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M ANGÁ T ROPICAL - U M E STUDO DE C ASO - 1 - MANGÁ TROPICAL UM ESTUDO DE CASO Patrick Raymundo de Moraes Brasília 2011 Edição Revista em 2018

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M A N G Á T R O P I C A L - U M E S T U D O D E C A S O

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MANGÁ TROPICALUM ESTUDO DE CASO

Patrick Raymundo de Moraes

Brasília2011

Edição Revista em 2018

P AT R I C K R A Y M U N D O D E M O R A E S

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© by Patrick Raymundo – 2011

Ficha Técnica

Revisão e Composição Patrick Raymundo

DiagramaçãoHelkton Gomes

[email protected]

Arte da CapaAle Nagado

ISBN: 978-85-64280-36-6ISBN E-BOOK: 978-85-64280-37-3

Raymundo, Patrick Manga Tropical- Um estudo de caso / Patrick Raymundo de Moraes. – Brasília, 2011. 64 p.

CDU 659.3

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AGRADE CIMENTOS

Agradeço a Elza Keiko, Alexandre Soares e Alexandre Nagado pelo prestimoso apoio à conclusão deste trabalho. Agradeço à minha mãe e avô pelo apoio em um momento de difi-culdade de saúde. Agradeço a Deus pela chan-ce de poder terminar este trabalho. E saúdo minha avó (em memória) e minha orientadora pela luz e sabedoria com as quais me orienta-ram. Obrigado a todos.

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SumárioAPRESENTAÇÃO 5

INTRODUÇÃO 6

CAPÍTULO I 10A história e criação dos mangás no Japão 10

CAPÍTULO II 21Narrativa e estilo dos quadrinhos. 21

CAPÍTULO III 34Estudos culturais 34

CAPÍTULO IV 39Mangá Tropical 39

Conclusão 42

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 43

IRMÃS! Texto laureado. 47

A VIDA É UM ELO ENTRE RAZÃO E FÉ! 50

SONHOS 53

SOMOS… 55

O AMOR SUPERA O CASTIGO 56

UM DESBAFO SINCERO! COMO UMA DOENÇA PODE ANIQUILAR OU RECONSTRUIR UMA FÉ! 59

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APRESENTAÇÃO

Em 2005, estava terminando a faculdade de Comunicação Social- Jornalismo, pelo IESB. O mercado de animês (de-

senhos animados japoneses) e mangás (histórias em quadrinhos japonesas) dava um salto para o futuro. O Canal Animax estrea-va sua programação voltada exclusivamente para os animês, e as editoras JBC e Conrad, desde o ano de 2000, distribuíam mangás para todo o Brasil. Foi nesse cenário que eu produzi minha mono-grafia. Em 2010, tivemos um novo cenário, muito positivo para os mangás. A editora JBC ganhou a companhia de outras editoras, como a Panini e a NewPop. Maurício de Souza lançou Turma da Mônica Jovem e, inclusive, a Marvel lançou seus heróis no formato estético japonês. Lamentavelmente, a Conrad, como será explicado no trabalho, teve que renegociar diversos de seus títu-los e o Animax mudou de perfil, mudou de nome, e teve seu sinal cancelado pelo grupo Sony. E o trabalho continua atual? Sim, a produção de novas histórias brasileiras, com a influência da nar-rativa e estética japonesa continua, portanto, o meu estudo con-tinua válido para tentar analisar esses produtos. Vamos começar!

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INTRODUÇÃO

O tema abordado neste trabalho refere-se a questão de ordem cultural: existe um mangá genuinamente nacional? Isto

é, histórias feitas por brasileiros e que possuem inspiração nas histórias em quadrinhos japonesas (mangás)? Para tal, é necessário entender o conceito de mangá, identidade cultural, cultura de massa e abordar o tema relacionado com a globalização. Seria possível que uma técnica pudesse ser transmitida sem que a sua ideia – conceito do que seja o mangá em si – se perdesse, ou se transformasse, assimilando o sentido da nova sociedade?

O termo mangá é a união de dois ideogramas japoneses: man (humor/divertido) e ga (imagem). O termo fora defindo por Katsuhika Hokusai (1760 – 1849) em 1814. Sendo uma palavra que caracteriza histórias em quadrinhos, as revistas que as publicam, assim como caricaturas e cartoons em geral. Para início de trabalho, mangá será usado como definição de histórias em quadrinhos. No parágrafo abaixo, iniciaremos um pequeno salto na história e veremos o crescimento do interesse do mangá no Brasil, pois o surgimento do mangá, no Japão, será tema para o capítulo I.

No Brasil, em 2000, observamos o crescimento do interesse pelo mangá, porque a editora Conrad, na época, lançou 4 títulos – Pokemon, Gen- Pés Descalços, Dragon Ball e Cavaleiros do Zodíaco, seguindo o modo de leitura oriental. Em 2001, a editora JBC anuncia o lançamento de 4 mangás: Samurai X, Video Girl

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Ai, Sakura Card Captors e Guerreiras Mágicas de Rayearth. A novidade, para a época, era que estes lançamentos seguiam quase todas as regras de edição dos quadrinhos japoneses, ou seja, quadrinhos em preto e branco, leitura oriental (orientação de leitura da direita para a esquerda), além de tamanho e papéis semelhantes aos usados no Japão.

“Como a JBC é uma editora japonesa com sede também no Brasil, optamos por lançar o mangá com as mesmas características do original publicado no Japão. Tanto o formato quanto a leitura foram mantidos, assim como as onomatopéias originais. A intenção é fazer um produto seguindo o padrão de qualidade nipônico.” (Prefácio da primeira edição de Samurai X, editora JBC).

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A diferença entre um mangá importado do Japão, lançado aqui no Brasi, e o mesmo título lançado lá, era o número de capítulos. Os mangás brasileiros tinham o dobro do número de edições do original japonês, porque tinham a metade dos capítulos por edição. Atualmente, JBC e Panini estão lançando mangás com a mesma quantidade de capítulos que os originais, embora a prática do meio “tanko” permaneça forte. O termo “tanko” vem de “tankobon”, que é uma coletânea de capítulos de uma mesma história.

Esse fenômeno recente se desenvolveu bastante. A Panini e JBC disputam o mercado com demais editoras, que tentam desenvolver o trabalho de autores nacionais. Segundo a História dos Mangás no Brasil, o mangá nacional se desenvolveu na década de 60.

“...o estilo mangá passa a ser adotado no Brasil ainda nos anos 60, quando vários artistas, descendentes de japoneses, começaram a ter seus trabalhos publicados. Tiveram histórias sobre ninjas e samurais publicadas pela editora Edrel, em revistas que duraram até os anos 70... As tentativas de trazer os autênticos mangás para o Brasil não deram certo, talvez pela simples razão da barreira que separava o mercado ocidental do oriental.”

Apesar da estética mangá nacional ter sido identificada, no Brasil, em 1960, foi com a massificação do mangá japonês, pelas editoras acima, realizando uma onda de transformação que, possivelmente, o mangá nacional fora amplamente divulgado. Stuart Hall (2000:15) identifica que, à medida que diferentes áreas do globo são colocadas em contato uma com as outras, “ondas de transformação atingem virtualmente todo o globo”.

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O trabalho visa identificar a estética do mangá e do quadrinho brasileiro. Analisar se ela produz a imagem de um produto nacional, usando-se de técnicas e enredos – que chamaremos de arcabouço temático japonês (ATJ). Ou seja, se ele possui uma identidade nacional, um discurso que produz sentido sobre a “nação” (Brasil), sentido com o qual podemos nos identificar como brasileiros, em união com a identidade nipônica. Trataremos o objeto de estudo, então, como um produto híbrido, passível de duas identidades.

Recapitulando:

Identificar enredos e técnicas próprias de mangás (ATJ) que possam estar sendo usados para a construção de quadrinhos no Brasil. Dentro do ATJ, identificar estruturas próprias da cultura japonesa e características semelhantes no objeto de estudo: Mangá Tropical. Para tanto, estarei usando um objeto de estudo – Mangá Tropical, para tentar responder a esta pergunta.

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CAPÍTULO I

A história e criação dos mangás no Japão

Para se entender melhor a criação de mangás no Brasil, que teve início na década de 60, e com nomes como Minami Kei-

zi e Cláudio Seto, precisamos analisar a sua origem no Japão.

Parte de um Chojugiga

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No Japão

A história do mangá é uma das teorias mais controversas que há.Uma das versões sobre sua origem é citada pelo site es-pecializado em cultura japonesa Manga Xplosion. Para eles, o mangá teve início da seguinte maneira: “Voltando nossos olhos para um Japão do século VI e VII, notamos o povo japonês abra-çando a poderosa crença Budista e os pergaminhos chamados Chojugiga, que apresentavam animais em situações humanas. Chojugiga que significa, literalmente, ‘quadros humorísticos de animais e pássaros’, era a primeira aparição do mangá no Japão”.

Esses pergaminhos serviam para transmitir os ensinamen-tos de Buda, fazendo o homem ponderar sobre seus erros e peca-dos, em uma era de guerra (Kamakura). Alfons Moliné (2004:18) informa que esses pergaminhos são de autoria do sacerdote-artis-ta Toba (1053-1140).

Já outros estudiosos, como Alexandre Barbosa (2005:109), defendem a teoria de que a globalização, isto é, o contato do Japão com outras culturas, como a britânica, foi decisiva para a criação do mangá. A abertura dos portos japoneses, na era Meiji, trouxe várias novidades para o Japão, entre as quais o quadrinho. Charles Wirgman, um inglês que havia trabalhado na Punch, cria, por volta de 1868, a Japan Punch, que trazia charges e cartuns com humor e irreverência. Barbosa ainda cita que os japoneses entraram no mun-do dos quadrinhos vendo um humor e uma forma narrativa que não eram as suas, mas que, com o tempo, conseguiriam adaptar.

O mangá foi sendo desenvolvido gradativamente ao longo dos séculos. O mangá se iniciou, então, como pequenas charges

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de uma página que retratavam o dia-a-dia das pessoas. Exatamen-te como os pergaminhos do final do século VI e VII.

Danilo Saraiva, para o site especializado em cultura pop japonesa OHAYO, já assume a posição de que a criação do man-gá possui mais de três séculos: “Ao contrário do que se pensa, o mangá não é uma coisa tão recente. Estudos afirmam que a pri-meira história em quadrinhos japonesa surgiu em 1702, já com divisões em quadrados, traços de expressão e balões de fala”. Se-gundo Danilo, o estilo só foi se especializar mesmo no início do século XX, quando surgiram editoras interessadas em publicar esse conteúdo. Assim, os mangás passaram a ter distribuição po-pular, não sendo mais uma coisa limitada a guetos ou do conhe-cimento de poucos.

Matéria da FOX NEWS (26/08/2005) parece ser da mes-ma opinião, ao relatar que podemos traçar a verdadeira origem do mangá no Japão do século12, porém com a criação oficial do mangá começando no século 19, quando famosos artistas regio-nais, como Hokusai, produziram as primeiras pinturas em blocos de madeira, muito similares aos quadrinhos. Hokusai publicou al-gumas cenas/sketches em uma coleção intitulada “hokusai man-gá”.

Alfons Moliné defende a tese de que, como os pergami-nhos Chojugiga possuíam tais características, e o significado da palavra mangá é amplo, podendo significar cartuns, quadrinhos, caricaturas, e toda a sorte de impresso de histórias em quadri-nhos, a sua origem se dá com o nascimento dos pergaminhos Chojugiga.

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Para fins de estudo, usaremos a criação de mangá com o surgimento dos pergaminhos, pois a palavra e acepção de manga, no Japão, é extensa e ampla o suficiente para agregar valor aos pergaminhos como sua primeira origem e, posteriormente, com o advento da chegada da era Meiji, e a abertura dos portos japone-ses ao ocidente, essa forma de expressão foi se desenvolvendo até a criação da Japan Punch.

Então, se houvesse um quadro de evolução da espécie, pensando como Darwin, este seria assim expresso de maneira simples: Chojugiga, Ukiyo-e (período Edo) e Mangá.

Ukiyo-e

Ukiyo-e era uma forma barata de diversão das massas e que também “retratava as pessoas nos prazeres e passatem-pos da vida” (Mangá Xplosion). “Na era Edo, xilogravuras, ou ukyo-e (...) tornaram-se a arte pictórica mais popular do Japão. Tiveram profunda influência sobre artistas como Matisse e Van Gogh” (Guia Visual do Japão:2000:81).

E o primeiro artista a fazer nome com esse tipo de arte foi Moronobu, que morreu em 1694. A era dourada do ukiyo--e durou de 1790 a 1850. Lindas mulheres, atores de Kabuki, cenas do Japão e o sobrenatural eram temas recorrentes. O tea-tro kabuki tem como característica o movimento exagerado dos personagens, atores maquiados e roupas vistosas.

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O mangá ganhou força realmente, para seu sucesso, depois de muito tempo, quando foram lançadas as primei-ras publicações coloridas. Na virada do século, as charges passariam por uma metamorfose, ou seja, elas deixariam de ser estáticas e centralizadas e passariam a ser sequênciais. Esta mudança agradou tanto que os mangás ganharam revis-tas próprias.

Ukiyo-e

Assim, surgia, em 1905, a primeira edição específica de quadrinhos e charges, chamada de TOKYO PUCK. Esta revis-ta era voltada unicamente a assuntos políticos. Aqui se inicia a grande fase do mangá moderno, com seu criador máximo, Osamu Tezuka (o Deus do mangá).

Tezuka consegue um título além dos títulos de tratamen-

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to convencionais. No Japão, uma pessoa demonstra sua afeição, ou contentamento, utilizando-se de formas de tratamento, como chan ou kun, ao final do nome. Exemplo: Dani-chan, Patrick--kun etc. Para Osamu, ele conseguiu o título máximo que é sama (algo muito mais afetuoso e de respeito do que os demais) sen-do usado, inclusive, para tratamentos divinos, tais como Kami--sama (Senhor Deus). Osamu-sama pode ser dito como pai ou deus do mangá.

Osamu Tezuka (1928 – 1989)

Aqui é difícil separar a história do mangá da história des-te criador, pois sua influência no mangá foi incomparável. Para identificar o prestígio que o autor possuía no Japão, deixaremos na íntegra o editorial do jornal Asahi: “Por que os japoneses apre-ciam tanto os mangás? Parece que os estrangeiros estranham essa mania. Por que os estrangeiros passaram tanto tempo sem ler mangás? Um dos motivos é que eles não tinham um Osamu Tezuka no país deles” (10/02/1989).

Toshio Ban nos diz que o desenhista de mangás Osamu Tezuka percorreu toda a era Showa deixando uma quantidade impressionante de obras. Segundo ele, foram cerca de 150 mil páginas de mangás e pouco mais de 60 obras de animação. A era Showa (1926 – 1989) foi um período de recuperação econômica do país pós Segunda Guerra Mundial. Em site de sua própria em-presa, os números de quadrinhos é impressionante, pois ele soma 700 títulos em sua carreira.

No final dos anos 40, o desenhista e roteirista deu a seus personagens imensos olhos, cabelos esquisitos, coloridos e tra-