m moisés - questão coimbrã e geração de 70

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Do Autor OfJras Escolhidas de Machado de Assis, 9 vais., S. Paulo, Cultrix, 1960-1961. (Orga- nização, introdução geral, cotejo do texto, prefácios e notas) A /.i/eratura Portuguesa, S. Paulo, Cultrix, 1960; 36ª ed., 2009. l~orrlGlntismo-Realismo e Modernismo, vaIs. II e III da Presença ela Literatura Portugue- sa, S. Paulo, Difusão Européia do Livro, 1961; 2ª ecl., vaI. 111,1967, vol. V, 1971; 4ª ed., vol. m, 1974; 6ª ed., vol. V,2002. ('am(ies, Lírica, S. Paulo, Cultrix, 1963; 14ª ed., 2001. (Seleção, prefúcio e notas) A Criação Literária, S: Paulo, Melhoramentos, 1967; 13ª ed., Poesia, S. Paulo, Cul- trix, 2006; 17ª ed., Prosa-I, S. Paulo, Cultrix:2008; 21" ecl. Prosa-li, S. Paulo, Cultrix, 2007; 20ª ed. 1'(,((IH'YlODicionário de Literatura Brasileira, S. Paulo, Cultrix, 1967; 7" ed., 200H. « :o-organização, co-direção e colaboração) ;\ I ill'leI{ura Portuguesa Através dos Textos, S. Paulo, Cultrix, 1968; 31" cd., 2009. :\ I i/c'/eI{Ula Brasileira Através dos Textos, S. Paulo, Cultrix, 1971; 26" ecl., 2007. /\ /\I/cl/"c' /.ilerária, S. Paulo, Cultrix, 1969; 16ª ed., 2007. I l/c ;ol/cllio de '/ámos Literários, S. Paulo, Cultrix, 1974; 13ª ed., 2006. ( ) (OI/lo l'cJ/lu,t.:ul's, S. Paulo, Cultrix/EDUSp, 1975; 6ª ed., 2005. (Seleção, introdu- ,;tp I' tIPla,,,;) I i/c'/cl/II/eI: Mundo e Forma, S, Paulo, CultrixlEDUSp, 1982. 11;.,IIII;cl dCI /.iloafu.ra Brasileira, 5 vais., S. Paulo, Cultrix/EDUSp, 1983-1989; \ vols., S. I'auio, Cultrix, 2001, vol. I - Das Origens ao Romantismo, 2" ed., 2.004; vol. I1 - I~('alismo, Simbolismo, 2ª ed., 2004; vol. lll- Modernismo; 2ª ed., 2()(H. ( ) (;IIc1nlcujor de I~('kmhos e Outros Poemas, de Fernando Pessoa, S. Paulo, Cultrixl I:l)lJSI; IllHH,H"cd., 2006. (Seleção e introdução) () Ilcmc/uciro Anurquis/a e Outras Prosas, de Fernando Pessoa, S. Paulo, Cultrixl EDUSp' 19H8, 2i!ed. revista, 2008. (Seleção e introdução) h'ft]cmc1o Pessoa: O Espelho e a Esfinge, S. Paulo, CultrixlEDUSp, 1988; 3ª ed., 200H. A I.ilaaluru Portuguesa em Perspectiva, 4 vais., S. Paulo, Atlas, 1992-1994. (Orga- nizaçdo e direção) A, hfc'{Í(as Lilerárias em Portugal. vol. I - Séculos XlV CI xvm, Lisboa, Caminho, 1l)()7;vol. 11 - Séculos XVJ/l e X/X, 2000. Melc lu/do de Assis: l'i(l1o c' 1/lo{Jicl, S. Paulo, (:ult ri", .'(lO I ( OI/lo.' ele Melc lIucio cir Ih,h, S 1':lll!P, I \)(J I. (r' ('(I , .'(lU!) «( l'I',:1I11::Il,';1l1, illlrlllllll.;\II, (l'vi":II) dI' Il'XIlI," I' tlol'as) MASSAUD MOISÉS A LITERATURA PORTUGUESA 36ª edição, revista e atualizada I (J)I'I'ORA ('I Jl:t'RIX Süo Palllo

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Capítulo sobre a Questão Coimbrã.

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Page 1: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

Do Autor

OfJras Escolhidas de Machado de Assis, 9 vais., S. Paulo, Cultrix, 1960-1961. (Orga-nização, introdução geral, cotejo do texto, prefácios e notas)

A /.i/eratura Portuguesa, S. Paulo, Cultrix, 1960; 36ª ed., 2009.l~orrlGlntismo-Realismo e Modernismo, vaIs. II e III da Presença ela Literatura Portugue-

sa, S. Paulo, Difusão Européia do Livro, 1961; 2ª ecl., vaI. 111,1967, vol. V,1971; 4ª ed., vol. m, 1974; 6ª ed., vol. V,2002.

('am(ies, Lírica, S. Paulo, Cultrix, 1963; 14ª ed., 2001. (Seleção, prefúcio e notas)A Criação Literária, S: Paulo, Melhoramentos, 1967; 13ª ed., Poesia, S. Paulo, Cul-

trix, 2006; 17ª ed., Prosa-I, S. Paulo, Cultrix:2008; 21" ecl. Prosa-li, S. Paulo,Cultrix, 2007; 20ª ed.

1'(,((IH'YlODicionário de Literatura Brasileira, S. Paulo, Cultrix, 1967; 7" ed., 200H.« :o-organização, co-direção e colaboração)

;\ I ill'leI{ura Portuguesa Através dos Textos, S. Paulo, Cultrix, 1968; 31" cd., 2009.:\ I i/c'/eI{Ula Brasileira Através dos Textos, S. Paulo, Cultrix, 1971; 26" ecl., 2007./\ /\I/cl/"c' /.ilerária, S. Paulo, Cultrix, 1969; 16ª ed., 2007.I l/c ;ol/cllio de '/ámos Literários, S. Paulo, Cultrix, 1974; 13ª ed., 2006.( ) (OI/lo l'cJ/lu,t.:ul's,S. Paulo, Cultrix/EDUSp, 1975; 6ª ed., 2005. (Seleção, introdu-

,;tp I' tIPla,,,;)

I i/c'/cl/II/eI: Mundo e Forma, S, Paulo, CultrixlEDUSp, 1982.11;.,IIII;cl dCI /.iloafu.ra Brasileira, 5 vais., S. Paulo, Cultrix/EDUSp, 1983-1989;

\ vols., S. I'auio, Cultrix, 2001, vol. I - Das Origens ao Romantismo, 2" ed.,2.004; vol. I1 - I~('alismo, Simbolismo, 2ª ed., 2004; vol. lll-Modernismo; 2ª ed.,2()(H.

( ) (;IIc1nlcujor de I~('kmhos e Outros Poemas, de Fernando Pessoa, S. Paulo, CultrixlI:l)lJSI; IllHH,H"cd., 2006. (Seleção e introdução)

() Ilcmc/uciro Anurquis/a e Outras Prosas, de Fernando Pessoa, S. Paulo, CultrixlEDUSp' 19H8, 2i!ed. revista, 2008. (Seleção e introdução)

h'ft]cmc1o Pessoa: O Espelho e a Esfinge, S. Paulo, CultrixlEDUSp, 1988; 3ª ed.,200H.

A I.ilaaluru Portuguesa em Perspectiva, 4 vais., S. Paulo, Atlas, 1992-1994. (Orga-nizaçdo e direção)

A, hfc'{Í(as Lilerárias em Portugal. vol. I - Séculos XlV CI xvm, Lisboa, Caminho,1l)()7; vol. 11 - Séculos XVJ/l e X/X, 2000.

Melc lu/do de Assis: l'i(l1o c' 1/lo{Jicl, S. Paulo, (:ult ri", .'(lO I

( OI/lo.' ele Melc lIucio cir Ih,h, S 1':lll!P, I \)(J I. (r' ('(I , .'(lU!) «( l'I',:1I11::Il,';1l1, illlrlllllll.;\II,

(l'vi":II) dI' Il'XIlI," I' tlol'as)

MASSAUD MOISÉS

A LITERATURA PORTUGUESA

36ª edição, revista e atualizada

I (J)I'I'ORA ('IJl:t'RIX

Süo Palllo

Page 2: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

III

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illiIi'T111!I'

ii

VIIIREALISMO

(1865-1890)

PRELIMINARES

Nos anos seguintes a 1860, desencadeia-se profunda reviravolta na vida men·tal portuguesa: o Romantismo, exausto, agonizante como estilo de vida e dearte, embora presente em muitas de suas facetas, sofre os primeiros ataquespor parte da nova geração. Mais uma vez é Coimbra que serve de trincheintpara os revolucionários, com a diferença de que o grito rebelde parte agora (bmassa estudantil, alvoroçada pelas idéias vanguardeiras dum Proudhon, dumQuinet, dum Taine, dum Renan e outros. Em 1861, Antero de Quental fundaa Sociedade do Raio, associação secreta que congrega cerca de duzentos estu··dantes da Universidade de Coimbra, com o objetivo de instaurar a aventura, aanarquia, a insubordinação, no âmbito do convencionalismo acadêmi.co. Emoutubro do ano seguinte, escolhido para saudar o Príncipe Humberto ela ltú-lia, Antero exalta a Itália livre e Garibaldi, então ferido em combate, num sig..nificativo gesto de audácia e rebeldia.

A Sociedade do Raio ainda vai agir no ano seguinte, raptando o Reitor Bnsi··lio Alberto e obrigando-o a renunciar às suas funções. Empolgados pelas no··vas idéias revolucionárias, em 1864 Teófilo Braga publica dois volumes dt'versos, a Visão dos Témpos e as "[(>mpeslades Sonoras, c em 1865, Ant(~l'(1edita asneks Moâf'fI'ws: eríl oIgot:t qut' l'allavn. N\~SI\' intcrinl, Pin!wirn Chngas t'SÇI\'W

Page 3: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

220 A LITERATURA PORTUGUESA REALISMO 22"

o Poema da Mocidade e procura o amparo de Castilho, seu mestre nas Letras.Cheio de entusiasmo, o poeta das Cartas de Eco e Narciso remete longa carta aoeditor da obra, a qual foi acrescentada em forma de posfácio na edição quedela se fez em 1865.

Na missiva, ao mesmo tempo que se refere calorosamente ao fiel discípulo,dirige-se com desagrado aos moços de Coimbra, em especial Antero e Teófilo,aos quais acrescenta Vieira de Castro, I afirmando que

"muito há que me eu pergunto a mim donde proviria esta enfermidade que hojegrassa por tantos espíritos, de que até alguns dos mais robustos adoecem, que fazcom que a literatura, e em particular a poesia, anda marasmada, com fastio demorte à verdade e à simpliCidade, com o olhar desvairado e visionário, com ospassos incertos, com as cores da saúde trocadas em carmins postiços", etc.

Mais adiante, diz: "Lembra-me que uma das causas a que o mal se poderáatribuir será a falta de convivência mútua destes pobres mancebos, que, tendosido pela natureza predestinados, se fazem precitos; que, talhados para res-plandecerem no panteão daqueles gênios, que os séculos ficam adorando, secondenam às trevas próximas do limbo", etc.

Dirigindo-se à poesia do tempo, Castilho pondera: "Se a afetação e a enfa-luação, se a falsa grandeza, que não é senão tumidez ventosa, se a ambição eincongruência dos ornatos, se as palavras em lugar de coisas, as argúcias em vezde pensamentos, a sobejidão nauseabunda anteposta à parcimõnia que sustentae robustece, e o relampaguear havido por alumiar, se tudo isto combinado emdiversas proporções, segundo variam as índoles, as horas, ou o grau da doençados escritores, constitui em resumo a desgraça de muitíssima da nossa poesiaatual, parece logo que o tratamento per si se está aconselhando", etc.

E mais adiante: "Quem não vê que vem tornando a contagiosa escola dosconceitos, das sutilezas, das vanidades discretas, dos alambicamentos metafísi-cos, das bátegas de flores, de pérolas, de diamantes, das mariposas, das estre-las, das asas de anjos; a anarquia, o turbilhão enfim de todas quantas imagensudas e miúdas há, e pode, e não pode haver, para usurparem o lugar devido

I Ill'i(i Cardoso VieIra de Castro (UB8·l872), de curta e desgl'<lç'ada vida, notabilizara-se como

,\1,\1101' ;lind,1 II'.JaIl<i.) ('Sltl<iantc em Coimbra, razi\o por qll(' (a!,lílltoo IIIcnciona ao lado dos

•.I.li'. po('I,I' •. "I'U:';/l1~"'I/'I'.' ",,/I/,/lIII"IIIII/C, pllbl il'ar'llII ~t CIIl IWl(,

aos pensamentos e aos afetos; a mascarada das figuras em suma, as saturnais dafantasia, a soltura das florais?" A insinuação vai por aí fora, até que o missivistapassa a tratar diretamente dos três moços de Coimbra, e por fim resume o seupensamento: "Deixando de parte, por agora, Braga e Quental, de que, pelas aI·turas em que voam, confesso, humilde e envergonhado, que muito pouco en··xergo nem atino para onde vão, nem avento o que será deles afinal", etc.

Antero, líder do grupo a que Castilho se refere acremente, de pronto revi"da as alusões que lhe são dirigidas, num opúsculo que recebeu o nome (li'

Bom-Senso e Bom Gosto, saído no mesmo ano de 1865. Falando em "escola deCoimbra", e à luz da boa fé, afirma:

"eu hei de sempre ver uma péssima ação, digna de toda a importância dum castigo, nas impensadas e infelizespalavras de V Exª, dignas quando muito dum sorriso de desdém e do esquecimento.

E se eu nem sequer me daria ao incômodo de erguer a cabeça de cima do nu'tI

trabalho para escutar essas palavras, entendo que não perco o meu tempo, qtl('

sirvo a moral e a verdade, censurando, verberando a desonesta ação de V Ex"."

Assim, com a violência entusiasmada dos vinte e cinco anos, Antero J~tz<l

súmula do pensamento que orienta a sua geração:

"combatem-se os hereges da escola de Coimbra por causa do negro crime elesuadignidade, do atrevimento de sua retidão moral, do atentado de sua probidade lile··rária, da impudência e miséria de serem independentes e pensarem por suas cahc··ças. E combatem-se por faltarem às virtudes de respeito humilde, às vaidadesomnipotentes, de submissâo estúpida, de baixeza e pequenez moral e intelectual."

o desagravo termina irreverentemente:

"Levanto-me quando os cabelos brancos de V Exª passam diante de mim. Mas (1

travesso cérebro que está debaixo e as garridas e pequeninas causas que saemdele confesso não merecerem, nem admiração, nem respeito, nem ainda eslitrlaA futilidade num velho ,ksgosta-llle tanto como a gravidade numa criança. V. I'xti

pl'ecisarnenos cinqüclll;\ ali.':'; (Iv idade, ou cnlúo mais cinqüetlla anos til'

I'C11l.'ldl 1."

Page 4: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

222 A LITERATURA PORTUGUESA REALISMO 223

Estava armada a polêmica, que passou a chamar-se pelo título do folhetoanteriano, ou ainda pela de Questão Coimbrã. Em defesa do pai, sai a campo Jú-lio de Castilho, seguido por Teófilo Braga, com um folheto intitulado As Teocra-cias Literárias, e Antero, com A Dignidade das Lerras e as Literaturas Oficiais.Formam-se dois partidos, um, pró-Castilho e outro, pró-Antero, que vão en-g.rrossandodurante os anos de 1865 e 1866, inclusive estendendo-se até o Brasil,com a adesão de D. Pedro II e Sílvio Romero. O número de opúsculos ascendea algumas dezenas entre as duas facções, integradas ainda por escritores comoCamilo, com o folheto Vaidades Irritadas e Irritantes, a favor da causa romântica,mas a pedido de Castilho; Ramalho Ortigão, com Literatura de Hoje, contra An-lero, o que obriga este a desafiá-lo em duelo e com ele se bater em fevereiro deIB66; Augusto Malheiro Dias, Amaro Mendes Gaveta, pseudônimo de CunhaBelém, Urbano Loureiro, Diogo Bernardes, Brito Aranha, Rui de Porto-Carrero,I;. A. Salgado, Carlos Borges, Eduardo Augusto Vidal e tantos outros.

Com a Questão Coimbrã, definia-se a crise de cultura que instala o Realis-mo em Portugal. A vitória sorri aos moços, mas era preciso que voltassem à

carga mais adiante a fim de consolidar as suas posições. A derrota de Castilhosignificava apenas o golpe de morte no Romantismo: nem era necessário tantoruido para abater as modas envelhecidas; bastava aguardar os anos, mas écondição da juventude o gosto de pôr abaixo estrepitosamente os velhos ído-los l' banzas. Não obstante, Castilho continuaria pelos anos fora a exercer in-fluência, mais ou menos clandestina, ou indireta, como se pode observar napoesi.a de Eugênio de Castro e de outras figuras do século XX.

Formados em Coimbra, os participantes da revolta anticastilhista e anti-mrnántica, dispersam-se e só voltam a reunir-se em Lisboa, em 1868, no gru-po do Cenáculo. Em casa de Jaime Batalha Reis (1847-1935), realizam encontrosperiódicos: Eça de Queirós, Antero, Oliveira Martins, Ramalho Ortigão, Salo-IIlÚOSáragga, Santos Valente, Mariano Machado de Faria e Maia, José EduardoI.(lho da Costa, e outros que aparecem menos. Congrega-os uma "escandalosaf\lI"tmlhade Revolução, de Metafísica, de Satanismo, de Anarquia, de BoêmiafC rllZ", como lembra Eça de Queirós no retrato que pintou de Antero numap:igi11<\ de rara beleza, intitulada Um gênio que era um santo.

1:111 IH71 , os integrantes do Cenáculo resolvem organi.zar um ciclo de con-fl'll'lH'ii\Spúhlicas, com o fito de pôr em c1iscussiío franca os problemas c asqlll",tncs dc nnkrn idc\\I\\p,ic:\quc ent:\(l inl(Te~,Savalll:",gClllc ndla ela Europa

e da América do Norte. Para tanto, alugam o Cassino Lisbonense, uma espéciede café-concerto onde se reúne a boêmia áurea do tempo, para ver o can-can eouvir cançonetas picantes. Situado a dois passos do Chiado, artéria elegantede Lisboa, era o lugar ideal para levar a efeito o cometimento. Depois de anun-ciadas enfaticamente, sobretudo pelo jornal A Revolução de Setembro, a 16 demaio de 1871 distribuía-se o programa-plataforma das conferências, intitula-das Conferências Democráticas Estabelecidas na Sala do Cassino, Largo da Abego-aria. Mais tarde, passaram a chamar-se Conferências do Cassino Lisbonense.Entre outras considerações, a plataforma apregoava o seguinte:

"Ninguém desconhece que se está dando em volta de nós uma transformação po-

lítica, e todos pressentem que se agita, mais forte que nunca, a questão de saber

como deve regenerar-se a organização social. [... ]

Abrir uma tribuna, onde tenham voz as idéias e os trabalhos que caracterizam este

movimento do século, preocupando-nos sobretudo com a transformação social,

moral e política dos povos;

Ligar Portugal com o movimento moderno, fazendo-o assim nutrir-se dos ele-

mentos vitais de que vive a humanidade civilizada;

Procurar adquirir a consciência dos fatos que nos rodeiam, na Europa;

Agitar na opinião pública as grandes questões da Filosofia e da Ciência moderna;

Estudar as condições da transformação política, econômica e religiosa da socieda-

de portuguesa;Tal é o fim das Conferências Democráticas."

Doze assinaturas leva o documento: Adolfo Coelho, Antero de Quental,Augusto Seromenho, Augusto Fuschini, Eça de Queirós, Germano Vieira Mei-reles, Guilherme de Azevedo, Jaime Batalha Reis, j. P Oliveira Martins, Ma-nuel de Arriaga, Salomão Sáragga e Teófilo Braga.

A 22 de maio de 1871, Antero abre a série de palestras com O Espírito dasConferências, que consiste em agitar idéias que colocassem novamente Portu-gal no ritmo da cultura européia do tempo. A conferência seguinte, a 27 demaio, Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos últimos Três Séw/os, ('ainda eleAntero, que aCI-edil:WHlósscrn três as causas do fenômeno: primeira,() (:at(1Iicismo do Condli\\ dc lrcnln; segunda. o Ahsolutismo; Icrrcit':t, :tsLl1ll!jlllslas. \lal':.l J'l'1I ICdtar ollwl. ,\nltro prl1pugna pela Rcvolu<,;:\o:"p (:l"Ístla

Page 5: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

Antero, intitulado Carta ao Exmo. Sr:Antônio José d'Ávila, Marquês d'Ávila, Pre-sidente do Conselho de Ministros, e por requerimentos solicitando fosse julgadoem tribunal o seu direito de reunião. Tudo em vão. No calor dos protestos,Alexandre Herculano abandona o silêncio de seu "exílio" em Val-de-Lobos eescreve uma carta, intitulada A Supressão das Conferências do Cassino, em quese coloca inteiramente contra a suspensão das conferências, embora discordede algumas idéias de seus patrocinadores. Como sempre, não faltou quemaplaudisse o ato governamental, como fez Pinheiro Chagas.

Com terem sido definitivamente suspensas, ficaram sem efeito outras queestavam programadas: o Socialismo, por Jaime Batalha Reis, A República, porAntero, A Instrução Primária, por Adolfo Coelho, A Dedução Positiva da IdéiaDemocrática, por Augusto Fuschini. Todavia, o espírito revolucionário que asanimava, esse não morreu; aliás, ganhou força de coisa proibida e atraiu umalegião de adeptos, a tal ponto que o ano de 1871 assinala a vitória decisiva dasidéias realistas em Portugal, pouco depois consolidada com a publicação, em1875, de O Crime do Padre Amaro, de Eça de Queirós.

Ao grande impacto provocado pela narrativa de fundo anticlerical, seguiu-se o aparecimento de obras teóricas acerca das questões estéticas levantadaspelo novo movimento literário. Na verdade, como raramente aconteceu emLiteratura Portuguesa, à instalação da ideologia realista sucedeu a proliferaçãode textos doutrinários: Do Realismo na Arte (1877) e Estética Naturalista (1885),de Júlio Lourenço Pinto (1842-1907), Júlio Dinis e o Naturalismo (1884), deJosé Antônio dos Reis Dâmaso (1850-1895), Do Realismo na Arte (5ª ed., 1877)e Realismo (1880), de Antônio José da Silva Pinto (1848-1891), Ensaios de Cn-tica e Literatura (1882), de Alexandre da Conceição (1842-1889), A Escola Re-alista e a Moral (1880), de Carlos Alberto, Notas e Impressões (1890), de LuísCipriano Coelho de Magalhães (1859-1935), e outros.

A geração realista (também chamada "geração coimbrã" ou "geração de70"), dispersou-se logo depois da supressão das conferências do Cassino Lis-bonense, e não mais voltou a reunir-se para lutar pela implantação do moder-no pensamento filosófico e científico em Portugal. Entre 1871 e 1887, essaesplêndida geração - a única que a rigor merece o rótulo dentro da LiteraturaPortuguesa - ating<' o apogeu de suas realizações, aglutinada fervorosamentecrn torno do mesmo l1bjellV(l e rezando pela mesma cartilha filosófica e cicnl j.

Ilc,l, haseada nos cnsinanWlllos (k 'l;linc, Proudholl, Darwin, Spencl'l', IIcgell'

A LITERATURA PORTUGUESA

Ilismo foi a Revolução do mundo antigo: a Revolução não é mais do que o(:ristianismo do mundo moderno".

A terceira conferência, efetuada a 5 de junho, por Augusto Seromenho, in-t ilula-se A Literatura Portuguesa, e nela o orador afirma a decadência da Litera-lma Portuguesa por falta de originalidade e gosto, evidente na poesia, noromance, no drama e na crítica que então se praticavam em Portugal. Para re-mediar a situação, aponta o caminho do Cristianismo, entendido como essen-cialmente diverso do Catolicismo.

Cabe a Eça de Queirós proferir, a 6 de junho, a quarta conferência, sob oI II ulo de A Literatura Nova (O Realismo como Nova Expressão da Arte). Apoian-do-se nas idéias de Proudhon, prega a revolução que se vinha operando napolítica, na ciência e na vida social. Para tanto, havia que considerar a Litera-Illra um produto social, condicionado a determinismos rígidos. A fim de ilus-lrar suas observações, Eça critica acerbamente o Romantismo por fugir aoIJ( IVO conceito de Arte, ao mesmo tempo que defende o Realismo, como a cor-!\'nte estética que realiza o consórcio entre a obra de arte e o meio social.( ,llurbet, na pintura, Flaubert, na ficção, servem-lhe de exemplo.

A quinta conferência, sob o título de A Questão do Ensino, é proferida a 19de junho, por Adolfo Coelho. Após discorrer acerca da necessidade e dos finsdl) ensino, passa a examinar-lhe as formas e tipos, e por fim, a organização emPortugal. No mesmo diapasão dos antecessores, o conferencista afirma a deca-dC,nciado ensino como resultante da aliança entre a Igreja e o Estado. Para re-solver o problema, entende que urge operar-se a separação entre ambos epromover a liberdade do pensamento. •

A sexta conferência, de autoria de Salomão Sáragga, gravitaria ao redor deOs .Historiadores Críticos de Jesus, mas não se realizou: as conferências tinhamsido suspensas, acoimadas de exporem e sustentarem "doutrinas e proposi-,úes que atacam a religião e as instituições políticas do Estado; e sendo certoque tais fatos, além de constituírem um abuso do direito de reunião, ofendemdara e diretamente as leis do reino e o código fundamental da monarquia, queos poderes públicos têm a seu cargo manter e fazer respeitar", como rezava aportaria do Marquês d'Ávila e de Bolama, de 26 de junho de 1871, afixada nasportas do Cassino Lisbonense.

'Ihlhic!os de surpresa, os organizadores das conil'rC'ncias protestam ver ..Il1Ctltelllen1l'Iwlos jllrnais, por Idhctos avulsos, dentl'l' 1.15 quais sobressai o de

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REALISMO 225

Page 6: m Moisés - Questão Coimbrã e Geração de 70

226 A LITERATURA PORTUGUESA REALISMO 227

outroS. Nesses anos, ainda embalados pelo êxito recente e pelo ardor próprioda juventude, sentem-se identificados por ardente fúria iconoclasta, dirigidacontra o espírito romântico sentimental e hipócrita, que consideram produtodas três instituições necessitadas de urgente reforma, a Monarquia, a Igreja e aBurguesia. Antimonárquicos, defendem princípios republicanos e socialistas,anticlericais e antiburgueses.

Entretanto, em fins de 1887 e princípios de 1888, alguns deles voltam aintegrar com outros mais o grupo de Os Vencidos da Vida. Título inesperado eambíguo, designa uma geração de "vencedores" agora reunidos tão-somentepara confraternizar e divertir-se em lautos banquetes, numa volúpia de viverpossivelmente destinada a servir de lição aos mais novos. Lá no fundo, porém,tlota-se um travo de amargura e melancolia, que o riso e a pilhéria mal disfar-(:am. Animava-os, certamente, o sentimento de haverem conseguido levar acabo o intento da juventude, isto é, arrasar Portugal, com a crítica e a ironia,Ilao sem descobrir que, ao fazê-lo, também se haviam esmagado. Congraçan-do-se festivamente, Oliveira Martins, Guerra Junqueiro, Antônio Cândido,I.uís Soveral, Carlos Mayer d'Ávila e Bernardo Pindela, pseudônimo do Condede Ficalho, apenas testemunham a agonia da revolução realista e o surgimentoduma onda de revolta contra eles, à semelhança da que provocaram em 1865.

Para impedi-la, e resistir ao naufrágio iminente, só lhes restava construiralgo que fosse coerente com os ideais de 1865 e 1871. Obra de otimismo e decstimulação do patriotismo adormecido, é o que procuram erguer a partirdessa tomada de consciência, sem perceber que concordavam tacitamentecom os pressupostos estéticos da falange simbolista, tel}-doà frente Eugênio deCastro, na década de 90.

Curiosa coincidência essa, que embaralha o panorama literário entre 1890e 1915, mas sem comprometer o saldo positivo deixado pelo Realismo; este,tornou-se inquestionavelmente um dos mais expressivos momentos da cultu-nl portuguesa, quer por sua ação benéfica sobre as consciências estagnadas dotcmpo, quer pelas obras literárias cujo aparecimento condicionou.

ORIGENS DO REALISMO - Ressalvado o caso das notas objetivas encon-trúwis nos rornallces deJúlio Dinis, e que devem pôr-se na conta de influênciai1\gksa (' de \lutms causas pessoais, o Realismo é de origern francesa. Além doqUl' a Iln,',lo de Slclldhall' de Balzac jú continha de atitude anti-romúntica, as

primeiras manifestações de grande importância datam de 1850 e 1853, anosem que, respectivamente, Gustave Courbet (1819-1877) expôs, não sem es-cândalo, duas de suas célebres telas realistas: Enterro em Ornans e As Banhistas.Independente, revoltado contra a pintura imaginativa do Romantismo, procu-rando nos seus quadros "traduzir os costumes, as idéias, o aspecto de [sualépoca [...], fazer arte atual", Courbet realiza em 1855, como represália a tersido parcialmente recusado na Exposição Universal de Paris, uma exposiçãode quarenta e uma telas sob o título de O Realismo, em cujo catálogo explica oporquê do rótulo: "O título de realista me foi imposto, como impuseram aoshomens de 1830 o título de românticos." Numa conferência pronunciada erllAnvers, em 1861, o artista diria que "o núcleo do Realismo é a negação eloideal. O Enterro em Ornans foi o enterro do Romantismo".

O esforço realista de Courbet vinha secundado por alguns escritores cp.\('defendiam idêntico ponto de vista. Hemi Murger (1822-1861) oferecia na~Cenas da Vida Boêmia (1848) um retrato fiel dos meios artísticos do tempo.Champfleury, pseudônimo de Jules Hudson (1821-1888), fizera algo de seme·lhante com a narrativa Chien-caillou (1847-1848) e outras no gênero, sem CC)\)·

tar com o seu manifesto, O Realismo, que veio à estampa em 1857, e apublicação do jornal Gazette, para defesa e ilustração do movimento: aliando ..se a Courbet e apoiando-lhe a pintura, Champfleury tornou-se o verdadeirocampeão do realismo na arte. Ainda resta lembrar Duranty (1833-1880), dis-cípulo de Champfleury, que funda em 1856 uma revista de combate, O Realis-mo, de efêmera duração. Quando, no ano seguinte, Flaubert publica MadameBovary - análise impiedosamente certeira da hipocrisia romântica e burguesa-, o Realismo pode-se considerar definido na França. Em 1867, com a publi-cação de Thérese Raquin, Zola inaugura o Naturalismo, metamorfose avançadada estética realista.

Todavia, é preciso compreender que a arte realista, em obediência ao pró-prio espírito anárquico alardeado, vinha inserida num contexto cultural que é

preciso ter em mente, ao menos nas linhas gerais, quando se pretende conhe-cê-la e julgá-la.

A revolução de 1848, seguida do estabelecimento da 2" República emFrança e do sufrágiO universal, corresponde a ampla transformação culturí\1.N(~ss(' rncsmo ano, I'nll'~·;t1~l'n;i1)(1832-1892) escreve o Fuluro <ia Ciénciu,grosso Ilt:lllllSl'l'i(ocOl'ltencill 11111"tll de fi.; rtn Vall)1"da \'i('rtcla, que () \'SCrilor

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só publica em 1890; em 1863, lança a Vida dejesus, com a mesma pulsão hu-manitária e a mesma fidelidade científico-histórica. Augusto Comte (1798-1857) cria o Positivismo com o Curso de Filosofia Positiva, publicado em seisvolumes entre 1830 e 1842.

Apresentando uma sistematização do conhecimento humano em forma depirãmide cujo vértice seria ocupado pela Sociologia, Comte defende a impor-lüncia fundamental da Ciência para a vida do homem em sociedade. Para tanto,propugna pelo abandono da Teologia e da Metafísica, em favor duma atitude deespírito voltada para: o conhecimento "positivo" da realidade, isto é, concreto,objetivo, passível de análise e experimentação, de forma que, com base no bomsenso, se procure saber o "como" das coisas em vez do "porquê".

Refletindo a doutrina positiva, Proudhon (1809-1865) constrói as basesdo pensamento socialista, por meio de jornais e de obras como Filosofia doProgresso (1835), Princípios de Organização Política (1843), Sistemas das Contra-cii(i)('s Econômicas (1846) e Teoria da Propriedade (1866). Ainda com funda-mento nas idéias de Comte, Hipólito Taine (1828-1893) tornou-se o verdadeiroteórico do Realismo e do Naturalismo: especialmente no prefácio da Históriadei{.ilnatura Inglesa (1864) e na Filosofia da Arte (1865-1869), expôs a sua teo-ria determinista da obra de arte, cuja existência obedeceria a leis inflexíveis: aela herança ("race"), do meio ("moyen') e do momento ("moment"), e ao fator do-rninante, embora variável, que denomina Jaculté maHresse (faculdade mestra),"conseqüência da psicologia do indivíduo".

Contemporaneamente, Darwin (1809-1882) publica A Origem das Espécies( 1859), uma verdadeira revolução no campo das ciências, sobretudo as bioló-gi.cas; e Claude Bernard (1813-1878) publica uma Introdução ao Estudo da Me-dicina Experimental (1865), que tanta influência exerceu sobre Zola desdeTháese Raquin (1867). Resta ainda considerar as idéias filosóficas de Schope-nhauer (1788-1860), de tão relevante presença no pensamento europeu dos('culo XIX: sem negar a Ciência, o pensador alemão pessimistamente conside-ra que o homem, submetido a determinismos morais, é por natureza fadado àdor e ao sofrimento, o mundo um imenso palco de falaciosas ilusões, e a pou-c<\a.lcgria conquistada resulta dum esforço doloroso que logo a destrói.

·I()eioesse quadro cultural, aqui apenas esboçado, serviu de esteio para asdOlltrinas rcalist~\sc naturalistas c, portanto, para :\S obms escritas com o in-tuito de l'xpl'ríllH'nl~l·las l' rcali?:'I-I:tselri :\rle

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CARACTERÍSTICAS DO REALISMO - Antes de passar às característicasdo Realismo, é preciso ponderar o seguinte: atitudes realistas houve sempre,desde que surgiu a arte, mas a moda realista aparece nos fins do século XIX, eé dela que estamos tratando no momento. Por isso, quando falamos em Rea-lismo, estética realista e cognatos, queremos referir-nos a um momento espe-cífico e diferenciado da história das literaturas européias e americanas. Ainda:por mais semelhanças que se possam estabelecer entre as atitudes realistas e amoda realista, separa-as uma grande distância, correspondente ao fato de asprimeiras serem assumidas num sentido demasiado amplo, e a segunda, numsentido rigoroso e definido. Com vistas a exemplificar a distinção, confronte-se o "realismo" dum Rabelais com o dum Flaubert, ou com o Naturalismo deZola, e do confronto salta logo uma diferença: o primeiro é incidentalmenl(~realista, quer dizer, apenas no caso em que se toma o vocábulo "realismo" coma significação primária de imagem crua das realidades, sobretudo daquelasque dizem respeito à vida dos instintos; enquanto os outros dois aderiram aoenfoque realista baseados em determinado programa estético, que pressupüeestreito vínculo entre a Arte, a Ciência e a Filosofia.

Por outro lado, é necessário não esquecer que entre o Realismo e o Nat.u-ralismo existem pontos de contato suficientes para justificar que alguns estu·diosos os considerem, equivocadamente, um pelo outro ou que os liguem porum hífen formando uma palavra composta. Embora até certo ponto seja plau-sível tal procedimento, na verdade há diferenças nítidas entre as duas tendên-cias, que serão focalizadas mais adiante, quando se tratar do romance realistae do naturalista. Com isso, fica entendido que as características apontadas aseguir referem-se à faixa comum entre o Realismo e o Naturalismo.

Primeiro que tudo, os realistas reagiram violenta e hostilmente contratudo quanto se identificava com o Romantismo. Anti-românticos confessos,pregavam e procuravam realizar a filosofia da objetividade: o que interessa é

o objeto, o não-eu. Para alcançar concentrar-se no objeto, tinham de destruira sentimentalidade e a imaginação romântica e trilhar a ünica via de aCeSsoàrealidade objetiva: a Razão, ou a inteligência. Eram, portanto, racionalistas, oque tornava o racionalismo a segunda grande característica do movimento.Mas a busca de uma visüo racional do mundo, no encalço da verdade, imIX's..soai e universal, irnplic:w<Ium V(H1('('i.\oespecífico de n~alidadc: i\ pergullta ..(/UI' c' fI'ul?--·· rcspl1lldii'lI:l'I ....tI <jlll' (,SI,\ fora de IHis COIllO ohjl'I11, L' p(ld(' ser