logica a arte de pensar caderno do estudante

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A Arte de Pensar 11.° ano C C a a d d e e r r n n o o d d o o E E s s t t u u d d a a n n t t e e E E x x e e r r c c í í c c i i o o s s d d e e l l ó ó g g i i c c a a Aires Almeida Célia Teixeira Desidério Murcho Paula Mateus Pedro Galvão Centro para o Ensino da Filosofia Sociedade Portuguesa de Filosofia Didáctica Editora

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Page 1: Logica a arte de pensar caderno do estudante

A Arte de Pensar 11.° ano

CCaaddeerrnnoo ddoo EEssttuuddaannttee EExxeerrccíícciiooss ddee llóóggiiccaa

Aires Almeida ⋅ Célia Teixeira Desidério Murcho ⋅ Paula Mateus ⋅ Pedro Galvão

Centro para o Ensino da Filosofia

Sociedade Portuguesa de Filosofia

Didáctica Editora

Page 2: Logica a arte de pensar caderno do estudante
Page 3: Logica a arte de pensar caderno do estudante

Índice A Arte de Pensar 3

Todos os direitos reservados. Didáctica Editora, 2004.

ÍÍnnddiiccee

Prefácio............................................................................................................................. 4

Introdução Questões de revisão........................................................................................ 5

Capítulo 1 Lógica aristotélica........................................................................................... 6 1. Teoria do silogismo ...............................................................................................................6 2. Quadrado de oposição..........................................................................................................13

Capítulo 2 Lógica proposicional .................................................................................... 15 1. Cinco conectivas ..................................................................................................................15 2. Inspectores de circunstâncias...............................................................................................17 3. Argumentos com três variáveis............................................................................................20 4. O âmbito das conectivas ......................................................................................................22 5. Teste rápido de validade ......................................................................................................29 6. Variáveis de fórmula............................................................................................................31 7. Formalização........................................................................................................................32 8. Derivações ...........................................................................................................................36

Capítulo 3 Falácias informais ......................................................................................... 39

Nota final Os problemas................................................................................................. 43 1. Como responder aos Problemas...........................................................................................44 2. Múltiplas respostas correctas ...............................................................................................45 3. Actividades ..........................................................................................................................46

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4 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

Todos os direitos reservados. Didáctica Editora, 2004.

PPrreeffáácciioo

Aprender lógica é como aprender a tocar viola ou aprender a andar de skate: exige prática. É para poderes praticar, fazendo inúmeros exercícios de lógica, que escrevemos este Caderno do Estudante. Neste caderno há três tipos de materiais. Em primeiro lugar, exercícios resolvidos do manual A Arte de Pensar — 11.o ano. O objectivo é exemplificar como se resolvem esses exercícios, para que cada um saiba resolvê-los por si. Em segundo lugar, exercícios complementares. Estes exercícios complemen-tam os que constam do manual. Em terceiro lugar, algumas explicações complementares, que esclarecem certos aspectos que podem levantar dúvi-das ao resolver alguns exercícios. Para tirar o máximo proveito deste Caderno e do manual é necessário usar papel, lápis e borracha. É necessário praticar e resolver vários exercícios, todas as semanas, à medida que se vai avançando no estudo da lógica. É muito importante praticar todas as semanas; se deixarmos tudo para a véspe-ra do teste, o resultado será muitíssimo mau. Mais uma vez: é como aprender a tocar viola ou aprender a andar de skate. É uma questão de adquirir certas rotinas; e isso exige a prática constante, o treino sistemático. O próprio manual A Arte de Pensar — 11.o ano tem inúmeros exercícios, em todos os capítulos. Mas o Capítulo 1, a partir da secção 3.2. ou 4.3., exige ainda mais exercícios do que os que era possível disponibilizar no manual. Por isso, só quando se chega a uma dessas secções, consoante se optou por estudar lógica aristotélica ou proposicional, é que este Caderno entra verdadeiramente em acção. Na Internet (www.didacticaeditora.pt/arte_de_pensar) há mais materiais complementares para todos os capítulos do manual. E pode-se contactar directamente connosco, por e-mail. Sugestões, críticas, dúvidas e comentá-rios são muito bem-vindos.

Os Autores

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Introdução Questões de Revisão 5

Todos os direitos reservados. Didáctica Editora, 2004.

IInnttrroodduuççããoo QQuueessttõõeess ddee rreevviissããoo

Ao longo do manual A Arte de Pensar — 11.o ano encontram-se dois tipos de exercícios: Questões de Revisão e Problemas. Como o nome indica, o primeiro grupo de exercícios visa apenas rever a matéria dada. Para respon-der a este grupo de exercícios basta estudar com atenção a secção relevante do manual. Por exemplo, na secção 1.1. do Capítulo 1, a Questão de Revisão 1 per-gunta o seguinte: «O que é uma proposição? Define e dá exemplos.» Ora, na secção 1.1. encontra-se a seguinte definição de proposição: «Uma proposição é o pensamento que uma frase declarativa exprime literalmente». E encon-tram-se também vários exemplos de frases que não exprimem proposições; os exemplos de frases que exprimem proposições são fáceis de descobrir: «A neve é azul», «Matar pessoas inocentes por prazer é mau», «Sócrates era suíço», etc. Assim, uma resposta correcta à Questão de Revisão 1 é a seguin-te:

Uma proposição é o pensamento literalmente expresso por uma frase declarativa. Por exemplo, as frases «A neve é azul», «Matar pessoas ino-centes por prazer é mau» e «Sócrates era suíço» exprimem proposições. Já as frases «Fecha a janela!», «Quem me dera que fosse Domingo!» e «Prometo que amanhã vamos ao cinema» não exprimem proposições.

Como se vê, não é difícil apresentar uma boa resposta. O fundamental está explicado no próprio manual, e mesmo que não esteja lá exactamente tudo o que é necessário para responder, é fácil descobrir o resto pensando um pouco. Já os Problemas são mais difíceis; mas é ao responder aos Problemas que ganhamos uma compreensão mais global e profunda da matéria dada. No final deste caderno veremos melhor a natureza dos Problemas, o que os distingue das Questões de revisão e como se responde correctamente aos Problemas. Para já, vamos ver como se resolvem exercícios de lógica.

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6 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

Todos os direitos reservados. Didáctica Editora, 2004.

CCaappííttuulloo 11 LLóóggiiccaa aarriissttoottéélliiccaa

No Capítulo 1 do manual, pode-se optar pela secção 3 (lógica aristotélica) ou 4 (lógica proposicional). Assim, é necessário saber qual das duas opções será escolhida antes de fazer os exercícios deste caderno. Neste capítulo apresentam-se exercícios relativos à lógica aristotélica (secção 3 do manual); no capítulo seguinte apresentam-se exercícios relativos à lógica proposicional (secção 4 do manual).

11.. TTeeoorriiaa ddoo ssiillooggiissmmoo

Na secção 3.2. do Capítulo 1 do manual há dois tipos de exercícios. Ou nos é pedido para determinar a validade silogística de um silogismo dado, ou nos é pedido para apresentar silogismos válidos cujas premissas tenham as formas lógicas dadas. Nesta secção vamos começar por dar exemplos de como se resolvem estes dois tipos de exercícios.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 3.2. Questão de revisão 1.1. O argumento é um silogismo válido porque não viola qualquer das regras do silogismo válido: 1) O silogismo tem exactamente três termos: «O que os artistas fazem»

(termo médio), «belo» (termo maior) e «arte» (termo menor). 2) O termo médio está distribuído pelo menos uma vez, na premissa menor. 3) O único termo que está distribuído na conclusão é o termo maior, e está

também distribuído na premissa maior. 4) O silogismo não tem duas premissas negativas: a menor é afirmativa. 5) O silogismo não tem duas premissas particulares: a menor é universal. 6) O silogismo não tem duas premissas afirmativas.

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Capítulo 1 Lógica Aristotélica 7

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7) A conclusão segue a parte mais fraca: é negativa e particular, tal como a premissa maior.

Questão de revisão 1.3. O argumento é um silogismo inválido porque: 1) O termo médio («verdades») não está distribuído em qualquer das premis-

sas, o que viola a Regra 2. 2) As duas premissas são particulares, o que viola a Regra 5. Questão de revisão 1.5. O argumento é um silogismo inválido porque viola a Regra 7: a conclusão não segue a parte mais fraca, dado que uma das premissas é negativa mas a conclusão é afirmativa. Note-se que, do ponto de vista estritamente lógico, basta que um dado silogismo viole uma das regras para ser inválido. Assim, de um ponto de vista estritamente lógico, a resposta à Questão de Revisão 1.3. poderia limitar-se a mostrar que o silogismo é inválido porque viola a Regra 2. Contudo, para efeitos de completude, costuma-se apresentar todas as regras que um dado silogismo inválido viola. Vejamos agora como se resolvem exercícios de outro tipo:

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 3.2. Questão de revisão 2.1. Alguns artistas não são geniais. Todos os artistas são pessoas criativas. Logo, algumas pessoas criativas não são geniais. Sendo A «artistas», B «geniais» e C «pessoas criativas», as premissas deste silogismo têm a forma dada: a premissa maior é da forma «Alguns A não são B» e a menor é da forma «Todos os A são C». O silogismo é válido porque não viola regra alguma da validade silogística: 1) O silogismo tem exactamente três termos. 2) O termo médio («artistas») está distribuído na premissa menor. 3) O único termo que ocorre distribuído na conclusão é o termo maior

(«geniais»), e este termo ocorre igualmente distribuído na premissa maior.

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8 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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4) O silogismo tem apenas uma premissa negativa: a premissa maior. 5) O silogismo tem apenas uma premissa particular: a premissa maior 6) As duas premissas não são afirmativas. 7) A conclusão segue a parte mais fraca: é particular porque uma das pre-

missas é particular e é negativa porque uma das premissas é negativa. Note-se que, dadas as formas lógicas das premissas, nenhuma outra forma silogística poderia ser dada. A única escolha que há a fazer é quanto aos termos. Neste caso, escolhemos «artistas», «geniais» e «pessoas criativas». A resolução do exercício está parcialmente errada se nos limitarmos a apresentar a forma do silogismo, em vez de um silogismo propriamente dito. Neste exercício pedia-se para apresentar um silogismo e não uma forma silogística e por isso não poderíamos limitar-nos a apresentar a forma seguin-te: Alguns A não são B. Todos os A são pessoas C. Logo, alguns C não são B.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 3.2. Questão de revisão 2.3. Alguns portugueses são lisboetas. Todos os lisboetas são mexicanos. Logo, alguns mexicanos são portugueses. Sendo A «portugueses», B «lisboetas» e C «mexicanos», as premissas deste silogismo têm a forma dada: a premissa maior é da forma «Alguns A são B» e a menor é da forma «Todos os B são C». O silogismo é válido porque não viola qualquer das regras da validade silogística: 1) O silogismo tem exactamente três termos. 2) O termo médio («lisboetas») está distribuído na premissa menor. 3) Nenhum termo ocorre distribuído na conclusão. 4) Ambas as premissas são afirmativas. 5) Uma das premissas é universal. 6) Tanto as premissas como a conclusão são afirmativas. 7) A conclusão segue a parte mais fraca: uma das premissas é particular e a

conclusão também é particular. Note-se que a conclusão apresentada na resolução da Questão de Revisão 2.3. é falsa, porque escolhemos termos que tornam a segunda premissa falsa.

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Capítulo 1 Lógica Aristotélica 9

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É perfeitamente correcto resolver um exercício deste género apresentando silogismos válidos com premissas falsas que, em muitos casos (mas não em todos), dão origem a conclusões igualmente falsas. Vejamos agora como se responde ao Problema 1. Há vários exemplos de formas silogísticas que só são consideradas válidas porque na lógica aristotéli-ca se excluem classes vazias. Todas as formas silogísticas válidas cujas pre-missas sejam universais e cuja conclusão seja particular dão origem a argu-mentos inválidos caso não se excluam classes vazias.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 3.2. Problema 1 Tome-se o seguinte argumento: Todo o habitante natural da Lua é um extraterrestre. Todo o selenita é um habitante natural da Lua. Logo, algum selenita é um extraterrestre. Este argumento é evidentemente inválido, dado que as duas premissas são verdadeiras mas a conclusão é falsa. Contudo, o argumento tem uma forma silogística válida: Todo o A é B. Todo o C é A. Logo, algum C é B. A classe dos selenitas é vazia: não há selenitas. Logo, se admitirmos clas-ses vazias na lógica silogística, há argumentos inválidos que serão considera-dos válidos à luz das regras dadas. A conclusão do argumento apresentado é falsa porque é uma existencial, equivalente a «Há selenitas que são extraterrestres». Como é evidente, dado que não há selenitas, também não há selenitas que sejam extraterrestres, nem há selenitas que não sejam extraterrestres. A melhor maneira de ver por que razão é verdadeira a premissa «Todo o selenita é um habitante natural da Lua» é pensar na sua contraditória: «Algum selenita não é um habitante natural da Lua». Uma vez mais, dado que não há selenitas, esta afirmação é falsa; logo, a sua contraditória, a nossa premissa, é verdadeira.

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EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 3.2. 11.. Determina a validade silogística das seguintes formas:

1) Todo o A é B. Todo o A é C. Logo, algum C não é B.

2) Algum A não é B.

Todo o A é C. Logo, algum C é B.

3) Todo o A é B.

Algum A não é C. Logo, algum C é B.

4) Nenhum A é B.

Todo o A é C. Logo, algum C é B.

5) Algum A é B.

Todo o A é C. Logo, algum C não é B.

6) Nenhum A é B.

Algum A não é C. Logo, algum C é B.

7) Nenhum A é B.

Todo o C é A. Logo, nenhum C é B.

8) Nenhum A é B.

Todo o C é A. Logo, algum C é B.

9) Todo o A é B. Algum C não é A. Logo, algum C é B.

10) Nenhum A é B.

Algum C é A. Logo, algum C é B.

11) Nenhum A é B.

Todo o C é B. Logo, nenhum C é A.

12) Nenhum A é B.

Todo o C é B. Logo, algum C é A.

13) Todo o A é B.

Nenhum C é B. Logo, nenhum C é A.

14) Todo o A é B.

Nenhum C é B. Logo, algum C é A.

15) Nenhum A é B.

Algum C não é B. Logo, algum C é A.

16) Todo o A é B.

Algum C é B. Logo, algum C não é A.

22.. Apresenta formas silogísticas válidas partindo de premissas com as seguin-

tes formas:

1) Todo o A é B. Todo o A é C.

2) Algum A é B.

7) Todo o A é B. Todo o B é C.

8) Todo o A é B.

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Capítulo 1 Lógica Aristotélica 11

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Todo o A é C. 3) Todo o A é B.

Algum A é C. 4) Nenhum A é B.

Todo o A é C. 5) Algum A não é B.

Todo o A é C. 6) Nenhum A é B.

Algum A é C.

Nenhum B é C. 9) Todo o A é B.

Nenhum B é C. 10) Algum A é B.

Todo o B é C. 11) Nenhum A é B.

Todo B é C. 12) Nenhum A é B.

Algum B é C. 33.. Tome-se as seguintes formas: 1) Algum A é B. 2) Algum A não é B. 3) Nenhum A é B. Para cada uma das formas dadas, apresenta quatro formas silogísticas

válidas diferentes que tenham essa forma como conclusão. 44.. Tome-se as seguintes proposições: 1) Nenhum mal é uma ilusão. Nenhum sofrimento é real. 2) Nenhum mal é uma ilusão. Algumas ilusões são perigosas. 3) Todo o mal é uma ilusão. Toda a ilusão é irreal. 4) Todo o mal é uma ilusão. Algumas ilusões não são perigosas. 5) Nenhum mal é uma ilusão. Nenhum mal é eterno. 6) Nenhum mal é uma ilusão. Alguns males são eternos. 7) Alguns bens são ilusórios. Algumas ilusões são perigosas. 8) Alguns bens são ilusórios. Nenhuma ilusão é perigosa. 9) Algumas ilusões são um mal. Alguns males são ilusões. Para cada par de proposições dadas, determina se é possível construir um

silogismo válido que tenha essas proposições como premissas. Justifica a resposta.

Na lógica silogística há apenas vinte e quatro formas consideradas válidas. É útil dispor da lista completa dessas formas, a fim de verificar as soluções de alguns exercícios.

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FORMAS SILOGÍSTICAS VÁLIDAS Todo o A é B. Todo o C é A. Logo, todo o C é B. Todo o A é B. Todo o C é A. Logo, algum C é B. Nenhum A é B. Todo o C é A. Logo, nenhum C é B. Nenhum A é B. Todo o C é A. Logo, algum C não é B. Todo o A é B. Algum C é A. Logo, algum C é B. Nenhum A é B. Algum C é A. Logo, algum C não é B. Nenhum A é B. Todo o C é B. Logo, nenhum C é A. Nenhum A é B. Todo o C é B. Logo, algum C não é A. Todo o A é B. Nenhum C é B. Logo, nenhum C é A. Todo o A é B. Nenhum C é B. Logo, algum C não é A. Nenhum A é B.

Todo o A é B. Todo o A é C. Logo, algum C é B. Algum A é B. Todo o A é C. Logo, algum C é B. Todo o A é B. Algum A é C. Logo, algum C é B. Nenhum A é B. Todo o A é C. Logo, algum C não é B. Algum A não é B. Todo o A é C. Logo, algum C não é B. Nenhum A é B. Algum A é C. Logo, algum C não é B. Todo o A é B. Todo o B é C. Logo, algum C é A. Todo o A é B. Nenhum B é C. Logo, nenhum C é A. Todo o A é B. Nenhum B é C. Logo, algum C não é A. Algum A é B. Todo o B é C. Logo, algum C é A. Nenhum A é B.

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Capítulo 1 Lógica Aristotélica 13

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Algum C é B. Logo, algum C não é A. Todo o A é B. Algum C não é B. Logo, algum C não é A.

Todo B é C. Logo, algum C não é A. Nenhum A é B. Algum B é C. Logo, algum C não é A.

22.. QQuuaaddrraaddoo ddee ooppoossiiççããoo

Esta secção é opcional.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 3.3. Questão de revisão 2 O valor de verdade da contraditória de uma proposição verdadeira é falso. Questão de revisão 4 Duas frases contraditórias não podem ser ambas falsas porque, por defini-ção, a contraditória de uma frase falsa é uma frase verdadeira. Mas duas frases contrárias podem ser ambas falsas, como é o caso de «Todos os homens são portugueses» e «Nenhum homem é português». Por definição, duas frases são contrárias quando não podem ser ambas verdadeiras mas podem ser ambas falsas. Questão de revisão 6 Dada uma certa proposição falsa não é possível saber exclusivamente por meios lógicos qual é o valor de verdade da sua subalterna, pois a relação de subalternidade apenas nos diz qual é o valor de verdade da subalterna caso a proposição de partida seja verdadeira. Por exemplo, dada a verdade de uma frase da forma «Todo o A é B», sabemos que a sua subalterna («Algum A é B») é também verdadeira. Mas se a frase de partida for falsa nada podemos saber. Os exemplos seguintes mostram que dada a falsidade de uma dada forma, a sua subalterna tanto pode ser verdadeira como falsa: «Todos os lisboetas são franceses» é falsa e «Alguns lisboetas são franceses» é igual-mente falsa; «Todos os homens são portugueses» é falsa, mas «Alguns homens são portugueses» é verdadeira.

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14 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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Questão de revisão 8 Se uma proposição for a contraditória de outra, esta é também a contra-ditória da primeira porque a relação de contradição é simétrica. Por exem-plo, a contraditória de «Todos os homens são mortais» é «Alguns homens não são mortais»; e a contraditória da última frase é a primeira. Problema 2 A relação entre a noção de subalternidade e a noção de argumento válido é a seguinte: se P é a subalterna de Q, então o argumento «Q, logo P» é válido; e se «Q, logo P» for um argumento válido, então P é a subalterna de Q. Problema 4 «Há contraditórias de grandes verdades que não são grandes verdades.» Problema 6 Pode-se determinar o valor de verdade de «Todos os A são B» com base na informação de que «Alguns A não são B» é verdadeira porque as duas formas são contraditórias. Logo, se alguns A não são B, então é falso que todos os A são B.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 3.3. 11.. Considere-se a seguinte frase: «Todo o mal do mundo resulta do livre

arbítrio». 1) Qual é a sua subalterna? 2) Qual é a sua contrária? 3) Qual é a sua contraditória? 22.. Considere-se a seguinte frase: «Algumas verdades são relativas». 1) Qual é a sua contraditória? 2) Qual é a sua subcontrária? 3) Há alguma proposição que seja a sua subalterna? Porquê?

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Capítulo 2 Lógica proposicional 15

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CCaappííttuulloo 22 LLóóggiiccaa pprrooppoossiicciioonnaall

Neste capítulo apresentam-se exercícios relativos à lógica proposicional (secção 4 do Capítulo 1 do manual).

11.. CCiinnccoo ccoonneeccttiivvaass

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.3. Questão de revisão 1.1. Admitindo que a vida não tem sentido, a frase «A vida tem sentido e a felicidade é real» é falsa porque numa conjunção basta que uma das frases conjuntas seja falsa para que toda a conjunção seja falsa. Questão de revisão 3.2. Admitindo que Deus existe e que não sabemos se a vida tem sentido, não é possível saber se a frase dada é verdadeira ou falsa porque o seu valor de verdade depende do valor de verdade da sua consequente («A vida tem senti-do»): se a sua consequente for verdadeira, a frase dada será verdadeira; se a sua consequente for falsa, a frase dada será falsa. Problema 2 A tabela de verdade da negação tem exactamente duas filas porque é uma conectiva unária (aplica-se a uma única proposição) e porque só se usa dois valores de verdade na lógica clássica. Assim, a combinação lógica exaus-tiva de condições de verdade esgota-se em duas filas: ou P é verdadeira ou P é falsa.

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16 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.3. 11.. Considere-se a seguinte frase: «Deus é omnipotente ou omnisciente». 1) Considerando que Deus não é omnipotente, será possível saber qual é o valor de verdade da frase dada? Porquê? 2) Considerando que Deus é omnipotente, qual é o valor de verdade da frase dada? 3) Considerando que Deus não é omnipotente nem omnisciente, qual é o valor de verdade da frase dada? 22.. Considerando que P simboliza «A vida é sagrada» e Q simboliza «O aborto

é um mal», qual é o significado das expressões seguintes? 1) P 6) Q 11) Q → Q 2) P → Q 7) Q → P 12) P ∧ P 3) P ∧ Q 8) Q ∧ P 13) Q ∨ Q 4) P ∨ Q 9) Q ∨ P 14) P ↔ P 5) P ↔ Q 10) Q ↔ P 33.. Considerando que P é falsa e Q verdadeira, qual é o valor de verdade das

14 expressões anteriores? 44.. Se desconhecermos o valor de verdade de P, mas soubermos que Q é

falsa, que expressões do exercício 2 podemos determinar como verdadei-ras ou falsas? Porquê?

55.. Se desconhecermos o valor de verdade de P e de Q, que expressões do

exercício 2 podemos determinar como verdadeiras ou falsas? Porquê? 66.. Formaliza as seguintes afirmações na lógica proposicional: 1) Zeus existe. 2) Zeus e Cronos existem. 3) Se Sócrates era grego, Platão também o era. 4) O conhecimento é ilusório ou os cépticos estão enganados. 5) O conhecimento não é ilusório. 6) A arte tem valor se, e só se, tem valor cognitivo. Note-se que, ao formalizar uma afirmação como «Zeus e Cronos existem», temos de ter em conta que na linguagem corrente nós eliminamos muitas repetições desnecessárias. A frase quer dizer «Zeus existe e Cronos existe» e

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Capítulo 2 Lógica proposicional 17

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formaliza-se como «P ∧ Q» sendo P «Zeus existe» e Q «Cronos existe». É por isso um erro formalizar apenas como «P». O mesmo tipo de fenómeno da linguagem corrente ocorre com «Se Sócra-tes era grego, Platão também o era». Esta frase é evidentemente uma forma abreviada de dizer «Se Sócrates era grego, então Platão era grego» — e por isso formaliza-se como «P → Q». Ao formalizar afirmações temos de estar atentos às conectivas proposicio-nais e completar frases que foram abreviadas. Formalizar «Zeus e Cronos existem» como «P» é um erro.

22.. IInnssppeeccttoorreess ddee cciirrccuunnssttâânncciiaass

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.4. Questão de revisão 1.2. P Q P ∨ Q, ¬P Q

V V V F V V F V F F F V V V V F F F V F A forma dada é válida dado que não há circunstância alguma em que as duas premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Questão de revisão 1.4. P Q P → Q Q ∧ P

V V V V V F F F F V V F F F V F A forma dada é inválida porque tanto na circunstância em que P é falsa e Q verdadeira como na circunstância em que tanto P como Q são falsas, a premissa é verdadeira e a conclusão falsa.

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18 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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Questão de revisão 1.6. P Q P ↔ Q Q → P

V V V V V F F V F V F F F F V V A forma dada é válida dado que não há circunstância alguma na qual a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Questão de revisão 3.1. Argumento: Ou o livre-arbítrio é possível ou a nossa vida é uma ilusão. Logo, a nossa vida é uma ilusão. Interpretação: P = O livre-arbítrio é possível. Q = A nossa vida é uma ilusão. Forma argumentativa: P ∨ Q Q

Inspector de circunstâncias: P Q P ∨ Q Q

V V V V V F V F F V V V F F F F O argumento dado é inválido porque na circunstância em que P é verda-deira e Q falsa a premissa é verdadeira e a conclusão falsa. Questão de revisão 3.4. Argumento: Sócrates era grego. Sócrates não era grego. Logo, Deus existe.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 19

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Interpretação: P = Sócrates era grego. Q = Deus existe. Forma argumentativa: P, ¬P Q

Inspector de circunstâncias: P Q P ¬P Q

V V V F V V F V F F F V F V V F F F V F O argumento dado é válido porque não há quaisquer circunstâncias em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Repare-se que a validade do último argumento testado resulta unicamen-te do facto de as suas premissas se contradizerem. Qualquer argumento com premissas contraditórias é um argumento dedutivamente válido porque nesse caso não há circunstâncias em que as premissas sejam verdadeiras e a conclu-são falsa.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.4. 1. Testa a validade das seguintes formas recorrendo a inspectores de cir-

cunstâncias: 1) P ∧ Q, P ¬Q

2) P ∨ Q, P ¬Q

3) P → Q, ¬Q P

4) P → Q, P ¬Q

5) P → Q ¬Q

6) P ↔ Q P → Q

7) P, Q P ∨ Q

8) P, ¬Q Q ∨ P

9) P → Q, ¬Q P ∧ Q

10) P → Q Q

11) ¬P Q → P

12) P ↔ Q, ¬Q ¬P

2. Testa a validade dos seguintes argumentos recorrendo a inspectores de

circunstâncias:

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1) Se o mal existe, a vida é absurda. Se a vida é absurda, o mal existe. Logo, a vida é absurda se, e só se, o mal existe. 2) Deus existe. Se Deus existe, o aborto é um mal. Logo, o aborto não é permissível. 3) Se Sócrates tem razão, a vida por examinar é absurda. Sócrates tem razão. Logo, a vida por examinar é absurda. 4) Sócrates era grego. Kant não era grego. Logo, Deus existe. 5) A Justiça é possível se, e só se, Platão tiver razão. Platão tem razão. Logo, a Justiça é possível.

33.. AArrgguummeennttooss ccoomm ttrrêêss vvaarriiáávveeiiss

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.5. Questão de revisão 1.1. P Q R P ∧ Q, P → R, Q → R R

V V V V V V V V V F V F F F V F V F V V V V F F F F V F F V V F V V V F V F F V F F F F V F V V V F F F F V V F A forma dada é válida porque não há circunstâncias em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 21

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Questão de revisão 1.3. P Q R P ↔ Q, Q ↔ R P ↔ R

V V V V V V V V F V F F V F V F F V V F F F V F F V V F V F F V F F F V F F V V F F F F F V V V A forma dada é válida porque não há circunstâncias em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa. Questão de revisão 1.5. P Q R P ∧ Q, R Q → R

V V V V V V V V F V F F V F V F V V V F F F F V F V V F V V F V F F F F F F V F V V F F F F F V A forma dada é válida porque não há circunstâncias em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.5. 1. Testa a validade das seguintes formas recorrendo a inspectores de cir-

cunstâncias: 1) P ∨ Q, P → R, Q → R R

2) P → Q, Q → R R → P

3) P ↔ Q, Q ↔ R R ↔ P

4) P ∨ R Q → P

5) P ∧ Q, R R → Q

7) P ∧ Q, P ∧ R, Q → R R

8) P → Q, Q → R P ∧ R

9) P ↔ Q, Q ↔ R P ∨ R

10) P ∨ R, Q Q → P

11) P → Q, R Q → R

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22 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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6) P → Q R ∨ Q 12) P → Q, R R → Q

44.. OO ââmmbbiittoo ddaass ccoonneeccttiivvaass

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.6. Questão de revisão 1.2. P Q ¬(P ∧ Q) ¬P ∨ ¬Q

V V F V F F F V F V F F V V F V V F V V F F F V F V V V A forma dada é válida dado que não há circunstância alguma em que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Questão de revisão 1.4. P Q ¬(P → Q) P ∧ ¬Q

V V F V V F F V F V F V V V F V F V F F F F F F V F F V A forma dada é válida dado que não há circunstância alguma em que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Questão de revisão 1.6. P Q P → Q ¬P ∨ Q

V V V F V V V F F F F F F V V V V V F F V V V F A forma dada é válida dado que não há circunstância alguma em que a premissa seja verdadeira e a conclusão falsa. Questão de revisão 3.1.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 23

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Argumento: O livre-arbítrio é possível ou a nossa vida é uma ilusão. Se o livre-arbítrio for possível, a nossa vida não é uma ilusão. Logo, a nossa vida não é uma ilusão. Interpretação: P = O livre-arbítrio é possível. Q = A nossa vida é uma ilusão. Forma argumentativa: P ∨ Q, P → ¬Q ¬Q

Inspector de circunstâncias: P Q P ∨ Q, P → ¬Q ¬Q

V V V V F F F V F V V V V V F V V F V F F F F F F V V V O argumento dado é inválido porque na circunstância em que P é falsa e Q verdadeira as premissas são verdadeiras e a conclusão falsa.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.6. 1. Testa a validade das seguintes formas recorrendo a inspectores de cir-

cunstâncias: 1) ¬(P ∨ Q) ¬P ∨ ¬Q

2) ¬(P ∧ Q) ¬P ∧ ¬Q

3) P → Q P ∨ Q

4) ¬(P → Q) ¬P → ¬Q

5) P → (Q → R) (P → Q) → R

6) P → Q ¬P ∧ Q

7) ¬(P ↔ Q) ¬(P → Q)

8) P ↔ ¬Q ¬P ↔ Q

9) ¬P → Q, Q → ¬P ¬P ↔ Q

10) ¬P → (Q ∧ P) ¬Q

11) P ∧ (Q ∧ R) (P ∧ Q) ∧ R

12) (P → Q) → Q, ¬Q ¬(¬P ∨ Q)

2. Testa a validade dos seguintes argumentos recorrendo a inspectores de

circunstâncias: 1) Se Deus existe, o mal não existe.

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Mas o mal existe. Logo, Deus não existe. 2) Não é verdade que se Deus existe, o mal não existe. Logo, Deus existe. 3) Não é verdade que nada é real e que tudo é uma ilusão. Nada é real. Logo, não é verdade que tudo é uma ilusão. 4) Não é verdade que a vida faz sentido se, e só se, Deus existe. A vida faz sentido. Logo, Deus não existe. 5) Não se pode definir a arte nem se pode definir o conhecimento. Logo, não é verdade que se pode definir a arte e se pode definir o

conhecimento. 6) Se o conhecimento não for possível, a filosofia é inútil. Logo, se a filosofia não é inútil, o conhecimento é possível. Vimos até agora casos muito simples de proposições compostas. Os casos mais complexos (e mais próximos da linguagem que usamos no quotidiano) dão origem a ambiguidades de âmbito.

Ocorre uma ambiguidade de âmbito numa afirmação quando há mais de uma maneira de interpretar o âmbito das suas conectivas.

Vejamos o seguinte exemplo: «Amanhã vou à praia ou leio um livro e vou ao cinema.» Quem afirma isto pode ter em mente duas proposições muito diferentes:

1. Amanhã vou fazer duas coisas: vou à praia ou leio um livro; e vou ao cinema.

2. Amanhã tenho duas alternativas: posso ir à praia; ou então leio um livro e vou ao cinema.

A formalização das duas possibilidades revela claramente as suas diferen-ças. Interpretação: P: Amanhã vou à praia.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 25

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Q: Amanhã leio um livro. R: Amanhã vou ao cinema.

1. (P ∨ Q) ∧ R 2. P ∨ (Q ∧ R)

As ambiguidades de âmbito levantam um problema: como podemos saber qual das duas interpretações é a correcta, ao formalizar um argumento? A resposta é que não há qualquer método automático que garanta que esco-lhemos a interpretação correcta. Mas devemos seguir a seguinte estratégia:

1. Começamos por formalizar as duas ou mais interpretações possíveis. 2. Procuramos determinar que interpretação é necessária para tornar o

argumento válido. 3. Procuramos determinar que interpretação é necessária para tornar as

afirmações em causa mais plausíveis. Retomemos a afirmação dada como exemplo, e coloquemos a afirmação num contexto argumentativo:

Amanhã vou à praia ou leio um livro e vou ao cinema. Se for ao cinema, tenho de telefonar à Paula. Logo, tenho de telefonar à Paula.

Neste contexto, a única interpretação que torna o argumento válido é a 1. Por isso, é razoável interpretar a primeira premissa dessa maneira. E como sabemos que a única interpretação que torna o argumento válido é a 1? Formalizamos o argumento das duas maneiras e determinamos qual deles é válido. Sendo S «Tenho de telefonar à Paula», as duas formalizações são as seguintes:

1. (P ∨ Q) ∧ R, R → S S

2. P ∨ (Q ∧ R), R → S S

Para testar a validade das formas dadas tanto podemos fazer dois inspec-tores de circunstâncias como podemos usar o teste rápido de validade. Por vezes, nenhuma das interpretações torna o argumento em causa válido; ou ambas as interpretações tornam o argumento válido; ou até pode-mos querer conhecer a forma lógica de uma dada afirmação que não foi proferida num contexto argumentativo. Nesse caso, temos de nos guiar pela interpretação mais plausível, dado o restante conhecimento das coisas.

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Vejamos um exemplo: «Deus existe e o mal é uma ilusão ou os teístas estão enganados». Esta afirmação é ambígua; pode exprimir qualquer uma de duas proposições diferentes. Vejamos quais. Interpretação P: Deus existe. Q: O mal é uma ilusão. R: Os teístas estão enganados.

1. (P ∧ Q) ∨ R 2. P ∧ (Q ∨ R)

Dado o conteúdo das afirmações e dado o nosso conhecimento filosófico geral, a interpretação 2 é menos plausível do que a 1. Isto porque faz mais sentido pensar que há uma alternativa entre a hipótese de Deus existir e o mal ser uma ilusão, por um lado, e o engano dos teístas, por outro, do que pensar que há uma conjunção entre a existência de Deus e a alternativa entre a ilusão do mal e o engano dos teístas. Por vezes, não há qualquer ambiguidade nas afirmações dos argumentos que queremos formalizar, mas cometemos erros de falta de atenção ao âmbi-to. Vejamos o seguinte exemplo: «Se Deus existe e o mal é uma ilusão, então os teístas estão enganados». A formalização correcta desta afirmação é a seguinte: Interpretação P: Deus existe. Q: O mal é uma ilusão. R: Os teístas estão enganados. Formalização (P ∧ Q) → R Assim, é um erro formalizar como se segue: P ∧ (Q → R) Esta forma lógica não corresponde à afirmação dada, mas antes à afirma-ção «Deus existe e se o mal é uma ilusão, então os teístas estão enganados». Como se vê, esta afirmação é muito diferente da anterior.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 27

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Eis mais um exemplo: «Não é verdade que se Deus existe, a vida faz sen-tido». A formalização correcta, atribuindo as variáveis apropriadamente, é «¬(P → Q)», pois o que se está a negar é a própria condicional e não apenas a sua antecedente. A formalização «¬P → Q» é incorrecta porque corresponde à afirmação «Se não é verdade que Deus existe, a vida faz sentido». Como é evidente, esta afirmação é muito diferente da anterior. As proposições compostas podem tornar-se muito complexas. Eis um exemplo: «Não é verdade que a vida faz sentido se, e só se, Deus não existe e os teístas estão enganados». Dado o conteúdo da afirmação, a forma lógica correcta é a seguinte:

Interpretação P: A vida faz sentido. Q: Deus existe. R: Os teístas estão enganados. Forma lógica ¬[P ↔ (¬Q ∧ R)]

Dado o conteúdo da afirmação, as seguintes alternativas não são correc-tas:

¬P ↔ (¬Q ∧ R) ¬(P ↔ ¬Q) ∧ R

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.6.

1. Formaliza as afirmações seguintes. Caso contenham ambiguidades de

âmbito explicita-as. 1) Deus existe e a vida é sagrada ou nada faz sentido. 2) Não é verdade que se Deus existe e é sumamente bom, então a vida

não faz sentido. 3) Se não é verdade que Deus existe e é sumamente bom, então a vida

não faz sentido. 4) Não é verdade que a vida faz sentido se, e só se, Deus existe e os

teístas estão enganados. 5) A vida não faz sentido se, e só se, Deus existe e os teístas estão enga-

nados. 6) Se o conhecimento não for possível e tudo for uma ilusão, a filosofia é

inútil.

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7) O conhecimento é possível e não é tudo uma ilusão ou a filosofia é inútil.

8) Não é verdade que o conhecimento é impossível e é tudo uma ilusão ou a filosofia é inútil.

9) Não é verdade que se pode definir a arte e se pode definir o conheci-mento.

10) Não é verdade que nada é real e que se tudo é uma ilusão, nada vale a pena.

11) Não é verdade que nada é real e se tudo é uma ilusão, nada vale a pena.

2. Avalia a validade dos argumentos seguintes. Caso contenham ambiguida-

des de âmbito, apresenta as diferentes interpretações possíveis; se algu-ma das interpretações for mais plausível, indica qual é e explica porquê.

1) Se Deus existe e é omnisciente, o mal não é possível. O mal é possível. Logo, Deus não existe ou não é omnisciente. 2) Se não é verdade que Deus existe e é sumamente bom, a vida não faz

sentido. Deus não existe ou não é sumamente bom. Logo, a vida não faz sentido. 3) Tudo é uma ilusão e se tudo é uma ilusão, nada vale a pena. Logo, nada vale a pena. 4) Não é verdade que nada vale a pena e se tudo é uma ilusão, nada vale

a pena. Logo, não é verdade que tudo é uma ilusão. 5) Não é verdade que se pode definir a arte e o conhecimento. Logo, não se pode definir a arte ou não se pode definir o conhecimen-

to. 6) Se o conhecimento não for possível e tudo for uma ilusão, a filosofia é

inútil. Se a filosofia for inútil, Platão e Kant estavam enganados. Não é verdade que Platão e Kant estavam enganados. Logo, o conhecimento é possível ou não é verdade que tudo é uma

ilusão.

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Capítulo 2 Lógica proposicional 29

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7) Não é verdade que se a vida faz sentido, Deus não existe e os teístas estão enganados.

Logo, a vida faz sentido.

55.. TTeessttee rrááppiiddoo ddee vvaalliiddaaddee

Note-se que esta secção é opcional: é um complemento ao manual. O teste rápido de validade permite determinar a validade ou invalidade de formas argumentativas sem usar inspectores de circunstâncias. Este méto-do consiste em pensar disciplinadamente, para descobrir se há circunstâncias nas quais as premissas são verdadeiras e a conclusão falsa. Testemos esta forma: (P ∨ Q) ∧ R, R → S S

1. Para uma forma ser inválida tem de haver circunstâncias nas quais as

premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Logo, temos de exa-minar a circunstância na qual S é F.

2. Para que a segunda premissa seja V, R tem de ser F, dado que S é F. 3. Mas se R é F, a primeira premissa não pode ser V. 4. Logo, a forma argumentativa 1 é válida: não há qualquer circunstância

na qual as premissas sejam V e a conclusão F. Testemos agora a seguinte forma: P ∨ (Q ∧ R), R → S S

1. Para uma forma ser inválida tem de haver circunstâncias nas quais as

premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Logo, temos de exa-minar a circunstância na qual S é F.

2. Para que a segunda premissa seja V, R tem de ser F, dado que S é F. 3. Mas a primeira premissa pode ser V, ainda que R seja F, dado que bas-

ta que P seja V. 4. Logo, a forma argumentativa é inválida: há pelo menos uma circuns-

tância na qual as premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Para não nos enganarmos no raciocínio podemos ir escrevendo num papel de rascunho os valores atribuídos às variáveis. No caso da forma que acabá-mos de testar, o resultado é o seguinte: P ∨ (Q ∧ R), R → S S

V F F F F [5 4 3 2 1]

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A ordem pela qual fomos atribuindo os valores de verdade está represen-tada pelos números entre parênteses. Estes números não se escrevem quando fazemos o exercício. Apliquemos a técnica a mais uma forma: P ∨ Q, P → R, Q → R R ∨ S

F F F F F F F F Este método torna-se mais complexo quando há mais de uma circunstân-cia em que a conclusão é falsa. Nesse caso, temos de explorar essas circuns-tâncias todas para verificar se em alguma delas as premissas são verdadeiras e a conclusão falsa. Vejamos um exemplo: P ∨ Q, P → R, Q → R R ↔ S

1. Para uma forma ser inválida tem de haver circunstâncias nas quais as

premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Neste caso, há duas circunstâncias nas quais a conclusão é falsa: I) quando R é V e S é F; II) quando R é F e S é V. Comecemos pela circunstância I.

2. Sendo R V, a segunda e terceira premissas são V independentemente do valor de verdade de P e Q.

3. Para que a primeira premissa seja V é necessário que P ou Q seja V. Ora, nós podemos atribuir V a P ou Q ou aos dois. Nesta circunstância, todas as premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa.

4. Logo, a forma argumentativa é inválida e não é necessário explorar a circunstância II.

Vejamos outro exemplo: P → Q, Q → R P ∧ R

1. Para uma forma ser inválida tem de haver circunstâncias nas quais as

premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Neste caso, há 3 cir-cunstâncias nas quais a conclusão é falsa: I) P é F e R é V; II) P é V e R é F; III) tanto P como R são F. Comecemos por I.

2. A falsidade de P garante a verdade da primeira premissa. 3. A verdade de R garante a verdade da segunda premissa. 4. Nesta circunstância, as premissas são verdadeiras e a conclusão falsa. 5. Logo, a forma argumentativa é inválida e não é necessário explorar as

circunstâncias II e III. Finalmente, vejamos este exemplo: P → Q, Q → P P ↔ Q

1. Para uma forma ser inválida tem de haver circunstâncias nas quais as

premissas são verdadeiras e a conclusão é falsa. Neste caso, há 2 cir-

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Capítulo 2 Lógica proposicional 31

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cunstâncias nas quais a conclusão é falsa: I) P é V e Q é F; II) P é F e Q é V. Comecemos por I.

2. A primeira premissa é falsa, dado que P é V e Q F. Logo, na circuns-tância I não se dá o caso de as premissas serem V e a conclusão F. Temos de explorar a circunstância II.

3. Na circunstância II, a segunda premissa é falsa, dado que Q é V e P é F.

4. Logo, a forma argumentativa é válida, dado que não há qualquer cir-cunstância na qual as premissas sejam verdadeiras e a conclusão falsa.

Exercícios: Usando este método, testa a validade das formas apresenta-das nos exercícios complementares da secção anterior.

66.. VVaarriiáávveeiiss ddee ffóórrmmuullaa

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.7. Questão de revisão 1.2. Trata-se de uma contraposição: A → B Logo, ¬B → ¬A A = (P ∨ R) B = ¬(Q ∨ P) Questão de revisão 1.4. Trata-se de um modus ponens: A → B A Logo, B A = ¬P B = Q

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EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.7. 1. Tendo em mente o quadro da secção 4.7. do manual, identifica as seguin-

tes formas lógicas: 1) ¬[P → (Q ∨ R)] Logo, P ∧ ¬(Q ∨ R) 2) (P ↔ Q) → (R ∧ S) R ∧ S Logo, P ↔ Q

3) ¬(¬P → ¬Q) Logo, ¬P ∧ ¬¬Q 4) ¬(P ∧ Q) → (R ∨ S) ¬(P ∧ Q) Logo, R ∨ S

77.. FFoorrmmaalliizzaaççããoo

A formalização é um dos aspectos mais importantes do estudo da lógica, entendida como instrumento do pensamento correcto. Pois para poder aplicar os instrumentos lógicos de análise de argumentos é necessário primeiro for-malizar os argumentos tal como estes ocorrem no dia-a-dia, nos livros, nos ensaios dos filósofos, etc.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.8. Questão de revisão 1.2. Se Deus existe, os seres humanos são apenas o resultado de um desígnio incompreensível. Se os seres humanos são apenas o resultado de um desígnio incompreensí-vel, a vida não faz sentido. Logo, se a vida faz sentido, Deus não existe. Questão de revisão 2.1. Alguém duvida que a nossa vida seja uma ilusão? É que, no que respeita ao livre-arbítrio, só há duas alternativas: ou é realmente possível ou a nossa vida é uma completa ilusão. Não há receitas automáticas para formalizar adequadamente um dado conjunto de afirmações ou argumentos. E há cinco aspectos que dificultam a formalização:

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Capítulo 2 Lógica proposicional 33

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1. Muitas vezes, usamos certas expressões que literalmente querem dizer uma coisa para dizer coisas completamente diferentes. Por exemplo, ao dizer «Dê-me 20 a lógica e eu fico feliz» estamos literalmente a afirmar uma con-junção, com a forma P ∧ Q. Mas, na verdade, o que queremos dizer é «Se me der 20 a lógica, fico feliz»: uma condicional, com a forma P → Q. Eis outro exemplo: ao dizer «Se te portares bem, dou-te um livro» parece que estamos a afirmar uma condicional, com a forma P → Q. Mas, na verdade, usamos quase sempre este tipo de estrutura para exprimir uma bicondicional, pois o que queremos realmente dizer é «Dou-te um livro se, e só se, te portares bem». 2. Outras vezes, não nos damos ao trabalho de apresentar todas as pre-missas dos nossos argumentos. Quando um amigo nos diz «Se não deixares de fumar, tens muitas probabilidades de desenvolver um cancro» pode estar a apresentar-nos um argumento, em certos contextos; mas limitou-se a expri-mir uma das premissas do argumento, porque quer a outra premissa quer a conclusão são evidentes: «Se não deixares de fumar, tens muitas probabilida-des de desenvolver um cancro; tu não queres desenvolver um cancro; logo, deves deixar de fumar». Trata-se, pois, de um modus ponens. 3. A maior parte das vezes, apresentamos os argumentos misturados com a defesa de algumas das suas premissas centrais. Por exemplo, uma pessoa pode dizer o seguinte: «Se Deus existisse, a vida não faria sentido, pois nesse caso seríamos como um artefacto, que é um meio para um fim e não um fim em si; dado que a vida faz sentido, Deus não existe». Este argumento é um modus tollens, mas a frase «nesse caso seríamos como um artefacto, que é um meio para um fim e não um fim em si» não faz parte do argumento; é apenas uma defesa muito sintética da primeira premissa. 4. A maior parte das vezes os argumentos apresentam-se cheios de «ruí-do», isto é, com muitos elementos que não desempenham qualquer papel lógico. Por exemplo: «Como é que podes ser a favor do aborto? É evidente que é um crime! Abortar é interromper uma vida e a vida é sagrada». Em todas estas frases, acaba por só se apresentar um argumento: «A vida é sagrada; logo, o aborto é um crime». O argumento é ridiculamente mau, mas o ruído que o rodeia cega-nos e esconde esse facto. 5. Finalmente, usamos várias formas diferentes de exprimir as cinco conectivas lógicas. A lista apresentada no manual dá uma ideia dessa diversi-dade, mas há outras formas de exprimir as conectivas (sobretudo a condicio-nal, que é a conectiva mais usada na argumentação). Por exemplo, dizer «Dado que Deus existe, a vida faz sentido» é uma forma de exprimir a condi-cional «Se Deus existe, a vida faz sentido». Isto significa que para formalizar é necessário ter um conhecimento ade-quado das conectivas proposicionais e é preciso ter atenção ao que o argu-mento sob análise pretende realmente dizer. Muitas vezes, temos de recons-

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truir fortemente o argumento original: temos de o interpretar. Como faze-mos isso? Apesar de não haver uma receita, é informativo ver como se pode raciocinar para decidir como formalizar uma dada afirmação. Vejamos o exemplo dado: «Se te portares bem, dou-te um livro». Não é possível saber qual é a forma lógica desta afirmação sem pensar no contexto em que a frase é proferida, no objectivo que se tem em vista ao proferi-la, etc. Literalmente, a afirmação é uma condicional com a forma P → Q. Mas numa situação normal esta afirmação não exprime uma condicional. Como podemos saber isso? Pensando nas suas condições de verdade; e isto pode-se fazer imaginando situações diferentes. Imaginemos uma situação em que a pessoa não se portou bem mas o locutor da frase dá-lhe à mesma um livro. Intuitivamente, diríamos que isso não é compatível com a afirmação original. Mas se interpretarmos essa afir-mação literalmente, a situação em que a pessoa não se portou bem e a outra lhe deu um livro é perfeitamente compatível com a afirmação. Isto acontece porque uma condicional é verdadeira mesmo que a sua antecedente seja falsa e a sua consequente verdadeira. Assim, a afirmação não pode ser entendida como uma condicional, porque as condições de verdade da condicional não são compatíveis com as condições de verdade da afirmação. E que condições de verdade tem a afirmação origi-nal? Bem, se a pessoa não se portar bem e a outra lhe der um livro, a afirma-ção é falsa; e é falsa também se a pessoa se portar bem e a outra não lhe der um livro. Temos assim duas filas da tabela de verdade:

P Q P ? Q V V ? V F F F V F F F ?

E se a pessoa se portar bem e a outra lhe der um livro? A afirmação origi-nal será evidentemente verdadeira. E se a pessoa não se portar bem e a outra não lhe der um livro? A afirmação é também evidentemente verdadeira. Completámos assim a nossa tabela de verdade:

P Q P ? Q V V V V F F F V F F F V

Ora, esta é a tabela de verdade da bicondicional ou equivalência. Por isso, concluímos que a afirmação original «Se te portares bem, dou-te um

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Capítulo 2 Lógica proposicional 35

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livro» tem de ser interpretada como uma forma económica de dizer «Dou-te um livro se, e só se, te portares bem». Evidentemente, este processo é complexo, exige um domínio razoável da lógica elementar e uma forte intuição lógica. Não é isto que se exige neste manual, mas é bom ter consciência de que o que estamos a estudar agora são as bases para que, no futuro, se possa fazer isto. Para ajudar a dar os primeiros passos, os exercícios do manual, tal como os exercícios complementares que apresentamos a seguir, são versões muito simplificadas de formalizações. São simplificadas porque os argumentos dados para formalizar já estão semi-formalizados.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.8. 1. Reescreve os argumentos seguintes na forma canónica: 1) A arte é a criação de um artista. A criação de um artista é a expressão

das emoções. Logo, a arte é a expressão das emoções. 2) Quem precisa do estado? Se o estado fosse útil, não haveria guerras

entre todos. Mas desde que se criaram os primeiros estados que as guerras não cessam.

3) Não é verdade que uma condição necessária para haver inteligência é

ter cérebro. Ter cérebro não é sequer uma condição suficiente para ter inteligência. Portanto, qual é o problema de afirmar que os com-putadores um dia serão inteligentes?

4) Uma condição suficiente para ter direito à vida é querer viver. Ora,

um feto não quer viver, porque não é consciente. Logo, os fetos não têm direito à vida.

5) A acção é, por natureza, egoísta. Ou agimos porque temos interesse

em fazer o que estamos a fazer, ou não o fazemos. Se não temos inte-resse no que estamos a fazer, não agimos.

6) Uma decisão sobre um assunto qualquer nunca pode ser a melhor a

menos que seja tomada por quem tem conhecimento de causa. Numa democracia, as decisões não são tomadas por quem tem conhecimento de causa. É por isso que defendo que a democracia é irracional.

7) Tanto Sócrates como Platão eram atenienses. Sócrates era grego se

era ateniense. E Platão também. Portanto, tanto Sócrates como Pla-tão eram gregos.

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2. Os argumentos seguintes estão na forma canónica; reescreve-os de uma

maneira mais natural. 1) Ou a vida não é sagrada ou o aborto é permissível. O aborto não é permissível. Logo, a vida é sagrada. 2) Se Sócrates era ateniense, era grego. Se Sócrates era grego, não era português. Sócrates era ateniense. Logo, Sócrates não era português. 3) A argumentação lógica não serve para nada. Se a argumentação lógica não serve para nada, não vale a pena estu-

dar lógica. Não vale a pena estudar filosofia. Logo, não vale a pena estudar lógica nem filosofia.

88.. DDeerriivvaaççõõeess

Esta secção do manual é opcional.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 4.9. Questão de revisão 1.1. 1. P ∧ Q Premissa 2. P 1, elim. da conjunção 3. P ∨ R 2, intro. da disjunção Questão de revisão 1.3. 1. P → (R ∨ S) Premissa 2. ¬R ∧ ¬S Premissa 3. ¬(R ∨ S) 2, De Morgan 4. ¬P 1, 3, modus tollens Questão de revisão 1.5. 1. ¬(¬P ∧ Q) Premissa

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Capítulo 2 Lógica proposicional 37

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2. ¬P ∧ R Premissa 3. ¬¬P ∨ ¬Q 1, De Morgan 4. ¬P 2, elim. da conjunção 5. ¬Q 3, 4, silogismo disjuntivo Questão de revisão 2.2. 1. P ∨ Q Premissa 2. P → R Premissa 3. ¬R → ¬ Q Premissa 4. ¬R Premissa da redução 5. ¬P 2, 4, modus tollens 6. Q 1, 5, silogismo disjuntivo 7. ¬Q 3, 4, modus ponens 8. Q ∧ ¬Q 6, 7, intro. da conjunção 9. R 4, 8, redução ao absurdo Questão de revisão 2.4. 1. ¬(P ∨ Q) Premissa 2. ¬P → R Premissa 3. ¬R Premissa da redução 4. ¬¬P 2, 3, modus tollens 5. ¬P ∧ ¬Q 1, De Morgan 6. ¬P 5, elim. da conjunção 7. ¬¬P ∧ ¬P 4, 6, intro. da conjunção 8. R 3, 7, redução ao absurdo Questão de revisão 2.6. 1. ¬(P → Q) Premissa 2. P → ¬R Premissa 3. R Premissa da redução 4. P ∧ ¬Q 1, neg. da condicional 5. P 4, elim. da conjunção 6. ¬R 2, 5, modus ponens 7. R ∧ ¬R 3, 6, intro. da conjunção 8. ¬R 3, 7, redução ao absurdo A última derivação pode provocar a seguinte perplexidade: Por que razão não podemos parar no passo 6? Afinal, já tínhamos concluído nesse passo o que queríamos concluir: ¬R. Não podemos parar o passo 6 porque estamos a fazer uma demonstração por redução ao absurdo. E neste tipo de demonstrações temos primeiro de encontrar uma contradição (uma fórmula da forma «A ∨ ¬A»). É por isso que

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38 A Arte de Pensar Caderno do Estudante

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usamos as linhas para demarcar a parte da demonstração que procede por absurdo. Enquanto não chegarmos a uma contradição não podemos fechar a linha, e enquanto não fecharmos a linha não podemos dar a demonstração por terminada.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 4.9. 1. Deriva as seguintes formas válidas sem recorrer à redução ao absurdo: 1) P ∧ Q, (P ∨ R) → S S 2) Q → R, ¬(¬P ∧ ¬Q), ¬R → ¬P, R 3) R, P → (¬R ∨ ¬S), S ¬P 4) ¬R → P, ¬(P ∨ Q), S R ∨ Q 5) ¬(¬P ∧ Q), R, R → ¬P ¬Q 6) S → ¬P, ¬(P → Q), ¬S → ¬R ¬R 7) ¬(S → P) → ¬P, ¬(¬P ∨ ¬Q), Q → (S → P) S → P 8) (Q → P) ∧ S, S → (P → R) ¬R → ¬Q 9) ¬(¬R ∨ ¬S) → ¬P, R, S ¬P ∧ S 10) ¬(P → ¬Q), ¬(R ∧ S) → ¬Q R 11) P ∨ (¬R → Q), P → Q, ¬Q ∧ S ¬Q → R 12) (P → Q) ∨ (Q ∨ R), (¬Q → ¬P) → R, ¬R → ¬(Q ∨ R) R 2. Deriva por redução ao absurdo todas as formas válidas do exercício ante-

rior.

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Capítulo 3 Falácias Iniformais 39

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CCaappííttuulloo 33 FFaalláácciiaass iinnffoorrmmaaiiss

Na secção 2.2. do Capítulo 2 do manual apresentam-se as seguintes falá-cias informais:

• Falso dilema • Derrapagem • Apelo à ignorância • Petição de princípio • Regressão infinita • Apelo ao povo • Apelo à misericórdia

Há muitas mais falácias informais. O que importa não é identificar nomes de falácias. O que importa é não cometer falácias na nossa argumentação e saber detectar falácias na argumentação alheia. Importa detectar falácias na argumentação alheia porque se alguém nos apresenta um argumento falacio-so, não temos mais razões para aceitar a conclusão desse argumento do que tínhamos antes do argumento; e o mesmo acontece nos nossos argumentos.

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS — SECÇÃO 2.2. Questão de revisão 2.1. O argumento é formalmente válido: tem a forma de um silogismo disjun-tivo (A ∨ B, ¬A ¬B). Contudo, é falacioso porque a primeira premissa não

esgota todas as possibilidades. Trata-se da falácia do falso dilema. A primeira premissa afirma que as verdades são todas relativas ou todas absolutas. Mas estas duas alternativas não esgotam todas as possibilidades, pois poderá dar-se o caso de algumas verdades serem relativas e outras absolutas. Logo, o argumento não nos oferece qualquer boa razão para aceitar a sua conclusão.

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Questão de revisão 2.3. O argumento é falacioso; trata-se da falácia do apelo à ignorância. A ausência de prova não é prova de ausência: ainda que seja verdade que os melhores filósofos nunca conseguiram provar que há um mundo exterior, daí não se segue que o mundo exterior é uma ilusão. Por exemplo, antes de os melhores biólogos terem provado que há organismos invisíveis a olho nu, não deixaria de ser falacioso argumentar que, por causa disso, não há organismos invisíveis a olho nu. Logo, o argumento não nos oferece qualquer boa razão a favor da ideia de que não há mundo exterior. É importante compreender que se usa muitas vezes o termo «falácia» de um modo derivado e não literal. Literalmente, uma falácia é um argumento inválido que parece válido. Mas a falácia do falso dilema, por exemplo, ocor-re muitas vezes em argumentos válidos. E por vezes diz-se que uma dada premissa ou proposição é falaciosa. Contudo, literalmente, só os argumentos podem ser falaciosos. As premissas ou proposições só podem ser verdadeiras ou falsas. Quando usamos esta forma de expressão o termo «falácia» tem um significado derivado; significa apenas que a premissa ou proposição é falsa, apesar de parecer verdadeira, e que está a ser usada num argumento como se fosse verdadeira. O resultado é um argumento que parece sólido mas não é, apesar de ser válido. E um argumento válido mas que não é sólido não apre-senta boas razões a favor da sua conclusão. Quando detectamos uma falácia, o importante é compreender por que razão se trata de um argumento que não apresenta boas razões em defesa da sua conclusão. Quando apresentamos um argumento, temos de nos perguntar até que ponto as premissas são boas razões a favor da nossa conclusão. Um argumento pode ser parecido com uma falácia informal e no entanto não ser falacioso. Tomemos o exemplo do apelo à misericórdia. Poderia pen-sar-se que o seguinte argumento é falacioso por ser um apelo à misericórdia:

Se não me ajudares atirando-me uma bóia, vou morrer afogado. Logo, deves atirar-me uma bóia.

Este argumento é muito semelhante ao seguinte: Se não me ajudar dando-me positiva, vou chumbar. Logo, deve dar-me positiva. O segundo é falacioso, mas o primeiro não é. O facto de alguém se estar a afogar é uma boa razão para lhe atirar uma bóia; mas o facto de alguém chumbar não é uma boa razão para lhe dar positiva. Porquê? Porque dar positivas ou negativas é algo que deve unicamente responder ao desempenho

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Capítulo 3 Falácias Iniformais 41

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escolar do estudante, e não ao facto de isso ajudar ou deixar de ajudar o estudante em causa. Ao passo que atirar uma bóia a alguém é algo que res-ponde, precisamente, a situações de emergência, como quando alguém se está a afogar. Se um argumento invocar razões irrelevantes para a conclusão que pre-tende estabelecer, é falacioso. Pois nesse caso as premissas não nos dão boas razões para aceitar a conclusão. Avaliar um argumento é perguntar se as premissas nos dão boas razões para aceitar a conclusão. Se a resposta for negativa, o argumento deve ser recusado. Note-se, contudo, que um argumento falacioso pode ter uma conclusão verdadeira. Provar que um argumento é falacioso não é equivalente a provar que a conclusão desse argumento é falsa; é apenas provar que esse argumen-to não nos dá boas razões a favor da conclusão — mas pode haver outros argumentos que nos dêem boas razões a favor daquela conclusão. Isto é muito fácil de ver no seguinte exemplo:

A neve é branca. Logo, Sócrates era um filósofo.

Este argumento não nos dá boas razões para aceitar a sua conclusão. Mas daqui não se segue que a conclusão é falsa. A conclusão é, de facto, verda-deira — porque há outros argumentos que nos dão boas razões a favor desta conclusão.

EXERCÍCIOS COMPLEMENTARES — SECÇÃO 2.2. 1. Avalia, comparativamente, os seguintes pares de argumentos: 1) Se legalizarmos as drogas, toda a gente poderá drogar-se. Se toda a gente puder drogar-se, acabaremos na mais completa barbá-

rie. Logo, se legalizarmos as drogas, acabaremos na mais completa barbá-

rie. 1*) Se Sócrates era ateniense, era grego. Se era grego, não era egípcio. Logo, se Sócrates era ateniense, não era egípcio. 2) A vida é sagrada. Se a vida é sagrada, o aborto é um assassínio. Logo, o aborto é um assassínio. 2*) O aborto é um assassínio. Logo, não deve ser permitido.

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3) Mais de 90% da população humana acredita num qualquer tipo de Deus.

Logo, Deus existe. 3*) Mais de 90% das pessoas acreditam que existem. Logo, essas pessoas existem. 4) Ou podemos conhecer tudo ou não podemos conhecer nada. Mas não podemos conhecer tudo. Logo, não podemos conhecer nada. 4*) Ou existo ou não existo. Mas não é verdade que eu não existo. Logo, eu existo.

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Nota final Os problemas 43

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NNoottaa ffiinnaall OOss pprroobblleemmaass

Ao longo do manual, os Problemas diferem das Questões de Revisão por três motivos: 1. As respostas às Questões de Revisão estão quase na sua totalidade no próprio manual. Para lhes responder pouco mais é necessário do que com-preender o que se estudou. Isto não acontece no caso dos Problemas. Para responder aos Problemas é necessário pensar por nós mesmos, com base no que estudámos; não basta estudar com atenção o que está no manual. 2. As respostas correctas às Questões de Revisão não permitem grandes variações; há apenas um conjunto muito restrito de variações aceitáveis nas respostas. O mesmo não acontece nas respostas aos Problemas; neste caso, é possível responder correctamente de inúmeras maneiras. O que é mais impor-tante na resposta aos Problemas são as justificações apresentadas, e não a resposta em si. 3. As respostas às Questões de Revisão quase não exigem qualquer tipo de capacidade discursiva: basta dizer mais ou menos pelas mesmas palavras o que se acabou de estudar. O mesmo não acontece no caso dos Problemas, que exigem alguma capacidade discursiva. Isto é, exigem a capacidade para articular um pequeníssimo ensaio (por vezes, é apenas um parágrafo) que responda ao problema. Por vezes, o grupo de respostas correctas aos Problemas é mais restrito; outras vezes é completamente aberto. Por exemplo, os dois Problemas da secção 1.1. só podem ser correctamente respondidos de formas relativamen-te restritas. No caso do Problema 1, qualquer resposta que afirme que a frase «Há seres inteligentes noutros planetas» não exprime uma proposição está errada. A resposta correcta é a seguinte:

A frase «Há seres inteligentes noutros planetas» exprime uma propo-sição apesar de ninguém saber se a frase é verdadeira ou falsa. Isto por-que o que determina se uma frase exprime uma proposição não é o facto

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de alguém conhecer o valor de verdade dessa frase, mas simplesmente o facto de essa frase ter um valor de verdade, ainda que ninguém saiba qual é. Ora, a frase dada tem sem dúvida um determinado valor de ver-dade, conforme há ou não seres inteligentes noutros planetas, e por isso exprime uma proposição, apesar de ninguém conhecer o seu valor de ver-dade.

Como se vê, este tipo de resposta exige uma articulação de ideias que as respostas às Questões de Revisão não exigem. É necessário compreender a matéria dada no manual, mas é também necessário pensar e depois saber organizar uma resposta articulada. E como se aprende a fazer isto? Praticando; pensando; comparando res-postas de diferentes colegas; discutindo as respostas com o professor. Não há receitas automáticas para aprender a fazer filosofia, tal como não há receitas automáticas para aprender a fazer seja o que for. Há algumas técnicas, e há alguns elementos firmes que temos de dominar, mas depois é necessário ser criativo e caminhar pelos nossos próprios pés.

11.. CCoommoo rreessppoonnddeerr aaooss PPrroobblleemmaass

Uma das técnicas que nos pode ajudar a responder correctamente aos Problemas é pensar no seguinte: «Que elementos da matéria dada são rele-vantes para responder ao Problema?» No exemplo dado, verifica-se que os elementos fundamentais para dar uma resposta correcta se encontram no manual:

• Uma frase pode ter valor de verdade ainda que ninguém saiba qual é; • Uma frase exprime uma proposição desde que tenha valor de verdade

Responder ao Problema dado é uma questão de saber isolar estes elemen-tos nos quais a resposta tem de se basear e depois organizar um pequeníssimo ensaio que articule esses elementos de forma a responder ao que está em causa. Precisamente porque estamos no início do manual e porque a lógica é uma disciplina exacta, os Problemas do Capítulo 1 têm quase todos respostas determinadas à partida — isto é, se alguém responder que «Há vida inteligen-te noutros planetas» não exprime uma proposição, esse estudante está a dar uma resposta errada. Mas noutros capítulos do manual isto não acontece: tanto se pode responder «sim», «não» ou até «talvez»!

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Nota final Os problemas 45

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22.. MMúúllttiippllaass rreessppoossttaass ccoorrrreeccttaass

Vejamos um exemplo: no Capítulo 2, secção 1.3., o Problema 1 pode ser respondido de maneiras muito diferentes. Tanto se pode concordar como discordar. Não é a concordância ou discordância que torna a resposta correc-ta ou errada. O que conta, nestes casos, é a justificação. Vejamos dois exemplos de respostas possíveis, igualmente correctas, mas que respondem de formas opostas:

Concordo com o argumento dado porque se compararmos as duas hipóteses vemos que quando um orador é honesto há menos probabilida-de de ele nos estar a enganar e a conduzir ao erro. Imaginemos um ora-dor honesto, que está a dizer-nos o que genuinamente pensa. É verdade que ele pode estar a conduzir-nos ao erro porque ele próprio pode estar enganado. Mas a probabilidade de isto acontecer é menor do que no caso do orador desonesto. Pois neste último caso, à probabilidade normal de ele poder estar enganado soma-se a probabilidade de ele saber a verdade mas estar deliberadamente a enganar-nos porque isso lhe convém. Logo, sempre que um orador é honesto há mais razões para aceitar o que ele diz do que quando um orador é desonesto.

Compare-se agora com outra resposta, igualmente correcta, mas oposta:

Discordo do argumento dado porque se compararmos as duas hipóte-ses vemos que o facto de um orador ser honesto não é suficiente para que a probabilidade de ele nos enganar ser menor do que a de um orador desonesto. A falácia de pensar o contrário consiste em presumir que o orador desonesto é quase omnisciente: que, quando ele pensa que nos está a enganar, está realmente a enganar-nos. Mas isso é falso. Um ora-dor pode ser desonesto porque está a afirmar que é verdade o que ele pensa que é falso; mas ele pode estar enganado e o que ele pensa que é falso ser de facto verdadeiro. Portanto, tanto faz que um orador seja honesto como desonesto: a probabilidade de engano é sempre a mesma. É por isso que o que conta na argumentação é exclusivamente o valor dos próprios argumentos e não o carácter do orador.

Como se vê, as duas respostas são opostas. Mas ambas estão correctas. Porquê? Porque ambas articulam os elementos essenciais necessários para uma resposta correcta; porque nenhuma delas comete falácias evidentes; porque ambas justificam de forma sólida e sóbria o que defendem. Assim, muitos dos problemas admitem mais de uma resposta correcta. Mas daqui não se segue que tudo é subjectivo e que se pode dizer tudo. Algumas respostas são erradas:

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Concordo porque a probabilidade é menor e além disso quem nos quer enganar é porque está a dizer falsidades e portanto não devemos confiar nele.

Esta resposta está errada porque não é articulada, não justifica o que defende, não revela qualquer reflexão pessoal e nem sequer uma compreen-são mínima da matéria dada. O facto de concordar é irrelevante. Se discor-dasse mas tivesse a mesma falta de articulação, justificação, reflexão e compreensão, a resposta estaria igualmente errada.

33.. AAccttiivviiddaaddeess

Muitos dos Problemas sugeridos podem e devem ser aproveitados para realizar diferentes tipos de actividades. Por exemplo, o Problema 2 da sec-ção 3 do Capítulo 2 é evidentemente uma actividade que implica a interac-ção entre estudantes. Mas muitos outros problemas podem e devem ser usa-dos para organizar actividades na sala de aula. Por exemplo, o Problema 1 da secção 2.2. do mesmo capítulo pode ser respondido por cada estudante indi-vidualmente, mas também pode e deve ser discutido na sala de aula. Discutir filosofia oralmente é um dos aspectos centrais do nosso estudo. E como se discute filosofia oralmente? Uma vez mais, não há receitas, tal como não há receitas para saber escrever boas respostas e bons ensaios. Mas há alguns elementos que nos ajudam a discutir melhor, muitos dos quais são exactamente os mesmos que nos ajudam a escrever melhor: ao discutir filoso-fia oralmente é necessário articular os elementos essenciais necessários para uma resposta correcta; não cometer falácias evidentes; procurar justificar de forma sólida e sóbria o que se defende; ouvir com atenção as ideias e objec-ções dos outros e responder-lhes adequadamente e sem ataques pessoais. Discutir ideias em filosofia é uma das experiências humanas mais ricas, com a qual se aprende imenso; é como entrar na cabeça das outras pessoas e ver o mundo a partir dos olhos delas; aprendemos a ver coisas que antes não víamos, e corrigimos mutuamente os nossos erros e distracções. Mas para que a discussão filosófica seja uma experiência enriquecedora é necessário enca-rá-la com seriedade, com o objectivo de descobrir a verdade, e não com o objectivo de «ganhar a discussão» ou de exibir superioridade perante os outros. Ensinar a fazer isto foi um dos objectivos que nos levaram a escrever este manual.