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LUIZ OTÁVIO REZENDE

Concurso para a Magistratura

Guia Prático

3ª Edição Revista, atualizada e ampliada

2016

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Nota à 3ª Edição

E chegamos à 3ª Edição!

Ainda ontem enviava ansioso o Guia Prático do Concurso para a Magistratura à Juspodivm, com aquela imagem clichê de novo autor cheio de expectativas sobre co-mo a obra de estreia seria recebida pelos leitores. Era um sonho se tornando realida-de, naquele sentimento tangível de dever cumprido após muita pesquisa e inúmeras versões de cada um dos capítulos do livro.

Para a minha surpresa, pouco mais de três meses após o festejado lançamento da obra, outra feliz realidade se apresentava, derivada da notícia de esgotamento precoce das duas tiragens iniciais da 1ª Edição, bem recebida não só por aqueles que tinham a magistratura como objetivo profissional, mas também pelas próprias bancas examinadoras, sendo o livro citado no julgamento de recursos visando a im-pugnação do edital de abertura do prestigioso certame promovido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

Certamente esse cenário trouxe uma grande realização pessoal, que, entretanto, jogou sobre esse singelo autor a responsabilidade de apresentar aos leitores um manual maior, mais completo e com informações adicionais não só sobre a carreira, mas tam-bém sobre as tão solicitadas dicas de preparação para cada uma das fases do certame.

Assim nasceu a 2ª Edição do Guia Prático, ou o livro verdinho, como carinho-samente costumo me lembrar.

Mais uma vez, e contando com o apoio incondicional de concurseiros de todo o país, vi uma edição de meu singelo manual esgotar as suas duas tiragens em pou-co mais de seis meses, com a diferencial de que cada uma delas teve quantidade de livros superior às impressas na edição pretérita.

Além disso, foi a partir dessa edição que recebi o convite para integrar o quadro de professores de um curso preparatório, cujo novo e promissor projeto era basea-

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - GUIA PRÁTICO • Luiz Otávio Rezende

do em um grupo de estudos na grande rede do Facebook, que conectava mais de setenta mil pessoas partilhando um sonho comum, qual seja, ingressar nos quadros da magistratura.

O início na docência foi difícil, e pude perceber, logo de cara, a importância ímpar de estar ao lado do aluno, com o diário desafio de repassar a contento o co-nhecimento acumulado após anos de estudo.

Os meses se passaram, e, enquanto recebia notícias sobre a boa receptividade da 2ª Edição, também fui informado uma, duas, três, e logo inúmeras vezes, das apro-vações seguidas dos alunos do curso MEGE em várias fases dos certames promovi-dos por tribunais de diversos estados brasileiros, tais como Distrito Federal, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Alagoas, Goiás, São Paulo e Santa Catarina.

Pude ver na prática que as dicas de preparação que reputava essenciais para o êxito nos concursos realmente eram efetivas, e, de alguma maneira, após o contato com o método de ensino que elaborei para o curso visando o estudo para a segunda etapa do certame, os alunos conseguiam obter resultados melhores nas provas a que se submetiam.

Nascia ali o mote para a 3ª Edição do Guia Prático do Concurso para a Ma-gistratura, fulcrada não só no incremento das dicas de preparação para o certame, extraídas desses meus primeiros meses como professor, mas também na apresentação das novidades legislativas e jurisprudenciais sobre o tema, e, ainda, com a juntada de entrevista com o Juiz Federal Sérgio Moro, cuja atuação em processos de relevo nacional trouxe novos ares à percepção geral da população brasileira sobre o trabalho do magistrado e seus efeitos na sociedade.

Tal como nas edições anteriores, reitero meu sincero desejo de que este simples manual possa ser um instrumento de estímulo à opção pela bela e desafiadora car-reira da magistratura, e se preste a auxiliar todos os que fizerem essa feliz escolha na longa e tortuosa caminhada até a aprovação no mais difícil concurso brasileiro.

Um grande abraço.

Brasília, fevereiro de 2016.

O Autor

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CAPÍTULO I

Você Realmente Deseja Ingressar na

Carreira da Magistratura?

A pergunta feita acima é de suma importância. Se, ao final desse primeiro capí-tulo, você ainda nutrir a vontade de se tornar magistrado, pode ter a certeza de que com persistência, disciplina, muito esforço e estudo dirigido esse anseio certamente será alcançado.

Decidi começar esse pequeno guia desmistificando alguns mitos normalmente ligados à magistratura, pois entendo ser primordial o conhecimento prévio dos per-calços do cargo almejado, com o intuito de trazer ao leitor um panorama completo da realidade profissional que irá encontrar.

Viso assim diminuir a possibilidade de uma escolha equivocada ser feita, hi-pótese essa com consequências altamente negativas àquele que tomar determinado caminho pessoal e profissional sem a certeza da correção dessa atitude.

Dito isso, declinarei neste primeiro capítulo os mitos mais importantes e co-mumente ouvidos no tocante à magistratura, procurando esmiuçar suas nuances e principais consequências diretas e indiretas aos que exercem a profissão, de maneira a impelir o leitor a realizar uma ponderada e completa reflexão antes de iniciar o longo caminho de estudos para o ingresso na carreira da magistratura.

Na verdade, conclamo o leitor a não visualizar nenhum dos mitos a seguir de-clinados como obstáculo à carreira, mas sim como ponto de reflexão, haja vista que toda e qualquer atividade possui prós e contras, e a magistratura não se mostra diferente quanto a esse aspecto.

À evidência, tenho que os percalços relatados devem servir nesse primeiro mo-mento para que o leitor se questione de forma tranquila e honesta se a realidade ine-

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - • Luiz Otávio Rezende

rente ao exercício da magistratura se enquadra não só no estilo de vida que detém, mas também no por ele almejado.

Por fim, e antes de iniciar, ressalto apenas que declinarei no capítulo seguinte minhas impressões positivas sobre a magistratura, com a finalidade de permitir que a decisão de ingressar ou não na carreira seja feita de forma ponderada e induvidosa, esperando, por certo, que minhas singelas palavras de incentivo se sobreponham aos problemas a seguir relatados, e signifiquem, ainda, um estímulo ao começo da empreitada visando à aprovação na maratona que hoje é o concurso da magistratura.

1. MITO DO SUBSÍDIO LIBERTADOR

Se você deseja ser magistrado única e exclusivamente em razão do valor do sub-sídio, melhor fechar imediatamente este singelo manual. Apesar de ser público e notório que se trata de alta quantia, devo alertar o leitor que esse fato não significa remuneração tão expressiva a ponto de permitir a completa e total independência financeira do novo juiz.

Como disse acima, é um valor substancioso, principalmente se comparado com os salários da grande maioria da população brasileira, mas, quando se leva em con-sideração a importância social e responsabilidade inata ao exercício do cargo, so-bretudo se compararmos tal quantia com a percebida por outros profissionais de ponta de diversas áreas, como médicos, engenheiros e administradores, vê-se uma grande defasagem salarial, constatação essa que tem afastado muitos profissionais da magistratura, à vista da possibilidade de auferirem igual ou maior valor em carreiras menos extenuantes, seja no aspecto físico-psicológico, seja no âmbito pessoal.

Muitos dos novos juízes têm enfrentado enormes dificuldades para a aquisição de casa própria e mantença das despesas mensais de suas famílias, especialmente aqueles residentes em grandes centros urbanos, localidades onde o alto custo de vida acaba por tomar parte considerável do valor auferido a título de subsídio.

Esse fator acaba por influir diretamente na qualidade do serviço prestado, já que obriga o juiz a buscar fontes complementares de renda na restrita área permitida por lei, qual seja, o magistério1-2, muitas vezes em prejuízo da atuação jurisdicional, ante a grande carga horária assumida para aquela finalidade.

1. Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias: (...) Parágrafo único. Aos juízes é vedado: I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério; II

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Cap. I –

Nesse ponto, dentre várias outras tentativas de valorização do subsídio dos ma-gistrados, destaco a plasmada na Proposta de Emenda Constitucional nº 63/2013, que visa instituir a parcela indenizatória de valorização por tempo na magistratura e no ministério público, no valor correspondente a 5% (cinco por cento) do subsídio do respectivo cargo a cada quinquênio de efetivo exercício até o máximo de 7 (sete), assegurado o tempo de exercício anterior em outras carreiras jurídicas, bem como na advocacia.2

Ressalto, ainda, a tentativa da magistratura de buscar a equiparação com o Mi-nistério Público, visando à simetria de direitos e garantias entre as duas carreiras, hipótese essa que acabou por redundar na Resolução nº 133/2011 do Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da qual os magistrados passaram a fazer jus a direitos previstos apenas na legislação atinente ao Ministério Público, tais como au-xílio-alimentação e possibilidade de indenização por férias não usufruídas em razão do acúmulo de trabalho3-4-5.

– receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; III – dedicar-se à atividade político-partidária. IV – receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contri-buições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas

juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo

O magistrado não deve assumir encargos ou con-trair obrigações que perturbem ou impeçam o cumprimento apropriado de suas funções

-

com o magistério deve sempre priorizar a atividade judicial, dispensando-lhe efetiva dis-

conduta adequada à sua condição de juiz, tendo em vista que, aos olhos de alunos e da sociedade, o magistério e a magistratura são indissociáveis, e faltas éticas na área do ensi-no refletirão necessariamente no respeito à função judicial.

-mento de assuntos particulares; c) Licença para representação de classe, para membros da diretoria, até três por entidade; d) Ajuda de custo para serviço fora da sede de exercício; e) Licença remunerada para curso no exterior; f) indenização de férias não gozadas, por

o pagamento das prestações pecuniárias arroladas no artigo primeiro correrão por conta -

em vigor na data de sua publicação.

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - • Luiz Otávio Rezende

Na verdade, a palavra de ordem tem sido “valorização”, tendo em conta que a grande maioria dos magistrados não considera o atual valor percebido condizente com a importância social e responsabilidade inerente ao exercício da judicatura.

Por todo o exposto, se o seu principal incentivo para se tornar juiz é tão somente o financeiro, deve, peremptoriamente, buscar outras carreiras que tenham a capa-cidade de lhe proporcionar maiores ganhos, muito embora seja forçoso reconhecer que o profissional cujo intento único é obter um grande salário nunca estará satis-feito com o valor deste ou mesmo com o trabalho escolhido, e, certamente, não irá exercer sua atividade de forma prazerosa, desafiadora e estimulante, aspectos básicos sempre verificados nos melhores profissionais das mais diversas áreas.4-5

2. MITO DA APOSENTADORIA TRANQUILA

Com certeza um dos grandes atrativos da magistratura e do setor público em geral era a possibilidade de aposentadoria pelo regime próprio, valendo-se o juiz de garantias como a paridade plena (igualdade de subsídio entre os togados da ativa e os aposentados) e a integralidade dos proventos (aposentadoria com o valor do subsídio ao final da carreira).

Todavia, como é cediço, várias Emendas Constitucionais (EC nº 20/1998, 41/2003, 47/2005 e 70/2012) acabaram por alterar por completo a situação funcio-nal do magistrado no tocante à aposentadoria, tolhendo as garantias acima delinea-das dos novos juízes, que, quando vierem a se aposentar, poderão ter um decréscimo do valor mensalmente auferido para fins de adequação dos proventos às novas regras constitucionais (CF, artigos 40, § 3º, e 93, VI).

-ca se posicionou pelo conhecimento parcial da ação, e, no mérito, pela improcedência do

e, no mérito, pela procedência do pedido. O voto do relator é pelo conhecimento da ação -

-gatoriedade de pagamento de auxílio-moradia a todos os juízes brasileiros, ressalvados os

-tos utilizados para o deferimento da liminar pleiteada foi justamente a simetria entre as

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Cap. I –

Nesse ponto, consigno que o Conselho Nacional de Justiça foi instado a se manifestar em procedimento de consulta formalizado pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, no qual se questionava a possibilidade de os togados se submeterem a regime distinto do estabelecido pelo artigo 93, VI, da CF, na redação dada pela Emenda Constitucional nº 20/98.

Segundo a Associação autora da consulta, haveria a necessidade de edição de lei de iniciativa exclusiva do Supremo Tribunal Federal para dispor sobre o sistema previdenciário dos magistrados, por incidirem, na espécie, as disposições constantes nos artigos 74 a 77 da Lei Orgânica da Magistratura, que não teriam sido revogados pela novel disposição constitucional trazida pela emenda citada linhas atrás.

Consoante se depreende do acórdão lavrado na Consulta nº 4132-47/2011, o CNJ decidiu pela aplicabilidade plena e imediata da nova regra constitucional aos magistrados, afastando a tese defendida pela associação dos juízes trabalhistas. Por oportuna, transcrevo a ementa do referido acórdão:

CONSULTA. REGIME DE APOSENTADORIA DOS MAGISTRADOS APÓS A ENTRADA EM VIGOR DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98. REGU-LAMENTAÇÃO CONTIDA NO ART. 40 DA LEI MAIOR POR EXPRESSA PRE-VISÃO DO ART. 93, INC. VI. NORMA DE EFICÁCIA PLENA. APLICAÇÃO INTEGRAL E IMEDIATA. 1. O art. 93, VI, da Constituição Federal, anteriormente à alteração promovida pela Emenda Constitucional nº 20/98, e os arts. 74 a 77 da Lei Complementar nº 35/79, disciplinavam o regime de aposentadoria dos magistrados. 2. Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 20/98, que modificou o art. 93, VI, da Carta da República, o sistema de aposentadoria dos magistrados pas-sou a submeter-se às mesmas regras direcionadas aos servidores públicos detentores de cargo efetivo, contidas no art. 40 da Constituição. 3. Embora o caput do art. 93 da Constituição Federal estabeleça que “Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura”, devendo tal lei observar os princípios dispostos nos incisos do mesmo artigo, tal norma não torna, por via de consequência, de eficácia contida todas as regras desses incisos, haja vista que a maioria desses dispositivos, no que se inclui o inciso VI, fixa critérios estritamente objetivos que não dependem de outra norma para produção de efeitos. 4. Nessa linha de raciocínio, considerando que o art. 93, VI, da Lei Maior é de aplicabilidade plena e imediata, obrigando todos à sua observância, é certo que a partir da entrada em vigor da Emenda nº 20/98 a aposentadoria dos magistrados passou a ser regida, sem restrições, pelo art. 40 da Lei Maior. Consulta conhecida e respondida negativamente. (Consulta nº 4132-47/2011. Relator Conselheiro Ney Jose de Freitas. Julgado em 27.03.2012)

Recentemente, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE) propôs uma ação originária junto ao Supremo Tribunal Federal pleiteando o reconhecimento do direito dos magistrados federais à aposentadoria especial prevista no artigo 40, § 4º, da CF, ao argumento de que o exercício da judicatura seria considerado atividade de risco.

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A ação foi distribuída ao Min. Luiz Roberto Barroso (Ação Originária nº 1800), que, por sua vez, refutou a tese acima elencada e indeferiu o pleito de tutela anteci-pada formulado pela AJUFE, mantendo a aplicabilidade da regra geral de aposen-tadoria aos magistrados brasileiros6, hipótese essa que, conforme o anteriormente exposto, certamente implicará redução salarial no momento da aposentadoria.

Dessa maneira, os candidatos à magistratura devem estar cientes do possível de-créscimo salarial futuro, de modo que atitudes como a adesão à previdência privada ou formação de poupança tornam-se obrigatórias, sob pena de vivenciarem grandes dificuldades financeiras em momento delicado da vida (início da terceira idade), razão pela qual essa circunstância deve ser devidamente considerada antes do início do estudo para a magistratura.

3. MITO DA ESCOLHA DIRIGIDA

Seguir os passos de um familiar pode ser considerado algo extremamente valo-roso quando avaliado pelo aspecto da inspiração e continuidade do sobrenome da família em determinada área de destaque.

No entanto, decidir pela magistratura pelo simples fato de seu pai, mãe, avô, avó, tio ou outro parente próximo ter abraçado essa carreira pode facilmente deixar de ser um sonho para se transformar em verdadeiro pesadelo, principalmente se essa opção significar a prevalência da vontade alheia sobre os seus verdadeiros anseios pessoais e profissionais.

Se a advocacia é a sua paixão, deve exercê-la com afinco, e o sucesso certamente virá com grande esforço e dedicação. Se, por outro lado, você sente que a realização ocorrerá como membro do Ministério Público, procure ingressar nessa grande car-reira de estado, visando desempenhar o importantíssimo papel social constitucional-mente determinado ao parquet.

-

-

-cional seja, em si mesma, uma atividade de risco. 3. Antecipação de tutela indeferida.

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Cap. I –

Igual raciocínio pode ser desenvolvido para as mais variadas opções possíveis ao bacharel em direito, devendo o candidato lembrar-se sempre que irá exercer a pro-fissão escolhida pelas próximas décadas, de modo que uma decisão equivocada terá efeitos altamente negativos no futuro, levando a uma vida profissional infeliz e sem estímulos positivos próprios, com alto potencial de comprometer a tão almejada qualidade de vida.

Devo dizer que em meu caminho pelos concursos vi vários colegas deixarem de lado seus verdadeiros sonhos apenas para que os anseios dos pais ou outros parentes próximos fossem atendidos.

Essa realidade acarretava desarrazoado aumento da pressão pelo sucesso na em-preitada, e, na grande maioria das vezes, significava uma lista enorme de fracassos, minando a confiança e individualidade dos que optaram por sonhos alheios.

Desse modo, conclamo o leitor a se perguntar, honestamente, se a escolha pela magistratura é realmente sua, pois só assim você poderá exercer sua vocação com afinco, serenidade e, claro, nutrido do prazeroso sentimento de fazer o que realmen-te quer e gosta, características importantíssimas para o alcance do efetivo sucesso profissional nesta grande carreira de estado.

4. MITO DA MANUTENÇÃO DA VIDA SOCIAL

A posse no cargo de juiz pode inserir a pessoa em realidade social totalmente diferente da antes vivenciada, impelindo, muitas vezes, uma brusca alteração de comportamento por parte do jovem julgador.

Sendo cargo de destaque, há, evidentemente, uma mudança de percepção por parte dos familiares quanto à posição do recém – aprovado na família, passando o novo juiz, mesmo sem saber ou se esforçar para tanto, ao patamar de arrimo jurídico dos familiares e amigos próximos.

Além de extremamente tormentosa, essa nova realidade acaba por expor o ma-gistrado a várias situações constrangedoras e, quase sempre, tratando-se de um fami-liar, a rusgas dificilmente passíveis de sanatória.

São muito comuns pedidos de interseção do magistrado em processos envolven-do a família ou amigos íntimos, pois aquele que faz o pleito pensa verdadeiramente que seu parente ou amigo, na qualidade de juiz, poderá influenciar determinado processo a seu favor.

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Dizer um não peremptório a esses pedidos e explicar claramente a situação me parece a melhor saída, haja vista que a “interseção” acima delineada representa não só ato ética e moralmente condenável, mas também constitui crime previsto no artigo 321 do CP.

Ao assim agir você deixará evidente sua postura de completo afastamento entre as situações pessoais e a atividade funcional exercida, evitando, ademais, que uma atitu-de passiva dê a impressão de possível mudança futura de opinião por parte do magis-trado, hipótese que acabaria por incentivar a continuidade das indevidas postulações.

Noutra via, devo alertar o leitor que, ao se tornar magistrado, você terá um pa-drão comportamental a manter, especialmente em cidades de pequeno porte, tendo em conta que sua figura representará para a população o próprio Poder Judiciário e sua imagem de equidistância e retidão, não lhe sendo permitidas condutas desabo-nadoras, tais como bebedeiras, discussões em público, frequência a locais de cunho social negativo e vida noturna muito ativa7.

O cuidado não se restringe a atitudes, mas também às eventuais opiniões emi-tidas nos autos, exigindo-se que essas não se mostrem impróprias ou excessivas. No próprio CNJ há precedente, de relatoria do então Conselheiro Rui Stoco, no sentido de que ao magistrado não se pode prejudicar ou punir por suas opiniões, com a só ressalva de impropriedade ou excesso de linguagem (PCA nº 23273/2008)89.

Como pessoa pública, qualquer ato reprovável ganhará dimensão muito supe-rior, haja vista a imediata associação da pessoa ao cargo, hipótese essa que acaba por macular, em última análise, a própria magistratura10.

meios de comunicação social, comportar-se de forma prudente e equitativa, e cuidar es-pecialmente: I – para que não sejam prejudicados direitos e interesses legítimos de partes e seus procuradores; II – de abster-se de emitir opinião sobre processo pendente de jul-gamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos, sentenças ou

do magistério. Art. 13. O magistrado deve evitar comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social, mormente a autopromoção em publicação de qualquer natureza.

Art. 15. A integridade de conduta do magistrado fora do âmbito estrito da atividade ju-

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Cap. I –

Por fim, não posso deixar de expor outra realidade indissociável do exercício do cargo, qual seja, a dificuldade na mantença e formação de novos vínculos de amiza-de, pois como ocupante de cargo público de destaque, sempre há a desconfiança da aproximação imbuída de interesse, muitas vezes escuso, por parte de velhos e novos amigos.

Não foram poucos os colegas que vivenciaram problemas com a situação narra-da acima, e as histórias de decepções são muitas, mas, com certeza, as que causam maiores sequelas são as relacionadas à possível prática do crime previsto no artigo 332 do CP, que narra a hipótese de uma pessoa que se vale da proximidade com determinada figura pública para obter vantagens próprias, realizando verdadeiro tráfico de influência, na grande maioria das vezes sem qualquer conhecimento por parte do magistrado.

Trata-se de problema que deve ser devidamente avaliado por aqueles que alme-jam a magistratura, ainda mais considerando a necessidade de muitos de manuten-ção de determinado estilo de vida, que pode se revelar, logo no início, inadequado ao exercício da judicatura.

Assim, o prezado leitor deve se perguntar de maneira honesta se o seu estilo de vida se encaixa no cenário esperado para o ocupante do cargo de juiz, evitando, dessa maneira, a surpresa desagradável de se ver tolhido das atividades que presa e necessita para manter sua qualidade de vida em razão da atividade profissional que escolheu.

5. MITO DO TRABALHO EM EQUIPE

Você estará só. O ônus de decidir será total e unicamente seu. Muito mais do que em outros ramos profissionais do direito, a magistratura impõe a obrigação de exercer a atividade de forma solitária, não sendo possível a divisão da responsabilida-de de julgamento com outros colegas.

Se os membros do Ministério Público ou advocacia podem assinar em conjunto suas manifestações, ao juiz não é dado dividir a responsabilidade inerente à sua ati-

magistrado deve comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral.

-sa privada ou de pessoa física que possam comprometer sua independência funcional.

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - • Luiz Otávio Rezende

vidade com outro colega, ou mesmo escolher as causas que deseja julgar. Mesmo nos casos de julgamento colegiado, há sempre a responsabilidade do voto pessoal, que exprime a vontade única e exclusiva do magistrado naquele processo em específico.

Conforme explana Regina Paixão:[...] a natureza do trabalho é predominantemente individual, posto que cada juiz de direito estuda e analisa processos que lhe são destinados, julgando-os e presidindo audiências; não há possibilidade de escolha de processos no ato de julgar, apenas a pos-sibilidade de declaração de impedimento. Nas audiências ele é a autoridade máxima, detentor de todo o respeito inerente à função11.

Fruto da independência funcional, essa característica do exercício do cargo pode significar, para alguns, fardo demasiadamente pesado, sendo certo que essas pessoas passariam a exercer a magistratura de forma claramente insegura, demonstrando uma incapacidade de decidir as mais variadas causas levadas à apreciação, hipótese essa inadmissível e extremamente prejudicial não só ao juiz, mas também à socieda-de, que vê seu agente político, cuja função é justamente decidir, se mostrar incapaz para tanto.

Na verdade, aqueles que têm personalidade voltada à predominância da divisão de tarefas e responsabilidades inerentes à atividade profissional exercida terão enor-mes dificuldades em gerir a tarefa de julgar, razão pela qual, para essas pessoas, talvez a melhor opção esteja em carreiras onde essa especificidade seja vista como um fator positivo, realidade essa, por certo, não verificada na magistratura.

6. MITO DA IMPERMEABILIDADE PSICOLÓGICA ÀS QUESTÕES JULGADAS

O juiz não passa incólume pelos casos por ele julgados. Em muitas ocasiões deve avaliar processos com grande carga psicológica, que irão permear seus pensamentos por grande período de tempo, e, por vezes, nunca serão esquecidos.

Não há como negar que o julgamento de algumas demandas se mostra capaz de deixar sequelas psicológicas no magistrado, obrigado a ter contato direto com os fatos narrados para decidir a contento a causa levada à apreciação.

11. O significado do trabalho no judiciário em Mato Grosso do Sul

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Cap. I –

O que dizer do juiz que teve de analisar os processos versando sobre crimes co-metidos por um maníaco, ou ainda casos de abandono afetivo extremo de incapazes, ou mesmo hipóteses graves de violência doméstica.

Certamente as referidas demandas não irão se esvair da memória num passe de mágica, e, claro, poderão gerar um desconforto constante pelo simples fato de o juiz ter tido contato direto com elas, representativas do pior da natureza humana.

Há de se mencionar que pesquisa realizada em trabalho acadêmico tendo com alvo juízes do trabalho apontou que 71% (setenta e um por cento) do público alvo apresentava sintomatologia típica de stress, e 1,3% (um vírgula três por cento) desse total já tinha atingido a fase de exaustão do stress, índice esse considerado o mais alto em pesquisas nacionais sobre o stress ocupacional1213.

O próprio CNJ instituiu grupo de trabalho para elaborar estudos e apresentar propostas no tocante à saúde no Judiciário, no intuito de propor uma política nacio-nal e permanente da saúde física e emocional dos magistrados brasileiros14.

Algumas pessoas conseguem lidar bem com a carga psicológica negativa acima relatada, mas outras, por inúmeros motivos, não se mostram capazes de suportar o ônus de ter contato e julgar tais causas, razão pela qual o candidato deve avaliar, antes do início dos estudos, se pode conviver com esses percalços sem danos à sua saúde física e mental, mantendo a qualidade de vida hoje tão almejada por todos, e, claro, a distância necessária entre o trabalho e a vida pessoal.

7. MITO DA SEGURANÇA EFETIVA PRESTADA PELO ESTADO

A magistratura é uma atividade de risco. Nos mais variados ramos onde o juiz pode atuar há sempre a possibilidade de uma decisão afetar determinada pessoa, que, por simples sentimento de vingança, sinta a necessidade de ameaçar ou mesmo cometer algum ato violento contra o magistrado ou sua família.

13.-

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - • Luiz Otávio Rezende

Os casos de magistrados ameaçados são inúmeros, e posso dizer ao leitor que a vida dos que passam por essa situação delicada se torna extremamente difícil, com várias restrições sociais para o resguardo da integridade física do juiz e de sua famí-lia, muito embora a integridade mental, nesses casos, seja definitivamente afetada, e a possibilidade de geração danos psicológicos irreversíveis, por seu turno, alcance patamares muito altos.

Ansiedade, síndrome do pânico, depressão e outras enfermidades são ampla-mente verificadas naqueles vitimados por ameaças ou efetivos atos de violência, e não é preciso ser um psiquiatra para afirmar com extrema certeza que a continuidade do exercício do cargo que gera a situação de stress contínuo não representa aumento das chances de cura dos males antes declinados, mas sim a possibilidade de piora do quadro clínico.

Há de se consignar que a segurança ofertada pelo Estado aos magistrados amea-çados nem sempre se mostra suficiente, e, por óbvio, não acompanhará o magistrado e sua família após a sua aposentadoria, pelo simples fato de ser restrita aos togados da ativa, à míngua de regulamentação desse proceder aos juízes aposentados.

Ademais, não há uma polícia judiciária devidamente treinada e à disposição dos Tribunais, que se veem obrigados a contar com o apoio das Policias Civil e Militar, normalmente mediante a cessão de alguns policiais para fazerem o papel de seguran-ças dos eventualmente ameaçados.

À evidência, tal cenário não demanda maiores digressões acerca da efetividade dessa proteção, sobretudo se considerarmos a falta de treinamento específico para o exercício da função por parte dos policiais disponibilizados, que, por essa razão, podem não ter a expertise necessária para lidar com situações de ataque e ofensa à integridade dos por eles protegidos.

Em suma, casos como a da Juíza de Direito carioca Patrícia Accioly e do Juiz Federal Odilon de Oliveira estão aí para demonstrar o efetivo risco do exercício da magistratura, razão essa que deve ser amplamente sopesada pelo leitor antes de optar por essa carreira, haja vista a existência de várias outras nas quais o risco de ameaça à integridade física é infinitamente inferior, como, por exemplo, a advocacia pública e privada.

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CAPÍTULO XIV

Entrevistas com Magistrados

Como o prezado leitor pôde perceber durante a leitura deste singelo manual, o concurso para o ingresso na carreira da magistratura é hoje uma verdadeira maratona física e mental, e, apesar da extensa regulamentação sobre o assunto, ainda pode se pautar por inúmeras e inesperadas nuances, cuja ocorrência pode aumentar conside-ravelmente a dificuldade de superação de todos os obstáculos do certame.

Ao longo dos vários capítulos deste livro, procurei trazer a realidade do concurso da magistratura, encartada não só nas regras aplicáveis e dicas pessoais de prepara-ção, mas principalmente no histórico jurisprudencial envolvendo o tema, haja vista que cada precedente revela, em seu teor, uma história singular de um candidato ao cargo e toda a sua luta para conseguir o objetivo de se tornar magistrado.

E é justamente nesse ponto que vou finalizar esse pequeno manual, tendo em conta que colaciono a seguir entrevistas realizadas com vários magistrados, visando proporcionar ao leitor o acesso a inúmeras perspectivas sobre o concurso e a carreira da magistratura.

Na verdade, estou certo que as histórias de vida e superação desses valorosos magistrados terão ainda outro papel de suma importância, que é inspirar os novos candidatos ao cargo a manter a esperança e foco na consecução do resultado final positivo, para o qual espero, juntamente com meus queridos amigos, ter dado uma pequena e sincera contribuição.

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Cap. XIV –

10 – A magistratura proporcionou a realização pessoal e profissional que a jovem Andréa visava quando optou pela carreira?

Sou magistrada há 20 anos e não há um dia em que eu saia para trabalhar sem uma enorme vontade de decidir, realizar audiências, ouvir as partes, receber os ad-vogados. Acho um enorme privilégio poder escolher o trabalho. É no trabalho onde passamos a maior parte da nossa vida e seria insuportável não fazer algo que me mo-tivasse e que não contribuísse para que a vida das outras pessoas pudesse ser melhor. Sou muito feliz com a escolha que fiz.

11 – Se pudesse dizer algumas palavras aos que sonham ingressar na magistratura, quais seriam elas?

Para ser magistrado, temos que gostar de gente. O ingresso, por meio de con-curso, é um caminho árduo, mas não pode ser encarado como um fim em si mesmo. Quem espera encontrar facilidades, privilégios, exercer o autoritarismo e se imaginar acima do bem e do mal, eu sugiro que reflita muito antes de continuar. A magis-tratura é uma belíssima profissão para aqueles que enxergam o direito como uma ferramenta de afirmação da justiça, da ética e da humanidade. Lidar com conflitos é um belo caminho para aprender a dialogar mais. Bem-vindos!

13. SERGIO FERNANDO MORO13

1 – Quando a magistratura se tornou a opção do jovem bacharel Sergio Moro? Alguém em especial o influenciou nessa escolha? E por que a magistratura fe-deral?

Optei pela magistratura, pelo que me lembro, pelo quarto ou quinto ano da faculdade. Não creio que alguém em especial tenha me influenciado. A magistratura federal foi uma escolha natural, pois trabalhava em escritório de advocacia cujo foco eram processos na Justiça Federal.

13.-

artigos, com ênfase em direito penal.

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CONCURSO PARA A MAGISTRATURA - • Luiz Otávio Rezende

2 – Como foi a sua preparação para o certame promovido pelo TRF 4ª Região, na-cionalmente conhecido pelo rigor nos exames, e pelo pequeno número de aprova-dos em cada concurso?

Não creio que exista uma fórmula única para sucesso em concursos. No meu caso, optei por continuar trabalhando como advogado no mesmo escritório que ha-via estagiado. Isso tem a virtude de diminuir a pressão da necessidade do sucesso do concurso. Além disso, eu precisava da remuneração. Aí estudava no período noturno e nos finais de semana.

3 – As responsabilidades inerentes ao exercício da judicatura podem tolher total-mente a vida pessoal do magistrado. Nesse cenário, como foi assumir, aos 24 anos, o cargo de juiz federal?

Foi um desafio considerável. O prévio trabalho na advocacia concede maior segurança. Mas o segredo, acredito, é dar um passo por vez e resolver os problemas dia a dia.

4 – Já como magistrado, quais foram os motivos que o levaram a conciliar a profis-são com a docência? Até que ponto a tradição familiar foi determinante para essa escolha?

Sempre tive vontade de ministrar algumas aulas, embora confesse que recente-mente, pela intensidade do trabalho da magistratura, tem sido muito difícil. Talvez a influência de meus pais, professores, tenha algum peso. Difícil saber.

5 – Você tem vários livros e artigos publicados, com destaque para o direito penal. Por que escolher essa área do conhecimento e, a seu sentir, o que torna esse ramo do direito tão desafiador?

Em 2002, quando vim para Curitiba, assumi a titularidade de Vara com com-petência exclusivamente criminal. Então, fui forçado, na prática, a aprender. Espe-ro, aliás, que tenha apreendido. O que acho interessante no ramo criminal é que cada caso é realmente um caso. Não há ações de massa. Fatos e provas compõem o cerne de cada processo, independentemente das questões jurídicas. Nada mais do que o processo penal para refletir o drama humano. Então, é uma boa área para se trabalhar.

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CAPÍTULO XV

Prova Simulada

Pedido reiterado por inúmeros leitores das duas edições pretéritas do Guia Práti-co, a disponibilização de uma prova simulada da segunda etapa do concurso da ma-gistratura se tornou necessária com vistas a possibilitar a realização de treinamento a partir das dicas de preparação declinadas ao longo deste manual1.

Desse modo, colaciono a seguir um exame simulado das provas subjetivas do certame para o ingresso na magistratura, seguindo os estritos termos que sempre utilizei quando de minha passagem como examinador de concursos promovidos por diversos Tribunais brasileiros.

O espelho de resposta foi alocado ao final, consoante o padrão usualmente utili-zado pelas bancas examinadoras, em especial aquelas que fornecem as respostas que eram esperadas dos candidatos após a realização dos exames.

O exercício envolvendo a sentença cível simulada seguiu as regras do novo CPC, e visa trazer minhas impressões sobre como os examinadores dos próximos certames irão cobrar a matéria.

Quanto à forma de resolução das provas simuladas, peço aos leitores que porven-tura se aventurarem a fazê-las que tentem reproduzir o cenário esperado nas provas reais, com limitação de tempo (até cinco horas) e de consulta (apenas legislação seca), pois somente assim poderão ter um treinamento efetivo e com resultados satisfatórios.

À evidência, reitero que somente a partir dos treinos prévios o candidato poderá realizar uma preparação condizente com o desafio que enfrentará nas provas subjeti-vas do concurso para o ingresso na carreira da magistratura.

-mulada trabalhista, pois a falta de prática na área, aliada ao desconhecimento de boa par-te da jurisprudência atual dos tribunais trabalhistas, poderia tornar o exercício dissonante da realidade, e sem qualquer resultado positivo aos leitores.

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Como sempre digo, treinamento com repetição gera memorização, de modo a permitir que o estudo seja otimizado, fato que certamente terá como consequência direta e imediata a melhora no desempenho nas provas vindouras.

Assim, desejo a todos bons estudos e uma grande prova!

1. PROVA DE QUESTÕES

1.1 Direito Processual Penal

Marlúcio foi beneficiado com o sursis processual, nos moldes previstos na Lei 9.099/95. Após o decurso do período de prova da suspensão condicional, o MP levou ao conhecimento do magistrado que Marlúcio não cumpriu as condições impostas quando da concessão do benefício, apesar de ter sido devidamente enca-minhado à instituição para a prestação de serviços à comunidade, solicitando a re-vogação do sursis e a continuidade do processo. Ao apreciar o pedido, o magistrado indeferiu o pedido do MP e extinguiu a punibilidade nos termos do artigo 89, § 5º, da Lei n. 9.099/95. Analise a situação de acordo com a jurisprudência do STJ.

1.2 Direito Penal

Sobre os crimes de porte e posse ilegal de arma de fogo, responda às seguintes indagações:

a) natureza dos delitos;

b) necessidade de realização de perícia para a configuração dos crimes;

c) configuração dos crimes na hipótese de arma desmuniciada;

d) existência dos delitos no caso de prova pericial atestando que a arma seria inapta a efetuar disparos.

1.3 Direito Processual Civil

Já na vigência do novo CPC, Joana da Silva moveu ação de execução de alimen-tos em desfavor de João da Silva, visando o recebimento de quatro meses de pensão não adimplidos, no valor total de R$ 2.000,00, seguindo o rito dos artigos 911 e 528, §§ 2º a 7º, da Lei n. 13.105/15. Regularmente citado, João apresentou justi-ficativa ao magistrado, alegando que trabalha como feirante e sofreu um acidente há cerca de quatro meses, o que ocasionou o seu afastamento total de qualquer ati-vidade laboral. Apresentou laudos médicos indicando a impossibilidade de realizar

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renda anual de R$ 455.000,00, ou aproximadamente U$ 100.000,00 (cem mil dóla-res). Neymar, jogador de futebol brasileiro, tem renda anual estimada em 36 milhões de euros, ou, em valores convertidos em real, R$ 162.000.000,00 (cento e sessenta e dois milhões de reais) anuais, ou R$ 13.500.000,00 (treze milhões e quinhentos mil reais) mensais. Exposto esse cenário, e levando-se em conta a lição de John Rawls e sua teoria de justiça, pode-se afirmar que essa diferença salarial se mostra justa?

1.8 Direito Constitucional

Discorra sobre a controvérsia pertinente à reserva do possível e a intangibilidade do mínimo existencial, com foco na questão das chamadas escolhas trágicas. (Limite de linhas – 40)

1.9 Direito Administrativo

O prefeito de determinada cidade dispensou ilegalmente procedimento licitatório, fracionando seu objeto, quando seria possível a concorrência entre os licitantes para fins de contratação da melhor proposta. Ao julgar a ação de improbidade proposta em razão desse fato contra o prefeito, o juiz aplicou a pena de ressarcimento ao erário. Analise a conduta do magistrado, considerando a jurisprudência recente do STJ.

1.10 Direito Empresarial

Discorra sobre o abuso de direito de voto do titular acionário das sociedades por ações, abordando, necessariamente, os seguintes aspectos:

a) vinculação mediata e imediata do direito de voto;

b) conceito e hipóteses de ocorrência do abuso de direito;

c) necessidade de o acionista auferir vantagem indevida para a caracterização do abuso de direito de voto;

d) possibilidade de reparação/indenização decorrente do abuso de direito de voto sem a comprovação do dano.

2. PROVA DE SENTENÇA CÍVEL

10ª Vara Cível de Brasília

CentroMED Hospitais Ltda. ajuizou ação monitória em desfavor de Joana da Silva e Maria da Silva, alegando, em síntese, que é credora das rés em razão da

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Cap. XIV –

Em sede de alegações finais, o MP requereu a condenação dos réus nos termos da denúncia.

Alegações finais do réu Jaeliton regularmente apresentadas, tendo sido arguida, preliminarmente, a nulidade do feito pela tomada do depoimento da vítima sem a sua presença. No mérito, requereu a sua absolvição pela negativa de autoria. Na hipótese de condenação, a fixação da pena no mínimo legal, e o direito de recorrer em liberdade.

Já a defesa do réu Lúcio arguiu, preliminarmente, a nulidade do feito pela ofensa ao princípio da identidade física do juiz, pois os autos serão conclusos a magistrado diverso do que presidiu a audiência, que não mais está lotado na 1ª Vara Criminal. No mérito, requereu a absolvição do crime de roubo por atipicidade, ante a apli-cação à espécie do princípio da insignificância, pois o valor do bem seria pequeno. Requereu a desclassificação do crime para o delito de furto, pois a arma de choque não traz a aplicação do inciso I do artigo 157, § 2º, do CP para a espécie. Requereu a retirada da majorante do inciso II, pois não há provas da participação de Jaeliton no crime. No caso de condenação, requereu o reconhecimento da continuidade delitiva, a compensação da agravante da reincidência com a confissão, e a revogação de sua prisão e direito de recorrer em liberdade, assim como a conversão da eventual pena em restritiva de direitos.

Após, foram os autos conclusos para sentença.

4. ESPELHOS DE CORREÇÃO

4.1 Prova de Questões

4.1.1 Direito Processual Penal

Com a devida vênia ao entendimento esposado pelo magistrado prolator da de-cisão ilustrada, cabe realçar que essa se mostra em descompasso com a jurisprudência do STJ. À evidência, no julgamento de recurso especial submetido à sistemática dos recursos repetitivos, o STJ assentou que se descumpridas as condições impostas du-rante o período de prova da suspensão condicional do processo, o benefício poderá ser revogado, mesmo se já ultrapassado o prazo legal, desde que referente a fato ocor-rido durante sua vigência (art. 89, § 4º, da Lei n. 9.099/1995). Dessa forma, no caso narrado, o magistrado deveria atender ao pleito ministerial, determinando, assim, a continuidade do processo em desfavor de Marlúcio. REsp 1.498.034-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 25/11/2015, DJe 2/12/2015.

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4.1.2 Direito Penal

Inicialmente, convém destacar que a Terceira Seção do STJ pacificou entendi-mento no sentido de que o tipo penal de posse ou porte ilegal de arma de fogo é delito de mera conduta ou de perigo abstrato, sendo irrelevante a demonstração de seu efetivo caráter ofensivo e, assim, desnecessária a realização de laudo pericial para atestar a potencialidade lesiva da arma de fogo ou da munição apreendida (EREsp 1.005.300-RS, DJe 19/12/2013). Contudo, se tiver sido realizado laudo técnico na arma de fogo e este tiver apontado a total ineficácia do artefato, descartando, por completo, a sua potencialidade lesiva e, ainda, consignado que as munições apreen-didas estavam percutidas e deflagradas, a aplicação da jurisprudência supramencio-nada deve ser afastada. Isso porque, nos termos do que foi proferido no AgRg no HC 149.191-RS (Sexta Turma, DJe 17/5/2010), arma, para ser arma, há de ser eficaz; caso contrário, de arma não se cuida. Em outras palavras, uma arma desmuniciada em conjunto com munição torna-se apta a realizar disparos; entretanto, uma arma ineficaz, danificada, quebrada, em contato com munição, não poderá produzir dis-paros, não passando, portanto, de um mero pedaço de metal. Registre-se que a parti-cularidade da ineficácia da arma (e das munições) não se confunde, à toda evidência, com o caso de arma sem munição. A par disso, verifica-se que, à luz do Direito Penal do fato e da culpa, iluminado pelo princípio da ofensividade, não há afetação do bem jurídico denominado incolumidade pública que, segundo a doutrina, com-preende o complexo de bens e interesses relativos à vida, à integridade corpórea e à saúde de todos e de cada um dos indivíduos que compõem a sociedade. Nessa ordem de ideias, a Quinta Turma do STJ (AgRg no AREsp 397.473-DF, DJe 25/08/2014), ao enfrentar situação fática similar – porte de arma de fogo periciada e totalmente ineficiente – asseverou que o objeto apreendido não se enquadrava no conceito téc-nico de arma de fogo, razão pela qual considerou descaracterizado o crime de porte ilegal de arma de fogo. Desse modo, conclui-se que arma de fogo pressupõe artefato destinado e capaz de ferir ou matar, de maneira que deve ser reconhecida a atipici-dade da conduta de possuir munições deflagradas e percutidas, bem como arma de fogo inapta a disparar, ante a ausência de potencialidade lesiva, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio. REsp 1.451.397-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 15/9/2015, DJe 1º/10/2015.

4.1.3 Direito Processual Civil

Em execução de alimentos pelo rito do art. 911 do CPC, o acolhimento da justificativa da impossibilidade de efetuar o pagamento das prestações alimentícias