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Marcas do Pós-modernismo em Ricardo Piglia e Silviano Santiago Letycia Fossatti Testa Wellington Ricardo Fioruci (Universidade Tecnológica Federal do Paraná UTFPR) Resumo: Este artigo objetiva analisar, sob um caráter comparativista, como a historiografia e seus discursos são revisitados e reinterpretados criticamente nas obras Em liberdade (1981), do brasileiro Silviano Santiago, e em Respiração Artificial, do argentino Ricardo Piglia (1980), a partir das características do período literário conhecido como o Pós-modernismo. Ambas as narrativas retratam períodos importantes vivenciados no Brasil e na Argentina e os autores utilizaram várias estratégias discursivas tidas como pós-modernas para tratar destes fatos históricos e construir suas ficções. Diante disso, buscar-se-á relacionar as duas narrativas, os contextos sócio-históricos nelas retratados, que refletem a história de ditaduras, repressões e violências vivenciados na América Latina e os recursos estilísticos empregados pelos autores, principalmente a metaficção historiográfica, sob a perspectiva de Linda Hutcheon (1991). Estas características revelam o caráter crítico, paradoxal e reflexivo evidenciado pelo pós- modernismo, assim como refletem criticamente a história do contexto latino-americano a partir de uma revisitação do passado por meio da literatura de Santiago e Piglia. Palavras-chave: Historiografia; Pós-modernismo; América Latina; Metaficção Historiográfica. Abstract: This article aims to analyze, in a comparativist way, how the historiography and its discourses are revisited and critically reinterpreted in the books Em liberdade (1981), by the brazilian writer Silviano Santiago, and in Respiração Artificial, by the argentine writer Ricardo Piglia (1980), from the characteristics of the literary period known as Postmodernism. Both narratives portray important periods lived in Brazil and Argentina. This authors used several discursive strategies considered as postmodern to deal with these historical facts and to construct their fictions. In this way, this study will try to relate both narratives, in the socio- historical contexts that reflect the history of military dictatorships, the repressions and the violence that were experienced in the Latin America and the stylistic resources employed by the authors, especially the historiographic metafiction, from the perspective of Linda Hutcheon (1991). These characteristics reveal the critical, paradoxical and reflective character evidenced by the postmodernism, also reflect in the critical way the history of the Latin American contexto, revisiting the past through Santiago and Piglia literature. Keywords: Historiography; Postmodernism; Latin America; Historiographic Metafiction. Introdução Este artigo objetiva analisar e relacionar duas obras contemporâneas: Respiração artificial, do argentino Ricardo Piglia e Em liberdade, do brasileiro Silviano Santiago, visando identificar como ambas remontam ao passado para criticá-lo, assim como, implicitamente,

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Marcas do Pós-modernismo em Ricardo Piglia e Silviano Santiago

Letycia Fossatti Testa

Wellington Ricardo Fioruci

(Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR)

Resumo: Este artigo objetiva analisar, sob um caráter comparativista, como a historiografia e

seus discursos são revisitados e reinterpretados criticamente nas obras Em liberdade (1981),

do brasileiro Silviano Santiago, e em Respiração Artificial, do argentino Ricardo Piglia (1980),

a partir das características do período literário conhecido como o Pós-modernismo. Ambas as

narrativas retratam períodos importantes vivenciados no Brasil e na Argentina e os autores

utilizaram várias estratégias discursivas tidas como pós-modernas para tratar destes fatos

históricos e construir suas ficções. Diante disso, buscar-se-á relacionar as duas narrativas, os

contextos sócio-históricos nelas retratados, que refletem a história de ditaduras, repressões e

violências vivenciados na América Latina e os recursos estilísticos empregados pelos autores,

principalmente a metaficção historiográfica, sob a perspectiva de Linda Hutcheon (1991). Estas

características revelam o caráter crítico, paradoxal e reflexivo evidenciado pelo pós-

modernismo, assim como refletem criticamente a história do contexto latino-americano a partir

de uma revisitação do passado por meio da literatura de Santiago e Piglia.

Palavras-chave: Historiografia; Pós-modernismo; América Latina; Metaficção

Historiográfica.

Abstract: This article aims to analyze, in a comparativist way, how the historiography and its

discourses are revisited and critically reinterpreted in the books Em liberdade (1981), by the

brazilian writer Silviano Santiago, and in Respiração Artificial, by the argentine writer Ricardo

Piglia (1980), from the characteristics of the literary period known as Postmodernism. Both

narratives portray important periods lived in Brazil and Argentina. This authors used several

discursive strategies considered as postmodern to deal with these historical facts and to

construct their fictions. In this way, this study will try to relate both narratives, in the socio-

historical contexts that reflect the history of military dictatorships, the repressions and the

violence that were experienced in the Latin America and the stylistic resources employed by

the authors, especially the historiographic metafiction, from the perspective of Linda Hutcheon

(1991). These characteristics reveal the critical, paradoxical and reflective character evidenced

by the postmodernism, also reflect in the critical way the history of the Latin American

contexto, revisiting the past through Santiago and Piglia literature.

Keywords: Historiography; Postmodernism; Latin America; Historiographic Metafiction.

Introdução

Este artigo objetiva analisar e relacionar duas obras contemporâneas: Respiração

artificial, do argentino Ricardo Piglia e Em liberdade, do brasileiro Silviano Santiago, visando

identificar como ambas remontam ao passado para criticá-lo, assim como, implicitamente,

criticam o tempo presente vivenciado pelos autores, que era a Ditadura Militar brasileira e a

argentina. As narrativas, apesar de pertencerem a contextos distintos, permitirão várias

reflexões, sobretudo pelas características pós-modernas que possuem, como a metaficção

historiográfica.

Para tanto, buscar-se-á realizar uma análise comparada das duas obras, verificando

como a historiografia e seus discursos são reinterpretados e discutidos, através de estratégias

discursivas que conferem um status crítico às narrativas, como a metaficção historiográfica,

sob a perspectiva de Linda Hutcheon (1991). Ademais, estes temas fundamentados no pós-

modernismo contribuirão para uma reanálise dos contextos de produção e recepção das obras,

que refletem os objetivos do período literário que pertencem, aberto a inúmeras interpretações

e/ou reinterpretações.

A América Latina refletida e reinterpretada no pós-modernismo de Piglia e Santiago

A história dos países latino-americanos é caracterizada por muitos processos violentos

e opressivos, como as ditaduras, que deixaram profundas cicatrizes sobre seus povos, sua

cultura, política, economia e, genericamente, sobre seu passado, registrado pela historiografia,

sociologia, economia, em documentos oficiais e até na literatura. No entanto, o advento do

período literário conhecido como Pós-modernismo, do qual os autores analisados neste artigo,

Silviano Santiago e Ricardo Piglia, fazem parte, está propiciando novas formas de (re)pensar

estes acontecimentos, ao criar ficções que abordam, de forma crítica e reflexiva, a própria

realidade e/ou história vivenciada, observada e/ou estudada pelos autores.

Portanto, o pós-moderno realiza dois movimentos simultâneos. Ele reinsere

os contextos históricos como sendo significantes, e até determinantes, mas,

ao fazê-lo, problematiza toda a noção de conhecimento histórico. Esse é mais

um dos paradoxos que caracterizam todos os atuais discursos pós-modernos.

E a conclusão que se tira é a de que não pode haver um conceito único,

essencializado e transcendente de “historicidade autêntica” [...].

(HUTCHEON, 1991, p. 122).

Nesse sentido, uma das característica desta estética é remontar ao passado para critica-

lo, para desconstruir e/ou revelar determinadas visões obscuras ou parciais que se tinham a

respeito de determinado acontecimento histórico. Para fazer isso, os autores pós-modernos

utilizam várias táticas discursivas em seus textos, como a metaficção historiográfica, a ser

analisada neste estudo, por ser uma característica evidente tanto Em liberdade, quanto em

Respiração Artificial. Linda Hutcheon, em Poética do Pós-modernismo: história, teoria, ficção

(1991), aborda esta poética, referindo-se principalmente, a metaficção historiográfica:

A metaficção historiográfica refuta os métodos naturais, ou de senso comum,

para distinguir entre o fato histórico e a ficção. Ela recusa a visão de que

apenas a história tem uma pretensão à verdade, por meio do questionamento

da base dessa pretensão na historiografia e por meio da afirmação de que tanto

a história como a ficção são discursos, construtos humanos, sistemas de

significação, é a partir dessa identidade que as duas obtêm sua principal

pretensão à verdade. (HUTCHEON, 1991, p. 127).

A obra Em liberdade, denominada pelo próprio autor, Silviano Santiago (1936-), como

uma “ficção”, foi publicada em 1981 e é uma espécie de diário do romancista brasileiro

Graciliano Ramos (1892-1953), famoso na história do romance regionalista da década de 30.

Neste diário de Ramos, Santiago remonta e recria, por meio da literatura e suas manifestações

linguísticas, o período após a saída da prisão do escritor alagoano, que foi preso pelo governo

de Getúlio Vargas em 1936, permanecendo na cadeia por quase um ano, sendo que nunca foi

comprovado nada com relação aos motivos da prisão do artista. Entretanto, indiretamente,

muitos acreditam que ele foi encarcerado por ser tido como comunista, indo contra a ideologia

pregada pelo governo autoritário de então.

O diário retrata a angústia vivenciada pelo escritor após sua soltura, que, ao contrário

do que se espera, não foi um período com sentimentos de liberdade, pois, mesmo livre, viviam

uma crise existencial consigo mesmo e com o restante da sociedade, sentia-se oprimido frente

a tudo e todos. Vivia no Rio de Janeiro, longe de sua terra natal e dos filhos, de favor na casa

de José Lins do Rego - um dos vários personagens escritores da narrativa -, sem condições

financeiras, sem sucesso e reconhecimento literário e/ou profissional.

Além disso, era obrigado a enfrentar diariamente a exigência insensível de várias

pessoas que desejavam uma obra sobre seu cárcere, denunciando o governo e sua truculência

e se afirmando como vítima, perante os acontecimentos fatídicos de sua vida. Entretanto,

Ramos critica e ironiza esse posicionamento das pessoas perante ele: “Aqui fora existem outras

e diferentes armadilhas [...]. Querem que eu aqui – em liberdade – volte para trás, volte para

detrás das grades; não querem deixar-me construir a minha vida em liberdade, sem as peias da

repressão militar e policial. Eis a armadilha.” (SANTIAGO, 2013, p. 65). Deste modo, o

romance de Santiago é a contrapartida ficcional, e não menos histórica, das Memórias do

cárcere (1953), testemunho controverso de seu tempo.

Não bastasse a complexidade dessas questões e do retrato que faz do governo de Getúlio

Vargas, Ramos, em seu diário – ficção criada por Santiago – remonta outro período histórico

brasileiro, o século XVIII, marcado pela Inconfidência Mineira, por meio do relato de um

sonho que teve sobre a morte de Cláudio Manuel da Costa, poeta do seu tempo e envolvido

com as causas da Inconfidência. No sonho é “revelado” que o inconfidente não se suicidou,

como prescrito nos documentos da história oficial do país, mas foi assassinado pelo governo

português. A partir deste sonho ou devaneio, o escritor-personagem decide escrever um conto

para revelar e/ou “denunciar” esse acontecimento. Portanto, Santiago remete diretamente a

duas épocas distintas, a Era Vargas e a Inconfidência Mineira, marcadas por autoridades

ditatoriais, violentas e opressivas no poder e sobre o país, o que acaba por refletir,

indiretamente, a própria época de produção e publicação da obra: a Ditadura Militar brasileira

(1964-1985).

De forma correlata, a obra argentina, Respiração artificial, de Ricardo Piglia (1941-

2017), caracterizada como um romance epistolar, foi publicada no contexto ditatorial do país,

em 1980, e retrata, mais especificamente, o ano de 1976, com épocas e personagens históricos.

O livro é dividido em duas partes, sendo que a primeira aborda o contato, por meio de cartas,

entre Emilio Renzi, provável alter ego de Ricardo Piglia, e seu tio, Marcelo Maggi, tido como

desaparecido pela família desde que, supostamente, roubou e fugiu com a herança de sua

esposa. Este contato inicia depois que Renzi publica um livro dedicado ao tio e este escreve

uma carta ao sobrinho para “Fazer as primeiras retificações, aulas práticas (dizia a carta).”

(PIGLIA, 2010, p. 13, grifo do autor).

Maggi era um historiador, vivia em uma cidade interiorana na Argentina e dedicava-se

a estudar a vida de Enrique Ossorio, bisavô de sua esposa, um intelectual do século XIX que,

na época, optou pela traição à causa política de Juan Manuel de Rosas, pelo exílio e pela busca

ao ouro, que deixou aos seus descendentes. É através das cartas de Maggi que Renzi conhece

a história desta figura, que representará e proporcionará uma nova visão ou reinterpretação, de

certa forma, à história da Argentina, questão chave do romance de Piglia.

Na segunda parte, Renzi vai ao encontro de Maggi, mas este desaparece em uma

misteriosa viagem. Todavia, encontra o polonês Tardewski e outros intelectuais, amigos de

Maggi e, enquanto esperam o improvável retorno do historiador, os personagens discorrem

sobre diversos temas importantes, como a literatura nacional e universal, filosofia, história,

arte, vida e dialogam sobre várias figuras históricas, como Borges, Joyce, Kafka, Hitler, entre

outros. Ao final da obra, Renzi descobre o motivo que o levou àquela visita e àquelas pessoas:

foi o escolhido para prosseguir com a construção da história de Enrique Ossorio. Por

conseguinte, da mesma forma que Em liberdade, esta obra problematiza alguns momentos e

aspectos históricos vivenciados pela Argentina, assim como, sem menção aparente, critica a

situação vivenciada pelo país na fase de produção e publicação do livro.

Nesse sentido, observa-se que as obras acima descritas, mesmo pertencentes a contextos

de representação, produção e recepção distintos, permitem um estudo comparado expressivo.

Isso é possível graças ao caráter comparativista deste trabalho, tendo em vista que:

O estudo comparado de literatura deixa de resumir-se em paralelismos

binários movidos somente por “um ar de parecença” entre os elementos, mas

compara com a finalidade de interpretar questões mais gerais das quais as

obras ou procedimentos literários são manifestações concretas. Daí a

necessidade de articular investigação comparativista com o social, o político,

o cultural, em suma, com a História num sentido abrangente. (CARVALHAL,

2006, p. 86).

Ademais, a América Latina, com sua heterogeneidade e, ao mesmo tempo, com suas

semelhanças que a particulariza perante outras culturas, é um contexto propício para o estudo

comparado, como o que se propõe neste estudo, com relação a história de dois países latino-

americanos, que representam, de certa modo, a história de vários outros espaços, povos, tempos

e culturas vivenciados pelo continente. Nas duas obras há um diálogo constante com o passado

e com a própria tradição, passado este que, seja através de personagens ou tempos históricos,

é revisitado e reinterpretado à luz do presente. Tanto em Piglia quanto em Santiago verifica-se

que o passado, a história e a tradição são percorridos e reinterpretados sob uma nova ótica,

mais atenta e crítica, para compreender novos processos históricos vivenciados no tempo

presente, ou seja, o passado modifica a interpretação que se tem do presente e o contrário

também se faz, e esse jogo entre passado, presente e futuro e entre história e ficção contribuirão

para a compreensão da formação identitária do Brasil e Argentina, assim como, da continente

latino-americano.

O crítico Altamir Botoso corrobora com essa visão ao afirmar que:

No pós-modernismo enfatiza-se o fato de que a história, realidade, gênero,

cultura, ciência são construídos por meio do discurso e a ficção nada mais faz

do que retomar esses discursos e reescrevê-los. A reescritura é um conceito

essencial para a pós-modernidade, que permite borrar as fronteiras entre

discurso histórico e ficcional, presente e passado, uma vez que propõe a

retomada, a reavaliação do passado à luz do presente. (BOTOSO, 2004, p.

111).

Desta forma, observa-se que o pós-modernismo e suas características, muitas delas

presentes nos livros de Piglia e Santiago, como a metaficção historiográfica, a reinterpretação

do passado, a relativização das verdades, a fragmentação e o anacronismo do tempo, do espaço

e do discurso, a presença de personagens escritores, entre outros, refletem e simbolizam vários

fatos sociais da história e da contemporaneidade latino-americana. A inserção diacrônica das

obras no espaço contemporâneo e sua filiação ao pós-modernismo remetam ao caráter de

abertura desses textos, para a possibilidade de inúmeras interpretações e do

multiperspectivismo da leitura, como “[...] uma espécie de esquema transcendental que nos

permite compreender novos aspectos do mundo.” (ECO, 1991, p. 158-159), mas exigem a

presença de um leitor ativo para desvendar os jogos discursivos propostos pelos dois autores

pós-modernos aqui em destaque.

O passado revisitado por meio da metaficção historiográfica

Indo além, complementando e dialogando com aquilo que o período literário anterior

pregava, o pós-modernismo, como uma vertente do contemporâneo, trabalha com as relações

duais, como as ideias de culto e popular; centro e periferia e passado e presente. Ademais,

discute, criticamente, o seu tempo, como um processo, em construção; a sociedade de consumo,

pós-guerras; as mazelas do contemporâneo; as relativizações de conceitos e verdades e contesta

o passado histórico, conhecido através de documentos/discursos passíveis de questionamento.

Tudo isso é feito pela linguagem, foco desta estética, pois “O vínculo entre texto e mundo é

remodelado no pós-modernismo não pelo desaparecimento do texto no interesse de um retorno

ao real, mas por uma intensificação da textualidade que a torna co-extensiva com o real.”

(CONNOR, 2012, p. 107).

O pós-modernismo encara o passado e a tradição como condições necessárias para a

compreensão do tempo presente e, por isso há a necessidade de remontar a história diacrônica.

Em Respiração artificial e Em liberdade os leitores logo percebem os recortes históricos feitos

pela ficção de seus escritores, tanto que as obras caracterizam-se como romances históricos,

entretanto, de modo distinto dos clássicos, estudados por Lukács na década de 30, em O

romance histórico.

Entre outros traços, o romance histórico reinventado para pós-modernos pode

misturar livremente os tempos, combinando ou entretecendo passado e

presente; exibir o autor dentro da própria narrativa; adotar figuras históricas

ilustres como personagens centrais, e não apenas secundárias; propor

situações contrafactuais; disseminar anacronismos; multiplicar finais

alternativos; traficar com apocalipses.” (ANDERSON, 2007, p. 217).

A metaficção historiográfica, foco deste estudo, dialoga e até se confunde, em alguns

casos, com as características do chamado novo romance histórico, e as obras de Piglia e

Santiago refletem isso, tendo em vista que nesta vertente:

[...] vertebran con mayor eficacia los grandes principios identitarios

americanos o se coagulan mejor las denuncias sobre las «versiones oficiales»

de la historiografia, ya que en la libertad que da la creaciôn se llenan vacios

y silencios o se pone en evidencia la falsedad de un discurso. (AÍNSA, 1994,

p. 27).

Em liberdade, Santiago remete ao tempo histórico de Graciliano Ramos e aos fatos que

realmente aconteceram vida do escritor, como se estivéssemos acompanhando o processo de

produção de um diário pelas mãos do próprio Graciliano. Em dado momento do diário, o

narrador-personagem remete ao tempo de Cláudio Manuel da Costa, relatando um sonho

perturbador que teve sobre o período da Inconfidência Mineira como se estivesse no lugar do

poeta. Mais que isso, escreve um conto, dentro do próprio diário, sobre o poeta árcade, o que

revela o caráter intertextual e metaficcional desta narrativa. Todavia, ao fazer isso, Santiago

evidencia um questionamento a própria veracidade dos discursos, tanto históricos quanto

ficcionais, considerando que “A interação do historiográfico com o metaficcional coloca

igualmente em evidência a rejeição das pretensões de representação “autêntica” e cópia

“inautêntica”, e o próprio sentido da originalidade artística é contestado com tanto vigor quanto

a transparência da referencialidade histórica.” (HUTCHEON, 1991, p. 146-147).

Esses passados revisitados possuem similaridades, são tempos de governos poderosos,

tidos como ditatoriais, que castigavam a duras penas aqueles que discordavam de seus planos

políticos e objetivos ideológicos, pois “Numa sociedade como a brasileira, qualquer

movimento mais audacioso da oposição tem de ser, irremediavelmente, secreto. Sobrepaira,

acima do segredo oposicionista, a verdade única e inquestionável, ditatorial, de um monarca,

de um presidente.” (SANTIAGO, 2013, p. 226-227). Isso é exemplificado pelos opressões

sofridas pelos próprios personagens - Ramos foi preso injustamente pelo governo de Vargas e

Costa, por ser um dos inconfidentes mineiros, foi preso e torturado pelo governo português, e,

como muitos acreditam e como o próprio Ramos - e/ou Santiago - denunciam, mesmo que sem

“documentos oficiais” que atestem isso, foi assassinado. Portanto, como o próprio Santiago

explica, como teórico e ensaísta, em Nas malhas da letra, desprende-se que “As ações do

homem não são diferentes em si de uma geração para outra, muda-se o modo de encará-las, de

olhá-las. O que está em jogo não é o surgimento de um novo tipo de ação, inteiramente original,

mas a maneira diferente de encarar.” (SANTIAGO, 2002, p. 54).

Além de desmistificar duas épocas importantes da historiografia brasileira, Santiago,

acaba, de ser forma, remetendo, implicitamente, à realidade extradiegética da obra, ao seu

tempo presente, que é o período da ditadura militar brasileira (1964-1985), marcada pela

ausência de democracia, pelo autoritarismo, pela censura, violência, repressão, entre outros

elementos negativos e corrosivos do seu tempo. No trecho abaixo, o narrador é Ramos, porém,

uma leitura atenta permite que se atribua partes da fala ao própria autor, como que referindo-

se ao que era vivido no período da ditadura, de forma similar ao que acontecia em governos

anteriores:

Eu mesmo fui vítima dessas forças ocultas. Fiquei quase um ano inteiro

preso; tenho os diversos membros de minha família dispersos pelos quatro

cantos; fui enviado como um saco de batatas para os lugares mais terríveis, e

no final descobrem que não existe ordem alguma de prisão contra a minha

pessoa, processo algum contra as minhas atividades. Existe apenas um

homem solitário na cadeia. Querem exemplo melhor da arbitrariedade e do

poder das forças ocultas? (SANTIAGO, 2013, p. 90, grifos nossos).

Santiago utiliza o recurso conhecido como pastiche, que consiste em inserir várias

vozes e/ou estilos no texto, sendo que um não se sobrepõe ao outro, ao dar voz a Ramos, com

todas as suas características pessoais e seu estilo de escrita e, do mesmo modo, ao poeta da

inconfidência, que fala no sonho de Ramos sobre a repressão que sofreu: “A Morte retira o

capuz. [...] Joga a capa para o lado: vejo que se veste como alta figura da administração

portuguesa. Com um pontapé atira a cadeira para o outro canto da cela. Com as duas mãos

fortes procura o meu pescoço (tinha já perdido as forças), asfixiando-me.” (SANTIAGO, 2013,

p. 217). Esse tipo de violência era praticado por todos os períodos históricos retratados,

portanto, a identificação dos personagens, proposta inteligentemente por Santiago, frente às

experiências que viveram, é inevitável, como o personagem alagoano atesta em seu diário: “[...]

na verdade o personagem era eu próprio, sendo (ou interpretando) Cláudio.” (SANTIAGO,

2013, p. 215). E não seria o próprio Santiago, sendo (ou interpretando) Ramos e Cláudio, para

criticar e denunciar, implicitamente, o momento que vivia?

Corroborando com essas afirmações, Santiago, enquanto ensaísta, apresenta o “narrador

pós-moderno” em oposição ao narrador clássico, definido por pensadores como Benjamin e

Leskov, e assim entende que o primeiro, o qual identifica-se nas narrativas de Piglia e Santiago:

“[...] olha o outro para leva-lo a falar (entrevista), já que ali não está para falar das ações de sua

experiência. Mas nenhuma escrita é inocente. [...] ao dar fala ao outro, acaba também por dar

fala a si, só que de maneira indireta. (SANTIAGO, 2002, p. 50). Dessarte, ao mesmo tempo

que Santiago fala da experiência alheia, termina por remeter, implicitamente, a sua própria

experiência, daí o diálogo estabelecido entre diferentes tempos, espaços e personagens que o

pós-modernismo permite.

No que tange ao romance argentino ora sob análise, Respiração artificial, a

metalinguagem e a metaficção historiográfica também estão presentes, pois Emilio Renzi

escreve um romance sobre seu tio, Marcelo Maggi, e para tanto se vale em grande medida da

troca de correspondências com seu parente, já que se encontram em lugares distintos da

Argentina. O tio, por sua vez, está estudando e também escrevendo sobre uma terceira pessoa,

Enrique Ossorio, secretário do presidente Juan Manuel Rosas, cuja persona política é

fundamental para a história argentina do século XIX. Enrique era avô do sogro de Maggi,

Luciano Ossorio, ex-senador da República. O processo de construção textual do historiador se

fundamenta em um sem número de papéis, cartas e documentos que o próprio Enrique Ossorio

deixou, uma vez que ele também queria escrever uma obra sobre si, como uma espécie de

testemunho de sua época, já que fora considerado um traidor político.

Há que se ressaltar o duplo papel da leitura no romance de Piglia: Renzi conhece a

história de Enrique Ossorio pelas cartas de Maggi, sendo que este conheceu a história de

Ossorio pelos documentos que este deixou, ou seja, há uma interposição e fragmentação de

personagens, tempos e acontecimentos, históricos e ficcionais, que torna a leitura da obra

labiríntica, um emaranhado de tempos, espaços e vozes, estratagema textual recorrente na

estética pós-moderna e na metaficção historiográfica, pois esta “[...] estabelece a ordem

totalizante, só para contestá-la, com sua provisoriedade, sua intertextualidade e, muitas vezes,

sua fragmentação radicais. (HUTCHEON, 1991, p. 155).

Sendo assim, Piglia utiliza a ficção para tratar do próprio fazer literário e a linguagem

para falar dela mesma, através de vários artifícios e jogos discursivos, como o pastiche, a

intertextualidade, o mise en abyme, a ironia, entre outros, como o faz também o autor brasileiro.

Respiração Artificial remonta diretamente ao tempo histórico de Enrique Ossorio, e o conflito

com o governo autoritário de Juan Manuel de Rosas, bem como insere a leitura no período do

Peronismo vivido por Maggi, ao passo que, indiretamente, abre uma outra passagem histórica,

situada no presente da escritura da obra, referente à Ditadura Militar argentina. Os personagens,

deste modo, ecoam diferentes tempos da história argentina e os canalizam de forma crítica

pelos vestígios da memória reconstruída fragmentariamente por seus textos. Essa miríade de

vasos comunicantes encontra ressonância no fragmento abaixo:

Finalmente gostaria de lhe dizer que nessas novas circunstâncias do país estou

um pouco desorientado com relação ao meu futuro imediato. [...] Estive

pensando que por enquanto o melhor será confiar o arquivo [...] a alguém de

minha inteira confiança. [...] Para mim trata-se antes de mais nada de

garantir que esses documentos se conservem, porque não só servirão [...]

para esclarecer o passado de nossa desventurada República como também

para entender algumas coisas que estão acontecendo nos tempos que

correm, não longe daqui. (PIGLIA, 2010, p. 60-61, grifos meus).

Da mesma forma que entende-se que Santiago se apropriou dos acontecimentos da vida

de Ramos e, consequentemente, de Cláudio Manuel da Costa, para representar ele mesmo,

verifica-se que, para ressaltar o momento que vivia, Piglia se identifica com o personagem

Emilio Renzi, que é um provável alter ego seu, sendo que seu nome completo é Ricardo Emilio

Piglia Renzi. Além disso, o personagem Maggi, de tanto estudar a respeito de Ossorio, se

identifica e até se confunde com ele: “[...] dedicado como está a remexer no mistério da vida

de outros homens (de outro homem: Enrique Ossorio), você terminou se parecendo com o

objeto investigado.” (PIGLIA, 2010, p. 23) ou ainda quando Maggi menciona: “Sofro dessa

desventura clássica: ter querido me apropriar daqueles documentos para decifrar neles a certeza

de uma vida e descobrir que são os documentos que se apoderaram de mim e me impuseram

seus ritmos e sua cronologia e sua verdade particular.” (PIGLIA, 2010, p. 23). Esse trecho

revela também como o texto, a escritura, fala por si só, ou seja, Maggi, mesmo sendo um

historiador, que de forma ideal só relataria fatos reais, tem consciência da impossibilidade de

fazer isso em alguns momentos, pois a história que conhecemos, retratada pela historiografia

ou pela ficção, é um produto, fruto da memória individual ou coletiva, de documentos passíveis

de questionamento.

Relacionando isso com Em liberdade, no trecho abaixo novamente fica claro a

identificação do personagem Ramos com o poeta da Inconfidência, sendo identificado o

discurso da alteridade, recorrente no pós-modernismo, em que o primeiro se coloca no lugar

do segundo. Outrossim, observa-se no início um discurso metaficcional sobre o fazer literário

e, em seguida, uma referência a própria história e seus discursos, que não permitem uma visão

plena e fidedigna sobre o passado e entende-se que a intenção do autor pós-moderno seria

representar como os regimes autoritários no Brasil e, genericamente, na América Latina,

permanecem, mesmo que com novas denominações e em períodos históricos distintos.

Tem que haver uma identificação minha com Cláudio, espécie de empatia,

que me possibilite escrever a sua vida como se fosse a minha, escrever a

minha vida como se fosse a sua. É um projeto perigoso, pois as pessoas dão

grande valor aos limites dos indivíduos. [...]

A verdade histórica [...] congela as partes fragmentadas na sua

particularidade, impossibilitando que se tenha uma compreensão global dos

acontecimentos. É esta a compreensão que busco, espero que a encontre.

Apresentar, numa cápsula da máquina do tempo, a permanência dos regimes

autoritários no Brasil. (SANTIAGO, 2013, p. 226, grifo do autor).

Na obra de Piglia há também uma referência similar, em uma carta de Enrique Ossorio

de 1850, em que ele se refere ao governo do seu período, de Juan Manuel de Rosas, mas acaba

remetendo ao futuro da Argentina, “prevendo” que o país não encontrará a liberdade tão cedo,

ou seja, há um diálogo entre períodos históricos - passado, presente e futuro - possível em

virtude da recorrência destes elementos trágicos sobre o país:

Vocês acham que a libertação da República está tão próxima, acham que a

queda de Rosas está tão ao alcance da mão, que se iludem com uma liberdade

que, não obstante, não chegará. [...] Antevejo: dissensões, divergências, novas

lutas. Interminavelmente. Assassinatos, massacres, guerras fratricidas.

(PIGLIA, 2010, p. 58).

Como observado, as obras de Piglia e Santiago são metaficções históricas, pois

dialogam com o passado e seus discursos, e, ao mesmo tempo, com o próprio fazer literário,

isso porque “Autoconscientemente, a metaficção historiográfica nos lembra que, embora os

acontecimentos tenham mesmo ocorrido no passado real empírico, nós denominamos e

constituímos esses acontecimentos como fatos históricos, por meio da seleção e do

posicionamento narrativo.” (HUTCHEON, 1991, p. 131). Por conseguinte, estes escritores

usam como pano de fundo os acontecimentos históricos, mas mantém o foco na linguagem e

em seus artifícios, tanto que o discurso e o fazer literário são assuntos debatidos em vários

momentos nos dois livros. No fragmento abaixo, Maggi discute sobre o gênero que mais foi

utilizado para a composição de Respiração artificial:

A correspondência, no fundo, é um gênero anacrônico, uma espécie de

herança tardia do século XVIII: os homens que viviam naquele tempo anda

confiavam na pura verdade das palavras escritas. E nós? Os tempos mudaram,

as palavras se perdem com facilidade cada vez maior, podemos vê-las flutuar

na água da história, afundar, aparecer outra vez, mescladas aos escolhos que

passam nas águas. Uma hora dessas achamos um jeito de nos encontrar.

(PIGLIA, 2010, p. 28).

Nesta passagem é possível várias interpretações, como um questionamento e uma ironia

com relação ao gênero utilizado para a construção da obra e para as próprias cartas trocadas

entre os personagens e as deixadas por Ossorio, em que discute-se sobre a sua veracidade,

principalmente em momentos ditatoriais, tendo em vista que a verdade, a história e seus

discursos são construtos e, por isso, devem ser questionados. Assim, “A resposta pós-moderna

ao moderno consiste em reconhecer que o passado, já́ que não pode ser destruído porque sua

destruição leva ao silêncio, deve ser revisitado: com ironia, de maneira não inocente. (ECO,

1985, p. 26).

Em outro excerto, a metalinguagem também é evidente, assim como a presença do

discurso indireto e indireto livre, marcante em toda a obra, que complica a leitura e a

identificação das vozes narrativas: “Não lhe escrevo, portanto, escrevia-me Maggi, para tentar

resgatar alguma coisa no meio dessa desolação; escrevo porque os anos sedimentaram minhas

lembranças como uma borra e o passado para mim se transformou num velho entrevado.”

(PIGLIA, 2010, p. 21). Além disso, o próprio personagem questiona a veracidade dos fatos que

estuda e narra sobre Ossorio, pois são frutos do passado, que ficaram na memória do

personagem, posteriormente, foram registrados pelo discurso, em documentos e cartas e,

novamente, estão sendo repassados e estudados. Enfim, a história e seus discursos são

construtos complexos, que revelam visões parciais, fragmentárias e instáveis sobre o passado

e a memória, que a literatura pós-moderna busca representar em obras, como as aqui estudadas.

Na ficção de Santiago, essa constatação metalinguística também é registrada em vários

momentos, como nesta passagem, em que o narrador tem consciência que o discurso é limitado,

nunca totalizante frente aos fatos da experiência: “Fiquei lamentando as limitações da palavra,

fosse a falada, fosse a escrita.” (SANTIAGO, 2013, p.53). Portanto, Santiago e Piglia jogam

com o leitor ao utilizarem gêneros caracterizados pela narração de fatos “reais”, como o diário

e a carta, e desconstruírem isso, por exemplo ao tornar a narrativa anacrônica ou ao debilitar a

autoridade do autor perante a obra, pois esta é aberta e gera significados na relação que

estabelece com o leitor e suas vivências, com o contexto de produção e recepção da obra, entre

outros.

Portanto, “O passado é apenas um lugar de reflexão que o homem presente pode

escolher (ou não) para melhor direcionar a sua posição no hoje e no amanhã.” (SANTIAGO,

2013, p. 89). Nesse sentido, Em liberdade e Respiração artificial apontam para várias visões e

até novas interpretações sobre o passado, que é revisitado criticamente na contemporaneidade

e, em muitos casos, relacionado com este período, daí o diálogo que o pós-modernismo busca

estabelecer entre história e ficção, entretanto, gerando “[...] resultados desestabilizadores, para

não dizer desconcertantes.” (HUTCHEON, 1991, p. 136), pois a literatura pós-moderna é um

processo de abrir as fronteiras do discurso.

Considerações finais

A análise das obras Respiração artificial e Em liberdade permitiu inúmeras reflexões

sobre a estética pós-moderna e seus desdobramentos, como a metaficção historiográfica,

identificada em ambas as narrativas. O estudo deste recurso permitiu uma diálogo entre

diferentes espaços, tempos, personagens, histórias, contextos e autores, o que é possível

também graças ao caráter comparativista deste artigo. Ademais, possibilitou que se

compreendesse e, ao mesmo tempo, problematizasse, o passado marcado por governos

autoritários do Brasil e da Argentina, que podem ser comparados a história de formação do

próprio continente que fazem parte – a América Latina e seus países - que em grande parte,

possuem trajetórias similares.

Dessa forma, as narrativas de Piglia e Santiago revisitam criticamente o passado de seus

países, por isso são caracterizadas como novo romance histórico. Todavia, fazem isso sem

deixar de lado as construções linguísticas recorrentes do pós-modernismo, que contribuem para

uma compreensão mais ampla das obras e para revelar seu caráter crítico e paradoxal. Aliás, a

recorrência nestes textos da fragmentação dos discursos, da polifonia, da metalinguagem e da

metaficção, da intertextualidade, do pastiche, do anacronismo, entre outros recursos, exigem

um leitor ativo, que interaja nos labirintos textuais, que questione a autenticidade dos fatos

narrados, dos documentos oficiais, das verdades tidas como absolutas, principalmente àquelas

oriundas de períodos que eram a favor do silenciamento dos povos e da censura frente a

qualquer ideia contrária a ideologia política de então. Por conseguinte, a literatura pós-moderna

busca formar ou contribuir para uma sociedade de pessoas e leitores pensantes, atuantes e

críticos frente ao passado e ao próprio presente.

Enfim, o pós-modernismo é um campo aberto, problematizador, nunca estanque,

reflexo do período contemporâneo, que é algo difícil de delimitar pelo seu caráter de

provisoriedade e instabilidade, por isso, “[...] volta a confrontar a natureza problemática do

passado como objeto de conhecimento para nós no presente” (HUTCHEON, 1991, p. 126),

sendo que essa confrontação é feita por meio da literatura. Nas duas obras analisadas,

marcadamente autoconscientes de seu caráter ficcional, a literatura contemporânea é mais uma

intérprete do passado da Argentina e do Brasil e se coloca ao lado dos demais discursos que se

entrecruzam, não raro conflituosamente, na busca por legitimar algum sentido para os ecos de

memória que assombram o homem em seu presente.

Referências:

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