logísticareversapósconsumo:aresponsabilidadeestendida ...engema.org.br/xviengema/41.pdf ·...
TRANSCRIPT
Logística Reversa Pós Consumo: A Responsabilidade Estendidado Produtor sobre os Pneus Inservíveis
PRISCILA DE AZEVEDO MACHADO MOTA.IFBA - Instituto Federal da [email protected] ANTONIO CLODOALDO ALMEIDA NETOInstituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA)[email protected] ALINE SANTOS BISPOINSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DA [email protected]
XVI ENGEMA 2014
1
Logística Reversa Pós Consumo: A Responsabilidade Estendida do
Produtor sobre os Pneus Inservíveis
Resumo: Este artigo busca expor como a logística reversa pode ser uma alternativa de gestão mais
plena e consequente aplicada por organizações com fins de agregar valor a sua cadeia produtiva. O
objetivo é evidenciar como a logística reversa pós consumo tem se tornado um fator essencial na gestão
de resíduos, sendo requerida, inclusive por força de leis que já colocam em evidência a responsabilidade socioambiental do produtor no ciclo de vida do produto. O estudo de caso aborda o ciclo de regresso de
pneus usados e o descarte adequado dos mesmos.
Palavras chave: logística reversa, responsabilidade sócio ambiental, gestão de resíduos, pneus.
Reverse Logistics Post Consumption: The Responsibility Extended
of Producer on Tires not recyclable
Abstract: This article seeks to expose how reverse logistics can be an alternative management fuller and
consequently applied by organizations with the purpose of adding value to their supply chain. The
objective is to show how post-consumer reverse logistics has become an essential factor in waste
management and being required including by force of laws that already evidence for environmental
responsibility of the producer of the product life cycle. The case study discusses the cycle return of used
tires and proper disposal of them.
Keywords: reverse logistics, socio environmental responsibility, waste management, tires.
XVI ENGEMA 2014
2
1. Introdução
O presente trabalho se propõe a fazer uma revisão bibliográfica quanto à logística reversa
focando pela responsabilidade socioambiental corporativa. Em consequência a séculos de descaso
com os aspectos ambientais essa surge como uma importante ferramenta de reutilização e/ou de
destinação correta de resíduos.
A fim de alcançar o objetivo pretendido, este artigo foi elaborado mediante pesquisa
exploratória (levantamento bibliográfico), com caráter interpretativo e natureza qualitativa, pelo
método indutivo com exposição de dados empíricos de casos de canais logísticos reversos que
agregam valor econômico às empresas, bem como atende as exigências legais que coíbe o
descarte indiscriminado de resíduos no meio ambiente.
Este estudo busca evidenciar a crescente necessidade das organizações pensarem a gestão
da logística reversa dentro das suas unidades de negócios. Hoje, enquanto a logística reversa é um
diferencial, convertendo-se em vantagem competitiva para algumas empresas, para outras já é
uma obrigação, dados os impactos dos produtos que comercializam e os impactos que o descarte
inadequado que tais produtos geram ao meio-ambiente - caso de óleos, baterias, e pneus. Este
último é o foco do presente estudo.
Desde o início da década de 1990, o CONAMA já chama a atenção para os efeitos do
descarte inadequado de pneus e para tanto lançou uma normativa que responsabiliza os
produtores e importadores sobre o descarte adequado desse produto. Mais de duas décadas
depois, com a expansão do mercado automobilístico na Brasil e o aumento das tensões que
envolvem os resíduos sólidos, cabe avaliar o contexto do qual emerge tal resolução, quais os
efeitos e os avanços obtidos a partir de então. Cabe, assim, neste artigo a evidência de novos
modelos de gestão mais amplos e consequentes com a natureza e a produção sustentável.
O estudo versa sobre como as empresas atuam com responsabilidade socioambiental,
através da logística tradicional e reversa e de forma a gerir seus resíduos com finalidade de
realizar o descarte adequado dos pneus inservíveis. Os tópicos abordados são referentes a
conceituação, à legislação e impactos ambientais, e como a logística reversa de pneus pode
contribuir para um maior entendimento da gestão da cadeia de logística reversa no Brasil.
2. Revisão Bibliográfica
2.1 Logística tradicional
A logística tradicional nada mais é do que um estudo que objetiva criar fluxos de
distribuição eficiente e economicamente eficazes – através de planejamento, organização e
controle efetivo – de serviços e/ou produtos aos clientes e consumidores. Ela reúne informações
relevantes sobre demandas que refletem no planejamento estratégico das organizações em relação
à cadeia de suprimentos. (BALLOU, 2001).
Neste processo, o fluxo de materiais é unidirecional, ou seja, eles são deslocados no
sentido da origem dos insumos (fábrica, minas, solo, etc.) até a entrega dos produtos finais aos
consumidores. Na forma tradicional, como já é sabido, há o envolvimento de conjuntos de
atividades administrativas e operacionais viabilizando o transporte dos insumos para os locais de
XVI ENGEMA 2014
3
transformação (fábricas), em seguida para os consumidores, e na maioria dos casos, com
travessia pelos mais diversos canais de distribuição. (BARBIERI; DIAS, 2002)
Sua origem está relacionada com as operações militares. Conforme a estratégia era
montada, os generais precisavam definir os procedimentos a serem executados por sua tropa na
hora certa, tais como: mantimentos, munição, equipamentos, socorro médico, dentre outros no
campo de batalha. E assim, os grupos logísticos articulavam as ações na retaguarda como forma
de apoio. Nas empresas, por muito tempo, a logística foi considerada como atividades de apoio,
como por exemplo, pela necessidade de transportar as matérias primas para os locais de
transformação (indústria) e posteriormente para os depósitos das lojas. Assim, os gestores
acreditavam que tais ações não agregavam valor ao produto. (NOVAES, 2007).
Na atualidade, contudo, a escolha por uma boa estratégia de logística pode proporcionar
vantagens competitivas à organização, através da: redução de custos, redução de capital e
melhoria dos serviços. De forma sucinta, a primeira busca pela diminuição dos custos variáveis
relacionados ao transporte e armazenagem; o segundo, pela redução dos níveis de investimento
com ações logísticas; e o terceiro, pela otimização dos serviços e assim aperfeiçoamento dos
processos – consequentemente trazendo satisfação aos clientes. (BALLOU, 2001)
No cenário de elevada competitividade do mercado, a logística é uma ferramenta
estratégica para sobrevivência empresarial. Uma distribuição eficaz dos produtos solicitados
pelos consumidores produz um diferencial à clientela. Este processo é essencial considerando que
através dele serão transferidos os produtos aos clientes finais. (CASTANHARO; FIGUEIREDO;
D’ANDRÉA; RIBEIRO).
2.2 Logística reversa
A logística reversa, processo contrário ao tradicional, é quando os bens de pós-venda e/ou
de pós-consumo regressam para algum ponto desta cadeia, para incorporar-lhes valores de
natureza tais como: econômico, ecológico, legal, de imagem coorporativa, dentre outros (LEITE,
2003).
Leite (2002) já citava que tal área estava com elevada recorrência tanto em livros
modernos sobre logística, artigos internacionais e nacionais, palestras e seminários, bem como o
interesse de universidades pela incorporação de uma disciplina especializada na grade acadêmica.
Tal postura evidencia que as empresas passaram a ter, a partir de então, outro ponto de vista desse
campo.
Como definido por Stock (1998, p. 20) apud Leite (2003) “Logística reversa: em uma
perspectiva de logística de negócios, o termo refere-se ao papel da logística no retorno de
produtos, redução na fonte, reciclagem, substituição de materiais, reuso de materiais, disposição
de resíduos, reforma, reparação e remanufatura…”.
Segundo Kotler e Keller (2012), os canais normalmente descrevem o movimento dos bens
a partir da sua origem até chegar ao consumidor final, mas os canais reversos também são
importantes (1) na reutilização de produtos ou contêineres (como tambores para produtos
químicos), (2) no recondicionamento de produtos (como circuitos impressos ou computadores)
para revenda, (3) na reciclagem de produtos (como papel), e (4) no correto descarte de produtos e
embalagens (como pneus, pilhas e materiais hospitalares).
Mundialmente, a Alemanha é o país pioneiro em relação às legislações que dizem respeito
a descarte de produtos consumidos. Na atualidade, em virtude de leis mais rígidas e maior
XVI ENGEMA 2014
4
consciência mundial correlacionado a possíveis danos ao meio ambiente, todos se preocupam
quanto a um correto descarte de produtos. Assim, os principais motivos que estimulam o
processo reverso são: (1) legislações ambientais mais rigorosas - exigência pelo correto descarte;
(2) benefícios econômicos - reinserir produtos a cadeia, ao invés do gasto elevado em descarte
ideal no lixo; e (3) elevada conscientização ambiental da humanidade. (CASTANHARO;
FIGUEIREDO; D’ANDRÉA; RIBEIRO).
No contexto brasileiro contemporâneo, em 02 de agosto de 2010 o governo federal
sancionou a lei 12.305 que discorre em suma sobre a destinação dos resíduos sólidos gerados no
país. Conforme o capítulo II, art. 3º, inciso XII dessa mesma lei, a logística reversa é definida
como instrumento de desenvolvimento econômico e social que apresenta características de um
conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a proporcionar a coleta e a devolução dos
resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros, ao até
outra destinação final ambientalmente apropriado. (BRASIL, 2010).
2.3 Responsabilidade socioambiental
Os efeitos relacionados a elementos ou problemas à sociedade e ao meio ambiente são
descritos como “socioambientais”. Neste sentido, no cenário global, as empresas que buscam
atuar a fim de minimizar os impactos nesses campos são intituladas como de “responsabilidade
socioambiental”. Tal caracterização, contudo, não se refere somente ao cumprimento de normas
e/ou leis nos segmentos que tangem ao meio ambiente - é muito mais! Caso contrário, será
apenas execução “forçada” por legislação.
No Brasil este movimento foi impulsionado por ações de entidades não governamentais,
institutos de pesquisa e empresas já atuantes neste campo, na década de 90. Atualmente as
preocupações socioambientais são significativas nas pautas organizacionais, governamentais,
acadêmicas e na sociedade civil. (MARTINS, 2011).
Diante da preocupação mundial quanto a impactos ambientais, por exemplo, a certificação
ISO 14001 é um item que comprova o padrão de qualidade da gestão ambiental das organizações.
Essa é um conjunto de normas internacional com parâmetros e diretrizes no sistema de gestão
ambiental, onde estabelece requisitos a fim de que os procedimentos corporativos exerçam
mínimo grau de agressão ao meio ambiente e à sociedade, bem como beneficie esta última num
aspecto amplo (ABNT, 2006).
Os benefícios pela certificação na ISO 14001 são: (1) Demonstrar, para reguladores e
governo, um comprometimento em obter conformidade legal e regulatória; (2) Demonstrar seu
comprometimento ambiental para com os stakeholders; (3) Demonstrar uma abordagem
inovadora e voltada para o futuro para clientes e futuros colaboradores; (4) Aumentar seu acesso
a novos clientes e parceiros de negócios; (5) Gerenciar melhor seus riscos ambientais, agora e no
futuro; (6) Reduzir potencialmente seus custos de seguros por responsabilidade pública; (7)
Melhorar a sua reputação. (BSI, 2014).
Além da ISO, algumas outras abordagens mais modernas da gestão incluem a
“responsabilidade socioambiental” como uma das variáveis significativas consideradas na sua
práxis metodológica, a exemplo do Modelo de Excelência em Gestão - MEG da Fundação
Nacional da Qualidade – FNQ, bem como o Modelo de Excelência em Gestão Pública - MEGP
do Programa Nacional de Gestão Pública e Desburocratização – GESPÚBLICA. Ademais, alguns
autores vêm enfatizando fortemente essa dimensão para uma gestão organizacional de fato
XVI ENGEMA 2014
5
moderna, consequente e urgentemente imprescindível, diante da evolução da produção e do
consumo de bens e serviços numa escala mundial crescente, exponencialmente.
Almeida Neto (2013) localiza a produção/consumo-organização-gestão em um contexto
universal e intrinsecamente entrópico, enfatizando a necessidade do enfoque na qualificação
dessa “Transformação” dos insumos em bens, que caracteriza de fato o que se entende como
“Produção”. Para o autor, do ponto de vista organizacional, de uma estrutura de trabalho
produtivo e numa abordagem na gestão da produção, é fundamental considerar a qualidade da
transformação. Esta deve ser uma variável significativa no contexto produtivo e pode ser
entendida como o “Rendimento” (não no sentido econômico, mas, sim, no sentido físico do
termo) de qualquer máquina de transformação de energia. O “Rendimento” da transformação é
diretamente proporcional à qualidade da produção e, portanto, inversamente proporcional à
entropia (Almeida Neto, 2013, p.151).
Nesta mesma direção, Almeida Neto (2013, p. 151) continua enfatizando que nem toda
energia que entra no sistema produtivo é transformada em energia útil, que gera trabalho, em
função do fato de que, por existir num dado ambiente entrópico, simbolicamente é necessário
pagar um “pedágio”. Ademais, não se pode ignorar que todo processo de transformação deixa
também no meio ambiente “Resíduos”, de múltiplas ordens, que não podem ser ignorados. A
geração de resíduo é um fenômeno físico geralmente prejudicial a uma ou outra forma de vida, e
direta ou indiretamente à vida humana. Um processo produtivo energeticamente perdulário (mais
“entrópico”) terá menos rendimento na transformação, gerando em decorrência mais resíduos.
Neste sentido, justifica-se, um cuidado na evidência e tratamento desta questão nos campos
econômico e administrativo (Almeida Neto, 2013, p.151).
Tais considerações são basilares na criação do “Modelo de Gestão dos 8R´s”, em que a
gestão dos “Resíduos” e a “Responsabilidade Social”, incluindo seus aspectos ambiental,
cultural e econômico, devam ser sistemática e estruturalmente gerenciados pelas organizações
produtivas, na direção de um futuro sustentável. (Almeida Neto, 2013, p.409)
Associada à variável Rendimento está o grau de eficiência da transformação (por estamos
em um mundo entrópico, mais apropriado seria o grau de ineficiência). Assim, vincula-se
também à produção (transformação), a geração de Resíduos, perdas, elementos poluentes
que prejudicam o meio ambiente e comprometem a sustentabilidade das novas gerações.
Esses resíduos, perdas e poluentes, de alguma forma, acabam sendo uma espécie de
subprodutos indesejáveis de todo o processo produtivo, que exigem sua gestão. Daí o
entendimento de que todo o processo de gestão envolve a Responsabilidade. Todo
processo produtivo está inserido em um contexto natural, cultural, político, econômico,
social e tecnológico, e é necessária a introdução da Responsabilidade Social,
incorporando todas as dimensões citadas, em qualquer processo produtivo, devendo ser
objeto da gestão cuidar, exercer esta responsabilidade social múltipla (Almeida Neto, 2013, p.413 e 414).
Nesta mesma linha epistemológica, evidencia-se a logística reversa como um importante
vetor agregador de valor a esse raciocínio político e metodológico, ao somar inovações
pragmáticas e soluções tecnológicas que mitiguem os impactos produtivos numa dada localidade,
região, país e planeta. Faz-se, assim, imprescindível a importância desse tema na sociedade atual
e na gestão das organizações e do meio ambiente.
XVI ENGEMA 2014
6
3. Metodologia
A metodologia utilizada para elaboração do artigo valeu-se de uma pesquisa exploratória
(levantamento bibliográfico), com caráter interpretativo e natureza qualitativa, pelo método
indutivo com exposição de dados empíricos de casos de canais reversos que agregam valor
econômico às empresas, bem como atende as exigências legais que coíbe o descarte
indiscriminado de resíduos no meio ambiente.
Gil (2002) apud Selltiz et all (1967, p.63) enuncia que a pesquisa exploratória tem o
objetivo de revelar o problema a fim de torná-lo mais explicito ou constituir hipóteses. Nessa há
levantamento bibliográfico; entrevistas sobre o problema pesquisado; e análise de exemplos que
“estimulem a compreensão”.
4. Apresentação e Análise de Resultados
4.1 História dos pneus
Os pneus são considerados componentes imprescindíveis para o funcionamento dos
veículos, com fatos curiosos quanto às suas historias de desenvolvimento, conjuntamente à sua
matéria-prima principal: a borracha (de maior quantidade em sua composição).
Historicamente, Charles Goodyear em 1894 descobriu, depois de muitas tentativas
frustradas, como fazer para que a borracha ganhasse forma regular e estável. Ao adicionar
enxofre na goma cozida e submeter a elevadas temperaturas originou a borracha vulcanizada.
Essa ao revestir as rodas de madeira e ferro aumentou a segurança nas freadas e diminuiu as
vibrações dos carros. (SOUZA, 2009 apud CONCEIÇÃO, 1990, p.17).
Assim, com o crescimento da indústria automobilística, a produção de pneus multiplicou-
se, proporcionalmente. No Brasil o desenvolvimento das fábricas de pneumáticos ocorreu em
1934 com a implantação do Plano Geral de Viação Nacional, mais especificamente em 1936 com
a instalação da Companhia Brasileira de Artefatos de Borracha – conhecida popularmente por
Pneus Brasil. Por esses terem se tornado um elemento fundamental no dia a dia da população –
por favorecer na mobilidade, agilidade e rapidez nos veículos modernos – em meados de 1990 já
tinham sido produzidos mais de 29 milhões de pneus. Assim, hoje a indústria nacional está em
sétimo lugar na produção de pneus para automóveis e o quinto em pneus para caminhões/ônibus e
camionetas. (SINPEC, 2011).
4.2 Pneus e impacto ambiental
Quando os pneus passam a ser inservíveis e descartados de forma inadequada podem
gerar impactos ambientais, bem como provocar risco a saúde humana, em razão de ser um meio
propício para acúmulo de água e assim vetor de doenças como a dengue e febre amarela.
(SOUZA, 2009 apud REVISTA MINAS FAZ CIÊNCIA, 2002). Dentre muitas consequências
negativas pelo descarte inadequado desses, em razão de seu formato, por exemplo, serve como
local de hospedagem para roedores e, em caso de acúmulo de água, por mosquitos que
XVI ENGEMA 2014
7
transmitem doenças emergentes1; outro efeito é referente à diminuição de calha de córregos,
lagos ou rios nos locais onde os pneus são jogados, podendo contribuir para ocasionar enchentes,
inundações, etc. Além disso, os pneus não sofrem decomposição natural, e ao serem queimados
liberam gases poluentes. (SOUZA, 2009 apud TEIXEIRA, 2007 apud LEONOL, 2007).
Assim, de acordo com Scagliuse (2014), durante a queima incontrolada de pneus, existem
dois subprodutos que geram os maiores riscos de contaminação ao meio ambiente: o óleo
pirolítico e as cinzas. Tudo isso devido à diminuição da quantidade de oxigênio no ar e ao calor
intenso que gera.
Calcula-se que no mundo, por ano, o descarte de pneus velhos chegue a atingir 800
milhões de unidades. Nos países da Comunidade Européia são descartados 180 milhões de pneus,
e outros 150 milhões somente nos Estados Unidos da América. Estima-se que três milhões de
pneus estejam acumulados em áreas desérticas, uma ameaça sempre iminente de incêndios
devastadores. (SCAGLIUSI, 2014)
De acordo com Furtado e Guimarães (2011), o processo de recuperação e regeneração dos
pneus exige a separação da borracha vulcanizada de outros componentes, por exemplo, metais e
tecidos. Os pneus são cortados em lascas e purificados por um sistema de peneiras. As lascas são
moídas e depois submetidas à digestão em vapor d'água e produtos químicos, como álcalis e
óleos minerais, para desvulcanizá-los. Ou seja, é o processo inverso da vulcanização, realizado
pela indústria. O produto obtido pode ser então refinado em moinhos até a obtenção de uma
manta uniforme para a obtenção de grânulos de borracha. (FURTADO; GUIMARÃES, 2011)
4.3 A Logística Reversa Pós-Consumo: Pneus
A Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos - ANIP foi criada na década de 1960,
buscando defender os interesses e objetivos comuns dos fabricantes de pneus. A consciência pelo
descarte adequado dos pneus, entretanto, não seguiu o mesmo caminho da produção - as fábricas
não se preocupavam adequadamente com os produtos pós-consumo.
Somente em 26 de agosto de 1990, após Resolução nº 258 do CONAMA (Conselho
Nacional Do Meio Ambiente) - onde determina que as empresas fabricantes e as importadoras de
pneumáticos ficam obrigadas a coletar e dar destinação final ambientalmente adequada aos pneus
inservíveis - e a Resolução nº 416, de 30 de setembro de 2009 – que dispõe sobre a prevenção à
degradação ambiental causada por pneus inservíveis e sua destinação ambientalmente adequada -
que tal consciência surgiu. (Brasil, 1999/2009).
Segundo Furtado e Guimarães (2011), em meio às normas trazidas pela Resolução nº
416/09, é visível a crescente preocupação trazida pela questão da destinação final dos pneus no
país. Em meio a essa problemática, a responsabilidade civil pós-consumo tem o importante papel
de fazer subsistir a responsabilidade dos importadores e fabricantes de pneus novos (FURTADO;
GUIMARÃES, 2011). Esta lógica deriva de um conceito ainda mais amplo já bastante difundido
na União Européia, cuja legislação está em vigor desde o início da década de 1990, o conceito de
Responsabilidade Estendida do Produtor (REP). Conforme afirmam Silva e Mota (2013), a REP é
1 Segundo o Guia de Bolso do Ministério da Saúde, disponível no link
<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/doencas_infecciosas_guia_bolso_7ed_2008.pdf>, doenças emergentes são as que surgiram, ou foram identificadas, em período recente, ou aquelas que assumiram novas condições de transmissão, seja
devido modificações das características do agente infeccioso, seja passando de doença raras e restritas para constituírem problema de saúde pública.
XVI ENGEMA 2014
8
uma estratégia destinada a promover a integração dos custos ambientais associados com produtos
ao longo do seu ciclo de vida para o preço de mercado dos produtos, sendo que o termo
“produtor” é genérico e designa tanto fabricantes quanto importadores e distribuidores (SILVA;
MOTA, 2013).
Assim, em 2007 foi criada pelos fabricantes de pneus Bridgestone, Goodyear, Michelin e
Pirelli a entidade Reciclanip - e em 2010 a Continental juntou-se ao time. Esta é considerada uma
das maiores iniciativas da indústria nacional quanto à responsabilidade pós-consumo. A atividade
desenvolvida por essa organização é pela coleta e destinação de pneus inservíveis em programas
de reciclagem, demonstrando, assim, a responsabilidade das indústrias de pneumáticos com
questões ambientais. (RECICLANIP, 2014).
Na figura 1, disponível no site da Reciclanip, há um fluxograma do trabalho
desenvolvido, que de forma sucinta descreve o ciclo dos pneus, sua fabricação, comercialização,
e destinação adequada. Este processo se alinha a sua missão que é: Administrar o processo de coleta e destinação de pneus inservíveis em todas as regiões,
visando: Garantir a captação de pneus, por meio da participação de todos os elos da
cadeia de produção; Assegurar sua autonomia operacional e financeira, reformulando o
perfil da entidade de ser o centro de custos para “profit-center”; e tornar-se referência em
conhecimento e informação. (RECICLANIP, 2014)
Figura 1 – Ciclo dos pneus pela RECICLANIP
Fonte: RECICLANIP, 2014
Segundo Scagliuse (2014), com base em dados da Associação Nacional da Indústria de
Pneumáticos (ANIP), desde a publicação da resolução do CONAMA, entre 1999 e 2007, 700 mil
toneladas de pneus foram reaproveitados de várias formas (componente energético, matéria-
prima para outros produtos etc.). (SCAGLIUSI, 2014)
Para proceder com a execução do programa, a ANIP, em parceria com 4.000 reven-
dedores de pneus do país, estabeleceu os critérios para a coleta dos pneus inservíveis e formou,
XVI ENGEMA 2014
9
com estas revendedoras, uma rede para captação dos pneus dos clientes; investiu na elaboração
de um programa para conscientização do consumidor para que entregassem os pneus inservíveis
nas revendedoras; definiu as tecnologias que seriam utilizadas para destinação final e implantou,
em comum acordo com as empresas parceiras que fariam a destinação final do produto, três
centros de armazenamento e trituração de pneumáticos, dois no interior do estado de São Paulo –
Jundiaí e Sorocaba, e um no Nordeste – João Pessoa. A figura 2 demonstra a cadeia de reposição
dos pneus. (MOTTA, 2008).
Figura 2: Cadeia de reposição dos pneus
Fonte: MOTTA, 2008.
A maior dificuldade, porém, é a realização da coleta e do transporte pois, em muitos
casos, esses pneus estão localizados em regiões de difícil acesso, o que torna o processo inviável
do ponto de vista econômico pelo custo logístico (LAGARINHOS, 2013). O que também faz
parte da problemática existente é o fato dos pneus ocuparem muito espaço e serem de difícil
compactação.
Além disso, segundo De Oliveira e De Castro (2012), apesar dos vários estudos realizados
sobre sua reciclagem, as questões que envolvem a destinação dos pneus usados e os prejuízos que
a sua má destinação pode causar à natureza e as pessoas, ainda não são amplamente divulgadas à
população. Desse modo, a minimização do descarte de pneus inservíveis requer uma significativa
mudança de comportamento, tanto em nível de processo industrial como também do consumidor,
associada a um plano de gerenciamento ambientalmente adequado (DE OLIVEIRA & DE
CASTRO, 2012).
Em seu artigo Motta (2008) explica que os pneus inservíveis podem seguir três caminhos:
os pneus convencionais são (1) destinados para as empresas que realizam a laminação e
transformação da borracha em artefatos diversos, como solados, cintas de sofá, tapetes para
carros etc.; (2) os pneus radiais, na maior parte das vezes, são triturados e depois encaminhados
para empresas produtoras de cimento, para queima nos fornos de clinquer, ou para o Processo
Petrosix® (unidade produtiva de Petróleo Brasileiro S.A (PETROBRAS); (3) ou os pneus podem
XVI ENGEMA 2014
10
ser encaminhados para empresas regeneradoras de borracha, que os transforma em pó de
borracha, embora sejam poucas as empresas que realizam este processo a partir dos pneus, pois a
maior parte delas se abastece dos resíduos gerados pelo processo de raspagem dos pneus usados,
realizados pelas empresas reformadoras (MOTTA, 2008).
A figura 3 descreve a cadeia de destilação dos pneus:
Figura 3: Cadeia de destinação de pneus
Fonte: IPT, 2000.
Há uma expectativa de que no futuro, com a adoção generalizada das práticas de produção
e consumo sustentáveis apoiadas por legislações que as incentivem, a logística reversa possa ser
algo comum nas empresas, tal como é hoje a logística tradicional. Deste modo, os resíduos
gerados após o consumo deverão se reduzir substancialmente, o que é social e ambientalmente
desejável. (BARBIERI; DIAS, 2002)
XVI ENGEMA 2014
11
5. Considerações finais
Através deste estudo foi possível uma revisão sobre a evolução da logística e como esta
ganhou, ao longo do tempo, maior importância dentro do contexto organizacional, deixando de
ser vista como mera atividade de apoio para as atividades bélicas e depois como apoio às
atividades produtivas operacionais, para ser atividade primordial na gestão estratégica das
organizações atuais, sendo mais um ponto chave para alcançar uma maximização do capital,
redução de custos ou melhoria dos serviços e assim, tornar a empresa mais competitiva.
Dada a importância que a gestão logística alcançou nos últimos anos e os novos desafios
que surgiram no último século, a atividade passou a apresentar desdobramentos que vão além da
natureza tradicional da atividade, que possui como objetivo básico promover o deslocamento da
matéria-prima ao consumidor. Nesta perspectiva o fluxo da logística estava sempre voltado para
o sentido do consumidor. Porém, nos últimos anos o que se assistiu foi a necessidade de praticar
este fluxo invertido, surgindo assim a logística reversa o que possibilitou, consequentemente,
uma atuação mais enfática e consistente quanto à responsabilidade socioambiental das
organizações produtivas.
A logística reversa é praticada basicamente em duas situações: a de pós venda, quando há
a necessidade de retorno do produto em função da necessidade de reparos ou da insatisfação do
cliente com a transação realizada, ou a de pós-consumo, objeto deste estudo, que opera em
função da necessidade de promover um retorno dos produtos à cadeia de produção através de
reciclagem ou reutilização dos insumos, o que promove uma correta destinação dos resíduos e
pode se converter ainda em redução de custos para as organizações com a reincorporação de
matéria-prima a sua cadeia produtiva.
Este estudo tomou como base a indústria de pneus, por reconhecer que neste setor a
questão da logística reversa tem exemplos de um nível mais avançado de aplicabilidade neste
mercado. Apesar dos resultados ainda não serem os esperados, a normatização da logística
reversa aplicada à indústria de pneus suscita muitas reflexões e esforços no sentido de promover
uma gestão logística adequada para que sejam cumpridos minimamente os requisitos impostos
pela legislação, que tende a ser cada dia mais exigente, face às novas conquistas alcançadas no
âmbito da gestão de resíduos e dos impactos ambientas por estes causados, como é o caso da
nova lei de Resíduos Sólidos, recentemente aprovada no Brasil.
O presente trabalho, além de evidenciar o ciclo reverso dos pneus inservíveis, quanto as
suas utilizações e os ciclos que estes percorrem, colocou em questão ainda os desafios a serem
superados no que diz respeito à gestão da logística reversa nos seus diferentes níveis, estratégico,
tático e operacional, sobretudo quando este processo ultrapassa os limites da organização e
precisa ser pensado a partir do envolvimento de toda a sociedade para que os objetivos propostos
sejam alcançados. Neste sentido, novos modelos de gestão que incluam critérios como a Gestão
dos Resíduos e a Gestão da Responsabilidade Social, implicitamente embutindo aspectos
ambientais, culturais e econômicos correlatos, são imprescindíveis e fundamentais para uma
produção sustentável que favoreça a vida das gerações vindouras num futuro mais pleno e viável.
XVI ENGEMA 2014
12
Referências
ABNT. Sistema de Gestão Ambiental ABNT NBR ISO 14001. Disponível em <
http://www.abnt.org.br/m3.asp?cod_pagina=1006>. Acesso em 06/07/2014.
ALMEIDA NETO, A. C. Modelagens sobre gestão organizacional em uma perspectiva
multidisciplinar e sistêmica: proposições para a Rede Federal de Educação Profissional,
Científica e Tecnológica – RFEPCT. Tese (Doutorado Multi-institucional e Multidisciplinar em
Difusão do Conhecimento) – Programa de Pós-Graduação, Universidade Federal da Bahia,
Salvador, 2013.
BALLOU, Ronald H., Gerenciamento da cadeia de suprimento: planejamento, organização e
logística empresarial. 4. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
BARBIERI, Jose Carlos; DIAS, M. Logística Reversa como Instrumento de Programas de
Produção e Consumo Sustentáveis. Tecnologística, São Paulo/SP, v. 7, n.77, p. 58-69, 2002.
Disponível em <
http://engema.org.br/upload/pdf/edicoesanteriores/VI/Logi%CC%81stica%20reversa%20como%
20instrumento%20de%20Programas%20de%20Produc%CC%A7a%CC%83o%20e%20Consum
o%20Sustenta%CC%81veis.pdf>. Acesso em 08/01/2013.
BRASIL. Lei nº 12.305, de 02 de agosto de 2010. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm>. Acesso
10/12/2013.
BRASIL. Resolução nº 258, de 26 de agosto de 1999. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=258>. Acesso 12/01/2014.
BRASIL. Resolução nº 416, de 30 de setembro de 2009. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?codlegi=616>. Acesso 12/01/2014
BSI. ISO 14001 Meio Ambiente. Disponível em: <
http://www.bsibrasil.com.br/certificacao/sistemas_gestao/normas/iso14001/>. Acesso em
06/07/2014.
CASTANHARO, Ana Maria; FIGUEIREDO Higor H.; D’ANDRÉA, Tássia de Q. G.;
RIBEIRO, Máris de C. A importância da logística reversa nas empresas.
DE OLIVEIRA, Otávio José; DE CASTRO, Rosani. Estudo da destinação e da reciclagem de
pneus inservíveis no Brasil. 2007.
KOTLER, P; KELLER, K.L. Administração de Marketing. 14ª Ed. São Paulo. Pearson
Pretince Hall. 2012.
XVI ENGEMA 2014
13
FURTADO, C ora F. do Carmo; GUIMARÃES, M. F. Processos de reciclagem de pneus no
segmento de transportes de cargas. Ano 2011. Disponível em: <
http://www.convibra.com.br/upload/paper/adm/adm_2745.pdf>. Acesso em 25/02/2014.
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4 ed, São Paulo: Atlas, 2002.
LAGARINHOS, Carlos AF; TENÓRIO, Jorge AS. Logística Reversa dos Pneus Usados no
Brasil. Polímeros, v. 23, n. 1, p. 49-58, 2013.
LEITE, Paulo. R. Logística Reversa: nova area da logística empresarial. Publicada na Revista
Tecnologística. São Paulo: Edit. Publicare, 2002. Disponível em: <
http://meusite.mackenzie.br/leitepr/LOG%CDSTICA%20REVERSA%20-
%20NOVA%20%C1REA%20DA%20LOG%CDSTICA%20EMPRESARIAL.pdf>. Acesso em
23/12/2013
LEITE, Paulo Roberto. Logística Reversa: meio ambiente e competitividade. São Paulo:
Prentice Hall, 2003.
MARTINS, Mônica de Araújo. Responsabilidade Socioambiental nas Organizações: Um
Enfoque sobre a Educação como Agente de Transformação. VII Congresso Nacional de
Excelência em Gestão. ISSN 1984-9354, 2011. Disponível em:
<http://www.excelenciaemgestao.org/portals/2/documents/cneg7/anais/t11_0352_2171.pdf>.
Acesso em 06/07/2014
MOTTA, Flávia Gutierrez. A cadeia de destinação dos pneus inservíveis: O papel da
regulação e do desenvolvimento tecnológico. Ambiente & Sociedade, v. 11, n. 1, 2008.
RECICLANIP. Disponível em: <http://www.reciclanip.org.br/v3/>. Acesso em 19/01/2014.
SCAGLIUSI, Sandra R. Reciclagem de Pneus Inservíveis Alternativa Sustentável à
Preservação do Meio Ambiente. 2014. Disponível em
http://faculdadefundetec.com.br/img/revista_academica/pdf/artigo_sandra_scagliuse.pdf. Acesso
em 28/01/2014.
SINPEC, Sindicato Nacional da Indústria de Pneumáticos, Câmaras de Ar e Camelback. História
do pneu. Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/sinpec/sobre-o-sinpec/historia-do-pneu/>.
Acesso em 27/01/2013.
SILVA, M.B.O; MOTA, L.R. e- lixo: A responsabilidade pós-consumo do produtor pela
logística reversa dos resíduos eletroeletrônicos no Brasil. Anais do 2º Congresso Internacional
de Direito e Contemporaneidade: mídias e direitos da sociedade em rede. 2013. Disponível em:<
http://www.ufsm.br/congressodireito/anais>. Acesso em 28/01/2014.
XVI ENGEMA 2014
14
SOUZA, Renata Tatiana. Análise da logística reversa de pneus usados e inservíveis e seus
impactos ambientais quanto descartados inadequadamente. Estudo de caso: de uma
empresa de transportes. Centro Tecnológico da Zona Leste, São Paulo, 2009. Disponível em: <
http://fateczl.edu.br/TCC/2009-1/tcc-233.pdf>. Acesso em: 23/12/2013.