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ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA Paulo César Colmenero Lopes INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA: situação atual e perspectivas Rio de Janeiro 2011

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Page 1: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA

Paulo César Colmenero Lopes

INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA:

situação atual e perspectivas

Rio de Janeiro 2011

Page 2: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

PAULO CÉSAR COLMENERO LOPES

INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA:

situação atual e perspectivas

Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia.

Orientador: Coronel R1 José Teixeira Louzada

Rio de Janeiro

2011

Page 3: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

C2011 ESG

Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitida a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita à referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG. _______________________________ PAULO CÉSAR COLMENERO LOPES

Biblioteca General Cordeiro de Farias

LOPES, Paulo César Colmenero Lopes

Integração Sul-Americana: situação atual e perspectivas / CMG Paulo César Colmenero Lopes - Rio de Janeiro : ESG, 2011.

43 f.

Orientador: Coronel R1 José Teixeira Louzada Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao

Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2011.

1. Processo de integração. 2. Blocos Regionais. 3. UNASUL. 4. Conjuntura Sul-Americana. I. Integração Sul-Americana: situação atual e perspectivas.

Page 4: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

EPÍGRAFE

“O que faz andar o barco não é a vela enfunada, mas o vento que não se vê.”

Platão

Page 5: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

RESUMO

O Trabalho está dividido em seis capítulos, incluindo uma conclusão (capítulo 6), e

trazendo as considerações iniciais na introdução (capítulo 1).

O segundo capítulo apresenta o conceito de integração regional, a classificação dos

principais tipos de blocos regionais e os blocos existentes na América do Sul com

seus respectivos instrumentos de integração.

O capítulo 3 aborda de forma específica a União de Nações Sul-Americanas

(UNASUL) e, ao compará-lo com os tratados de integração firmados anteriormente,

enfatiza as inovações que esse acordo incorpora e os pontos, por ele elencados,

como objetivos da integração.

O próximo capítulo analisa a atual conjuntura sul-americana, ressaltando os

aspectos positivos e negativos existentes que poderão influenciar, de forma direta ou

indireta, no sucesso da UNASUL como instrumento de integração continental.

O quinto capítulo apresenta algumas propostas de ações estratégicas, a serem

adotadas pelo Brasil, para fortalecer o processo de integração sul-americana em

curso, por intermédio da UNASUL.

Palavras-chave: América do Sul. Integração. UNASUL

Page 6: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

RESUMEN

El trabajo se divide em seis capítulos, incluyendo una conclusión (capítulo 6), y las

consideraciones iniciales en la introducción (capítulo 1).

El segundo capítulo introduce el concepto de la integración regional, la clasificación

de los principales tipos de bloques regionales y los bloques que hay en América

del Sur y sus respectivos instrumentos de integración.

El Capítulo 3 trata especificamente de la Unión de Naciones Suramericanas

(UNASUR) y lo compara con los tratados de integración subscritos con anterioridad,

hace hincapié en las novedades que incorpora este acuerdo y los puntos que figuran

como objetivos de la integración.

El siguiente capítulo examina la situación actual en América del Sur, haciendo

hincapié en los aspectos positivos y negativos existentes que pueden influir, directa

o indirectamente, en el éxito de UNASUR como instrumento de integración

continental.

El quinto capítulo presenta algunas propuestas de acciones estratégicas a ser

tomadas por Brasil para fortalecer el processo de integración sudamericana en

marcha, a través de la UNASUR.

Palabras-clave: América del Sur. Integración. UNASUR

Page 7: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 8

2 O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO E OS BLOCOS REGIONAIS ............... 10 2.1 O CONCEITO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL ............................................ 10 2.2 CLASSIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS “BLOCOS REGIONAIS” ................... 11 2.2.1 Zona de Livre Comércio ............................................................................ 11 2.2.2 União Aduaneira ........................................................................................ 12 2.2.3 Mercado Comum ....................................................................................... 12 2.2.4 União Econômica e Monetária .................................................................. 13 2.3 OS BLOCOS REGIONAIS DENTRO DA AMÉRICA DO SUL ...................... 13 2.3.1 O MERCOSUL ............................................................................................ 13 2.3.2 A Comunidade Andina de Nações............................................................ 15 2.3.3 A Organização do Tratado de Cooperação Amazônia ............................ 17 2.4 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS.................................................................... 19 3 A UNIÃO DAS NAÇÕES SUL-AMERICANAS ........................................... 20 3.1 A CONSTITUIÇÃO DO BLOCO .................................................................. 20 3.2 A ESTRUTURA VIGENTE ........................................................................... 23 3.3 OBJETIVOS DA UNASUL ........................................................................... 24 3.4 OS AVANÇOS DA UNASUL ....................................................................... 26 3.4.1 Instrumento para a solução pacífica de controvérsias .......................... 26 3.4.2 Representatividade internacional ............................................................ 27 3.4.3 Ações dos Conselhos ............................................................................... 28 3.5 AS INOVAÇÕES INCORPORADAS PELA UNASUL .................................. 28 3.6 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS.................................................................... 30 4 A ATUAL CONJUNTURA SUL-AMERICANA ............................................ 32 5 AÇÕES ESTRATÉGICAS PARA O FORTALECIMENTO DA UNASUL .... 37 5.1 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER POLÍTICO .................................. 38 5.2 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER ECONÔMICO............................. 38 5.3 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER PSICOSSOCIAL ........................ 39 5.4 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER MILITAR ..................................... 40 5.5 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO 40 6 CONCLUSÃO ............................................................................................. 41 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 43

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1 INTRODUÇÃO

Inicialmente, a integração sul-americana aparece como uma proposta embutida

nas tentativas de integração latino-americanas que ocorrem há mais de um século,

tendo como pioneiro Simon Bolívar, que em 1814, quando estava exilado na

Jamaica, redigiu uma carta propondo uma aliança entre os povos americanos para

se alcançar uma América independente e republicana.

A primeira vez que se contemplou, exclusivamente, a integração dos países da

América do Sul, por inteiro, ocorreu quando o Governo do Brasil lançou, em 1994, a

ideia de se criar uma Área de Livre Comércio Sul-Americana (ALCSA), que

congregasse os países do cenário americano meridional. Entretanto, podemos

classificar como o marco da iniciativa de integração da América do Sul o ano 2000,

quando, a convite do Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, realiza-se

em Brasília, nos dias 31 de agosto e 1º de setembro daquele ano, pela primeira vez

na história do continente, a Reunião de Presidentes da América do Sul.

Hoje, o continente sul-americano conforma-se em três espaços geopolíticos,

com seus respectivos blocos geoeconômicos: Cone Sul – Mercado Comum do Sul

(MERCOSUL), formado por Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela

(Estado Parte em processo de adesão); Região dos Andes – Comunidade Andina de

Nações (CAN), formada por Bolívia, Colômbia, Equador e Peru; e o Arco Amazônico

– Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), formada por Brasil,

Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela (Rego, 2003,

p.15).

Levando-se em consideração que a América do Sul possui uma área de

17.819.100 km², maior que a de qualquer outro país do mundo, que nesse espaço

vivem cerca de 3801 milhões de habitantes e existem grandes reservas de recursos

naturais como minérios, águas, terras cultiváveis e energia, pode-se afirmar que

existe uma boa probabilidade do continente se tornar uma das mais importantes

áreas econômicas desse mundo globalizado onde se consomem grandes

quantidades de alimentos, matérias-primas e energia. Dessa forma, a união dos

países sul-americanos torna-se fundamental para o fortalecimento dessa área

geoestratégica. Essa união poderá ser obtida mais facilmente por intermédio de um

1 Fonte: www.wikipedia.org

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instrumento que consiga unir os blocos geoeconômicos já existentes, intensificando

não somente a integração econômica, mas também a social e a política.

Ao saudar a criação da União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), no

discurso de abertura da reunião de cúpula, realizada em Brasília, em 23 de maio de

2008, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o novo organismo realiza

um sonho maior que o de Simon Bolívar e que a América do Sul ganhava estatura

de ator global e um novo papel geopolítico.

Durante a Conferência de abertura do VI Curso para Diplomatas Sul-

Americanos, que ocorreu em abril de 2009, o então Ministro de Estado das Relações

Exteriores do Brasil, Celso Amorim, colocou que a UNASUL é um processo

extremamente vivo e importante, que permite à região se coordenar e se apresentar

diante do mundo.

Segundo Saraiva (2010)2, a UNASUL pode ser considerada uma iniciativa com

um perfil diferente das outras, que acomoda diferenças e que pode dar uma

contribuição importante para a consolidação de uma governança regional.

Um processo de integração entre países deve estar baseado em interesses e

objetivos comuns e deve ser realizado em um ambiente de cooperação onde devem

ser exploradas plenamente as sinergias e oportunidades potenciais. Observando

esse condicionante e os aspectos anteriormente elencados, neste trabalho será

analisado se a UNASUL poderá ser o instrumento eficaz para efetivar a integração

do continente, situação desejada pelo Brasil conforme estabelecido no artigo 4º de

sua própria Constituição que descreve os princípios que regem as relações

internacionais do país, dentre eles a cooperação entre os povos e, em seu parágrafo

único, a busca pela integração econômica, política, social e cultural dos povos da

América Latina.

2 Professora do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Universidade do Estado

do Rio de Janeiro

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2 O PROCESSO DE INTEGRAÇÃO E OS BLOCOS REGIONAIS

2.1 O CONCEITO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL

Segundo o Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, podemos

definir integração, sob um enfoque social, como sendo o ajustamento recíproco dos

membros de um grupo e sua identificação com os interesses e valores do grupo.

Fazendo uma adaptação dessa definição, podemos caracterizar, de forma simples, a

integração regional como sendo o ajustamento recíproco entre Estados vizinhos de

forma a se formar um grupo coeso que privilegie os interesses e valores da região.

Nas literaturas sobre o assunto existem várias abordagens para se conceituar

Integração Regional, sendo a mais comum a de viés econômico. Sob esse ponto de

vista, as relações comerciais entre economias nacionais independentes, já são um

sinal de integração (Balassa, 1973, p.2). A Integração Regional, quando percebida

como integração econômica regional, busca a diminuição progressiva das barreiras

comerciais, mantidas entre os Estados participantes, até a eliminação das mesmas,

de forma a propiciar um intercâmbio que fortaleça economicamente a região, criando

condições mais favoráveis para o relacionamento com o resto do mundo.

O processo de integração econômica pode ser visualizado como sendo um

conjunto de medidas de caráter econômico e comercial adotadas para promover um

tratamento preferencial que, em um primeiro momento, estabelece uma

aproximação entre as economias dos Estados participantes e, posteriormente,

alcança a união dessas economias.

Apesar da grande associação feita entre integração regional e aspectos

econômicos e comerciais, não podemos visualizá-la de forma restrita. Existem

abordagens de caráter mais amplo. A Integração Regional, ou simplesmente

regionalismo, pode ser definida como sendo um conjunto de políticas, estabelecidas

com a intenção de promover o surgimento de uma sólida unidade regional, a qual,

além de desempenhar um papel definidor nas relações entre os Estados dessa

região e o resto do mundo, constitui a base organizativa para políticas internas da

região em diversos temas. (Hurrell, 1993, p.100).

O Processo de integração regional acarreta a criação de novas formas de

governança de escopo regional. As questões políticas, sociais, culturais, econômicas

e comerciais, dentre outras, estão relacionadas com esse processo, sendo

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necessário, para se compreender o tipo de bloco regional formado pelos países,

conhecer sua rede de interdependências e os objetivos comuns.

Pode-se entender por “bloco regional” o grupo de países vinculados pela

proximidade geográfica e por acordos intergovernamentais. Entretanto, surge, mais

uma vez, uma visão economicista que usa esse termo para significar um grupo de

caráter comercial resultado de um projeto de integração, passando a denominá-lo

como “bloco comercial”.

2.2 CLASSIFICAÇÃO DOS PRINCIPAIS “BLOCOS REGIONAIS”

As formações de blocos regionais têm sido a mais viva expressão do

processo de globalização3 atualmente em curso.

Tomando como base a visão econômica e comercial, os blocos regionais são

caracterizados pelos tipos de acordos econômicos firmados entre os países

membros e, nesse sentido, podemos classificá-los da seguinte forma:

2.2.1 Zona de Livre Comércio

Formada por um grupo de países que firmam um tratado econômico que visa

à eliminação das barreiras tarifárias e não tarifárias que incidem sobre a circulação

de mercadorias entre eles. Dessa forma os produtos fabricados nesses países

podem ser comprados ou vendidos pelos membros do grupo sem a aplicação de

impostos e sem limites de quantidades. Esse tratado diz respeito somente à área

comercial e não interfere nos acordos que possam ser firmados entre os países

membros e países não pertencentes ao bloco. Seu principal objetivo é incentivar o

comércio entre os países participantes de forma a aumentar a eficiência da

produção do bloco. Como um bom exemplo, podemos citar o bloco regional do North

American Free Trade Agreement (NAFTA)4.

3 O processo de Globalização está relacionado com a forma como os países interagem, aproximando

pessoas e interligando o mundo, considerando os aspectos econômicos, sociais, culturais e políticos (Wikipédia). 4 É um tratado envolvendo Canadá, México e Estados Unidos da América, que entrou em vigor em 1º

de janeiro de 1994, numa atmosfera de livre comércio, com custo reduzido para troca de mercadorias entre os três países (Wikipédia).

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2.2.2 União Aduaneira

Esse bloco é formado por um grupo de países que assumem compromissos

que vão além da eliminação das barreiras tarifárias e não tarifárias que incidem

sobre a circulação de mercadorias entre eles. No tratado firmado fica também

estabelecida uma Tarifa Externa Comum (TEC) para produtos importados de países

de fora do bloco. Nesse acordo já se percebe a interferência nas relações

comerciais dos países membros com os demais países de fora do bloco, pois não se

pode admitir que um país membro assine um tratado econômico, com um país não

integrante do bloco, que estabeleça a eliminação de restrições comerciais entre eles.

Seu principal objetivo é captar investimentos produtivos para o bloco valendo-se do

mercado consumidor proveniente da regra de livre comércio e da proteção

alfandegária existente, ampliando a eficiência econômica do bloco e gerando

relações mais estreitas entre os países componentes. Podemos citar como exemplo

o MERCOSUL com todas as suas especificidades que serão citadas mais adiante no

trabalho.

2.2.3 Mercado Comum

Esse tipo de tratado, que caracteriza outro tipo de bloco regional, transcende

a esfera comercial atuando em outras áreas como a financeira, a educacional, a

trabalhista, a ambiental dentre outras. Isso se deve ao fato de, além de ser

obedecido o livre intercâmbio de mercadorias e a adoção de uma tarifa aduaneira

comum, estar prevista a livre circulação de trabalhadores, serviços e capitais pelas

fronteiras dos países membros o que exige um alinhamento das legislações estatais.

Seu objetivo é incrementar o poder do mercado regional de forma a permitir que as

instituições comerciais e produtivas, que operam no interior do bloco instaladas nos

países membros, consigam competir no mercado globalizado. Essa é a explicação

para o aparecimento de diversos blocos regionais em virtude do fortalecimento do

processo de globalização. A União Europeia (UE)5 é um exemplo de Mercado

Comum.

5 É uma união supranacional econômica e política formada por 27 países europeus, estabelecida

após a assinatura do Tratado de Maastricht, em 7 de fevereiro de 1992.

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2.2.4 União Econômica e Monetária

Para esse tipo de bloco regional acrescem-se aos acordos firmados em um

Mercado Comum a existência de uma moeda única e um Banco Central único para

todos os países membros. Para que realmente esse tipo de tratado seja efetivo é

necessário que os países que compõem o bloco consigam manter suas inflações,

déficits públicos e taxas de juros em níveis toleráveis de forma a ser possível uma

harmonização orçamental. A Zona Euro, da União Europeia, é o que se aproxima,

como exemplo, desse tipo de bloco e o Pacto de Estabilidade e Crescimento6 o

instrumento de harmonização orçamental.

2.3 OS BLOCOS REGIONAIS DENTRO DA AMÉRICA DO SUL

2.3.1 O MERCOSUL

Dentro do espaço geopolítico denominado como Cone Sul, temos o bloco do

MERCOSUL.

O MERCOSUL surge de uma iniciativa do Brasil e da Argentina. Ao se

desprenderem do velho sentimento de desconfiança e de competição e em pleno

processo de democratização, os países, que não viviam uma boa situação

econômica, precisavam de investimentos e possuíam grandes dívidas externas,

percebem a necessidade de cooperarem entre si para conseguirem uma solução

para problemas similares. É assim que em 30 de novembro de 1985 é assinada a

Declaração de Foz do Iguaçu que foi precedida de diversas reuniões, entre os

governos dos dois países, com a intenção de se construir um acordo, a fim de

promover o desenvolvimento econômico de ambos. Os entendimentos prosseguem

até que em 1990, Brasil e Argentina assinam o Tratado de Buenos Aires para a

efetivação de uma integração econômica entre os dois países. Logo em seguida, em

1991, complementando o Tratado de Buenos Aires, é assinado o Tratado de

Assunção, que já conta com a presença do Uruguai e do Paraguai, e constitui o

MERCOSUL.

6 O Pacto de Estabilidade e Crescimento é um acordo entre os países da UE onde aqueles que fazem

parte da área do Euro devem apresentar regularmente programas de estabilidade, respeitar os objetivos macroeconómicos contidos nesses programas e evitar défices públicos superiores a 3% do PIB, bem como valores da dívida pública superiores a 60% do PIB.

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Entretanto é somente em dezembro de 1994 que, com a assinatura do

Protocolo de Ouro Preto, fica estabelecida a estrutura institucional do MERCOSUL

e, assim, ele ganha um personalidade jurídica e passa a ser reconhecido,

internacionalmente, como uma Organização, o que lhe permite, como bloco, interagir

com outros blocos, países e organismos internacionais.

O MERCOSUL tem como objetivo principal a integração dos Estados Partes

por meio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, do

estabelecimento de uma Tarifa Externa Comum, da adoção de uma política

comercial comum, da coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais, e da

harmonização de legislações nas áreas pertinentes. Logo pode se notar que a

intenção é formar um bloco regional que alcance as características de um Mercado

Comum.

Já a partir dos primeiros anos de vigência do MERCOSUL é percebido um

incremento qualitativo nas relações comerciais e econômicas entre os membros do

Grupo.

O sucesso inicial do MERCOSUL atrai o interesse de novos atores e começa

então a sua expansão. Gradativamente, outros países da América do Sul, por

intermédio de Acordos de Complementação Econômica7, vão aderindo ao Bloco

como Estados associados – Bolívia (1996), Chile (1996), Peru (2003), Colômbia

(2004) e Equador (2004) – e por intermédio de outros instrumentos como, por

exemplo, o Protocolo de Olivos8, a organização vai sendo aprimorada,

principalmente com a criação de novos foros.

Com relação ao seu status econômico, desde 1995 assume formalmente um

perfil de União Aduaneira mesmo tendo sido atendidos apenas parcialmente alguns

requisitos necessários que caracterizam esse tipo de acordo econômico. Essa

situação é uma fase intermediária na busca de se alcançar o Mercado Comum

idealizado.

Em 04 de julho de 2006 é assinado o protocolo de adesão da República

Bolivariana da Venezuela ao MERCOSUL. Atualmente, a inclusão da Venezuela no

7 Acordos bilaterais firmados entre o MERCOSUL e cada país associado. Nesses acordos se

estabelece um cronograma para a criação de uma zona de livre-comércio com os países do MERCOSUL e uma gradual redução de tarifas entre o MERCOSUL e os países firmantes (Wikipédia). 8 O Protocolo de Olivos é um protocolo assinado em 2002, pelos membros do MERCOSUL, com o

objetivo de solucionar controvérsias e de minimizar as suas diferenças. Criou-se, através desse protocolo, o Tribunal Permanente de Revisão (TPR), com o fim de controlar a legalidade das decisões arbitrais.

Page 15: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

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bloco depende apenas do parlamento paraguaio, já que os congressos dos outros

três países se posicionaram a favor do protocolo.

Embora o MERCOSUL possua dimensões econômicas, políticas e sociais, o

bloco vem sendo conduzido, pelos governos, como um projeto de integração quase

que exclusivamente comercial e, nesse sentido, as dificuldades para o crescimento

do bloco são inúmeras.

Importantes crises internacionais atingiram de forma variada os países da

região, pressionando os governos a buscarem soluções individuais que afetaram os

esforços de integração e aprofundaram os problemas internos. Cada país encontrou

seu caminho de forma individual, não negociada, e nem sempre compatível com os

propósitos de promover uma convergência entre as quatro economias.

O MERCOSUL considerado inicialmente como um instrumento que

possibilitaria um desenvolvimento econômico e social dos países membros e a

efetivação de uma integração da região ainda está longe de alcançar suas metas.

Podemos citar a eliminação de diversas barreiras comerciais ainda existentes entre

os países integrantes do bloco, a lenta recuperação dos dois mais importantes

membros do bloco (Brasil e Argentina) após as recentes crises econômicas, a

insatisfação de membros menores como Uruguai e Paraguai e a indefinição da

adesão da Venezuela ao bloco, como os maiores problemas a serem vencidos na

atualidade para que o MERCOSUL continue a evoluir.

2.3.2 A Comunidade Andina de Nações

Com o nome de Pacto Andino, este bloco econômico sul-americano é criado

em 1969, durante o Acordo de Cartagena, com o objetivo de aumentar a integração

comercial, política e econômica entre seus países-membros. Inicialmente o acordo é

firmado entre os seguintes países: Bolívia, Colômbia, Chile, Equador e Peru.

Posteriormente, em 1973, a Venezuela adere ao acordo.

Após sete anos de vigência, em outubro de 1976, o Chile retirou-se do bloco

alegando incompatibilidades econômicas.

Durante os primeiros dez anos de existência foram formados os principais

órgãos e instituições necessárias à condução das atividades do bloco (Corte Andina

de Justiça, Parlamento Andino e o Conselho Andino de Ministros das Relações) com

exceção do Conselho Presidencial Andino que foi criado em 1990.

Page 16: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

16

A política adotada pelo bloco na primeira década de sua existência seguia o

modelo de substituição de importações, onde a indústria interna dos membros era

protegida por altas tarifas impostas aos produtos provenientes do exterior. A crise

dos anos 80 acaba com o modelo econômico vigente e o processo de integração do

bloco não avança.

A partir do final da década de 1980 e no início dos anos 90 o bloco troca o

modelo de desenvolvimento fechado por um modelo mais flexível que é o adotado

até os dias de hoje. A questão do comércio torna-se prioridade, os países membros

eliminam as tarifas entre si e formam uma área de livre comércio que alavanca as

negociações dentro do bloco criando milhares de empregos.

Em 1997, os presidentes dos países membros decidiram, através do

Protocolo de Trujillo, realizar reformas no Acordo de Cartagena, a fim de se adaptar

às mudanças no cenário internacional. É criada a Comunidade Andina que substitui

o Pacto Andino.

Em 2000 começam as tratativas entre os Presidentes dos países sul-

americanos para buscar implementar uma área de livre comércio entre a CAN e o

MERCOSUL, objetivo que está claro dentro das aspirações da UNASUL que será

abordada posteriormente.

Em abril de 2006, o presidente Hugo Chávez, anuncia a saída da Venezuela

da Comunidade Andina, argumentando que os Tratados de Livre Comércio,

assinados pela Colômbia e Peru com os Estados Unidos, causaram dano irreparável

às instituições andinas.

Em setembro de 2006 o Chile é reincorporado à CAN como membro

associado.

Nesses últimos dez anos o modelo de desenvolvimento adotado pela CAN

permitiu o crescimento do comércio, mas não conseguiu resolver os problemas da

pobreza, da desigualdade e da exclusão social. Percebendo esse problema, em

2007, os presidentes dos países membros firmam um acordo para continuar a

promover a integração do bloco, porém com um enfoque mais equilibrado entre os

aspectos econômicos e comerciais e os aspectos sociais.

Page 17: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

17

Em 2010 o Conselho Andino de Ministros das Relações Exteriores9 junto com

a Comissão da Comunidade Andina10, aprovam os princípios orientadores que

devem guiar o processo de integração andino e uma agenda estratégica com 12

assuntos os quais os países membros estão dispostos a, juntos, trabalharem para

um avanço conjunto.

Atualmente, a CAN vive um dilema onde em pratos opostos da balança de

interesses estão o incentivo à integração regional e a adoção de Acordos Bilaterais

(Tratados de Livre Comércio) hoje existentes entre a maioria dos países membros

(Peru, Colômbia e Equador) e os grandes mercados (Estados Unidos e a União

Europeia).

A história da Comunidade Andina tem-se caracterizado por avanços e

retrocessos como com qualquer outro grupo de integração. Esses retrocessos

muitas vezes foram ocasionados por uma visão meramente econômica do processo

fundamentada em aspectos unicamente comerciais.

2.3.3 A Organização do Tratado de Cooperação Amazônia

A Amazônia tem sido foco de tensões devido a pressões e interesses

internacionais sobre os países da região, fundamentado nas questões dos

problemas indígenas e dos direitos humanos, na preocupação da proteção do meio

ambiente e no incremento da ocorrência de ilícitos transnacionais.

Em julho de 1978 era assinado, por Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador,

Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, o Tratado de Cooperação Amazônica (TCA),

instrumento jurídico que reconhece a natureza transfronteriça da Amazônia. Esse

tratado reafirma a soberania dos países amazônicos e incentiva, institucionaliza e

orienta o processo de cooperação regional entre os mesmos. Tem como objetivo

central, a promoção do desenvolvimento harmônico da Amazônia, e a incorporação

de seus territórios às respectivas economias nacionais, o que é fundamental para a

manutenção do equilíbrio entre crescimento econômico e preservação do meio

ambiente. Para alcançar esse objetivo estão previstas as seguintes ações por parte

9 Órgão de direção política, composto pelos ministros de relações exteriores dos países membros,

responsável por garantir a realização dos objetivos do processo de integração sub-regional e formular e executar a política externa da Comunidade Andina. 10

Órgão Normativo composto por um representante plenipotenciário de cada um dos países membros.

Page 18: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

18

dos países membros: o incremento da pesquisa científica e tecnológica; o

intercâmbio de informações; a utilização racional dos recursos naturais; a liberdade

de navegação; a preservação do patrimônio cultural; os cuidados com a saúde; a

criação de centros de pesquisa; o estabelecimento de uma adequada infraestrutura

de transportes e comunicações; e o incremento do turismo e do comércio fronteiriço.

Os representantes dos Países Membros firmaram no dia 14 de dezembro de

1998, na cidade de Caracas, Venezuela, o Protocolo de Emenda ao TCA que

estabelece a criação da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA)

e a implantação de sua Secretaria Permanente.

A OTCA é um instrumento do TCA com uma ampla visão do processo de

cooperação Sul-Sul11, que fortalece a vocação de seus governos em construir

sinergias com outros atores.

A OTCA além de coordenar estudos sobre as potencialidades econômicas

geradoras de renda e oportunidades para a região amazônica, proporcionando uma

efetiva cooperação e integração dos países membros do Tratado, tem como uma de

suas funções principais interagir com as demais iniciativas que existem no espaço

territorial que abarca a Amazônia, seja em matéria de infraestrutura, transporte ou

comunicações.

Desde julho de 2009, a Secretaria Permanente da OTCA, por mandato dos

Países Membros, iniciou a revisão do seu Plano Estratégico 2004 – 2012

entendendo a necessidade de atualizar as prioridades nacionais sobre o espaço

amazônico. Nesse contexto, comemorando os 30 anos de vigência do TCA, os

Ministros das Relações Exteriores do Tratado de Cooperação Amazônica realizaram

sua décima reunião no dia 30 de novembro de 2010. Na ocasião, os chanceleres

subscreveram a Declaração de Lima que reitera o renovado papel da OTCA como

um fórum de cooperação, intercâmbio, conhecimento e projeção conjunta para

enfrentar os novos desafios internacionais. Também adotaram uma nova Agenda

Estratégica de Cooperação Amazônica, com ações específicas para o curto, médio e

longo prazo, relançando à Organização no novo cenário regional dos seus Países

Membros.

11

É uma filosofia cooperativa entre Estados em situações semelhantes de grau de desenvolvimento e que compartilham percepções sobre os obstáculos para atingir níveis satisfatórios de bem-estar social

Page 19: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

19

2.4 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

O processo de globalização ao qual o mundo está submetido, caracterizado

pela interligação dos sistemas internacionais de produção e financeiros, faz com que

os países se preocupem com o seu fortalecimento econômico de forma a estarem

capacitados para competir internacionalmente. Nesse contexto, a integração

regional é um dos melhores instrumentos de fortalecimento e se insere

perfeitamente no atual cenário econômico mundial. Entretanto muitos dos blocos

econômicos formados não conseguem superar as diferenças existentes entre os

Estados membros e não atingem as metas traçadas nos tratados constitutivos. A

origem de tal problema pode estar no fato da falta de uma verdadeira integração

regional que vá além dos acordos com viés meramente econômico e comercial.

Na América do Sul o CAN e o MERCOSUL começaram avançando

rapidamente, apresentando resultados entusiasmantes, mas, com o passar do

tempo, tiveram seu ritmo de crescimento reduzido, chegando, em determinadas

épocas, a quase paralisia total. As supostas assimetrias existentes entre os países

membros e as diversas crises econômicas vivenciadas fizeram com que diversas

medidas ditas como defensivas fossem tomadas de forma unilateral, muitas delas

descumprindo as obrigações inicialmente assumidas. Os Governos mostram-se

incapazes de adotar políticas mais incisivas na área econômica e comercial que

possam ir além dos cortes tarifários mais simples, associados aos segmentos que

não possuem demanda interna por proteção.

A OTCA por sua vez não tem um enfoque fortemente econômico e comercial,

mas está restrita a área amazônica e na área da integração continental necessita

coordenar-se com as demais iniciativas para poder vir a ser um instrumento eficaz, o

que, após mais de trinta anos de existência, ainda não alcançou.

Apesar da América do Sul, por suas características e pelas diversas

iniciativas já existentes, apresentar um grande potencial para obter uma ótima

integração entre seus Países, provavelmente a priorização dos temas da economia

nos projetos de integração, não permitiram, até o momento alcançar a união

pretendida. De qualquer forma, as experiências até agora obtidas com o CAN,

MERCOSUL E OTCA não devem ser descartadas nas futuras ações a serem

executadas em busca da união dos países sul-americanos.

Page 20: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

20

3 A UNIÃO DAS NAÇÕES SUL-AMERICANAS

3.1 A CONSTITUIÇÃO DO BLOCO

A iniciativa de integração da América do Sul começa no ano 2000 quando, a

convite do Presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, realiza-se em Brasília,

nos dias 31 de agosto e 1º de setembro daquele ano, pela primeira vez na história

do continente, a Reunião de Presidentes da América do Sul. O objetivo dessa

reunião foi aumentar o diálogo entre os países do Continente, buscando medidas

para incentivar a integração da região. Sob esse enfoque foi criada a Iniciativa para

Integração da Infra-Estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) cujo objetivo principal

era a elaboração de planos para as áreas de integração física e infraestrutura que

modernizem as relações e potencializem a proximidade sul-americana, rompendo os

obstáculos fronteiriços e formando um espaço ampliado através de obras e

articulações nas áreas de transporte, energia e comunicações.

Integração e desenvolvimento da infra-estrutura física são duas linhas de ação que se complementam. A formação do espaço econômico ampliado sul-americano almejado pelas sociedades da região dependerá da complementação e expansão de projetos existentes e da identificação de novos projetos de infra-estrutura de integração, orientados por princípios de sustentabilidade social e ambiental, com capacidade de atração de capitais extra-regionais e de geração de efeitos multiplicadores intra-regionais. Avanços no campo da infra-estrutura, por sua vez, reverterão em novos impulsos para a integração, criando-se assim uma dinâmica que deve ser incentivada. Esse cenário seria ainda beneficiado por uma política de investimentos com perspectiva regional e não apenas nacional (Comunicado de Brasília, item 37).

Como resultado dessa reunião ficou registrado no Comunicado de Brasília

que a consolidação e a instrumentação da identidade sul-americana deveriam ser

buscadas, pois contribuiriam para o fortalecimento de processos regionais.

Em 2002 é realizada a 2ª Reunião de Presidentes da América do Sul na

cidade de Guayaquil, no Equador. Nela, além de se reafirmar a importância

estratégica da IIRSA como instrumento de integração sul-americana, foi assinado o

Consenso de Guayaquil que renovou o compromisso dos países da região com os

princípios democráticos e com os direitos humanos. Apesar de vários temas terem

figurados em sua agenda é interessante ressaltar que ao final desse encontro fica

como um dos resultados a evidencia da existência da identidade sul-americana

respaldada na história comum e na herança cultural compartilhada entre os povos

da região.

Page 21: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

21

No dia 8 de dezembro de 2004, durante a 3ª Reunião de Presidentes da

América do Sul, realizada em Cuzco, no Peru, foi estabelecida a Comunidade Sul-

Americana de Nações (CASA), em consonância com o desejo de integração dos

países sul-americanos, verificado nas duas primeiras reuniões. Conforme consta no

texto da Declaração de Cusco, a CASA foi formada levando-se em conta a

convergência dos interesses políticos, econômicos, sociais, culturais e de

segurança, como um fator potencial de fortalecimento e desenvolvimento das

capacidades internas dos países da região para sua melhor inserção internacional.

Além da criação da CASA, nessa mesma reunião foi ratificada a “Agenda de

Implementação Consensuada 2005-2010”12.

Em setembro de 2005 em Brasília ocorre a 1ª Reunião de Chefes de Estado

da CASA, no discurso inaugural da reunião, Lula disse: "A Comunidade Sul-

Americana de Nações é muito mais do que uma construção política e jurídica, fruto

de voluntarismo. Somos 350 milhões de homens e mulheres, determinados a

realizar todas as potencialidades de uma região dotada de imensos recursos

naturais e humanos”. Os participantes da primeira reunião de cúpula da CASA

discutiram questões econômicas, infraestrutura, integração física e energética,

cultura, meios de comunicação, meio-ambiente e problemas sociais. Durante esse

encontro foi apresentada a necessidade da associação da CAN e do MERCOSUL.

Na Declaração Final firmada após o evento ficou registrado que a associação

recíproca dos Estados componentes do MERCOSUL e da CAN, além do Chile, da

Guiana e do Suriname era essencial para se conseguir a conformação da CASA,

cuja essência se estabelece com o entendimento político e com a integração

econômica e social dos povos existentes na América do Sul.

A 2ª Reunião de Chefes de Estado da CASA ocorre em Cochabamba, na

Bolívia, no dia 9 de dezembro de 2006. Mais uma vez é reafirmada a necessidade

de se levar em consideração e incluir nesse novo programa de integração todos os

avanços obtidos pela CAN e pelo MERCOSUL. Na Declaração Final de

Cochabamba, eles apontaram a globalização do pós-guerra fria como um dos

fatores responsáveis pelo aprofundamento de problemas econômicos e sociais na

região e a integração regional como meio para se evitar e enfrentar tais problemas.

12

Programa que focava 31 projetos de integração física da América do Sul e que previa para tal um orçamento US$ 4,3 bilhões. O financiamento desses projetos além de contar com a ajuda dos governos dos países da região também contava com recursos da iniciativa privada.

Page 22: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

22

O novo modelo proposto de integração possui identidade própria e pluralista, que

abrange o âmbito comercial, mas ao mesmo tempo busca uma articulação

econômica e produtiva mais ampla, bem como novas formas de cooperação política,

social e cultural, no âmbito público e no âmbito privado.

Em 16 de abril de 2007, por ocasião da 1ª Cúpula Energética Sul-americana,

realizada na Ilha de Margarita, na Venezuela, a CASA muda de nome e passa a se

chamar União das Nações Sul-Americanas. A formalização desse novo projeto de

integração ocorre no dia 23 de maio de 2008 quando é firmado durante a 3ª Cúpula

de Chefes de Estado, realizada em Brasília, o Tratado Constitutivo da UNASUL.

O tratado constitutivo da UNASUL entrou em vigor em 11 de março do

corrente ano, um mês depois da sanção do Uruguai, nono país a ratificá-lo. Por

ocasião da entrada em vigor do tratado ainda faltavam o Paraguai, a Colômbia e o

Brasil ratificarem o tratado.

O Senado paraguaio aprovou no dia 09 de junho deste ano o tratado

constitutivo da UNASUL e, consequentemente, o ingresso legal do país na

organização, entretanto o documento foi remetido a Câmara dos Deputados do

Paraguai que, em sessão realizada no dia 14 de junho próximo passado, adiou, sem

data prevista, a avaliação do tratado constitutivo, tendo como justificativa a

necessidade de um tempo maior para estudar o projeto. A questão que está sendo

avaliada naquela casa legislativa está relacionada ao fato da UNASUL ser

visualizada, por alguns deputados paraguaios, como um projeto do presidente

venezuelano, Hugo Chávez, para, apenas, debilitar a Organização de Estados

Americanos. Cabe ressaltar que também é o Paraguai que vem dificultando a

entrada da Venezuela no MERCOSUL.

Na Colômbia o tratado já foi aprovado pelo Parlamento e pelo Executivo e

está atualmente na Corte Constitucional, devendo ser ratificado em breve.

No Brasil, a Câmara dos Deputados aprovou a carta constitutiva em 31 de

maio deste ano, e o Senado no dia 7 de julho subsequente. No dia seguinte a

aprovação pelo Senado, em cerimônia realizada perante a presença da secretária-

geral da UNASUL, a colombiana María Emma Mejía, na Chancelaria do Equador,

país depositário do acordo, o governo brasileiro entregou a ratificação do tratado se

tornando o 10º país a aprovar a carta constitutiva da UNASUL.

Page 23: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

23

3.2 A ESTRUTURA VIGENTE

A UNASUL13 foi institucionalizada em sua personalidade jurídica enquanto

organismo internacional, sendo dirigida por uma presidência pro tempore e tendo

como sua máxima instância o Conselho de Chefes de Estado e de Governo. Possui

ainda como outros órgãos centrais, responsáveis pela orientação política e

supervisão do processo de integração, um Conselho de Ministros de Relações

Exteriores, um Conselho de Delegados e uma Secretaria Geral. Além dos órgãos

centrais possui também os Conselhos Ministeriais Setoriais que são: Conselho

Energético, Conselho de Saúde, Conselho de Defesa, Conselho de

Desenvolvimento Social, Conselho sobre o Problema Mundial das Drogas, Conselho

de Infraestrutura e Planejamento, Conselho de Economia e Finanças e Conselho de

Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia. Conta ainda com três Grupos de Trabalho:

o afeto a integração financeira, subordinado ao Conselho de Economia e Finanças;

o relacionado à solução de controvérsias em matéria de investimentos, em cujo

âmbito estuda-se a possibilidade de criar mecanismo de arbitragem, Centro de

Assessoria Legal e código de conduta para membros de tribunais arbitrais; e o de

respostas a emergências.

A presidência temporária é exercida por um período de um ano em sistema

de rodízio seguindo a ordem alfabética dos países signatários. Já presidiram o Bloco

o Chile, de maio de 2008 a agosto de 2009 e o Equador, de agosto de 2009 a

novembro de 2010. O atual presidente da UNASUL é Bharrat Jagdeo, presidente da

Guiana.

A atual Secretária-Geral da União das Nações Sul-Americanas, a ex-

chanceler da Colômbia María Emma Mejía, iniciou seu mandato no dia 16 de junho

de 2011 com a assinatura de um acordo para que a sede permanente do órgão

comece a funcionar em Quito, capital do Equador. A atual secretária permanecerá

no cargo até maio de 2012.

Outro aspecto importante a ressaltar é que as decisões e normatizações de

quaisquer assuntos referentes à organização têm que ser tomadas e adotadas por

consenso conforme está previsto no 12º artigo do Tratado Constitutivo.

13

Composta por 12 países, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e a Venezuela.

Page 24: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

24

3.3 OBJETIVOS DA UNASUL

O objetivo geral da UNASUL, que consta do 2º artigo do Tratado Constitutivo,

é construir, de maneira participativa e consensuada, um espaço de integração e

união no âmbito cultural, social, econômico e político entre seus povos, priorizando o

diálogo político, as políticas sociais, a educação, a energia, a infraestrutura, o

financiamento e o meio ambiente, entre outros, com vistas a eliminar a desigualdade

socioeconômica, alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a

democracia e reduzir as assimetrias no marco do fortalecimento da soberania e

independência dos Estados.

Os objetivos específicos da UNASUL, conforme consta no 3º artigo do

Tratado Constitutivo, são, entre outros:

- o fortalecimento do diálogo político entre os Estados Membros que assegure um

espaço de concertação para reforçar a integração sul-americana e a participação

da UNASUL no cenário internacional;

- o desenvolvimento social e humano com equidade e inclusão para erradicar a

pobreza, superar as desigualdades na região e avançar no acesso universal à

educação, à seguridade social e aos serviços de saúde;

- o desenvolvimento de uma infraestrutura para a interconexão da região;

- a integração energética, bem como a industrial e produtiva;

- o intercâmbio de informação e de experiências em matéria de defesa;

- o desenvolvimento de mecanismos concretos e efetivos para a superação das

assimetrias, alcançando assim uma integração equitativa;

- a promoção da diversidade cultural e das expressões da memória e dos

conhecimentos e saberes dos povos da região, para o fortalecimento de suas

identidades; e

- a cooperação setorial como um mecanismo de aprofundamento da integração sul-

americana mediante o intercâmbio de informação, experiências e capacitação.

Cada Conselho Ministerial Setorial possui também objetivos próprios,

extraídos dos objetivos específicos, visando contribuir para que o objetivo geral da

Organização seja alcançado.

O Conselho Energético é encarregado de traçar as diretrizes fundamentais

para o aprofundamento da cooperação regional no setor. O seu estabelecimento foi

decidido na 1ª Reunião de Energia Sul-Americana em 16 de abril de 2007 e possui

Page 25: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

25

sua sede em Quito no Equador. Já desenvolve projetos tais como o Anel Energético

Sul-Americano que visa a construção de uma rede de gasodutos.

O Conselho de Saúde, criado no dia 16 de dezembro de 2008, reúne os

ministros da área de saúde dos estados membros e visa elaborar programas

regionais na área de saúde pública a fim de construir um espaço de integração em

matéria de saúde, incorporando esforços e conquistas de outros mecanismos de

integração regional e promovendo políticas comuns.

O Conselho de Defesa, que teve sua criação aprovada em 15 de

dezembro de 2008 durante a reunião da Cúpula Extraordinária da UNASUL, tem

como objetivos principais: elaborar políticas de defesa conjunta; realizar intercâmbio

de pessoal entre as Forças Armadas de cada país; realizar exercícios militares

conjuntos; participar em operações de paz das Nações Unidas; permitir a troca de

análises sobre os cenários mundiais de defesa e buscar a integração das industriais

de material de defesa.

O Conselho de Desenvolvimento Social tem como objetivo criar grupos

temáticos sobre diversos assuntos da área social viabilizando a cooperação técnica

entre os países membros.

O Conselho sobre o Problema Mundial das Drogas visa promover a

cooperação entre os organismos especializados dos países membros da UNASUL

na luta contra o tráfico de entorpecentes ou drogas ilícitas em todos os elos de sua

cadeia, quais sejam: cultivo, produção, fabricação, trânsito, tráfico e distribuição.

O Conselho de Infraestrutura e Planejamento, criado em agosto de 2009,

busca planejar e desenvolver atividades na área de integração da infraestrutura

conferindo o suporte político necessário a assegurar os investimentos essenciais ao

desenvolvimento dos projetos prioritários, acompanhando os importantes trabalhos

que vêm sendo desenvolvidos pela IIRSA ao longo de seus dez anos de existência.

A integração da infraestrutura física regional é uma das prioridades dentro da

agenda multilateral dos países da América do Sul.

O Conselho de Economia e Finanças tem como objetivo alcançar a integração

financeira estabelecendo uma política monetária e projetos de desenvolvimento de

finanças.

O Conselho de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia, que foi criado por

ocasião da 3ª Reunião Ordinária da UNASUL, realizada em Quito no dia 10 de

agosto de 2009, visa promover: a colaboração entre universidades, centros de

Page 26: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

26

pesquisa, empresas públicas e privadas, a fim de transferir conhecimentos

científicos e tecnológicos para incrementar a capacidade de inovação e melhorar a

competitividade sistêmica do setor produtivo; a coordenação de intercâmbio de

experiências para a formação, pesquisa e inovação em desenvolvimento

sustentável, conservação da biodiversidade e adaptação e mitigação das mudanças

climáticas; e o intercâmbio de informações sobre os sistemas de reconhecimento,

equivalência de estudos e garantia de qualidade em todos os níveis e modalidades

educativas, para facilitar a integração, a mobilidade e o intercâmbio acadêmico,

profissional e trabalhista.

3.4 OS AVANÇOS DA UNASUL

3.4.1 Instrumento para a solução pacífica de controvérsias

Logo após sua criação a UNASUL passou a desempenhar um papel

importante de mediador nas situações de crise na América do Sul. A primeira

participação ocorre por ocasião da crise separatista do Pando14, na Bolívia, em

2008. Os chefes de Estado dos países da UNASUL, demonstrando uma grande

coesão frente à crise interna vivida pela Bolívia, organizaram uma reunião de

emergência na qual declararam total apoio ao presidente Evo Morales. Como

resultado dessa reunião, foi formada uma comissão de diplomatas dos diversos

países do continente, para auxiliar as negociações na Bolívia, visando ao

estabelecimento de um diálogo para resolver o conflito.

Um fato merecedor de destaque ocorre quando a UNASUL, ao discutir o

acordo que estava sendo firmado entre Washington e Bogotá, permitindo o controle

de várias bases militares na Colômbia pelos Estados Unidos, conseguiu despertar a

14

Ao promulgar uma lei que federalizou a receita advinda da exploração das reservas de gás o presidente da Bolívia, Evo Morales, impôs grandes prejuízos aos estados mais ricos da Bolívia. Como consequência os departamentos de Santa Cruz, Tarija, Beni e Pando (que, juntos, possuem mais de 80% das reservas de gás do país) passaram a exigir maior autonomia em relação ao governo federal, defendendo mudanças na distribuição dos impostos e na escolha de seus governadores. Tal movimento ficou conhecido como a crise de Pando tendo em vista que dentro desse processo de crescente tensão política ocorreram confrontos entre governistas e opositores no departamento amazônico de Pando, onde o governador Leopoldo Fernández ordenou a seus pistoleiros uma caçaria seletiva dos principais dirigentes camponeses, mesmo que em alguns momentos a matança fosse indiscriminada. Os paramilitares a serviço do governo de Pando executaram os crimes desatando uma onda de terror que redundou em cerca de 30 mortes.

Page 27: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

27

rejeição necessária para que o Tribunal Constitucional da Colômbia promulgasse

uma sentença negativa a realização daquele acordo na íntegra.

Outra atuação importante dos países que compõem a UNASUL ocorre por

ocasião da crise vivida entre a Colômbia e a Venezuela, quando seus governos

chegaram a um ponto de ruptura em meados de 2010. Foi necessária uma grande

articulação entre os ministros e chefes de Estado dos países do continente até que

os próprios governos envolvidos na crise resolvessem a situação.

Mais uma vez a UNASUL foi chamada a agir por ocasião da crise institucional

ocorrida no Equador, em setembro de 2010. Em conjunto, os chefes de Estado, por

meio da organização, indicaram que não seriam tolerantes a qualquer quebra da

ordem institucional, incorporando um Protocolo Adicional ao Tratado Constitutivo, no

qual foram estabelecidas medidas concretas a serem adotadas pelos Estados

Membros da UNASUL em situações de ruptura da ordem constitucional. No citado

Protocolo os países membros se comprometem a desconhecer qualquer governo

que não seja resultado de um processo eleitoral.

3.4.2 Representatividade internacional

Já ocorreram algumas significativas participações da UNASUL, como

organismo regional, no âmbito externo ao Continente.

Como exemplo dessas participações pode-se citar a atuação do bloco por

ocasião do terremoto de grandes proporções que ocorreu no Haiti. A UNASUL doou

cerca de 100 milhões de dólares e estabeleceu uma secretaria técnica e um plano

de ação para ajudar na reconstrução daquele país. Conforme afirmou o presidente

do Equador, Rafael Correa, por ocasião da cerimônia de entrada em vigor do

Tratado Constitutivo da União Sul-Americana de Nações, realizada em março de

2011 em Quito, a UNASUL é sem dúvida o organismo que mais cumpriu suas

promessas junto ao Haiti.

Outro exemplo de que a UNASUL já é uma realidade política e assim é

entendida por outros atores internacionais ocorre quando, por ocasião da II Cúpula

dos Países da América do Sul com Países Árabes, quem fala em nome da América

do Sul é a presidente do Chile, Michelle Bachelet, então presidente da UNASUL.

Page 28: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

28

3.4.3 Ações dos Conselhos

Um passo importante dado pela UNASUL, para fortalecer a estabilidade, a

paz e a cooperação na América do Sul, foi o estabelecimento de um mecanismo de

Medidas de Fomento da Confiança e da Segurança pelo Conselho de Defesa Sul-

Americano. Após as reuniões que ocorreram em setembro e novembro de 2009 com

os ministros de Defesa e das Relações Exteriores dos países membros foram

estabelecidas medidas nas áreas de intercâmbio de informação e transparência

relacionadas aos sistemas de defesa e gastos de defesa e medidas na área de

segurança entre outras. Posteriormente, os procedimentos a serem observados para

aplicação dessas medidas foram aprovados pelos Ministros de Defesa e pelos

Ministros de Relações Exteriores em maio e novembro de 2010 em reuniões

realizadas em Guayaquil e Georgetown, respectivamente.

Outro ponto de destaque na área do Conselho de Defesa Sul-Americano foi a

inauguração, no último dia 26 de maio, em Buenos Aires, do primeiro órgão desse

Conselho, o Centro de Estudos Estratégicos de Defesa (CEED). O CEED terá sua

sede construída até 2012, e ficará localizado em Buenos Aires. Tem como objetivo

principal incentivar a cooperação militar entre os Estados Membros, subsidiar a

análise e a propositura de novas políticas de defesa, atendendo às necessidades

específicas e aos interesses dos países da região.

Com a meta de apoiar os Estados Membros da UNASUL no fortalecimento de

seus sistemas de saúde pública e no desenvolvimento da capacidade de seus

recursos humanos, foi criado pelo Conselho de Saúde Sul-Americano o Instituto Sul-

Americano de Governança em Saúde (ISAGS). O ISAGS, uma instituição de

natureza comunitária e de caráter público, cuja sede será no Rio de Janeiro, terá

como suas duas principais funções a gestão dos conhecimentos já existentes e a

produção daqueles que ainda são necessários de se obter.

3.5 AS INOVAÇÕES INCORPORADAS PELA UNASUL

A primeira inovação que a UNASUL incorpora, quando a comparamos com os

demais tratados15 existentes na América do Sul, é o fato de ela ser o primeiro

15

Os tratados referenciados são os já citados ao longo do trabalho: o MERCOSUL; a CAN; e a OTCA.

Page 29: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

29

instrumento de integração que reúne todos os países do continente sul-americano.

Essa ideia é reforçada pela afirmação feita durante a Conferência de abertura do VI

Curso para Diplomatas Sul-Americanos, que ocorreu em abril de 2009, pelo então

Ministro de Estado das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim:

A Unasul é um processo extremamente vivo e importante, que permite à região se coordenar e se apresentar diante do mundo. Eu costumo dizer que algo que chama a atenção é que nunca esses países tenham assinado um tratado, um instrumento jurídico entre eles, pelo menos, de caráter amplo (Amorim 2009, p. 18).

A UNASUL assume o papel de uma organização dotada de personalidade

jurídica internacional, que tem a capacidade de representar todos os países da

América do Sul de forma completa e uníssona em instâncias bilaterais e multilaterais

diversas.

Conforme mencionado durante a cúpula de Brasília, espaços como a Unasul

são essenciais para botar a América do Sul “no mapa” e dar-lhe peso maior nas

negociações internacionais.

Uma segunda diferença, talvez a mais significativa, está associada ao fato de

que a UNASUL não está pautada em uma integração econômica orientada para a

integração comercial. Ela incorpora um perfil de cooperação dentro de um viés

político-social. Segundo Miriam Gomes Saraiva, a UNASUL pode ser considerada

uma iniciativa com um perfil diferente das outras:

...seria interessante destacar, em primeiro lugar, o papel que a Unasul vem exercendo atualmente na região. Tem tido um desempenho agregador e tem contribuído para a solução de situações de crise que, sem um marco institucional consolidado, poderiam ter resultados prejudiciais ao continente. A Unasul não representa um tipo de integração econômica (campo no qual a interdependência existente entre os países é ainda pequena) mas tem aberto caminhos para uma articulação político-estratégica importante. A Unasul como mecanismos de formação de consensos tem podido acomodar visões diferentes sobre integração... (Saraiva 2010, p. 15).

Este novo instrumento de integração, diferente do que acontece com o

MERCOSUL e com a CAN, criou um espaço para que ações de aproximação sejam

orquestradas entre os países do continente nos mais diversos aspectos. A UNASUL

incorpora novas faces à integração regional quando aborda no escopo de seu

tratado constitutivo a importância da cooperação nas áreas de energia, de

infraestrutura, de defesa, de educação, de ciência e tecnologia, de saúde, e outras.

Entretanto é importante também realçar que na UNASUL o aspecto econômico e

comercial não está em um segundo plano, ele existe, só não assume um papel de

Page 30: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

30

destaque sendo colocada a frente das demais áreas de interesse. Conforme

comenta o Embaixador Antônio José Ferreira Simões:

...a Unasul tem outras dimensões centrais. A econômico-comercial é fundamental, porém não pode ser colocada à frente das demais. O objetivo a ser alcançado é fazer convergir os processos de integração comercial que, em separado, buscaram o Mercosul, a Comunidade Andina, o Chile, o Suriname e a Guiana. Observe-se: a Unasul não estabeleceu metas quanto ao alcance do livre comércio até uma data determinada. Sua abordagem mais pragmática e flexível visa fazer com que os avanços no sentido da abertura e integração econômica se façam à medida que possam ser aceitos pelos setores econômicos dos vários países, de forma que sejam sustentados no longo prazo (Simões 2008, p. 270).

O Tratado Constitutivo da UNASUL, ao listar diversas áreas de cooperação,

induz, de forma clara, que tal organismo está aberto a buscar a integração em outras

áreas que possam se mostrar atrativas. Além do mais, em cada área de integração

já estabelecida os representantes dos Estados membros têm por obrigação

identificar as oportunidades e propor os acordos necessários a explorá-las (Simões

2008, p. 263).

A UNASUL é inovadora, pois ela impõe aos Estados membros que a relação

vá além de uma mera troca comercial fazendo com que sejam superadas as

desconfianças e o próprio desconhecimento mútuo que existe entre nações vizinhas.

Ela requer a participação de múltiplos atores, gerando assim novos canais de

diálogo político, social e econômico.

3.6 CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

A UNASUL, diferente do que muitos autores defendem, é um instrumento de

integração promissor como pode ser comprovado ao se verificar que, mesmo antes

do tratado entrar em vigência, no dia 11 de março de 2011, muitas ações

administrativas, políticas e estratégicas foram tomadas e, em diversos assuntos, a

participação do órgão foi fundamental para que fossem alcançadas soluções

favoráveis para o continente.

Com o estabelecimento da UNASUL o processo de integração do continente

sul-americano obteve fortes avanços. Em termos quantitativos, a UNASUL promove

uma inclusão dos Estados do continente que as experiências da CAN, do

MERCOSUL e da OTCA não possuíam, possibilitando a construção de uma maior

capacidade coletiva de influência nas negociações internacionais. Em termos

qualitativos, a UNASUL supera os objetivos econômicos e comerciais que

Page 31: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

31

caracterizam os demais tratados existentes, objetivando a integração em temas

como energia, infraestrutura, defesa, educação, ciência e tecnologia, saúde entre

outras, buscando valorizar a identidade sul-americana, promovendo o fortalecimento

da democracia, o respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente.

A UNASUL reúne totais condições para efetivar à tão sonhada integração sul-

americana. Uma integração acompanhada de ações sociais, políticas e econômicas

que, minimizando as assimetrias dos Estados membros, proporcionará um

desenvolvimento regional sustentável, trazendo prosperidade para todos os países

do bloco.

Page 32: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

32

4 A ATUAL CONJUNTURA SUL-AMERICANA A América do Sul está inserida em um mundo onde, na nova ordem mundial,

a multipolaridade se manifesta na medida em que os países centrais se obrigam a

um maior grau de compartilhamento do poder, em função da necessidade de

preservação de seus próprios interesses. É o que já se verifica na dimensão

econômica, por efeito da globalização, com a internacionalização dos fluxos de

capitais. Nesse sentido diversos países se unem para buscar uma maior

representatividade nas diversas estruturas econômicas e políticas multipolares, que

se baseiam em um novo equilíbrio de forças entre as nações, fortalecendo a ideia de

integração regional. Essa ideia fortalece a UNASUL, pois, diferente dos demais

tratados, ela comtempla a região como um todo dando maior peso político as suas

intervenções nos diversos fóruns internacionais.

Em que pese a recente visita realizada pelo presidente Barack Obama ao

Brasil, quando então demonstrou em seus discursos um interesse de efetivar uma

verdadeira parceria entre os dois países, atualmente o governo dos Estados Unidos

não tem uma política específica orientada para a América do Sul. Soma-se a esse

fato que os atuais governos sul-americanos têm agido de forma a se distanciar dos

Estados Unidos, enfraquecendo os laços históricos com o norte (Saraiva 2010, 1).

Tal situação favorece as ações voltadas para a integração regional sendo um ponto

forte para o sucesso da UNASUL.

Outro aspecto político importante de se analisar é o fato de que todos os

atuais governos sul-americanos são democráticos, uma vez que seus presidentes

foram eleitos pelo voto, e na sua grande maioria de esquerda, o que, a princípio,

induziria a se acreditar em um entrosamento quase que perfeito entre eles,

favorecendo assim a aceleração do processo de integração continental. Só que

dentro desses governos existem duas esquerdas, uma mais moderada e outra mais

radical, que divergem em conteúdo e estilo e que se aproximam ou se afastam de

acordo com os movimentos no tabuleiro do xadrez político (Carvalho 2008, 6). Tal

situação pode ser prejudicial para a integração e, consequentemente, para o

sucesso da UNASUL, caso ela proporcione uma disputa por uma suposta liderança

regional. Um exemplo de uma disputa regional foi a reação à candidatura brasileira a

um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, que não

conta com o apoio da Argentina e da Colômbia.

Page 33: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

33

Apesar de a integração regional ser o assunto em pauta nos discursos dos

diversos governos sul-americanos e existir um esforço por parte da maioria deles

para acelerar a sua efetivação, existem alguns conflitos entre os países do

continente que devem ser vencidos para não prejudicar o avanço dessa integração e

se constituírem em um ponto fraco para o sucesso da UNASUL. As relações entre

alguns países da América do Sul ainda estão pautadas em sentimentos de

desconfiança mutua, motivados por reivindicações que são resultado de interesses

conflitantes. A existência de áreas de fricção é um aspecto negativo para a

integração, pois é muito difícil realizar ações de cooperação ao mesmo tempo em

que se enfrentam situações conflitivas. Existem diversos casos concretos de

conflitos latentes que, se reascendidos, irão se transformar em entraves aos ideais

de integração, dos quais podemos citar como exemplo:

- a mais recente, mas não inédita, reivindicação da Bolívia junto ao Chile de obter

sua saída para o mar (em maio do corrente ano o Chile advertiu à Bolívia

divulgando que suas Forças Armadas estariam preparadas para defender a

soberania do país, depois que o governo boliviano manifestou sua intenção de

pleitear junto ao Tribunal de Haia uma negociação para conseguir uma saída para

o mar);

- na fronteira entre o Peru e o Equador persiste o antigo contencioso que já levou

esses países a diversos conflitos, onde o último deles culminou em grave

confronto militar;

- a constante interação entre os interesses da Colômbia e da Venezuela provocam

idiossincrasias e pronunciamentos de protesto dos dois governos, envolvendo

contencioso fronteiriço, além de atritos relacionados a temas diversos como o

suposto apoio da Venezuela as FARC e os acordos realizados entre a Colômbia e

os Estados Unidos;

- o não reconhecimento da Venezuela de sua fronteira oriental com a Guiana ( a

Venezuela reivindica três quartos do território vizinho de tal forma que o

presidente Hugo Chávez inseriu a região como parte do país em sua Constituição

Bolivariana).

Outro importante aspecto da conjuntura atual que deve ser mencionado e

classificado como um ponto fraco para o sucesso da UNASUL está no fato de alguns

países priorizarem seus objetivos domésticos em detrimento da cooperação

regional. Estão enquadrados nessa situação diversos casos que ocorreram

Page 34: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

34

recentemente. Dentre eles podemos citar os embates entre o Brasil e a Bolívia com

relação à questão do gás16; o Brasil e o Paraguai envolvendo a questão da revisão

do Tratado de Itaipu17; o Equador e a Colômbia no caso da fumigação

de herbicidas18; o Brasil e o Equador com o caso do financiamento de obras pelo

BNDES19; e a Argentina e o Uruguai no caso das fábricas de celulose20. Alguns

desses embates decorreram em grande medida das mudanças políticas internas dos

países que vivenciam alguma instabilidade política.

Na América do Sul há um crescimento econômico em quase todos os países.

Os programas sociais, que a maioria dos governos sul-americanos tem adotado,

associado a esse crescimento econômico que a região tem vivenciado

recentemente, estão sendo muito valiosos para combater a pobreza e a

desigualdade, proporcionando um desenvolvimento social que terá resultados

positivos a médio e longo prazo. Entretanto, as diversidades no tamanho dos países,

na estrutura econômica e nos níveis de desenvolvimento são facilmente percebidas

e essas assimetrias podem dificultar em alguns aspectos as negociações comerciais

e até mesmo a integração regional como um todo. Acordos são mais facilmente

obtidos entre países situados em um mesmo patamar de desenvolvimento

econômico e social (Almeida 2008, 85). Sob esse enfoque podemos classificar os

programas sociais como pontos fortes e as assimetrias ainda não vencidas como

pontos fracos para que a UNASUL seja bem sucedida na obtenção da integração

regional.

16

A Bolívia decidiu nacionalizar as reservas e as atividades de exploração e refino de petróleo, a qual culminou na ocupação das instalações da Petrobrás por tropas do exército daquele país. Além disso, a Bolívia forçou uma negociação em torno da revisão do contrato internacional para o preço do gás que fornece ao Brasil, insumo este que tem sido utilizado em grande escala nas atividades industriais e no programa de ampliação das termoelétricas brasileiras. 17

Tema relacionado com o preço da energia da binacional Itaipu pago pelo Brasil ao país, considerado por este como inferior ao que é praticado no mercado internacional. 18

O programa de erradicação colombiano, que visa destruir as plantações de coca na fronteira, vem causando tensões com o Equador. O presidente Rafael Correa alega que os herbicidas representam um risco para os moradores e as plantações na fronteira entre os dois países. 19

O governo do Equador pediu a abertura de arbitragem internacional questionando a legalidade da dívida contraída junto ao BNDES, por meio do grupo Odebrecht, para a construção da usina hidrelétrica San Francisco. O Equador alega que o problema é entre o Estado do Equador e uma empresa privada já o Brasil, em resposta, convocou o seu embaixador naquele país para consultas. O Presidente do Equador afirma que a divida é ilegal, ilegítima e, portanto, não será paga. 20

Crise diplomática motivada pelo fato do Uruguai ter autorizado a instalação de duas grandes plantas industriais de celulose e papel nas margens do Rio Uruguai, na fronteira com a Argentina. Tal ação provocou manifestações veladas de desagrado por parte do governo argentino e gerou protestos e uma mobilização da sociedade argentina na rejeição ao referido projeto, tendo como alvo os potenciais danos ambientais advindos da instalação das referidas indústrias.

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35

Ainda enfocando os níveis de desenvolvimento dos países sul-americanos

constata-se que a área científica e tecnológica, apesar dos últimos avanços, não foi

contemplada com recursos suficientes pela política de nenhum dos países do

continente, mantendo, ainda, a região em um patamar inferior em relação às áreas

mais desenvolvidas do planeta (Morais 2001, 8). Apesar da necessidade de

desenvolvimento dessa área ser um ponto forte para a implementação de ações

consensuais da UNASUL e seu consequente fortalecimento, a continuação da falta

de investimentos na área de ciência e tecnologia pode se tornar um ponto fraco para

o sucesso do Conselho de Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia daquela

organização.

O continente sul-americano ainda possui uma grande deficiência em sua

integração física, não existindo uma efetiva interconexão dos países da região.

Cientes desse obstáculo, que é um ponto fraco para qualquer instrumento de

integração, inclusive a UNASUL, os países têm intensificado seus esforços para

superá-lo. Algumas obras de infraestrutura já estão sendo realizadas, no escopo da

IIRSA, para minimizar essa situação de precariedade de transportes no interior do

continente, que faz com que os países lindeiros dos Oceanos Atlântico e Pacífico,

separados pela Cordilheira dos Andes e pela Floresta Amazônica, permaneçam de

“costas” uns para os outros.

Outro aspecto importante a mencionar é que existe uma falta da participação

das sociedades dos países da América do Sul no processo de integração o que

dificulta o apoio a políticas que visam o desenvolvimento econômico e social da

região como um todo. Até pouco tempo a grande maioria da população sul-

americana, por falta de informação, desconhecia os problemas que são comuns à

região e que, portanto, exigem soluções comuns, fortalecendo a integração regional.

Faz poucos anos que as instituições de ensino passaram a abordar o tema de uma

forma mais destacada e os veículos de imprensa ainda não atribuem a importância

necessária a essa matéria. Essa falta de participação da população sul-americana é

um ponto fraco para o sucesso da UNASUL, na medida em que ela é um processo

de integração baseado na existência de uma identidade comum com ênfase na

participação da sociedade.

Um problema que também vem sendo vivenciado por muitos países sul-

americanos é a quantidade de Organizações não governamentais (ONG) atuando no

continente, principalmente na área da floresta amazônica, criando dificuldades para

Page 36: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

36

o desenvolvimento da região. Sob o enfoque ambiental e da questão indígena as

ONG vêm travando diversos projetos de infraestrutura. Ao se tornarem um

empecilho para o desenvolvimento da infraestrutura do continente se caracterizam,

sem dúvida, como uma ameaça para o sucesso da UNASUL.

Outro problema da atual conjuntura sul-americana, que não pode deixar de

ser mencionado, são os crimes transnacionais em especial os associados ao

narcotráfico uma vez que a região possui os maiores produtores de maconha e

cocaína do mundo. Na medida em que o combate ao narcotráfico pode gerar

conflitos e instabilidades internas em países produtores, consumidores e que servem

de rota para o tráfico, caracteriza-se como um ponto fraco para o sucesso da

UNASUL.

Em que pese às limitações e os problemas supracitados, os países da região,

por possuírem programas sociais que proporcionam a expansão de seus mercados

de consumo e estarem enfrentando bem a crise mundial, tem se tornado um atrativo

para o investimento estrangeiro. Esse investimento é muito bem vindo e são

oportunidades concretas para se financiar os diversos projetos que devem ser

executados para fortalecer e facilitar a integração por intermédio da UNASUL.

Os avanços obtidos pela UNASUL, citados no capítulo anterior, e o fato dessa

organização buscar articular a relação de aproximação em diversas áreas, permite-

nos vislumbrar que as oportunidades e os pontos fortes existentes no atual cenário

sul-americano permitirão que a UNASUL seja um instrumento exitoso na tão

almejada integração, superando os pontos fracos e as ameaças existentes.

Page 37: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

37

5 AÇÕES ESTRATÉGICAS PARA O FORTALECIMENTO DA UNASUL

Considerando que a Constituição Brasileira, conforme está exposto no artigo

4º do texto constitucional, estabelece princípios como a cooperação entre os povos e

a integração econômica, política, social e cultural entre os Estados do continente,

qualquer mecanismo que vise incrementar ações nesse sentido deve ser apoiado e

fortalecido pelo Brasil.

Pela análise efetuada até o momento, percebe-se que a CAN e o

MERCOSUL têm grandes dificuldades de obter resultados positivos, de magnitude,

em termos de integração, pois esbarram em problemas oriundos de temas

econômicos e comerciais resultantes das assimetrias existentes entre os países

membros, das diversas crises econômicas e das medidas unilaterais defensivas, que

descumprem as obrigações acordadas.

Os recentes problemas pelos quais vem passando a União Europeia,

problemas esses também relacionados a crises econômicas, reforçam a

vulnerabilidade dos blocos regionais que baseiam sua integração prioritariamente

nos aspectos comerciais e econômicos.

Surgindo como um mecanismo que, incorporando um novo viés à integração,

permite acomodar experiências como CAN, MERCOSUL e OTCA, atuando em um

ambiente mais cooperativo e voltado para todas as áreas, não só as relacionadas à

economia e ao comércio, a UNASUL pode conseguir obter, mais facilmente, a tão

desejada integração regional e, portanto, deve ser fortalecida por ações estratégicas

brasileiras.

Essas ações estratégicas devem ser planejadas de forma a minimizar os

pontos fracos, superar as ameaças, amplificar os pontos fortes e aproveitar as

oportunidades existentes na atual conjuntura sul-americana.

A seguir serão sugeridas algumas ações estratégicas que poderão ser

adotadas pelo Brasil, buscando a efetivação da integração regional por intermédio

da UNASUL. As ações serão elencadas agrupadas pelas expressões do poder

nacional, quais sejam: política; econômica; psicossocial; militar; e científica e

tecnológica21.

21

As expressões do poder mencionadas são assim classificadas pela Escola Superior de Guerra conforme consta em seu Manual Básico, Vol. 1, Elementos Fundamentais, página 36.

Page 38: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

38

5.1 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER POLÍTICO.

- Posicionar-se de forma a se contrapor, politicamente e diplomaticamente, a

qualquer ação internacional que seja contrária aos interesses dos Estados Membros

da UNASUL.

- Apoiar os poderes constituídos dos Estados Membros da UNASUL de forma a

garantir a manutenção dos regimes democráticos, sugerindo a convocação do

Conselho de Chefes de Estado e de Governo sempre que ocorrerem ameaças à

ordem constitucional.

- Desempenhar um papel construtivo na melhoria das relações entre os

Estados Membros da UNASUL sugerindo a convocação do Conselho de Chefes de

Estado e de Governo sempre que situações de crise forem percebidas.

- Cumprir todas as regras fixadas nos diversos acordos firmados,

demonstrando a predisposição de ser um ator que se coloca no mesmo nível dos

demais independente da força política e econômica de cada um.

- Intensificar ações diplomáticas com todos os Estados Membros tratando-os

de forma igualitária, mantendo a mesma estrutura representativa em todos os

países.

- Aprimorar e intensificar o controle do Estado sobre as ONG, mantendo-as

cadastradas e vigiadas de forma a rapidamente cercear as ações que se

contraponham aos interesses do bloco regional.

- Propor o apoio do bloco para candidatos sul-americanos que estejam

disputando funções de relevância em organismos internacionais, a fim de aumentar

a atuação da UNASUL internacionalmente.

5.2 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER ECONÔMICO.

- Apoiar a criação de um mecanismo na UNASUL para solução de

controvérsias em matéria de investimentos, a fim de evitar que empresas

estrangeiras submetam questões litigiosas com o Estado a tribunais de arbitragem

fora da região.

- Continuar, por intermédio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico

e Social (BNDES), a investir na região, financiando obras de infraestrutura

elencadas pela IIRSA e incorporadas no âmbito da UNASUL.

Page 39: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

39

- Incentivar a convergência, dentro da UNASUL, entre a CAN e o MERCOSUL,

ampliando os acordos bilaterais, já existentes e criando medidas de compensação

para os Estados menores, a fim de reduzir as assimetrias.

- Exercer o papel financeiro de “paymaster”.

5.3 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER PSICOSSOCIAL.

- A fim de valorizar a integração regional divulgar na mídia escrita, falada e

virtual as ações exitosas da UNASUL.

- Realizar campanhas publicitárias que apresentem, para as populações menos

esclarecidas, os principais objetivos da UNASUL e os benefícios a eles associados,

a fim de obter o apoio popular para medidas que devem ser tomadas pelo governo

para alavancar a integração sul-americana.

- Criar uma rede de televisão pública para divulgar assuntos de interesse da

região e dos seus povos e realizar um intercâmbio cultural transmitindo os principais

programas televisivos dos países da região.

- Criar uma mentalidade sul-americana realizando simpósios, conferências e

incentivando a discussão do tema no meio acadêmico.

- Realizar ações sociais junto às populações fronteiriças, intensificando a

presença do Estado, a fim de melhorar as condições de vida e criar um clima

construtivo de forma a minimizar tensões e favorecer a integração.

- Incentivar o turismo na região, estimulando o conhecimento dos países sul-

americanos.

- Tornar obrigatório o ensino da língua espanhola nas escolas de ensino

fundamental.

- Propor a criação de uma data comemorativa da união dos povos sul-

americanos, que poderia coincidir com o dia da assinatura do tratado da UNASUL,

onde seriam realizados diversos eventos culturais e esportivos com a presença de

representantes de todos os países em um dos Estados Membros, em caráter de

rodízio.

- Realizar acordos com todos os países, dentro do escopo da UNASUL, em

termos de melhoria da segurança pública, alavancando principalmente os projetos

do Conselho sobre o Problema Mundial das Drogas.

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40

- Criar um curso de pós-graduação na área de integração regional onde seriam

estudados e elaborados trabalhos acadêmicos, sobre temas diversos, que envolvam

as relações entre os países da região.

5.4 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER MILITAR.

- Proporcionar incentivos fiscais para a criação de uma base de indústrias de

defesa nos países sul-americanos.

- Contribuir para a formulação de políticas e estratégias de segurança e defesa

conjuntas na região por intermédio do Centro de Estudos Estratégicos de Defesa.

- Incrementar os intercâmbios com as Forças Armadas dos países sul-

americanos por intermédio da realização de cursos e estágios, bem como pela

ampliação dos exercícios conjuntos.

- Desenvolver equipamentos e meios militares em conjunto com outros países

sul-americanos.

5.5 AÇÕES ESTRATÉGICAS DE CARÁTER CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO.

- Promover o desenvolvimento de linhas de pesquisa científica e tecnológica

comuns, a fim de aproveitar as capacidades existentes em cada Estado Membro da

UNASUL.

- Desenvolver projetos conjuntos na pesquisa da biodiversidade com os demais

países amazônicos.

- Incrementar os intercâmbios entre as escolas técnicas, os centros de

pesquisa e instituições tecnológicas.

- Ampliar os investimentos nas áreas de ciência e tecnologia.

- Estabelecer prêmios a serem ofertados anualmente, durante as reuniões de

cúpula da UNASUL, para pesquisadores dos Estados Membros que se destacaram

com seus trabalhos científicos e tecnológicos.

Page 41: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

41

6 CONCLUSÃO

Faz muito tempo que a integração dos países da América do Sul vem sendo

buscada, mas muitas pessoas questionam quais seriam os benefícios que tal união

traria para o Brasil, maior país da região em todos os aspectos. Entretanto, no

momento, o que está em questão não são os benefícios advindos da integração sul-

americana, mas sim o atingimento de uma meta fixada na Constituição Brasileira,

em seu artigo 4º, que estabelece princípios como a cooperação entre os povos e a

integração econômica, política, social e cultural entre os Estados do continente.

A Constituição deixa claro que a integração deve ser abrangente e não ser

realizada apenas com o foco na área comercial e econômica.

Na onda da globalização os blocos regionais começaram a surgir em todo o

mundo e a serem classificados tomando como base acordos econômicos firmados

entre os países membros. Na América do Sul não foi diferente, os tratados que

inicialmente surgiram privilegiavam os acordos comerciais. Além disso, esses

tratados foram realizados por grupos isolados de países vizinhos, pecando na

abrangência e no foco.

Os tratados de integração vigentes, tais como o MERCOSUL, a CAN e a

OTCA, não conseguiram abarcar como membros efetivos todos os países sul-

americanos e têm grandes dificuldades de obter resultados positivos, em termos de

integração, pois esbarram em problemas oriundos de temas econômicos e

comerciais, resultantes das assimetrias existentes entre os países membros, das

diversas crises econômicas e do descumprimento das obrigações acordadas,

visando à adoção de medidas unilaterais defensivas.

Nesse cenário, surge um instrumento de integração, denominado UNASUL,

que visa construir uma relação entre os países sul-americanos, com dimensão

múltipla, onde a aproximação ocorra não somente na área econômica e comercial,

mas, sim, nas mais diversas áreas, deixando claro que a união será construída em

cima de oportunidades. As cooperações, nas diversas áreas inicialmente

estabelecidas, estão avançando de acordo com o ritmo das negociações. Nem todas

as áreas de integração estão evoluindo de forma igual, mas isso não deve ser um

empecilho, pois a flexibilidade da UNASUL, sem meta e prazos auspiciosos, permite

que as vantagens e as beneficies, que são obtidas em uma das áreas, demonstrem

a validade de todo o processo e estimulem o avanço das negociações em outros

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42

aspectos. Na área de defesa, na área de saúde, na área de infraestrutura e na área

política alguns avanços significativos vão sendo percebidos e esses resultados, sem

dúvida, estão irradiando motivação para as demais áreas.

O vínculo entre as nações sul-americanas que a UNASUL está criando, aos

poucos, permitirá que avanços sejam alcançados em todas as áreas, inclusive no

sentido da integração econômica, facilitando a convergência entre a CAN e o

MERCOSUL. Sua abordagem mais flexível permitirá que os setores econômicos dos

diversos países se adequem no tempo necessário e a integração nessa área ocorra

de forma sustentada no longo prazo.

Na medida em que os avanços em integração forem sendo alcançados, nas

diversas áreas, a representatividade da UNASUL, no âmbito internacional, irá se

ampliando e o poder de negociação do bloco também, trazendo benefícios para

todos os Estados membros da organização. A percepção desses benefícios

redundará em um maior comprometimento dos Estados com todos os acordos

firmados dentro do escopo da UNASUL, gerando assim um ciclo virtuoso que

consolidará a integração sul-americana.

Considerando: as inovações incorporadas ao processo de integração, que leva

em conta a convergência dos interesses políticos, sociais, culturais, e de segurança,

além dos econômicos; que em um curto prazo de vigência do tratado, o organismo

mostrou-se eficiente como um instrumento para a solução pacífica de controvérsias,

possuidor de representatividade no âmbito internacional e implementou medidas

significativas em diversos dos seus Conselhos; a atual conjuntura sul-americana

com diversos pontos favoráveis ao incremento de uma união dos Estados; e as

ações estratégicas que o Brasil poderá implementar para fortalecer o enfoque de

integração mais amplo abordado pelo tratado; podemos afirmar que são grandes as

possibilidades da UNASUL conseguir ser um instrumento eficaz no processo de

integração da América do Sul.

Page 43: LOPES, Paulo César Colmenero. Integração sul-americana

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