manifestaÇÃo jurÍdica nº 31/14 de: assessora jurídica do...

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São Paulo, 28 de julho de 2014. MANIFESTAÇÃO JURÍDICA Nº 31/14 DE: Assessora Jurídica do CFESS PARA: CFESS ASSUNTO: Declaração de NULIDADE da Resolução CFESS nº 559 de 16 de setembro de 2009, que dispõe sobre a atuação do assistente social, inclusive, na qualidade de perito judicial ou assistente técnico, quando convocado a prestar depoimento/ SUSPENSÃO de seus efeitos – nacionalmente - por decisão do PODER JUDICIÁRIO/ Punições que tenham sido aplicadas, com base na Resolução CFESS nº 559/2009, ficam, também, anuladas. Cumpre informar que em 2012 o Estado do Rio Grande do Sul ajuizou Ação Civil Pública em face do Conselho Federal de Serviço Social e do CRESS da 10 a . Região, postulando a anulação da Resolução CFESS nº 559 de 16 de setembro de 2009 e eventuais penalidades que tenham, com base nela, sido impostas aos assistentes sociais. Sustentou o autor da ação, que a citada resolução estabelece que o assistente social, quando intimado a depor como testemunha, deverá comparecer e declarar que está obrigado a guardar sigilo profissional, sob pena de responsabilização profissional. O Estado do Rio Grande do Sul considera ilegal a citada resolução, que violaria, dentre outros, o direito difuso a tutela jurisdicional, já que estabelece proibição não prevista na lei processual, retirando do julgador a possibilidade de busca de verdade no processo civil e penal. Conforme sentença prolatada pela Juíza Federal da 3 a . Vara Federal da Seção Judiciária de Porto Alegre em 11 de abril de 2014, a resolução questionada ao vedar que o assistente social preste informações obtidas no exercício da profissão, quando ouvido como testemunha, perito ou assistente técnico, desbordou em muito do seu caráter meramente regulamentar criando vedação não estabelecida na lei processual civil ou penal. Argumenta que a Lei 8662/93, que dispõe sobre a profissão do assistente social, nada refere acerca da oponibilidade do segredo profissional em juízo, do que se conclui que os assistentes sociais não estão incluídos nas exceções trazidas pelos dispositivos processuais que regulamentam a matéria, de forma que não podem se eximir de informar ou depor sobre fatos que tenham tomado conhecimento no exercício da profissão. 1

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São Paulo, 28 de julho de 2014.

MANIFESTAÇÃO JURÍDICA Nº 31/14 DE: Assessora Jurídica do CFESS PARA: CFESS ASSUNTO: Declaração de NULIDADE da Resolução CFESS nº 559 de 16 de setembro de 2009, que dispõe sobre a atuação do assistente social, inclusive, na qualidade de perito judicial ou assistente técnico, quando convocado a prestar depoimento/ SUSPENSÃO de seus efeitos – nacionalmente - por decisão do PODER JUDICIÁRIO/ Punições que tenham sido aplicadas, com base na Resolução CFESS nº 559/2009, ficam, também, anuladas. Cumpre informar que em 2012 o Estado do Rio Grande do Sul ajuizou Ação Civil Pública em face do Conselho Federal de Serviço Social e do CRESS da 10a. Região, postulando a anulação da Resolução CFESS nº 559 de 16 de setembro de 2009 e eventuais penalidades que tenham, com base nela, sido impostas aos assistentes sociais. Sustentou o autor da ação, que a citada resolução estabelece que o assistente social, quando intimado a depor como testemunha, deverá comparecer e declarar que está obrigado a guardar sigilo profissional, sob pena de responsabilização profissional. O Estado do Rio Grande do Sul considera ilegal a citada resolução, que violaria, dentre outros, o direito difuso a tutela jurisdicional, já que estabelece proibição não prevista na lei processual, retirando do julgador a possibilidade de busca de verdade no processo civil e penal. Conforme sentença prolatada pela Juíza Federal da 3a. Vara Federal da Seção Judiciária de Porto Alegre em 11 de abril de 2014, a resolução questionada ao vedar que o assistente social preste informações obtidas no exercício da profissão, quando ouvido como testemunha, perito ou assistente técnico, desbordou em muito do seu caráter meramente regulamentar criando vedação não estabelecida na lei processual civil ou penal. Argumenta que a Lei 8662/93, que dispõe sobre a profissão do assistente social, nada refere acerca da oponibilidade do segredo profissional em juízo, do que se conclui que os assistentes sociais não estão incluídos nas exceções trazidas pelos dispositivos processuais que regulamentam a matéria, de forma que não podem se eximir de informar ou depor sobre fatos que tenham tomado conhecimento no exercício da profissão.

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A sentença determina a nulidade da Resolução CFESS nº 559/2009, decisão esta com abrangência nacional, uma vez que não se pode cogitar, segundo entendimento da Juíza Federal, que uma norma seja nula em um Estado da Federação e não seja nos demais. Quanto às punições que tenham sido aplicadas, com base na Resolução CFESS nº 559/2009, ficam, também, anuladas, em decorrência da nulidade da própria norma, cuja abrangência é restrita as punições deliberadas pelo CRESS da 10a. Região uma vez que é único integrado nesta lide. Entendo que tal decisão é incabível e absolutamente infundada, pois desconsidera o sigilo profissional do assistente social, previsto pelo Código de Ética profissional, bem como todos os diplomas legais que asseguram o sigilo ou segredo das informações, obtidas em decorrência do exercício profissional. Informo, ainda, que o CFESS está recorrendo da decisão, motivo pelo qual estou elaborando as razões de apelação, para ser protocolizada no Tribunal Regional Federal da 4a. Região. Submeto a presente manifestação jurídica ao conhecimento dos conselheiros/as do CFESS e opino, outrossim, que seja dado conhecimento - de seus termos - a toda categoria profissional, bem como seja divulgado pelos meios disponíveis.

Sylvia Helena Terra Assessora Jurídica CFESS

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CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL DA 17º REGIÃO/ES

Rua Pedro Palácio, n° 60, Edifício João XXIII, 11°andar, Salas 1103 - 1106, Cidade Alta, Vitória/ES, CEP: 29015-

160 - Telefone: 3222-0444 - E-mail: [email protected]

TERMO DE ORIENTAÇÃO

Assunto: Irregularidades quanto à circulação de documentos

elaborados por Assistentes Sociais em seus espaços sócio-

ocupacionais/ quebra do sigilo profissional/Código de

Ética/Constituição Federal.

Considerando ser atribuição dos Conselhos Regionais de Serviço Social - CRESS, dentre outras: orientar, disciplinar e Fiscalizar o exercício profissional do/a Assistente Social em âmbito estadual, em conformidade com o inciso II do artigo 10º da Lei 8.662/93; Considerando o Capitulo V, artigos 15 a 18, do Código de Ética Profissional do/a Assistente Social, que trata do sigilo profissional do/a Assistente Social no âmbito do exercício da profissão; Considerando, a recorrente apuração por parte da Comissão de Orientação e Fiscalização - COFI de irregularidades no que tange à circulação de documentos (relatórios, laudos, pareceres...) elaborados pelos/as Assistentes Sociais nos espaços sócio-ocupacionais, em especial nos órgãos vinculados às Secretarias municipais de Assistência Social; A COFI se serve do presente termo para prestar os devidos esclarecimentos aos/às Assistentes Sociais do Estado do Espírito Santo acerca da matéria ora tratada, a fim de contribuir com a atuação profissional consonante com os princípios éticos e constitucionais. Inicialmente, faz-se necessário abordar o texto da Constituição Federal de 1988, constante no Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, que aponta, em seu artigo 5º, incisos XIII e XIV que,

Art. 5º (...) XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional". (...) (BRASIL, 1988).

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Por força dessa disposição, pode-se entender que a proteção ao sigilo profissional tem sua aplicabilidade estendida a todas as categorias profissionais. Nesse contexto, o artigo 154 do Código Penal Brasileiro é claro ao prever o crime de violação do segredo profissional a todo aquele/a que "Revelar a alguém, sem justa causa, segredo, de quem tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem". Do mesmo modo, o Código de Ética do/a Assistente Social, regulamentado pela Resolução CFESS 273/2003, atualizada pela Resolução CFESS n.º 594/2011, versa que:

Art. 15 - Constitui direito do/a assistente social manter o sigilo profissional. Art. 16 - O sigilo protegerá o/a usuário/a em tudo aquilo de que o/a assistente social tome conhecimento, como decorrência do exercício da atividade profissional. Parágrafo Único: Em trabalho multidisciplinar só poderão ser prestadas informações dentro dos limites do estritamente necessário. Art. 17 - É vedado ao/à assistente social revelar sigilo profissional. Art. 18 - A quebra do sigilo só é admissível quando se tratarem de situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer prejuízo aos interesses do/a usuário/a, de terceiros/as e coletividade.

Neste debate não há que se perder de vista o conteúdo das Resoluções do CFESS nº 493/2006 que dispõe acerca das condições éticas e técnicas para o exercício profissional de Assistente Social e nº 556/2009 que dispõe sobre procedimentos para efeito de lacração do material técnico e material técnico-sigiloso do Serviço Social. Da análise das legislações acima citadas, pode-se depreender que o sigilo é, ao mesmo tempo, um dever e um direito do/a assistente social, visto que, para garanti-lo ao usuário, esse/a precisa ter asseguradas, pelo empregador, condições mínimas de trabalho, que perpassam tanto pela estrutura física dos espaços institucionais quanto pela autonomia dada aos/às profissionais para o desenvolvimento de suas atividades. Na perspectiva do dever, para que o usuário tenha sua privacidade resguardada em conformidade com o Código de Ética do Serviço Social, é imprescindível que os/as profissionais zelem pelo sigilo em todo o processo da prática profissional; ou seja, além da preservação da privacidade nos atendimentos e escutas, também na materialização dos mesmos por meio dos documentos elaborados, tais como: relatórios sociais, estudos e pareceres, muitas vezes encaminhados a outras instituições solicitantes, como exemplo recorrente, ao judiciário. Já na perspectiva do direito, Sylvia Terra, assessora Jurídica do Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, em seu Parecer Jurídico 06/2013, esclarece:

(...) eis que o sigilo também se configura como “direito”, até porque assegurar tal condição na atividade profissional realizada não depende somente do assistente social. Nesta dimensão do “direito”, consequentemente, o sigilo

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deverá ser respeitado por todos os outros que se relacionam com o assistente social na sua atividade profissional, seja qualquer superior hierárquico, empregador, o patrão, enfim, qualquer um que nas relações de poder possa ou pretenda interferir na atividade profissional do assistente social, ou impor regras de conduta incompatíveis com o sigilo profissional. (...) (CFESS, 2013, p.2).

Desse modo, é inconteste que os/as assistentes sociais informem aos seus superiores hierárquicos que documentos privativos elaborados por assistentes sociais devem ser, quando solicitados, encaminhados aos órgãos de destino sem risco de violação ou apropriação de informações sigilosas por terceiros. Para que tal procedimento seja aplicado, instituições empregadoras devem garantir que seus procedimentos de registro, protocolos de ofícios e documentos, incorporem à preservação do sigilo, reafirmando um preceito constitucional. Sendo assim, são necessários o estabelecimento e manutenção do diálogo entre profissionais e superiores hierárquicos, de modo a identificar a melhor forma de garantir a defesa dos princípios éticos profissionais. Não obstante, o/a assistente social deve independente da conduta de seu empregador, adotar cuidados ao registrar suas intervenções a fim de preservar, em todos os aspectos, os direitos dos usuários de seus serviços. Cabe ao assistente social, portanto, avaliar quais informações pode constar nos documentos que venham a ser disponibilizados a outros profissionais e/ou instituições, devendo registrar em documento à parte, do tipo relatório, as informações complementares, a fim de manter o histórico dos usuários e das situações acompanhadas. Por fim, alertamos que as dificuldades por ventura encontradas pelos/as Assistentes Sociais na tentativa de garantir as questões ora tratadas neste termo devem ser apresentadas formalmente ao CRESS, a fim de que sejam prestadas as devidas orientações e avaliadas, de forma individual, as possibilidades de intervenção política e jurídica.

Publicado em Agosto de 2013

Comissão de Orientação e Fiscalização – COFI Conselho Regional de Serviço Social – CRESS 17ª Região/ES

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O CFESS na defesa das condições de trabalho e do projeto ético-político profissional*

CFESS in defense of the working conditions and the ethical-political professional project

Silvana Mara de Morais dos Santos*

Resumo:.Este.texto.analisa.a.ação.política.do.CFESS.na.defesa.das.condições.de. trabalho.do(a). assistente. social. e.na.materialização.do.projeto.ético‑político.profissional neste.tempo de.crise.estrutural.do.ca‑pital,.momento.histórico.de.extrema.imposição.da.mercantilização.sob.todas.as.dimensões.da.vida.social.e.de.banalização.da.vida.humana.

Palavras‑chave:.Condições.de.trabalho..Projeto.profissional..Política.

Abstract:.This.paper.analyzes.CFESS’s.political.action.in.defense.of.the.social.worker’s.working.conditions.and.the.materializing.of.the.ethical‑political.professional.project.in.this.time.of.structural.

*.Este.artigo.agora.revisado.foi.originalmente.apresentado.na.forma.de.palestra:.“Condições.de.trabalho.e.a.materialização.do.projeto.ético‑político.profissional”.durante.o.XIII.CBAS.realizado.em.Brasília.no.pe‑ríodo.de.31.de.julho.a.5.de.agosto.de.2010..O.XIII.CBAS.teve.como.tema.geral.“Lutas.sociais.e.exercício.profissional.no.contexto.de.crise.do.capital:.mediações.e.consolidação.do.projeto.ético‑político.profissional”..A.palestra.foi.realizada.no.dia.4/8/2010.em.mesa.dividida.com.a.profa..dra..Marilda.Iamamoto.—.Uerj..Foi.um.grande.prazer.e.enorme.responsabilidade.dividir.esta.mesa.com.a.profa..Marilda,.que.é,.sem.dúvida,.uma.grande.referência.intelectual.da.categoria.profissional..Este.artigo.será.também.publicado.pelo.CFESS.numa.edição.especial.que.reunirá.as.palestras.proferidas.no.XIII.CBAS.

*.Doutora.em.Serviço.Social,.professora.do.Departamento.de.Serviço.Social.da.UFRN.—.Natal/RN,.Brasil;.coordenadora.do.Grupo.de.Estudos.e.Pesquisa.em.Trabalho,.Ética.e.Direitos.(Gepted).e.Coordenado‑ra.da.Comissão.de.Ética.e.Direitos.Humanos.do.CFESS.—.Gestão.2008‑11..E‑mail:[email protected].

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crisis.of.the.capital..This.is.a.historical.moment.of.extreme.imposition.of.commodification.in.all.di‑mensions.of.the.social.life.and.of.trivializing.of.the.human.life.

Keywords:.Working.conditions..Professional.project..Policy.

Este.artigo.tem.o.objetivo.de.socializar.aspectos.da.agenda.do.conjun‑to.CFESS‑Cress.e.notadamente.da.ação.política.do.CFESS.que.se.direcionam.para.a.defesa.das.condições.de.trabalho.e.materialização.do.projeto.ético‑político.profissional,.considerando.os.desafios.con‑

temporâneos.presentes.nas.condições.e.relações.de. trabalho,.no.contexto.de.defesa.dos.interesses.da.classe.trabalhadora.e.no.universo.de.um.projeto.pro‑fissional.que.se.articula.na.perspectiva.da.construção.de.um.projeto.societário.anticapitalista.

Refletir.sobre.o. tema.proposto.envolve.um.conjunto.de.determinações,.dimensões.e.situações,.postas.por.condições.objetivas.e.subjetivas.a.que.estamos.submetidos.e.os.diversificados.espaços.de.realização.do.exercício.profissional.do(a).assistente.social..Podemos.afirmar.que.é.um.tema.difícil.e.delicado..Di‑fícil. porque. sua. abordagem.exige. apreender. um.conjunto.de.determinações.sócio‑históricas.e.suas.implicações.na.vida.cotidiana..E.delicado.porque.refle‑tir.sobre.condições.de.trabalho.tem.profundas.implicações.nas.condições.de.vida,.de.como.os.indivíduos.se.movimentam.para.o.atendimento.de.suas.neces‑sidades.e.de.como.essas.condições.de.trabalho.promovem.ou.obstaculizam,.no.tempo.presente,.o.desenvolvimento.da.individualidade.e.a.formação.do.sujeito.profissional,.em.sua.expressão.individual.e.coletiva.

As.condições.e.relações.de.trabalho.só.podem.ser.analisadas.em.sua.den‑sidade.histórica.no.contexto.da.sociabilidade.capitalista.em.suas.particularidades..Isto. implica.apreender.o. sistema.do.capital. simultaneamente.como.modo.de.produção.e.processo.civilizatório.que.promove.e.desenvolve.formas.objetivas.e.ideológicas.subjacentes.ao.universo.burguês,.na.perspectiva.de.construir.um.tipo.de.individualidade.que.corresponde.à.dinâmica.societária.naquilo.que.ela.tem.de.avanço.e.no.que.tem.de.entrave.ao.pleno.desenvolvimento.humano..Este.modo.de.produção,.tendo.surgido.no.âmbito.da.sociedade.feudal,.vivenciou.uma.fase.de.transição.longa.e.contraditória.que.se.inicia.no.século.XIII.e.“apenas.com.a.Revolução.Industrial,.que.ocorreu,.na.segunda.metade.do.século.XVIII,.o.novo.modo.de.produção.capitalista.se.consolida.e.se.impõe.definitivamente”.(Mandel,.

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2001,.p..11)..Como.projeto.civilizatório,.implica.reconhecer.a.vigência.de.uma.nova.racionalidade,.referente.ao.horizonte.ideológico.burguês,.que.estrutura.as.relações.sociais,.atravessando,.progressivamente,. todas.as.dimensões.da.vida.social.e,.assim,.podemos.pensar.que.o.capitalismo

construiu.não.apenas.os.seus.aparelhos.materiais.de.produção.mas,.também,.e,.fundamentalmente,.as.suas.premissas.ideológico‑políticas..Fez.“terra.arrasada”.da.maneira.pela.qual.as.sociedades.anteriores,.e.cada.um.dos.seus.indivíduos,.compreendiam.a.vida,. a. história,. o.mundo..Destruiu. toda. a. institucionalidade.anterior..(Dias,.1997,.p..27)

Para.análise.do.tema.proposto.é.fundamental.partirmos.de.alguns.pressu‑postos.que.embora.fundamentais.para.o.entendimento.das.questões.que.envol‑vem.o.tema,.não.teremos.condições.de.desenvolvê‑los.neste.espaço..Quando.Marx.define.que.o.seu.objeto.de.estudo.é,.em.primeiro.lugar,.a.produção.mate‑rial.não.se.trata.de.contrapor.sociabilidade.à.individualidade,.nem.economia.à.política.e.ao.cotidiano,.mas.de.estabelecer.uma.perspectiva.de.totalidade.para.a.compreensão.das.formas,.das.determinações.e.dos.aspectos.da.produção.ma‑terial.da.vida.humana..Materialidade.abrange.as.determinações.econômicas,.políticas.e.culturais,.por.onde.se.estruturam.as.formas.ideológicas.e.o.conteúdo.“espiritual”.de.um.tempo.histórico..E.neste.processo.de.estruturação.da.socia‑bilidade.reconhecemos.o.trabalho.como.momento.fundante.da.vida.humana.que.torna.possível.a.constituição.do.ser.social.e.a.reprodução.da.vida.cotidiana.

O.sistema.do.capital.constitui.as.relações.sociais.fundadas.na.exploração.do.trabalho.e.na.reprodução.permanente.da.desigualdade.social..É.sempre.bom.lembrar.que.a.exploração.do.trabalho.e.as.iniciativas.para.dificultar.e.mesmo.obstaculizar.o.desenvolvimento.do.processo.de.consciência.e.de.construção.de.um.projeto.político.da.classe.trabalhadora.integra.a.dinâmica.e.a.lógica.da.so‑ciedade.capitalista.e.suas.estratégias.de.hegemonia,.não.sendo,.portanto,.uma.questão.contemporânea.ou.determinada.a.partir.da.década.de.1970.mediante.a.crise.estrutural.do.capital..Exploração.e.desigualdade.social.também.não.são.problemas/falhas/defeitos.que.possam.ser.ajustados.por.dentro.da.ordem.bur‑guesa,.pois.constituem.modos.de.ser.da.sociabilidade.sob.o.comando.e.direção.do.capital.

Na.conjuntura.atual,.todo.esse.processo.se.agrava..Desemprego,.inserção.precária.no.universo.do.traba.lho,.múltiplas.formas.de.violência.na.vida.cotidia‑na,.criminalização.dos.movimentos.sociais,.de.suas.lide.ranças,.criminalização.

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da.pobreza;.judicialização.da.questão.social.e.instituição.do.“Estado.penal”.dão.o.tom.do.cenário.contempo.râneo.por.onde.se.movimentam.os.sujeitos.profis‑sionais.nos.diferentes.espaços.sócio‑ocupacionais.

Tudo.o.que.acontece.na.vida.cotidiana,.por.um.conjunto.amplo.de.media‑ções,.é.determinado.pelas.condições.estruturais.da.sociedade.e.pela.ação.dos.sujeitos..E.é.exatamente.por.essa.razão.que.o.entendimento.das.condições.de.trabalho.dos(as).assistentes.sociais.exige.o.pleno.conhecimento.das.determina‑ções.e.implicações.da.crise.estrutural.do.sistema.do.capital.(Mészáros,.2002).e.das.iniciativas.de.resistência.da.classe.trabalhadora..Desde.a.década.de.1970.que.o.capital.desenvolve.estratégias.que.visam.o.enfrentamento.da.sua.própria.crise.e.restauração.da.sua.hegemonia.sem.ameaças.quanto.à.constituição.do.poder.político.da.classe.trabalhadora..Utiliza.variadas.ações.que,.ao.reestruturar.a.produção,.define.padrões.de.atuação.do.Estado.frente.à.questão.social,.mas,.também,.impregna.nas.relações.sociais,.valores.que.orientam.os.indivíduos.em.sua.conduta.pessoal.e.profissional..Trata‑se.da.formação.e.disseminação.de.um.ethos,.sempre.atualizado.conforme.as.necessidades.do.capital..É.neste.sentido.que.refletir.sobre.condições.de.trabalho.implica.apreender.como.se.efetivam.essas.determinações.do.capital.na.vida.social.e.particularmente.na.classe.traba‑lhadora.e.no.universo.do.Serviço.Social.

As.condições.objetivas.e.subjetivas.impostas.pelo.capital.à.classe.traba‑lhadora. e. à. vida. social,. longe. de. se. constituir. referências. secundárias. ou.servir.de.cenário.para.a.vida.cotidiana,.são,.na.verdade,.determinações.que.tecem.modos.de.ser.e.viver..No.entanto,.é.fundamental.lembrar.que.esse.é.um.movimento.contraditório,.aberto.à.luta.de.classes,.permeável.à.ação.das.forças.organizadas.do.trabalho,.à.atuação.e.reflexão.crítica.dos.sujeitos.individuais.e.coletivos,.que.também.fazem.a.história,.ainda.que.em.condições.bastante.adversas.

Esses.são.pressupostos.sobre.os.quais.nos.apoiamos.para.pensar.as.con‑dições.de.trabalho.de.assistentes.sociais.e.as.possibilidades.de.materialização.do.projeto.ético‑político.profissional.no.capitalismo.contemporâneo..E.é.nesse.tempo.sócio‑histórico.que.entender.as.condições.e.relações.de.trabalho.viven‑ciadas.pela.classe.trabalhadora.e.em.particular.por.assistentes.sociais,.na.con‑dição. de. trabalhador(a). assalariado(a),. coloca. exigências. que. passam.pela.apreensão.de.um.conjunto.de.mediações.para.localizar.a.intensidade.e.as.mo‑dalidades.de.mudanças.impostas.pelo.capital.e.que.incidem.nas.relações.entre.Estado‑sociedade.e.notadamente.no.novo.papel.que.o.Estado.assume.nas.res‑

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postas.às.expressões.da.questão.social;.na.forma.de.lidar.com.as.necessidades,.reivindicações.e.lutas.do.trabalho.e.nas.exigências.e.demandas.postas.ao.Ser‑viço.Social..Essas.questões.têm.sido.analisadas.num.movimento.teórico.denso,.posto.que.numa.perspectiva.de.totalidade,.são.objetos.de.estudo.e.reflexões.na.produção.bibliográfica.da.profissão.nos.últimos.trinta.anos.

Todo.esse.processo.de.mudanças.determinado.por.movimentos.objetivos.do.capitalismo.contemporâneo.que.incide.no.Serviço.Social.chega.ao.conjunto.CFESS‑Cress.de.diferentes.e.combinadas.formas..A.articulação.dessas.moda‑lidades.de.apreensão.do.exercício.profissional.evidenciam.o.aprimoramento.da.comunicação.e.da.relação.política.entre.o.conjunto.CFESS‑Cress.e.a.categoria.profissional..Tais.mudanças.advêm.de.profissionais.que.buscam.essas.entidades.e.socializam.o.universo.de.novas.exigências.e.demandas.postas.no.seu.trabalho..São.profissionais.que.nomeiam.entraves.e.limites.institucionais.que.revelam,.simultaneamente,.o.modo.de.agir.do.Estado.nas. respostas. às. expressões.da.questão.social,.por.meio.de.políticas.sociais.com.ênfase.na.focalização.e.em.situações.específicas.de.vivência.da.pobreza.e.o.modo.como.os.indivíduos.são.tratados.pelo.sistema.do.capital,.diante.das.respostas.às.suas.necessidades.e.projetos.de.vida..Praticamente.nas.diferentes.áreas.de.atuação.profissional,.as.narrativas.trazidas.por.assistentes.sociais.ao.conjunto.CFESS‑Cress.informam.e,.por.vezes,.problematizam.o.processo.intenso.de.banalização.da.vida,.expres‑sos.em.múltiplas.formas.de.violência.e.de.violação.dos.direitos.vivenciadas.pelos.indivíduos,.usuários.do.Serviço.Social.

Necessidades.reais.da.vida.cotidiana.dos.usuários.são.respondidas.com.estratégias.que.combinam.intensificação.na.responsabilidade.individual.e.fa‑miliar.com.políticas.e.programas.sociais.que.asseguram,.em.condições.raras.de.bom.funcionamento,.acesso.ao.mínimo,.algo.que.seja.capaz.tão.somente.de.tornar.a.vida.física.ainda.possível..São.inúmeras.situações.graves,.com.deter‑minações.econômica,.política.e.cultural.próprias.das.particularidades.de.um.país.de.capitalismo.periférico,.com.cultura.política.autoritária.e.processos.de.democratização.inconclusos,.que.são.respondidas.com.“políticas.de.incentivo”..Incentivo.à.solidariedade. individual.e.comunitária;. incentivo.à.“mágica”.do.empreendedorismo,.da.economia.solidária,.do.“emponderamento”.e.da.autoes‑tima..Na. contramão.do. atendimento. às. necessidades. humanas. por.meio. de.políticas.sociais.de.caráter.universal.e.reconhecedoras.da.diversidade,.avançam.e.se.consolidam.políticas.de.privatização.e.mercantilização.da.educação,.da.seguridade.social.e.do.meio.ambiente..Tudo.isto.sendo.realizado.com.a.presen‑

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ça.explícita.do.Estado,.que.assegura.legitimidade.política.e.caminhos.institu‑cionais.à.busca.sem.limites.do.capital.para.recompor.e.promover.sua.capacida‑de. de. expansão. e. dominação. ideológicAs. condições. e. relações. de. trabalho.dos(as).assistentes.sociais. também.chegam.ao.conjunto.CFESS‑Cress.como.resultado.da.efetivação.da.política.nacional.de.fiscalização.(PNF)1.do.conjunto.que.possibilita.apreender.perfil,.demandas.e.respostas.profissionais.vistas.em.seus.processos,.possibilidades,.dinâmicas,.tensões.e.limites.vividos.no.cotidia‑no..A.PNF.se.estrutura.na.dimensão.afirmativa.de.princípios.e.compromissos.conquistados.na.trajetória.do.Serviço.Social;.na.dimensão.político‑pedagógica.e.na.dimensão.normativo‑disciplinadora..Estas.três.dimensões.da.PNF.se.en‑contram.organicamente.vinculadas.e.orientam.os.conselhos.regionais.em.sua.execução..Revelam,.também,.o.processo.de.amadurecimento.teórico‑ético‑po‑lítico.e.normativo.do.conjunto.CFESS‑Cress.que.aprimorou.os.instrumentos.para.a.fiscalização.do.exercício.profissional,.superando.concepções.e.práticas.de.fiscalização.fundadas.em.valores.corporativos.e.voltadas.para.o.desenvolvi‑mento.de.ações.de.controle.meramente.burocrático.e.punitivo.sobre.os.profis‑sionais..Podemos.afirmar.que.a.PNF.possibilita.apreender.as.inúmeras.dificul‑dades,. contradições. e. os. desafios. postos. à. materialização. do. projeto.ético‑político.profissional.

Outro.momento.de.extrema.relevância.que.favoreceu.a.socialização.e.as.reflexões.sobre.as.condições.de.trabalho.dos.assistentes.sociais.foram.os.semi‑nários. realizados. de. forma. gratuita,. com. transmissão. via. internet,. pelo.CFESS‑Cress..Entre.2009.e.2010.foram.realizados.quatro.seminários.que.ver‑saram.sobre.o.trabalho.profissional.na.Saúde,.na.Assistência.Social,.na.Previ‑dência.e.no.campo.sociojurídico..Foram.momentos.demasiadamente.ricos.de.debate.em.que.o.exercício.profissional.esteve.no.centro.da.reflexão..Além.dis‑so,.mesmo.com.particularidades.oriundas.da.natureza.de.suas.intervenções,.os.conselhos.regionais,.o.CFESS,.a.Abepss.e.a.Enesso.se.empenham.teórica.e.politicamente.para.apreender.o.Serviço.Social.na.história,.com.interlocuções.com.o.que.de.melhor.a.área.conseguiu.produzir.para.entender.a.realidade.con‑temporânea.e.a.profissão.na.perspectiva.do.pensamento.crítico.

1..A.política.nacional.de.fiscalização.(PNF).do.exercício.profissional.do.assistente.social.foi.aprovada.no.XXV.Encontro.Nacional.CFESS‑Cress.em.1996,.foi.revisada.a.partir.de.contribuições.dos.Cress.e.do.CFESS.e.aprovada.em.plenária.nacional.CFESS‑Cress,.de.caráter.deliberativo,.realizada.em.Brasília.(DF).em.2007.

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Considerando.que.são.muitas.e.complexas.as.questões.que.objetivam.o.universo.das.condições.e.relações.de.trabalho,.sintetizarei.alguns.aspectos.que.se.manifestaram.de.forma.recorrente.em.todas.as.áreas.de.atuação.do(a).assis‑tente.social,.obviamente.com.maior.ou.menor.incidência.e.intensidade.em.uma.ou.outra.área:

. 1.. O.Estado.efetiva.seu.papel.político.para.atender.prioritariamente.os.interesses.do.capital.em.detrimento.do.atendimento.às.necessidades.humanas,.impondo.alterações.profundas.no.modo.de.ser.das.políticas.sociais.e.das.instituições.que.as.realizam.no.que.se.refere.aos.objeti‑vos.e.critérios.de.acesso.institucionais.que.passam.a.operar.cada.vez.menos.na.perspectiva.dos.direitos.e.mais.na.lógica.do.mercado.com.sua.ânsia.de.eficácia.e.produtividade.

. 2.. Verifica‑se.perda.crescente.de.condições.de.infraestrutura.para.a.rea‑lização.do. trabalho,.que. seguindo.variações.e.particularidades.nos.diferentes.espaços.sócio‑ocupacionais.revelam.falta.de.equipamentos.de.toda.ordem,.de.material.de.informática;.meios.de.transporte.para.realização.de.atividades.que.requerem.deslocamento.dos.profissionais,.falta.de.material.de.consumo.e.ênfase.em.espaços.inadequados.para.o.atendimento.profissional,.visto.que.possuem.escassa. iluminação,.ventilação.e.segurança..Há.indicações,.também,.referentes.à.falta.de.arquivos.disponíveis.para.guarda.de.material.técnico.de.caráter.reser‑vado,.de.uso.e.acesso.restrito.por.assistentes.sociais.e.ausência.de.espaço.físico.com.possibilidades.para.reuniões.e.estudos,.de.caráter.individual.e.em.equipe.

. 3.. A.falta.de.condição.de.infraestrutura.nos.espaços.institucionais.faz.com.que.não.haja.como.garantir.a.privacidade.dos.usuários.naquilo.que.for.revelado.durante.a.intervenção.profissional.e.que.o.assistente.social.não.tenha.assegurado.as.condições.para.manter.o.sigilo.profis‑sional..Isto.se.agrava.em.situações.em.que.usuários.tiveram.seus.di‑reitos.violados.e.buscam.o.Serviço.Social.na.perspectiva.de.recompor.esses.direitos..Por.exemplo,.quando.crianças.e.adolescentes. foram.vítimas.de.abuso.e/ou.exploração.sexual,.a.falta.de.condições.de.tra‑balho,.notadamente.a.ausência.de.espaço.com.recursos.para.garantir.o.sigilo.profissional,.gera.uma.situação.em.que.em.vez.de.proteção.institucional,.usuários.são.submetidos.à.exposição,.vivenciando.outra.violação.de.direito.no.momento.do.atendimento.

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Este.aspecto.tem.profundas.implicações.éticas,.pois.a.ausência.de.condições.objetivas.para.assegurar.o.sigilo.profissional.leva.o.profissional.a.não.cumprir.o.que.consta.no.Código.de.Ética.em.seu.artigo.2º,.inciso.d.que.trata.da.“invio‑labilidade.do.local.de.trabalho.e.respectivos.arquivos.e.documentação,.garan‑tindo.o.sigilo.profissional”.e.o.que.consta.na.Resolução.CFESS.n..493/2006,2.que.em.seu.artigo.3º.afirma.que.“o.atendimento.efetuado.pelo.assistente.social.deve.ser.feito.com.portas.fechadas,.de.forma.a.garantir.o.sigilo”..Esta.resolução.é.uma.estratégia.do.CFESS.em.defesa.das.condições.de.trabalho.do(a).assis‑tente.social.

. 4.. Temos.que.considerar.também.que.em.algumas.instituições.em.que.há.sistemas.sofisticados.de.informatização,.os.recursos.existentes.são.destinados.ao.controle.excessivo.do.trabalho.e.dos.indivíduos,.e.não.para.facilitar.dinâmicas.e.processos.de.atendimento.às.reais.necessi‑dades. dos. usuários..A. tecnologia. se. destina.mais. para. disciplinar,.unificar.e.burocratizar.procedimentos,.por.meio.de.uma.super.racio‑nalidade.burocrática.

Em. todas. as. áreas. de. inserção.profissional. prevalece. esse. processo.de.deterioração.das.condições.de.trabalho,.que.só.podem.ser.analisadas.em.suas.particularidades.na.medida.em.que.são.realizados.estudos.e.pesquisas.sobre.o.trabalho.profissional..Como.ilustração.dessa.difícil.realidade,.destaco.pesquisa.recente3.sobre.as.condições.de.trabalho.de.assistentes.sociais.inseridos.nos.Cras.em.municípios.do.estado.do.Rio.Grande.do.Norte..Tal.pesquisa.apresenta.vários.dados,.que.ao.mesmo.tempo.em.que.mostram.a.expansão.do.trabalho.de.assis‑tentes.sociais,.notadamente.no.âmbito.da.política.de.assistência.social,.adensa.reflexões.que.possibilitam.apreender.de.modo.mais.concreto.que.isto.acontece.sob.condições.de.inserção.precária..Alguns.dados.desta.pesquisa.para.ilustrar.este.processo:.foram.entrevistadas.89.assistentes.sociais..Desse.universo,.69,66%.estão.inseridas.nos.Cras.entre.menos.de.um.a.cinco.anos..Quanto.à.forma.de.acesso.no.Cras:.54,55%.receberam.convite;.25%.por.processo.seletivo.e.20,45%.

2..Resolução.CFESS.n..493/2006.“dispõe.sobre.as.condições.éticas.e.técnicas.do.exercício.profissional.do.assistente.social”.

3..Pesquisa.realizada.na.tese.de.doutorado.de.Mara.Jales.intitulada.A interiorização e a expansão dos espaços sócio‑ocupacionais do Serviço Social no RN (2004‑2008): um estudo das competências profissionais,.do.Programa.de.Pós‑graduação.da.UFPE,.sob.a.orientação,.da.profa..Ana.Elizabete.Mota.

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por.indicação,.evidenciando,.desse.modo,.o.quanto.a.luta/campanha.pela.rea‑lização.de.concurso.público,.lançado.pelo.conjunto.CFESS‑Cress,.é.fundamen‑tal..Os.dados.sobre.a.origem.das.indicações.ou.convites.para.atuar.nos.Cras.revelam.as.complexas.e.históricas.relações.da.formação.sócio‑histórica.do.país.e.da.Região.Nordeste,.no.que.se.refere.à.instituição.e.reprodução.de.uma.cul‑tura.política.da.tutela,.do.autoritarismo.e.de.privatização.do.espaço.público..Para.53,57%.a.indicação.foi.realizada.pelo.prefeito;.35,71%,.pela.Secretaria.de.Assistência.Social;.7,14%,.pelo.afiliado.político.partidário,.e.3,57%.por.vere‑ador..Do.total.32,53%.têm.dois.vínculos.de.trabalho.e.82,14%.possuem.mais.de.um.vínculo.de.trabalho..Lembra.a.autora.que.é.necessário.considerar.como.agravante.das.condições.e.relações.de.trabalho.a.reprodução.da.cultura.política.autoritária.que.prevalece.nos.municípios.

Acrescente‑se.a.todos.os.aspectos.já.assinalados.as.implicações.que.essas.condições.e.relações.de.trabalho.têm.na.subjetividade.dos.indivíduos..Sobre.a.dimensão.subjetiva,.poderíamos.refletir.várias.questões,.mas.elejo.apenas.uma.que.me.parece.comum.a.todas.as.áreas.de.atuação..Trata‑se.dos.processos.de.adoecimento.dos.trabalhadores.e.trabalhadoras,.em.particular.dos(as).assisten‑tes.sociais,.que.são.gerados.a.partir.da.inserção.no.trabalho.em.tempo.de.mun‑dialização.do.capital..Problemas.variados.de.coluna,.gastrites,.úlceras,.depres‑sões.e.síndromes.as.mais.diversas.são.reveladoras.de.indivíduos.vivendo.em.situações.agudas.de.competitividade,.burocratismo.e.violação.de.direitos..Ain‑da.são.invadidos.por.demandas.do.trabalho.a.todo.instante.por.meio.eletrônico,.que.permite.que.com.um.simples.acesso.ao.e‑mail.o.indivíduo.comece.a.res‑ponder.às.demandas.de.trabalho.

São.processos.de.adoecimentos.que.nos.colocam.diante.de.situações.de.medo,.pânico,.desesperança.quanto.à.possibilidade.do.futuro..Profissionais.que.são.contratados.por.projetos.com.validade.de.um.ano.falam.que.conseguem.levar.uma.vida.“normal”.durante.os.seis.primeiros.meses.porém,.nos.seis.meses.seguintes.têm.a.nítida.sensação.que.vivem.um.tempo.ausente,.pois.não.conse‑guem.viver.o.presente,.angustiados.que.estão.com.a.proximidade.do.desempre‑go.e.nem.conseguem.se.lançar.na.busca.por.novas.possibilidades.profissionais..Viver.no.tempo.presente.de.forma.ausente.é. talvez.a.forma.mais. intensa.de.retirar.de.mulheres.e.homens.a.capacidade.e.a.possibilidade.de.elaborar.o.futu‑ro.em.novas.bases.

Em.síntese,.podemos.afirmar.que.assistentes.sociais.vivenciam.em.todos.os.espaços.sócio‑ocupacionais.as.tendências.de.precarização.e.exploração.do.

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trabalho..Com.isto.não.temos.dúvidas.em.afirmar.que.as.tendências.mais.gerais.do.mercado.de.trabalho.—.flexibilização/desregulamentação/desterritorialização.—,.que.tanto.produzem.instabilidade.e.insegurança,.comparecem.nas.condições.de.trabalho.de.assistentes.sociais.com.um.agravante,.pois.eles.lidam.com.indi‑víduos.diretamente.inseridos.em.situações.de.violação.de.direitos,.de.violência.e.de.desigualdade.social.em.toda.a.sua.intensidade.

Diante. disso,. passo. a. ressaltar. as. ações. estratégicas. desenvolvidas. no.âmbito.do.conjunto.CFESS‑Cress.que.se.voltam.para.o.enfrentamento.dessa.situação.e.que.se.destinam.a.fortalecer.o.processo.de.materialização.do.projeto.ético‑político.profissional..Porém.não.se.trata.aqui.de.fazer.uma.narrativa.de.atividades.e.ações.desenvolvidas,.mas.de.ressaltar.processos.de.resistência.e.de.luta.construídos.coletivamente..E.neste.sentido.é.fundamental.o.entendimento.de.que.não.nascemos.assistentes.sociais..Nos.tornamos.assistentes.sociais,.e.este.movimento.de.tornar‑se.é.histórico,.é.diverso.na.história.de.cada.um/uma.de.nós..Temos.que.considerar.aqui.a.necessária.temporalidade.para.gestar.seja.o.profissional.assistente.social.em.sua.dimensão.individual,.seja.o.coletivo.da.categoria.profissional..Do.ponto.de.vista.da.formação.individual.do.profissional,.o.processo.tem.início.no.curso.de.graduação.em.Serviço.Social,.mas.esse.tem‑po.se.amplia.por.meio.da.participação.política.dos.estudantes.e.posteriormente.nas.inserções.em.nível.de.pós‑graduação,.nas.experiências.profissionais.coti‑dianas. e. inserção. em.espaços. de. representação. e. organização.política..Não.podemos.esquecer.que.a.maioria.dos(as).assistentes.sociais,.ao.entrar.na.uni‑versidade,.possuía.projetos.voltados.para.as.necessidades.do.“eu”,.com.aspira‑ções.e.buscas.ensimesmadas.na.própria.singularidade.

Do.ponto.de.vista.da.construção.coletiva.do.projeto.ético‑político,.temos.uma.cultura.profissional.construída.nesses.mais.de.trinta.anos.que.nos.separa.do.III.CBAS,.denominado.“Congresso.da.Virada”,.realizado.em.1979,.em.São.Paulo,.construção.que.repõe.e.recria.o.sentido.de.projeto.coletivo..Se.as.difi‑culdades.e.mesmo.derrotas.existem,.as.conquistas.são.muitas.e.valiosas,.e.tudo.isto.tem.o.sabor.todo.especial.porque.são.derrotas.e.conquistas,.entendidas.numa.relação.dialética. que. favorece,. potencializa. e. oxigena.nosso.movimento. de.apreender. e. atuar. profissional. e. politicamente. nas. contradições. e. de. seguir.adiante.qualitativamente.melhor.

Diferentes.gerações.se.dedicaram.à.construção.desse.projeto.profissional..No.cotidiano.e.nos.momentos.coletivos.(seminários/congressos/encontros.des‑centralizados.e.nacional.do.conjunto.CFESS‑Cress),.espaços.esses.instituídos.

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democraticamente.no.Serviço.Social,.se.efetiva.o.encontro.de.estudantes.e.as‑sistentes.sociais.que.realizam.belas.e.verdadeiras.sínteses.entre.as.diferentes.gerações.do.Serviço.Social.brasileiro..O.ato.público4.constituiu‑se.numa.im‑portante.manifestação. política. que. contou. com. a. presença. de. estudantes. e.profissionais.de.diferentes.gerações.e.estados.do.Brasil,.além.de.representantes.de.movimentos.sociais.e.de.partidos.políticos.de.esquerda.que.apoiaram.esta.luta..O.ato.público.foi.realizado.em.defesa.do.PLC.n..152/2008.que.define.a.jornada.máxima.de.trabalho.de.assistentes.sociais.em.30.horas.semanais.sem.redução.salarial,.aprovado.no.plenário.do.Senado.Federal,.em.Brasília.(DF).no.dia.3.de.agosto.e.sancionado.pelo.Presidente.Luis.Inácio.Lula.da.Silva.no.dia.26.de.agosto.de.2010..A.diminuição.da.jornada.de.trabalho.sem.redução.salarial.constitui‑se.reivindicação.e.luta.histórica.da.classe.trabalhadora.por.melhores.condições.de.trabalho.

O.CFESS.desde.2008.interfere.politicamente.neste.processo.por.meio.de.reunião.com.autor.e.relatores.do.projeto.na.câmara;.reunião.entre.o.autor.do.projeto.e.representantes.do.conjunto.CFESS‑Cress;.participação.em.audiências.públicas.e.debates;.elaboração.de.notas.técnicas.com.o.objetivo.de.explicar.as.razões.que.nos.possibilitam.afirmar.que.a.categoria.de.assistentes.sociais.pela.natureza.do.trabalho.desenvolvido.insere‑se.entre.as.categorias.profissionais.que.estão.submetidas.a.situações.de.adoecimento,.com.níveis.acentuados.de.stress,. desgaste. físico. e. emocional.. Isto. porque. convivem.diariamente. com.demandas.profissionais.que.explicitam.o.quadro.de.violência.e.de.violação.de.direitos.a.que.estão.submetidos.os.indivíduos,.usuários.do.Serviço.Social,.que.vivenciam.as.consequências.da.desigualdade.social.e.de.múltiplas.formas.de.opressão.em.toda.sua.intensidade.e.manifestação.na.vida.cotidiana..Esta.con‑quista,.portanto,.tece.possibilidades.para.que.assistentes.sociais.possam.traba‑lhar.em.condições.mais.favoráveis.para.se.refazerem.subjetivamente.dos.im‑

4..No.dia.3.de.agosto.de.2010.durante,.o.XIII.CBAS,.foi.realizado.em.Brasília.(DF).ato.público.em.defesa.do.Projeto.de.Lei.n..152/2008,.de.autoria.do.deputado.Mauro.Nazif.(PSB‑RO)..Coordenado.pela.comissão.organizadora. do.XIII.CBAS. (CFESS/Abepss/Cress‑DF),. o. ato. reuniu. aproximadamente. 3.mil.pessoas,.entre.assistentes.sociais.e.representantes.de.movimentos.sociais.e.partidos.políticos.de.esquerda..Depois.do.ato.público,.as.professoras.Ivanete.Boschetti.(presidente.do.CFESS),.assistente.social.Marinete.Cordeiro.(CFESS),.Elaine.Behring.(presidente.da.Abepss),.assistente.social.Fernanda.Fernandes.(presidente.do.Cress‑DF).e.Mario.Pereira.(estudante,.representante.da.Enesso).tiveram.audiência.com.o.presidente.do.Senado..A.manifestação.continuou.nas.galerias.do.Congresso.Nacional.até.a.noite,.quando.finalmente.o.PLC.entrou.em.votação.e.foi.aprovado.por.unanimidade.

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pactos. próprios. de. um. tipo. de. trabalho. que. evidencia. situações. em.que. os.usuários,.além.de.estarem.historicamente.interditados.do.acesso.ao.circuito.dos.direitos,.estão.subjetivamente.despotencializados.para.viver.

Nesse.tempo.histórico.de.construção.e.materialização.do.projeto.ético‑po‑lítico.profissional,.a.realidade.em.sua.dinamicida.de.e.dimensão.contraditória.torna‑se.o.chão.histórico.prenhe.de.lições.cotidianas.por.meio.do.protagonismo.das. lutas.da. classe. trabalhadora. e.dos. sujeitos.profis.sionais.que.passaram.a.apreender.as.necessidades.re.ais.vivenciadas.pela.população.como.demandas.pos.tas.ao.Serviço.Social..Direito.ao.tra.balho,.à.autonomia.de.organização.sin‑dical.por.ramo.de.atividade.e.não.por.categoria.profissional;.acesso.à.segurida‑de. social.pública. e.universal;. acesso. aos.direitos. sociais,. políti.cos. e. civis. e.aqueles.re.lacionados.à.diversidade.humana.—.como.liberdade.de.orientação.e.expressão.sexual,.direito.à.igualdade.e.à.identidade.de.gênero5,.direito.à.diver‑sidade. étnico‑racial.—. emergiram. como.demandas. concretas. no. cotidiano.profissional.e.por.isso.adentraram.na.agenda.de.lutas.do.conjunto.CFESS‑Cress.

Nas.últimas.três.gestões.do.CFESS.tivemos.a.realização.de.campanhas.na‑cionais.que.se.direcionam.para.a.defesa.da.diversidade.humana.e.dos.direitos.humanos.6.A.“Campanha.de.combate.ao.racismo:.o.Serviço.Social.mudando.o.rumo.da.história”.desenvolvida.pela.gestão.CFESS‑Cress.(2002‑05);.a.campanha.“Assistente. social.na. luta.contra.o.preconceito:.pela. liberdade.de.orientação.e.expressão.sexual”.efetivada.pela.gestão.CFESS‑Cress.(2005‑08)7.e.a.campanha.dessa.gestão.CFESS‑Cress.(2008‑11),.“Trabalho,.direitos.humanos.e.riqueza.no.Brasil”,.que.por.meio.de.diferentes.abordagens.de.comunicação.tratou.o.tema.em.

5..Integram.as.deliberações.do.38°.Encontro.Nacional.CFESS‑Cress,.no.eixo.Ética.e.Direitos.Humanos,.uma.proposição.que.visa.“aproximar.a.categoria.profissional.do.debate.contemporâneo.acerca.do.uso.do.nome.social.nos.espaços.públicos.e.privado.e.no.acesso.às.políticas.públicas.para.a.população.LGBT,.con‑siderando.o.respeito.à.diversidade.de.orientação.sexual.e.a.identidade.de.gênero”..Neste.momento.sob.a.responsabilidade.do.CFESS,.por.meio.de.sua.assessoria.jurídica,.está.em.processo.de.elaboração.procedi‑mentos.para.assegurar.ao(a).assistente.social.que.solicitar.o.nome.social.na.carteira.de.identidade.profissio‑nal.de.modo.a.garantir.o.direito.à.identidade.de.gênero.

6..No.último.encontro.nacional.CFESS‑Cress.de.cada.gestão,.é.escolhido.um.tema.que.será.trabalhado.durante.toda.a.gestão.seguinte.na.forma.de.campanha,.que.envolve.o.desenvolvimento.de.múltiplas.maneiras.de.comunicação.(cartaz/spot.de.rádio/banner/folder.etc.).e.promoção.de.diversos.debates.

7..Como.parte.integrante.dessa.campanha.o.CFESS.instituiu.a.Resolução.n..489/2006,.que.“estabelece.normas.vedando.condutas.discriminatórias.ou.preconceituosas,.por.orientação.e.expressão.sexual.por.pessoas.do.mesmo.sexo,.no.exercício.profissional.do.assistente.social,.regulamentando.princípio.inscrito.no.Código.de.Ética.Profissional”.

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suas.determinações.concretas..No.universo.dessas.campanhas,.a.violação.dos.di‑reitos.humanos.foi.analisada.em.relação.com.a.desigualdade.social.e.com.a.explo‑ração.do.trabalho,.rompendo.com.a.visão.abstrata.e.liberal.dos.direitos.humanos.

As.campanhas.assinaladas.interferem.nas.condições.de.trabalho.ao.possi‑bilitarem.a.categoria.refletir.sobre.temas.polêmicos,.em.geral.permeados.no.cotidiano.por. concepções. que. reiteram.discriminação. e. preconceitos..Essas.questões,.ao.serem.trabalhadas.no.universo.profissional.contribuem.para.des‑mistificar.e.evidenciar.situações.consolidadas.de.opressão.que.levam.os.indi‑víduos,.muitos.dos.quais.usuários.do.Serviço.Social,.a.viver.sob.o.signo.da.violência.e.da.violação.de.direitos..

As.temáticas.foram.tratadas.sob.uma.perspectiva.de.totalidade..Isto.signi‑fica.o.entendimento.da.diversidade.humana.como.parte.constituinte.da.indivi‑dualidade.que.só.pode.ser.entendida.em.relação.com.a.sociabilidade..A.direção.teórica.dada.possibilitou.a.crítica.às.teorias.pós‑modernas.e.seu.aprisionamen‑to.na.valorização.e.respeito.à.diferença.entre.os.indivíduos.em.detrimento.da.defesa.de.um.projeto.societário.de.igualdade.e.liberdade.substantivas.que.reco‑nhece.e.valoriza.a.diversidade.humana..Nas.teorias.pós‑modernas.prevalece.o.compromisso.e.o.entendimento.dos.interesses.de.grupos.e.segmentos.em.detri‑mento.do.reconhecimento.quanto.à.necessidade.histórica.objetiva.e.subjetiva.de.construir.e.fortalecer.um.projeto.político.da.classe.trabalhadora..A.dimensão.de.classe.tende.a.ser.desconsiderada.na.apreensão.da.vida.social..

As.campanhas.possibilitaram.abordagens.que.superaram.visões.pós‑mo‑dernas,.economicistas.e.a.afirmação.de.que.a.classe,.em.sua.densidade.histórica,.é.constituída.de.indivíduos.que.vivenciam.determinadas.condições.objetivas,.caracterizadas.pelo.não.acesso.à.riqueza.socialmente.produzida.e.que.subjetiva‑mente.são.diversos,.dentre.muitas.outras.questões,.quanto.à.identidade.de.gêne‑ro.e.étnico‑racial,.quanto.à.orientação.sexual.e.o.gênero..A.classe.é.vida.real.que.entra.em.movimento.coletivo,.que.forja.na.luta.a.formação.da.consciência.de.classe.e.possibilidades.de.construção.de.um.projeto.coletivo.emancipatório.

A.cada.dia.estamos.aprimorando.nosso.entendimento.no.âmbito.do.con‑junto.CFESS‑Cress.de.que.as.condições.de.vida.e.de.trabalho.se.alteram.me‑diante.processos.de.resistência.e.de.luta..E.que.essas.não.são.palavras.mágicas..Resistência.e.luta.são.processos.construídos,.pensados.e.redefinidos.em.cada.conjuntura.e.que.não.podem.prescindir.da.presença.de.mulheres.e.homens.que.nomeiam,.pela.fala.pública,.situações.concretas.que.sintetizam.formas.de.opres‑são. e. de. exploração..Constroem.argumentos. e. decidem.estratégias. de. luta..

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Resistência.e.luta.são.desafios.permanentes.quando.pensadas.numa.perspectiva.teórico‑política.que.não.cede.às.ilusões.do.economicismo,.do.politicismo,.do.eticismo,.nem.do.pensamento.conservador.e.moralista.que.insistem.em.renovar,.com.interferências,.muitas.vezes,.por.dentro.de.um.projeto.que.tem.compro‑misso.com.a.emancipação.humana.

Contra.o.pragmatismo,.o.conservadorismo.e.a.su.posta.neutralidade.defen‑didos.pelo.Serviço.Social.tradicional,.o.projeto.profissional.do.Serviço.Social.brasileiro.elaborado.nos.últimos. trinta.anos. foi. fundado.na. luta.política.por.democracia,.liberdade,.trabalho.e.direitos..É.na.trincheira.da.resistência.e.do.enfren.tamento.à.desigualdade.social.que.as.entidades.nacionais.da.categoria.e.assistentes.sociais.em.diferentes.recantos.deste.país.assumiram.explicitamente.seu.compromisso.com.os.interesses.do.trabalho..O.apri.moramento.intelectual.é.entendido.como.condição.para.apreen.der.o.real.em.sua.concretude.e.comple‑xidade..Neste.processo,.a.interlocução.com.a.tradição.marxista.e.posteriormen‑te.com.o.pensamento.marxiano.forne.ceu.o.alicerce.teórico‑metodológico.para.apreen.der.a.realidade.sob.uma.perspectiva.de.totalidade..Três.décadas.depois.podemos.afirmar.que.a.perspectiva.da.totalidade.constituiu‑se.na.grande.con‑quista. desse. pro.jeto. profissional. e,. simultaneamente,. no. grande. desa.fio. da.profissão.na.contemporaneidade..O.projeto.éti.co‑político.profissional.é.produ‑to.da.ação.dos.sujeitos.profissionais.sob.determinadas.condições.objetivas..Em.cada.momento.histórico.surgem.novas.exigências.e.desafios.

Nos.anos.de.1990,.a.categoria.de.assistentes.sociais.foi.chamada.a.apri‑morar. o. entendimento. da. ética. e,. desse.modo,. aperfeiçoar. os. instrumentos.normativos.no.âmbito.do.Serviço.Social..O.atual.Código.de.Ética.profissional,.aprovado.em.1993,.foi.resultado.de.um.amadurecimento.das.re.flexões.iniciadas.na.elaboração.do.Código.de.1986,.fruto.de.uma.construção.coletiva.da.catego‑ria,.mas.que.em.face.da.realidade.revelou‑se.insuficien.te,.entre.outras.questões,.na.subordinação.imediata.e.sem.mediações.entre.ética.e.política.e.na.ausência.de.mediações.entre.projeto.societário.e.projeto.profissional.

É.também.de.1993.a.renovação.da.Lei.de.Re.gulamentação.da.Profissão.que,.ao.definir.atribuições.e.competências.profissionais,.contribuiu.para.inscre‑ver.a.profissão.de.Serviço.Social.num.patamar.qualifi.cado.no.tratamento.das.expressões. da. questão. social..Desse. período. em.diante,. aprofunda‑se.mais.ainda.o.arsenal.teórico‑metodológico,.ético‑político.e.os.instrumentos.norma‑tivos..Merece.destaque.a.capacidade.que.tem.tido.o.conjunto.CFESS‑Cress.de.apreender. questões. e. demandas. postas. no. exercício. profissional. e. discernir.

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sobre.a.necessidade.de.objetivar.a.lei.de.regulamentação.da.profissão.e.o.Có‑digo.de.Ética,.por.meio.de.resoluções.apresentadas.pelo.CFESS.no.uso.de.suas.atribuições.legais.e.regimentais,.que.lhe.são.conferidas.pela.Lei.n..8.662/93..Do.universo.de.inúmeras.resoluções,.destacaremos.as.mais.recentes.e.que.cau‑saram.debates.polêmicos,.colocando.em.primazia.o.exercício.profissional.e.os.desafios.à.materialização.do.projeto.ético‑político.

A.Resolução.CFESS.n..533/2008,.que.“regulamenta.a.supervisão.direta.de.estágio.no.Serviço.Social”,.parte.do.entendimento.expresso.na.lei.de.regu‑lamentação.da.profissão.de.que.o.exercício.de.tal.atividade.profissional.é.pri‑vativa.de.assistentes.sociais..Considera.os. inúmeros.debates.sobre.a.relação.entre.o.estágio.e.a.PNF.sistematizados.pelos.conselhos.regionais.na.perspecti‑va. de. enfrentar. os. entraves,. apreender. desafios. e. qualificar. a. formação. e. o.exercício.profissional.

A.Resolução.CFESS.n..554/2009,.que.“dispõe.sobre.o.não.reconheci‑mento.da.inquirição.das.vítimas.crianças.e.adolescentes.no.processo.judicial,.sob.a.metodologia.do.Depoimento.Sem.Dano/DSD,.como.sendo.atribuição.ou.competência.do.profissional.assistente.social”.é.síntese.de.amplo.debate.no.universo.do.Serviço.Social.brasileiro..Ao.reconhecer.a.metodologia.DSD.como.função.própria.da.magistratura,.possibilitou.o.debate.sobre.as.atribuições.e.competências.do(a).assistente.social.e.as.particularidades.da.profissão.na.sua.inserção.e.defesa.do.sistema.de.garantia.dos.direitos.das.crianças.e.dos.adolescentes..Compete.ao(à).assistente.social.atuar.nas.complexas.expressões.da.questão.social.na.perspectiva.de.contribuir.para.a.recomposição.dos.direi‑tos.violados..A.participação.em.metodologias.como.o.DSD.e.estratégias.si‑milares,.centra.o.objetivo.da.intervenção.na.produção.de.provas.para.punir.o.sujeito.agressor.e,.neste.sentido,.destoa.dos.objetivos.do.Serviço.Social,.além.de. obstaculizar. a. autonomia. profissional. no. que. se. refere. à. definição. dos.procedimentos.de.abordagem.do.usuário.em.cada.situação.particular.e.das.questões.que.merecem.atenção.e. intervenção.direta.do.profissional. junto.a.crianças.e.adolescentes.

A.Resolução.CFESS.n..556/2009,.que.trata.dos.“procedimentos.para.efei‑to.da.lacração.do.material.técnico.e.material.técnico‑sigiloso.do.Serviço.Social”,.põe.em.discussão.a.relevância.no.arquivamento.de.material.próprio.do.Serviço.Social.e.da.atenção.que.deve.ter.o.profissional.quando.entra.e.quando.conclui.seu.trabalho.em.determinada.instituição.frente.às.informações.de.caráter.técni‑co.e/ou.sigiloso..De.acordo.com.a.resolução,.

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o.material.técnico.sigiloso.caracteriza‑se.por.conter.informações.sigilosas,.cuja.divulgação.comprometa.a.imagem,.a.dignidade,.a.segurança,.a.proteção.de.inte‑resses.econômicos,. sociais,.de. saúde,.de. trabalho,.de. intimidade.e.outros,.das.pessoas.envolvidas,.cujas.informações.respectivas.estejam.contidas.em.relatórios.de.atendimentos,.entrevistas,.estudos.sociais.e.pareceres.que.possam,.também,.colocar.os.usuários.em.situação.de.risco.ou.provocar.outros.danos.8.

Esta.resolução.articula‑se.à.Resolução.n..493/2006.e.com.o.próprio.Códi‑go.de.Ética.na.atenção.dispensada.à.questão.do.sigilo.profissional.e,.desse.modo,.contribui.com.a.melhoria.das.condições.de.trabalho.ao.fornecer.os.procedimen‑tos.e.indicações.que.os.profissionais.devem.seguir.em.situações.específicas.

A.Resolução.CFESS.n..557/2009,.que.“dispõe.sobre.a.emissão.de.parece‑res,.laudo,.opiniões.técnicas.conjuntos.entre.o.assistente.social.e.outros.profis‑sionais”,.reconhece.que.o(a).assistente.social.pode.atuar.em.equipe.multipro‑fissional. e. desenvolver. atividades. junto. com. outros. profissionais. e. visa.assegurar.particularidades.do.Serviço.Social.no.desenvolvimento.e.na.elabora‑ção.de.trabalhos.técnicos..Afirma.que.é.“inadmissível,.juridicamente,.que.em.uma.mesma.manifestação.técnica,.tenha.consignado.o.entendimento.conjunto.de.duas.áreas.profissionais.regulamentadas,.sem.que.se.delimite.o.objeto.de.cada.uma,.tendo.em.vista,.inclusive,.as.atribuições.privativas.de.cada.profissão”..Não.há,.nessa.resolução,.nenhum.impedimento.à.realização.de.trabalho.con‑junto.com.outras.áreas.profissionais,.no.entanto.delimita.a.necessidade.de.o.assistente.social.atuar.por.meio.de.opinião.técnica.somente.em.matéria.de.sua.área.de.atuação.e.de.acordo.com.suas.competências.e.atribuições.privativas,.conforme.prevê.a.Lei.n..8.662/93..Esta.resolução.incide.sobre.as.condições.de.trabalho.porque.assegura.ao(a).assistente.social.que.este.deve.emitir.opinião.técnica.somente.em.matéria.da.sua.área.de.atuação,.ao.tempo.em.que.veda.que.outros.profissionais.possam.subscrever.entendimento. técnico.em.matéria.do.Serviço.Social..Garante,.assim.que.o.usuário.tenha.acesso.as.opiniões.técnicas.diversas.sobre.sua.situação.e.favorece.a.autonomia.de.cada.área.profissional.mesmo.que.o.trabalho.tenha.sido.realizado.em.equipe.

A.Resolução.CFESS.n..569/2010.“dispõe.sobre.a.vedação.da.realização.de.terapias.associadas.ao.título.e/ou.ao.exercício.profissional.do.assistente.social”.por.entender.que.o.desenvolvimento.de.terapias.exige.arsenal.teórico‑metodo‑

8..Parágrafo.único.da.referida.resolução.

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lógico.e.uma.série.de.procedimentos.que.não.integram.o.processo.de.formação.básica.em.Serviço.Social..Diferentes.profissões.atuam.em.contato.com.indiví‑duos.em.suas.condições.objetivas.e.subjetivas,.mas.cada.área.tem.suas.compe‑tências.e.atribuições.e.se.movimentam.de.acordo.com.a.cultura.profissional.e.com.seus.instrumentos.normativos..A.resolução.não.avalia.a.direção.social.das.terapias..Adverte,.porém,.que.seu.uso.exige.conhecimento.teórico‑metodológi‑co.e.habilidades.específicas,.pois.estes.trazem.consequências.práticas.na.vida.dos.usuários..O(a).assistente.social.tem.plena.liberdade.para.atuar.com.indiví‑duos,.grupos,.famílias.e/ou.comunidade.e.definir.formas.de.acesso.e.atividades.voltadas.para.o.enfrentamento.das.expressões.da.questão.social.e.da.luta.pela.garantia.dos.direitos.em.conformidade.com.suas.atribuições.e.competências.profissionais.

Todas.essas.resoluções.contribuem.para.a.melhoria.das.condições.de.tra‑balho,.pois.regulamentam.temas.presentes.no.cotidiano.profissional,.na.pers‑pectiva.de.garantia.das.competências.e.atribuições.profissionais.e.das.condições.éticas.e.técnicas.para.o.exercício.profissional.do(a).assistente.social..São.ques‑tões. que. demandam. reflexão. e. posicionamento. profissional..As. resoluções.formam.um. importante. arsenal. jurídico‑normativo.que. longe.de. engessar. o.trabalho.profissional,.alicerçam.a.qualidade.e.competência.teórico‑metodoló‑gica‑ético‑política.e.técnico‑operativa.nos.limites.da.intervenção.profissional,.considerando.suas.competências,.habilidades.e.atribuições.privativas..São.ins‑trumentos.de.defesa.e.valorização.do.Serviço.Social,.dos.serviços.prestados.à.população.usuária.e.à.sociedade.brasileira.

Nos.diversos.espaços.de.representação.em.que.se.insere.o.CFESS,.sua.atuação.é.marcada.pela.defesa.dos.interesses.do.trabalho..Em.síntese,.três.gran‑des.eixos.articulam.a.luta.política.do.conjunto.CFESS‑Cress.e.se.objetivam.em.várias.estratégias:.1).em.defesa.da.qualidade.na.formação.e.no.exercício.pro‑fissional;.2).pelo.direito.à.cidade.para.todas.as.pessoas.sem.racismo,.sem.desi‑gualdade.de.gênero.e.sem.homofobia/lesbofobia.e.transfobia;.e.3).em.defesa.dos.direitos.humanos.e.da.universalização.das.políticas.sociais..Entre.as.estra‑tégias.destacamos:.o.plano.de.lutas.em.defesa.do.trabalho.e.da.formação.pro‑fissional,.desenvolvido.em.parceria.com.a.Abepss.e.a.Enesso;.a.publicação.de.parâmetros.de.atuação.do(a).assistente.social.nas.políticas.de.assistência.social.e.saúde.e.em.processo.de.debate.atualmente.a.possibilidade.de.elaboração.dos.parâmetros.na.área.da.Previdência.Social.e.no.campo.sociojurídico..Destacam‑se,.ainda,.o.acompanhamento.permanente.de.projetos.de.lei.de.interesse.do.Servi‑

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ço.Social.e.que.se.voltem.à.defesa.dos.direitos.humanos;.campanha.pela.reali‑zação.de.concurso.público.para.assistentes.sociais.em.diferentes.espaços.só‑cio‑ocupacionais.e.a.promoção.de.seminários.nacionais.para.analisar.questões.e.desafios.referentes.ao.trabalho.profissional..Duas.estratégias.de.luta.merecem.atenção.especial.pela.força.mobilizadora.que.possuem.e.por.situar.politicamen‑te.a.luta.numa.perspectiva.crítica.ao.sistema.do.capital..Trata‑se.da.luta.pelo.direito.ao.trabalho.e.à.seguridade.social.pública.e.pelo.direito.à.terra.e.à.mora‑dia.com.condições.dignas.e.por.ações.estratégicas.que.favoreçam.à.plena.im‑plementação.da.política.nacional.de.reforma.urbana.e.reforma.agrária.

A.profissão.ganha.visibilidade.no.cenário.nacional.na.defesa.intransigen‑te.dos.direitos.humanos,.sobressaindo‑se.lutas.pela.implementação.do.sistema.de.garantia.dos.direitos.das.crianças,.adolescentes,. jovens.e.pessoas. idosas;.ações.em.defesa.dos.direitos.das.pessoas.com.deficiência.e/ou.portadoras.de.transtorno.mental;.direitos.sexuais.e.reprodutivos.da.mulher,.pela.constitucio‑nalidade.e.plena.implementação.da.Lei.Maria.da.Penha.e.defesa.dos.direitos.LGBT.com.aprovação.do.PLC.n..122/2006,.que.criminaliza.a.homofobia..São.lutas.que.exigem.conhecimento.dos.temas.e.suas.polêmicas.em.profundidade.e.participação.política.com.concepção.fundada.na.defesa.das.po.líticas.sociais.universais.e.de.um.conjunto.de.mar.cos.legais.que.se.tornaram.fundamentais.para.a.realização.dos.direitos.

É.nesse.processo.de.luta.pela.efetivação.de.direitos.que.importantes.me‑diações. se. objetivam,. favorecendo.o. entendimento. das. complexas. relações.entre.projeto.profissional.e.projeto.societário..Em.todas.as.trincheiras.de.luta.se. explicitam.as. condições.objetivas. e. subjetivas.de.um. tempo.histórico.de.crise.do.capital,.mar.cado.por.um.“continuum.depressivo”,.posto.que.o.capital.não.tem.limi.tes.à.sua.expansão..Tudo.ordena.e.desordena,.acolhe.e.descarta,.constrói.e.destrói..Inadvertidamente.alguém.pode.supor.que.numa.conjuntura.de.crise.estrutural.como.esta.o.projeto.ético‑político.profissional.perde.relevân‑cia.e.possibilidades.concretas.de.materialização..Con.siderando.que.assistentes.sociais.atuam.nas.expres.sões.da.questão.social.e.na.mediação.de.direitos.para.atendimento.às.necessidades.da.população.usuária,.quanto.mais.esta.categoria.for.capaz.de.decifrar.e.apreender.as.determinações.sócio‑históricas,.mais.terá.condições.para.elaborar.respostas.pro.fissionais.qualificadas..A.efetivação.do.projeto.passa.também.pela.capacidade.dos.profissionais.para.identificar.a.insu‑ficiência.das.respostas.do.Estado.e.assim.explicitar.o.que.falta.e.o.que.restringe.nas.políticas.e.programas.sociais.tal.como.se.apresentam.

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Como.dissemos.por.ocasião.da.comemoração.dos.trinta.anos.do.Congres‑so.da.Virada.em.CFESS.Manifesta9.escrito.na.ocasião,.“este.projeto.profissional.não.é.uma.carta.de.inten.ções..É.um.processo.de.construção.permanente.e.coti‑diana.em.defesa.de.uma.perspectiva.ética,.teórica.e.política.que.subsidia.as‑sistentes.sociais.e.as.entidades.nacionais.da.categoria.para.atuar.em.condições.concretas..As.respostas.às.demandas.e.aos.desafios.se.objetivam.no.cotidiano..Não.espalhamos.ilusões..O.projeto.ético‑político.pro.fissional.requer.um.con‑junto.de.mediações.que.arti.culem.a.luta.por.um.projeto.societário.anticapitalis‑ta. às. estratégias.de. enfrentamento.no. tempo.presente”..A.materialização.do.projeto. profissional. é. simultaneamente. conquista. e. desafio..No. cotidiano. é.fundamental.resgatar.e.manter.viva.a.memória.das.lutas.históricas.desenvolvi‑das.pela.categoria.em.defesa.dos.direitos.e.das.condições.de.trabalho.e,.neste.sentido,.o.ato.público.de.3.de.agosto.de.2010.deve.integrar.essa.memória.de.resistência.e.de.luta.como.um.dia.inesquecível.de.mobilização.e.participação.da.categoria.profissional.

Este.é.um.projeto.coletivo.de.uma.categoria.profissional.que.construiu.e.preserva.por.mais.de.três.décadas.procedimentos.e.instâncias.de.decisão.demo‑crática..A.ação.do.CFESS.é.radicalmente.contrária.às.formas.de.fazer.política.fundadas.na.judicialização.das.lutas.sociais,.no.desrespeito.aos.instrumentos.normativos.do.Serviço.Social,.na.criminalização.dos.movimentos.sociais.e.de.suas.lideranças..Buscamos.a.dimensão.jurídica,.sempre.de.modo.contraditório.para.a.defesa.dos.direitos..Nesses.trinta.anos,.o.projeto.ético‑político.profissio‑nal.superou.inúmeros.limites.teórico‑políticos.e.com.razão.militante.não.temeu.forças.opositoras.conservadoras.nem.o.debate.democrático.sobre.grandes.ques‑tões.que.permeiam.a.vida.social.e.o.cotidiano.da.profissão.

É.um.projeto,.portanto,.que.se.alimenta.da.realidade.e.busca.fortalecer.em.cada.situação.concreta.as.possibilidades.que.emergem.do.solo.profundo.das.contradições..Não.é.fácil.apreender.e.atuar.nas.contradições..Exige.a.reflexão.crítica.permanente.e.a.elaboração.de.estratégias.cotidianas..Por.isso,.mais.do.que.nunca.precisamos.estar.atentos.e.fortes.para.não.sucumbir.à.“confusão.do.espírito”,.ao.conformis.mo,.ao.“pensamento.único”.e.às.falsas.polêmicas..Pre‑cisamos.de.coragem,.porque,.como.sinaliza.Guimarães.Rosa:.“O.correr.da.vida.

9..O.CFESS.Manifesta.é.uma.publicação.permanente.que.traz.o.posicionamento.ético‑político.do.CFESS.sobre.questões,.acontecimentos.da.vida.social.e.sobre.assuntos.de.interesse.do.Serviço.Social..No.site.do.CFESS.<www.cfess.org.br>.encontram‑se.publicados.todos.esses.documentos.

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embrulha.tudo,.a.vida.é.assim:.es.quenta.e.esfria,.aperta.e.daí.afrouxa,.sossega.e.de.pois.desinquieta..O.que.ela.quer.da.gente.é.coragem”..O.projeto.ético‑po‑lítico. pro.fissional. se. constrói. numa.processualidade. histórica,. com. sujeitos.profissionais.que.misturam.diferentes.trajetórias,.histórias.e.experiências.pro‑fissionais.e.políticas..Tem.tido.a.força.teórico‑política.e.a.direção.ética.para.não.sucumbir.diante.de.um.mundo.em.situação.de.barbárie.e.busca.sua.reno.vação.incessantemente.com.posicionamento.firme.e.estratégias.criativas.

São.mais.de.trinta.anos.na.defesa.dos.direitos,.na.luta.contra.a.exploração.do.trabalho.e.pela.vigência.de.outro.tipo.de.sociabilidade.fundada.na.igualdade.e. liberdade. subs.tantivas..São. trinta. anos. na. luta. pelo. fortalecimento.de.um.projeto.político.das.classes.trabalhadoras..Não.podemos.deixar.que.o.projeto.dominante.desrealize.a.experiência.histórica.das.classes.trabalhadoras.em.suas.lutas.e.em.seus.momentos.de.dor.e.de.resignação.

Temos.que.ter.a.memória.desse.tempo.de.anticivilização.e.de.violação.de.direitos.não.para.nos.paralisar.perante.os.obstáculos.e.limites.cotidianos,.mas.para.que.possamos.com.uma.memória.ativa.construir.com.outros.interlocutores,.sujeitos.individuais.e.coletivos,.a.transformação.do.presente..Construir.um.novo.tempo.histórico.em.que.os.indivíduos.vivam.sem.exploração.e.sem.opressão.nada.tem.de.ilusório..É.possibilidade.inscrita.na.vida.real.mediante.a.decadên‑cia.objetiva.e.ideológica.do.capital.no.atendimento.às.necessidades.humanas..Os.compromissos.éticos.e.políticos.e.o.conjunto.de.lutas.e.ações.em.defesa.dos.direitos.assumidos.pelo.Serviço.Social.brasileiro.nesses.mais.de. trinta.anos.alicerçam.nossa.participação.efetiva.na.elaboração.do.futuro.

Artigo recebido em ago./2010 n Aprovado em set./2010

Referências bibliográficas

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Ética e sigilo profissionalEthics and Professional Secrecy

Simone Sobral Sampaio* Filipe Wingeter Rodrigues**

Resumo: Este artigo problematiza o sigilo profissional em uma perspectiva ética com o objetivo de apresentar a sua caracterização e complexidade a partir de alguns elementos contemporâneos presentes na sociedade brasileira, como o domínio midiático sobre a vida priva‑da da população pobre, as exigências postas ao assistente social na relação direito e dever no contexto institucional e legal, assim como as perguntas que sinalizam sua pertença ao campo ético.

Palavras‑chave: Sigilo profissional. Ética. Direito.

Abstract: This article deals with the questioning of the professional secrecy from an ethical point of view in order to present its characteristics and complexity from contemporary elements that are present in the Brazilian society, as the control the media has over poor people´s private lives, the requirements over the social workers for the relationship between rights and duties in the legal and institutional context, as well as the questions belonging to the ethical area.

Keywords: Professional secrecy. Ethics. Law.

* Assistente Social, professora doutora do departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis-SC, Brasil. PhD. E‑mail: [email protected].

** Mestrando em Serviço Social no Programa de Pós-Graduação em Serviço Social (PPGSS) pela UFSC. E‑mail: [email protected].

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Introdução

O presente artigo trata da análise fruto dos resultados parciais obtidos na realização do projeto de pesquisa, em curso, sobre a atuação do assis‑tente social no espaço sociojurídico.

Muitos aspectos envolvem algo que é, aparentemente, simples: a manutenção de um segredo. Se essa atitude já envolve questões e dilemas quando em relação interpessoal, pois implica desde a possibilidade e o dever daquele que guarda o segredo de se omitir em revelá-lo até a necessária proteção da intimidade do sujei‑to que apresenta o aspecto de sua vida que não quer que seja conhecido por outrem, todos esses aspectos complexificam-se ainda mais nos termos do sigilo profissional.

Pelo exercício de sua profissão, cabe ao assistente social o direito de não re‑velar a informação obtida do usuário que o fez na confiança de resguardo da maté‑ria sigilosa. Na língua portuguesa, segredo e sigilo são sinônimos. Ao verificar as diversas definições de sigilo profissional pode-se observar sua similitude tanto enquanto direito como dever do profissional em não divulgar informações colhidas ou obtidas em decorrência de seu trabalho.

Não são todas as profissões que devem a obrigação do sigilo e isso já seria revelador da disposição social que é atribuída a algumas profissões de terem o dever e o direito de mantê-lo.

Ora é consenso que o profissional conheça todos os elementos necessários para o bom cumprimento de seu trabalho, desde as condições institucionais até as informações obtidas na sua relação com o usuário. O sigilo profissional não é ab‑soluto, no caso do Serviço Social, esse elemento abre a possibilidade de esse pro‑fissional avaliar, subjetivamente, se deve manter ou divulgar o fato sigiloso, deven‑do prevalecer o disposto no Código de Ética Profissional do Assistente Social atentando para o conteúdo ético-político dos princípios que o regem.

A análise do sigilo profissional a partir da ética mostra que se está diante de algo complexo, que não se limita a um preceito legal. Quer dizer, o seu entendi‑mento remete as questões: para quem?; com qual necessidade?; para quê? e em que condições? Essas questões não podem ser pensadas abstratamente, mas sim a par‑tir das situações concretas nas quais estão inseridas, pois interrogam a multiplici‑dade de demandas que lhe são colocadas na comunicação de uma informação.

Dessa forma, as reflexões que serão propostas aqui não pretendem ser nem um guia de boas práticas, nem tampouco um catálogo de comportamento, mas problematizar esse importante aspecto presente no exercício profissional.

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Desenvolvimento

O sigilo profissional trata de uma informação a ser protegida, impõe uma relação entre privacidade e publicidade, cujo dever profissional se estabelece desde a se ater ao estritamente necessário ao cumprimento de seu trabalho, a não informar a matéria sigilosa.

Partindo da hipótese que a esfera privada da vida de alguns indivíduos tende a ser confiscada em maior medida que a da vida de outros, pode-se dizer que o lugar de tensão entre o respeito à vida privada, sem discriminação, e as escolhas da sociedade estão desaparecendo; é como se todos os meios fossem válidos desde que justificados.

A vida das pessoas pobres sofre maior interferência e intervenção do poder público e da mídia sob alegação de segurança e proteção. Na ordem atual em que a mídia explora largamente a exposição da vida dos indivíduos pobres, a banaliza‑ção da questão social e o tratamento sensacionalista dispensados pela mídia forta‑lecem a despolitização e a naturalização dessas existências, reforçando um espaço público espetacular que se faz como exposição vazia da vida privada.

Os pobres, ou melhor, a sua “imagem” tem sido alvo devidamente cuidado pela rede televisiva brasileira com a justificativa ou alegação de uma eficiente co‑bertura da realidade. Com esse propósito, por exemplo, são reproduzidos dezenas de programas televisivos, os quais têm como carro-chefe a exposição dos dramas cotidianos de pessoas pobres, criando uma imagem dessa população e utilizando-a como produto mercadológico. A variedade como é manipulada a existência da população pobre percorre muitos programas, desde o conhecido telejornal policial,1 passando pelo talk show, até chegar aos palcos dos programas de auditório,2 e outros meios que se pretendem mais sutis (Sampaio, 2006).

Não é difícil constatar que a programação televisiva está repleta, em seus diversos horários e programações (desde os menos concorridos até os que atingem melhor ibope) de histórias reais de infortúnio e reclamações variadas. Vidas desti‑

1. O estilo conhecido como “mundo cão na TV” foi inaugurado em 1991, pelo programa Aqui Agora (SBT). A fórmula perdeu espaço devido à queda na audiência e a fuga dos anunciantes, mas seria apressado prever o seu desaparecimento. Dentro desse filão destacaram-se o Cidade Alerta (Record), Repórter Cidadão (Rede TV), e Brasil Urgente (Band), que está no ar desde 3/12/2001.

2. Quadros emblemáticos são observados: o “Se vira nos trinta” (no programa Domingão do Faustão, Globo) e “Agora ou nunca” (no programa Caldeirão do Huck, Globo), para ficar apenas nos que apresentam maior audiência.

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nadas a passar ao largo podem na TV denunciar ou solicitar. Esse fato poderia à primeira vista ser motivo suficiente de comemoração de uma destinação pública de um espaço no programa televisivo ou, então, de uma sensibilidade social. Mas será que devemos mesmo comemorar essa explosão de realidade na telinha?

É na contracorrente e na crítica a esse intenso processo de espetacularização da pobreza que se encontram os valores éticos que fundam o Código de Ética Pro‑fissional do Assistente Social, aliado à compreensão da pessoa a ser atendida como sujeito de direito, sendo que a prática profissional se estabelece para recuperar um direito que já foi ferido ou, na maioria das vezes, nunca existiu de fato.

Nesse quadro, o assistente social trabalha com profissionais de outras áreas, que ainda que tenham o sigilo profissional circunscrito em seus códigos, não estão sujeitos às mesmas obrigações, apresentam objetivos diferentes e, ainda, lógicas e prioridades distintas das do Serviço Social. O assistente social atua em circuitos em que as informações devem ser partilhadas e, ao mesmo tempo, em que a confi‑dencialidade é, legalmente, autorizada.

Outro elemento que também deve ser considerado é a diversidade de inter‑pretações, nem sempre compatíveis, alicerçadas sobre diferentes valores em jogo. Além do que, o sigilo profissional no domínio do que se convencionou chamar “social” é menos digno de nota, sofre uma hierarquia menor que o referente a outras profissões, como advogados e médicos. É como se quando o “cliente” dessas pro‑fissões fosse mais digno do que quando usuário do Serviço Social.

Aliada a todos esses elementos somam-se outras questões: o que fazer quan‑do as palavras repassadas são deformadas, retiradas do contexto que foram ditas e apropriadas juridicamente para um fim que estava de antemão definido? O que fazer diante do dever de testemunhar sem que isso abale o igual dever, de proteção da infância, por exemplo? Como assegurar a proteção ao anonimato e resguardar a qualidade da informação e a segurança dos envolvidos? Como definir dentro do que foi dito, o que deve ser matéria de sigilo? Quais as informações que realmente contribuem para o direito reclamado?

Resumindo, em que circunstâncias o assistente social deve resguardar o si‑gilo profissional? Essa pergunta possui diversos vetores: a obrigação jurídica, as regras de determinada instituição, as escolhas éticas do profissional, o estabeleci‑do pelo Código de Ética Profissional, a própria relação entre o usuário do serviço e o assistente social, a realidade que suscita o sigilo. Por tudo isso, a resposta pode parecer simples, mas não é. Não se trata apenas de uma decisão no âmbito da lei. Quer dizer, talvez não se trate de definir esquematicamente o que cabe à instituição e o que cabe ao profissional, mas refletir anteriormente qual é o direito que está

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sendo reclamado pelo demandante. E, nessa perspectiva, definir o limite do sigilo. Para Ceneviva (1996, p. 17), o dever ético cujo cumprimento é atribuído a uma pessoa em razão de sua profissão lhe imputa uma atitude de “obter apenas a infor‑mação necessária para o cumprimento da missão profissional, e não mais que isso”. Isso serve para pensar não apenas a obtenção da informação, mas ainda a veicula‑ção desta ao que for necessário para o cumprimento do direito.

A resposta adequada para a pergunta “dizer ou não dizer?” é posterior à ati‑tude profissional que a princípio deve procurar não ir além do que é necessário para o cumprimento do objetivo profissional.

Em algumas situações, a troca e o compartilhamento de informações nem sempre se estabelecem entre profissionais que possuem a obrigação do sigilo, sen‑do diferentes os papéis e as responsabilidades de cada um. Por outro lado, geral‑mente o assistente social é um trabalhador assalariado em uma instituição, inserido em uma equipe e em uma rede maior que tem outros profissionais, outras instituições, que se articulam justamente por meio da colaboração e da comunicação de infor‑mações. Nesse conjunto, o que pode ou não ser dito sem caracterizar violação do sigilo profissional?

Esse cuidado deve ser orientado na comunicação restrita apenas ao necessá‑rio ao interesse do direito do usuário, que deve estar de acordo ou, pelo menos, informado do processo que segue, e dito a outro profissional que também esteja submetido ao sigilo profissional. Isso pode gerar dúvidas sobre o que deve ser matéria de sigilo profissional. E, principalmente, a seguinte reflexão: se a função social de uma informação fosse a mesma, seria irrelevante se ela fosse colhida pelo policial, pelo advogado, pelo médico, pelo assistente social ou pelo juiz.

Sigilo/segredo profissional

Como se sabe, o sigilo profissional3 — a guarda de informações obtidas em razão do exercício profissional, de tudo aquilo que lhe foi confiado como sigilo, ou o que veio a ser conhecido devido seu estatuto profissional — está previsto em

3. O termo sigilo tem origem do latim sigillum, que significa selo ou segredo. Segundo Ceneviva (1996, p. 22), “o sigilo, [...] além do sinônimo de segredo, é também o selo e o respectivo sinete, ligando-se direta‑mente ao étimo, como selo aposto para garantir a inviolabilidade de documento ou de seu envoltório. Mantém‑-se com esse significado na espécie de sigilo de correspondência, com o qual, aliás, terminou estendido à comunicação telegráfica, à transmissão de dados e à conversão telefônica”.

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muitos dispositivos legais (a Constituição Federal brasileira, o Código Penal, o Código Civil, o Código de Processo Penal, a Lei das Contravenções Penais e o Código de Processo Civil).

Constitucionalmente, ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude da lei, e que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Esse entendimento norteia os dispositivos legais que se referem ao sigilo profissional, em particular o sigilo médico.

A referência a esses dispositivos legais nos é útil nessa reflexão para chamar a atenção que o direito à confidencialidade é tanto um direito da pessoa, como também uma responsabilidade profissional. Em outros termos, a existência do si‑gilo profissional interessa a toda sociedade, pois é condição indispensável para o trabalho do profissional, na medida em que essas ações encarnam um interesse da sociedade, definido historicamente.

No Brasil, todos os Códigos de Ética do(a) assistente social instituídos no decorrer da história da profissão trataram sobre a questão do sigilo ou de seu sinô‑nimo segredo, ainda que representasse uma forte vinculação moral da doutrina cristã. O Código de Ética de 1947, em sua seção primeira, item 2, preconizava como dever fundamental “guardar rigoroso sigilo, mesmo em depoimentos policiais, sobre o que saiba em razão de seu ofício”. Não havia o esclarecimento sobre em que condições determinadas informações sigilosas poderiam ser reveladas.

No Código de Ética de 1965, em seu capítulo terceiro, tratava-se especifica‑mente do segredo profissional.

Art. 15. O assistente social é obrigado pela Ética e pela Lei (art. 154 do Código Penal) a guardar segredos sobre todas as confidências recebidas e fatos de que tenha conhe‑cimento ou haja observado no exercício de sua atividade profissional, obrigando-se a exigir o mesmo segredo de todos os seus colaboradores. (CFAS, 1965, p. 3)

A permissão da revelação de um segredo profissional, previsto nesta norma‑tiva, era concedida apenas para “evitar um dano grave, injusto e atual ao próprio cliente, ao assistente social, a terceiros e ao bem comum” e “após terem sido em‑pregados todos os recursos e todos os esforços, para que o próprio cliente se dis‑ponha a revelá-lo”, dentro do estritamente necessário, conforme preceituava os parágrafos 1º, 2º e 3º do artigo 15º do dito Código. A questão do sigilo profissional nesse Código representava uma obrigação moral e legal ao(à) assistente social.

No Código seguinte, de 1975, o(a) assistente social deveria observar o segre‑do profissional no seu exercício, sobre todas as confidências recebidas, fatos e

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observações escolhidas no seu exercício, abstendo-se de transcrever informações de natureza confidencial, e tal como previsto no Código de Ética anterior, era ad‑missível a quebra de sigilo apenas quando pudesse causar um dano grave ao “clien‑te”, ao assistente social ou ao bem comum.

Para Barroco (2010), o Código de Ética de 1986 tornou-se uma marca da opção da profissão por uma prática vinculada aos interesses da classe trabalhadora, o que fica evidenciado no parágrafo primeiro do artigo 4º do referido Código: “A quebra do sigilo só é admissível, quando se tratar de situação cuja gravidade possa trazer prejuízos aos interesses da classe trabalhadora” (CFAS, 1986, p. 4).

No que estabelece o atual Código de Ética Profissional do Assistente Social (1993), a revelação do sigilo profissional implica uma falta que tem sanções disci‑plinares. Nesse Código de Ética, o seu capítulo V trata diretamente do sigilo pro‑fissional como direito e dever profissional, sendo que o artigo 18 estabelece: “A quebra do sigilo só é admissível, quando se tratar de situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer prejuízos aos interesses do usuário, de terceiros ou da coletividade”. No parágrafo único diz que a revelação será feita dentro do estritamente necessário. Tem-se ainda o Capítulo VI, das relações do assistente social com a justiça, em que o profissional pode declarar obrigação com a guarda do sigilo profissional. Quer dizer, não se trata apenas de um direito, mas de uma obrigação.

Barroco e Terra (2012, p. 92) afirmam que “o sigilo profissional é parte de todas as profissões liberais e sua polêmica decorre da possibilidade da quebra do sigilo, pois coloca dúvidas acerca de sua justificação, em outras palavras: em quais situações seria correto quebrar o sigilo?”

É possível acontecer situações em que o sigilo profissional se opõe à requisi‑ção institucional formulada, geralmente apresentada como motivo legítimo. Mas o que é um motivo legítimo?

Sobre isso é ilustrativo o ocorrido entre 1830-36, no momento revolucionário francês de construção republicana, em que os monarquistas, representantes da ordem social vigente, exigiram que lhes fossem repassados os nomes dos insurgentes que se socorreram em um hospital de Paris. O responsável pelo hospital respondeu o seguinte à exigência feita: “Eu não vi nenhum insurgente em meu hospital, vi ape‑nas feridos”.4

4. “Je n’ai pas vu d’insurgés dans mes saltes d’ hôpital, je n’ai vu que des blessés”. Dupuytren, Biblio‑thèque Nationale de France. Disponível em: <http://catalogue.bnf.fr/ark:/12148/cb32798517r>. Acesso em: 4 nov. 2013.

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Não são raras as vezes em que o assistente social se encontra diante do con‑flito sobre qual a melhor decisão a ser tomada. Esses conflitos supõem valores que podem se contrapor ao instituído, que podem estar em desacordo com a sua equipe de trabalho, bem como com a instituição empregadora. Esses conflitos se colocam no coração da ética, suscitados pela pergunta “o que fazer?” Implica tanto decidir em nome de um princípio, como também estar ciente da responsabilidade por sua decisão e as suas consequências.

Segundo Silva (2007), para explicitar a ética (que está implícita na prática profissional) será necessário refletir sobre os valores pelos quais os assistentes sociais desenvolvem suas ações, perceber qual o significado desses valores para si, bem como as finalidades e repercussões de sua intervenção, ou seja, analisar a adequação dos atos às consequências que os mesmos podem produzir.

Consequentemente, o profissional, adotando um posicionamento ético-político, deve analisar as atribuições que lhe são confiadas, compreender as problemáticas que se colocam na sua ação, as atividades que desenvolve, i.e., verificar quais os valores subjacentes à sua intervenção de modo a incorporá-los na sua prática quotidiana, terá igualmente que estar ciente de que as tomadas de decisão proporcionam o apareci‑mento de dilemas, visto, em muitos casos, qualquer que seja a “escolha”, esta pressu‑põe como resultado uma ação indesejada. (Silva, 2007, p. 107; grifo do autor)

Uma decisão ética resulta de uma deliberação, de uma escolha consciente diante da pluralidade de elementos que envolvem determinada questão. Sendo que sua decisão terá implicações para si mesmo, para o usuário do serviço, para a ins‑tituição e para o conjunto da sociedade. Por isso é preciso considerar a opinião do usuário, se a informação tratada é ou não confidencial, seu objetivo profissional, para que serve o compartilhamento de tal informação, e com quem compartilhá-la; e, ainda, o que é melhor para garantir determinado direito.

Na relação com o usuário, este deve ser colocado a par sobre a situação que demanda suas informações, para melhor se posicionar ou até mesmo se recusar a prestar as informações solicitadas. É importante que o usuário seja reconhecido como sujeito, de modo que tome conhecimento do conteúdo daquele trabalho e que as informações prestadas não serão banalizadas, ao contrário, pois estão sendo ditas a um profissional que possui qualificação, competência e ética profissional, o que pode permitir a construção de uma relação de confiança mútua.

Reforça-se o termo confiança mútua para dizer também que as pessoas con‑cernentes, em geral aquelas que sofrem de diferentes tipos de privação, principal‑

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mente a falta dos direitos sociais, têm igualmente direito ao respeito, no avesso do que lhe são comumente destinados, como a discriminação, a desconfiança, presu‑midas culpadas e perigosas. Não é apenas o dito que é matéria de sigilo. Algumas vezes nos deparamos com situações em que a palavra não é dita, mas é o corpo que fala por meio de gestos que mostram o constrangimento sofrido. Nesses casos, é o silêncio que aparece.

Considerações finais

O sigilo profissional não pode vir separado da reflexão ética, como se fosse uma simples questão técnica ou mesmo procedimental. As questões que despertam e os dilemas que apresentam ao cotidiano do exercício profissional impelem a ne‑cessidade de uma postura analítica da realidade, da clareza do objetivo profissional, que não se deixe burocratizar ou tecnificar, de ações norteadas por princípios éticos no lugar de preconceitos, e de uma competência que não reforce a subalternidade dos usuários do Serviço Social, ao contrário, construa possibilidades de reconhe‑cimento de direitos.

Nesses termos, a ética recoloca a necessidade da reflexão e da crítica, fazendo ver que nem a moral e nem a lei são dados a-históricos, naturais e imutáveis. Ela perpassa todos os campos que estruturam a sociedade, pois que estes são igualmen‑te produto e produtores das ações dos sujeitos. A ética interroga as leis, as compe‑tências e qualificações profissionais, conforma uma deontologia profissional. E, sobretudo, nos pergunta o que estamos fazendo de nós mesmos?

A ética e a política possuem uma relação ineliminável, pois a resposta à per‑gunta “o que fazer?” sempre é acompanhada da não menos difícil reflexão sobre “o que eu posso fazer?”. Porém nesse caso o poder não é apenas o lugar do insti‑tuído e da autoridade, mas verbo presente no constante processo de construção de autonomia profissional.

Recebido em 7/11/2013 ■ Aprovado em 2/12/2013

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Referências bibliográficas

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CENEVIVA, Walter. Segredos profissionais. São Paulo: Malheiros Editores, 1996.

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SAMPAIO, Simone Sobral. A questão social na sua versão midiática. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISADORES EM SERVIÇO SOCIAL, 10., Anais..., Recife, 2006.

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MEC - MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA

UFF - UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PURO - PÓLO UNIVERSITÁRIO DE RIO DAS OSTRAS

RIR - DEPARTAMENTO INTERDISCIPLINAR DE RIO DAS OSTRAS

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

O SIGILO PROFISSIONAL DOS

ASSISTENTES SOCIAIS:

Um estudo dos Códigos de Ética e da concepção de

profissionais

Rio das Ostras

2011

2011

2011

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PÓLO UNIVERSITÁRIO DE RIO DAS OSTRAS

DEPARTAMENTO INTERDISCIPLINAR DE RIO DAS OSTRAS

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

RAYANNE DANIELLE COSTA CARDOSO DE OLIVEIRA

O SIGILO PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS: Um estudo dos Códigos de Ética e da concepção de profissionais

Rio das Ostras, dezembro de 2011.

2

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PÓLO UNIVERSITÁRIO DE RIO DAS OSTRAS

DEPARTAMENTO INTERDISCIPLINAR DE RIO DAS OSTRAS

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

RAYANNE DANIELLE COSTA CARDOSO DE OLIVEIRA

O SIGILO PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS: Um estudo dos Códigos de Ética e da concepção de profissionais

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como

requisito parcial para a obtenção do título de

bacharel em Serviço Social pela Universidade

Federal Fluminense – Polo Universitário de Rio das

Ostras.

Orientadora: Profª. Mariana Pfeifer

Rio das Ostras, dezembro de 2011.

3

RAYANNE DANIELLE COSTA CARDOSO DE OLIVEIRA

O SIGILO PROFISSIONAL DOS ASSISTENTES SOCIAIS: Um estudo dos Códigos de Ética e da concepção de profissionais

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado e aprovado como requisito parcial para a

obtenção do título de Bacharel em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense, Polo

Universitário de Rio das Ostras.

Monografia aprovada em ____/____/____

Banca Examinadora

____________________________________

Profª. Msc. Mariana Pfeifer

Orientadora

Universidade Federal Fluminense

____________________________________

Profª Dra. Cristina Maria Brites

Examinadora

Universidade Federal Fluminense

_____________________________________

Profª. Msc. Lúcia Maria da Silva Soares

Examinadora

Universidade Federal Fluminense

4

Dedico este trabalho ao meu Deus e Senhor, que me

deu forças pra eu que chegasse até aqui, e que

bondosamente conduziu meus passos não me

deixando desistir.

5

AGRADECIMENTOS

A Deus pelo dom da minha vida, por toda a presença que tem no meu viver, sobretudo por te

me concedido a graça de cursar uma Universidade Federal.

Aos meus pais, Sr. Marcelo e Sra. Elizangela, pela educação que me deram, pela dignidade da

formação do meu caráter e pelo amor que sempre me concederam. A minha mãe que sempre

acreditou no meu potencial, e ao meu pai, pelo auxilio na escolha da profissão, pela ajuda

material com a impressão dos trabalhos e pelo apoio de sempre. Aos dois todo meu

amor!Obrigada por tudo.

Ao meu amor e companheiro Jodemilson, pelo seu amor, carinho, compreensão, por todo

incentivo e força para que eu concluísse a faculdade. Eu te amo muito! Obrigada!

Ao meu irmão que gentilmente abaixou o som todas as vezes que eu precisava estudar, e pelas

suas críticas que contribuíram de forma construtiva no meu pensamento e postura enquanto

profissional.

Aos professores que contribuíram transmitindo o conhecimento necessário para minha

formação acadêmica.

A minha orientadora Mariana Pfeifer, que surpreendeu todas as minhas expectativas, e que

contribuiu de forma muito positiva, não me deixando desistir e me dando ânimo para que eu

concluísse mais essa etapa na minha vida. Obrigada Mariana!

A todos os meus amigos e amigas, as que fiz ao longo da vida acadêmica pela partilha de

todos os momentos da minha formação, e a todos os amigos que sempre estiveram ao meu

lado. Raiana, Caroline, Bianca, Fernanda, amigas que estão sempre comigo, obrigada por

tudo, minhas irmãs! Obrigada Raiana pela paciência de ouvir, que a culpa é do sistema e que

esse sistema tem que acabar.

A todos que fazem parte da minha vida, e que de alguma forma contribuíram para a conclusão

dessa jornada.

6

“Só há duas opções nesta vida: se resignar ou

se indignar. E eu não vou me resignar nunca”.

Darcy Ribeiro

7

RESUMO

O objetivo deste trabalho é discutir e analisar o sigilo profissional do Assistente Social

brasileiro nos diferentes contextos históricos, teórico-metodológicos, ético-políticos e

normativo. Para tal se faz necessário, conhecer o contexto histórico, teórico-metodológico e

ético-político no qual se inserem os Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro; analisar as

concepções de Sigilo Profissional nos Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro dos anos

de 1947, 1965, 1975, 1986 e 1993 e compreender o entendimento que os Assistentes Sociais

têm acerca do Sigilo Profissional. Neste processo, será mostrado o contexto que se deu o

surgimento do Serviço Social no Brasil, e a primeira formulação ética de normatização no ano

de 1947, logo após a atuação do Serviço Social entre os anos de 1950 e 1970 e os Códigos de

Ética de 1965 e 1975, a ditadura militar, o movimento de reconceituação e os Códigos de

Ética de 1986 e 1993. A fim de analisar a concepção do sigilo do Serviço Social brasileiro, há

a criação de alguns indicadores e critérios para esta análise. E por fim, com o objetivo de dar

um enfoque mais específico, que se aproxime mais da realidade, foi realizada uma entrevista

com três profissionais de Serviço Social, sendo duas professoras do Curso de Serviço Social e

uma Agente Fiscal do Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro, para levantar

as concepções que estas têm acerca do que é o sigilo profissional, o que se entende por quebra

do sigilo profissional, e outras questões que determinam a abordagem do sigilo profissional

no âmbito do exercício da profissão.

Palavras-Chave: Sigilo profissional, Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro, exercício

profissional.

8

LISTA DE SIGLAS

ABAS - Associação Brasileira de Assistentes Sociais

ABESS- Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social

ABEPSS- Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social

CFAS- Conselho Federal de Assistentes Sociais

CFESS- Conselho Federal de Serviço Social

CRAS- Conselho Regional de Assistentes Sociais

CRESS- Conselho Regional de Serviço Social

9

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Terminologia utilizada nos Códigos de Ética relativos ao Sigilo ..................... 27

Tabela 2 – Sigilo enquanto direito ou dever do Assistente Social ...................................... 32

Tabela 3 – Forma como aparece a noção de dever e de direito ao Sigilo ........................... 33

Tabela 4 – Terminologia utilizada nos Códigos relativas Usuário ..................................... 35

10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 11

1 OS CÓDIGOS DE ÉTICA DO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO: UM RESGATE

HISTÓRICO E TEÓRICO-METODOLÓGICO ............................................................................ 13

1.1 Surgimento do Serviço Social no Brasil e a primeira formulação ética de 1947 ........................ 13

1.2 Atuação do Serviço Social entre 1950 e 1970 e os Códigos de Ética de 1965 e 1975 ............... 17

1.3 Ditadura Militar, Movimento de Reconceituação e os Códigos de Ética de 1986 e de 1993 ..... 22

2 O SIGILO PROFISSIONAL NOS CÓDIGOS DE ÉTICA DO SERVIÇO SOCIAL

BRASILEIRO: UMA ANÁLISE COMPARATIVA ....................................................................... 26

2.1 Terminologia utilizada: Sigilo e segredo .................................................................................... 27

2.2 Informações consideradas Sigilosas ........................................................................................... 28

2.3 Possibilidades de quebra do Sigilo Profissional ......................................................................... 29

2.4 Sigilo Profissional diante de depoimento judicial ou policial ..................................................... 31

2.5 Sigilo Profissional enquanto direito e/ou dever do Assistente Social ......................................... 32

2.6 Terminologia utilizada com relação ao usuário .......................................................................... 35

2.7 A questão da interdisciplinaridade .............................................................................................. 36

2.8 Resoluções que abordam temas relativos ao Sigilo Profissional ................................................ 37

3 A CONCEPÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS ACERCA DO SIGILO .................................. 40

3.1 Metodologia utilizada para realização das entrevistas ................................................................ 40

3.2 Resultados das Entrevistas ......................................................................................................... 41

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................. 51

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 53

11

INTRODUÇÃO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso está inserido como exigência parcial de

obtenção do título de Bacharel em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense.

A atuação como estagiária de Serviço Social do Programa DST/AIDS do município de

Macaé/RJ, me fez debruçar em uma realidade de usuários soropositivos marcados pelo

estigma de preconceito que sofrem pela sociedade. Sendo assim, todos os funcionários do

Programa têm o dever ético do Sigilo com relação aos pacientes da Instituição. Ao me deparar

com esta realidade, no decorrer de todo o Estágio a questão do Sigilo Profissional no âmbito

da atuação do Serviço Social sempre foi algo que me questionou e foi objeto de reflexão antes

mesmo de entrar no campo de Estágio, sobretudo, nas aulas da Disciplina de Ética e Serviço

Social e Estágio Supervisionado em Serviço Social. Desta forma, o tema deste trabalho é o

Sigilo Profissional, a forma como esse aspecto ético foi abordado ao longo da trajetória do

Serviço Social, e os desafios atuais de resguardá-lo em face das condições cada vez mais

precárias de trabalho das quais se deparam os Assistentes Sociais.

A relevância acadêmica do tema deve-se ao fato da escassez de material sobre o

assunto, apesar de existir produção acadêmica acerca de reflexões e questionamentos postos

ao profissional de Serviço Social nos dias atuais, principalmente no que diz respeito às

precárias condições de trabalho que consequentemente rebate na qualidade do atendimento

prestado ao usuário. O Sigilo sempre foi abordado nos códigos de ética profissional com certa

relevância. No cotidiano de trabalho os Assistentes Sociais sempre se deparam com situações

em que devem guardar Sigilo ou situações de precariedade das condições de trabalho onde o

Sigilo é ameaçado, como salas inadequadas, inexistência de arquivo com chave para guardar o

material, entre outros, mesmo com a regulamentação das resoluções expedidas pelo CFESS e

as diretrizes contidas no Código de Ética profissional de 1993, conforme a discussão proposta

por Forti (2009): “Contudo, embora identifiquemos a importância dos Princípios e /ou

referências contidos nesse documento, sabemos que esses só ganham significado, só podem

ser objetivados, no âmbito das situações concretas, ou seja, cotidiano do exercício

profissional” (FORTI, 2009, p.122).

O tema do Sigilo possui pouca bibliografia a respeito, pois foi realizada pesquisa

bibliográfica em revistas e livros de produção teórica sobre o Serviço Social e não foi

encontrado nenhum material que discutisse diretamente e em profundidade o Sigilo

12

profissional no âmbito do Serviço Social, sendo assim, o estudo dos Códigos de Ética

profissional do Serviço Social brasileiro serviram como instrumento de análise para a

realização desse trabalho.

Neste sentido, o objetivo geral desse trabalho é discutir e analisar o Sigilo profissional

do Assistente Social brasileiro nos diferentes contextos históricos, teórico-metodológicos,

ético-políticos e normativo. Este se desdobra nos seguintes objetivos específicos: conhecer o

contexto histórico, teórico-metodológico e ético-político no qual se inserem os Códigos de

Ética do Serviço Social brasileiro; analisar as concepções de Sigilo Profissional nos Códigos

de Ética do Serviço Social brasileiro dos anos de 1947, 1965, 1975, 1986 e 1993; e

compreender o entendimento que os Assistentes Sociais têm acerca do Sigilo Profissional.

A metodologia utilizada para esta pesquisa foi a análise documental, com o objetivo de

identificar as concepções do Sigilo nos Códigos de Ética do Assistente Social, tais como a

terminologia utilizada com relação ao Sigilo, informações consideradas Sigilosas,

possibilidades de quebra do Sigilo profissional, Sigilo profissional diante de depoimento

judicial ou policial, Sigilo profissional enquanto direito e/ou dever do Assistente Social,

terminologia utilizada com relação ao usuário e a questão da interdisciplinaridade. A análise

foi realizada estritamente sobre os artigos que tratam ou trazem elementos acerca do Sigilo

profissional. E ainda, foram realizadas entrevistas com dois professores do Curso de Serviço

Social e uma Agente Fiscal do CRESS-RJ para identificar sua compreensão acerca do Sigilo

Profissional.

No primeiro capítulo, é feito um resgate histórico e teórico-metodológico do

surgimento do Serviço Social no Brasil e a primeira formulação ética de 1947, a atuação do

Serviço Social entre os anos de 1950 e 1970 e os Códigos de Ética de 1965 e 1975, e a

ditadura militar, o movimento de reconceituação e os Códigos de Ética de 1986 e de 1993. No

segundo capítulo é feita uma análise comparativa dos Códigos de Ética do Serviço Social

brasileiro, segundo os indicadores de análise supramencionados. E no terceiro e último

capítulo, a concepção de Sigilo dos Assistentes Sociais conforme entrevistas realizadas,

apresentando a metodologia utilizada para a realização das entrevistas e a análise das mesmas.

13

1 OS CÓDIGOS DE ÉTICA DO SERVIÇO SOCIAL BRASILEIRO: UM RESGATE

HISTÓRICO E TEÓRICO-METODOLÓGICO

Neste primeiro capítulo, me proponho a discorrer sobre o contexto histórico e teórico-

metodológicos vivenciados pela profissão e relacionados aos Códigos de Ética do Serviço

Social em qual contexto estes se inserem, uma vez que também refletem a conjuntura

histórica do país na época. Para isso, se faz necessário contextualizar o surgimento do Serviço

Social no Brasil de acordo com a conjuntura social e política naquele momento histórico.

1.1 Surgimento do Serviço Social no Brasil e a primeira formulação ética de 1947

Segundo Iamamoto (1981), o Serviço Social brasileiro surge em um contexto no qual a

expansão do capitalismo e a constituição do mercado estão em grande desenvolvimento nos

centros urbanos. Ou seja, passa a necessitar cada vez mais de uma mercadoria vital para o seu

funcionamento: a força de trabalho. Sendo assim, o operário tem na venda de sua força de

trabalho o meio que garantirá a sua sobrevivência. A exploração da força de trabalho do

operário torna-se abusiva, consubstanciando grande precariedade nas condições de vida e

trabalho da população trabalhadora do país, desta forma o operariado trava uma luta contra a

classe burguesa, para a garantia e ampliação de suas condições de existência. Ao passo que a

luta do operariado se desenvolve, esta passa a ser para a burguesia “uma ameaça a seus mais

sagrados valores, a moral, a religião e a ordem pública” (IAMAMOTO, CARVALHO, 1981,

p.126). Então, a partir deste momento a compra e venda da força de trabalho passa a ser,

progressivamente, alvo de uma regulamentação jurídico-política feita pelo Estado.

Essa regulamentação tem nas leis trabalhistas e sociais sua parte fundamental, sendo

colocadas a partir do momento em que as condições insalubres de vida e de trabalho do

operariado são desveladas para sociedade brasileira através das lutas sociais articuladas em

torno dos sindicatos e partidos operários. Assim sendo, diversas classes e frações de classes

dominantes, o Estado e a Igreja começam a se posicionar em face da “questão social”, e com

14

o desdobramento desta e a entrada do operariado no cenário político, há a necessidade de seu

reconhecimento pelo Estado e de implementação de políticas sociais que considerem seus

interesses. Além disso, a “questão social” passa a constituir-se fundamentalmente na

contradição entre burguesia e proletariado, ou seja, como parte intrínseca da sociedade

capitalista. Netto (2001), à luz do pensamento de Marx pontua que:

O desenvolvimento capitalista produz, compulsoriamente, a “questão social”-

diferentes estágios capitalistas produzem diferentes manifestações da “questão

social”; esta não é uma sequela adjetiva ou transitória do regime do capital: sua

existência e suas manifestações são indissociáveis da dinâmica específica do capital

tornado potência social dominante. A “questão social” é constitutiva do

desenvolvimento do capitalismo (NETTO, 2001, p.45).

O surgimento do Serviço Social se dá nesse contexto histórico, através da iniciativa de

grupos que se posicionam, sobretudo, vinculados à Igreja Católica. Sua legitimação enquanto

profissão está sustentada em grupos restritos da classe dominante, e sua especificidade está na

ausência de uma demanda que emane dos grupos aos quais se destina essencialmente.

Além disto, sustentam Iamamoto e Carvalho (1981) que o surgimento do Serviço

Social se dá em um momento de transformações vivenciadas no país. A crise internacional de

1929 e o movimento de outubro de 1930 geram um processo de reorganização no âmbito

estatal e econômico, acelerando a alocação da atividade central de agroexportação da

acumulação capitalista para outras de caráter interno. Em contrapartida, no decorrer das

décadas de 1920 e 1930, a pressão feita pelo movimento operário permanecerá como pedra de

toque através da qual as frações de classes sociais irão desenvolver políticas distintas, para o

enfretamento das questões levantadas pelo proletariado. Tais políticas delimitarão os limites

em que atuará o Serviço Social: a repressão e a caridade. Repressão, pois o Estado incapaz de

implementar políticas sociais que atendessem as demandas emanadas do proletariado, tratará

violentamente com a repressão policial suas reivindicações, como forma de manter a “ordem

social” necessária para o desenvolvimento do capitalismo. E caridade, pois contará com

práticas assistencialistas, como caixas de auxílio e assistência mútua, incentivadas pelo

empresariado e, sobretudo, pela Igreja, como forma de atenuar as tensões sociais.

Assim, segundo Iamamoto e Carvalho (1981) é no âmbito da Igreja com o movimento

católico leigo, que surge o Serviço Social como departamento especializado da Ação Social,

tendo como base a doutrina social da Igreja. Através do movimento laico católico as

iniciativas sociais se multiplicarão, no que diz respeito ao trato da “questão social”, no qual a

Igreja tentará atenuar as sequelas deixadas pelo desenvolvimento do capitalismo. Na década

de 1930, a Igreja se articula com o Estado para resguardar a “ordem social” fundamentando

15

esta articulação com ações universitárias católicas, Instituições de Estudos superiores,

Sindicalismo católico, entre outros.

Neste contexto surge o Centro de Estudo e Ação Social de São Paulo (CEAS), que

pode ser considerado a primeira manifestação do Serviço Social no Brasil. A criação dos

CEAS foi uma espécie de condensação das necessidades da ação católica em responder a

filantropia das classes dominantes e seu objetivo central era o de “promover a formação de

seus membros pelo estudo da doutrina social da Igreja e fundamentar sua ação nessa formação

doutrinária e no conhecimento aprofundado dos problemas sociais” (CEAS Apud

IAMAMOTO, 1981, p.169)

Havia também um sentido nessa ação social, o de intervir diretamente no proletariado,

visando afastá-lo de influências subversivas. O CEAS era formado por moças católicas, pois

viam na mulher a vocação para a caridade e que a mulher seria capaz de preservar a ordem

moral e social em sua intervenção. Segundo Iamamoto e Carvalho:

As atividades do CEAS se orientarão para a formação técnica especializada de

quadros para a ação social e a difusão da doutrina social da Igreja. Ao assumir essa

orientação, passa a atuar como dinamizador do apostolado laico através da

organização de associações para as moças católicas e para a intervenção direta junto

ao proletariado (IAMAMOTO, CARVALHO, 1981, p.173).

Assim, no ano de 1936 a partir das ações desenvolvidas pelo CEAS e o apoio da

hierarquia católica que será fundada a primeira Escola de Serviço Social de São Paulo. O

Serviço Social em seu surgimento relaciona-se profundamente com a ação social e política da

Igreja, que naquele momento lutava para assumir novamente sua influência e prestígio na

sociedade brasileira. Em sua ideologia, está envolto de uma doutrina social totalitária, em um

movimento de recristianização da sociedade através de um capitalismo modificado que

enquadrasse as classes subalternas afastando-as do pensamento socialista, introduzindo o

comunitarismo ético cristão, tendo como base o neotomismo, segundo Brites e Sales (2000),

pode assim ser definido como a base filosófica da doutrina da Igreja Católica que surge no

final do século XIX. Consiste em retomar as idéias mais fundamentais de São Tomás de

Aquino, somado a uma visão conservadora de mundo. Tem forte influência européia no que

diz respeito a algumas características assumidas pelos pioneiros do Serviço Social brasileiro

como o autoritarismo, paternalismo, doutrinarismo e ausência de base técnica que irá marcar

as primeiras ações desenvolvidas pelos núcleos formados em São Paulo e no Rio de Janeiro,

onde nesta última, a escola é criada em 1937.

A profissão vai se constituir por mulheres das frações das classes dominantes, que se

16

reúnem a partir de seu engajamento no âmbito católico. Seu modo de ver o mundo está

diretamente relacionado com a ideologia da classe dominante, o que reflete não só sua

inserção aos princípios católicos, mas também de sua origem de classe, no viés conservador,

de estabelecimento e manutenção da “ordem” para o desenvolvimento do sistema capitalista.

A atuação do Serviço Social é bem delimitada, tem por objetivo ajustar os indivíduos ao

considerado como normal, remediando tanto suas deficiências como as da coletividade,

"quando se dirige ao ajustamento de um determinado quadro, ele o faz para sanar deficiências

acidentais, decorrentes de certas circunstâncias, e não de um defeito estrutural"

(IAMAMOTO, CARVALHO, 1981, p. 202-203). Ao mesmo tempo em que sua atuação

concorre para garantir ao trabalhador e sua família um nível moral, físico e econômico

considerados “normal” de vida, deveria combater o relaxamento no trabalho, zelar pela

moralidade e adaptar o trabalhador a sua função no trabalho, como pontua muito bem

Iamamoto:

A profissão não se caracteriza apenas como nova forma de exercer a caridade, mas

como forma de intervenção ideológica na vida da classe trabalhadora, com base na

atividade assistencial; seus efeitos são essencialmente políticos: o enquadramento

dos trabalhadores nas relações sociais vigentes, reforçando a mútua colaboração

entre capital e trabalho (IAMAMOTO, 1992, p.20).

No que diz respeito à produção teórica do Serviço Social e a ética profissional, esta é

reflexo do humanismo cristão, qualidade necessária aos que pretendiam se inserir na profissão

de Serviço Social. O Assistente Social deveria ser uma pessoa íntegra moralmente, com

capacidade de devotamento e amor ao próximo, simplicidade, sociabilidade, calma, simpatia,

e com poder de convencimento.

Tinha como dimensão ético-política da profissão, a legitimação de uma suposta face

humanitária do Estado e do empresariado. Como princípios e diretrizes ético-morais, o

respeito à lei de Deus, o bem comum, a dignidade da pessoa humana, a caridade cristã, e

compreendia que o Serviço Social lida com pessoas humanas desajustadas. Sendo assim,

Uma primeira formulação ética do Serviço Social Brasileiro data de 1947 e consistiu

numa resposta à exigência de configuração de uma axiologia, isto é, da explicitação

de um corpo de valores com os quais os profissionais se comprometiam, para fins da

regulamentação do exercício profissional (BRITES, SALES, 2000, p.27).

Em sua elaboração e texto, o Código de Ética de 1947, é reflexo da ideologia que

sustentava a atuação do Serviço Social na época, como por exemplo, na Secção I, dos Deveres

Fundamentais, o Artigo I indica: “Cumprir os compromissos assumidos, respeitando a lei de

17

Deus, os direitos naturais do homem, inspirando-se, sempre em todos seus atos profissionais,

no bem comum e nos dispositivos da lei, tendo em mente o juramento prestado diante do

testemunho de Deus”. E também na Secção II, dos Deveres para com o beneficiário do

Serviço Social, o Artigo 1 indica: “Respeitar no beneficiário do Serviço Social a dignidade da

pessoa humana, inspirando-se na caridade cristã” (ABAS, 1947, p.1).

1.2 Atuação do Serviço Social entre 1950 e 1970 e os Códigos de Ética de 1965 e 1975

Segundo Iamamoto e Carvalho (1981), no decorrer da década de 1940 até a metade da

década de 1950, a economia brasileira mostra taxas de crescimento graças a muitos fatores,

sobretudo, a melhoria nas relações de intercâmbio com o exterior, que é seguido de medidas

de política econômica que objetivam o desenvolvimento da industrialização. Apesar das taxas

de crescimento positivas, algumas consequências negativas advêm desse processo, como, o

crescimento da dívida externa, percebida a partir do ano de 1955, no qual há uma constante

luta por definição de opções que objetivavam criar condições favoráveis para a expansão

econômica, no interior do chamado “capitalismo dependente”. Todos esses elementos fazem

parte das condições concretas que geram a ideologia desenvolvimentista e marcam suas

principais vertentes.

Conforme Iamamoto e Carvalho (1981), com a eleição de Juscelino Kubitschek a

presidência da República, a ideologia desenvolvimentista se tornará dominante, e será base de

uma nova estratégia que aglutina o pensamento da política getulista e a abertura para a

internacionalização da economia do país. O desenvolvimentismo tem como aspecto mais

importante a proposta de um crescimento econômico continuado, acelerado e auto-sustentado,

com vistas a superar o período de atraso e subdesenvolvimento. Assim, a ideologia

desenvolvimentista pode ser definida pela busca da expansão econômica nacional, no sentido

de prosperidade, grandeza material, riqueza, em um ambiente de paz e ordem social, no qual

todo esforço de elaboração de política econômica e trabalho são feitos para eliminar o

pauperismo, a miséria, elevando o nível de vida população, como consequência do

crescimento econômico. Sendo assim, como já mencionado, o problema a ser combatido era o

atraso do desenvolvimento econômico brasileiro, o que é explicitado por sua posição

18

secundária dentro do sistema capitalista, que pode ser entendido pelo fato da predominância

do modelo agroexportador, ou o fraco desenvolvimento industrial do país. Neste sentido, a

meta principal é investir na industrialização de base do país, de forma maciça, que garantirá a

contínua expansão. Para alcançar tal meta, não se faz necessário questionar a presença do

capital estrangeiro, pelo contrário, o apoio internacional é importante para o processo de

expansão da economia. O objetivo dessa expansão econômica não era abranger determinados

setores ou classes, mas sim o conjunto da sociedade. Para isto, mobilizaria a coletividade, pois

desta forma, a ideologia desenvolvimentista seria um ponto de convergência entre o Estado e

o povo, no qual a riqueza gerada seria o patrimônio de todos.

Contudo, apesar da ideologia desenvolvimentista ser dominante nesta época, o Serviço

Social permanecerá, até o final da década de 1950, alheio a toda essa ideologia. Isto ocorre

por muitos motivos, conforme explicita Iamamoto & Carvalho:

Num primeiro nível, o fato de o desenvolvimentismo juscelinista subordinar a

resolução da totalidade dos problemas ao da expansão econômica; o fato de o social,

dos diversos campos em que este se subdivide aparecer como variável dependente –

e ter por eixo de suas políticas específicas a potencialização do desenvolvimento

econômico – explicitam uma larga diferenciação de objetivos. Ao centrar a

perspectiva de integração das massas marginalizadas nas virtualidades da expansão

econômica, para a qual se orientam os esforços da política econômica e social,

restringe-se o espaço para um reforço da ação assistencial, e, portanto, a

possibilidade de sua incorporação àquelas políticas (IAMAMOTO, CARVALHO,

1981, p. 342).

Para os Assistentes Sociais é um momento de consolidação importante de posições e

campos de atuação, no âmbito do aparato social e assistencial. Este foi um momento de

desenvolvimento, absorção, aprofundamento e institucionalização do Serviço Social enquanto

profissão. Data desta época também, a abertura de um amplo e novo campo para a atuação do

Serviço Social: as empresas, sobretudo, as indústrias. Concomitante a este processo, é um

momento também de sistematização teórica e técnica das suas funções, objetivando definir

áreas específicas de atuação técnica. Há também um aprofundamento no âmbito do ensino em

Serviço Social, que se em seus primórdios é marcada pela influência européia, sobretudo

franco-belga, neste momento a influência passa a ser a do viés norte-americano, no qual a

atuação dos Assistentes Sociais volta-se cada vez mais para o tratamento, na linha da

psicologia e psiquiatria, com os desajustamentos psicossociais, fundamentado na ideologia

positivista, através da atuação do Serviço Social com caso, grupo e comunidade, o qual

detalharei mais adiante. Cabe agora explicitar no que consiste o pensamento positivista que

será o pano de fundo ideológico e a base teórica que sustentará, sobretudo, a atuação do

19

Serviço Social de Caso.

Para o positivismo, a sociedade é regida por leis naturais, isto é, leis invariáveis,

independentes da vontade e ação humanas, na vida social, reina uma harmonia natural. Assim,

as ciências da sociedade, assim como as da natureza, devem limitar-se a observação e à

explicação causal dos fenômenos, de forma objetiva, neutra, excluindo qualquer possibilidade

de superação ou negação da ordem social estabelecida. Com base nesse pensamento, o

Serviço Social de Casos, segundo Hamilton, “caracteriza-se pelo objetivo de fornecer serviços

práticos e de aconselhamento, de tal modo que seja desenvolvida a capacidade psicológica do

cliente e seja levado a utilizar-se dos serviços existentes para atender a seus problemas”

(HAMILTON, 1958, p.38). Sendo assim, o objetivo principal é fazer com que o cliente se

adapte ao seu ambiente social, desvendando as causas psicológicas ou os fatores externos das

disfunções e fazer com que o indivíduo satisfaça suas necessidades e se relacione com o meio

da maneira mais adequada.

No que diz respeito ao Serviço Social de grupo, este consistia primeiramente na

aplicação de áreas de recreação, baseada na necessidade de uma ocupação adequada para as

horas de lazer, sobretudo à base de atividades sociais (como passeio e festas), educacionais

(cursos e palestras) e atividades esportivas. Tais grupos eram isolados, pois as atividades

estavam centradas nos interesses de cada grupo. Contavam com o patrocínio de alguma

entidade que programava as atividades que seriam realizadas pelo grupo.

A partir dos anos de 1960, a abordagem do Serviço Social de Grupo ganha aspectos e

objetivos distintos daqueles exercidos anteriormente. Segundo Vieira (1978) seu objetivo

passa a ser a capacitação do indivíduo para que este haja corretamente em seu meio social.

Conforme o documento de Araxá: “O Serviço Social de Grupo é um processo de Serviço

Social que, através de experiências propositadas, visa capacitar os indivíduos a melhorarem o

seu relacionamento social e enfrentarem do modo mais eficaz seus problemas pessoais,

grupais e comunitários” 1. Sendo assim, o objetivo é a transformação da situação em que se

encontra o grupo e seus membros, que pode ser interna ou externa. Interna quando diz

respeito à situação dentro do grupo e externa quando se refere às condições da organização ou

na comunidade. Visam atender, da melhor forma possível às necessidades e objetivos dos

membros. Segundo Vieira (1978, p.163), são os objetivos do Serviço Social com Grupos:

1) Ajudar o indivíduo a resolver problemas pessoais que não podem ser resolvidos por um tratamento individual, seja pela interferência de costumes ou tradições culturais, seja porque precisa de uma experiência de socialização;

1Documento de Araxá Apud Vieira, 1978, p.162.

20

2) Resolver problema de relacionamento ou de adaptação, ensinando o indivíduo a viver em sociedade, ajustá-lo a exigências da vida moderna, através de experiências planejadas, de modo a levá-lo a participar inteligentemente das atividades do grupo, e, assim, obter satisfação pessoal como membro de uma equipe. 3) Ajudar o grupo, como um todo, a atingir seus objetivos e desenvolver nesta experiência sua consciência social, cooperando com a organização que o abriga e com outros grupos na comunidade. Pode-se dizer, portanto, que o Serviço Social com Grupos é, tanto para o indivíduo como para o grupo, uma escola de democracia (VIEIRA, 1978, p.163).

Toda essa abordagem e intervenção com grupos são sustentadas pelas concepções

sociológicas fundamentalmente positivistas, pela constatação dos fatos, pela compreensão dos

fenômenos grupais e comportamentais dos indivíduos.

O desenvolvimento de Comunidade como um dos meios de intervenção do Serviço

Social, tem como foco a “comunidade em si”, seus problemas, necessidades, aspirações, e a

sua inserção nos planos de desenvolvimento do país, que se faz necessário nesse contexto, o

governo se alia ao esforço da população. É um processo multiprofissional e interdisciplinar,

no qual o Serviço Social se constitui como uma das profissões que integram esse

desenvolvimento.

Como resultado de um processo histórico, e do contexto sócio-histórico vivenciado

pela profissão na década de 1960, há a criação do Conselho Federal de Assistentes Sociais

(CFAS) aprovado pelo Decreto nº 994, de 15 de maio de 1962, e a regulamentação dos

Conselhos Regionais de Assistentes Sociais (CRAS). O Código de Ética de 1965 é reflexo

dos valores tradicionais de caráter conservador e cristão, sobre a atuação profissional,

confiante na “solidariedade entre classes” e consonante com o projeto reformista conservador.

Algumas características podem ser destacadas, como a defesa da tradição social, a ênfase na

família, valorização dos princípios da ordem, hierarquia e disciplina, entre outras. Isto pode

ser expresso no Artigo 6 que diz: “O Assistente Social deve zelar pela família, grupo natural

para o desenvolvimento da pessoa humana e base essencial da sociedade, defendendo a

prioridade dos seus direitos e encorajando as medidas que favoreçam a sua estabilidade e

integridade”, como também no Artigo 8: “O Assistente Social deve colaborar com os poderes

públicos na preservação do bem comum e dos direitos individuais, dentro dos princípios

democráticos, lutando inclusive para o estabelecimento de uma ordem social justa” e ainda no

Artigo 37 que diz que: “ Todo Assistente Social, mesmo fora do exercício de sua profissão,

deverá abster-se de qualquer ação que possa desaboná-lo, procurando firmar sua conduta

pessoal por elevado padrão ético, contribuindo para bom conceito da profissão” (CFAS, 1965,

p.7).

Conforme Brites e Sales:

21

A ética tradicional, pois, presente tanto no documento de 1947 quanto no Código de

1965, era apenas de caráter controlador e normativo, consistindo o código de ética

num instrumento essencialmente corporativo, que empreende por meios legais, a

adequação da prática profissional ao estabelecido, de forma conectada ao

coroamento filosófico da defesa do status quo (BRITES, SALES, 2000, p.29-30).

Segundo Brites e Sales (2000), no decorrer da década de 1960, opera-se uma mudança

no perfil profissional dos assistentes sociais, que vão se distinguindo das pioneiras da

profissão de características católicas e de cunho moral, origem burguesa e opção profissional

entendida como uma vocação. A partir desta época, os profissionais tornam-se advindos das

camadas médias da sociedade, o que é explicado pela expansão e consolidação do mercado de

trabalho e o assalariamento dos profissionais, tendência que se intensificará nos anos de 1970.

Brites e Sales ainda pontuam que:

Tais alterações no perfil dos assistentes sociais, articuladas aos desdobramentos

sócio-econômicos e político-culturais da década de 60 em todo o continente latino-

americano, contribuem para a emersão de um pluralismo profissional, que se

aprofunda em direções diferentes: uma voltada para o passado e com referência na

matriz conservadora e tradicional; outra ainda nessa direção, mas emoldurada pela

modernização; e por fim, aquela, que, ancorada na matriz crítico-dialética e com os

olhos postos no futuro, associar-se-á, em fins dos anos 70, às possibilidades de

ruptura com o tradicionalismo e à renovação profissional (BRITES, SALES, 2000,

p.30).

Porém, irá prevalecer até a década de 1980, “um projeto profissional que aprofunda os

vínculos do Serviço Social com o conservadorismo. Esse teor ídeopolítico se traduziu numa

concepção de prática profissional assentada em estratégias de controle, inculcação e

psicologização” (BRITES, SALES, 2000, p.31). Tal matriz conservadora é dotada de caráter

modernizador e tecnicista, o que será sistematizado nos Documentos de Araxá (1967) e

Teresópolis (1970). No âmbito das disposições ética e normativas, ele se materializa no

Código de Ética de 1975, mantidos os pressupostos filosóficos neotomistas. Ancorando-se em

Brites e Sales (2000):

No Código de Ética de 1975, aprofundaram-se, sobretudo, os vínculos teóricos

metodológicos do Serviço Social com o estrutural-funcionalismo, expressando o

adensamento da lógica racionalista, cientificista, asséptica e a-histórica, como

parâmetros técnico-operativos ao desencadeamento da prática profissional (BRITES,

SALES, 2000, p.34-35).

22

1.3 Ditadura Militar, Movimento de Reconceituação e os Códigos de Ética de 1986 e de

1993

O período que compreende o ano de 1964 até o ano de 1985 é o período de governo da

ditadura militar. Segundo Pereira (2000) tal período se caracterizou pelo modelo autoritário e

tecnocrático, e expressou explícita modificação no conteúdo estatal, deixando de ser

populista/desenvolvimentista, para tornar-se tecnocrático e centralizado sob o apoio da classe

média e burguesa e dominado pelas elites civis e militares. Foi seguido de reformas

institucionais que reestruturaram o aparelho estatal, enfatizando o planejamento direto, a

racionalização burocrática, e a hegemonia do saber técnico em detrimento da participação

popular. Além disto, no âmbito econômico, este foi concentrador e excludente, negando o

liberalismo conservador e dotado de algumas características como, o desprezo pela massa

popular, valorização do capital estrangeiro, intervenção do Estado na economia e na

sociedade, através de medidas como arrocho do salário, coibição dos sindicatos e proibição de

greves, estatização de áreas de infraestrutura, indústria pesada e insumos básicos (visando o

interesse dos investidores estrangeiros), entre outros.

Concomitante a vivência da ditadura militar no Brasil, no interior do Serviço Social é

um período de desenvolvimento importante da profissão. Conforme pontua Netto:

Do estrito ponto de vista profissional, o fenômeno mais característico desta quadra

relaciona-se à renovação do Serviço Social. No âmbito das suas natureza e

funcionalidade constitutivas, alteraram-se muitas demandas práticas a ele colocadas

e a sua inserção nas estruturas organizacional – institucionais (donde, pois, a

alteração das condições do exercício profissional); a reprodução da categoria

profissional – a formação dos seus quadros técnicos – viu-se profundamente

redimensionada (bem como os padrões da sua organização como categoria); e suas

referências teórico-culturais e ideológicos sofreram giros sensíveis (assim como as

suas auto-representações (NETTO, 2002, p.115).

Segundo Netto (2002), isto se deve ao fato de que a partir dos anos de 1960, a

inspiração marxista torna-se expressiva no âmbito dos Assistentes Sociais, de teor

notadamente crítico articulado sobre matrizes teóricas bem diversas. É importante destacar

que estas mudanças no interior da profissão não surgiram abstratamente. Faz parte de um

processo que emerge desde meados da década 1960, acarretada por uma série de fatores, que

favoreceram o surgimento dos movimentos sociais dos trabalhadores que reivindicavam a

implementação de políticas sociais para o atendimento de suas necessidades. Este contexto foi

extremamente favorável ao movimento de reconceituação das práticas profissionais

conservadoras. A partir de então a influência marxista emerge de forma mais clara para os

23

assistentes sociais.

Seguida da crise do regime ditatorial que é expresso por um contexto de luta pela

democratização da sociedade brasileira, foi propiciado um terreno fértil para o

aprofundamento do movimento de renovação do Serviço Social. O grande marco deste novo

período que se abre para a profissão é o III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, no

ano de 1979, que ficou mais conhecido como “Congresso da Virada”, pelo seu aspecto de

contestação e vontade de transformação da profissão. No âmbito da ética profissional,

conforme explicitam Brites e Sales (2000):

Há duas inflexões significativas, recentes, nos rumos da ética profissional no Brasil:

uma na segunda metade dos anos 80 e outra no início dos anos 90. A primeira diz

respeito à revisão do Código de Ética de 1975, na esteira dos acontecimentos da luta

pela redemocratização no país, da organização política da categoria, que inaugura

uma prática sindical em sintonia com a luta mais geral dos trabalhadores; e do

debate da formação profissional (BRITES, SALES, 2000, p.43).

Tendo o “Congresso da Virada” como fomentador, temos a partir de então,

decisivamente um acúmulo das reflexões investigativas sobre a formação, o que foi

incentivado pela Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social (ABESS) – atual

Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS) – que culminou

com a aprovação do Currículo de 1982 e a concretização teórica das exigências de um novo

perfil para o Assistente Social. Todos os avanços se articularam com as experiências da

prática que visavam a ruptura com Serviço Social tradicional. Temos assim, no âmbito da

profissão, assistentes sociais cada vez mais críticos, que começam a interagir com perspectiva

crítico-dialética (marxismo) e outras perspectivas teóricas críticas. A respeito da ruptura com

o Serviço Social tradicional Iamamoto (1992) pontua que:

A ruptura com a herança conservadora expressa-se como uma procura, uma luta por

alcançar novas bases de legitimidade da ação profissional do Assistente Social, que

reconhecendo as contradições sociais presentes nas condições do exercício

profissional, busca colocar-se,objetivamente, a serviço dos interesses dos usuários,

isto é, dos setores dominados da sociedade. Não se reduz a um movimento “interno”

da profissão. Faz parte de um movimento social mais geral, determinado pelo

confronto e a correlação de forças entre as classes fundamentais da sociedade, o que

não exclui a responsabilidade da categoria pelo rumo dado às suas atividades e pela

forma de conduzi-las (IAMAMOTO, 1992, p.37 – grifos no original).

Temos assim, como resultado desta perspectiva crítica de reflexão, no campo ético, a

revisão do Código de Ética de 1975, que engendrou um novo Código de Ética em 1986,

marcado pela recusa da neutralidade, pelo reconhecimento do aspecto político da profissão,

noção de historicidade e de determinação material como categoria fundante do ser social,

24

assim como colocou a objetivação dos sujeitos históricos que possam apreender suas

necessidades concretas, ultrapassando os valores do bem comum e da dignidade humana de

caráter conservador. A mudança que o Código de Ética de 1986 produziu, pode ser notada

logo em seu início, quando diz: “As idéias, a moral e as práticas de uma sociedade se

modificam no decorrer do processo histórico. De acordo com a forma em que esta se organiza

para produzir, cria seu governo, suas instituições e sua moral” (CFAS, 1986, p.7). É

irrefutável que a elaboração do Código de Ética de 1986 é fruto de avanços conquistados pela

categoria profissional, principalmente com relação à Instituição, os usuários e os demais

profissionais, conforme pontuam Brites e Sales (2000, p.48):

O reconhecimento dos direitos e das necessidades dos usuários dos serviços sociais

repercute diretamente na compreensão profissional acerca das demandas

institucionais colocadas à sua prática e da premência de alterar qualitativamente a

relação deste profissional com a Instituição, e com os demais profissionais. O que

impulsiona esta redefinição da correlação de forças no espaço institucional é a

consciência da importância de se imprimir uma nova direção social à prática

profissional. Esse redirecionamento ancora-se em referências políticas e econômicas

que permitem uma apreensão crítica acerca do complexo papel da intervenção do

Estado nas expressões da questão social, no âmbito da contraditória relação entre as

necessidades e interesses das classes. A esse respeito o Código estabelece, entre os

seus princípios e diretrizes, como um parâmetro decisivo na relação dos assistentes

sociais com a instituição, a expressar uma nova ética: “A contribuição na alteração

da correlação de forças no espaço institucional e o fortalecimento de novas

demandas de interesses dos usuários” (Código de 1986:8).

Com relação ao Código de Ética de 1993, este representa uma reafirmação dos

avanços conquistados pelo Código de Ética de 1986, bem como a proposição de algumas

alterações que expressam cada vez mais o amadurecimento teórico da categoria profissional,

tendo em vista a necessidade de explicitar o significado social da profissão e os rebatimentos

éticos de sua intervenção. Expressa o abandono da base filosófica conservadora, e o

reconhecimento pelo Serviço Social dos direitos de seus usuários, como também a

representação de um instrumento que irá normatizar a qualidade dos serviços prestados pelos

profissionais aos usuários, bem como a garantia de um direcionamento único para a totalidade

dos profissionais, apontando condições ideais de exercício profissional, no qual o foco é a

qualidade dos serviços prestados a população usuária. Neste sentido, o Código de Ética de

1986 mostrou-se incipiente, por isso a necessidade de sua revisão, conforme pontuam Brites e

Sales (2000):

Todavia, se o Código de 86, como se viu, buscou instituir no plano ético uma nova

legitimidade profissional, no lastro de acúmulo de uma massa crítica no âmbito da

formação e da organização política da categoria, mostrou-se frágil em sua

capacidade de embasar a operacionalização jurídica e política dos pressupostos

25

valorativos ali contidos. (BRITES, SALES, 2000, p.49):

Há também a efetivação de diretrizes para respostas profissionais e também do

processo de fiscalização da profissão, através de resoluções expedidas pelo Conselho Federal

de Serviço Social (CFESS), aos quais detalharei no segundo capítulo.

Presenciamos nos dias atuais conforme Iamamoto (2004), um período de regressão dos

direitos sociais em prol do capital e do mercado, orientado pela lógica neoliberal, de

diminuição da intervenção do Estado nas expressões da questão social, que se aprofundam e

se modificam, transferindo a responsabilidade para a iniciativa privada, como pontua

Iamamoto (2004):

A atual desregulamentação das politicas públicas e dos direitos sociais desloca a

atenção à pobreza para a iniciativa privada ou individual, impulsionada por

motivações solidárias e benemerentes, submetidas ao arbítrio do indivíduo isolado, e

não à responsabilidade pública do Estado (IAMAMOTO, 2004, p.3).

Temos hoje, desafios colocados aos Assistentes Sociais, um deles é como

implementar um projeto profissional vinculado à defesa dos direitos sociais num cenário tão

adverso, no qual as expressões da questão social se modificam, assumindo formas distintas de

acordo com cada contexto, e o que presenciamos atualmente é o aumento do desemprego, a

precarização das relações de trabalho, juntamente com a hegemonia do projeto neoliberal no

qual o aparelho estatal torna-se cada vez menos responsável pela execução de políticas

públicas que de fato atendam as necessidades dos usuários do Serviço Social.

Portanto, a consolidação do projeto ético-político do Serviço Social nos dias atuais é

um constante desafio colocado as Assistentes Sociais, pois vivemos em contexto desfavorável

a efetivação dos direitos sociais, conforme explicitado acima, e que é brilhantemente exposto

por Iamamoto (2004):

A consolidação do projeto ético-político profissional que vem sendo construído

requer remar na contracorrente, andar no contravento, alinhando forças que

impulsionem mudanças na rota dos ventos e das marés na vida em sociedade.

Teimamos em reconhecer a liberdade como valor ético central, o que implica

desenvolver o trabalho profissional para reconhecer a autonomia, emancipação e

plena expansão dos indivíduos sociais, reforçando princípios e práticas

democráticas. Aquele reconhecimento desdobra-se na defesa intransigente dos

direitos humanos, o que tem como contrapartida a recusa do arbítrio e de todos os

tipos de autoritarismos (IAMAMOTO, 2004, p.141- grifos no original).

26

2 O SIGILO PROFISSIONAL NOS CÓDIGOS DE ÉTICA DO SERVIÇO SOCIAL

BRASILEIRO: UMA ANÁLISE COMPARATIVA

O Sigilo Profissional sempre foi um aspecto presente no âmbito da atuação do

Assistente Social, assim como é abordado no decorrer de todos os Códigos de Ética do

Serviço Social, desde a primeira formulação ética de 1947 até o atual Código de 1993. Ora é

abordado como Segredo Profissional, ora abordado como Sigilo Profissional, mesmo assim,

sempre foi elemento presente em todos os Códigos de Ética. O significado tanto do termo

Sigilo quanto do termo Segredo remete a idéia de confidencialidade, de algo que é restrito,

oculto, escondido. Segundo o dicionário da língua portuguesa, o significado da palavra

Segredo é:

s.m. O que há de mais escondido; o que se oculta à vista, ao conhecimento: não

conte este segredo a ninguém. / O que a ninguém deve ser dito; que é secreto;

confidência: segredo confidencial. / O sentido oculto de algo: segredo do texto. / O

que há de mais difícil; o que exige uma iniciação especial, em uma arte, uma ciência

etc.: segredos da poesia. / Meio ou processo conhecido de uns poucos. 2

O significado da palavra Sigilo é: “s.m. Segredo. / Ant. Selo para fechamento de

documentos”.3

Assim, no decorrer dos Códigos de Ética do Serviço Social, elementos como

nomenclatura, concepção do que é o Sigilo, informações consideradas Sigilosas,

possibilidades de quebra, quebra diante de depoimentos policiais ou judiciais, procedimentos

para revelação em caso de quebra de Sigilo, como guardar Sigilo, Sigilo como direito/dever,

terminologia utilizada no que diz respeito ao usuário, e o Sigilo na perspectiva interdisciplinar

foram se modificando com o passar do tempo e do amadurecimento do Serviço Social

enquanto profissão. Tais aspectos são determinados pelo contexto sócio-histórico de cada

Código, bem como da base teórico-metodológica que lhes sustentava, tal como abordado no

Capítulo 1 deste trabalho. Desta forma, me proponho a analisar e comparar de que forma cada

um desses elementos aparecem nos diferentes Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro.

2 Disponível em: http://www.dicionariodeportugues.com/significado/segredo-41730.html. Acesso em: 05 out. 2011. 3 Disponível em: http://www.dicionariodeportugues.com/significado/Sigilo-41730.html. Acesso em: 05 out. 2011.

27

2.1 Terminologia utilizada: Sigilo e segredo

Com relação à nomenclatura utilizada nos Códigos, pode-se evidenciar que aparece

tanto o termo “Segredo” quanto o termo “Sigilo”. Pode-se analisar que a palavra Segredo nos

remete a idéia de uma relação mais informal e coloquial, relativa às relações pessoais,

familiares e de amizade. O termo Sigilo já nos traz a idéia de uma relação técnica e formal,

tendo em vista que a relação do Assistente Social com o usuário é uma relação profissional e

não uma relação informal ou de amizade, mesmo que o Assistente Social em sua atuação

profissional estabeleça com o usuário um vínculo de confiança, proximidade e empatia. O

termo Segredo pode nos remeter a uma noção moralista das condições de vida da população

usuária, tendo em vista seu caráter mais informal.

Nos diferentes Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro, a terminologia pode ser

explicitada da seguinte forma:

Tabela 1 - Terminologia utilizada nos Códigos de Ética relativos ao Sigilo

Código de Ética 1947 1965 1975 1986 1993

Terminologia Sigilo Segredo Segredo Sigilo Sigilo

Fonte: Elaborado pela autora.

É interessante notar que mesmo no contexto dos primórdios da profissão no Brasil,

envolta em pressupostos católicos e com base neotomista de sustentação teórica, no Código

de Ética de 1947, a nomenclatura utilizada é “Sigilo”, o que só aparecerá dessa forma

novamente no Código de Ética de 1986.

Como explicitado no quadro acima, a nomenclatura utilizada nos Códigos de 1965 e

1975 é a terminologia “Segredo”, e é relevante destacar que no Código de 1975 mesmo que a

terminologia utilizada no seu capítulo III, que trata especificamente do tema, utilize o termo

”Segredo”, anteriormente, quando trata no capítulo I dos direitos do Assistente Social, vai

tratar a partir do termo “Sigilo” quando diz que é um direito em relação ao exercício

profissional o “Sigilo Profissional” (CFAS, 1975). O contexto vivenciado dos anos de 1965 a

1975 ainda tinha-se uma atuação moralista e conservadora do Serviço Social, com a prática do

28

Serviço Social de Caso, Grupo e Comunidade, voltada para o ajustamento do individuo ao

meio social e ao desvendamento as causas psicológicas e dos fatores externos dos seus

“desajustes”, para que assim, o “cliente” passasse a se relacionar com o ambiente social de

maneira mais adequada.

No Código de Ética de 1986 a nomenclatura “Sigilo” é retomada e reafirmada na

elaboração do Código de Ética de 1993, que está em vigor até os dias atuais.

2.2 Informações consideradas Sigilosas

O Sigilo Profissional e sua importância no âmbito da atuação profissional aparece

desde o Código de 1947. Neste sentido, outro elemento de análise se refere à concepção do

que cada Código compreende ser uma informação Sigilosa no trabalho profissional. Neste

Código de 1947, são consideradas “Sigilosas” todas as informações que o profissional toma

contato em razão de seu ofício, isto é, informações que o Assistente Social toma

conhecimento no seu processo de atuação profissional. Tal idéia é explicitada no Art.2 onde

diz que as informações Sigilosas são aquelas “Sobre o que [o profissional] saiba em razão de

seu ofício” (ABAS, 1947, p.1).

Após 18 anos, na implementação do Código de Ética de 1965, a compreensão do que é

informação Sigilosa se refere a “todas as confidências recebidas e fatos de que tenha

conhecimento ou haja observado no exercício de sua atividade profissional”, conforme

indicado no Art. 15 (CFAS, 1965, p.3). Neste Código, o Sigilo aparece com a idéia de dever

do profissional, aspecto que irei analisar mais adiante, quando tratarei da noção do Sigilo

como direito/dever.

O Código de Ética de 1975 é o único Código que detalha que tipo de informações que

eram vedadas ao Assistente Social divulgar, quais sejam: nome, endereço ou qualquer outra

informação que identificasse o “cliente”. Considera-se ainda todas as confidências, fatos e

observações colhidas pelo Assistente Social através do exercício profissional. Este Código

também especifica que a revelação de casos de sevícias (torturas), castigos corporais,

supressão intencional de alimentos, atentados ao pudor, entre outros que visassem à proteção

do menor, não eram consideradas quebra de Sigilo Profissional. Ou seja, se o Assistente

29

Social tomasse conhecimento de um desses casos, a revelação não seria considerada quebra

de Sigilo.

Depois de nove anos e de todo o processo de renovação profissional vivenciado pela

categoria, que já foram detalhados no primeiro capítulo, o Código de Ética de 1986 pode ser

considerado um Código que visava romper com as práticas do Serviço Social tradicional, e ao

longo do seu texto podemos perceber a mudança da base teórica na qual a categoria

profissional passa a se ancorar. O Código de Ética de 1986 vai trabalhar com a noção de que

informações Sigilosas são todas as informações confiadas e/ou colhidas no interior do

exercício profissional, sendo dever do Assistente Social observar o Sigilo Profissional em

relação a elas. Esta idéia aparece no seguinte trecho do Art. 4: “o Assistente Social deve

observar o Sigilo profissional, sobre todas as informações confiadas e/ou colhidas no

exercício profissional” (CFAS, 1986, p.4).

No último e atual Código de Ética, publicado em 1993, tudo aquilo que o Assistente

Social toma conhecimento em decorrência de sua atuação profissional é considerado Sigiloso,

e o Sigilo Profissional protege o usuário no que diz respeito a essas informações que são

colhidas no fazer profissional do Assistente Social.

Um aspecto que é interessante analisar é a forma como os Códigos de Ética do Serviço

Social abordam o modo através do qual o Assistente Social pode resguardar o Sigilo

Profissional no âmbito da sua atuação. Os únicos Códigos que abordam tal aspecto são o

Código de Ética de 1975 e o de 1993. No primeiro, estava previsto que para manter o Sigilo

Profissional era necessário se abster de transcrever qualquer informação de natureza

confidencial, bem como manter “discrição de atitudes nos relatórios de serviço onde quer que

trabalhe”, como referido no item III do Art. 7 (CFAS, 1975, p.8). No atual Código de Ética,

publicado em 1993, o resguardo do Sigilo Profissional está posto quando indica que no

trabalho multidisciplinar o Assistente Social deverá prestar “informações dentro dos limites

do estritamente necessário” (CFESS, 1993, p.7).

2.3 Possibilidades de quebra do Sigilo Profissional

A quebra do Sigilo Profissional também é tomada como elemento de análise

comparativa entre os Códigos Ética de neste estudo. A possibilidade de quebra de Sigilo

30

Profissional aparece primeiramente no Código de Ética de 1965, que previa situações em que

a quebra possa evitar um mal maior e um dano grave ao “cliente”, ao Assistente Social, a

terceiros e ao bem comum. Entretanto, a quebra só é admitida após esgotar todos os recursos

possíveis, no qual o próprio “cliente” se dispusesse a revelá-lo. Tal compreensão aparece de

forma similar no Código de 1975, quando diz no Art. 7 que:

§2° ‐ É admissível revelar segredo profissional para evitar dano grave, injusto e

atual ao próprio cliente, ao Assistente Social, a terceiro ou ao bem comum.

§3°‐ A revelação do Sigilo profissional será admitida após se haverem esgotado

todos os recursos e esforços para que o próprio cliente se disponha a revelá‐lo.

§4°‐ A revelação será feita dentro do estritamente necessário, o mais discretamente

possível, quer em relação ao assunto revelado, quer ao grau e número de pessoas que

dele devem tomar conhecimento (CFAS, 1975, p.8).

Por outro lado, o Código de Ética de 1975 preconizava a necessidade de revelação de

Sigilo Profissional em casos de sevícias, castigos corporais, atentados ao pudor, supressão

intencional de alimento e uso de tóxicos, com vista à proteção do menor, como apontado no

Artigo 7, Inciso 5, Capítulo III (CFAS, 1975). Cabe ressaltar que é apenas neste Código de

Ética que a revelação desses casos não era considerada quebra de Sigilo Profissional, nos

demais tal situação não é mencionada.

Já no Código de Ética de 1986, compreendia-se que a quebra do Sigilo Profissional só

era admissível em situações nas quais a gravidade pudesse trazer prejuízos aos interesses da

classe trabalhadora, como trata no Art. 4: “§1° ‐ A quebra do Sigilo só é admissível, quando

se tratar de situação cuja gravidade possa trazer prejuízos aos interesses da classe

trabalhadora” (CFAS, 1986, p.4).

No Código de Ética de 1993, que permanece em vigor na atualidade, preconiza-se que

a quebra do Sigilo Profissional só é admissível em situações que envolvam ou não fato

delituoso, possa trazer prejuízos aos interesses do usuário, de terceiros e da coletividade,

conforme o Art.18:

A quebra do Sigilo só é admissível quando se tratarem de situações cuja gravidade

possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer prejuízo aos interesses do usuário, de

terceiros e da coletividade.

Parágrafo único - A revelação será feita dentro do estritamente necessário, quer em

relação ao assunto revelado, quer ao grau e número de pessoas que dele devam

tomar conhecimento (CFESS, 1993, p.7).

Além de prever a possibilidade da quebra nas situações supracitadas, a partir do

Código de Ética de 1965, também será explicitado algumas indicações em relação a revelação

do Sigilo Profissional. Neste Código, a revelação do “Segredo Profissional”, só seria feita

31

após esgotar todos os recursos disponíveis. Neste e nos Códigos de Ética de 1975, de 1986 e

de 1993, há a orientação de que a revelação do Sigilo Profissional deveria ser feita dentro do

estritamente necessário, quer em relação ao assunto revelado, quer em relação ao grau e ao

número de pessoas que deveriam tomar conhecimento. Contudo, não trazem o que se

considera ou compreende por “estritamente necessário”, quais informações seriam, qual seu

conteúdo, colocando neste sentido a autonomia e a subjetividade do profissional como

elemento de mediação para a análise e tomada de decisão acerca do que se considera como

Sigiloso e ao que o profissional considera como passível de revelação.

2.4 Sigilo Profissional diante de depoimento judicial ou policial

No decorrer de todos os Códigos de Ética do Serviço Social brasileiro, o Assistente

Social nunca esteve legalmente obrigado a prestar depoimento judicial ou policial sobre as

informações que tomava contato em decorrência de sua atividade profissional, revelando

informações protegidas pelo Sigilo Profissional.

Diferentemente dos demais, o Código de Ética de 1947 é o único em que não há

menção acerca do Art.144 do antigo Código Civil, enquanto um respaldo ao profissional para

a guarda do Sigilo mesmo se fosse chamado a depor em depoimentos policiais, em função do

seu ofício. Este artigo que diz que: “Ninguém pode ser obrigado a depor de fatos, a cujo

respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo” (Código Civil de 1916, Lei n. 3.071,

de 1° de janeiro de 1916). Neste sentido, mesmo chamado a depor policial ou judicialmente, o

Assistente Social deveria guardar Sigilo de todas as informações que tinha conhecimento.

No Código de Ética de 1965, O Assistente Social não estava legalmente obrigado a

depor como testemunha sobre fatos de que tenha tomado conhecimento em seu exercício

profissional. Porém, intimado a depor, deveria comparecer diante da autoridade competente e

informar que está legalmente obrigado a guardar segredo profissional, conforme o Art. 144 do

Código Civil, como previsto no Art. 17° do Código de Ética de 1965:

O Assistente Social não se obriga a depor como testemunha, sobre fatos de que

tenha conhecimento profissional, mas intimado a prestar depoimento, deverá

comparecer perante à autoridade competente para declarar‐lhe que está ligado à

obrigação do segredo profissional, de acordo com o art. 144 do Código Civil (CFAS,

1965, p.4).

32

A partir do Código de Ética de 1975, aparece a figura do próprio Código de Ética

como respaldo legal para a desobrigação de prestar informações e considerava que, se o

Assistente Social fosse intimado a prestar depoimento, deveria comparecer e informar a

autoridade competente que está obrigado a guardar segredo profissional nos termos do Código

de Ética e do Código Civil. Esta concepção também aparece no Código de Ética de 1986.

É interessante notar que no Código de Ética de 1993 esta situação é preconizada como

um dever do Assistente Social conforme a alínea “b” do Art.19: “Comparecer perante a

autoridade competente, quando intimado a prestar depoimento, para declarar que está

obrigado a guardar Sigilo Profissional nos termos deste Código e da Legislação em vigor”. E

ainda, na alínea “a” do Art. 20, diz que é vedado ao Assistente Social: “depor como

testemunha sobre situação Sigilosa do usuário de que tenha conhecimento no exercício

profissional, mesmo quando autorizado”. Cabe ressaltar, que o atual Código de Ética é o

único que preconiza que mesmo se o usuário autorizasse o Assistente Social a depor como

testemunha ou revelar informações Sigilosas colhidas no âmbito do exercício profissional, a

este é vedado essa condição de testemunha.

2.5 Sigilo Profissional enquanto direito e/ou dever do Assistente Social

Com a reformulação do Código de Ética de 1986 realizada no ano de 1993, este que é

o último e atual Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais brasileiros, o Sigilo

Profissional é preconizado como direito do Assistente Social. Além disto, pode-se

compreender que além de um direito do Assistente Social, o Sigilo também é um dever do

profissional, o que é explicitado no Art. 16, segundo o qual é o compromisso ético com o

Sigilo que “protegerá o usuário de todas as informações que o Assistente Social venha a tomar

conhecimento, através de sua atuação profissional” (CFESS, 1993, p.7).

A noção de direito e/ou dever está posta nos Códigos de Ética tal como indica o

quadro a seguir.

33

Tabela 2 – Sigilo enquanto direito ou dever do Assistente Social:

Código de Ética 1947 1965 1975 1986 1993

Terminologia Dever Dever Dever e

Direito

Dever Direito e

Dever

Fonte: Elaborado pela autora.

Outro aspecto de grande relevância é perceber e analisar de que forma esta noção de

direito e/ou dever em relação ao Sigilo Profissional está colocada textualmente nos Códigos

de Ética do Serviço Social brasileiro. A concepção do Sigilo enquanto um direito é percebida

ora como uma noção indireta, isto é, não está textual e explicitamente colocada no Código nos

termos “O Assistente Social tem direito ao Sigilo Profissional” , e ora como uma noção direta,

ou seja, aparece textualmente colocada nos Códigos de Ética. Já a noção de dever aparece

somente como uma noção indireta, visto que o texto dos Códigos de Ética utiliza termos como

“obrigado”, “vedado”, isto é, o Assistente Social é obrigado a manter Sigilo ou lhe é vedado

revelar Sigilo profissional; nunca aparecendo explicitamente que o Assistente Social tem o

dever de resguardar o Sigilo Profissional. A tabela abaixo sistematiza esta análise tal como

aparecem nos diferentes Códigos.

Tabela 3 – Forma como aparece a noção de dever e de direito ao Sigilo.

Códigos de Ética 1947 1965 1975 1986 1993

Noção

de

Direito

Como

aparece

Não

aparece Não aparece

Indireta

Indireta

Direta

Termo

utilizado

“Direito a

inviolabilidade”

“Constituem-

se direitos”

Constitui direito

do Assistente

Social.

Noção

de

Dever

Como

aparece Indireta Indireta Indireta Indireta Indireta

Termo

utilizado

“Guardar

rigoroso

Sigilo”

“O

Assistente

Social é

obrigado a”

É vedado”

“Deve observar”

“Proteção a

confidencialidade

do cliente”

“O Assistente

Social deve

observar

Sigilo”.

“O Sigilo

protegerá o

usuário”

Fonte: Elaborado pela autora.

A noção indireta do Sigilo Profissional enquanto um direito do Assistente Social

aparece apenas a partir do Código de 1975. Esta idéia se coloca nos Códigos quando apontam

34

como um direito do Assistente Social a “inviolabilidade do domicílio do consultório, dos

locais de trabalho e respectivos arquivos”, tal como expresso no Título II- Direitos e Deveres

do Assistente Social, Capítulo I- Dos Direitos, Art.4º, Alínea “e” (CFAS, 1975, p.4). O

Código de Ética de 1986 também traz a noção de direito ao Sigilo de uma forma indireta

quando aborda no Título II- Dos direitos e das Responsabilidades gerais do Assistente Social,

no Capítulo I- dos Direitos no “Art.2º- Constituem-se direitos do Assistente Social: e.

Inviolabilidade do domicilio, do local de trabalho e respectivos arquivos e documentação”

(CFESS, 1986, p.3). Também no Código de Ética de 1993, esta noção indireta de sigilo está

colocada no Art. 2º, alínea d, que diz: “Inviolabilidade do local de trabalho e respectivos

arquivos e documentação, garantindo o sigilo profissional” (CFESS, 1993, p.4).

A noção direta de direito ao Sigilo aparece no Código de Ética de 1975, no Título II

que aborda os Direitos e Deveres do Assistente Social, Capítulo I - dos Direitos, alínea “d” do

Art.4, o qual preconiza explicitamente que é um direito do Assistente Social o Sigilo

Profissional. Essa noção aparece novamente no Código de 1993, a idéia vem explicitamente

colocada no Art.15 quando afirma que “Constitui direito do Assistente Social manter o Sigilo

Profissional” (CFESS, 1993, p.7).

A noção indireta de dever com relação ao Sigilo aparece no Código de Ética de 1965,

no Art.15, quando diz que: “O Assistente Social é obrigado pela Ética e pela Lei (art.154 do

Código Penal) a guardar segredo sobre todas as confidências recebidas e fatos que tenha

conhecimento ou haja observado no exercício de sua atividade profissional” (CFAS, 1965,

p.3), ou seja, a obrigatoriedade de manter o “segredo” das informações recebidas no exercício

profissional dá a idéia de que era dever do Assistente Social zelar pelo “segredo” dessas

informações.

No Código de Ética de 1975, no Art. 6, estava previsto que: “É vedado ao Assistente

Social: c- Divulgar nome, endereço ou outro elemento que identifique o cliente”. E ainda no

Art.7: “O Assistente Social deve observar o segredo profissional: I- Sobre todas as

confidências recebidas, fatos ou observações colhidas no exercício da profissão”. Sendo

assim, nos artigos a idéia de dever se coloca indiretamente. Neste mesmo Código, embora

preconizado como um direito do Assistente Social com relação ao exercício profissional, na

alínea “c” do Art.4 diz: “Proteção a confidencialidade do cliente” (CFAS, 1975), o que

também exprime de forma indireta essa noção de dever do profissional.

No Código de Ética de 1986, essa noção indireta de dever vem expressa somente no

Art.4 que prevê que: “O Assistente Social deve observar o Sigilo Profissional, sobre todas as

informações confiadas e/ou colhidas no exercício profissional” (CFESS, 1986).

35

E, no último e atual Código de Ética do Assistente Social, de 1993, a noção indireta de

dever aparece no Art.16: “O Sigilo protegerá o usuário em tudo aquilo que o Assistente Social

tome conhecimento, como decorrência do exercício profissional da atividade profissional”.

Apenas no Código de 1993, ficará explicitamente colocado no texto em seu Art.15:

“Constitui direito do Assistente Social manter o Sigilo profissional” (CFESS, 1993, p.7).

2.6 Terminologia utilizada com relação ao usuário

A terminologia utilizada nos Códigos com relação ao usuário pode ser explicitada da

seguinte forma:

Tabela 4 - Terminologia utilizada nos Códigos relativas Usuário:

Código de Ética 1947 1965 1975 1986 1993

Terminologia Cliente Cliente Cliente Usuário Usuário

Fonte: Elaborado pela autora.

Cabe ressaltar, que a nomenclatura cliente nos remete a idéia de uma relação

mercadológica, uma relação de compra e venda, pois o indivíduo é entendido como

desajustado e precisa de tratamento para se adequar ao meio social, conforme explicita Vieira

(1978):

Como no Serviço Social com Indivíduos, o sujeito é o indivíduo psicologicamente

normal ou com leves distúrbios, que não o impede, entretanto, de funcionar em

sociedade. Quando o indivíduo não é mental ou psicologicamente normal, deve ser

encaminhado a especialistas e poderá, se for o caso, ser o objeto da terapia em grupo

(VIEIRA, 1978, p.162- grifos no original).

Já a nomenclatura usuário remete a idéia de sujeito de direitos, usuário de políticas sociais

públicas, política social que é brilhantemente caracterizada por Behring (2009):

Constata-se que a política social – que atende às necessidades do capital e, também,

do trabalho, já que para muitos se trata de uma questão de sobrevivência –

36

configura-se, no contexto da estagnação, como um terreno importante de luta de

classes: da defesa de condições dignas de existência, face ao recrudescimento da

ofensiva capitalista em termos do corte de recursos públicos para a reprodução da

força de trabalho (BEHRING, 2009, p. 316- grifos no original).

2.7 A questão da interdisciplinaridade

Ely (2003), utilizando os conceitos propostos por Vasconcelos (1997) pontua que a

interdisciplinaridade pode ser compreendida por relações entre profissionais que partilham de

estratégias de ação comuns, estabelecendo uma recíproca troca de saberes e conhecimentos

entre as diferentes disciplinas. Para a existência da relação interdisciplinar é necessário que

haja equipes de trabalho constituídas por profissionais com qualificações diversas que

trabalhem em uma constante troca, com cooperação e coesão. No âmbito desse processo de

troca e articulação, é necessário que haja o respeito à criatividade e autonomia intrínseca a

cada profissão, para que não haja a exclusão ou predominância de uma determinada área.

A primeira abordagem relativa ao trabalho interdisciplinar nos Códigos de Ética do

Serviço Social brasileiro vai aparecer no Código de 1965, no Artigo 15, quando diz que:

O Assistente Social é obrigado pela ética e pela Lei (art.154 do Código Penal)4 a

guardar segredos sobre todas as confidências recebidas e fatos de que tenha

conhecimento ou haja observado no exercício de sua atividade profissional,

obrigando-se a exigir o mesmo segredo de todos os seus colaboradores (CFAS,

1965, p.3).

Os outros profissionais eram chamados de colaboradores, e o Assistente Social deveria

exigir que os mesmos tivessem o mesmo cuidado com relação ao “segredo profissional”.

A menção ao trabalho interdisciplinar também está posta no Código de Ética de 1975,

abordado no primeiro inciso do Art.7, que diz: “O Sigilo estender-se-á à equipe

interdisciplinar e aos auxiliares, devendo o Assistente Social empenhar-se em sua guarda”.

(CFAS, 1975, p.8). Cabe ressaltar que, enquanto no Código de 1965 o Assistente Social

deveria exigir segredo profissional por parte de seus colaboradores; no Código de 1975 o

dever era do Assistente Social de resguardar esse Sigilo no âmbito do trabalho

4 Art.154: Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão,

e cuja revelação possa produzir dano a outrem (Decreto Lei n.2.848 de 7 de dezembro de 1940).

37

interdisciplinar, ou seja, o Assistente Social deveria guardar Sigilo dos fatos e confidências

recebidas no âmbito da atuação profissional, mesmo quando em uma atuação interdisciplinar.

O Código de 1986 não aborda a questão no Sigilo profissional no trabalho

interdisciplinar. O tema volta a ser objeto de normatização no atual Código de Ética

profissional de 1993, em seu Artigo 16 diz que:

O Sigilo protegerá o usuário em tudo aquilo de que o Assistente Social tome

conhecimento, como decorrência do exercício da atividade profissional. Parágrafo

único. Em trabalho multidisciplinar só poderão ser prestadas informações dentro dos

limites do estritamente necessário (CFESS, 1993, p.7).

2.8 Resoluções que abordam temas relativos ao Sigilo Profissional

Dentro do quadro normativo do Serviço Social, ainda existem duas resoluções

expedidas pelo CFESS que tratam de questões de importância para a compreensão do Sigilo

Profissional.

Uma delas é a Resolução CFESS n° 493, de 21 de agosto de 2006, que regulamenta e

dispõe sobre as condições éticas e técnicas do exercício profissional do Assistente Social e

prevê algumas condições mínimas para o exercício da profissão. Esta Resolução orienta que:

Art. 2º O local de atendimento destinado ao Assistente Social deve ser dotado de

espaço suficiente, para abordagens individuais ou coletivas, conforme as

características dos serviços prestados, e deve possuir e garantir as seguintes

características físicas:

a- iluminação adequada ao trabalho diurno e noturno, conforme a organização

institucional;

b- recursos que garantam a privacidade do usuário naquilo que for revelado

durante o processo de intervenção profissional;

c- ventilação adequada a atendimentos breves ou demorados e com portas fechadas

d- espaço adequado para colocação de arquivos para a adequada guarda de

material técnico de caráter reservado.

Art. 3º - O atendimento efetuado pelo Assistente Social deve ser feito com portas

fechadas, de forma a garantir o Sigilo (CFESS, 2006, p.2 – grifos nossos).

Ou seja, temos apontadas, a partir desta resolução, as condições de trabalho

consideradas adequadas para a prestação de um serviço de qualidade aos usuários do Serviço

Social, um local de atendimento que garanta privacidade ao usuário, um espaço para os

arquivos para guardar o material técnico Sigiloso, e de portas fechadas. Todas essas condições

38

são necessárias, sobretudo, para que o atendimento Sigiloso prestado ao usuário seja

garantido.

Há também a Resolução n° 556, de 15 de setembro de 2009, que dispõe sobre os

procedimentos para efeito de lacração do Material Técnico e Material Técnico-Sigiloso do

Serviço Social. Esta Resolução vai fazer uma distinção entre dois tipos de materiais técnicos:

o material técnico e o material técnico Sigiloso. O primeiro se refere aos materiais e

documentos elaborados e gerados em decorrência da atuação profissional do Assistente Social

nos quais não contém informações consideradas Sigilosas. Já no segundo,

Art. 2 - Entende-se por material técnico Sigiloso toda documentação produzida, que

pela natureza de seu conteúdo, deva ser de conhecimento restrito e, portanto,

requeiram medidas especiais de salvaguarda para sua custódia e divulgação.

Parágrafo Único - O material técnico Sigiloso caracteriza-se por conter informações

Sigilosas, cuja divulgação comprometa a imagem, a dignidade, a segurança, a

proteção de interesses econômicos, sociais, de saúde, de trabalho, de intimidade e

outros, das pessoas envolvidas, cujas informações respectivas estejam contidas em

relatórios de atendimentos, entrevistas, estudos sociais e pareceres que possam,

também, colocar os usuários em situação de risco ou provocar outros danos (CFESS,

2009, p.2).

A Resolução ainda indica que, o Assistente Social deve proceder da seguinte forma:

“Art. 3 - Assistente Social garantirá o caráter confidencial das informações que vier a receber

em razão de seu trabalho, indicando nos documentos Sigilosos respectivos a menção:

“Sigiloso” (CFESS, 2009, p.2). A Resolução n° 493, também preconiza que o material técnico

Sigiloso deve ser guardado em arquivo com chave e é de caráter reservado, ou seja, só os

Assistentes Sociais deverão ter acesso a essa documentação que como caracterizado no Art. 2

da Resolução n° 556, diz respeito à intimidade dos usuários, são informações que devem ser

resguardadas porque ao serem explicitadas para outras pessoas, podem expor os usuários a

situações de risco e causar danos.

Temos ainda, no estado do Rio de Janeiro, a Lei Estadual n° 5261, de 11 de junho de

2008, que determina a obrigatoriedade da existência de local reservado para a atuação dos

profissionais de Serviço Social no âmbito da Administração Estadual direta, indireta e

fundacional, com vistas a preservação do Sigilo e da qualidade do atendimento. Estabelecida

principalmente em seus dois primeiros artigos:

Art. 1º No atendimento dos usuários do serviço público estadual, no âmbito da

administração direta, indireta e fundacional, por parte de profissional de serviço

social, é obrigatória a existência de local que assegure a privacidade e a dignidade

do atendimento, além do Sigilo das informações prestadas.

Art. 2º Além do disposto no artigo anterior, o ambiente físico do local de

atendimento por profissional de serviço social deverá ser estruturado atendendo aos

seguintes parâmetros:

39

I - ser visual e acusticamente indevassável;

II - evitar qualquer interferência ou interrupção no transcurso do atendimento;

III - possuir adequadas condições de higienização, ventilação e iluminação;

IV - ser dotado de mobiliário adequado e compatível com o atendimento;

V - possuir arquivo passível de ser trancado à chave, que sirva para a guarda do

material técnico e documentação Sigilosa de exercício da profissão de Assistente

Social (GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, Lei Estadual n.5261, de

11 de junho de 2008).

O que é interessante ressaltar, é que está previsto na Lei Estadual de n° 5261, que o

local para atendimento aos usuários do Serviço Social seja visualmente e acusticamente

indevassável, ou seja, além de resguardar a escuta das informações que o Assistente Social

toma contato durante o atendimento, resguarda também a imagem do usuário, quando diz que

o local de atendimento deve ser também visualmente indevassável. A Lei Estadual de n° 5261

também traz uma novidade em relação à Resolução de n° 493, parâmetro II, do Art.2 prevê

que: “evitar qualquer interferência ou interrupção no transcurso do atendimento” (Lei

Estadual n° 5261, de 11 de junho de 2008). Ou seja, deve ser um local no qual o Assistente

Social não seja interrompido no decorrer do atendimento.

Isso confronta uma difícil realidade das condições de trabalho dos Assistentes Sociais.

Temos nos dias atuais condições cada vez mais precárias de atendimento aos usuários que não

garantem nem a qualidade do serviço prestado nem o resguardo do Sigilo acerca das

informações que os Assistentes Sociais tomam conhecimento em seus atendimentos. Além

disso, vivenciamos um quadro no qual os Assistentes Sociais tem que revezar a sala de

atendimento com outros colegas de trabalho, e o que muitas das vezes acontece é que o

Assistente Social é constantemente interrompido durante o atendimento, o que dificulta a

garantia do Sigilo das informações.

40

3 A CONCEPÇÃO DE ASSISTENTES SOCIAIS ACERCA DO SIGILO

Pretendo neste capítulo, analisar as entrevistas realizadas, que foram feitas como

forma de coleta de dados como forma de identificar a concepção que profissionais do Serviço

Social tem acerca do Sigilo profissional.

3.1 Metodologia utilizada para realização das entrevistas

Foram realizadas 3 entrevistas para coleta de dados. Os entrevistados foram dois (2)

professores do Curso de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense, entrevistadas B

e C e uma (1) Agente Fiscal da Seccional de Campos do Conselho Regional de Serviço Social

do Rio de Janeiro, CRESS 7ª região, a entrevistada A.

As perguntas feitas aos professores foram as seguintes:

O que é Sigilo profissional?

Qual a particularidade do Sigilo no Serviço Social?

Como resguardar o Sigilo na prática profissional?

O que se entende por quebra do Sigilo profissional?

O Sigilo pode ser entendido também como um dever do Assistente Social?

As perguntas feitas a Agente Fiscal foram as seguintes:

O que é Sigilo profissional?

Qual a particularidade do Sigilo no Serviço Social?

Como resguardar o Sigilo na prática profissional?

O que se entende por quebra do Sigilo profissional?

O Sigilo pode ser entendido também como um dever do Assistente Social?

41

O Art.18 do Código de Ética de 1993 diz: “A quebra do Sigilo só é admissível quando

se tratarem de situações cuja gravidade possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer

prejuízo aos interesses do usuário, de terceiros e da coletividade. Parágrafo Único: A

revelação será feita dentro do estritamente necessário, quer em relação ao assunto revelado,

quer ao grau de pessoas que dele devam tomar conhecimento”. Neste sentido, quais as

informações que, no cotidiano profissional tomamos contato que podem ser consideradas

“estritamente necessárias”?

De que forma é feita essa avaliação pelo CRESS dos casos de quebra de Sigilo que são

passíveis de sanções e punições? E quais são os casos de quebra de Sigilo que são passíveis

de punições?

O Art.15 do Código de Ética de 1993, preconiza o Sigilo com um direito do Assistente

Social. De que forma isto é materializado na prática profissional?

O Sigilo pode ser entendido também como um dever do Assistente Social?

Qual a diferença entre o Sigilo profissional hoje, tal como colocado no Código de

Ética atual, do Sigilo profissional posto nos Códigos de Ética anteriores?

Cabe ressaltar, que as perguntas feitas a Agente Fiscal foram diferenciadas com o

objetivo de colher informações de como é feita a fiscalização do exercício profissional, como

são avaliadas as situações de quebra de Sigilo profissional, quais são as sanções e punições

previstas para os casos de quebra de Sigilo profissional e de que forma é materializado na

prática profissional o direito que o Assistente Social tem ao Sigilo profissional, preconizado

no Art.15: “Constitui direito do Assistente Social manter o Sigilo profissional” (CFESS,

1993, p.7).

As entrevistas foram gravadas com o consentimento dos entrevistados e transcritas

para que o material colhido sirva de subsídio para análise. Cada entrevista durou em média 30

minutos. A entrevista com a Agente Fiscal do CRESS foi feita na própria Seccional do

Conselho no município de Campos dos Goytacazes/RJ, e as entrevistas com as docentes

foram realizadas na Universidade.

3.2 Resultados das Entrevistas

De acordo com as respostas dadas pelas entrevistadas, o Sigilo profissional pode ser

definido como toda informação que diz respeito à privacidade, intimidade, identidade e

história do usuário do Serviço Social, ou seja, toda informação colhida no exercício

42

profissional que o usuário confia ao Assistente Social e que não gostaria de expor para outras

pessoas. Segundo a entrevistada B: “no sentido mesmo de preservar o usuário, de qualquer...,

enfim, preservá-lo, preservar a sua vida, a sua identidade, e de qualquer problema,

intercorrência que possa haver nos desdobramentos do atendimento que o Assistente Social

vai fazer”, conforme pontua também a entrevistada C: “o Sigilo exige que o profissional tenha

clareza de que nem todas as informações que são passadas ali podem ter acesso público.

Então o Sigilo profissional ele serve pra proteger o usuário, de qualquer exposição que ele

possa ter em relação a instituição, a outros usuários, a outros profissionais”.

A particularidade do Sigilo no Serviço Social é que os Assistentes Sociais no seu

cotidiano profissional de viabilização do acesso aos direitos acabam tomando contato com a

intimidade do usuário, suas idéias, seu cotidiano, sua trajetória, e isso ocorre por conta do

acesso às políticas sociais, aos serviços, ou seja, o usuário pra ter o acesso aos direitos acaba

abrindo e compartilhando essas informações ao Assistente Social. Sobre isto a Entrevistada B

pontua que:

nós assistentes sociais, ao buscarmos viabilizar direitos, nós temos acesso a

intimidade do usuário, ou seja, o seu cotidiano, seus hábitos, as suas idéias, e aí seus

preconceitos também, as suas escolhas, é isso é de muita seriedade, você tem um

contato muito próximo, um contato direto com essa pessoa, que é usuário dos

serviços sociais, é se você não cuidar você pode ser extremamente invasiva,

autoritária, e desrespeitosa né, porque você pode, infelizmente existe a possibilidade

naquele relação profissional com o usuário, você querer conduzir é a sua escolha, a

sua ação, a sua decisão, então isso é muito sério, a gente tem que ter muito cuidado

com isso, o usuário ele não é nosso parente, o usuário não é nosso amigo, o usuário é

um cidadão que está ali buscando acessar um determinado serviço, direito.

A entrevistada C diz que:

No caso do Serviço Social, acho que a particularidade é que nós somos

trabalhadores que lidamos com expressões da questão social, as mais diversas e dá

pra dizer que com tragédias pessoais, então a cada entrevista, a cada atendimento

que a gente faz individualizado, muitas vezes pro usuário ter acesso ao seu direito,

ele expõe a sua vida, e de uma maneira bastante íntima eu diria, ele conta sua

trajetória, ele fala da qualidade das suas relações familiares e pessoais, ele fala da

sua intimidade, ele fala das suas condições de trabalho, ele fala de uma série de

coisas que dizem respeito ao modo como ele vivencia a questão social, as

desigualdades geradas nessa sociedade. Então eu entendo que pro Serviço Social,

pros Assistentes Sociais, resguardar o Sigilo significa muitas vezes proteger o

usuário, que ele já está numa situação desigual, de desigualdade, muitas vezes

quando ele procura o Assistente Social, ele já tá com seus direitos violados, grande

parte do atendimento que a gente faz é revelador de violação de direitos, e muita

vezes as situações que requerem intervenção profissional, elas já são violação de

direitos, elas expressam violações de direito, então dependendo do que ele fala, o

Sigilo no caso do Serviço Social, é pra proteger esse usuário, essa pessoa que tá

sendo atendida, esse cidadão que está sendo atendido, pra que ele não tenha a sua

situação que já é de violência, de exposição ainda mais exposta.

43

Segundo as entrevistadas, a questão de resguardar o Sigilo profissional é algo muito

complicado e polêmico nos dias atuais. Conforme a fala da entrevistada B:

é um mega desafio é, pra nós, porque nós sabemos das péssimas condições de

trabalho a que estamos todos submetidos, todos os trabalhadores, o Assistente Social

também, então assim não é a toa que o CFESS, recentemente, tem criado algumas

resoluções, o CFESS tem se preocupado muito com isso, porque de fato, mal as

vezes nós temos uma sala própria do Serviço Social, muitas vezes a gente divide

com outros colegas de outras especialidades, então as vezes a gente tem a sala, então

assim quando você divide com outro colega de outra área, você tem que ficar

combinando quem vai usar a sala naquele momento pra não atender o usuário no

corredor ou com gente passando e quando a sala própria do Serviço Social as vezes

não há um cuidado, uma estrutura e aí o som resvala, então o usuário tá ali falando

da vida dele, do cotidiano dele, da intimidade dele e tá todo mundo ouvindo ao lado,

isso é um grande limite e as vezes tem muito essas baias, não sei que material é esse

não é tijolo não é cimento e então resvala mesmo é o som, e as vezes você tem uma

excelente sala, própria do Serviço Social, de cimento de tijolo, mas você é

interrompido a todo momento e o outros colegas enfim, da equipe, da Organização,

da Instituição acham que podem entrar qualquer hora, que não tem problema porque

tem que falar com você naquele momento, isso também é um desafio, para o

profissional de Serviço Social que ele deve deixar claro, ele tem que, isso clama um

posicionamento do profissional muito firme, e dizer, olha enquanto estou atendendo

eu não posso ser interrompido, a não ser que seja uma notícia muito alarmante, fora

a isso não, porque eu estou ouvindo uma vida, então assim, estou ouvindo uma vida!

Então é, isso é de uma responsabilidade pública, muito profunda, muito grande e se

você enquanto profissional, não deixa isso claro para os seus pares, e pra sua Chefia,

muito firmemente, esse Sigilo profissional ele também é muito ameaçado.

Segundo a entrevistada A, para resguardar o Sigilo profissional de acordo com a

fiscalização feita pelos Agentes Fiscais:

A fiscalização do exercício profissional tem a ver com a defesa da profissão, que é

diferente da defesa do Assistente Social, a gente defende a profissão mesmo que pra

isso o profissional tenha que responder eticamente com suas ações, então agente tá

garantindo, busca a defesa da profissão, e a garantia da qualidade do atendimento ao

usuário. Dentro disso a fiscalização, ela vai, tem fiscalizado a partir da 493. Na

resolução 493, mas que já tem o artigo do Código de Ética que fala sobre as

condições de trabalho, ela regulamenta aquele artigo, ela busca garantir esse espaço

do Sigilo. Hoje nós temos a legislação estadual, que é uma legislação de 2008, que o

deputado Marcelo Freixo aprovou. Bom então a fiscalização diz respeito a isso,

quando a gente vai fiscalizar o exercício profissional a gente sempre tenta identificar

as condições de trabalho do profissional, que sejam condições que garantam a

qualidade do atendimento. Então é muito incomum encontrar profissionais

atendendo na mesma sala ou com outros profissionais de Serviço Social, ou que é

ainda mais grave com outros profissionais que não são da área de Serviço Social. Há

pouco tempo nós fiscalizamos uma instituição de atendimento as mulheres vítimas

de violência que ela atendia ao lado da sala da advogada, quer dizer na mesma sala

só tinha uma divisória de um armário, que dizer, isso não garante o Sigilo, então é,

uma diz respeito às condições desse Sigilo, que é ter a condição adequada dentro da

sala, e com relação ao próprio material, que tem que ter um arquivo com chave, pra

guardar os relatos, agora decorrente dessa questão do espaço de trabalho e dos

arquivos, eu vou colocar três outras questões: Com relação ao espaço é, com relação

ao espaço de trabalho, a gente vê, a primeira coisa que o Assistente Social tem que

fazer é fazer valer a 493, que ela tem que formalizar ao próprio empregador, que ele

44

necessita das condições adequadas de trabalho. Então a gente entende que não ter

uma sala específica não quer dizer nada, porque você pode garantir o Sigilo ao

usuário, você pode atender sozinho naquela sala, outra hora outro profissional

atende sozinho, não precisa ter uma sala do Assistente Social, mas o equipamento

social tem que dispor de um espaço em que o Assistente Social possa atender o

usuário com a garantia do Sigilo, não que aquela sala tem que ser dele

exclusivamente dele, mas que esteja disponível pra esse atendimento.

Para a entrevistada C para resguardar o Sigilo profissional

significa muitas vezes proteger o usuário, que ele já está numa situação desigual, de

desigualdade, muitas vezes quando ele procura o Assistente Social, ele já tá com

seus direitos violados, grande parte do atendimento que a gente faz é revelador de

violação de direitos, e muita vezes as situações que requerem intervenção

profissional, elas já são violação de direitos, elas expressam violações de direito,

então dependendo do que ele fala, o Sigilo no caso do Serviço Social, é pra proteger

esse usuário, essa pessoa que tá sendo atendida, esse cidadão que está sendo

atendido, pra que ele não tenha a sua situação que já é de violência, de exposição

ainda mais exposta. Então eu entendo que assegurar o Sigilo profissional de

qualquer atendimento é uma responsabilidade do profissional, de qualquer

profissional, porque o usuário procura e expõe a sua vida, ele é provocado a isso, na

verdade a gente faz perguntas pra entender aquela realidade, a gente provoca o

usuário a dizer coisas, então a gente tem que tomar o cuidado, porque quando a

gente provoca pra que ele diga coisas pra nós, nós é que estamos provocando as

vezes ele não tá espontaneamente dando informação pra nós, a gente faz entrevista, a

gente faz questionário, a gente pede informações que são provocadas, então o Sigilo

serve pra assegurar que aquilo seja usado no interior da construção da resposta, seja

individualmente ou seja no interior da equipe, e que o usuário tem que saber que

aquela informação não vai extrapolar o âmbito da resposta profissional, seja em

equipe, ou individual, então eu acho que o Assistente Social tem que ter ainda mais

esse cuidado em função das situações particulares dos nossos usuários, que são

pessoas que vivem expressões da questão social, da violência, etc.

Ou seja, apesar de termos algumas resoluções expedidas pelo CFESS, que

regulamentam condições de trabalho, sobretudo a Resolução n° 493, de 21 de agosto de 2006,

que dispõe sobre as condições éticas e técnicas do exercício profissional do Assistente Social,

ainda nos deparamos com precárias condições de trabalho colocadas aos Assistentes Sociais,

o que está diretamente relacionado com o cuidado de resguardar o Sigilo profissional. Apesar

da Resolução n° 493 regulamentar a garantia do espaço do Sigilo, tal como explicitado no

Capítulo anterior, o Serviço Social se depara com falta de equipamentos sociais que garantam

a qualidade do atendimento, nos quais o principal deles é uma sala na qual o Assistente Social

possa atender com a garantia do Sigilo, ou seja, com estrutura adequada. Os profissionais,

muitas vezes se deparam com situações em que tem que dividir a sala com outros

profissionais, ou quando possuem sala esta é feita de material impróprio no qual o som é

resvalado e outras pessoas podem ter acesso a escuta dos atendimentos. Segundo a

Entrevistada C:

45

A 493 não resolve a precarização do mercado profissional de trabalho, mas ela é um

respaldo legal, que o Assistente Social pode se valer dessa resolução pra informar ao

empregador, pra informar a instituição e que ela tá irregular, que ela tem uma

irregularidade e precisa ser resolvido, é um instrumento de luta é um instrumento de

normatização desse espaço de trabalho.

Outra questão que é importante ser destacada é com relação ao material. As

instituições costumam ter um Cadastro Institucional. Sendo assim, é de extrema importância

que o Assistente Social, tenha muito cuidado com relação às informações que colocará neste

cadastro, tendo o zelo de não colocar informações Sigilosas nestes documentos institucionais.

Por isso a importância de um documento específico do Serviço Social, no qual só os

Assistentes Sociais tenham acesso, e que seja guardado em um arquivo com chave, e que o

Assistente Social resguarde esse material, e segundo a entrevistada A:

O Serviço Social tem que ter um documento próprio, então é muito comum, e aí o

perigoso é você colocar informação Sigilosa nesse documento. Então a gente orienta

mesmo que o Assistente Social não tenha documentação específica do Serviço

Social, que ele jamais coloque informações Sigilosas nesses cadastros, porque tem

cadastro que tem observação, etc, então que ele faça o relatório da entrevista a parte,

e guarde em arquivo com chave, ainda sim se não tiver o arquivo com chave, que ele

até leve pra casa, mas que ele resguarde esse material.Significa que nem tudo que

ouviu na entrevista ele vai relatar no Cadastro da Instituição.

De acordo com as entrevistadas, com relação à quebra do Sigilo profissional, esta pode

ser entendida como algo que deve ser feito em última instância, isto é, excepcionalmente,

quando esgotadas todas as possibilidades, e quando expõe o usuário a risco iminente de vida.

Para a entrevistada A a quebra é: “Risco iminente de vida, que coloque em risco a vida do

próprio usuário ou de outra pessoa que esteja próximo dele”. Já a entrevistada B pontua que:

Então em geral a gente não sabe muito responder sobre isso, em relação a quebra da

Sigilo, mas em função da minha militância no Conselho Profissional, eu acabei me

debruçando um pouco mais, esse documento o Código de Ética que tá em vigor de

1993, diz muito claro que a quebra do Sigilo Profissional ela deve ser feita somente

numa situação, absolutamente excepcional, especialíssima e somente quando ao

mesmo tempo há uma situação, uma circunstância, um problema, que envolva o

próprio usuário, é terceiros, ou seja, outros sujeitos que se relacionam com o

usuário, e a sociedade, ou a comunidade próxima, na verdade eu aprendi isso,

porque no próprio texto, você acha que é ou numa situação, ou é em outra, ou é

numa terceira, e na verdade foi uma Agente Fiscal, que atua na Sede do CRESS que

me ensinou numa reunião que nós tivemos, de Diretoria, nos ensinou, me ensinou,

pelo menos a mim ela ensinou, ela falou não gente, tem que ter uma circunstância

que envolva e que possa comprometer essas três partes ao mesmo tempo, é o

usuário, terceiros e a sociedade, ou a comunidade mais próxima, senão não há

quebra de Sigilo.

E a entrevistada C diz que:

46

A quebra do Sigilo ela é sempre muito polêmica, em que situações é possível

quebrar o Sigilo, o Código de Ética ele, o nosso Código deixa muito claro, você só

quebra Sigilo profissional em situações que aquela informação, é, pode favorecer a

não colocar terceiros em risco, então assim recebi uma informação, e eu sei que

aquela informação é importante pra preservar o direito de um terceiro envolvido, só

que isso, tem que ser muito cuidado, pensar o que significa isso tem que ser muito

analisado, com cautela, discutido, nas equipes, etc. Mesmo estando muito claro no

Código que a quebra do Sigilo ela só é permitida, só é possível diante do risco

colocado a terceiro, mesmo esse risco ele tem que ser analisado com cautela, porque

senão a gente faz uma interpretação mecânica, superficial e acaba colocando aquela

pessoa que deu uma informação pra gente, ou sobre a qual a gente tem acesso aquela

informação, em uma situação de violação de direitos, de uma relação desigual, então

eu diria que as situações de quebra de Sigilo elas são muito é, inéditas assim, elas

são poucas, elas não são, eu acho que o Sigilo profissional só pode ser quebrado em

último caso, em situações de risco mesmo iminente de vida e ainda sim , ele tem que

ser analisado com profundidade, até pra gente entender o que nós estamos chamando

de risco de vida, o grau de isso ocorrer ou não , porque é uma situação muito

delicada, então eu diria que é em último caso. Ele existe a possibilidade, existe, mas

eu penso que ela é uma possibilidade remota, extremamente excepcional, e ela só

pode ser tomada a hora que o profissional, a equipe tiver esgotado todas as

possibilidades na relação com o usuário, em situações muito particulares, e no

limite, como situação limite.

Analisando as respostas dadas pelas entrevistadas, a questão da quebra do Sigilo

profissional é algo muito polêmico, pois é algo que envolve o laço de confiança estabelecida

entre o profissional e o usuário, o vínculo, e é uma questão que dever ser analisada com

cautela. Segundo a Entrevistada C:

Então eu entendo a quebra do Sigilo nesse sentido e entendo que o fato não cabe ao

Código de Ética determinar em que situações pode ou não, ele tem que ser vago e

não é vago, ele tem que ser universal na verdade eu não acho que ele seja vago, eu

acho que ele tem que ter um grau de universalidade, como a lei, a lei ela não da

conta de todas as situações particulares, ela coloca uma normatização mais universal

e que cabe aqueles que se relacionam com a lei pensar as situações particulares que

cabem naquela normatização mais universal, acho que isso é um esforço, e ai exige

uma capacitação teórica dos Assistentes Sociais e dos estagiários, porque nós

estamos falando também de um espaço de formação, de exercitar a reflexão ética, de

se perguntar eticamente, o que significa a quebra ou não a do Sigilo em cada

situação, quem são sujeitos envolvidos nessa situação, com a capacidade dos

sujeitos envolvidos nessa situação de exercer a sua autonomia, que implicações

éticas e políticas existem nas duas situações de quebra ou de não quebra do Sigilo

nessa situação, isso tem que tá muito claro pras equipes e pros Assistentes Sociais,

porque você pode em nome de um direito, em nome da defesa de um direito

aprofundar a desigualdade que já existe numa dada realidade, você pode sim piorar a

situação. Então eu acho que essa capacitação teórica e esse exercício mesmo como

parte do trabalho profissional essa reflexão mais filosófica no sentido de perguntar

sobre o sentido, o que eu to afirmando que valores que estão em jogo, que

moralidade é essa, quando eu to avaliando essa situação, quais são os valores que eu

estou efetivamente legitimando, que eu estou de fato, levando em consideração as

determinações objetivas dessa situação ou eu to fazendo um julgamento moral dessa

situação, porque julgar a gente sempre julga não existe intervenção neutra, agora há

situações pedem julgamentos diferenciados, as vezes a situação pede julgamento

político, as vezes a situação pede julgamento valorativo ético e as vezes a mediação

é pela moralidade a gente tem que ter muita clareza disso, acho que isso é uma

questão que vale a pena pensar.

47

Para a entrevistada C:

Eu defendo que não, na verdade a realidade ela é dinâmica, ela apresenta sempre

situações inéditas pra nós, não cabe em nenhum debate teórico e muitos menos num

Código de Ética você tentar assegurar a dinâmica da realidade, o que cabe é ter uma

defesa de princípios de direitos e de deveres que se baseiam em uma dada concepção

de profissão, numa dada concepção de homem, numa dada concepção de sociedade,

e as situações particulares, o profissional com essa clareza com esse acúmulo ele vai

ter competência pra decidir e nas situações tão inéditas, tão conflitantes eu acho que

ele tem que dividir isso, tratar isso como uma situação que merece o

aprofundamento em equipe, que merece um encaminhamento que não seja

individual e as vezes até consulta, isso também, as vezes eu acho que os

profissionais eles tem uma relação com a Legislação e com a Normatização muito

abstrata, quando suscita dúvida o profissional não tem clareza, não conseguiu

resolver, ele pode fazer consultas formais, os nossos Conselhos eles tem inclusive

assessoria jurídica, tem os Agentes Fiscais, tem as Comissões de Fiscalização que

tem esse papel educativo, acho que a gente falou um pouco disso, eu acho que o

Serviço Social ele trata a fiscalização do exercício profissional de forma bastante

diferenciada das outras profissões, a tendência das outras profissões que a gente

conhecer é tratar de forma corporativista, o Serviço Social tem um traço corporativo

no sentido de resguardar a Instituição Serviço Social, mas ele é corporativo no

sentido de resguardar a profissão e não a defesa individual do assistente social, do

profissional, por isso as Comissões de Fiscalização e as outras comissões éticas que

fazem parte dos nossos Conselhos eles tem também essa perspectiva educativa, de

esclarecer de ser um espaço de consulta, de ser um espaço de reflexão, não por acaso

os Conselhos também organizam as Comissões por áreas de políticas públicas, que é

um modo de fomentar a discussão teórica, o debate etc., pra que os conflitos éticos

sejam enfrentados a partir de um acúmulo no interior de uma política setorial, então

por exemplo, eu tenho experiência na área da saúde, com usuário de drogas, com

redução de danos, eu tenho um acúmulo nessa área, tá ficando defasada pelo tempo

que eu to fora, um outro colega tem um acúmulo na Assistência, um outro colega

tem um acúmulo na Educação, as Comissões, que formam no CRESS de estudo de

debate etc., também contribuem pra que o profissional que participa ah eu to lá na

área da Assistência, se eu acompanho o debate da Assistência no interior do CRESS

eu também me respaldo eticamente pra tomar decisões, então eu acho que a questão

da quebra do Sigilo, a questão do cumprimento de um dever, um direito que tá

previsto no Código, ele fica mais tranqüilo, porque ele fica incorporado de forma

fundamentada, eu acho que esse desafio pra realização da ética profissional e pra

realização do projeto profissional, em que medida nós Assistentes Sociais nos

apropriamos do debate da categoria e respondemos as situações singulares,

particulares que se apresentam pra nós, de uma forma fundamentada, com clareza a

partir de um acúmulo que a própria categoria tem, e quando não tem a gente precisa

investir pra que ela posso ser consolidada.

Uma questão que também foi abordada com as entrevistadas foi se o Sigilo

profissional pode ser entendido também como um dever do Assistente Social. Segundo as

entrevistadas, o Sigilo profissional é entendido como dever, uma vez que o Assistente Social

toma contato com a intimidade da vida dos usuários e informações que os usuários expõem

para o profissional que revelam situações de desigualdade e de violência, então o Sigilo

profissional é uma proteção para o usuário, sobre essas informações que o Assistente Social

48

toma conhecimento. Segundo a entrevistada A: “Mas é um dever, é posto como um dever

também é um direito em relação à Instituição e um dever em relação ao usuário”. Já a

entrevistada B pontua que:

acho positiva essa reflexão porque denota que, aquele estudante ou aquela Assistente

Social, que afirmou que o Sigilo profissional é um dever dela ou dele, demonstra

que ela tem consciência da responsabilidade pública, que ela guarda, que ela tem,

que ela assume, porque a partir do momento que você se torna um Assistente Social,

você vai representar essa profissão, no seu Estado, no seu país, enfim você vai

representar toda uma categoria de Assistentes Sociais, então isso é muito sério, então

essa noção do dever do Sigilo profissional eu acho bacana, ou seja é uma

consciência assim de olha, eu devo cuidar para que na minha relação profissional

com o usuário, esse usuário ele possa ter as melhores condições né para poder falar

de si, de suas experiências , de uma forma Sigilosa, de uma forma que não fique

todo mundo sabendo da sua vida, de uma forma leviana, sem cuidado, sem respeito

né, então acho que essa reflexão do Sigilo profissional como dever é positiva,acho

muito positiva.

E para a entrevistada C:

eu acho que tem as duas faces, pelo seguinte, eu acho que é um dever na medida em

que o Assistente Social tem que só usar a quebra de Sigilo nas situações

excepcionalíssimas porque tem uma relação de confiança, que ele estabelece com o

usuário, tem uma relação de confiança que implica e eu acho que isso eu falei, você

provoca o usuário a te dar informações, no atendimento você é que define a

condução que você vai dar, então em situações de atendimento individual, até

mesmo de atendimento em grupo, na maioria das situações é o Assistente Social que

conduz o atendimento, então é ele que faz as perguntas, então muitas vezes, a

informação que eu tenho do usuário, fui eu que pedi, fui eu que provoquei que ele

me desse, e talvez se eu deixasse muito claro, pra ele o uso que eu faria dessa

informação, talvez ele não daria essa informação. A exposição que o usuário faz da

sua vida, da sua intimidade pra receber um atendimento do Assistente Social, não só

do Assistente Social mas as vezes ele faz isso com o médico, ele faz isso com outros

profissionais, eu acho que a gente tem que ter uma clareza que é dever nesse sentido,

nós provocamos numa entrevista, num atendimento que ele nos forneça, nos dê

informações, então a gente tem técnicas inclusive pra isso, a gente aprende na nossa

formação determinados instrumentos e técnicas, pra provocar o ambiente de

confiança, o ambiente protegido para que ele ponha as condições objetivas de sua

vida, e muitas vezes a gente chega até a intimidade, dependendo do local onde eu

trabalho a gente pode chegar a intimidade, isso tem que ficar muito claro pro

Assistente Social, nesse sentido, ele tá confiando ele tá abrindo aquela informação

porque de fato ele tá confiando, então é esse sentido que eu defendo que é um dever

do Assistente Social porque a gente provoca que ele exponha então a gente tem que

assegurar que essa exposição seja Sigilosa, seja protegida. Há situações em que

aquela exposição, aquela informação revela riscos a terceiros, há, então nessas

situações isso tem que ser discutido com o usuário, isso tem que ser muito

claramente definido pela equipe, pelo Assistente Social, pra que a gente não cometa,

pra que a gente não acirre a violação de direitos que os usuários já estão vivendo

quando estão diante de um profissional, de um Assistente Social, então nesse sentido

ele é um dever. Ao mesmo tempo, que eu posso considerar que é um direito diante

de algumas obrigações judiciais inclusive, então eu posso me valer do Sigilo

profissional pra proteger a informação do usuário e pra me resguardar perante a Lei,

então há situações em que eu posso ser mandado a fornecer alguma informação e eu

vou dizer não, não vou fornecer porque tá aqui, então eu posso usar também o

Código de Ética e o artigo que trata do Sigilo profissional como um direito meu,

então eu acho que tem essas duas faces desse artigo que prevê lá o Sigilo

49

profissional, ele é um dever na relação com o usuário e ele pode ser interpretado

como um direito pra resguardar um direito de revelar informações que diz respeito

ao atendimento a autonomia profissional e ao Sigilo que eu to respeitando em

relação ao dever que eu tenho na relação com o usuário, então eu acho que cabe

essas duas formas de pensar.

Algumas perguntas que foram feitas especificamente para a entrevistada A, as quais

me proponho analisar nesse momento. Questionei a Agente Fiscal que está previsto no Art.18

que:

A quebra do Sigilo só é admissível quando se tratarem de situações cuja gravidade

possa, envolvendo ou não fato delituoso, trazer prejuízo aos interesses do usuário, de

terceiros e da coletividade.

Parágrafo único - A revelação será feita dentro do estritamente necessário, quer em

relação ao assunto revelado, quer ao grau e número de pessoas que dele devam

tomar conhecimento (CFESS, 1993, p.7).

Sendo assim, levantei a seguinte questão, quais as informações que tomamos contato

no cotidiano profissional que podem ser consideradas “estritamente necessárias”? Segundo a

entrevistada A: “Eu acho é risco de vida, risco eminente de vida. Que coloque em risco a vida

do próprio usuário ou de outra pessoa que esteja próximo dele”. Ou seja, essa questão também

se relaciona com as situações de quebra de Sigilo, pois o Código prevê, conforme citado

acima que a revelação é feita dentro do estritamente necessário, e o que pode se concluir de

todas as entrevistas realizadas é que a quebra deve ser feita em último caso, como última

possibilidade e nos casos de risco iminente de vida do usuário.

Outra pergunta feita a entrevistada A foi como é feita essa avaliação pelo CRESS dos

casos de quebra de Sigilo que são passíveis de sanções e punições, e quais são os casos de

quebra de Sigilo que são passiveis de sanções e punições. Segundo a Entrevistada A, mesmo

que o Assistente Social escute de um usuário uma confissão de crime, essa informação jamais

deve ser revelada, pois ao contrário o Assistente Social pode ser um delator, esse tipo de

situação é passível de punição. Essas questões são avaliadas por Comissão denominada

Comissão de Denúncia Ética que faz esta análise a partir do Processo Ético Disciplinar, que

vai ver se está previsto no Código de Ética, encaminha para, a Comissão de Instrução que vai

ouvir todas as partes envolvidas, e em última instância vai a julgamento, podendo o envolvido

constituir um advogado.

Questionei a Agente Fiscal a respeito do Art. 15 do Código de Ética profissional, que

diz: “Constitui direito do Assistente Social manter o Sigilo profissional” (CFESS, 1993, p.7),

coloquei que o Código de Ética prevê que o Sigilo profissional é um direito do Assistente

50

Social, e sendo assim, de que forma isso é materializado na prática profissional. A

entrevistada respondeu que temos a Resolução de n° 493, como instrumento para garantir esse

direito, com relação à necessidade que temos em ter uma sala adequada para atendimento, um

arquivo adequado para guardar o material, mas que independente disso, o Assistente Social

deve ter cuidado em não registrar informações Sigilosas no Cadastro Institucional, colocando

apenas dados gerais.

51

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das questões estabelecidas no processo de elaboração desta pesquisa, verifica-

se que o surgimento do Serviço Social enquanto profissão se dá num contexto de ampliação

do sistema capitalista, sobretudo em sua fase monopolista, na qual há uma intensa exploração

da força de trabalho operária, o que gera precárias condições de vida e de trabalho para essa

classe. Sendo assim, o operariado passa a se articular e lutar por melhores condições de vida

e de trabalho, passando a ser alvo de regulamentação política do Estado, através de

implementação de políticas sociais que atendessem suas necessidades. Sua ação foi por muito

tempo voltada para o ajustamento dos indivíduos ao que era considerado como “normal”, a

fim de promover a manutenção do status quo para o desenvolvimento do sistema capitalista,

tendo como base de sustentação teórica o humanismo cristão e neotomismo (principais idéias

e fundamentos de São Tomás de Aquino, juntamente com uma visão conservadora de

mundo).

A partir das entrevistas realizadas, sobretudo, o entendimento que a Entrevistada C

tem acerca dos Códigos de Ética anteriores, houve um grande equívoco no texto destes

Códigos ao regulamentar ou normatizar em quais situações deve-se quebrar o Sigilo, quais

informações devem ser resguardadas porque são consideradas Sigilosas, entre outras.

Entende-se que não cabe ao Código de Ética regulamentar essas questões ou prever “situações

modelo” de quebra de Sigilo, de informações que devem ser resguardadas. O Código de Ética

não pode, nem deve dar conta das situações particulares e singulares as quais se deparam os

Assistentes Sociais em sua atuação profissional. Cabe ao Assistente Social ter clareza dos

princípios éticos, da base de sustentação teórica que está por trás de sua atuação profissional

no cotidiano e a partir de sua autonomia enquanto profissional tomar as decisões e avaliar as

situações particulares que lhes são apresentadas. Pôde-se perceber também que o Sigilo

profissional no âmbito do exercício da profissão sempre esteve presente nos Códigos de Ética

do Serviço Social brasileiro, e abordado com muita importância, visto que sua abordagem

aparece em todos os Códigos de Ética do Serviço Social.

Cabe destacar que aspectos como a terminologia utilizada (Segredo/Sigilo),

informações consideradas Sigilosas, possibilidades de quebra do Sigilo profissional, Sigilo

52

profissional diante de depoimento judicial ou policial, Sigilo profissional enquanto

direito/dever do Assistente Social, o Sigilo no âmbito do trabalho interdisciplinar, que foram

aspectos tomados como indicadores de análise desta pesquisa modificaram-se e tem

abordagens diferentes nos Códigos de Ética profissional, sempre abordados, mas com

características que refletem o contexto vivenciado pela profissão na época e a base de

sustentação teórica da prática profissional.

Concluo, portanto, que a pesquisa realizada procurou apenas esboçar o aspecto ético-

normativo de abordagem do Sigilo profissional no decorrer da trajetória profissional vivida

pelo Serviço Social brasileiro, não esgotando a complexidade apresentada pela realidade

vivenciada pelos Assistentes Sociais em sua atuação profissional. Resguardar o Sigilo

profissional nos dias atuais torna-se um desafio cotidiano para os Assistentes Sociais, visto

que nos deparamos cada vez mais com condições precárias de trabalho, vínculos

empregatícios vulneráveis, condições essas que ameaçam não só o Sigilo profissional, mas

também a qualidade do serviço prestado a população usuária do Serviço Social.

53

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procedimento/ código de ética do assistente social-quebra de sigilo/ Constituição

Federal – violação do direito a intimidade e a privacidade. CFESS, abr. 2013.

Conselho Federal de Serviço Social. Resolução n.493, de 21 de agosto de 2006. Dispõe

sobre as condições éticas e técnicas do exercício profissional do Assistente Social e

prevê algumas condições mínimas para o exercício da profissão. CFESS, 2006.

Conselho Federal de Serviço Social. Resolução n.556, de 15 de setembro de 2009.

Dispõe sobre os procedimentos para efeito de lacração do Material Técnico e

Material Técnico-Sigiloso do Serviço Social. CFESS, 2009.

Conselho Federal de Serviço Social. Resolução n. 559, de 16 de setembro de 2009.

Dispõe sobre a atuação do Assistente Social, inclusive na qualidade de perito judicial

ou assistente técnico, quando convocado a prestar depoimento como testemunha,

pela autoridade competente. CFESS, 2009.

MANIFESTAÇÃO JURÍDICA Nº 31/14 Assessora Jurídica do CFESS Sylvia Terra. ASSUNTO: Declaração de NULIDADE da Resolução CFESS nº 559 de 16 de setembro

de 2009, que dispõe sobre a atuação do assistente social, inclusive, na qualidade de

perito judicial ou assistente técnico, quando convocado a prestar depoimento/

SUSPENSÃO de seus efeitos – nacionalmente - por decisão do PODER JUDICIÁRIO/

Punições que tenham sido aplicadas, com base na Resolução CFESS nº 559/2009,

ficam, também, anuladas.

Conselho Regional de Serviço Social 17ª. Região/ES. Termo de Orientação:

Irregularidades quanto à circulação de documentos elaborados por Assistentes

Sociais em seus espaços sócio ocupacionais / quebra do sigilo profissional/Código de

Ética/Constituição Federal. COFI, ago. 2013.

FORTI, Valéria. Ética, Crime e Loucura: Reflexões sobre a Dimensão Ética no Trabalho

Profissional. Lumen Juris Editora, Rio de Janeiro, 2009.

GOVERNO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Lei Estadual n.5261, de 11 de junho de

2008. Determina a obrigatoriedade da existência de local reservado para a atuação

dos profissionais de Serviço Social no âmbito da Administração Estadual direta,

indireta e fundacional, com vistas a preservação do Sigilo e da qualidade do

atendimento. 2008.

SAMPAIO, Simone Sobral; RODRIGUES, Felipe Wingeter. Ética e Sigilo profissional.

Serviço Social & Sociedade n. 117, p. 84-93, jan./mar. 2014.

SANTOS, Silvana Mara de Morais dos. O CFESS na defesa das condições de trabalho e

do projeto ético político profissional. Serviço Social & Sociedade n. 104, p. 695-714,

out./dez. 2010.

SIMÕES, Carlos. O dever do sigilo profissional. In: __________.Curso de direito do

serviço social. São Paulo : Cortez, 2008. p. 522-534. (Biblioteca Básica de serviço social,

v.3)

VELOSO, Renato. O sigilo profissional. In: _______. Serviço social, tecnologia da

informação e trabalho. São Paulo, Cortez, 2011. p. 192-195.

DVD

SEMINÁRIO NACIONAL DE CAPACITAÇÃO DAS COFIS DO CONJUNTO CFESS-CRESS, 9º,

Brasília, 19-20/07/2014.

Mesa-Redonda: Josiane Soares Santos; Alessandra Ribeiro de Souza. Fortalecimento da

Política Nacional de Fiscalização e sua interface com as políticas de seguridade social:

atribuições, sigilo e outros debates.

SEMINÁRIO NACIONAL DE CAPACITAÇÃO DAS COFIS DO CONJUNTO CFESS-CRESS, 8º,

Brasília, 30/05 a 01/06/2013.

Mesa Redonda: Maurílio Matos; Rosa Predes e Sylvia Terra. A garantia do sigilo

profissional: um desafio ético.