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Livro Universidades Completo Inep

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  • A Universidade no Brasil: concepes e modelos

    Braslia-DF 2011

  • PRESIDENTE DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASILDilma Rousseff

    MINISTRO DA EDUCAOFernando Haddad

    SECRETRIO EXECUTIVO DO MECJos Henrique Paim

    PRESIDENTE DO INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANSIO TEIXEIRAMalvina Tuttman

  • A Universidade no Brasil: concepes e modelos

    2 edio

    Organizador Geral da Edio e Presidente da Direo Editorial:Marilia Costa Morosini (PUC-RS)

    Direo Editorial:Afrnio Mendes Catani (USP)

    Maria Estela Dal Pai Franco (UFRGS)Stella Maria Meneguel (Furb)

    Valdemar Sguissardi (UFSCar/Unimep)

    Braslia-DF

    GT Poltica de Educao Superior/Anped

    2011

  • COORDENAO-GERAL DE ESTATSTICA DA EDUCAO SUPERIORJaime Giolo

    COORDENAO-GERAL DE AVALIAO INSTITUCIONAL E DOS CURSOS DE GRADUAOIara de Moraes Xavier

    COORDENAO-GERAL DO EXAME NACIONAL DE DESEMPENHO DOS ESTUDANTESAlmir Limana

    ASSESSORIA EXECUTIVA DA DEAES/INEPKarla Tadeu Duarte de OliveiraPalmira Gass Sevegnani de Freitas

    AUXILIARES DE PESQUISASCamila de Souza Soares (CNPq)Carine Gass Portela (FAPERGS)

    REVISOOsmar dos Santos

    DIAGRAMAOMrcia Terezinha / Jos Miguel dos Santos

    PROJETO GRFICO / CAPAMarcos Hartwich

    EDITORIASRTVS - Quadra 701, Bloco M - Edifcio Sede - 6 andarCEP: 70340-909 - [email protected]

    A universidade no Brasil: concepes e modelos / Marilia Morosini, organizadora. Braslia: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira, 2006.

    297 p.

    ISBN 85-86260-28-2

    1.Educao superior. 2. Universidade Brasil. I. Morosini, Marilia. II. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira. III. Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao.

    CDU 378(81)

  • 5SUMARIO

    PRLOGO .......................................................................................................................................... 7

    PARTE I A UNIVERSIDADE BRASILEIRA NO SCULO XXI E O MODELO UNIVERSITRIO INICIAL

    CAPITULO 1 A universidade brasileira em tempos de contemporaneidade ...................................... 23Dilvo Ristoff

    CAPITULO 2 UDF: Construo criadora e extino autoritria ......................................................... 37Maria de Lourdes de Albuquerque Fvero (UFRJ/UCP)

    PARTE II CONCEPES E MODELOS UNIVERSITRIOS: UNIVERSIDADES FEDERAIS

    CAPITULO 3 UFPR: Uma universidade para a classe mdia ........................................................... 53Regina Michelotto (UFPr)

    CAPITULO 4 UFRJ: Origens, construo e desenvolvimento ......................................................... 65M. de Lourdes de A. Fvero (UFRJ/UCP))Helena Ibiapina Lima (UFRJ)

    CAPITULO 5 UFRGS: Da Universidade Tcnica universidade inovadora .................................... 81Maria Estela D. P. Franco (UFRGS)Marlia Morosini (PUC-RS)

    CAPITULO 6 UFMG: Projeto intelectual e poltico de universidade ................................................... 97Maria do Carmo Lacerda Peixoto (UFMG)

    CAPITULO 7 UnB: Da universidade idealizada universidade modernizada................................ 113Joo Ferreira de Oliveira (UFGLuis Dourado (UFG)Erasto Fortes Mendona (UnB)

    CAPITULO 8 Ufal: De um fenmeno tardio a uma maturidade singular.......................................... 133M. das Graas Medeiros Tavares (Ufal)Elcio de Gusmo Verosa (Ufal)

  • 6CAPITULO 9 UFPA: Um modelo de universidade multicampi para a Amaznia .............................. 142Vera Jacob Chaves (UFPA)Olgases Cabral Maus (UFPA)Luciene de Medeiros (UFPA)

    CAPITULO 10 Unifesp: De uma Escola Livre de Medicina Universidade da Sade ..................... 155Otilia Seiffert (Unifesp)

    Universidades comunitrias e confessionais

    CAPITULO 11 PUC-RJ: Pioneirismo e mudana ........................................................................... 173Stela Ceclia Segenreich (UCP)

    CAPITULO 12 PUC-RS: Uma universidade inovadora no contexto de confessionalidade ............... 187Maria Helena AbrahoMarlia Morosini (PUCRS)

    CAPITULO 13 Unimep: Haver um modelo confessional de universidade brasileira? .................... 201Joo dos Reis Silva Jnior (UFSCAR)

    CAPITULO 14 Uniju: Expresso do segmento comunitrio........................................................... 217Mariluce Bittar (UCDB)

    Universidades estaduais

    CAPITULO 15 A USP e a formao de quadros de dirigentes. ..................................................... 231Ana Paula Hey Afrnio Catani (USP)

    CAPITULO 16 Uerj: Da gnese utilitria aos compromissos pr-cincia. .................................. 245Deise Mancebo (UERJ)

    CAPITULO 17 Unicamp: Crebros, crebros, crebros ................................................................. 255Stella M. Meneghel (Furb)

    PARTE III DESAFIOS DOS MODELOS UNIVERSITRIOS

    CAPITULO 18 Entre a tradio e a renovao: os desafios da universidade empreendedora .......... 265Jorge N. Audy (PUC-RS)

    CAPITULO 19 Universidade no Brasil: dos modelos clssicos aos modelos de ocasio? .............. 275Valdemar Sguissardi (Unimep)

    COLABORADORES ......................................................................................................................... 291

  • 7PRLOGO

    O mundo da educao superior est em efervescncia como nunca antes. Organismos multilaterais, naes desenvolvidas ou emergentes, estados-nao, instituies universitrias e a prpria comunidade acadmica tendem a afirmar que as instituies de educao superior esto em crise. Corrobora para tal o surgimento de teorias Ps-modernas sobre a Universidade difundindo a crena que a sociedade de hoje transformou-se: vivemos numa era da informao onde o conhecimento fragmentado por sua instrumentalizao e por sua concepo como comodities. No perodo histrico-social anterior o moderno, a essncia da universidade era a construo da narrativa totalizante, tornando-se, hoje, uma instituio de menor importncia para as demandas polticas e culturais da condio ps-moderna. reconhecido, por um lado, o declnio do monoplio do conhecimento na universidade e em suas antigas funes e, por outro lado, a existncia atual de uma diversidade de modelos de universidades e tipos de conhecimento. A universidade ps-moderna (Delanty, 2001) contesta o conhecimento global e reconhece a emergncia de conhecimentos locais. Existem muitos tipos de conhecimento e um crescente ceticismo sobre a afirmao do universalismo construdo sobre valores da racionalidade cognitiva. (Morosini, 2003)

    Frente a este quadro esto sendo realizados inmeros estudos sobre a educao superior em diferentes nveis1. Paradigmas esto sendo questionados e regras so ditadas novos modelos so propostos. Sob os tradicionais modelos universitrios humbolditianos e francs-napolenico so ofertados o modelo empresarial, o internacional e o da universidade empreendedora e sustentvel (Clark, 2000), entre outros. Nesta sociedade do conhecimento questes tais como: captao de crebros, manuteno da qualidade internacional, barreiras comerciais, propriedade intelectual e rompimento da lacuna digital, so postas como agenda. Smart (2005, p. 107) nos alerta que a orientao econmica com respeito ao conhecimento deixa de lado para paises em desenvolvimento, a considerao da importncia do uso do conhecimento para a busca de maior equidade nas suas sociedades ou ainda, do uso do conhecimento produzido como ferramenta de desenvolvimento.

    No Brasil o ensino superior brasileiro tem suas razes no incio do sculo XIX em escolas isoladas, profissionalizantes e localizadas em centros urbanos de maior porte. So identificadas, em 1808, a Academia de Marinha (Rio de Janeiro) e a Cadeira de Anatomia da Escola de Cirurgia no Hospital Real da Bahia. (ver quadro 1). de 1920 a criao da URJ. Entretanto a universidade, como instituio s tem possibilitado seu surgimento formal, em 1931, com o Estatuto das Universidades Brasileiras. de 1934 a UPA Universidade de Porto Alegre, de 1935 a UDF, de 1946 a PUC-Rio, de 1948 a PUCRS, de 1950 a UERJ. Em 1968 temos uma reforma universitria com modelo humboldtiano, e em 1994 a criao da UNIFESP. Em 1996, com a aprovao da nova LDB Lei Diretrizes e Bases da Educao Nacional, se oportuniza, pela flexibilizao o surgimento de outros modelos universitrios. Paralelo a isto o sistema de educao superior se expande aceleradamente. Durante dois sculos praticamente estes modelos se mantiveram presentes, basta lembrar que, no panorama maior, a instituio universitria uma das poucas instituies que subsistem desde a idade mdia.

    Neste contexto brasileiro de formalismo normativo na Educao Superior (ver quadro 2) o sculo XXI marcado, j em seu incio, por uma nova proposta de reforma universitria que est prestes a ser legislada. Ela vem sendo discutida e ora encontra-se no congresso para ser votada.

    1 Merecem destaque aqueles que objetivam realizar estados de conhecimento da rea, atravs de enciclopdias ou similares, sejam na pers-pectiva de sistema educacional e/ou de disciplina (Dunkin, 1987, Husen & Postlewaite, Neville, 1995, Clark, Neave, 1995, Anderson, 1995, Knowles, 1997, Teichler, 2001, Spafford, Pesce, 1998, Favero, Britto, 2002), e/ou seja, na perspectiva institucional (Altbach, 1991, Ferguson, 2002, Ridder- Symoens, 1996, 2002).

  • 8Frente aos arrazoados da presso global, da perspectiva espao tempo podemos nos questionar: existe uma experincia brasileira de universidade? Como podemos identific-la? Quais so os traos universais e especficos que a experincia nos ensina? A busca de resposta a tais questes a contribuio que este livro pretende oferecer a seus leitores.

    Os autores da obra

    A Universidade no Brasil: concepes e modelos mais um trabalho da Rede UNIVERSITAS. Esta rede tem no seu bojo um projeto de pesquisa integrado, iniciado em 1993 e formalmente apoiado pelo CNPq, desde 1996, que apresenta como principais objetivos analisar e avaliar a produo cientfica sobre educao superior, no Brasil, a partir de 1968, e desenvolver uma Biblioteca Virtual, Universitas/Br, contendo documentos sobre o tema (http://www.pucrs.br/faced/pos/universitas). UNIVERSITAS rene um grupo de pesquisadores e de bolsistas da UFRGS, FURB, UFPR, UFRJ, UCP, UERJ, UFMG, UNIMEP, UNIFESP, UFAL, UFPA, UFMT, UFG, UCDB, USP, PUCRS, UFSCAR congregados no GT Poltica de Educao Superior da ANPED Associao Nacional de Ps-graduao e Pesquisa em Educao.

    A rede UNIVERSITAS tem a riqueza de ser constituda por pesquisadores de diferentes IES brasileiras e que vm estudando instituies universitrias h um largo tempo. Corroborando com a experincia da rede para produzir sobre o tema, importante afirmar que obras de largo espectro so praticamente impossveis de serem escritas isoladamente. A este fator se agrega o objeto do livro diferentes instituies de educao superior brasileiras. Tal tema implica em conhecimento aprofundado de 15 IES. E, isto s foi possvel porque seus autores j vem escrevendo sobre a sua instituio e/ou sobre a instituio que analisam neste livro.

    A produo deste livro fruto de uma metodologia de trabalho que vem consolidando a rede UNIVERSITAS: uma forma de ao construda a partir das discusses entre os membros do grupo, todos os pesquisadores do objeto educao superior, mas com diferenciadas percepes e diferenciadas participaes em grupos nacionais e internacionais. O que nos une a pesquisa em educao superior dirigida pelas grandes linhas da ANPED. Representamos diferentes regies do pas e diferentes universidades.

    Neste contexto interativo a obra surgiu do amadurecimento do projeto2. A idia inicial deste livro seria a construo de uma Enciclopdia Brasileira de Educao Superior EBES, em moldes j existentes em outros paises, com abordagens tericas, disciplinares, transdisciplinares e enriquecida pela experincia do nosso estado-nao. As discusses com colegas, e aqui realizo um agradecimento especial professora Stella Meneguel, que pacientemente, foi apresentando pontos e ajudando a construir a idia deste livro, nos levou a estudar o problema de um ngulo mais focado, mas suficientemente importante na perspectiva epistemolgica. Ou seja, o objeto deste livro so estudos sobre instituies de educao superior brasileiras que se constituem

    2 A rede UNIVERSITAS j publicou coletivamente 10 livros, a saber: SGUISSARDI, V. (Org). Polticas Pblicas para Educao Superior. Piracicaba: UNIMEP, 1997; SGUISSARDI, MOROSINI (Orgs). Educao Superior em Peridicos Nacionais. Vitria: FCAA/UFES, 1998; CATANI (ORG). Novas perspectivas nas polticas de Educao Superior na Amrica Latina no limiar do sculo XXI. Campinas: Autores Associados, 1998; PEIXOTO, M.C. (org.) Educao Superior: avaliao da produo cientifica. Belo Horizonte: Imprensa Universitria, 2000; SGUISSARDI, SILVA JUNIOR (Orgs). Educao Superior: Anlises e perspectivas de pesquisa. So Paulo: Xam Editora e Grfica Ltda, 2001; CAMARGO, JACOB, (Orgs). Mltiplos Olhares sobre Educao Superior: A pesquisa como fio condutor. Belm do Par: CEUFPA, 2001; MOROSINI, M. C. (Org.). Educao Superior em Peridicos Nacionais (1968-1995). Braslia: INEP/MEC, 2001; DOURADO, CATANI, OLIVEIRA. (Orgs). Polticas e gesto da educa-o superior. Goinia, EdUFG, 2002; BITTAR, MOROSINI, SILVA Junior (Orgs). Revista ESTUDOS. Numero Especial Educao Superior. Campo Grande, EdUCDB, 2004; FAVERO, MANCEBO (Orgs). UNIVERSITAS: polticas, avaliao e trabalho docente.So Paulo: Cortez, 2004.

  • 9e/ou se constituram em pontos de referncia da viso do pas sobre a instituio universitria. Provavelmente uma outra obra mais detalhada, envolvendo um nmero maior de IES e, portanto bem mais longa ser produzida pela Rede Universitas. Assim, neste processo de produo coletiva por telefone, por e-mail e face to face a obra foi se delineando e se consolidando nos seminrios da rede na UERJ3 e aps no na UFRGS/PUCRS4. Aqui agradeo a colega professora Maria Estela Dal Pai Franco que coordenou, de forma impar, o seminrio de Porto Alegre, no qual foram apresentados trabalhos iniciais sobre modelos universitrios no Brasil. A discusso sobre o contedo da obra continuou na 28 reunio Anual da ANPED, em Caxambu, em outubro de 2005.

    Objetivo da obra

    O principal objetivo da obra recuperar, mostrar e problematizar a experincia universitria no Brasil sob a tica dos modelos clssicos de universidade, isto , os mais conhecidos na experincia brasileira: o napolenico ou profissional e o humboldtiano ou de pesquisa e todas as suas possveis variantes, que podem se revelar em cada uma das trajetrias das instituies escolhidas. A obra visa abordar algumas especificidades da experincia universitria no Brasil, numa eventual comparao com a experincia europia, norte-americana ou mesmo latino-americana.

    Uma coletnea sobre um tema delimitado neste caso, modelos de universidade no Brasil, precisa ter um razovel grau de homogeneidade, voltada ao que se pretende com ela. Neste entender alguns traos comuns aos diferentes captulos, cada qual abordando a experincia de uma dada universidade, com suas caractersticas gerais e especficas.

    Assim, na abordagem da trajetria de cada uma das IES escolhidas, algumas questes buscaram ser respondidas, sem prejuzo de outras que tenham resposta especfica, dada histria e contribuio particular de cada instituio. Entretanto importante ressaltar que mesmo com a construo de diretrizes o resultado aqui apresentado, revela autonomia do pesquisador nas formas de abordagem e no prprio objeto do estudo proposto.

    1. Em que circunstncias (contexto scioeconmico-poltico e cultural) nasce a IES, por iniciativa (patrocnio) de quem e com que objetivos proclamados em relao ao ensino, pesquisa e extenso?

    2. Como se estruturou inicialmente e atravs do tempo do ponto de vista organizacional? Como se colocou a questo do poder (reitoria, rgos colegiados), se pblica, se privada?

    3. possvel definir e como se caracterizam as principais etapas de sua trajetria, em termos de ensino de graduao, ps-graduao e pesquisa e extenso?

    3 IX Seminrio do Projeto UNIVERSITAS A sociedade do conhecimento no novo milnio, de 11 a 13 de maio de 2005 teve por temtica central a discusso dos impactos provocados pelas mudanas contemporneas especialmente, as novas e aceleradas demandas que se fazem pre-sentes para a produo cientfica e tecnolgica na produo acadmica sobre educao superior.

    4 X Seminrio do Projeto UNIVERSITAS Educao Superior no Brasil em Mudana: Estado do Conhecimento, Teoria & Prtica, de 3 a 5 de agosto de 2005, teve entre seus objetivos socializar produes acadmicas que articulem teoria & prtica em Educao Superior e focalizem concepes/modelos de universidade.

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    4. Como se caracteriza hoje a instituio sob a tica dos modelos universitrios clssicos e das novas tendncias de reconfigurao das IES em instituies neoprofissionais, tecnolgicas e/ou voltadas exclusivamente para o mercado? Como cada IES analisada est enfrentando os desafios da integrao ensino-pesquisa (e extenso) atuais?

    5. Como se tem colocado nessa perspectiva, as questes de financiamento, autonomia, avaliao, democratizao, relao pblico-privado?

    6. Quais so, do ponto de vista dos modelos, os traos mais marcantes da experincia da IES em anlise? O que a diferenciaria das demais universidades brasileiras? As IES estudadas, alm de traos comuns s demais, tm suas marcas prprias; quais so essas marcas?

    No se trata de contar a historia e sim de identificar momentos, personagens e traos marcantes da IES, na medida do possvel sob a tica dos modelos universitrios, tais como consubstanciados na experincia universitria no Brasil.

    O sistema de educao superior brasileiro ps LDB de 1996 no apresenta mais a afirmao de um modelo nico, no caso o das federais, mas a possibilidade de formalizao de diversos modelos institucionais. O SNES conta hoje com 2230 IES Em anexo, a relao das IES no Brasil, segundo o censo de 2004 (INEP, 2005). Deste total 11,1% publicas e 88,9% privadas (1652). Na primeira modalidade esto agregadas as federais ou estaduais ou municipais. Na segunda as particulares ou confessionais e/ou comunitrias. Ainda podem ser universidades (163), centros universitrios (81), escolas, institutos ou faculdades isoladas (1 403) e centros tecnolgicos (93).

    Estrutura da obra

    Orientada pela complexidade do sistema nacional de educao superior em termos de diversidade organizacional e a dependncia administrativa a obra Universidade no Brasil: concepes e modelos se constitui pela proposta de trs partes interligadas.

    A Parte I A universidade brasileira no Brasil no sculo XXI e o modelo universitrio inicial apresenta uma viso geral do sistema de educao superior no pais e a primeira organizao universitria. A Parte II Concepes e modelos universitrios descreve e analisa 15 significativas universidades brasileira congregadas segundo uma combinao das categorias organizao acadmica e dependncia administrativa. So estudadas as federais, as confessionais e comunitrias e as estaduais. E, a parte III Desafios dos modelos universitrios, finaliza com um ensaio que prope uma analise integrada dos diversos modelos consubstanciados em IES e com os desafios de um modelo que considera a inovao.

    As IES no Brasil neste sculo so um modelo de universidade marcante composta de dois captulos, a saber:

    A universidade brasileira em tempos de contemporaneidade, escrito por Dilvo Ristoff (Diretor de Avaliao e Estatstica da Educao Superior/Inep)

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    A Universidade do Distrito Federal: construo criadora e extino autoritria, escrito por Maria de Lourdes de Albuquerque Fvero (UFRJ/UCP) analisa as origens e a instituio da Universidade do Distrito Federal (UDF), idealizada por Ansio Teixeira, em meio agitao poltica que marcava o pas, s tendncias centralizadoras do poder institudo e s disputas pelo controle da educao nos anos 1930. Assinala o papel renovador dessa Universidade, mediante definio clara de suas funes, com nfase no ensino e na pesquisa, alm de se preocupar em promover cultura, formar profissionais em diferentes campos de atuao, bem como de prover a formao do magistrio em todos os nveis. Mostra que para realizar sua proposta a UDF convocou misses de professores estrangeiros que, juntamente com brasileiros, deixaram suas marcas no ensino e na pesquisa, utopia vetada, mas tambm como uma experincia universitria fecunda, considerando o momento histrico que o pas atravessava, desde sua criao em 1935 e sua extino em 1939.

    A Parte II Concepes e modelos universitrios, est composta por exemplos de universidades brasileiras federais ou comunitrias e/ou confessionais, ou estaduais. No caso das Universidades Federais, so apresentados os seguintes captulos de:

    UFPR: Uma universidade para a classe mdia, escrito por Regina Michelotto (UFPr), que teve como fio condutor um dos aspectos peculiares que forjaram a instituio desde o momento da criao: a inteno de evitar que ela servisse apenas elite, uma vez que esta era constituda de um nmero no significativo de indivduos. Situada em um estado da federao cuja populao, comparada do vizinho So Paulo, a UFPr no se destacava por empreendimentos formidveis, geradores de grandes fortunas e assim, recebeu, ao ser criada, a marca da adequao s necessidades da classe mdia. Foi possvel captar, em diferentes momentos da histria dessa instituio, aproximaes com modelos de universidade considerados clssicos.

    UFRJ: Origens, construo e desenvolvimento, escrito por M. de Lourdes de A. Fvero (UFRJ/UCP) e Helena Ibiapina Lima (UFRJ), que resgata concepes de universidade que marcam a histria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) a partir de 1920, criada sob a denominao de Universidade do Rio de Janeiro (URJ). Analisa sua reorganizao na Reforma Campos (1931), bem como sua instituio em 1937 pela Lei n 452/37 como Universidade do Brasil (UB), denominao que permanece at 1965. Situa a UFRJ aps a Reforma Universitria de 1968 e discute questes referentes instituio na atualidade. Indica percepes do princpio de autonomia universitria, inerentes ao governo da Universidade. Identifica no seu interior grupos, que protagonizaram sua construo, destacando o papel, a composio e o poder decisrio dos rgos colegiados. Assinala as condies institucionais para o desenvolvimento do ensino, da pesquisa e da extenso, na busca da produo e socializao do conhecimento.

    UFMG: projeto intelectual e poltico de universidade, escrito por Maria do Carmo Lacerda Peixoto (UFMG), parte da constatao que a universidade parte integrante de um projeto poltico: da Inconfidncia Mineira sua criao como Universidade de Minas Gerais no incio do sculo XX, com a misso de promover a emancipao cultural do estado frente ao predomnio das elites paulista e fluminense. Tendo entre seus fundadores alguns membros da gerao que proclamou a Repblica, a estruturao do pas numa federao se relaciona, de certo modo, com esse iderio. Essa misso vai se fazer presente ao longo dos quase oitenta anos da trajetria dessa universidade, em articulao com o papel que desempenhou no conjunto das universidades brasileiras. No debate sobre a reforma universitria da dcada de 60, a UFMG desempenhou papel de vanguarda no processo de reforma e modernizao da estrutura universitria brasileira. De forma pioneira no pas, ela conduziu esse processo no perodo de 1964 a 1967, constituindo a conexo mineira para difuso do modelo estrutural da Universidade de Braslia para outras universidades e, mesmo, para a legislao federal. Diante

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    da impossibilidade que se instaurou, no perodo militar, para dar continuidade implementao do projeto daquela universidade, a UFMG desempenhou, nesse contexto, o papel de um modelo alternativo atraente para a modernizao das demais universidades. No contexto atual, a misso de emancipao cultural do estado da UFMG pode ser ainda identificada na sua busca por constituir-se em instituio de referncia nacional. Essa misso se encontra, agora, situada em outro patamar, em que comprometida com propostas de solues para o desenvolvimento scio-econmico e cientfico e tecnolgico do pas, ela tem buscado afirmar-se como uma instituio onde se focaliza no apenas a excelncia da pesquisa e do ensino, mas tambm se faz presente o foco sobre a relevncia cientfica e social do que produz frente s desigualdades de toda a ordem presentes na sociedade brasileira.

    UFRGS: Da Universidade Tcnica universidade inovadora, escrito por Maria Estela D. P. Franco (UFRGS) e Marlia Morosini (PUCRS) recompe a trajetria da instituio atravs de princpios de anlise de contedo e identificao de categorias. Foram consultados estudos e/ou escritos sobre a UFRGS, documentos oficiais e sites institucionais. Na gnese da UFRGS as instituies isoladas so antecipativas s normas do Estado-Unio. Na Escola de Engenharia (1896), a estruturao e as finalidades se aproximavam da idia de universidade do conhecimento a servio da hegemonia do Estado-RS. A UPA (1934) tem a marca da articulao de interesses e a URGS (1947) representa a associao para a regionalizao. A URGS das dcadas de 1950 e 60, federalizada, forja condies de pesquisa atravs de institutos universitrios (1952-1964). A UFRGS na dcada de 1970, com a Ps-graduao, eivada de dualidades, em parte decorrentes do modelo hbrido que sobrepe a produo de pesquisa ao modelo da transmisso do conhecimento. A UFRGS dos anos de 1980 a dos fruns, da participao e dos movimentos de articulao associativa, forjando novas relaes e interlocues. A UFRGS dos anos de 1990 a da consolidao de grupos de pesquisa e insero internacional, associando desenvolvimento e progresso tecnolgico. A depauperizao do pblico contribui para a vinculao universidade-empresa prestao de servios. O estudo conclui que desde a gnese duas marcas vocacionais esto presentes: a produo e disseminao do conhecimento e a formao da nova gerao de pesquisadores.

    UnB: Da universidade idealizada universidade modernizada, escrito por Joo Ferreira de Oliveira e Luis Dourado (UFG) e Erasto Fortes Mendona (UNB), que analisam a trajetria da Universidade de Braslia envolvendo o processo de criao, estruturao e consolidao desta instituio. O exame do contexto histrico e das polticas educacionais direcionadas educao superior servem como pano de fundo e balizamento para a compreenso da especificidade da UnB. A anlise evidencia trs perodos marcantes na estruturao desta universidade: a dos reitores idealizadores e fundadores (1961-1964), a dos interventores (1964-1985) e a dos reitores eleitos pela comunidade universitria. Verifica-se que a UnB transitou de uma fase de sonhos para uma nova fase de modernizao passando por um interregno de intervenes, lutas e resistncias no perodo do regime militar. A instituio ao buscar resgatar a sua identidade inicia novo processo de modernizao que tem como uma de suas marcas a indissociabilidade ensino, pesquisa e extenso e o seu alto potencial de arrecadao e gerao de recursos prprios, o que a distingue do conjunto das universidades federais. De modo geral, a trajetria da UnB evidencia sua contribuio para a formao de um modelo de universidade brasileira tendo influenciado na estruturao das demais IFES.

    Ufal De um fenmeno tardio a uma maturidade singular, escrito por M. das Graas Medeiros Tavares e Elcio de Gusmo Verosa (UFAL), busca recuperar, mostrar e problematizar a experincia da Universidade Federal de Alagoas sob a tica dos modelos clssicos de universidade: o napolenico ou profissional e o humboldtiano ou de pesquisa. Discute que, apesar de ter sido criada atravs de escolas privadas, paradoxalmente promoveu uma democratizao de oportunidades de acesso ao ensino superior. Analisa sua estrutura organizacional e a

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    forma como se efetiva o poder constitudo e revela as etapas de sua trajetria, destacando a luta de professores e estudantes para sua criao. Coloca que, at o final da dcada de 80, a UFAL detinha fortes caractersticas do modelo napolenico profissionalizante. Explicita que o ethos da sociedade que a cria, mantm e com ela interage foi o que determinou sua forma de realizar permanncias e rupturas internas no seu padro de atuao. Afirma que apesar de ter se constitudo tardiamente a UFAL hoje pode ser vista como uma Instituio com fortes traos do modelo humboldtiano de pesquisa, concluindo que a UFAL, atenta necessidade de se fazer legtima frente sociedade que a sustenta, vem desenvolvendo aes de ensino, pesquisa e extenso voltadas a solues especficas para os problemas do Estado e demandas regionais, o que torna impossvel reduzi-la a modelos apontados como paradigmticos fora e dentro do pas.

    UFPA: Um modelo de universidade multicampi para a Amaznia, escrito por Arlete Camargo, Luciene Medeiros, Olgases Cabral Maus e Vera Jacob (UFPA) que realizam uma retrospectiva histrica do surgimento da UFPA na dcada de 1950, como resultado da aglutinao de algumas instituies isoladas de ensino superior, pblicas e privadas, chegando at os dias atuais. Foram analisados os primrdios da instituio, o seu crescimento e o processo de transformao em uma universidade multicampi. O processo de interiorizao inicia na dcada de 1970 com os primeiros ncleos, enquanto influncia do Projeto Rondon e do Crutac, passando pela criao do Projeto de Interiorizao em 1986, com os Cursos Intervalares e com a criao dos campi universitrios em 8 municpios do Estado do Par. A consolidao do processo de interiorizao da UFPA ocorre com a implantao de Cursos regulares, em carter permanente, durante o ano letivo. A Universidade Multicampi contribui para o desenvolvimento poltico, social e econmico da regio, pelo crescimento numrico e qualitativo que teve com a adoo desse modelo.

    Unifesp: de uma Escola Livre de Medicina Universidade da Sade, escrito por Otilia Seiffert (Unifesp), destaca que a formao dessa Universidade, a primeira universidade especializada no pas, nos remete Escola Paulista de Medicina-EPM, fundada, em 1933, como instituio privada e federalizada em 1956, que se revela fundamental consolidao das cincias da sade no processo de formao da sociedade paulista na poca e tambm da prpria cincia nacional. A EPM pioneira na implantao do primeiro Hospital-Escola e Residncia Mdica (1957), colocando o saber mdico como organizador dos servios de sade. Representantes da elite cientfica nacional (mdicos), que participaram da criao da EPM e eram vinculados s principais escolas mdicas do Brasil, defendiam a idia de uma nova instituio no estado de So Paulo, no apenas para garantir vagas no curso mdico, tendo em vista os casos dos excedentes, mas tambm a superao da insuficincia do atendimento hospitalar na cidade e a necessidade da produo do conhecimento cientfico por meio da pesquisa experimental. Em 1994, por fora da Lei n 8.957, a EPM transforma-se de uma instituio de ensino superior isolada na primeira universidade especializada no pas, tendo como objetivo desenvolver, em nvel de excelncia, atividades de ensino, pesquisa e extenso, com nfase no campo das Cincias da Sade.

    Universidades comunitrias e confessionais

    PUCRJ: Pioneirismo e mudana, escrito por Stela Ceclia Segenreich (UCP), aponta que o pioneirismo e mudana representam traos muito marcantes que esto presentes nos principais momentos da histria da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro: as origens da Universidade, culminando com a sua criao em 1946, tornando-se a primeira universidade particular do Brasil; o pioneirismo da dcada de 1960, no que se refere criao de cursos de ps-graduao stricto sensu e implantao do seu projeto de reforma universitria; e o processo de mudana de direo em seu projeto institucional, nos anos 1980,

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    no que diz respeito ao processo de democratizao da gesto, valorizao da extenso como uma de suas funes e sobrevivncia institucional sem as verbas governamentais que subsidiavam seu Centro Tcnico e Cientfico. Pde-se constatar dois traos que acompanham toda a trajetria da PUC-Rio : (a) natureza catlica da Instituio; e (b) predominncia da excelncia acadmica como carter especfico da Universidade. A PUC-Rio se coloca como uma universidade de pesquisa, no quadro de diferenciao institucional estabelecido pelo MEC a partir da LDB de 1996.

    PUCRS: A universidade inovadora no contexto de confessionalidade, escrito por Maria Helena Menna Barreto Abraho e Marilia Costa Morosini (PUCRS), no qual so explicitados tpicos, ainda que breves e pontuais, sobre a origem da instituio 1948, como universidade, mas desde 1900, como instituio de ensino no Rio Grande do Sul sobre as concepes de educao e aes no passado e no presente, bem como a viso de futuro que tem orientado as concepes e aes preparadoras de novos tempos na instituio, no sentido de poder responder s exigncias de uma sociedade com as caractersticas de complexidade dos dias atuais, conservando as caractersticas que conformam a essncia de sua natureza e razo de ser: a da identidade confessional a PUCRS uma instituio crist, catlica, marista. Esse movimento abordado a partir da tenso entre uma instituio que se moderniza sem descaracterizar sua identidade enquanto instituio confessional. Os princpios e o iderio da pedagogia marista remontam a 1853, poca do primeiro Guia, o qual, at hoje, mantm atualidade naqueles princpios fundantes e fundamentais de uma educao catlica e marista. Esses princpios, mais genricos, esto direcionados para o desiderato da formao integral do sujeito da educao. Naturalmente, a expresso prtica desses princpios que se ajusta, na relao pedaggica, s nuances de necessidades de cada momento histrico e de cada espao geogrfico. Em especial, hoje, nas sociedades complexas em que vivemos entenda-se, sob a vigncia da mundializao da cultura, dos processos econmicos, via revoluo tecnolgica, da emergncia de fenmenos planetrios transnacionais o iderio de educao marista estar iluminando aes educativas que traduzam o papel social, poltico e evangelizador de uma instituio de educao marista, consoante com os reclamos e necessidades educacionais destas mesmas sociedades. Esta apresentao tentar explicitar a consolidao da universidade em dois grandes momentos: at dezembro de 2004, com a preparao da estrutura organizacional em termos de capacitao de gestores, professores e funcionrios e de infra-estrutura fsica para a pesquisa, o ensino e a extenso e aps dezembro de 2004, em que a universidade assume, preservando sua identidade, uma face que contempla esses novos desafios e prope um trabalho inovador.

    Unijui: Expresso do segmento comunitrio, escrito por Mariluce Bittar (UCDB) que analisa a constituio da FIDENE Fundao de Integrao, Desenvolvimento e Educao do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, mantenedora da UNIJU, em 1969. Desde 1957, com a instalao da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras (FAFI), j existia um profundo debate com a sociedade regional sobre a necessidade de implantao do ensino superior na regio. So destacados alguns protagonistas dessa histria, como a Ordem dos Frades Menores Capuchinhos e o Instituto Educacional Dom Bosco. Segue-se a transformao em Universidade de Iju, enfatizando seu carter regional multicampi e sua articulao com: o movimento de base das dcadas de 1950 e 1960; as transformaes ocorridas com a Reforma Universitria de 1968 e a expanso da educao superior nos anos 1990. O texto contextualiza a universidade comunitria como modelo diferenciado, enfatizando as recentes transformaes ocorridas na educao superior e a formao desse segmento, inspirado no modelo das universidades comunitrias gachas (com destaque para a UNIJU), como forma de defender interesses comuns, confrontando-se com a esfera pblica e com a iniciativa privada empresarial. Por ltimo, ressaltada a ambigidade do conceito/modelo de universidade comunitria: entre as presses do mercado e a necessidade de preservao de traos de sua identidade.

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    Unimep: haver um modelo confessional de universidade brasileira? escrito por Joo dos Reis Silva Jnior (UFSCAR), trabalho que procura estudar o movimento institucional do Instituto Educacional Piracicabano (IEP), no ensino superior, durante o perodo de 1964 at 1978. Em um primeiro momento busca-se aclarar como se d sua insero neste nvel de ensino, como decorrncia da debilidade institucional no nvel mdio de ensino. Para tanto, faz uma anlise conjuntural objetivando compreender a contradio entre o poltico e o econmico que se estabelece na primeira metade da dcada de 60. Em um segundo momento analisa o movimento poltico-administrativo das primeiras faculdades do IEP Faculdades Isoladas bem como sua transformao em Faculdades Integradas, no contexto da expanso do ensino superior privado no Pas. O movimento institucional das Faculdades Integradas ento estudado junto com sua transformao na Universidade Metodista de Piracicaba, em uma conjuntura de terror da ditadura Mdici. Finalmente o trabalho analisa sob o contexto da distenso poltica e da rearticulao da sociedade civil do governo Geisel, a organizao da comunidade interna da recm criada universidade confessional, o que fez instalar uma crise institucional que cria condies para uma reorientao poltico ideolgica da Universidade. Com base no construto terico histrico da Universidade Metodista de Piracicaba, o autor discute uma das dimenses centrais de sua cultura, de sua filosofia institucional: os principais traos da confessionalidade metodista expressos numa instituio de educao superior.

    Universidades Estaduais

    A USP e a formao de quadros de dirigentes, escrita por Afrnio Catani (USP) e Ana Paula Hey, enfoca o projeto originrio da Universidade de So Paulo, implantada nos anos de 1930, por intermdio dos agentes que o conceberam e o estruturaram. Esses agentes se caracterizam pela composio de um grupo especfico fruto da coalizo de foras sociais diversas, tanto da esfera poltica quanto cultural e econmica -, tendo como finalidade a conquista da hegemonia cultural como mecanismo de dominao poltica. Tal projeto inicial objetiva o desenvolvimento cultural, a investigao cientfica e os altos estudos ao lado da formao de quadros dirigentes, compondo o esprito universitrio uspiano. Enfatizando o ethos universitrio uspiano e suas tentativas de realizao, centra-se nos grupos dirigentes originrios da USP que emergem a partir de meados dos anos 1960 no pas e que iro compor uma nova elite de poder concretizada, sobremaneira, na era dos governos Fernando Henrique Cardoso.

    Uerj: Da gnese utilitria aos compromissos pr-cincia, escrito por Deise Mancebo (UERJ), que apresenta a gnese da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1950), destacando o agrupamento pragmtico de interesses que presidiu, no s o ato de fundao, mas reapareceu nas formas institucionalizadas que foram construdas para a universidade, em outras conjunturas. Analisa o funcionamento propriamente acadmico da instituio que, at final dos anos 70, voltava-se para o chamado ensino utilitrio, direcionado para a adaptao dos estudantes s injunes do mercado de trabalho, reforando a caracterstica reprodutora desta IES, em detrimento da produo original do conhecimento e transmisso da cultura. Destaca que, a despeito desta marcas e regularidades, a instituio no se apresentava com uma estrutura monoltica, existiam projetos que se contrapunham, de modo que, a partir de finais dos anos 70, a aglutinao dessas divergncias possibilitou importantes transformaes na instituio, com destaque para a introduo sistemtica da pesquisa e da produo de conhecimento. Discute, por fim, os novos problemas advindos com essas mudanas, em especial, a concepo produtivista e competitiva presente na dinmica acadmica, que se materializa atravs de um complexo sistema de avaliao-gratificao, com fortes impactos no trabalho docente.

    Unicamp: Crebros, escrito por Stella M. Meneghel (Furb) analisa a proposta com que foi criada a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), em 1966, e discute sua progresso at a atualidade,

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    enfocando: 1) Misso Institucional; 2) Modelo de Gesto; 3) Modelo de Financiamento; 4) Relao com a Sociedade. Em um primeiro momento, aborda a relao entre o projeto da Universidade e o contexto social e poltico que favoreceu sua implementao, no qual se destaca a figura do Prof. Zeferino Vaz. No perodo Zeferino Vaz (1966-1980), a Universidade desenvolveu perfil tecnolgico e voltou-se formao em nvel de ps-graduao, sendo marcada por uma gesto personalizada e centralizadora, ativa na busca de interao com o setor produtivo a fim de promover formao acadmica e pesquisa voltados s demandas tecnolgicas da regio. A relativa facilidade de obteno de financiamento para projetos consistiu em estmulo captao de crebros investigadores reconhecidos por seu potencial de pesquisa e produtividade acadmica. Em um segundo momento, ao longo da dcada de 80, houve o processo de institucionalizao da Universidade, que gerou um modelo de gesto mais democrtico. Em meados da dcada de 90, a escassez de recursos provocou a intensificao de relaes da UNICAMP com a sociedade, em especial, o setor produtivo, com vistas captao de recursos para manuteno das atividades de pesquisa. Ao longo deste percurso, nota-se a manuteno do perfil tecnolgico e nfase na formao em nvel de ps-graduao.

    A terceira e ultima parte do livro engloba dois textos:

    Universidade inovadora: entre a tradio e a renovao, escrito por Jorge Nicolas Audy (PUCRS) analisa alguma transformaes que as universidades esto enfrentando desde a segunda metade do sculo XX em direo a uma universidade inovadora. Este processo est sendo acelerado nos ltimos anos com a ampliao dos projetos de pesquisa com empresas e um novo papel do governo na relao com as universidades neste contexto (Interao Universida-Empresa-Governo), bem como por uma maior demanda da sociedade por um novo papel da universidade no processo de desenvolvimento econmico e social. O texto conclui com proposies para este enfrentamento entre a tradio e a renovao.

    Universidade no Brasil: dos modelos clssicos aos modelos de ocasio?, escrito por Valdemar Sguissardi (Unimep), que realiza o exame da trajetria percorrida pela instituio universitria no Brasil entre a adaptao autctone dos modelos clssicos de universidade napolenico, alemo, ingls ou americano e a gradual adoo dos aqui chamados modelos de ocasio universidade neoprofissional, universidade mundial do Banco Mundial ou modelo anglo-saxnico. Visa-se mostrar como a universidade, no Brasil, seguiu os passos e traos do desenvolvimento tardio e subalterno, aps a independncia poltica da colnia em relao metrpole e quando da consolidao, com mais de um sculo de atraso, da revoluo burguesa no pas. Tentar-se- mostrar como, por um lado, a universidade brasileira conseguiu recuperar ao menos parcialmente seu grande descompasso em relao a suas congneres de diversos pases hispano-americanos, quando da criao da USP, da UDF, das primeiras IFES, da UnB e das demais Estaduais, Comunitrias ou Privadas, e de entidades como a SBPC, o CNPq, a Capes e a Fapesp; como, por outro, em geral, antes que adaptaes pertinentes s necessidades do desenvolvimento requerido pelo pas, a universidade representou uma mescla de vrios modelos clssicos, com resultados pouco promissores no conjunto, at se defrontar, hoje, com os parmetros definidos pela mundializao do capital, pela mercantilizao do conhecimento e do ensino superior, enfim, pela modernizao conservadora que atinge profundamente a universidade.

    Finalizando, este prlogo, que no tem a ambio de esgotar o substrato do titulo da obra Universidade no Brasil: modelos e concepes, mas muito mais contribuir para o resgate de modelos universitrios presentes na realidade do pais, gostaria de renovar meus agradecimentos ao INEP, que nos apia na editorao e divulgao do livro. O INEP tem marcado sua importncia na trajetria educacional brasileira e ora reafirma seu papel de pensar e subsidiar os caminhos da educao.

    Marilia Costa MorosiniPorto Alegre, primavera de 2005.

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    Referencias bibliogrficas

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    QUADRO 1 Origem do ensino superior brasileiro 1808-1889

    RIO DE JANEIRO BAHIA PERNAMBUCO SO PAULO MINAS GERAIS RS

    1808

    *Academia de Marinha, 4,5*Cadeira de Anatomia

    *Escola de cirurgia (Hospital Real da Bahia)

    1809

    *Cadeira de Medicina Terica e Prtica (Hospital Real Militar e da Marinha)

    1810 *Academia Real Militar

    1812*Curso de Agricultura 3,4, 5

    1813Academia Mdico-Sanitria

    1814 *Curso de Agricultura

    1815*Academia Mdico- Cirrgica 1

    1817*Curso de Qumica (Industrial, Geologia e Mineroloia) 3,4,5

    1820 *Academia de artes 4

    1826*Academia de Belas Artes 4

    1827*Curso de Cin- cias Jurdicas e Sociais de Olinda

    *Curso de Cincias Jurdicas e Sociais de So Paulo

    1832 *Faculdade de Medicina*Faculdade de Medicina da BA

    1833*Academia Naval / Militar 4

    1839 *Escola MilitarFaculdade de Farmcia 2,3

    1841*Escola Nacional de Msica 1.3

    1854*Faculdade de Direito de Recife

    Faculdade de Direito de SP

    1855*Escola de Aplicao do Exrcito 3.4

    1858Escola Central Curso de Matemtica e Cin-cias Fsicas e Naturais

    1874*Escola Politcnica do RJ

    1875Escola Superior de Agronomia (Cruz das Almas)

    *Escola de Minas e Metalrgica

    1878 Curso de Odontologia

    1883

    Escola de Medicina Veterinria e Agric. Prtica (Pelotas)

    1884 Escola de Farmcia1888 Escola Politcnica1889

    Obs: A variao de nmeros ao lado dos referentes cursos, indica o autor que revela tal informao. A ausncia de nmeros ao lado dos cursos significa concordncia de todos os autores em relao informao. O asterisco significa que a informao foi confirmada pelo ndice da legislao de Josephina CHAIA-FONTES; 1) TOBIAS, Jos. Histria da Educao Brasileira. So Paulo: Ed. Juriscredi, 1972. 2) CAMPOS, Ernesto de Souza. Instituies culturais e de Educao Superior no Brasil. Rio de Janeiro: Ministrio da Educao,1941. 3) CUNHA, Lus Antnio. A Universidade Tempor. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1986. 4) AZEVEDO, Fernando de. A Transmisso de Cultura, So Paulo; Melhoramentos, 1976. 5) RIBEIRO, Maria Luiza S. Histria da Educao Brasileira. So Paulo: Moraes, 1984. 6) CHAIA, Josephina A Educao Brasileira. ndice da Legislao.

    FONTE: LEITE, D.; CUNHA, M.; MOROSINI, M. et all. Universidade e Ensino de Graduao. Pelotas: EdUFPel, 1997. p. 43.

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    QUADRO 2 Legislaes do Ensino Superior Brasil Sc XIX 2004

    REGIMEPOLTICO

    DATA DENOMINAO (DECRETO) SUBSTNCIA

    REINO-UNIDO

    1808 18/21808 23/21813 1/4

    Carta RgiaCarta RgiaReforma lvares de Carvalho

    Autorizao para a criao do 1 Curso Superior 1 Estatuto do Curso SuperiorEstatutos de Cirurgia

    IMPRIO

    1832 3/101854 28/41879 1884 (1)19/4

    Reforma Senador VergueiroReforma Luiz Pereira de Couto Ferraz 1386Reforma Lencio de Carvalho 7274

    Nova organizao s Academias Mdicas da Bahia e RJNovo Estatuto aos Cursos JurdicosCriao de Faculdades Livres

    PRIMEIRAREPBLICA

    1891 2/11901 1/11911 5/4

    1915 18/31925 13/1

    Reforma Benjamin Constant (1232H)Reforma Epitcio Pessoa (3890)Reforma Rivadvia Corra (8659)

    Reforma Carlos Maximiliano (11530)Reforma Rocha Vaz (16782)

    Regulamento Instituio de Ensino JurdicoCdigo para o Ensino superior-equiparaoTransio entre a oficializao completa do ensino sua total independnciaRestabelecimento da FiscalizaoCriao de Universidades

    REPBLICA

    1931

    1961

    19681991

    1996

    Estatuto das Universidades Brasileiras(19.850) (19.851)(19.852)Lei Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB (4024)Reforma Universitria ( 5.540)Mercosul Educativo

    Lei Diretrizes e Bases da Educao Nacional LDB (9394)

    Criao do Conselho Nacional de EducaoOrganizao das UniversidadesOrganizao da Universidade do Rio de JaneiroOrganizao do Sistema de Educao

    Modernizao da UniversidadeIntegrao dos sistemas educativos dos pases do MercosulFlexibilizao do Sistema de Educao Superior

    (1) A Reforma Lencio de Carvalho s foi completada em 1884, atravs de uma srie de outras legislaes. Fonte: MOROSINI, M.C. Seara de desencontros: a produo do ensino na universidade. 1990. 270 p. Tese (Doutorado em Educao) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. p.69.

  • PARTE IA UNIVERSIDADE BRASILEIRA NO SCULO 21

    E O MODELO UNIVERSITRIO INICIAL

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    CAPTULO 1

    A UNIVERSIDADE BRASILEIRA CONTEMPORNEA:

    TENDNCIAS E PERSPECTIVAS

    Dilvo Ristoff

    Antes de abordar diretamente o tema que me foi proposto, gostaria de compartilhar com os senhores algumas reflexes de Alvin Tofler, extradas de seu livro Choque de Futuro.

    Toda a educao, escreve Tofler, brota de alguma imagem de futuro. Se a imagem de futuro de uma sociedade estiver grosseiramente equivocada, o sistema educacional acabar por trair os seus jovens. Imagine uma tribo indgena que durante sculos tenha navegado no rio porta de suas ocas em canoas feitas de troncos de rvore. Durante todo este tempo, a cultura e a economia da tribo dependeram da pesca, do preparo dos produtos do rio, dos alimentos colhidos do solo fertilizado pelo rio, da construo de canoas e demais instrumentos necessrios. Enquanto o ritmo das mudanas tecnolgicas nesta comunidade permanecer lento, enquanto guerras, invases, epidemias ou desastres naturais no perturbarem o ritmo constante da vida, a tribo no ter dificuldades para formular uma imagem operacional de seu futuro, pois o amanh apenas ser uma rplica do ontem.

    A educao brota a partir desta imagem. Mesmo que no existam escolas na tribo, haver um currculo um conjunto de habilidades, valores e rituais que devem ser aprendidos. Aos meninos ser ensinado como remover as cascas das rvores e como fazer canoas de troncos, da mesma forma como fizeram os seus antepassados. O professor neste contexto sabe o que est fazendo, convicto de que a tradio o passado funcionar no futuro.

    O que acontecer a esta tribo, no entanto, se continuar com os seus mtodos tradicionais, sem saber que 700 quilmetros acima est sendo construda uma represa que secar o brao de rio no qual vive? Repentinamente, a imagem de futuro o conjunto de pressupostos nos quais os membros da tribo baseiam o seu comportamento presente torna-se perigosamente enganosa. O amanh no mais replicar o hoje. O investimento da tribo na preparao de seus filhos para viverem numa comunidade ribeirinha torna-se sem sentido e um desperdcio potencialmente trgico. Uma imagem falsa de futuro destri a relevncia do esforo educacional.

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    Esta a nossa situao hoje, com uma diferena: ironicamente somos ns, e no um bando de desconhecidos a milhares de quilmetros de distncia, que estamos construindo a represa que aniquilar a cultura do presente. Nunca antes qualquer cultura esteve sujeita a to intenso bombardeio de mudanas tecnolgicas, sociais e info-psicolgicas. Esta mudana se acelera e testemunhamos em todas as sociedades de alta tecnologia que as velhas estruturas da era industrial j no conseguem mais desempenhar suas funes a contento.

    E, no entanto, nossos lderes polticos em sua maior parte propagam o mito de que a sociedade industrial est destinada a se perpetuar indefinidamente. Como os ancios da tribo ribeirinha, eles imaginam cegamente que as principais caractersticas do atual sistema social se estendero indefinidamente no futuro. E a maioria dos educadores, incluindo aqueles que se consideram agentes de mudana, sem perceber aceitam este mito... E, assim, quando a mudana chegar, sua imagem de futuro provar estar no apenas obsoleta mas anti-adaptativa, pois no ter deixado lugar para a possibilidade de mudana radical (Alvin Toffler Future Schock minha traduo e adaptao).

    E qual a imagem de futuro com a qual trabalha a sociedade brasileira? Poderamos dizer que a imagem de futuro est centrada no programa de governo do Presidente Lula, que estabelece como um de seus compromissos bsicos o reconhecimento do papel estratgico das universidades, em especial as do setor pblico, para o desenvolvimento econmico e social do pas. Esta percepo, no entanto, est nitidamente expressa no Plano Nacional de Educao (PNE), materializado na Lei 10.172 de 2.001, e que tem, como diretriz, a expanso com qualidade da educao superior e, como viso de futuro, a noo de que nenhum pas pode aspirar a ser desenvolvido e independente sem um forte sistema de educao superior.

    Esta viso do PNE, aprovada pelo Congresso Nacional, foi claramente contemplada no programa de governo do presidente Lula e tambm na proposta de Reforma da Educao Superior encaminhada pelo ex-Ministro da Educao Tarso Genro. Na apresentao do ante-projeto da Reforma, o ex-Ministro Tarso assim se expressa: A educao superior brasileira tem a misso estratgica e nica voltada para a consolidao de uma nao soberana, democrtica, inclusiva e capaz de gerar a emancipao social. importante observar que a transformao da proposta de Estado em programa e ao de governo deixa claro que a misso da educao superior estratgica, isto , trata-se de uma misso que supera o presente e insere-se em um futuro imaginado. Na traduo que o ex-ministro Tarso Genro faz do plano do governo Lula e das diretrizes do PNE, a misso estratgica vislumbra uma nao (1) soberana, dona de seu destino; (2) democrtica, isto , uma nao cujos destinos pertenam ao seu povo e no s suas oligarquias; (3) inclusiva, que promova a justia e oferea a todos os seus cidados a oportunidade de participarem ativamente da vida scio-poltica, econmica e cultural; e (4) que promova a emancipao social, de modo que os indivduos possam afirmar a sua cidadania e criativamente gerar as suas oportunidades e as oportunidades da sociedade.

    Esta viso, a um s tempo, deriva do texto do Plano de governo de Lula para a educao superior, e est subjacente a ele. Deriva tambm da realidade expressa pelos nmeros do Censo da Educao Superior. Pela sua consistncia histrica, estes nmeros projetam um quadro que no pode ser desprezado pelos que seriamente pensam a educao superior.

    E os nmeros dizem, primeiro, que temos hoje um sistema de educao superior altamente centralizado. Das 2.013 instituies registradas pelo Censo de 2004, 1.859 pertencem ao setor privado. Se considerarmos

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    que estas fazem parte do sistema federal, juntamente com as 87 IFES, conclumos que 96,7% do sistema de educao superior do pas federal, ou seja, dependente do sistema regulatrio da Unio.

    Conclumos igualmente, pelos dados acima, que o sistema, embora essencialmente dependente do Estado para autorizao, reconhecimento e renovao de reconhecimento de curso, autorizao para expanso de vagas e outras questes de ordem legal, altamente privatizado, situando-se, na verdade, entre os sistemas mais privatizados do mundo. Embora, o ritmo de crescimento do setor privado tenha reduzido significativamente nos ltimos 3 anos, de 19,4% em 2002, para 14,1% em 2003, para 8,3% em 2004, e, embora o ritmo de crescimento do setor pblico tenha se mantido exatamente estvel (em 11,1% nos ltimos dois anos) os ndices acumulados na dcada passada mantm o setor privado responsvel por praticamente 90% de todas as IES do pas.

    Quando observamos que o sistema de educao superior conta com 4.163.733 estudantes matriculados, e quando consideramos o alto grau de centralismo a ele associado, temos a sensao de que o sistema brasileiro de dimenses amaznicas. Na verdade, estes nmeros, considerados em relao populao brasileira, mostram que o nosso sistema est entre um dos menores do planeta. Embora no ltimo ano a taxa de escolarizao tenha crescido mais de 1%, em funo de medidas governamentais adotadas, apenas 10,4% da populao da faixa etria de 18 a 24 anos se encontram matriculados na educao superior, indicando que temos ainda um sistema altamente elitista e excludente, carente, portanto, de um agressivo processo de democratizao do acesso e da permanncia, como os j implantados e os em implantao.

    Por fim, como quarta caracterstica fundamental do sistema, cabe destacar que o sistema de educao superior brasileiro, ao contrrio da compreenso popular, no composto exclusivamente por universidades. Na verdade, quando atentamos para os nmeros do Censo, percebemos que as universidades representam uma parcela nfima do total de IES (8,4%). Isto significa dizer que 91,6% das instituies constitucionalmente no tm a obrigao de realizarem atividades de pesquisa ou extenso e no necessitam preocupar-se com mestrados, doutorados ou estudos aprofundados. Os nmeros indicam que 67,8% das instituies so pequenas faculdades isoladas com at 1.000 estudantes, fato que escapa maioria das pessoas, acostumadas a ver na grande mdia o vestibular das universidades pblicas, ou a agressiva publicidade de universidades cujas matrculas se aproximam ou mesmo superam a casa dos 100.000 estudantes.

    , pois, no contexto de um sistema de educao superior centralizado, privatizado, diversificado, elitista e excludente, aparentemente grande, mas extremamente pequeno para as dimenses do Brasil que precisamos discutir as propostas apresentadas no plano de governo. Esta contextualizao fundamental para a construo de aes que privilegiem o sonho de uma educao superior mais democrtica e inclusiva, sem perder de vista as restries, empecilhos e dificuldades impostos pela realidade.

    O Plano para a educao superior do candidato e, agora, presidente Lula reza:

    Assim os compromissos bsicos do nosso governo com a educao superior so:

    a) a promoo da autonomia universitria e da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extenso nos termos constitucionais (Artigo 207 da CF);

    b) o reconhecimento do papel estratgico das universidades, em especial as do setor pblico, para o desenvolvimento econmico e social do pas;

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    c) a consolidao das instituies pblicas como referncia para o conjunto das IES do pas;

    d) a expanso significativa da oferta de vagas no ensino superior, em especial no setor pblico e em cursos noturnos;

    e) a ampliao do financiamento pblico ao setor pblico, reviso e ampliao do crdito educativo e criao de programa de bolsas universitrias, com recursos no vinculados constitucionalmente educao;

    f) a defesa dos princpios constitucionais da gratuidade do ensino superior pblico (artigo 206, IV, da CF);

    g) envolvimento das IES, em especial as do setor pblico, com a qualificao profissional dos professores para a educao bsica, em cursos que garantam formao de alta qualidade acadmico-cientfica e pedaggica e associem ensino, pesquisa e extenso.

    As aes do Ministrio da Educao, empreendidas nestes trs primeiros anos de governo, mostram que estes compromissos no foram esquecidos, tendo havido avanos expressivos na consolidao de alguns e avanos mais tmidos em outros.

    A defesa da autonomia e da indissociabilidade para as universidades fica evidente no apenas na poltica de respeito s tradies das universidades no tocante escolha de seus dirigentes, com pleno respeito ao processo de escolha e indicao dos dirigentes eleitos pela comunidade universitria, como no texto da Reforma da Educao Superior encaminhado Casa Civil, que regulamenta o Artigo 207 da Constituio, definindo o significado de autonomia (didtico-cientfica, administrativa, de gesto financeira) e as suas implicaes para o dia a dia da universidade, que vo desde criar, organizar e extinguir cursos; fixar nmero de vagas, propor quadro de pessoal docente e tcnico-administrativo nos termos do oramento autorizado at a contratao de pessoal por tempo determinado, elaborao de oramentos plurianuais e tomar providncias de natureza oramentria necessrias ao seu bom desempenho. A consolidao efetiva da autonomia universitria passa, sem dvida, pela Reforma Universitria. A Reforma proposta garante que as universidades federais tero, enfim, a autonomia de gesto financeira prevista na constituio, mas nunca posta em prtica; tero asseguradas a to sonhada dotao global de recursos, a irredutibilidade nos repasses e a expandibilidade continuada. Estaro, portanto, livres das amarras burocrticas e financeiras, que inibem a auto-gesto, repelem a inovao e foram a privatizao do espao pblico. O avano, por enquanto, modesto por no ter ainda sido apreciado pelo Congresso Nacional e por no ter superado todos os embates ideolgicos e operacionais em torno da questo dentro do prprio governo, mas fica evidente que o compromisso de campanha no foi esquecido e que, se aprovado nos termos propostos, o texto da reforma representar um avano considervel sobre as prticas administrativas e acadmicas das universidades federais. Ao defender a autonomia das universidades, nos termos do artigo 207 da Constituio, o governo tambm deixa claro o seu entendimento de que nestas instituies, embora no necessariamente nos Centros Universitrios e Faculdades, as atividades de ensino, pesquisa e extenso so definidoras de sua natureza.

    O reconhecimento do papel estratgico das universidades, em especial as do setor pblico, visando colocar o ensino, a pesquisa e a extenso a servio do desenvolvimento social, econmico e cultural talvez explique por que o Presidente Lula tenha em vrias ocasies se reunido com os reitores das universidades federais, buscando construir um consenso sobre a expanso destas instituies. importante lembrar que

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    a Associao Nacional dos Dirigentes das Instituies Federais de Educao Superior (Andifes) teve papel fundamental na produo do texto da Reforma e que, inclusive, submeteu ao Presidente da Repblica uma proposta de duplicao das vagas das IFES em quatro anos.

    Este processo avanou de vrias formas: no aumento em 100% dos recursos de Outros Custeios e Capital, na aprovao do plano de carreira para os servidores tcnico-administrativos, na expanso do nmero de vagas (embora no nos nmeros originalmente pretendidos), na criao de novas universidades federais, na criao de novos campi e em estmulos abertura de vagas noturnas e outras modalidades de democratizao do acesso. Alm da expanso do corpo docente nas IFES existentes, foram criadas em 2005, entre outras, a Universidade Federal do ABC, a Universidade Federal do Grande Dourados, no Mato Grosso do Sul, com mais um hospital universitrio, a Universidade Federal do Vale do So Francisco e dos plos universitrios de Volta Redonda, Baixada Fluminense e Garanhuns. Foram ainda criados vrios novos campi, entre eles, a UNIFESP/Santos, UFSCAR/Sorocaba, UFPR/Litoral, UFBA/Vitria da Conquista e UFAC/Universidade da Floresta.

    Ainda para registro: em 2003, as IFES receberam uma dotao extra de 1,7 bilho de reais, representando um acrscimo de 47% com relao ao ano anterior. Destes 1,7 bilho, 1,3 bilho foram destinados a reajustes de docentes e tcnicos e 260 milhes para custeio. Este montante certamente significativo e tem sido assim reconhecido, publicamente, pela Associao Nacional dos Dirigentes das Instituies Federais de Educao Superior - ANDIFES. Foi na verdade, um dos maiores acrscimos na ltima dcada. Destaque-se ainda que 2.344 professores foram contratados nos dois primeiros anos de governo e j est anunciada a contratao de mais 6.000 professores at o final de 2006. Isto representa um aumento significativo de 16% sobre o total de professores e de 19,2% sobre os professores em regime de dedicao exclusiva. O primeiro impacto destes esforos s dever se tornar visvel atravs dos nmeros do Censo de 2005, que devem ser divulgados at agosto ou setembro de 2006.

    A consolidao das IFES como referncia de qualidade do sistema passa evidentemente tambm por medidas estruturantes. Ningum tem iluses, por exemplo, de que a expanso agressiva de vagas, a criao de novos campi e de novas IFES seja possvel sem um significativo aumento no volume de recursos. A proposta da Reforma de aumentar o repasse para a educao superior dos atuais 62% para 75% da receita constitucionalmente vinculada manuteno e ao desenvolvimento do ensino uma das questes de conflito dentro do governo e, tambm, dentro de setores da sociedade que entendem que os recursos da unio devem ir prioritariamente para a educao bsica.

    A ttica de lanar a educao bsica contra a educao superior , sabidamente, antiga e tem sido enfrentada com muita determinao e competncia pelos Ministros Tarso Genro e Fernando Haddad. Tarso e Haddad tm sido incansveis em demonstrar que a educao bsica, alm de ser atribuio precpua dos estados e municpios, estar recebendo aportes expressivos da unio com a aprovao do Fundeb. Ambos os ministros tm enfatizado a necessidade de ver a educao em seu conjunto, recusando-se a topicalizar e a fragmentar a educao recusando-se, portanto, a priorizar um dos nveis em detrimento de outros. Esta viso sistmica ganha corpo e dever ter efeitos positivos sobre a educao brasileira como um todo nos prximos anos, pois fica cada vez mais claro que impossvel desenvolver um nvel educacional sem dar ateno ao outro. As metas do PNE, por exemplo, s podero ser atingidas com a expanso do ensino mdio e este no pode prescindir da melhoria da qualidade, da diminuio da repetncia e da ruptura com a crnica defasagem idade-srie na educao fundamental. Da mesma forma, a formao de professores qualificados, em quantidade compatvel com as necessidades do pas em todos os nveis de escolaridade, depende da qualidade

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    pedaggica da educao superior, da democratizao do acesso campus e das polticas de permanncia para os estudantes de baixa renda familiar.

    Alm de assegurar um repasse maior de recursos s IFES, buscando atender s demandas da graduao, necessrio perceber que a centralidade das universidades pblicas passa tambm pela ps-graduao. Neste sentido, o governo federal apresentou o Plano Nacional de Ps-Graduao, buscando garantir, atravs das instituies pblicas federais, estaduais e municipais, a melhoria do ensino, da pesquisa e da extenso mediante um programa ainda mais agressivo de formao de mestres e doutores. O Plano Nacional de Ps-graduao prev dobrar a titulao anual de doutores, dos 8.094 em 2003 para 16.295 em 2010.

    Por outra parte, a expanso da oferta de vagas no ensino superior tem se mostrado um grande desafio, no apenas pelo seu impacto financeiro, mas tambm pelo receio da comunidade acadmica e da sociedade brasileira em geral de que a expanso inimiga da qualidade. O setor privado, conforme mostram os nmeros das ltimas duas edies do Censo da Educao Superior, vem reduzindo drasticamente o seu ritmo de crescimento (de 14,6% em 2003 para 8,3% em 2004, em nmero de instituies, e de 11,7% para 7%, em nmero de matrculas). Ressalte-se que em 2004 cerca de 50% das vagas oferecidas pelo setor privado permaneceram desocupadas. Esta ociosidade de vagas reflete em grande parte a incapacidade da populao de pagar pelos altos custos da educao superior, revelando que a expanso privada chegou prximo do seu limite e que, embora tenha atendido aos interesses dos filhos da classe mdia na dcada passada, no ter condies de atender aos filhos das classes baixas que nos ltimos anos tiveram acesso ao ensino fundamental e mdio. Da que no basta mais falar em expanso do campus h que se falar em democratizao do campus. Expandir simplesmente as vagas do setor pblico equivale a transferir os alunos mais aquinhoados do setor privado para o setor pblico, sem, no entanto, abrir novas oportunidades aos alunos pobres. Neste contexto, criar novas instituies pblicas, interiorizar as IFES, ampliar o nmero de vagas, diurnas e noturnas, expandir o ensino a distncia no setor pblico apresentam-se como alternativas reais incluso dos filhos das classes baixas.

    A criao de programa de bolsas universitrias, com recursos no vinculados constitucionalmente educao, conforme previsto no plano de governo, se deu principalmente atravs do Programa Universidade para Todos (o PROUNI), embora o nmero de estudantes beneficiados pelo FIES tenha aumentado 45,4% em 2 anos, de 219.204 em 2002 para 318.679 em 2004. O Prouni, no entanto, diferentemente do Fies, um programa de bolsas e no um financiamento estudantil. Destinado a alunos verdadeiramente carentes, o Prouni d ao aluno uma bolsa do governo federal para estudar em instituies privadas participantes do programa. A vaga , portanto, pblica, j que sustentada com recursos advindos da renncia fiscal.

    No obstante as crticas que o programa tem recebido de setores da Esquerda que defendem a expanso da educao pblica e gratuita, ou, mesmo, que toda a educao superior seja pblica e gratuita, a verdade que o Prouni mostrou-se uma forma bem mais eficaz de controle pblico sobre os incentivos j concedidos pelo estado s instituies de educao superior privadas. Ele tornou-se, na verdade, forma bastante eficaz de dar transparncia contrapartida das isenes garantidas constitucionalmente s IES que se declaram sem fins lucrativos ou que tm certificado de filantropia.

    E, ao contrrio do que imaginam os seus crticos, o montante da renncia fiscal fica em torno de 250 milhes de reais/ano e no nos bilhes imaginados capazes de revitalizar a universidade pblica. Na verdade, 250 milhes representam hoje cerca de do montante repassado anualmente ao FIES, que, importante destacar, financia h anos os estudos de alunos das classes mdias nas mesmas instituies privadas. Outro

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    dado importante: somente em 2004 o Prouni ofereceu 112.000 vagas a alunos carentes. Em 2005 este nmero deve ser superado em muito. Isto equivale a dizer que, mantida a atual procura e participao, o Prouni oferecer em quatro anos a oportunidade a mais de 500.000 jovens carentes a oportunidade de continuarem os seus estudos. Apenas a ttulo de comparao, bom lembrar que todo o conjunto das IFES hoje tem cerca de 500.000 alunos de graduao o que por si s uma demonstrao de que o Prouni o maior programa de democratizao do acesso j ensaiado no Brasil.

    Mantido o atual ritmo de crescimento, deveremos chegar ao ano 2011 com cerca de 9 milhes de estudantes universitrios. Parece muito, mas no ! Se quisermos atingir a meta do Plano Nacional de Educao (30% dos jovens de 18 a 24 anos matriculados na educao superior, com 40% das matrculas em instituies pblicas) vamos precisar de bem mais do que do crescimento inercial instalado.

    Se por um momento lembrarmos que, em 2003, pela primeira vez na histria do Pas, tivemos mais vagas na educao superior do que concluintes do ensino mdio e que, em 2004, 48% das vagas oferecidas nas IES privadas permaneceram ociosas, fica evidente que, para garantir a migrao desejada de crebros e pessoas para a educao superior, ser necessria uma participao maior do poder pblico. O mercado, por si s, ao contrrio do que sonharam alguns, no conseguir viabilizar este importante projeto de Estado pela via do setor privado, que hoje representa 90% das instituies. Quando este setor deixa quase a metade de suas vagas ociosas, quando ndices alarmantes de inadimplncia o desestabilizam e quando a evaso ameaa inviabilizar mesmo cursos de altssima demanda, fica evidente, como j demonstramos, que a sua capacidade de expanso est prxima do limite. Junte-se a isso o fato de que os cerca de 9 milhes de estudantes do ensino mdio tm renda familiar 2,3 vezes menor do que a dos estudantes que hoje esto na educao superior. O IBGE ainda nos informa que entre os 9 milhes, h cerca de 2.2 milhes de estudantes que so to pobres que, mesmo que a educao superior seja pblica e gratuita, tero dificuldades de se manterem no campus.

    Como este quadro s tende a piorar com a universalizao da educao bsica -- que trar exrcitos de carentes s portas do campus nos prximos anos -- falar apenas em expanso insuficiente. Se verdade que a expanso da educao privada teve o mrito de fazer com que o vestibular deixasse de ser um trauma na vida de pais e filhos da classe mdia, tambm verdade que ela, para os filhos das classes baixas, trouxe apenas promessa. Estes, porque no conseguem nem vencer o elitismo do campus pblico nem pagar os preos do campus privado, continuam em grande parte excludos da educao superior.

    Convm repetir: se a palavra de ordem da dcada passada foi expandir, a desta dcada precisa ser democratizar. E isto significa criar oportunidades para que os milhares de jovens de classe baixa, pobres, filhos da classe trabalhadora e estudantes das escolas pblicas tenham acesso educao superior. No basta mais expandir o setor privado -- as vagas continuaro ociosas; no basta aumentar as vagas no setor pblico elas apenas facilitaro o acesso e a transferncia dos mais aquinhoados.

    A democratizao, para acontecer de fato, precisa de aes mais radicais -- aes que afirmem os direitos dos historicamente excludos, assegurando acesso e permanncia a todos os que seriamente procuram a educao superior, desprivatizando e democratizando o campus pblico. O Programa Universidade para Todos, a criao de novos campi nas IFES, a proposta de expanso do ensino noturno pblico, a criao de novas universidades federais, a proposta de converso da dvida dos estados em investimentos na educao, a criao da Universidade Aberta do Brasil, a expanso da educao a distncia, a criao de bolsas permanncia so algumas das aes que apontam para o caminho da democratizao.

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    H, no entanto, necessidade de se tornar a democratizao indissocivel da expanso nos campi pblicos, onde permanece fortemente enraizada a noo de que expandir significa piorar a qualidade. Lamentavelmente, escapa maioria de ns a percepo de que preocupar-se s com a qualidade, sem pensar em quantidade, significa a preservao de um sistema elitista e excludente! O estranho que quando a expanso do setor privado veio beneficiar a classe mdia, o campus pblico fez de conta que a questo no era com ele; quando, no ano passado, a renncia fiscal tornou vivel a concesso de bolsas para dezenas de milhares de jovens pobres, no mesmo setor privado, no foram poucas as vozes que deixaram claro o seu protesto; agora que a democratizao quer dar um passo adiante para atender aos mais carentes, no espao pblico, o campus pblico se escuda na autonomia e se esconde atrs da qualidade. E assim, democratizar o campus pblico permanece, no campus pblico, ironicamente um tabu. A menos que consigamos mudar esta cultura, grande parte do esforo pela recuperao da centralidade da universidade pblica e gratuita torna-se sem sentido.

    A gratuidade do ensino superior pblico, prevista no artigo 206, IV, da Constituio Federal talvez nunca tenha estado to protegida como nos ltimos trs anos, no obstante as freqentes investidas dos adversrios da universidade pblica. Na verdade, como vimos, a poltica do Ministrio da Educao tem sido no s a de defender a gratuidade, mas tambm e principalmente a de democratizar o acesso e a permanncia da populao pobre. A criao de bolsas-permanncia e a expanso de recursos de custeio tm desempenhado papel importante neste sentido. Cabe ainda ressaltar que o texto da reforma dever significar um importante avano neste processo de democratizao do acesso e da permanncia de jovens carentes, prevendo apoio financeiro para a inscrio gratuita nos vestibulares e processos seletivos, bolsas de fomento formao acadmico-cientfica, atividades de extenso, moradia estudantil, restaurantes, transporte, assistncia sade, participao em eventos cientficos, etc. O anteprojeto prev que as IFES devero destinar pelo menos 9% de sua verba de custeio para implementar tais medidas, alm da extrao anual de loteria pela Caixa Econmica Federal, com destinao da renda lquida exclusivamente para as IFES.

    O envolvimento das IES, em especial as do setor pblico, com a qualificao profissional dos professores para a educao bsica, em cursos que garantam formao de alta qualidade acadmico-cientfica e pedaggica e associem ensino, pesquisa e extenso tem sido pouco divulgado, mas a promessa assumida no plano de governo no ficou no papel. O Programa Pr-Licenciatura, voltado capacitao de professores j atuantes nas redes de ensino, se encontra em implantao e certamente representar um impulso ao combate deficincia de escolarizao, tanto em termos quantitativos como qualitativos, conforme detectada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (Inep). Trata-se de um programa de formao inicial e continuada para professores, que dever ser desenvolvido em parceria com os Sistemas Estaduais e Municipais de Ensino e Instituies de Educao Superior.

    Alm desses compromissos bsicos, o Plano de Governo de Lula listou 25 linhas de ao para a educao superior. Para que se possa melhor avaliar os avanos em cada uma das linhas, listamos abaixo as aes propostas:

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    Proposta O que foi feito

    1 Ampliar, em quatro anos, as vagas no ensino su-perior, em taxas compatveis com o estabelecido no PNE (Prover at o final da dcada, a oferta da educao superior para, pelo menos, 30% da faixa etria de 18 a 24 anos);

    Em quatro anos, o Programa Universidade para Todos representar um acrscimo aproximado de meio milho de alunos (todos carentes) no sistema de educao superior. Isto equivale ao nmero de matrculas que hoje tm as 82 instituies federais juntas. A criao da Universidade Aberta, a expanso do ensino noturno pblico e a abertura de novas vagas nas IFES asseguram avanos expressivos rumo ao alcance da meta.

    Trata-se, pois, de uma ao em estgio avanado de execuo.

    2 Ampliar a oferta de ensino pblico universitrio, de modo a projetar, no mdio prazo, uma proporo de no mnimo 40% do total de vagas, prevendo inclusive a parceria da Unio com os Estados na criao de novos estabelecimentos de educao superior (Meta referenciada em dispositivo do PNE aprovado pelo Congresso Nacional e vetado pelo presidente da Repblica).

    A criao de 12 novas universidades federais e a instalao de 30 novos campi nas IFES, alm da expanso de Centros Federais de Tecnologia, com a conse-qente expanso do nmero de matrculas nas IES pblicas -- todas estas aes, combinadas com um decrscimo significativo no ritmo de crescimento do setor privado, permitem inferir que ser possvel atingir a meta. Mesmo assim, a meta do PNE, ao atrelar o percentual da participao do setor pblico ao crescimento das matrculas do setor privado, cria uma meta relativizada, sem referenciais seguros e, portanto, difcil de controlar. Como expressivos avanos j podem ser concretamente observados, poderamos definir esta como uma ao em estgio avanado de execuo.

    3 Promover o aumento anual do nmero de mestres e de doutores formados no sistema nacional de ps-graduao em pelo menos 5%, em conformi-dade com meta estabelecida pelo PNE.

    Plenamente atingida at aqui, com um aumento mdio no nmero de mestres titulados de 6,5% e de 7,3% no nmero de doutores ao ano nos ltimos dois anos. Estes percentuais devem ser ainda maiores com a implementao do Plano Nacional de Ps-Graduao, que prev a titulao de, no mnimo 16.918 dou-tores e de 56.956 mestres, representando um aumento de pelo menos 109% e 106%, respectivamente, at 2.010.

    Em estgio avanado de execuo.

    4 Promover a autonomia universitria nos termos constitucionais, vinculando-a democracia in-terna, baseada na tomada de decises por rgos colegiados representativos e no controle social mediante mecanismos abertos de prestao de contas e de avaliao institucional

    Plenamente contemplada na proposta de Reforma Universitria a ser encamin-hada ao Congresso. Como se trata ainda de uma proposta, longamente discutida com setores acadmicos, os avanos so por enquanto apenas polticos e con-ceituais.

    Em estgio intermedirio de execuo.

    5 Revisar a legislao de escolha de dirigentes nas IFES compatibilizando-a com o princpio constitu-cional da autonomia universitria.

    Tambm faz parte da proposta da Reforma da Educao Superior. Na prtica, o MEC vem respeitando na ntegra a escolha de dirigentes feita autonomamente pelas comunidades acadmicas. Poderia, pois, ser definida como em estgio avanado de execuo.

    6 Estabelecer e implantar medidas que visem di-minuir a desigualdade de oferta de cursos e va-gas de graduao e ps-graduao em termos regionais e de interiorizao.

    A poltica de interiorizao das universidades federais tem, em grande parte, este sentido, buscando atender s demandas e necessidades locais. Estudos do Inep por rea do conhecimento na graduao e os esforos da Capes, na ps-graduao, j abrem caminho para uma melhor orientao das polticas in casu.

    Em estgio intermedirio de execuo.

    7 Planejar e incentivar, na graduao e ps-grad-uao, a oferta de cursos e vagas em reas de conhecimento que melhor respondam s neces-sidades do projeto nacional de desenvolvimento.

    O incentivo expanso das faculdades de tecnologia e centros de educao tecnolgica mostram o esforo do governo tambm no atendimento s neces-sidades imediatas do desenvolvimento, sem descuidar-se da pesquisa e da ps-graduao. As 1.500 novas vagas de docentes recentemente autorizadas tm duas destinaes: vo atender as 28 novas unidades descentralizadas (Uneds) que integram o plano de expanso da rede tecnolgica e suprir a carncia de professores e de pessoal administrativo em algumas Uneds criadas nos ltimos dez anos e que at hoje no tm quadros prprios de pessoal.

    Em estgio avanado de execuo.

    8 Estabelecer mecanismos e critrios que superem os limites do atual processo de seleo e consid-erem a possibilidade de novas formas de acesso ao ensino superior, em especial para negros e es-tudantes egressos da escola pblica. Tal medida deve se fazer acompanhar, quando necessrio, de programas de nivelamento de conhecimento sob a responsabilidade das instituies de ensino superior.

    A poltica de quotas, buscando reservar no mnimo 50% das vagas para estu-dantes oriundos da escola pblica e estudantes negros, pardos e indgenas, vem sendo adotada gradualmente por universidades federais em vrios pontos do pas, mesmo antes da aprovao da lei pelo congresso. A poltica em implan-tao visa garantir oportunidade de estudar a todos os que seriamente buscam a educao superior, o que torna gradativamente obsoleto o vestibular elitista e excludente.

    Em estgio intermedirio de execuo.(continua)

  • 32

    Proposta O que foi feito

    9 Estabelecer medidas com vistas a reduzir a evaso escolar.

    A expanso do Fies e a bolsa para estudantes carentes, beneficirios do Prouni, so apenas algumas das aes do governo Lula no sentido de melhorar a per-manncia dos estudantes pobres no campus. Esta poltica ser consideravel-mente ampliada com a aprovao do texto da Reforma que prev investimento mnimo de 9% dos recursos de outros custeios e capital das universidades fede-rais, alm da extrao de loteria especial anual destinada ao apoio permanncia de estudantes carentes no campus.

    Em estgio intermedirio de execuo.

    10 Implantar de forma progressiva uma rede univer-sitria nacional de ensino superior distncia, com exigente padro de qualidade.

    A criao da Universidade Aberta do Brasil, alm de outros programas j em funcionamento, de formao de professores distncia, mostra que esta ao est em estgio avanado de execuo.

    11 Ampliar os programas de iniciao cientfica (PET e PIBIC) e criar programas de iniciao docn-cia e extenso.

    O programa Pet teve especial incentivo desde o incio do governo, sendo reto-mados os pagamentos de tutores e bolsistas; Foram criados 30 (trinta) novos grupos, constitudos por estudantes bolsistas de graduao coordenados por um professor tutor. Esses trinta grupos foram classificados em trs lotes; o primeiro visa o desen-volvimento regional, priorizando as IFES localizadas em estados da federao que ainda no participam do PET ou que contam com, no mximo, dois grupos; o segundo lote visa atender as IES que se proponham a trabalhar em temas voltados a polticas pblicas em reas prioritrias; e o terceiro aberto as IFES localizadas em unidades da federao que possuam trs ou mais grupos PET e demais IES independentemente da sua localizao geogrfica. Os recursos para bolsas de iniciao cientfica (Pibic) tambm tiveram um aumento significativo desde o incio do governo, de 40.727.039 reais em 2002 para 49.979.734 em 2005, um aumento de 22,7% nos primeiros trs anos de governo.Em estgio avanado de execuo.

    12 Rever o atual sistema de avaliao que inclui o Exame Nacional de Cursos ENC ou Provo e implantar um sistema nacional de avaliao insti-tucional a partir, entre outras, da experincia do Programa de Avaliao Institucional das Universi-dades Brasileiras (PAIUB).

    A extino do Provo e a aprovao da Lei do Sinaes (Sistema Nacional de Aval-iao da Educao Superior) pelo Congresso Nacional, a sano da Lei pelo presidente, a instalao das Comisses Prprias de Avaliao em cada uma das 2.013 IES do pas, a aplicao de duas edies do Exame Nacional de Desem-penho dos Estudantes (Enade) e a concluso dos novos instrumentos de avalia-o de cursos e instituies mostram que esta ao est em estgio avanado de execuo e em pleno processo de consolidao.

    13 Revisar as carreiras e matrizes salariais dos do-centes e funcionrios tcnico-administrativos das IFES (universidades e CEFETs) com base em parmetros de qualificao e desempenho, e adoo de planos de qualificao profissional para os funcionrios tcnico-administrativos.

    Os servidores tcnico-administrativos das IFES conquistaram, aps anos de luta, o seu plano de carreira, com ganhos salariais expressivos. Esta conquista histrica representou novo piso salarial (passando de 452,00 para 701,98 reais), alm da incorporao de gratificaes. A carreira docente est em processo de reviso, tendo sido eliminado o carter produtivista da Gratificao de Estmulo Docncia (GED) e abrindo a perspectiva de sua incorporao ao salrio, alm da incorporao das outras gratificaes existentes. Embora sem uma nova car-reira docente, possvel afirmar que os ganhos salariais da categoria tm sido significativos se comparados com os ltimos 8 anos. Em 2003, por exemplo, os aumentos salariais variaram entre 10 e 34%, bem superiores ao dos anos anteriores.

    Em estgio intermedirio de execuo.

    14 Revisar as atribuies e a composio (represen-tatividade) do Conselho Nacional de Educao (CNE).

    Algumas medidas que discutem as atribuies do CNE esto em discusso e devem fazer parte do Decreto-ponte a ser encaminhado presidncia proximam-ente. No h iniciativas no sentido de rediscutir a representatividade dos mem-bros do CNE. Em fase inicial de execuo.

    15 Ampliar a superviso, pelo poder pblico, da ofer-ta e expanso dos servios pblicos de educao superior prestados por IES pblicas e privadas, respeitada a autonomia universitria.

    Algumas aes tm sido tomadas nos ltimos trs anos nos sentido de inibir a expanso desenfreada de instituies privadas. Uma destas aes foi o fecha-mento por quase um ano do protocolo do MEC. A outra, um maior rigor no julga-mento de novos pedidos. Estudos recentes do Inep, por reas de conhecimento, permitiro estudos mais aprofundados das realidades regionais e das unidades