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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014. ISBN: 978-85-7506-232-6 MAPEAMENTO DO USO DA TERRA NA COMUNIDADE TRADICIONAL DO VALE DO PATI/ PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DIAMANTINA – BA Vitor Costa Borges Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS GEONAT (Grupo de Pesquisas em Geografia e Natureza) – UEFS [email protected] Jocimara Souza Britto Lobão Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS GEONAT (Grupo de Pesquisas em Geografia e Natureza) – UEFS [email protected] INTRODUÇÃO No Brasil o histórico de criação de parques nacionais vem acompanhado por alguns conflitos de ordem socioambiental, devido à sobreposição de seus territórios aos territórios de comunidades locais, a criação destas unidades de conservação de proteção integral em áreas habitadas acabam mudando a dinâmica de uso e ocupação da terra e alterando a gestão de uso dos recursos naturais. Estas alterações acabam impactando diretamente as comunidades que estabeleceram ao longo do tempo um contato direto e tradicional com os recursos naturais existentes em suas áreas de uso e ocupação. Com a criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina a comunidade tradicional do Vale do Pati (Figura 1) começou a sofrer estas mudanças ligadas ao uso da terra, devido a essa sobreposição de territórios. A ocupação dos primeiros moradores do Vale Pati data de meados de 1844 quando foram descobertas as lavras diamantinas (FUNCH apud GUANEM, VIANA 2006, p. 24), quando a Chapada Diamantina vivia o apogeu dos ciclos do garimpo. A história socioambiental e econômica do vale sempre foi ligada intimamente à agricultura e ao uso dos recursos naturais disponíveis. Praticando desde sua criação a 5072

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MAPEAMENTO DO USO DA TERRA NACOMUNIDADE TRADICIONAL DO VALE DO PATI/

PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DIAMANTINA –BA

Vitor Costa Borges

Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS

GEONAT (Grupo de Pesquisas em Geografia e Natureza) – UEFS

[email protected]

Jocimara Souza Britto Lobão

Universidade Estadual de Feira de Santana – UEFS

GEONAT (Grupo de Pesquisas em Geografia e Natureza) – UEFS

[email protected]

INTRODUÇÃO

No Brasil o histórico de criação de parques nacionais vem acompanhado por

alguns conflitos de ordem socioambiental, devido à sobreposição de seus territórios aos

territórios de comunidades locais, a criação destas unidades de conservação de proteção

integral em áreas habitadas acabam mudando a dinâmica de uso e ocupação da terra e

alterando a gestão de uso dos recursos naturais. Estas alterações acabam impactando

diretamente as comunidades que estabeleceram ao longo do tempo um contato direto e

tradicional com os recursos naturais existentes em suas áreas de uso e ocupação.

Com a criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina a comunidade

tradicional do Vale do Pati (Figura 1) começou a sofrer estas mudanças ligadas ao uso da

terra, devido a essa sobreposição de territórios. A ocupação dos primeiros moradores do

Vale Pati data de meados de 1844 quando foram descobertas as lavras diamantinas (FUNCH

apud GUANEM, VIANA 2006, p. 24), quando a Chapada Diamantina vivia o apogeu dos ciclos

do garimpo. A história socioambiental e econômica do vale sempre foi ligada intimamente à

agricultura e ao uso dos recursos naturais disponíveis. Praticando desde sua criação a

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policultura, extrativismo vegetal, caça e em alguns momentos a monocultura do café

(CARDOSO, 2003).

As mudanças no planejamento territorial da Chapada Diamantina na Bahia,

voltadas ao fomento do turismo após a crise na exploração do diamante, culminou no

tombamento de Lençóis como monumento histórico nacional em 1973, e na criação do

parque nacional da Chapada Diamantina em 1985 através de decreto nacional (BRITO,

2005). A estratégia de criação desta unidade de conservação, visava a proteção ambiental e

o desenvolvimento econômico de seu entorno por meio da promoção do ecoturismo.

Figura 1 – Mapa de localização

Elaboração: BORGES, V., 2014.

Este estudo visou verificar qual a dinâmica e os limites desta comunidade em

relação ao uso da terra, através da produção de um mapeamento que pudesse ser utilizado

posteriormente pela comunidade, contribuindo como ferramenta de planejamento e gestão

deste território; visando facilitar a organização social e incentivar esta comunidade

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tradicional a conhecer e participar dos processos de planejamento e gestão do seu

território.

A evolução tecnológica dos Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) e das

ferramentas de geoprocessamento vem contribuindo fortemente para as análises espaciais

e ambientais destas áreas, fomentando o avanço tecno-ciêntifico e instrumentalizando o

planejamento e a gestão dos territórios.

O conjunto formado pelas tecnocnogias de aquisição de dados por meio de

sensoriamento remoto e do Sistema de Posicionamento Global (GPS), associados

às técnicas de processamentos digitais em imagens de satélites,

armazenamento, manipulação de dados e geração de novas informações por

meio de SIGs, fazem parte das técnicas de geoprocessamento. Eles

constituem-se, na atualidade em um poderoso ferramental para análises

espaciais e ambientais. (LOBÃO; SILVA, 2013, p. 73).

Com o aprimoramento deste sistema criou-se o Sistema Etnográfico de

Informações Geográficas (EtnoSIG), proporcionando assim uma importante ferramenta para

análise socioambiental, ampliando e gerando informações significativas para a resolução de

conflitos a partir de dados etnográficos e técnicos.

O arcabouço de ferramentas disponibilizadas pelos EtnoSIGs vem sendo

utilizado em diferentes regiões do mundo para a conciliação da preservação

cultural, mediação de conflitos, manejo e gestão dos recursos naturais e

desenvolvimento econômico em áreas habitadas por comunidades tradicionais

(ESRI/Intertribal GIS Council, 2001 apud PAESE; UEZU; LORINI; CUNHA, 2012,

p.108).

O mapeamento de uso da terra baseado em informações etnográficas é uma

das formas de utilizar e obter dados e informações sobre o contexto territorial, podendo

traduzir parte da realidade socioambiental do local estudado. Para o mapeamento é

necessário conhecer e entender os padrões de uso da terra e qual a sua dinâmica, conforme

o manual de uso da terra (IBGE, 2006, p.146):

As áreas sob utilização econômica são reconhecidas como padrões de Uso da

terra, entendidos como uma representação sintética de um conjunto de

atividades econômicas com expressão espacial que, de alguma forma, interagem

nesse espaço. Esses padrões deverão refletir a maior significância espacial de

um determinado tipo de uso, como também funcionamento das atividades

produtivas inseridas em determinado padrão ou associações de uso. O uso da

terra pode ser (...) interpretado como um conjunto de fatos ou fenômenos

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espaciais (escalas de semidetalhe e exploratórias), será de fundamental

importância a compreensão da organização e dinâmica dos processos políticos,

econômicos e sociais que atuam sobre uma área ou região, de modo a se

conhecer as tipologias de uso que podem ser nominadas e, consequentemente,

definir os padrões de uso.

A investigação destes padrões é de grande importância para a obtenção de

informações e para a compreensão do objeto de estudo, no caso dos parques nacionais em

conflito com comunidades locais também é importante avançar nas observações dos

padrões de uso com a obtenção e troca de informações no envolvimento direto com a

comunidade, através do EtnoSIG.

Neste caso estas informações podem auxiliar a priori nas atividades de

planejamento e zoneamento de parques nacionais, na indicação de pontos estratégicos e

emergenciais a serem investigados e trabalhados, e na tomada de decisões tanto pela

comunidade quanto pela gestão da unidade de conservação sobre a condição do uso dos

recursos naturais presentes (POOLE, 1999; MCCALL; MINANG, 2005; RAMBALDI et al., 2007;

KALIBO; MEDLEY, 2007 apud PAESE; UEZU; LORINI; CUNHA, 2012, p.93).

Para que o mapeamento e a obtenção dos dados sejam conduzidos de forma a

captar um número suficiente de informações sobre o uso da terra, é importante considerar

também as atividades que nem sempre estão relacionadas com a cobertura, e que só

poderão ser correlacionadas a partir de dados suplementares, como é o caso do turismo. Ao

retratar as formas e a dinâmica de ocupação da terra, esses estudos irão representar

também um instrumento valioso para a construção de indicadores ambientais e para a

avaliação da capacidade ambiental, diante dos diferentes manejos empregados na produção

agrícola, contribuindo assim para a identificação de meios alternativos para uma maior

sustentabilidade no uso da terra (IBGE, 2006).

Esta forma de mapear o uso da terra leva em consideração as informações de

sistemas sofisticados de processamento de dados e ao mesmo tempo integra relevantes

informações geradas a partir do conhecimento tradicional, tornando a análise mais rica e

detalhada devido a diversidade das fontes de informação. “Atualmente, não se concebe um

SIG apenas para sobreposição e/ou cruzamento de dados, mas, principalmente, como uma

poderosa ferramenta para análise e suporte para decisões.” (LOBÃO; SILVA, 2013, p.74). Este

processo pode tornar o conhecimento gerado mais próximo e acessível da comunidade,

facilitando o uso destas informações na tomada de decisões, no incentivo da organização e

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participação social nos processos de planejamento e gestão do território.

MATERIAIS E METODOLOGIA

Este trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da

Universidade Estadual de Feira de Santana. Obteve também, a permissão do Instituto Chico

Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), para a realização das atividades de

campo e coleta dentro da unidade de conservação.

Inicialmente, foi realizada a revisão da literatura, e uma pesquisa e análise

documental. A partir dos dados obtidos através da análise documental foi criado um quadro

com o histórico de desenvolvimento do uso da terra no vale do Pati. Paralelamente a isto

criou-se um EtnoSIG, contendo: i) quatro cenas RapdEye com resolução espacial de 5

metros, mosaicadas e gerreferenciadas, adquiridas em 29/09/2009; ii) modelo digital de

terreno - MDT onde gerou-se mapas de declividade, direção de fluxos, relevo sombreado,

mapa de aspecto e uma classificação altimétrica; iii) pontos georrefrenciados decritos e com

registro fotográfico de dois trabalhos de campo; iv) análise e digitalização de informações

oriundas de etnomapas; v) dados de entrevistas realizadas pelo Instituto Chico Mendes de

Conservação da Biodiversidade (ICMBio) em 2011, com membros da comunidade tradicional

do Vale do Pati.

Com o processamento destes dados foi elaborado o mapa de uso da terra no

vale do Pati, no qual, juntamente com os dados do quadro histórico possibilitou observar

parte da realidade e da dinâmica de uso da terra neste vale. A síntese dos procedimentos

metodológicos pode ser visualizada na (figura 2).

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Figura 2 – Fluxograma metodológico

Fonte: BORGES, V. C., 2014.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise documental realizada como subsídio a este trabalho contou com a

análise Leis, livros, Projeto que propõe a construção do termo de compromisso entre o

parque nacional e a comunidade, estudo da câmara dos Deputados e 17 etnomapas

realizados com a comunidade do Vale do Pati.

Por meio desta análise verificou-se que devido a fatores históricos e geográficos

a comunidade do Pati foi se moldando ao passar do tempo em função de ciclos econômicos

e das Políticas voltadas a Proteção da natureza e do reconhecimento de comunidades

tradicionais. Os (quadros 1 e 2) são uma síntese das principais mudanças socioambientais

com repercussões no Vale do Pati desde a sua ocupação socioeconômica até os dias atuais.

Ele foi dividido em três períodos sendo: 1- início e declínio da exploração de diamantes, 2-

Colapso da produção de diamantes e carbonados / Declínio econômico (Quadro 1), 3-

Planejamento e incentivo ao turismo e a conservação. Eles revelam fatores importantes do

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planejamento na região do Pati e seus impactos na dinâmica econômica, social e ambiental.

Quadro 1 – Histórico das principais mudanças socioambientais no vale do Pati e entorno.

Período1.801 até 1.900

Ocupação socioeconômica da Chapada Diamantina/início e declínio da exploração de Diamantes

Fonte:

100Anos

Início Séc.19

Processo de ocupação socioeconômica da ChapadaDiamantina

(SAMPAIO, 1938 apudBRITO, 2005, p. 83).

1844Foram encontradas jazidas de diamantes na serra do

Sincorá

(TEIXEIRA; LINSKER, 2005apud GANEM; VIANA,

2006 p. 13).

Meadosde 1844

Ocupação socioeconômica do Pati(FUNCH 2002 apud

GANEM; VIANA, 2006 p.24)

1847/1856 Criação dos povoados de Mucugê 47 / Lençóis 56 (BRITO, 2005, p. 83).

1870 Café é introduzido na chapada diamantina

(PEREIRA, 1907 e 1937;AGUIAR, 1889 apud

GUANEM, VIANA 2006 p.16)

1871Declínio da exploração do Diamante na Chapada

Diamantina(BRITO, 2005, p. 89).

1880Começo da exploração do Carbonado na Chapada

Diamantina

(SALES, 1975; MORAES,1991, apud BRITO, 2005,

p. 89).

1884/1890 Criação dos povoados de Anadaraí 84 / Palmeiras 90 (BRITO, 2005, p. 83).

Período1.901 até 1.973

Colapso da produção de diamantes e carbonados /Declínio econômico no vale Pati

Fonte:

73 Anos

Início Séc.20

Colapso da produção de diamantes e carbonadoscomeça a se verificar no início do século.

(SALES, 1975; MORAES,1991 apud BRITO, 2005,

p. 89).

Dec. 20 Início da exploração de Madeira em Andaraí (BRITO, 2005, p. 90).

Dec. 40

O café é a principal cultura comercial do Pati, secundadopelos cultivos de milho, banana, laranja, limão,

cana-de-açúcar e seus derivados. Abastecendo Lençóis,Mucugê e Andaraí.

(BRITO, 2005, p. 203).

Dec. 50 Declínio da exploração de Madeira em Andaraí (BRITO, 2005, p. 90).

Dec. 50/60

Decadência econômica do vale do Pati: enfraquecimentodo solo/ Programa Nacional de Erradicação do Café/

liberação de empréstimos através do Banco do Brasil/Grande número de mutuários não conseguem pagar e

vão a falência

(BRITO, 2005, p. 203).

(FUNCH, 2002; ZELLER,2002 apud GANEM;VIANA, 2006 p. 24).

Fonte: BORGES, V., 2014.

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O (Quadro 1) apresenta a ocupação socioeconômica e criação dos povoados na

Chapada Diamantina nas proximidades do Vale do Pati. Esta ocupação ocorreu a partir da

descoberta e mineração dos diamantes, período em que o Pati também foi ocupado

socioeconomicamente e inserida a agricultura. A atividade de mineração entrou em declínio

no início do século seguinte.

Após este período, nos anos 40, os moradores do vale do Pati baseavam

fortemente sua economia no cultivo do café, devido a tal, muitos moradores do vale

migraram nos anos 60 com a crise gerada por problemas ligados a esta atividade. A crise

econômica generalizada na região deu força a um novo movimento econômico e

socioambiental, com o planejamento do turismo e a conservação do patrimônio histórico e

ambiental, que gerou conflitos e mudanças territoriais significativas (Quadro 2). Este período

foi muito importante no contexto histórico e reflete fortemente até os dias atuais. Para a

análise do contexto atual é de extrema importância o olhar histórico e a compreensão sobre

as mudanças ambientais e sociais que ocorreram neste período.

Quadro 2 – Histórico das principais mudanças socioambientais no vale do Pati e entorno.

Período1973 até 2014

Planejamento e incentivo ao turismo e a conservação Fonte

41Anos

1973 Tombamento de Lençóis como Monumento Histórico Nacional (GANEM; VIANA,2006 p. 13)

1974 Governo Estadual realiza o primeiro inventário turístico da região,nas cidades de Lençóis, Andaraí e Mucugê, para promover a

interiorização do turismo na Bahia.

(BRITO, 2005, p.124).

Dec. 80 Governo do Estado promove a implantação do garimpomecanizado na Chapada Diamantina

(BRITO, 2005, p.133/134).

Dec. 80 Movimentos sociais ligados a defesa do meio ambiente (BRITO, 2005, p.129).

1985/Setembro

Parque Nacional da Chapada Diamantina é criado através deDecreto Federal

DECRETO N°91.655, de 17 de

setembro de1985.

1992 Ministério Público fecha os garimpos mecanizados próximos aAndaraí e Lençóis

(SENNA, 1996apud BRITO,

2005, p. 136).

1994-2000 PRODETUR (BA) – Programa de Desenvolvimento Tur´sitico daBahia, aumento do fomento ao turismo na Chapada Diamantina

(BRITO, 2005, p.150).

1996 Operação do Governo estadual e federal embargam a atividadede garimpo mecanizado

(BRITO, 2005, p.137).

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1997/ Julho Inauguração do Hotel Portal de Lençóis (BRITO, 2005, p.149).

1998/ Julho Construção do aeroporto de Lençóis (BRITO, 2005, p.149).

1998Janeiro -Agosto

Universidade Federal de Lavras através da Fundação de Apoio aoEnsino e Pesquisa realiza o levantamento fundiário para o IBAMA

na área demarcada como parque.

(BRITO, 2005, p.200).

1998/Setembro

Nova operação conjunta para interditar o secular garimpo deserra na área do Parque Nacional

(BRITO, 2005, p.138).

2000/Setembro

I Encontro de Populações Tradicionais do Parque Nacional daChapada Diamantina/ Documento ao Ministério Público e IBAMA

para permanência.

(ACVCD apudBRITO, 2005, p.

210).

2000/ Julho É criado o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). LEI N° 9.985 de18 de julho de

2000.

2001/Outubro

II Encontro de Populações Tradicionais do Parque Nacional daChapada Diamantina / objetivo de fortalecer as comunidades

tradicionais e suas associações.

(ACVCD apudBRITO, 2005, p.

210).

2002 - 2003 Reuniões da segunda etapa do PRODETUR - NE (BRITO, 2005, p.154).

2000/Junho

Formou-se o Núcleo Pró-Parque Nacional da ChapadaDiamantina

(BRITO, 2005, p.180).

Final2001

Criação do Conselho Consultivo do Parque Nacional –CONPARNA, pelo Ministro do Meio Ambiente

(BRITO, 2005, p.181).

2009 Publicação do plano de manejo do Parque Nacional da ChapadaDiamantina

(ICMBIO, 2014).

2011 Elaboração do projeto que prevê a construçaõ de um termo deCompromisso com a comunidade do Pati.

(ICMBIO, 2014).

Fonte: BORGES, V., 2014.

Com a crise econômica e migração de parte da comunidade do Vale do Pati e

entorno para outros lugares do País, a primeira mudança significativa na região, voltada ao

turismo e a conservação, foi o tombamento de Lençóis como Patrimônio Histórico Nacional

em 1973. Esta e outras ações em favor do turismo e da conservação continuaram até

culminar na criação do Parque Nacional da Chapada Diamantina, em 1985.

A criação do Parque Nacional foi um fator de grande influência para a promoção

do setor turístico na Chapada Diamantina, seu entorno foi sendo estruturado e recebeu

vários investimentos em conservação, infraestrutura e marketing voltados a recepção dos

turistas, aumentando também o fluxo turístico no Vale do Pati. Um dos objetivos previstos

na Lei No 9.985, de 18 de julho de 2000 é que os parques nacionais também deverão

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favorecer condições e promover o turismo ecológico.

A criação desta unidade de conservação de proteção integral, trouxe para a

comunidade do Pati a incerteza da permanência no vale e poderá trazer mudanças no uso

da terra, como a citada por Brito (2005 p.203) “A legislação que regulamenta os Parques

Nacionais, proíbe a presença de moradores no interior dessas unidades de conservação”. A

legislação também diz através da Lei No 9.985, de 18 de julho de 2000, que proteção integral

é a manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas por interferência humana,

admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais.

Por outro lado o DECRETO Nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007, que institui a

Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Define comunidade tradicional como:

Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se

reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que

ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua

reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando

conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição. (Art.

3º Inciso I).

Nesta lógica, podemos compreender, que mesmo ainda não havendo um

decreto de reconhecimento legal, a comunidade do Vale do Pati é tradicional pois: i)

possuem um histórico de ocupação de um território, ii) as práticas agrícolas são tradicionais

e específicas da comunidade; iii) a construção de suas moradias são adaptadas aos recursos

locais; iv) por seus cultos religiosos; v) por suas festas; vi) pelo uso e trato de animais como

meio de transporte; vii) o relatório do ICMBio reconhece as práticas e usos tradicionais do

território do Vale do Pati.

Visando melhor compreender o processo de ocupação e a configuração

territorial oriunda deste uso tradicional gerou-se o mapa de uso e ocupação do vale do Pati,

tendo por base o EtnoSig. Para a elaboração do mapa de uso e ocupação do Vale do Pati foi

necesário a elaboração de uma chave de interpretação (Figura 3), que indica o modo como

integramos e codificamos o conhecimento tradicional, as imagens de satélite e o modelo

digital de terreno (MDT). O quadro é composto por um padrão nas imagens de satélite, pelo

etnomapeamento com a descrição das classes pela comunidade. Compondo assim a

definição das classes.

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Figura 3. Chave de interpretação

Fonte: BORGES, V., 2014.

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A produção do mapa de uso da terra no Vale do Pati (Figura 4 e 5), foi baseado

em geotecnologias e no conhecimento tradicional da população residente em seu interior.

Este instrumento de produção do conhecimento é útil para trazer a tona o olhar desta

comunidade sobre o seu territorio e como este é utilizado, transformando o resultado deste

processo em um conhecimento sistematizado mais próximo da comunidade

A comunidade do Vale do Pati vem se transformando a partir de uma nova

configuração e gestão territorial a partir do turismo de base comunitária, resultando em

características socioambientais e econômicas que encontramos hoje e observamos através

do mapa de uso e ocupação da terra (Figura 4 e 5).

Figura 4 – Mapa de uso e ocupação da terra no Pati de cima

Elaboração: BORGES, V., 2014.

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Figura 5 – Mapa de uso e ocupação da terra no Pati de baixo ou Cachoeirão.

Elaboração: BORGES, V., 2014.

O mapa de uso identificou áreas utilizadas pelos moradores para agricultura de

subsistência, e possibilitou o cruzamento de dados das mesmas outras informações como

incidência de samambaias e localização das moradias e das trilhas, trouxe a lume dados

importantes para as ações de planejamento, gestão e manejo do território. Reuniu dados

técnicos e informações de participação social, produzindo assim uma visão mais ampla e

integrada do contexto socioambiental.

Verifica-se também que a maior área de uso localiza-se no Pati de cima (Figura

4), local onde encontrou-se a maior incidência de Samambaia-do-campo (Pteridium

aquilinum (L.) Kuhn) e samambaias (Dicranopteris flexuosa (Schrad.) Underw.). Espécie ruderal

que ocorre intensamente em antigas áreas de cultivo e pastagens abandonadas, sendo

considerada pelo ICMBio e pela comunidade local como um dos principais problemas

ambientais do Parque. Esta área é a porta de entrada para um grande número de turistas

que chegam de Guiné, Vale do Capão e Mucugê (Figura 1), logo, verificou-se a necessidade

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de um manejo mais ecológico das trilhas e das áreas de pastagens. A topografia é bastante

acidentada com altitudes que variam de 430 a cerca de 1550m, e declividades que chegam a

77º. Esse ambiente diverso, forma belíssimos cenários que são recobertos por uma Floresta

Estacional, mais densa nos talus dos morros e menos primitiva no fundo do vale, onde se

intercalam áreas de agricultura. Encontram-se também campos rupestres nos topos dos

morros intercaladas por uma porção de cerrado no colum entre os Morros Branco e Castelo

(Lapinha). A parte do Pati de baixo ou cachoeirão apresentou em relação ao Pati de cima,

menor área de uso e menor incidência de samambaias (Dicranopteris flexuosa (Schrad.)

Underw.).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo apresentou através do mapeamento o conflito de uso da terra no

Vale do Pati, com o histórico de ocupação e desenvolvimento tradicional da agricultura, a

comunidade do Pati, hoje, sente os impactos da legislação que regulamenta os Parques

Nacionais no Brasil. Ao mesmo tempo em que suas atividades ligadas ao uso direto dos

recursos naturais, estão ficando mais restritas, enxergam no turismo de base comunitária

uma alternativa para a sobrevivência e permanência no vale.

Desta forma, é recomendável o incentivo à permanência da comunidade

tradicional do Vale do Pati no local, aprofundamento e aperfeiçoamento dos estudos sobre

as práticas tradicionais sustentáveis, e o fomento da integração entre a comunidade e a

gestão do Parque Nacional, para o planejamento territorial. Esta recomendação, se colocada

em prática, beneficiará o Parque Nacional da Chapada Diamantina com uma possivel gestão

compartilhada, contribuindo para a proteção e manutenção de sua diversidade histórica,

cultural, e ambiental. Visto que o maior conhecimento histórico e tradicional sobre o Vale do

Pati é a comunidade que lá reside.

Com a não desterritorialização desta comunidade, e a integração da mesma nos

processos de planejamento e gestão do território, o parque nacional poderá aprofundar o

conhecimento de uso da terra de forma participativa e incentivar a comunidade às ações de

manejo ecológico podendo diminuir os impactos e danos causados pelo aumento do fluxo

de turistas.

O incentivo à permanência da comunidade do Vale do Pati, e o incentivo de

práticas de uso da terra tradicionais e sustentáveis, beneficiará esta comunidade com a

preservação e manutenção de sua cultura, e suas práticas produtivas tradicionais. Fazendo

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com que a análise histórica da crise nessa região seja colocada em prática, e esta

comunidade não se estruture apenas em uma atividade econômica, uma vez que o turismo

está se tornando a única fonte de renda desta população, atividade na qual a demanda está

relacionada fortemente a influência sazonal do fluxo de turistas e pelas crises econômicas,

podendo cessar ou diminuir por estes e vários outros fatores.

Para que se possa diminuir os conflitos socioambientais no Vale do Pati, é

necessário conhecer, reconhecer e dialogar sobre as especificidades referentes às questões

dos parques nacionais quanto das comunidades tradicionais, e aprofundar os estudos

relacionados a esta área do conhecimento, principalmente por ser um momento decisivo no

planejamento e gestão deste território com a formulação do termo de compromisso entre o

parque nacional e a comunidade do Vale do Pati.

REFERÊNCIAS

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MAPEAMENTO DO USO DA TERRA NA COMUNIDADE TRADICIONAL DO VALE DO PATI/ PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DIAMANTINA – BA

EIXO 6 – Representações cartográficas e geotecnologias nos estudos territoriais e ambientais

RESUMO

No Brasil a criação de Unidades de Conservação da Natureza são estratégias de controle do

território, pois estabelecem limites e dinâmicas de uso e ocupação. Os Parques Nacionais

Brasileiros são unidades de conservação de proteção integral, e muitas vezes sobrepõem seus

limites aos de territórios onde vivem comunidades tradicionais, tornando sua gestão mais

complexa. Comunidades tradicionais impactadas com este processo de criação de unidades de

conservação de uso integral, estão se transformando, em decorrência das novas políticas e

mudanças na gestão de seus territórios. Para que os parques nacionais existentes em

sobreposição aos territórios tradicionais possam diminuir os conflitos e os impactos sobre essas

comunidades, e conseguir planejar e gerir suas unidades, é necessário conhecer e reconhecer as

questões socioambientais dos mesmos. No interior do parque Nacional da Chapada Diamantina –

BA, encontra-se a comunidade tradicional do Vale do Pati. Este estudo visou verificar qual a

dinâmica desta comunidade em relação ao uso da terra, através da produção de um mapa de uso

da terra que pudesse ser utilizado posteriormente pela comunidade, como ferramenta de

planejamento e gestão deste território. Desta forma, com o intuito de contribuir para a organização

social e incentivar esta comunidade tradicional a participar dos processos de planejamento e

gestão territorial, elaborou-se um mapa de uso e cobertura do vale do Pati a partir do

conhecimento tradicional. Foi realizada uma análise documental sobre o histórico e os principais

aspectos de uso da terra no vale do Pati; utilizou-se imagens RapdEye e criou-se um Sistema

Etnográfico de Informações Geográficas (EtnoSIG) com dados oriundos de trabalhos de campo,

entrevistas com a comunidade e etnomapas gerados na comunidade cedidos pelo Instituto Chico

Mendes de Conservação da Biodiversidade com sede em Palmeiras. Nos resultados obtidos

verificou-se que a maior área ocupada com agricultura localiza-se no Pati de cima, local onde

encontrou-se a maior incidência de samambaias (Dicranopteris flexuosa (Schrad.) Underw.),

espécie ruderal que neste caso ocorre intensamente em antigas roças e pastagens abandonadas.

Nesta área verificou-se a necessidade de manejo mais ecológico das trilhas e áreas de pastagens,

principalmente por ser a nascente do rio Pati e a área com maior intensidade de atividades mais

recentes, como o fogo e roçados. A topografia é bastante acidentada em todo o perímetro

estudado, e com presença de Floresta Estacional intercalada com agricultura. O mapa identificou

as moradias com seus espaços de uso. Desta forma cruzou-se dados de uso com informações,

sobre o histórico de ocupação, turismo, dentre outras, trazendo a lume importantes informações

que podem subsidiar ações de planejamento, gestão. Desta forma, reunindo dados técnicos e

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http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6

informações de participação social, por meio do EtnoSIG, foi possível analisar o contexto

socioambiental da unidade de conservação de forma mais profunda.

Palavras-chave: mapa de uso; mapeamento participativo; comunidade tradicional.

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