sc e n t a p r ova v e lme n te que le s que f o r a m p r e -

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    13/230

    1 2 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    c e de n te m e nte me nc ion a dos pa r a e xp l ic a r o suce sso da D e c l a r a - o de 1789 . O s i ng l e se s n o ha v i a m nunc a sonha do e xpor t a rsua concepo dos di re i tos hu m ano s. Os amer icano s , m ui to ma isisolados no contexto do sculo XVIII, qua se n o o pod ia m. Of e de r a l i smo a do ta do pe los E s t a dos U nidos c onf e ri a um m n im oalcance s dec la raes , necessar iamente diversas dos Estadospar t icula res , e um car te r mais "processua l" s emendas .

    19 As outras declaraes revolucionrias. O s ou t r os t e x tos f r a n -ceses de 1793/dec la raes gi rondina e montanhesa) e de 1795

    ( a n o III) n o a dqu i r i r a m gr a nde no to r i e da de , t a lve z por que a Re vo lu - o m e r gu lha va e m c on t r a d i e s i n t e r na s e e m gue r r a s e x t e rna s . C on -s ide r a n do a i n t e r p r e t a o que e la susc it ou a de c l a ra o mon ta nh e sa de1793 a n i c a que me r e c e ma i s c u ida do . E l a a p r e se n t a da c om o a n un -ciando as ideologias socialistas. De fato, a f i losof ia que a inspi ra m u i t opr xim a f ilosofia dos const i tuintes de 1789. suposto qu e o pov o f ra n-cs a li "exp onh a" em um a "dec la rao solene" os di re i tos "na tura is" , " sa -g r a do s e i na l ie n ve i s" do hom e m " e m pr e se n a do Ser Supre mo" . C omcer teza , a igua ld ade pro c lam ada a ntes da liberdade , da segurana e d apr opr i e da de ( a r t . 2 o ) . M a s e ssa l t im a p r oc l a m a da e m t e r m os m ui topr x im os da que l e s u t i l iz a dos e m 1789 : " O d i r e it o de p r o pr i e da de aque le que per tence a tod o c idado, que goza e dispe , segu ndo su a v on -t a de , de se us be ns , de se us r e nd im e ntos , do f r u to de seu t r a ba lh o e desua indst r ia" (a r t . 17) . "Ni ngu m p od e se r pr ivad o em nad a de sua pro -p r i e da de se m se u c onse n t ime n to , a n o se r qua ndo a ne c e ss ida de p-bl ica lega lmente consta tada o exige , e sob a condio de uma jus ta eprvia inde niza o" (a r t . 18). Pode-se tam b m fazer va le r que "a le i nor e c o n h e c e n e n h u m a d o m e s t i c i d a d e " (a r t . 1 8 ). D a m e s m a f o r m a , " o ssocor ros pbl icos so uma dvida sagrada . A soc iedade deve a subsis-tnc ia aos c idados infe l izes , se ja encont rando- lhes t r aba lho, se ja asse-gurando os meios de exis t i r para aque les que es to sem condies det rab a lh ar" (a r t . 21) ou o "a ins t ru o a necess idade de todo s . A soc ie -da de de ve f avor e c e r c om tod o se u pod e r os p r ogr e s sos da r a z o p b l i -

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    14/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 1 3

    ca , e colocar a ins t ruo ao a lcance de todos c idados" (a r t . 22) . Noentanto, es tes poucos a r t igos , dos qua is a lguns j es tavam em substn-c ia na Con st i tui o de 1791, cor re spo nd em ma is a um a viso socia l qu esoc ia li s ta , no sen t ido q ue se dar post e r io rm ente a es ta pa lavra . Sua ins-pi rao pode fac i lmente se r r eve lada na mora l c r i s t ou na filosofia d os c u lo xv i l l da s qua i s c onse r va m nume r osa s se me lha n a s . E nf im, aDecla rao de 1793 es t mui to prxima de 1789 mesmo se o tom m e no s c on tund e n te . T alve z a de c l ar a o j a c ob ina se j a um po uc o m e -nos i nd iv idua l i s t a e a bs t r a t a , ma s e l a i gua lme nte t r a nsc e nde n te euniversa l i s ta .

    As dec la raes o f inal do sculo x v m parecem levar a um a f ilo-so f i a c om um . E s ta impr e ss o pa r c i a lme n te e xa ta . E l a pod e r i a a pe na sdiss imular que a f i losof ia dos di re i tos humanos, e laborada nes ta poca , p r o f u n d a m e n t e a m b g u a .

    -J-. -

    Seo IIA ambigidade da fi losofia dos direitos humanos20 A elaborao das declaraes. C o m o s e s u r p r e e n d e r c o m a

    a mbig ida de da f i l osof i a dos d i r e i t os huma nos qua ndo ser e m e m or a e m que c on t e x to e la fo i f o r mu la da ? O s g r a nde s p r inc p ios ,aque les a pa r t ir d os quais ela se desenvolver ou ser julga da, fo ram ob rade assemb l ias pol t icas . Este foi o caso dos Estad os Un idos da Am r i -ca. Foi igua lme nte o caso da Frana . A Assembl ia Nac iona l Con st i tuinteadotou a r t igo por a r t igo a Dec la rao dos Dire i tos Humanos e do Ci-dado, depois de te r admit ido o seu pr inc pio. Traba lhos das comissese com its , d iscusses em sesses plenr ias e votos , esca lonaram-se de 9de jul ho a 26 de agosto de 1789, em u m c l im a pol t ico que i n t i l l e m-brar a que ponto e ra " revoluc ionr io" e mui tas vezes fe rvoroso. I s to ,sem dvida prpr io para ga lvanizar as energias e para favorecer a ado- o de f r m ula s c on tunde n te s susc i t a ndo o e n tus i a smo : a D e c l a r a o

    . u m a i lus t rao notve l disso.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    15/230

    1 4 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    A pe na s o r a dor e s e xc e pc iona i s t i nha m a priori o p o r t u n i d a d e s d echamar a a teno de uma assembl ia de mais de 1 .000 membros , aosqua is se junta va um a ass is tnc ia num ero sa e muitas vezes barulhenta ,a inda mais que a sa la no e ra adaptada aos t r aba lhos par lamentares eque os me ios t c n i c os mode r nos e r a m, claro, inexistentes. . .

    Todavia ta l t r aba lho cole t ivo no apresenta r , por definio, n e ma un ida de , ne m a c oe r nc i a da que l e e l a bor a do por um n ic o ho m e mou por um p e qu e no g r up o c om pa r t i l ha nd o a m e sm a f il osof ia ou a sme sm a s c r e na s . Ca da de p u ta do t i n ha p r ova ve lme nte sua s mot iva e spr of unda s no mome nto do vo to de c a da a r t i go . N a da i nd i c a que a sma ior i a s n o c or r e spond ia m a c onve r g nc i a s f o r tu i t a s . Ra c iona lme n-te , ta l obra cole t iva plura l i s ta no somente em sua inspi rao, mast a m b m e m s e u s c o m p o n e n t e s .

    1 A D I V E R S I D A D E D A S O R I G E N S

    21 Os autores da declarao. A d ive r s ida de de i nsp i r a o quema r c a a D e c la r a o pode r i a a priori parecer como a resul tan-

    te na tura l da divers idade soc ia l da Assembl ia ; no contava es ta comm e m b r o s p e rt e n c e n t es s t rs orde ns: clero (al to e baix o) , nob reza (al tae ba ixa igua lmente) e te rce i ro es tado? Os membros do te rce i ro es tadoso e les mesmos bas tante di fe rentes : in ic ia lmente por sua idade , poise le s s e d iv ide m e m do i s g r upo s num e r i c a m ne te p r x im os e n t r e os quet inh a m ma i s e os que t i nha m m e no s de 40 a nos ; por sua f o r tun a e suasconvices bas tante difceis de con hece r ; po r seu domic l io , me sm o qu ea s c ida de s e s t e j a m um pouc o ma i s be m r e pr e se n t a da s ; e m c omp e nsa -o, ma is de dois te ros de les so h om en s de le i ou de tento res de cargosa dmin i s t r a t i vos . 5 Esta for te pres ena dos jur i s tas no d e ixou de te r in-

    5 E. H. LEMAY, La composition de 1'Assemble constituante: les hommes de lacontinuit?, Revue d'Histoire moderne et contemporaine, t. XXIV, 1977, p. 363.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    16/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 1 5

    f lunc ia sobre o contedo dos deba tes , a comear por aque les que sere fe r i ram so bre a pr pr i a ut i l idade de um a dec la rao do s di re itos . Seusde f e nsor e s a a p r e se n t a va m c omo um Cdigo de sa be dor i a e de r a z o ,o u e m o u t r o s te r m o s , c o m o a c o loc a o e m f o r m a ju r d i c a de p r inc p i -os universa is . E la e ra des t inad a edi f icao dos povos e a se rvi r de fu n-d a m e n t o c o n s t r u o d o e d i f ci o c o n s t i t u c i o n a l . O s o p o n e n t e sdenunciavam o seu car te r metaf s ico e abs t ra to . No exis tem di re i tosna na tu r e z a e me nos a inda d i r e i t os i l imi t a dos . E l e s de se j a va m pe lome nos ve r es t a de c l a r a o a c om pa n ha d a da que l a sobr e os de ve re s .

    22 O esprito do sculo XVIII. Q u a i s q u e r q u e f o s s c T o seus obje -t ivos , a maior par te dos qi je inte rvie ram, e espec ia lmente os

    pa r t i d r ios de um a de c l a r a o e os re da to r e s de p r o j e tos , e st a va m im-pr e gn a dos da s me sm a s i d ia s , m e sm o qu e e le s a s i n t e r p r e t a s se m d i f e -r e n t e m e n t e . U s a v a m o m e s m o v o c a b u l r io . O u v i u - s e c o n s t a n t e m e n t ere tornarem s pa lavras l iberdade , na tureza , cont ra to soc ia l , r azo, f e l i -c ida de , p r ospe r ida de , i gua lda de , von t a de . 6 As pa lavras so reve ladorasde um a c e r t a me n ta l i da d e , da qu i lo que f o i c ha ma do e m se gu ida " o e s-p r i to do sculo XVIIl" .

    prec iso, a lm disso, se r bas tante prudente quando se evoca es tanoo . Os " f i lsofos" so mui to d i fe rentes uns d os out ros : c r i s tos , ma te -r ia l i s tas ou de s tas , par t idr ios de uma mudana radica l ou apenas dere formas no mbi to pol t ico, preocupados em a l ivia r as misr ias ou emma nte r a h i e r a r qu i a soc ia l. N o su r ge ne nh um a b ipo l a r iz a o do pe nsa -me nto f r a nc s , pa r a r a c ioc ina r e m t e r mos c on t e m por ne o s . A lguns a t eus( D ide r o t e sobr e tud o H olba c h) s o mui to c onse r va dor e s no mbi to so -c ial . Vol ta ire par t i dr io de re form as hu m ani t r ias e rac iona is no mbi-to judici r io , ma s seu desp ot i smo esc la rec ido supe q ue o povo no o se ja .

    6 P. DELVAUX, La controversades droi ts de 1'homme de 1789, Tese, Paris II, mimeo,2 vol . ; Anlise lexical dos debates da Constituinte sobre a Declarao dos DireitosHumanos , in Droits, 1985 , n 2 2, p . 23-33 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    17/230

    1 6 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    A sensibi lidade popu lar e re ligiosa de Rousseau n o o torn a , no entan to,um l ibera l. Me smo qu and o se t r a ta de evocar hipteses his tr icas , as con-t radies se evidenc iam. O que h de com um ent re as teor ias do con t ra tosocial de Hobbes, Locke, Rousseau e de vr ios ou t r os? D a m e sm a f o r m aquando se t r a ta de propor remdios em matr ia de organizao pol t ica ,a teor ia da vontad e geral de Rousseau radica lm ente incom pat ve l co m ase pa r a o dos pode r e s de M onte squ i e u .

    N a d a d i ss o i m p e d e a f o r m a o d e u m a o p i n i o m d i a , apriori fa -vorve l a um a re f lexo pol t ica fun da da na razo, e vo l tan do a se a lia r aum a x r e n a va ga na pe r f e c t i b i l i da de da s i ns t it u i e s . A s l t im a s r e f o r -m as de Lus XVI n o i a m no m e sm o se n t ido? 7 A s s im , i n d e p e n d e n t e m e n t ede sua s c onv ic e s p r o f und a s , um a g r a n de pa r t e dos f r a nc e se s que ha -v i a m s e b e n e f i c i a d o d e u m a f o r m a o i n t e l ec t u a l e d i s p u n h a m d o slazeres necessr ios havia se acostumado a re f le t i r sobre es tas questes .U m a d i f us o su f i c i e n t e me nte a mpla da i ns t r u o na s pe q ue n a s e sc o l a se nos colgios e da informao por meio de obras impressas , as gaze tase jorna is , as academ ias de prov nc ia , a t as lojas ma n icas e os sa lespa r i s i e nse s , ha v i a - lhe s p r opor c iona do os me ios . 8

    A par t i r de 1760, e ta lvez m ais a ind a depois de 1780, u m a m ino r iacom cer teza , embora no negl igenc ive l , dos f ranceses admite um cer -t o n m e r o de i di a s a mb gua s . A soc i e da de r e pousa sob r e um c on t r a topa ssa do e n t r e os i nd iv duos . E sse s s o ti t u l a r e s de um c e r to n m e r o dedi re i tos subje t ivos: di re i to l iberdade individua l , podendo se es tender l iberdade econmica (cor rente dos f i s iocra tas) , e l iberdade pol t ica ;d i r e i t o s e gur a n a , supondo um pr oc e d ime nto j ud i c i r i o r a c iona l ee q i t a t i vo ; d i r e i t o de p r opr i e da de c ons i s t i ndo e m d i spor de se us be ns

    7 Turgot, onomiste et administrateur ( s o b a d i r e o d e C . B O R DE S e J. M O R A N G E ) ,P U F , 1 9 8 2 .

    8 D. M O R N E T , Les origines inte lectueles de aRolution franise, Paris, 1933.Sobre o ensino: J. M O R A N G E , La rorme de 1'ensegnement fin de 1'Ancien Rime,P U F , 1 9 7 4 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    18/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 1 7

    sob a proteo de qua lquer inte rveno exte rna . Esses di re i tos so osme sm os pa r a t odos , ma s a i gualda de de f a to r e iv ind i c a da a pe na s po ra lguns pensadores ext remis tas . E les so tanto mais absolutos que se in-se rem no mbi to de uma f i losof ia de progresso e so concebidos porhom e ns , n o t e ndo ne nh um a e xper i nc ia do pode r e da a dm in i s t r a o . 9

    Estas re ivindicaes parec iam, no entanto, r ea l i s tas medida quese i nvoc a va um e xe mplo e s t r a nge i r o o r na do de t oda s a s v i r t ude s , om od elo ingls . Depois de se haver re t ido os mais s imples tem as da a n-l ise suti l de Mont esqu ieu, apegava-se vulg ar izao , mais imprecis a, m astam b m mais a t raente , de Vol tai re nas suas "car tas inglesas" , ass im co m os- ri ses um po uc o idl icas de autores secun dr i os . Subl inh a-se , sob re-tud o, que exis te u m pa s respe i toso da l iberdad e individ ua l , da l iberda-de de c onsc i nc i a , e da l i be r da de de impr e nsa , no qua l a j us t i a inde p e nde n te e impa r c i a l . A a ng loma nia va lo r i z a a s e pa r a o dos po-deres e no o pape l pol t ico menor dos sdi tos br i tnicos e as des igua l -dades soc ia is ao menos to gr i tantes quanto aque las que se conhecemna Frana . Em suma, a Ingla te r ra parec ia uma p t r ia de sonho para osgrandes burgueses filsofos e os nobres pou co conform is tas , em n om e deprincpios universais. Todavia sua argumentao dava frutos pois sua de-nn c ia dos abusos do pod er real f rancs es tava amplam ente comp rovada .

    23 Os "abusos" do Antigo Regime. , de fato, dif ci l avaliar hoje,c om e xa t id o , o pa pe l de se mp e nh a do pe los " a busos" do A n -

    tigo Regime na elaborao de uma nova f i losofia pol t ica. Estes eramviva me n te de nunc i a dos e m todos se to r e s da op in i o , ou oficial e pub l i -c a m e nte pe l a p r pr i a a u to r ida de r e a l .10 O absurdo e o car te r in tole r -ve l de cer tas pr t icas a rbi t r r ias e ram di f ceis de s up or ta r pois e las n o

    9 A . DE TOCQUEVILLE, UAncien Rme et la Rolution, livro III, cap. I: " C o m oem meados do sculo XVIII os homens de letras descrevem os principais homenspolticos do pas e os efeitos que deles resultaram".

    10 Turgot, onomiste et administrateur, P U F , 1 9 8 2 ( o p . c i t . ) .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    19/230

    1 8 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    parec iam mot ivadas pe lo inte resse gera l , mas unicamente por aque ledos pr ivi legiados: "Enquanto as inte rvenes do absolut i smo rea l fo-ram ra ras , jus t i f icadas pe la razo do Estado, o re i e seus conse lhe i rosimedia tos permanec iam mest res de sua apl icao. I sso ocor reu de for -ma d i f e r e n t e qu a nd o e l as s e ge ne r a l i z ar a m. O s p r pr ios min i s t r os ne mse mp r e c on t r o l a r a m o e xer c c io de f un e s que f o r a m c onf i a da s a f un -c ion r ios suba l t e r nos , a f e t a ndo o p r e s t g io real. Simples of ic ia is de p o-l c i a g o z a v a m d e p r e r r o g a t i v a s d o p o d e r s u p r e m o . S u a s f a l t a sr e sp inga va m na p r p r i a pe s soa do mo na r c a , c u jo c a r imbo e c u j a a ss i-na tu r a e r a m qua se se mpr e de so nr a do s , c o loc a dos a s e rv i o de r a nc or e spr iva dos e s vezes de combin aes inconfessve is" . 1 '

    Haver ia provave lmente uma his tr ia da hipocr is ia , no f ina l doAnt igo Regime, a escrever em re lao com a his tr ia da a f i rmao dosdi re i tos hum ano s. Surpreen de-se , s vezes , o ext rem ismo f ilosfico su-benienui t ic - por ccc tasfTmu as . N o dever iam ser .com preend idas ma issob seu aspec to nega t ivo (condenao daqui lo que exis te ) do que sobse u a spe c to pos i ti vo ( p r oc l a ma o d e p r inc p ios novos )? E m nu me r o-sos ou t ros mb i tos , nos qua is parece colocar regras novas , a Dec la ra oapen as d enu nc ia p r t icas exis tentes . "A l iberdade de i r e vi r se repor ta Bas tilha e s lettres de cachei*; a l iber dad e de escrever e de imp r imi r l e m -bra o Emlio que im a do pe l a s m os do c a r ra sc o e Rousse a u ba n id o p orum do s mais be los l ivros do sculo; a l iberdade de consc inc ia lem bra -va os prote s tantes expulsos do re in o e des t i tu dos d o es tado c ivi l. A p ro-p r i e da d e c onf i r m a da c omo d i r e i to na tu r a l r e spon d ia s ve lha s d v ida sfeuda is s qua is e la havia s ido su bjugad a . . . a igua ldade dian te da le i seo p u n h a s jus t ias excepc iona is; a igua l admiss ibi l idade aos en cargos ,

    1 1 A. BOY ER , La libert individuelle, p. 21, in B O Y E R , C O U Z I N E T , B R E T H E D E L AGRESSAYE, A. H A U R I O U , M A U R Y , Les garants de la ibert individuele Paris, Sirey,1933.

    * ( N . T.) Lettres de cachet: ordens rgias.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    20/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 1 9

    aos pr ivi lgios dos graus reservados aos nobres ; a par t i lha proporc io-na l dos impo s tos , l e mb r a n a da taille' exc lus ivamente paga pe lo te r -ce i ro es tado." 12

    2 4 Uma sociedade de liberdade. A l ivre comunicao das id iaspr oc l a ma da no a r t . 11 c ons t i t u i um a c onde na o do p r oc e -

    d im e nto da c e nsur a . M a s h mu i to c onse gu ia se f a ze r imp r imi r e d i -fu nd ir as ob ras m ais diversas at na corte real. As aes a inda p erpe t rad ascont ra os dis t r ibuidores de folhe tos e os impressores parec iam mais doqu e a rbi t r r ias . A l iberda de re l igiosa coloca nov am ente em causa a uni - ,da de de f of ic ia lm ente em vigor . Mas de fa to os protes tan tes no e rammais obje to de perseguies s i s temt icas , mesmo antes do di to de to-lerncia de 1787. Os castigos que sofr iam e a falsa adeso ao catolicis-mo demonst rada por a lguns e ram considerados hipocr is ias . A igua ldadedos di re i tos pe em che que a ordem soc ia l do Ant igo Regime. E la colo-ca mais s implesmente o di re i to em acordo com a rea l idade :

    p*IMo f inal d o s culo XV II I , escreve A. de Tocquevi l le, pod ia-se ain -

    da percebe r u ma d i ferena, sem dv ida, ent re as manei ras da nobre-za e as da burgues ia ; po is no h nada que se igua le mais lentamen tedo que esta superf c ie de costumes que se denom inam manei ras; mas,no fundo, todos os homens co locados ac ima do povo se parec iam,t inham as mesmas id ias, os mesmos hbi tos , seguiam os mesmos

    , gostos, se entregavam aos mesmos prazeres, l iam os mesmos l ivros,

    * (N . T . ) Taille: imposto que se cobrava antigamente dos plebeus.1 2 JANET, Philosophie de a Revolution franise, 4. ed., Paris, 1892,1.1, p. XLVI.

    Citado por G. Del Vecchio, La Dlaration des Droits de 1'homme et du Citoyen dans laRevolution franise, 1 .ed. , 1968,2. ed. , 1979, Ed. Nagard-Rome Distribution, L GD J , p .14 . A real idade , s vezes , complexa . Ass im ROUSSEAU f o i t o " v t i m a " d o senciclopedistas quanto do poder.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    21/230

    2 0 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    fa lavam a mesma l inguagem. E les se d i ferenc iavam ent re s i apenaspelos direi tos. '3

    M u i ta s c onde n a e s g loba i s do A n t igo Re g ime pa r e c i a m in jus t a s .M a s a s va n t a ge ns do s i s t e ma , a dqu i r i da s h mui to t e mpo , e r a m mui tomenos vis ve is que seus vc ios e seu i logismo. "Assim se expl ica comonossos a nc e s tr a is , de po i s de t e r e m v iv ido sob u m r e g ime ma i s ou m e -nos t o l e r ve l, a l i v i r a m a ma i s od io sa t i r a n i a e da t a r a m , da t om a da daBa s t il ha , o a dve n to da l i be r da de i nd iv id ua l . " 1 4

    E, no e ntanto, as l iberdades das qua is a lguns f ranceses gozavam sobo A nt igo Re g ime f a r i a m, ho j e a inda , mu i tos i nve josos ! Q u a n tos e sc ri -t o r e s d i s s ide n t e s a p r e c i a r i a m d i spor da l i be r da de c onc r e t a da qua lV ol ta i re , os e nc ic lope d i s ta s e t a n tos o u t r o s usu f r u r a m , m e sm o que e l ase a c om pa nha s se de a lguma s pe r se gu i e s e a mola e s?

    O pa s vivia n u m cer to am bie nte d e " tole rnc ia". Os pr pr i os p r i -v i l eg i a dos t i nh a m de sde mu i to t e m po r e iv ind i c a do d i r e i t os . A " r e vo l taa r i s t oc r t i c a " p r e c e de u , e m 1788 , a r e vo lu o bur gue sa . P r e oc upa dose m de f e nde r se us p r iv il g ios , os pa r l a m e nta r e s n o he s i t a r a m e m op orse us d i r e it os a o pod e r r e al . D a m e sm a f o r m a , e le s ha v i a m ha b i tua d o aop in i o pb l i c a e sc la r e cida a qu e os a tos do mo na r c a f os se m sub me t i -dos a o cr ivo de sua s c r ti ca s . D e nu nc i a va m de sde mui to , c omo a r b i t r -r i os , t udo o que o r e i l he s impunha , e mbor a r e c onhe c e sse m que e l e ofaz ia na defesa do inte resse gera l. H vr ias dcadas , a Eu rop a oc id enta la pa r e c i a c omo uma t e r r a de l i be r da de sobr e tudo qua ndo e r a c ompa r a -da E ur opa o r i e n t a l . A p r p r i a I da de M dia ba s t a n t e de ne gr ida na poc ahavia favorec ido, m ais do qu e se c r , es ta ecloso de l iberdade : l ibe rda-de das ordens re l igiosas e dos c l r igos , l iberdade dos univers i t r ios , l i -

    1 3 A. DE TOCQUEVILLE, L' Ancien Rime et a Rolution, l ivro II, cap. VIII: "Qu ea Frana era o pas onde os homens haviam se tornado mais parecidos entre si ."

    1 4 A . B OY E R , o p . c i t . , p . 2 5 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    22/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 2 1

    berdade dos burgueses , l iberdade dos nobres , l iberdade re la t iva de a l -g u m a s c o m u n i d a d e s c a m p o n e s a s re i v i n d ic a n d o , c o m m o v i m e n t o s d ec on te s t a o ma i s ou me n os e spon t ne o s , um d i r e i to i gua lda de . N ose t r a ta de escrever es ta his tr ia da l iberdade na Europa oc identa l emum simples manual de l iberdades pbl icas . Mas no se r ia poss ve l es-quecer que os homens do sculo XVIII eram o f ru to de um a cer ta c ivil i-z a o m e s m o q u a n d o e l e s a r e n e g a v a m . E l e s s e a c r e d i t a v a m m a i sinsp i r a dos pe lo e xe mplo dos r oma n os e dos g r e gos do que por sua p r -pr ia his tr ia nac iona l . Sua educao os levava a isso. Ma s a Ant ig ida-de no e ra sua nica fon te de inspi rao . , de fa to , um a ou t ra que stoque surge nes tes l t imos anos: a da inf lunc ia do pensamento c r i s to.Co m certeza , h m ui to tem po autores a f i rm ara m u m a cer ta f i liao. Masas posies oficiais da Igre ja , po r um lado, e as daque les que invocavamos pr inc pios de 1789, por ou t ro , parec ia m co nt radiz- las . Ora prec isa -me nte um a e vo lu o mui to n t i da se p r o du z ho j e e m d i a :

    0 que no f izeram os f i lhos e f i lhas de vossa nao para o con he-c imento do homem, para expressar o home m at ravs da formulao deseus direitos inal ienveis! Sabe-se o lugar que a idia de l iberdade, deigualdade e de f raternidade tem em vossa cul tura, em vossa histria.No fun do so idias crists. Eu o digo ao mesm o tem po qu e tenho b as-tante consc inc ia de que aqueles que formulara m ass im pe la pr imei ravez este ideal, no se referiam al iana do homem com a sabedoriaeterna. Mas eles queriam ag ir para o hom em , declarou, no f inal de maiode 1980, o papa Joo Paulo I I em sua ho ml ia do Bo urg et

    As id ias de 1789 so provave lmente inseparve is de um te r renocr is to. Notemos, a lm disso, que a Dec la rao no foi nem e laboradane m vo ta da nu m a m bie n t e a n t i- r el i g ioso e n o susc i t ou ime d ia t a m e ntereao host i l do c le ro. Se a lgum as a f i rma es es to em con t radio como d og m a ca tl ico e mais a inda co m a conc epo que de la faz ia a Igre jana po ca , no se po de a f i rm ar qu e isso f icou eviden te para os conte m-po rne os . Ser mais ta rde que a obra ant i - re l igios a da Revoluo, auxi -

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    23/230

    2 2 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    l ia da pe l a pa r t i c ipa o de mui tos c a t l i cos nos mo vim e ntos mo na r qu i s -tas , como se notou nes te texto, que surgem as maiores oposies di re i -t a - e sque r da , mona r qu i s t a s - r e pub l i c a nos , c l e r i c a i s - a n t i c l e r i c a i s . E s t a sc l iva gens pod ia m se r t o ma i s f a c i lme n te e xp lo r a da s na me dida e m queos pr inc pios proc lamados em 1789 e ram abst ra tos . Se foi poss ve l f a -z e r l e i t u ra s c om ple t a m e nte d i f e r en t e s , . po r qu e sua p r pr i a d ive r s ida -de o pe r mi t i a .

    2 A D I V E R S I D A D E D O S C O M P O N E N T E S

    As assembl ias que vota ram as dec la raes de di re i tos e ram maisou menos representa t ivas do esp r i to do sculo. I sso fac i l i tou um acor -do sobr e a f o r m a e sobr e o voc a bu l r io . E m c om pe nsa o , e s ta c onve r -g nd L n o se estend ia nec essa r iam entea o.alca nce.d as palavras p.rr.Ud..-que e ssas l t ima s e xpr e s sa va m f i l osof ia s p r o f u nd a m e nte d i f e re n t e s .

    A - As filosofias subjacentesA f i losof ia do d i re i to se divide t r adic iona lm ente ent re a cor rente

    posi t ivis ta e as teor ias do di re i to na tura l . (Sobre es ta questo, r epor ta r -se- com proveito s obras de M. VlLLEY; cf. Bibl iograf ia . )

    25 O positivismo jurdico. O posi t ivismo jur dico no cor respo ndea uma tendnc ia m od ern a m esm o se e le expressa hoj e na Fran -

    a o pe nsa m e nto dom ina n te . H ouve , e m todos os t e mpos , pos i t iv i smos me dida que os d i r i ge n t e s e x ig i r a m a obe d i nc i a e m nome da s o r de nsque p r omulga va m; n o ha v i a ne nhuma ne c e ss ida de , e n t o , de j us t i f i -ca t ivas ter icas . Estas apareceram somente na presena de tendnc iasc on t r a d i t r i a s . A ss im, os g r e gos op un ha m um a l ei supe r io r , r e gu l a nd oo curso dos as t ros e a vida das c idades , le i humana . Esta c rena e rap o t e n c i a l m e n t e p o r t a d o r a d e conflitos. neste contex to que os sof is tas

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    24/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 2 3

    ensinaram a pr imazia da le i humana confundida para e les com a le i domais for te . Da me sm a forma , exis tiam em R om a tendn c ias posi t ivis tas ,apesar de te rem s ido m eno s teor izadas .

    E s t a c onc e p o do d i r e i t o de sa pa r e c e a pa r e n t e me nte na E ur opadu ran te a Idade M dia . Ela ressurge e se desenvolve a par t i r do Ren as-c imento. Os nac iona l i sm os pol t icos e econm icos , r e forados pe lo cor tere l igioso que a Refo rma int rod uz iu , es to na or ig em de m l t iplas legis-laes para le las , s vezes cont rad i tr ias , que ne nh um a au tor id ade vemha r mon iz a r . A lguma s filosofias ant igas so redescober tas . O ce t ic i smofavorece a dvida quanto aos mr i ts compara t ivos das legis laes . O.epicur ismo leva o indivduo a procurar a f e l ic idade nos prazeres s im-p l es e e m um a mo r a l me d ia n a . V nq . d i r e i to um c on t r a to f un da do nointeresse , ten den do a proib i r os a tos noc ivos e a prescrever os que so t e i s . T oda s e s sa s f i l osof i a s ha v i a m s ido f o r m ul a d a s na poc a dohe lenismo, enquanto: o absolut i sm o levava o indivdu o a se des inte res-sa r da e laborao da regra de di re i to . Com o surgimento do Estadom o d e r n o , as mesmas causas produzem efe i tos s imi la res . medida queela subsiste , a pesq uisa jur di ca o fe i to de nobre s ou de burgu eses , n otendo quase nunca pr t ica judic i r ia , mais do que de c l r igos . Inf luen-ciados pelas teor ias cientf icas de sua poca, eles procuram extrair le isgerais, claras e abstratas. O direi to ganharia a em cer teza, em vez de ga-nh ar em jus t ia , m esm o qu an do essas lei s so qua l i f icadas de na tu ra is .

    Pois as teor ias do di re i to na tura l so tota lmente di fe rentes . Apare-c e r a m sob a f o r ma que c onhe c e mos a inda ho j e , na G r c i a , na poc ac lssica. Scra tes reagia con t ra o ma ter ia l i sm o p osi t ivis ta dos sof is tas .D e n t r e se us d isc pu los, P l a t o e A r i s t t e le s i n t e r p r e t a m se u pe ns a m e n :to em sent idos di fe rentes que es to um e out ro na or igem das grandesescolas do di re i to na tura l .

    26 O direito natural objetivo. Com Ar is tte les , o di re i to na tura l obje t ivo. E le considera , de fa to , que a Natureza , obra de um

    D e us c r ia dor , obe de c e a um a o r de m r a c iona l . D e ve e x i s ti r uma ha r m o-nia entre a lei e a Nature za . Tamb m a le i deve decor re r , no de u m sen-

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    25/230

    2 4 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    t im e n to i n t e r i o r , ma s de um a obse r va o i n t e l ige n t e da o r de m na tu r a l ,supostamente rac iona l . Procurar - se - a f ina l idade de qua lquer coisa eins t i t u i o e de duz i r - se - a l e i que e l a supe . A l e i r e ina r c om aimpe ssoa l ida de que t e m po r c ond i o a ge ne r al i da de . I s to t o r na r ne -cessr ia sua adap ta o ao s casos par t icu la res , apl icand o-a co m jus t ia ee q i d a d e .

    A f i losof ia a r i s tot l ica do di re i to na tura l se r re tomada e desen-volvida por So Toms de Aquino. Esse d uma def inio gera l da le i :" N o ou t r a c o i sa que uma o r de na o da r a z o e m v i s t a do be m c o-m um , es t a be le c ida po r a que l e que t e m a i nc um b nc i a da c omu nida dee p r o m u l g a d a . " 1 5 E s ta l e i , l e i huma na , c ons t i t u i uma p r omulga o dale i na tura l , "par t ic ipao da le i e te rna na c r ia tura razove l" . 16 Todos osse re s hum a no s , de v ido a sua o r ige m d iv ina , pod e m , i n de pe n de n te m e nteda f , descobr i r a le i na tura l . o que havia conseguido fazer o pagoAr is tte les . o que pode fazer , par t i r da observao inte l igente dacr iao, a r azo humana . Todavia o respe i to da le i na tura l , necessr io ,n o suf ic iente . A le i na tur a l apenas o re f lexo im per fe i to da lei e te rna" razo da d ivina s abed or ia , pois , e la co m an da todo s os a tos e todas asna e s" . 17 I na c ess vel som e nte i n t l ig nc i a hum a n a , ma s ' me nte pe l aRe ve la o, a l e i e t e r na o r i e n t a t a m b m os mo vim e nto s i n t e r io r e s qu ee sc a pa m le i hu m a n a . E la pe r mi t e a o hom e m a t i ng i r o f im da b e a t i t udee te rna qua l e le o r d e n a d o . 1 8 So Tom s dissoc ia ni t idam ente a lei e ter -na e a le i na tura l , mesmo se essa no es t ranha pr imeira . E le marcat a m b m c l a r a m e nte a subor d ina o da l ei hu m a n a l ei na tu r a l . A s l ei sde i ns t i t u i o hu m a n a ob r iga m e m c onsc i nc ia a pe na s se e la s s o j us -t a s , e m r a z o de se u f im ( b e m c o m um ) , de se u a u to r ( c omp e t nc i a ) , des e u t e o r ( r e p a r t i o e q i t a t i v a d e s u a s i n c u m b n c i a s ) . 1 9 A filosofia

    1 5 Suma Teolgica. Das les, Quest o XC , art. 4 .1 6 Ibid. Questo XCI, art . 2 o .1 7 Ibid. Questo XCIII, art . I o .1 8 Ibid. Questo XCI, art . 4 o .1 9 Ibid. Questo XCVI, art . 4 o .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    26/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 2 5

    t omi s t a n o se d ir i ge un i c a m e nte a o cr i s t o . Co n tud o , e la a dqu i r e t od osent ido apenas em re lao com a c rena em uma ordem na tura l divina .

    Se m se r nu nc a t o t a lm e n te a ba nd ona da , a f i losof i a t omis t a pa r e -c e u de c l i nar . M e sm o a que l e s que a invoc a va m t i nha m t e nd nc i a a verne l a ma i s um dog ma f ixo do qu e um m tod o de pe squ isa . A l m d i s so ,e l e s i n t r oduz i r a m nume r osos e l e me ntos he t e r og ne os e sub j e t i vos . Aredescober ta de f i losof ias ant igas , mais cent radas em uma viso subje -t iva do di re i to na tura l , e ra amplamente responsve l por es ta perda deinte resse . Pode-se igua lmente invocar a evoluo das c inc ias . Funda-das sobre a pesquisa das causas e no das f inalidades, l igadas ao quan-t i ta t ivo e ao mensurve l mais do que aos va lores , e las supunham umacer ta man ei ra d e ver a r ea l idade . Dif ic i lm ente es ta no pod er ia exercersua inf lunc ia sobre a formulao da mora l , da t ica e do di re i to .

    A ps a p r ox im a da m e nte me io s c u lo , a s si s te - se , no e n t a n to , a u mre torn o des tas teor ias . Alguns pensad ores i lus t res cont r ibu ram bastantepara i sso. Outras consideraes se acrescentam. Quaisquer que se jamos progressos das c inc ias exa tas , parece cada vez mais improv ve l q uee les permi t i ro compreender todas as le i s da na tureza . Reve la ram-sa l m d i s so i nc a pa z es de p r o t e ge r a hu ma nid a de de um c e r to n m e r ode vc ios , os tota l i ta r i s mo s em p r im eiro lugar . Por t anto , conc lui -se qu eera prec iso separar a pesquisa c ient f ica propr iamente di ta e a ref lexotica. Tanto a f i losofia de Aristteles como a de So Toms apresentame s t a va n t a ge m de pe r mi t i r , pe lo me nos a t um c e r to pon to , uma pe s -qu i sa c om um a os c r e n te s e a os n o c r e n t es . El a pod e f un da r um a mo r a lla ica , obje t iva , acei tve l po r tod os . Assim, po de-se expl icar sua coexis-tnc ia a tua l com as teor ias do di re i to na tura l subje t ivo.

    27 O direito natural subjetivo. Para Pla to, a le i vem da na tu-reza do homem. Ela lhe di tada pe la razo cor re ta . 2 0 Q u e r

    2 0 (N.R.) Foi o f i lsofo ingls Guilherme de Occam (1285-1349) o primeiro autilizar a expresso " the Power of Right Reason" , ou seja, a capacidade do homem de

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    27/230

    2 6 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    dizer , por aqui lo que divino em cada indivduo. Super ior ao homem,e la no lhe , no entan to, es t ranha . A f i losof ia pla tn ica te r um a amp lad i f us o no mu nd o a n t igo a o m e sm o t e m po que se mi s tu r a va a ou t r a s ,ent re as qua is o es toic ismo. Insp i rou C cero qua nd o e le def iniu assim alei na tura l : "Um a le i verdade i ra a razo cor re ta conforme Natureza ,di fun di da em todo s os seres". Ass im c om o So Toms c r i s t ianizou a fi -losofia de Aristteles, Santo Ago stinho havia cr ist ianizado a f i losofia pla-tnic a na q ua l e le havia s ido form ad o pe la le i tura de Ccero.

    Parc ia lmente ec l ipsadas no sculo XIII pela inf luncia de So To-ms, as teor ias do di re i to na tura l subje t ivo i r iam progress ivamente re -a pa r e c e r . O nomina i smo de G ui lhe r me de O c c a m de se mpe nhou umgra nd e pap e l nesse sent ido. Re je i tand o os gneros , as espc ies , os un i -versa is , ele a f i rm a o pr im ado do ind ivduo. Desde ento, o rea l ismo notem mais s igni f icado. Os di re i tos no podem ser procurados na rea l i -da d ex c~ :or . S pd em ser subje t ivos . Estas id ias inf luenc ia ram nu -m eros os pensa dores . O ressurgim ento das f i losof ias ant igas que hav iamestado na or igem do dec l nio do tomismo ve io, ao cont r r io , confor ta resta viso do mu nd o. O estoicismo n o ensin ou a existncia de uma fora(logos) qu e organiza o mu nd o e se reve la no nve l de nossa consc inc ia?Assim as teor ias do direi to natural subjetivo iam se laicizar . A voz dac onsc i nc i a fo i c ons ide r a da , por a lguns , v inda da na tu r e z a do h om e m .

    C o m G r o t iu s 2 1 espec ia lmente , o di re i to na tura l decor rente da na -tu r e z a do ho m e m se d i s t ingue a o m e sm o t e m po da l ei hu m a n a e da leidivina . Sua teor ia do D ire i to e do Estado , f unda me nta lme nte , i nd iv i -dua l i s ta e con t ra tua l . O Estado tem a respons abi l idade do be m p bl ico,M a s e s ta no o c or r e sponde un i c a m e nte a o que de um a ut i l idade "co-mu m". E la no impl ica de form a a lgum a na exis tnc ia de f ins cole tivos

    definir de m aneira autnom a suas escolhas morais, descartada a influncia dos ou -tros em seu domnio "natural". A "droite raison" pode tambm sugerir ao homemuma srie de regras que buscam tornar possvel um a coexistncia pacfica.

    2 1 1 5 8 3 - 1 6 4 5 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    28/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 2 7

    pr pr ios d i s t i n tos do c umpr ime nto dos f i ns i nd iv idua i s dos me mbr osdo c or po soc i a l . Puf e ndor f 2 2 i r mais longe nesta laicizao do direi tona tura l . E le opera uma n t ida dis t ino ent re os deveres rac iona is ouna tura is , que se impem porque a razo cor re ta os faz parecer soc ia l - .m e n te ne c e ss r ios, e os deveres resul tantes da Escr i tura Sagrad a . Dire i -to na tura l e di re i to divino es to desta vez separad os .

    Na vspera da Revoluo Francesa , a maior par te da opinio es-c la rec ida c r mais ou menos confusamente na exis tnc ia de um sent i -me n to do j us to un ive r sa lme nte d i spe r so e m c a da i nd iv duo .

    B - 0 alcance das palavrasVr ias pa lavras dever iam ser espec i f icadas quando se consideram

    os f un da m e nt os dos d i r ei t os hum a no s . N o e n t a n to u m a e sc o lha se im-pe ne c e ssa r ia me nte .T e m

    aren i ic i tS rcij u lavras Lib erda de, Igu al-da de e Fra te rnidade , emblem a da Repbl ica f rancesa . Um a ou t ra escolhaera, verdade , apriori possvel . A Declarao de 1789 no en t lhc ia den -t re "os di re i tos n a tura is e imprescr i t ve is do hom em", a l iberdade , a pro -pr iedade , a segurana , e a res is tnc ia opresso? De fa to , a abo rdag emda igua ldade inseparve l daque la do di re i to de propr iedade , da mes-ma f o r ma que a se gur a n a o da p r pr i a no o de li be r da de . Q u a n to res is tnc ia opresso, e la const i tui mais uma pe t io de pr inc pio doqu e u m di re i to . E la se s i tua , de fato, por d e f in i o , f o r a da o r d e m ju r -dica existente e m e s m o c o n t r a ela. Puro fa to , em uma viso posi t ivis ta ,e la pod e no m xim o invoc a r c e r ta s te o r i as na tu ra l i s ta s . O me sm o n oacontece com as t r s noes consideradas .

    2 2 1632-1694 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    29/230

    2 8 DIREITO S HUM ANO S E L IBERDADES PBLICAS

    28 A liberdade. Como Fus t e l de Coula nge s mos t r ou ma gi s t r a l -me nte , n o foi a Grc ia que nos legou no ssa concep o de li -

    b e r d a d e : 2 3Os ant igos no conhe cem nem a l iberdade da v ida pr ivada, nem

    a l iberdade da educao, nem a l iberdat ere l ig iosa. A pessoa huma-na contava mui to pouco em re lao a esta autor idade santa e quasedivin a que se chama va a ptria ou o Estado.. . ento um e rro sing ularent re todos os erros hum ano s ter acred i tado que nas c idades ant igaso hom em gozava da l iberdade. E le no t inha sequer a id ia . No acre-di tava que poderia exist i r dirf to diante da cidade e de seus deuses.Logo veremos que o governo mudou vr ias vezes de forma, mas anatureza do Estado perman eceu mais ou menos a mesma, e sua on i -potnc ia em nada fo i d im inu da. O governo cham ou-se, sucess iva-mente, monarqu ia , ar is tocrac ia , democrac ia , mas nenhuma dessasrevo lues d eu aos home ns a verdadei ra l iberdade, a l iberdade in d i -v idua l . Ter d i re i tos po l t i cos, votar , nomear magis t rados, poder serarconte , e is o que se chamava a l iberdade; mas o homem no era nem ,por isso menos su b juga do ao Estado. Os ant igos, e sobretud o os gre -gos, exageram sempre a importnc ia e os d i re i tos da soc iedade, is todecorre sem dv ida do carter sagrado e re l ig ioso que a soc iedadehavia se revest ido na or igem .

    A l iberdad e dos gregos um a l iberdade pol t ica . l ivre o c idad oqu e par t ic ipa da vida de sua c idade , e la me sm a l ivre , ind epe nd ent e ins-t i t uc iona l e e c onomic a me nte de t oda domina o e x t e r na . Com c e r t e -za , p de exis ti r em a lgum as c idades , em a lgum m om en to de sua his tr ia ,uma to l e r nc i a um pouc o ma ior no mbi to ho j e qua l i f i c a do de v idapr ivad a , e po de-s e c i ta r um a f rase a t r ibu da a Pric les: "N s no nos

    2 3 F U S T E L D E C O U L A N G E S , La Citantique, cap. X V I I I : "Da onipotncia do Esta-do: os antigos no conheceram a l iberdade individual ."

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    30/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 2 9

    i r r i t a mo s c on t r a o nosso se me lha n t e qu a nd o e le a ge se gund o sua von -tade" . Mas, se ja como for , t r a tava-se de uma tole rnc ia mui to re la t iva ,s e m n e n h u m f u n d a m e n t o j u r d i c o . A c id a d e g r eg a es t s u b m e t i d a at e nd nc i a s t o t a l i t r i a s . E s t a s a pa r e c e m mui to n i t i da me nte na c ida deidea l descr i ta po r Pla to. N o se r ia poss ve l esquecer que a grande m aio -r ia dos habi tantes encont ra - se exc luda do gozo da l iberdade pol t ica :mu lheres , c r ianas , es t range i ros e escravos . Sob a m esm a reserva , Rom apa r e c e r i a ma i s l i be r a l : um e sp r i t o ma i s p r a gm t i c o se a c omoda me - "lhor com uma cer ta l iberdade de fato, be ne f i c i a do por um e spa o ge o-gr f i c o ma i s a mplo . N o me nos ve r da de i r o que a l i be r da de ma i sa que l a do c ida d o so lda do do que a do hm e m pr iva do .

    Na rea l idade , no Cr is t ianismo que prec iso procurar as or igensda l ibe r da de i nd iv idua l . E s ta a f i r ma o c om um e nte a dm i t i da na h i s t -r ia das id ias poder i a surp reend er . Inic ia lmen te , os pr im eiros c r i s tos ,e les m esm os aps seu Mest re , nu nca re ivindica ram a l iberdade jur dica .Se e les proc lamam, em a l to e bo m som, que o Cr i s to os l i be r tou , n o ' ? opresso p ol t ica que e les a lud em , ma s n ica que con ta rea lmente , ad o p e c a d o . 2 4 Em seguida , prec iso reco nhec - lo be m , as igre fas c r i s tsn o se m os t r a r a m se mpr e p r e oc upa d a s , a o l ongo da h i st r ia , c om a li -be r d a de i nd iv idua l e ma i s p r e c i sa me nte c o m a l i be r da de de c onsc i n-c ia . Contudo, vr ias razes podem expl icar es ta a t i tude . Ins t i tu ieshu ma na s , a s i g r ej a s s o i n f lue nc ia da s pe l a c u l t u r a dos povos nos qua i se las exis tem. Seus di r igentes e seus membros no es to ao abr igo dastentaes autor i t r ias que inc lus ive os apstolos haviam manifes tadoantes de se fazerem repreen der pe lo Cr is to . 2 5 N o p l a n o dos p r inc p ios , sempre di f c i l ace i ta r ver seu semelhante cometer e r ros graves que seju lga m pr e jud i c i a i s a e l e me smo e a ou t r e m. O s pode r e s , e sp i r i t ua l etempora l , no devem ze la r para assegurar a sa lvao do pecador? Noentanto, se es tas consideraes mais nobres ou menos nobres desem-

    1 4 SAO PA.ULO, Epstola aos Roman os, cap. VI.2 5 L U CA S, c a p . I X , 5 4 , 5 5 , 5 6 .

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    31/230

    30 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    pe n ha r a m u m g r a nde pa pe l e s e a s p r ime i r a s se t r a du z i r a m e m t e o lo -gia, a f c r is t po r t a d or a de l i be r da de . A d m i t indo q ue c a da se r hum a -no c ons ide r a do ind iv idua lme nte , que ele o nico responsve l de seusa tos e qu e se r julgad o apenas p or e les , n o imp l ica e la em qu e se devarespe i ta r as e sc o lha s f unda me nta i s feitas por c a da um? A inda m a i s que imposs ve l j u lga r hon e s t a m e nte ou t r e m po i s n o c onhe c e mo s o f un -do de se u se r . Q ua ndo mui to , c omo 0 se n t ine l a , pode - se a v i s - lo ouc ha m - lo c onve r s o . 26 O pr pr io e xe mplo do Cr i s to pode r i a c onf or -ta r es ta opin io. E le n o ace i tou q ue pessoas recusassem segui -lo?

    Co m c e r te z a, n o f o i es ta a r gume nta o que dom ino u o pe nsa m e n-to do sculo XVII . No entanto, e la no foi es t ranha s mot ivaes dosreda tores das dec la raes amer icana ou f rancesa . Tomemos dois exem-p los : T ur go t , o min i s t r o r e f o r m a do r de L u s XVI ao qual os f i lsofos eVol ta ire pres ta ram h om ena gem , dese java um a la ic izao do Estado. Emapoio, o ant igo es tudante de teologia fornece a rgumentos tanto teol-gicos quanto rac iona is . A submisso devida Igre ja c r c l igio sc r -m e n te a da c onsc i nc i a . O s r e is e s t o subm e t id os r e l i g i o c o m oind iv duos , ma s n o c omo pr nc ipe s . N o t m ne nhuma c ompe t nc i apara d i ta r a le i r e l igiosa , m bi to n o qua l sua ignornc ia qua se se mpr enotr ia . O mbi to da f deve escapar a toda inte rveno tempora l ex-te rna . Deve-se obedecer volunta r iamente e em consc inc ia . A verdadeimp or - se - por e la me s ma . O Cr i s to de u o e xe mplo r e pr e e nd e nd o f o r -t e me nte se us d i sc pu los que que r i a m f a z e r c a i r o f ogo c e l e s t e sobr eSam ar ia . Qu an to aos pr nc ipes , sua nica m isso fazer a fe l ic idade dospov os sobre a te r ra . Devem respe i ta r as c renas individua is . " prec isot e me r a obs t a c u l i z a o da busc a da ve r da de , hu m i lha nd o a que l es quen o a c onhe c e m e que n o me r e c e m por i s so se r e m humi lha dos . " 2 7

    2 6 EZEQUJEL, II, 16-21.2 7 Carta de 10 de maio de 1765 , in Oeuvres po r G. SCHELLE, Paris, F. Alcan, 1914

    (reimpresso, 1972), t. V, p. 438.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    32/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 3 1

    I gua lme nte i n t e r e s sa n t e sob e s t e pon to de v i s t a o pe nsa me nto deM o u n i e r q u e d e s e m p e n h o u u m g r a n d e p a p el n o i n c io d a R e v o l u o . 28

    T oda v ia , a s o r ige ns ime d ia t a s da " l i be r da de mode r na " s o mui tomais la icas . N o se r ia poss ve l esquecer a inf lun c ia inglesa e , po r m eiode la , o pragmat ismo anglo-saxo. As l iberdades inglesas , pois o plura lc or r e sponde p r ova ve lme nte me lhor r e a li da de , se pos i c iona m pr ogr e s -s iva me nte , me d ida da s c i r c uns t nc i a s e dos c ompr omissos . M onte s -qu i e u , que popu la r i z ou e s t a p r t i c a , f e z de l a a t e o r i a , s e m por i s soto r n - l a a bs t r a t a . 2 9 Q u e r - se po r p r ova a de f in i o da l i be r da de que e leconsidera : "A l iberda de pol t ica consis te na segu rana o u pe lo m en osna op in i o q ue se t e m d e sua se gur a n a . " 30 Essa def inio subje t iva su-p e o estabe lecim ento d as garantias. Essas so con hecida s. preciso fazerum a se pa r a o dos pod e r e s a f im de que o pod e r pa r e o pode r . O m to-do usa do po r M o nte sq u i e u pa r t e e n t o de um a a n l i se ps ic o lg ic a da sl iberdades dos r i scos de a rb t r io . As viola es dos di re i tos pro vm deque t odo de t e n to r de um pode r e s t t e n t a do de l e a busa r . P r e c a u e sa da p ta da s p r oc ur a de um e qu i l b r io pe r mi t i r o , s e n o supr imi r osr i scos , pe lo menos l imi t - los .E s t e e sque ma e r a c onhe c ido dos Cons t i t u in t e s f r a nc e se s ou a me -r i c a nos . A s de c l a r a e s r e vo luc ion r i a s c a r r e ga m a ma r c a de l e . M a s ,pou c o ha b i tua d os p r t i c a do pode r , t e ndo r e f l e t i do sobr e a s r e f o r m a sa pe na s por me io de l e i t u r a s , os home ns do s c u lo XVIII t m t a m b mtendnc ia a querer procurar solues abs t ra tas de vocao universa l . Ate or ia do c on t r a to soc ia l l he s f o r ne c i a um a e xp l i c a o a pa r e n t e me ntec i e n t f ic a dos ma le s dos qua i s so f r i a a hu m a n ida de . E la da va um f un -

    2 8 M O U N I E R , Recherches sur les causes qui ont emph les Franis de devenirlibres, et sur les moyens qui leur resterttpour acquir la ibert Genebra, 1792 (2 vol . )especialmente p. 154,155 , em que ele insiste sobre a igualdade moral e o respeito aosemelhante decorrente do cristianismo.

    29 De 1'Esprit des Lois, livro XI, cap. VI: "Da Con stituio da Inglaterra".3 0 Ibid., livro XII, cap. II.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    33/230

    3 2 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    da m e nto , t a m b m a pa r e n t e me nte l gi co , a p r opos i e s de r e f o r ma s . O shomens viviam no es tado de na tureza . Sent i ram a necess idade de fazeru m c on t r a to que f un da a soc i e da de. Se o e sque ma ge ra l ma is ou me -nos c ompa r ve l e m H ob be s , L ocke , Rousse a u e v r ios ou t r os a u to r e s ,a s d if e r e n a s n o s o me no s num e r osa s e f un da m e nta i s . A v ida no e s-tad o d e na tureza fe l iz para Locke e Rausseau, ca tas t rf ica para Hob bes .E s t e c on t r a to impl i c a um a ba ndono to t a l da l i be r da de e m H obbe s eRousseau. A preservao da l iberdade tem como nica garant ia a von-tade do soberano suposta razove l (Hobbes) ou a vontade gera l supos-t a i n f a l ve l ( Rousse a u) . E m c ompe nsa o , s e gundo o pe nsa me nto deLocke , os indivduos , felizes no e s t a do de na tu r e z a , som e nte b usc a va m,a o f i r m a r o c o n t r a t o s o c i a l , u m a f e l i c i d a d e a i n d a m a i o r . E e n t oimpensve l que e les t ivessem renunc iado a todos os di re i tos e l iberda-des . E les se despoja ram unicamente do que indispensve l para asse-gu rar a vida social no interesse de todos. esta viso mu ito m ais o timis tada h i s t r i a da s soc i e da de s huma na s que i nsp i r ou d i r e t a me nte a i d i ade di re i tos na tura is , ina l ienve is e sagrados , preexis tentes soc iedade .

    Co ns id e r a nd o sua impo r t nc i a , n o i n t i l r e l e mb r a r o r a cioc -n io de L oc ke e m se u se gund o t r a t a do do gov e r no civil: " O s h o m e n s s otodos , po r na tu r e z a , l iv r es , igua i s e i nde pe nd e n te s c om o foi di to , e nin -gu m po de se r p r iva do de se us be ns , ne m sub me t ido a o pode r p o l t ic ode u m o u t r o , se e le m e sm o n o o c onse n t iu . O n i c o p r oc e d im e nto quepe r m i t e a qua lque r u m se de spo ja r de sua l i be r da de na tu r a l e e ndossa ros vnculos da soc ied ade c ivil , a ssina r um a c onve n o c om ou t r os ho-me n s , nos t e r mos da qua l as pa r t e s de ve m se j un t a r e s e un i r e m um am e sm a c om unid a de , de ma ne i r a a v ive r j un to no c o nf or to , na se gu r a n-a e na paz , gozan do em segurana de bens . . . "31 A ss im se f o r m a um c or popo l t i c o no qua l a ma io r i a possu i nor m a lm e nte o pode r d e de ci so : " pr e c i so e n t o a dm i t i r que t odos a que le s que sa e m d o e s t a do de na tu r e -z a pa r a se un i r e m e m c omunida de a bd ique m, e m f a vor da ma io r i a ,

    3 1 Cap. VIII: " Do inc io das sociedades polt icas".

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    34/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 3 3

    tota l ida de dos podere s necess r ios realizao das f inalidades sociais,a me nos que uma e s t i pu l a o e xpr e s sa e x i j a o a c or do de um nme r osuper ior maior ia" . 32 " . . . Es te poder legis la t ivo o poder supremo daRepbl ica . . . E le no a rbi t r r io , pois e le no po de r ia te r mais po de r d oque c ada me m br o da soc i e dade po l t ic a ind iv idua lme n te " . M e sm o c on -s ide r a do e m sua s ma io r e s d ime nse s , " o pode r que e l a ( l e g i s l a tu r a )de t m l imi t a - se a o que e xige o be m pb l i c o da soc i e da de . E u m po de rque n o t e m ou t r o f im a n o se r a c onse r va o e n o pode , por t a n to ,resul ta r no di re i to de des t rui r os suje i tos , de subjug- los , nem de que-r e r e mpobr e c - los . As obr igaes da le i de na tureza no se apagam nasoc iedade" . 33

    L oc ke um dos p r e c ur sor e s do l i be r a l i smo, d i f e r e n t e me nte deHo bbe s ou de Rousseau. Esta uma viso l ibera l do cont ra to soc ia l queprevalece no f inal do sculo XVIII m e s m o q u a n d o n o s e c o n s i d e r a mtoda s a s su t i l e z a s do r a c ioc n io do a u to r ou qua ndo se p r oc e de a _a m lga ma s s ve ze s i l g i c os. A ss im , qu a n to s l e i t o r e s de R ou sse a i rc onse r va r o a pe na s um a ima g e m se n t ime n ta l de f e l ic ida de e de l i be r -dade no es tado de na tureza e fa la ro de di re i tos na tura is se rnse daremc onta da s i nc ompa t ib i l i da de s de st a v i s o c om a a dm iss o da on ipo t n -c ia da vonta de geral? De fa to , todas essas teor ias co nf or tam o ind ivid u-a l i smo ambiente , a id ia de uma l iberdade na tura l , espc ie de para sope r d ido que um novo c on t r a to pe r mi t i r r e e nc on t r a r . E sse l t imo su -pe u ma c r e n a na i gua lda de p r o f un da dos se r es .

    29 A igualdade. U ma h i s t r i a , me smo mui to b r e ve , e ne c e ssa r i a -m ent e bas tante esquem t ica , da id ia ' de igua lda de faz a pa r e -cer um a no o susce tve l, tan to qu an to a pre ced ente , de m l t iplas in-

    te rpretaes . Enco nt ramo s as ra zes da id ia de igua ldade no pen sam entogrego.

    3 2 Ibid.3 3 Cap. XI: "Da extenso do poder legislativo".

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    35/230

    3 4 DIREITOS HUMA NO S E LIBERDADES PB LICAS

    O nome de P l a t o foi f r e q e n te m e nte a ssoc ia do , ao l ongo da h i s -tr ia , id ia comun is ta . No se m razes, pois A Repblica nos descreveum a c idade idea l on de a igua ldade se t r ad uz pe la concesso de parce lasde t e rr a a os t r a ba lha dor e s e po r um c om uni s mo q ua se i n t e gra l pa r a osguer re i ros e filsofos. C o m u n i s m o d o s b e n s , m a s t a m b m d a s m u l h e -re s e da s c r i a n a s , o t odo c ombina do .c om uma r e gu l a me nta o e umavigi lnc ia minuc iosa de todos os a tos da vida . Este comunismo tota l i -tr io, f rugal , repousa sobre excluses (escravos, estrangeiros) e seleesseveras (passagem de uma c lasse a um a ou t ra ) . Ele foi for tem en te c om -ba t id o po r Ar is tteles .

    Para Aristteles, de fato, o home m t e m ne c e ss ida de de p r opr i e da -d e e de a fe io exc lusivas . A amizad e e o amo r re fo ram a c idade , pro -pic iand o um a divers idade necessria . A experinc ia ens ina que h pou capreocupao sobre o que cole t ivo. As c r ianas ou os bens se r iam, defato, tratado s com igual indiferena. Alm disso, no se resolver iam destaforma as quere las humanas: "Na rea l idade , es tes maus no tm nuncac omo c a usa o de f e i t o do c om uni s mo dos be ns , ma s a pe r ve r s ida de hu-ma n a . Po i s, c ons t a t a mos que os possu idor e s de be ns e m c om um ou e mdiviso tm, ent re eles, confli tos muito mais f reqentes do que os cida-dos cujo s inte resses es to sep arado s ." 34

    Do ponto de vista social , a igualdade deve ser relat iva e leva emconta as capac idades diversas dos indivduos . Segundo es te autor , nose c onf i a uma f l a u t a ne m a o ma io r ne m a o ma i s f o r t e . D a m e sm a f o r -m a, dever-se- ia confiar as respo nsab il idades po l t icas aos m elho res e aosma i s a p tos . A de moc r a c i a bo a na qu i lo e m que t od os os hom e n s s oefe t ivamente igua is sob a lguns aspec tos . E la , con tud o, d efe i tuosa , po ise les no so igua is em tudo. Inversam ente , a ol igarquia c onsid era suasdesigua ldades na tura is , ma s negl igenc ia bas tante a igua ld ade to na t u-ra l quanto. Decor re a pre fe rnc ia de Ar is tte les pe lo regime mis to fa -zend o ape lo, po r u m lado, igua ldade numr ica , e por ou t ro , igua ldade

    3 1 ARIST T E L E S, Lapolitique, Paris, Vrin, 1970,p. 100.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    36/230

    \

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HU MAN OS " 35

    p e l o m r i t o . 3 5 Pois "a igua ldade de duas espc ies : a igua ldade pura-m e n t e n u m r i c a e a igua lda de pe lo m r i t o . E n t e ndo por num e r i c a me n teigua l o que idnt ico e igua l em nmero e em grandeza , e por igua l ,s e gund o o m r i t o , o que i gual e m pr opor o . . . M a s a o me sm o t e m poem que concordam com es ta id ia de que o jus to , no sent ido absoluto, aque le em que o mr i to considerado- , os homens cessam de se en-tender . . . naqui lo em que uns pensam que , se e les so igua is em a lgunspo nto s , e les so tota lm en te igua is , e qu e os out ros , ao con t r r io , c remque , se eles so des igua is em a lgum p on to, e les so des igua is em tu do " 3 6

    Convir ento t r a ta r igua lmente o que igua l e des igua lmente oque des igua l . Deve-se considerar as capac idades quando se t r a ta dec idados . Reconhecer - se -o di re i tos econmicos , mas no pol t icos aoses t range i ros , u m po der t ie l ibera t ivo, m as no de dec iso, para a mulh er .Q ua nt o aos escravos , e les no po ssue m es te po der de l ibera t ivo. Em lon -gos desen volv imen tos , Ar is tte les expl ica qu e a escravido admiss ve lno caso da exis tnc ia de se res hu m an os cu ja na turez a os con duz em a sesub me te r e m a u to r ida d e de um ou t r o . O r a , p r e c i same nte , i sso n o l heparece c or re spo nd er rea l idade . Escravos tm corpo s de homens l ivres,e ho m en s l ivres tm a lmas de escravos . Al is, a ma ior par te dos escra -vos , pr i s ione i ros de guer ra , havia ante r iormente provado sua capac i -da de d e se r l ivre . Ass im, Ar is tte les aconse lha seus donos a n o abusarda autor idade , mas a t r a t - los com inte l ignc ia e amizade . Ar is tte lesn o va i a t o f im da lgica de seu rac ioc nio, precon izand o a supressoda escrav ido, me sm o qu e e le aconse lhe a em ancipa o. Ta lvez es tives-se um po uc o p r i s i o ne i r o dos da dos e c on mic o s de sua poc a e de se um eio cu l tura l n o qu a l a escravido parec ia indispensve l . Se as nave tastecessem sozin has, explica ele, n o haveria n ecessidad e de escravos. Aris-tte les foi m ui t o a l m de ou t r os pe nsa do r e s g r egos . N o e n t a n to e le n ode u o l t imo pa sso .

    35 La politique, V, 1.[ 36 La politique, V, 1 , 1301 .1 . 28; op. cit., p. 341.rri

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    37/230

    3 6 DIREITOS HUMANOS E LIBERDADES PBLICAS

    Esse se r dado, nesse mbi to como em tantos out ros , pe lo Cr is t ia -n i smo. O A nt igo T e s t a me nto j ha v i a c o loc a do p r inc p ios f unda me n-t a i s . Cr i a do ima ge m de D e us , o home m de ve se r r e spe i t a do . N oimpor tando sua queda aparente , r esul tante da misr ia , a t de seus e r -ros , e le permanece uma cr ia tura divina . O conjunto das regras bbl icasse inspi ra nes ta id ia . Ass im, os hebreus possuem no um di re i to dep r o p r i e d a d e a b s o l u to e a r b i t r r i o e m sua p t r i a , ma s um a " he r a n a " . 37As propr iedades repar t idas em igua ldade ent re as t r ibos e as fam l iasn o p od e m se r ve nd ida s de ma ne i r a de f in it i va . A l m do m a i s , os p r o f e -t a s r e l e mb r a m pe r iod i c a m e nte os r i cos de se us de ve re s f und a m e nta i s . 3 8

    O N ovo T e s t a me nto va i ma is a l m. N o som e nte e le l e mbr a c ons -t a n t e m e nte a obr iga o de re spe it a r s e u se me lha n t e , me s mo qua ndo e lese tornou um inimigo, de no se c re r super ior a out rem e de no julg-lo se m sa be r , ma s t a m b m c on t m um a pe lo c ons t a n t e a ir al m d i s so .Aquele qu e se dec la ra disc pulo do Cr is to deve es ta r pro nt o a pre fe r i - loa seus ben s , s suas a fe ies te r res t res e a t sua pr p r ia vid a . 3 9

    Toda a t r adio c r i s t r e tomar es te esp r i to: "No h mais judeu,ne m gr e go , n o h ne m e sc r avo ne m h om e m l iv r e , n o h ne m ho m e mne m mulhe r ; por que t odos vs so i s um e m Cr i s to" . ' 10 O a ps to lo dosG e nt ios d i r i g indo- se a os Cor n t i os os c onv ida r t a mb m a uma pa r t i -lha concre ta d e seus bens "para que ha ja a l vio para out ro , vs no deve isvos reduz i r ao aper to , mas , segundo a regra de igua ldade , que a vossaa bu nd nc i a a tua l c om pe nse o que fa l ta a os ou t r os , pa r a que t a mb m aabundnc ia de les (em out ra ocas io) venha a supr i r vosso aper to , e as-s im ha j a i gua lda de " . 41 A t r a d i o pa t r s ti c a mo s t r a - se e l a t a m b m ba s -tante concre ta e a inda mais exigente .

    3 7 L E V T I C O , c a p . X X V .3 8 Por exemplo , ISAAS, cap. L V I I I .3 9 M A T E U S , XIX, 21-22; M A R C O S , X, 21-22; L U C A S , XVIII, 22-23.4 0 SA o P A U L O , Epstola aos Glatas, III, 28.4 1 Epstola aos Corntios, VII, 13-14.

  • 7/22/2019 Material de Direitos Humanos

    38/230

    A FILOSOFIA DOS DIREITOS HUMANOS 3 7

    Essa exignc ia adqui re , com So Tom s de Aqu ino, um a for m a m aisjur dica . Re tom an do as bases da f i losofia de Aristteles, So Tom s pe nsaque o homem pode possui r tudo o que t i l para seu f im. O di re i to dep r o p r i e d a d e um di re i to na tura l , ina l ienve l , necessr io para a conser -vao da exis tnc ia . Sua jus t i f ica t iva pragmt ica ta l como em Ar is t-te les . As pro pr ied ade s individua is f avorecem um a me lho r ges to, evi tamas discrdias e permi tem o a l t rusmo. E las devem ser r epar t idas con-forme a jus t ia dis t r ibut iva , ou se ja , levando em considerao a igua l -da de num r i c a e a i gua lda de se gundo o m r i t o . Ca da um t e m o de ve rde t i r a r o melhor par t ido de seus bens . Deve-se dar , se puder , t r aba lho que l e que n o o t e m, pa r a pe r mi t i r - l he ga nha r a v ida por e l e me smo.= 'Quando i sso no se reve la poss ve l , deve-se , em l t ima ins tnc ia , daresmola . Pois no nve l do co nsu m o, a f ina lidade dos ben s preva lece so-b r e o d i r e i t o de p r opr i e da de . E s t e e s t subor d ina do a uma f un o so -c ia