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Caminhos e Trajetos da Filantropia Científica em São Paulo. A Fundação Rockefeller e suas Articulações no Ensino, Pesquisa e Assistência para a Medicina e Saúde (1916-1952) MARIA GABRIELA S. M. C. MARINHO ANDRÉ MOTA (ORGANIZADORES) Caminhos e Trajetos da Filantropia Científica em São Paulo. A Fundação Rockefeller e suas Articulações no Ensino, Pesquisa e Assistência para a Medicina e Saúde (1916-1952) Coleção Medicina, Saúde & História

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  • Caminhos e Trajetos da Filantropia Cientfica em So Paulo.

    A Fundao Rockefeller e suas Articulaes no Ensino,

    Pesquisa e Assistncia para a Medicina e Sade (1916-1952)

    MARIA GABRIELA S. M. C. MARINHOANDR MOTA(ORGANIZADORES)

    3

    Caminhos e Trajetos da Filantropia Cientfica em So Paulo.

    A Fundao Rockefeller e suas Articulaes no Ensino, Pesquisa e Assistncia para a Medicina e Sade (1916-1952)

    Coleo Medicina, Sade & Histria

    Coleo Medicina, Sade & Histria

    ol. 1 ol. 2

  • Andr MotaCristina de Campos

    Gustavo Querodia TarelowMaria Gabriela S. M. C. Marinho

    Coleo Medicina, Sade & Histria

    Vol. III

    Caminhos e Trajetos da Filantropia Cientfica em So Paulo.

    A Fundao Rockefeller e suas Articulaes no Ensino,

    Pesquisa e Assistncia para a Medicina e Sade (1916-1952)

    Coleo Medicina, Sade & Histria

    Vol. I Prticas Mdicas e de Sade

    nos Municpios paulistas:a histria e suas interfaces

    Vol. IIHistria da Psiquiatria:

    Cincia, prticas e tecnologias de uma especialidade mdica

    Vol. IIICaminhos e Trajetos da Filantropia Cientfica

    em So Paulo. A Fundao Rockefeller e suas Articulaes no Ensino, Pesquisa e

    Assistncia para a Medicina e Sade (1916-1952)

  • Caminhos e Trajetos da Filantropia Cientica em So

    Paulo. A Fundao Rockefeller e suas Articulaes no

    Ensino, Pesquisa e Assistncia para a Medicina e Sade

    (1916-1952) / Maria Gabriela S.M.C.Marinho e Andr

    Mota. -- So Paulo: USP, Faculdade de Medicina: UFABC,

    Universidade Federal do ABC: CD.G Casa de Solues e

    Editora, 2013

    180 p. : il. ; 21 cm. (Coleo Medicina, Sade e Histria, 3)

    Vrios autores

    ISBN: 978-85-62693-14-4

    1. Medicina So Paulo (Estado) Histria. 2. Medicina -

    Psiquiatria So Paulo (Estado) So Paulo (Estado). I. Mota, Andr.

    II. Marinho, Maria Gabriela S.M.C. III . Ttulo.

    CDD 610.98161

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    2013 by

    Profa. Dra. Maria Gabriela Silva Martins da Cunha Marinho

    Prof. Dr. Andr Mota

    Direitos desta edio reservados Comisso de Cultura

    e Extenso Universitria da Faculdade de Medicina da

    Universidade de So Paulo CCEx-FMUSP

    Proibida a reproduo total ou parcial, por quaisquer meios,

    sem autorizao expressa da CCEx-FMUSP

    Imagem da capa

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    de maro de 1943.

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    P912

  • SumrioPrefcio ..................................................................................................................................................................................7Jos Ricardo de Carvalho Mesquita Ayres

    Parte 1PRojEToS ModElARES: A FIlAnTRoPIA CIEnTFICA ESColHE So PAulo ...............................................................................................................................................11

    DifunDir a CinCia, MoDernizar a MeDiCina. PaCtos Para uMa nova raCionaliDaDe MDiCa: so Paulo, 1916-1925 ...........................................................................................................................13Maria Gabriela S.M.C. Marinho

    a viageM De geralDo Paula souza Para os estaDos uniDos, 1918-1920: fragMentos De uMa Histria Da relao entre a funDao roCkefeller e o instituto De Higiene De so Paulo ........................................................................................................................37Cristina de Campos

    o HosPital Das ClniCas De so Paulo e a PoltiCa Da Boa vizinHana norte-aMeriCana, 1938-1944 ............................................................................................................................57Andr MotaGustavo Querodia Tarelow

    Parte 2ElITES EM nEgoCIAo. BREVE HISTRIA doS ACoRdoS EnTRE A FundAo RoCkEFEllER E A FACuldAdE dE MEdICInA dE So PAulo (1916-1931) REIMPRESSo ................................................................................................... 79Maria Gabriela S.M.C. Marinho

    Prefcio .................................................................................................................................................................................81Hebe Vessuri

    soBre os autores ............................................................................................................................................................... 177

  • 7PREFCIoQuem quer que se proponha a compreender as prticas de sade

    brasileiras, seja em sua atualidade, seja no seu processo de conformao tcnica e institucional ao longo do sculo XX, sempre encontrar uma referncia ineludvel: a Fundao Rockefeller.

    A presena da Fundao se faz sentir de diferentes modos, de acordo com a forma de aproximao a essas prticas. Se as tomamos desde uma perspectiva institucional, encontraremos os recursos da Fundao inanciando e fornecendo modelos estruturais e gerenciais de escolas de formao proissional e institutos de pesquisa de papel nuclear no desenvolvimento das prticas de sade brasileiras, como a Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo, a Faculdade de Sade Pblica (inicialmente Instituto de Higiene), a Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto, as escolas de enfermagem da USP, em So Paulo, e Ana Neri, no Rio de Janeiro, entre outras. Voltada predominantemente, em um primeiro momento, para aes de carter poltico-sanitrio e, mais adiante, focada no desenvolvimento mdico-cientico, a Fundao desenvolveu no Brasil, como em diversas outras partes do mundo, um extenso trabalho de implantao de bases institucionais para um profundo movimento de transformao das prticas de sade, estendendo um modelo que se consolidou no trabalho de inluentes Universidades norte-americanas1.

    Uma outra via pela qual encontramos as marcas da Fundao Rockefeller a da prpria concepo ilosica, poltica e tcnica das prticas de sade. O modelo institucional que ela ajudou a disseminar pelo mundo, e no Brasil no foi diferente, carrega um trao caracterstico e marcante, que pode ser sintetizado como uma modernizao das prticas mdicas e sanitrias, o que, neste caso, queria dizer a busca de uma radical articulao entre o fazer tcnico e a investigao cientica especialmente a investigao de base laboratorial2.

    Mas no foram apenas as cincias bsicas e biomdicas que foram chamadas a compor tal modernizao. No entrecruzamento entre o grande interesse prtico despertado pelas condies sanitrias e o controle das doenas em escala populacional no incio do sculo XX, o notvel desenvolvimento das tcnicas de quantiicao e anlise de dados aplicadas a coletivos humanos, e essa busca de bases cienticas para a ao da moderna sade pblica, veio conformar-se o ambiente propcio para a formalizao de uma nova rea cientica que, do lado de fora dos laboratrios, viria a adquirir tambm um papel de transcendente relevncia para a sade: a epidemiologia3. Assim que,

    1 Cf. Faria, L.; Costa, MC. Cooperao cientica internacional: estilos de atuao da Fundao Rocke-feller e da Fundao Ford. Dados Revista de Cincias Sociais. 49(1): 159 a 191, 2006.

    2 Cf. Visealtear, AJ. The emergence of pioneering public health education programmes in the United States. In: Fee, E.; Acheson, RM. (eds.) A history of education in public health health that mocks the doctors rules. Oxford, Oxford University Press, 1991, p. 114-54.

    3 Cf. Ayres, JRCM Sobre o risco: para compreender a epidemiologia. 3. Ed. So Paulo, Hucitec, 2008, 328 p.

  • 8na histria da construo dessa jovem, revolucionria e controversa cincia da sade, tambm encontramos forte protagonismo da Fundao Rockefeller, que no apenas concorreu para sua consolidao como rea de produo de conhecimento, especialmente nos EUA, como ajudou a disseminar pelo mundo o seu ensino e aplicao.

    Este e outros compromissos com a disseminao da produo cientica em sade e de intervenes tcnicas nela embasadas nos remetem a outra entrada pela qual cruzamos necessariamente com as contribuies da Fundao: a formao de proissionais. A Fundao Rockefeller, como apontado acima, apoiou a criao de diversas escolas de medicina, sade pblica e enfermagem no Brasil. Financiou, de outro lado, um intenso intercmbio entre professores e estudantes, trazendo diversos especialistas dos EUA para o Brasil e vice-versa, alm de fornecer bolsas para um expressivo nmero de estudantes brasileiros, inanciando sua ida s Universidades e Institutos de ponta nos EUA para aprimorarem sua formao cientica e proissional4. Mais importante, porm, do que todo esse movimento de intercmbio de pessoas e inanciamento de escolas, e inseparvel deles, foi o apoio poltico que a Fundao deu ao amplo e radical processo de reforma das concepes e tcnicas de ensino da medicina e da Sade Pblica, nos EUA e fora dele5. Capitaneada por nomes como Abrahan Flexner, Wickliffe Rose e William Welch, foi to impactante essa reforma, e to fundamental o apoio da Fundao, que no raro ouvimos referncias a um modelo Rockefeller como paradigmtico do que se faz at hoje na formao em sade em nosso pas tanto entre os que defendem, quanto entre os que criticam tal paradigma.

    Bem, mas este o lado, digamos, luminoso, da imagem que temos da Fundao Rockefeller na histria das prticas e instituies de sade em nosso pas. E no falsa essa imagem. Como dizamos ao incio, impossvel no perceber as contribuies concretas da Fundao Rockefeller a essa histria. Mas h nela tambm um lado menos glamouroso, certamente. O que no est imediatamente dado percepo da participao da Fundao nessa histria : Por qu? Por que a Fundao Rockefeller se empenhou to decisivamente nesse projeto? Instrumentalizao poltica, diro alguns. Altrusmo, respondero outros6. Na verdade no se pode refutar de forma absoluta nem uma nem outra tese. H documentao histrica consistente para sustentar a evidente relao de lideranas da Fundao com nomes e movimentos polticos ainados com os interesses econmicos e ideolgicos que poderamos chamar genericamente de americanistas7. Mas fato inegvel, tambm, que a criao e atuao da Fundao Rockefeller foi perfeitamente coerente com a formao cultural norte-americana; com o privatismo radical e publicismo pleno8 que marcaram a construo do espao pblico

    4 Cf. Marinho, MGSMC. A Fundao Rockefeller e instituies de ensino e pesquisa em So Paulo. Procedimentos, prticas e personagens no campo biomdico: uma anlise preliminar (1916-1952). Ho-rizontes. 22(2): 151-158, 2004.

    5 Cf. Schraiber, LB. Educao mdica e capitalismo. So Paulo, Hucitec-Abrasco, 1989; Ayres, op.cit.6 Cf. Faria, LR. Os primeiros anos da reforma sanitria no Brasil e a atuao da Fundao Rockefeller

    (1915-1920). Physis Revista de Sade Coletiva. 5(1):109-129, 1995.7 Cf. Marinho, op. cit.8 Cf. Ayres, op. cit.

  • 9norte-americano, e que izeram escoar sob a forma de grandes instituies ilantrpicas os movimentos de construo de solidariedade social que em outras sociedades foram aglutinadas pelo Estado ou por instituies tradicionais de carter religioso, tribal ou familiar.

    Mas talvez um dos grandes desaios da investigao histrica seja mesmo este, o de garimpar os fatos histricos nas diversas dimenses em que estes se manifestam como fenmenos interpretativos, resgatando, nas tramas que permitem relacionar essas diferentes leituras, os liames que, ao contrrio de nos prender verdade do passado, nos permitem, conforme nos advertiu Goethe, desembaraar-nos desse passado.9

    No de admirar, portanto, que a Coleo Medicina, Sade e Sociedade, tenha selecionado como um de seus primeiros nmeros, o tema da Fundao Rockefeller. A marcante presena da Fundao na histria da sade no Brasil e as narrativas diversas, lacunares e muitas vezes apaixonadamente polarizadas acerca dos signiicados dessa presena, fazem dela um tema de extrema potncia para os historiadores da sade e de no menor interesse para ns todos, beneicirios do seu ofcio. Revisitar essa histria, com a contribuio de novos ou renovados estudos, contando, nesta iniciativa, com a especial contribuio de uma de nossas maiores autoridades sobre o tema, a Professora Maria Gabriela Marinho, uma preciosa oportunidade para nos emanciparmos do legado rockefelleriano. Emancipao entendida aqui no como absurda e impossvel ruptura com o passado, mas no sentido referido acima por Srgio Buarque de Holanda, e ao qual nos abriu certa conscincia histrico-hermenutica contempornea: a de que a liberdade de pensarmos nosso futuro depende de uma rigorosa apropriao crtica de nossa histria.

    So Paulo, 18 de janeiro de 2013

    Jos Ricardo C. M. Ayres

    9 Cf. Holanda, SB. Apologia da Histria. In: Holanda, SB. Srgio Buarque de Holanda: escritos coligi-dos: Livro II, 1950-1979 / Marcos Costa (Org.). So Paulo, Editora UNESP:Fundao Perseu Abramo, 2011, p. 18.

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    Parte 1PRojEToS ModElARES:

    A FIlAnTRoPIA CIEnTFICA ESColHE So PAulo

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    DifunDir a CinCia, MoDernizar a MeDiCina.PaCtos Para uMa nova raCionaliDaDe MDiCa: so Paulo, 1916-1925.

    Maria Gabriela S. M. C. Marinho

    Em busca de informaes, a

    Fundao Rockefeller chega ao BrasilO estudo mais sistemtico sobre os acordos estabelecidos a partir

    de 1916 pela Fundao Rockefeller e a ento Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo (FMCSP)1 foi realizado no inal da dcada de 1980 e defendido como dissertao de mestrado em 19932. As negociaes que resultaram na formulao e execuo dos referidos acordos foram precedidas de uma longa viagem realizada por mdicos e pesquisadores norte-americanos que no comeo daquele ano desembarcaram no Brasil em busca de informaes sobre as condies gerais do pas em termos de ensino mdico e assistncia hospitalar. Selecionados entre instituies prestigiadas da cincia biomdica norte-americana, os designados para a comisso deveriam veriicar ainda a existncia, em alguns estados brasileiros, de estruturas sanitrias e de atendimento sade que poderiam compor, de algum modo, uma rede ou um sistema de preveno e enfrentamento de doenas endmicas, ento inexistentes em esfera nacional3.

    Na perspectiva da Fundao, a questo sanitria deveria ser analisada e enfrentada por diferentes ngulos. Cabia compreender e atuar sobre o territrio, por meio de campanhas de preveno e proilaxia, com a 1 Em 1925, passou a ser denominada Faculdade de Medicina de So Paulo. Com a criao da Universi-

    dade de So Paulo em 1934, tornou-se Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (FMUSP) como conhecida ainda hoje.

    2 O estudo oferece detalhes sobre a criao e atuao da Fundao Rockefeller na Faculdade de Medicina e pode ser conferido na segunda parte desta publicao que reproduz na ntegra o texto Elites em Negocia-o, cuja publicao original data de 2003. O presente captulo revisa e aprofunda alguns dos temas que foram ali abordados como resultado do mestrado desenvolvido no Departamento de Poltica Cientica e Tecnolgica/DPCT-Unicamp, defendido em 1993. Conferir tambm: Marinho (1993 e 2003).

    3 No mesmo ano, 1916, outra comisso designada pela Rockefeller composta pelo prestigiado mdi-co e militar norte-americano William Gorgas e por Walter Reed desenvolveu no Brasil uma srie de estudos voltados para as condies de incidncia da Febre Amarela e da Malria no Brasil. Conferir, entre outros, Benchimol (2001) e Lwy (2006). As duas comisses visitaram tambm o Equador, Peru, Colmbia e Venezuela, alm do Brasil, com o objetivo de pesquisar as condies de incidncia e leta-lidade da febre amarela, determinar os polos de infeco e as medidas necessrias para erradicao da doena. Paralelamente, a segunda comisso buscava coletar informaes sobre as instituies de ensino e pesquisa no campo biomdico.

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    instalao de postos de sade, dispensrios mdicos, vacinao, educao sanitria, pela mobilizao, enim, dos instrumentos disponveis para o enfrentamento e controle de endemias e epidemias.

    Outro ngulo da questo referia-se formao de quadros tcnicos e proissionais que pudessem atuar de modo seguro e eicaz nas campanhas ou nas estruturas permanentes de controle sanitrio. Associado ao princpio da formao de quadros operacionais, sobrepunha-se, ainda, um terceiro aspecto: o fomento pesquisa cientica e o apoio ao estabelecimento de grupos permanentes, por meio de inanciamento s instalaes e equipamentos necessrios ao desenvolvimento das atividades, alm da concesso de bolsas de estudos e patrocnios, aquisio de publicaes, formao de bibliotecas. Em situaes especicas, esse apoio levou ao desenvolvimento de novas reas do conhecimento, tais como o da chamada Biologia Molecular.

    Nesse sentido, e dada a diversidade de sua atuao no Brasil, a presena da Fundao Rockefeller no pas ainda precisa ser estudada de modo mais sistemtico, em amplitude e profundidade. Grosso modo, pode-se apontar uma especializao e, por conseguinte, certa espacializao dessa atuao. Desse modo, e numa anlise ainda preliminar, possvel considerar que o Rio de Janeiro centralizou aes relativas s campanhas de Sade Pblica, em especial da Febre Amarela, com repercusses sensveis na montagem da estrutura federal de polticas pblicas para a rea da Sade a partir de 1930 at a criao do Ministrio da Sade em 1953.

    Por outro lado, So Paulo de certo modo concentrou recursos destinados a se qualiicar como centro irradiador de capacitao para quadros proissionais na rea da Sade, seja pela profunda remodelao que imps em sua faculdade de medicina, seja pela criao do Instituto de Higiene, depois Faculdade de Sade Pblica. Para alm, da formao de quadros proissionais para a Sade, a Universidade de So Paulo tornou-se tambm o desaguadouro de recursos considerveis para a pesquisa biomdica, entre as quais, o resultado mais visvel foi a implantao do Departamento de Gentica e a presena decisiva de Theodosius Dobzhansky na pesquisa com drosilas, o que assegurou ao grupo brasileiro visibilidade e prestgio internacionais 4.

    No primeiro estudo sobre os acordos da Fundao Rockefeller em So Paulo, como referido inicialmente, a anlise estendeu-se pelo perodo de quinze anos. Por meio daquele trabalho, possvel conhecer em suas grandes linhas a articulao entre as duas instituies, no caso, entre a Fundao Rockefeller e a Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo. Ali, a presena da comisso de estudos de 1916, registrada como Comisso Mdica para o Brasil, coordenada por Richard Mills Pearce, e a meno aos pesquisadores posteriormente designados para se instalar em So Paulo, so referncias passageiras. O objeto daquele estudo se concentrava muito mais em oferecer um quadro geral sobre a lgica e o percurso das negociaes, e a subsequente implantao das deliberaes, do que no detalhamento dos mltiplos aspectos que envolveram o processo.

    4 Conferir Glick (1994).

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    O captulo aqui apresentado busca exatamente tratar com mais profundidade dois aspectos apenas mencionados no trabalho anterior. Primeiro, acompanha em detalhes a jornada empreendida pela Comisso Mdica a partir do Relatrio elaborado pelo grupo. Depois, seleciona e analisa parte da correspondncia trocada entre os quatro pesquisadores que se instalaram em So Paulo entre 1918 e 1924. Dois deles, Samuel Taylor Darling e Wilson Smillie, concentraram-se na implantao da Cadeira e do Laboratrio de Higiene, depois Departamento de Higiene, embrio do que mais tarde se tornaria Instituto de Higiene, em 1925, e Faculdade de Sade Pblica, em 1946.

    Os outros dois, o canadense Oskar Klotz e Richard Archibald Lambert, dedicaram-se a implantar o Instituto de Anatomia Patolgica. O quinto personagem de interesse e relevo na documentao agora analisada5 Richard Mills Pearce, diretor da Diviso Mdica da Fundao Rockefeller, chairman da Comisso de Estudos de 1916 e principal mediador das negociaes entre as duas instituies at sua morte em 1924.

    o institucional e o pessoal: o trgico,

    o fluido e o transitrio pontuam o

    processo

    Um aspecto que emerge na presente anlise refere-se dimenso trgica da existncia que pontua a experincia humana. Ao longo dos documentos examinados, e para alm dos acordos, das negociaes, dos entraves burocrticos, avulta o infortnio que atravessou esse conjunto de relaes, como poder ser observado pela seleo da correspondncia aqui analisada. To logo desembarcaram em 1918, mal haviam se aclimatado s condies locais, poucos meses depois, a devastao da Gripe Espanhola solapou a cidade de So Paulo, como de resto ocorreria no pas e em diferentes localidades do globo, naquela que foi uma das piores epidemias do sculo XX.

    No plano pessoal, fora do quadro das catstrofes mundiais, algumas perdas foram irreversveis para membros desse grupo, como a morte de parto da esposa de Wilson Smillie , em outubro de 1918, cerca de seis

    5 Agradeo a Helosa Pimenta da Rocha, da Faculdade de Educao da Unicamp, e a Luz Antonio de Castro Santos e Lina de Faria (IMS-UERJ) a cesso de documentos originais. A documentao cedida por Helosa, coletada na Faculdade de Sade Pblica, foi reproduzida e depositada no Centro de Documentao e Apoio Pesquisa Histrica da Universidade So Francisco em Bragana Paulista (CDAP-USF), onde se encontra disponvel para consulta. A documentao cedida por Luz Antonio foi coletada por ele junto ao Rockefeller Center em Nova York e organizada no Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro onde a consultei.

  • 16

    meses depois da chegada em So Paulo. Do ponto de vista institucional, alm de Pearce, duas outras mortes foram marcantes ao longo do processo: o falecimento de Arnaldo Vieira de Carvalho, diretor da Faculdade de Medicina, em 1920, aos 54 anos, e do pesquisador Samuel Taylor Darling, que adoeceu em So Paulo, partiu de volta para os Estados Unidos, onde morreu em maio de 1925, aos 53 anos.

    Porm, ao se olhar para outra direo, emergem tambm dessa nova documentao elementos que permitem compreender como a cidade de So Paulo e sua elite mdica rapidamente se dispuseram a pactuar vnculos e aceitar as credenciais cienticas e institucionais do grupo estrangeiro que aqui aportou. A disposio, disponibilidade e abertura para pactos culturais com o exterior no eram novidade para o grupo dirigente da cidade e do estado. A luidez no trato e o desembarao nos contatos logo foram percebidos e assinalados na correspondncia que se produziu.

    Contudo, se os acordos foram rapidamente pactuados, sua execuo no assumiu a mesma celeridade, como foi demonstrado pelo estudo anterior, referido acima. A distncia entre a inteno e o gesto, ou entre o pacto e a execuo, um aspecto interessante que poder, eventualmente, ser mais amplamente estudado em torno dos mltiplos acordos que a Fundao Rockefeller estabeleceu no pas. Entre outras razes, pode se considerar que essa distncia uma das expresses do embate entre estruturas sociais, valores culturais e racionalidades muito distintas, no bastando apenas o voluntarismo de um grupo dirigente para que se implantem transformaes que venham a se enraizar e se consolidar.

    Nesse sentido, novos pactos e suas execues, fracassadas ou bem-sucedidas, resultam do enfrentamento de vises de mundo, interesses, tenses e contradies que revelam um tempo histrico em permanente movimento. Ao longo do sculo XX, a Fundao Rockefeller geriu, por meio de suas aes, um poderoso projeto de transformao social e se constituiu como fora modeladora que mereceu adeses, recusas, crticas, em torno de reas vitais para a sobrevivncia humana. Parte dessa experincia encontra-se revisitada na anlise a seguir.

    uMa CiDaDe iMersa nas ContraDies De seu teMPo soCial

    Em 1966, vrias personalidades paulistanas, entre as quais sobressaam notveis da rea mdica acadmicos, cirurgies, especialistas de projeo em seus campos de atuao se cotizaram para custear a produo de dois volumes da biograia de Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho (Guimares 1967)6. Tratava-se, naquela conjuntura, de

    6 Dados biogricos e referncias mais extensas sobre a trajetria de Arnaldo Vieira de Carvalho podero ser obtidas em Dantes e Silva (2012), Mota (2012), (Mota e Marinho, 2010), Marinho (2012).

  • 17

    celebrar o centenrio de nascimento de um expoente local cuja trajetria vinha se prestando, desde sua morte em 1920, a diferentes simbolismos e apropriaes (Mota, 2012). Mdico, diretor da Faculdade de Medicina de So Paulo, da Santa Casa de Misericrdia, do Instituto Vacinognico, presidente da Sociedade de Medicina e Cirurgia, entre outras posies de destaque, emerge da narrativa de Palma uma personagem profundamente conectada com o espao urbano da cidade em plena transformao nas dcadas iniciais do sculo XX7.

    O convvio intenso e rotineiro com a parcela da cidade urbanizada, embelezada e higienizada, constitua-se em um dos elos que articulavam os grupos locais abastados, cujos membros buscavam reproduzir hbitos considerados civilizados, procedentes e referenciados em grande medida pelas metrpoles europeias. Desde a gesto do conselheiro Antonio Prado na Intendncia de So Paulo (1899-1911) alguns trechos da cidade haviam sido cuidadosamente selecionados, remodelados e cultivados como elementos de identiicao e prestgio para exibio e fruio dos potentados locais em busca de sintonia com os modelos europeus.

    Nesse ambiente de requinte, coninado a parques, jardins, alamedas e bulevares que exibiam ediicaes suntuosas, praticava-se um convvio social plenamente ainado com os preceitos higienistas assumidos por Arnaldo Vieira de Carvalho ainda que nas frestas e nas margens da cidade idealizada se avolumassem os cortios, as vrzeas e crregos sujeitos ao alagamento constante, onerando uma populao indefesa perante as enchentes, o lixo e os insetos que invadiam espaos sem saneamento.

    7 Entre exaltaes, compilaes e descries do biografado, emerge daquela narrativa o reproduzido a seguir. Embora longo, revelador por assinalar hbitos, trajes e roteiro dirio de um membro da elite mdica de So Paulo no comeo do sculo. Os trajetos e hbitos rotineiros de perambulao pelos es-paos urbanos, e a fruio de uma prestigiada rede de sociabilidades, apuravam em Arnaldo o gosto pelo reinamento que muito o aproximaria dos pares estrangeiros com quem travava contato frequente, como pode ser acompanhado a seguir: (...) Vestia-se na Casa Raunier, calava botinas de couro ingls, de polimento ou verniz, usava camisas de linho brancas, colarinhos e punhos engomados, botes de ouro nos punhos; perola na gravata de cor sbria, ou preta com mais freqncia; na lapela duas lores de ervilha-de-cheiro. Ei-lo pronto para a lida cotidiana. Chegava Santa Casa entre sete e oito horas. Levantava-se entre cinco e seis e quebrava o jejum com meia garrafa de gua de Vichy quente. Ginstica sumaria. Passava diariamente pela casa das irms Albertina e Adelina esquina da rua Timbiras com a Praa da Repblica (...) Operava todos os dias, na Santa Casa e no Santa Catarina, com freqncia mais de um caso cada dia, e tinha habitualmente a assistncia de colegas visitantes. (...) Ao deixar a Santa Casa dirigia-se ao Instituto Vacinognico, depois de ter passado pelo Sanatrio Santa Catarina. A seguir a 1913 encaminhava-se Faculdade de Medicina. Ao tornar casa, entre doze e treze horas, tomava um primeiro banho, quente e demorado, e almoava. Comia pouco e no dispensava vinho tinto francs. Repousava alguns minutos na biblioteca, renovava todo o vesturio e partia, em caminhada, para a Po-liclnica (...). Da Policlnica rumava para o consultrio, que desde 1900 foi sempre em prdios da rua S. Bento (...). Terminado o expediente, descia a encontrar-se com Mathias Vallado e seguiam ambos pelo Triangulo, rumo praa Antonio Prado. (...) Pelas quatro horas da tarde, voltava a casa, a tomar ch com a esposa e os ilhos, quando no o retinham amigos porta do jornal [O Estado de Paulo, onde escre-via regularmente uma coluna sob o pseudnimo Epicarnus] ou pelas confeitarias Pinoni ou Castelles (...). Jantava s sete e meia (...). Aps o jantar e breves momentos de convvio com a famlia, ei-lo de novo toda a fatiota renovada em marcha batida (...) na visita quase diria a Ramos de Azevedo. Amigos reuniam-se ali a jogar bilhares, a rir, a contar casos. noite, de volta cidade, passava outra vez pela Redao do Jornal, dispensava a viatura e subia. Era ento um sodalcio erudito que se reunia na sala de Julio de Mesquita (...). Essa rotina de Arnaldo no colidia, entretanto, com as reunies da Sociedade de Medicina e Cirurgia (...). Pelas dez para onze recolhia-se. Por essas bilaquianas e extintas noites frias e brumosas da S. Paulo garoenta desse tempo, poderia ser visto, a gola do sobretudo levantada, um vulto solitrio que cruzava a passo cadenciado o viaduto Santa Iignia. (Palma Guimares, 1967, p.17-23).

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    Em meio s contradies, contudo, a igura de Arnaldo encaixava-se com desenvoltura no projeto social hegemnico conduzido por So Paulo nas primeiras dcadas republicanas. As origens familiares, os valores, hbitos e perspectivas intelectuais compartilhadas com o movimento sanitrio-higienista que se difundia em escala mundial, ao lado de sua insero privilegiada no ambiente poltico e acadmico do pas, asseguravam-lhe uma interlocuo qualiicada com membros da comunidade mdica e cientica internacional. Portanto, ao reunir em torno de si esse conjunto de atributos desejveis, Arnaldo conigurava-se como membro legitimado das elites letradas paulistas que partilhavam as referncias estticas e culturais associadas ao padro civilizacional eurocntrico.

    A existncia desse substrato cultural comum se manifestava tambm nos valores e crenas partilhadas por outras personagens locais que, assim como Arnaldo, se relacionariam diretamente com os enviados da Fundao Rockefeller a So Paulo. Entre os personagens que se destacariam nessas relaes cienticas e institucionais iguravam Alexandrino de Moraes Pedroso e Benedicto Montenegro, ambos diplomados em Medicina nos Estados Unidos, Geraldo Horcio de Paula Souza e Ernesto de Souza Campos, que se tornaram bolsistas da Fundao Rockefeller, e Ernesto Puech, entre outros8. As credenciais favorveis, em termos de repertrio pessoal e trato cosmopolita dessa elite mdica local, se revelariam instrumentos valiosos nos contatos estabelecidos por quase dez anos com os membros das comisses que visitaram So Paulo a partir de 1916 e com os pesquisadores que se ixaram na cidade entre 1918 e 1925.

    nessa direo, portanto, que se pretende analisar neste captulo o modo como se processaram localmente interaes cienticas e institucionais, mas tambm afetivas e existenciais, dos pesquisadores e prepostos da Fundao Rockefeller que visitaram ou se ixaram em So Paulo entre nas primeiras dcadas do sculo passado. Trata-se, portanto, de recuperar prticas, valores e a viso de mundo de personagens que interagiam, confrontavam e negociavam com as circunstncias locais em um perodo conturbado da cidade. Habitada por segmentos sociais muito distintos, o perodo em questo foi palco de eventos signiicativos, por vezes dilacerantes, para uma cidade que se viu paralisada pela greve geral de 1917, abatida pela epidemia da Gripe Espanhola de 1918, supostamente escandalizada pelas ousadias modernistas da Semana de 22 e, por im, convulsionada pelo levante de 1924.

    No interior desse tempo social, entre 1916 e 1925, custeados pela ilantropia norte-americana, visitaram ou permaneceram-se mais longamente na cidade de So Paulo, mdicos, pesquisadores e membros de alto nvel do staff da Fundao Rockefeller, entre os quais, George Vincent, seu presidente entre 1917 e 1929, Wickliffe Rose, diretor da Junta Sanitria 8 O mdico Alexandrino de Moraes Pedroso, do Instituto Bacteriolgico, formado nos Estados Unidos

    em 1904, pela Universidade da Pensilvannia, que havia inicialmente intermediado os primeiros conta-tos entre Arnaldo Vieira de Carvalho e Richard Pearce, passou a servir de intrprete a Taylor em suas aulas e exposies. Mais tarde, Pedroso foi indicado membro permanente do comit que a Fundao manteve durante alguns anos em So Paulo.

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    Internacional no perodo de 1913 a 1923, Lewis Hackett e Richard Pearce, que se tornaria o diretor da Diviso de Cincias Mdicas, entre 1919 e 1930. Desse conjunto de visitantes, no entanto, quatro pesquisadores se ixaram em So Paulo por um perodo mais longo: Samuel Taylor Darling, Wilson Smillie, Oskar Klotz e Richard Archibald Lambert.

    Por im, encontram-se realadas as experincias cotidianas, as diiculdades de adaptao, o olhar estrangeiro sobre a cidade e o estado, seus hbitos e crenas, o estranhamento perante realidades por vezes incompreensveis para seres oriundos de terras to distantes. Parte dessa documentao deixa entrever, ainda, disputas e ressentimentos entre os prprios comissionados da Fundao Rockefeller, como o caso, em particular, de certa rispidez na comunicao entre Wickliffe Rose e Richard Pearce.

    A documentao pesquisada procede, em sua maior parte, dos registros gerados pelos prprios personagens e arquivados no Rockefeller Archive Center. Contudo, parte desse material encontra-se duplicado, por razes distintas, em diferentes instituies nacionais e em arquivos nem sempre acessveis. A im de assegurar uma narrativa mais articulada, optou-se por apresentar uma estrutura de fundo linear e cronolgica que recupera inicialmente presena das comisses que visitaram o Brasil entre 1916 e 1917 e prossegue com o processo de vinda dos pesquisadores citados acima.

    Em 1916, a Fundao Rockefeller constituiu duas comisses para percorrer o Brasil: a Comisso Sanitria da Febre Amarela, presidida por William Gorgas e Walter Reed e a Comisso Mdica para o Brasil, presidida por Richard M. Pearce, professor de Pesquisa Mdica da Universidade da Pennsylvania, e composta por John A. Ferrell, da Comisso Sanitria Internacional, e Bailey Ashford do Corpo Mdico do Exrcito Norte-Americano, e secretariada por W. D. Garvey. Neste trabalho, a nfase na anlise incidiu sobre a Comisso Mdica que gerou impacto direto para a instalao dos acordos com a Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo. A Comisso da Febre Amarela se tornaria decisiva para a implantao das campanhas e postos de proilaxia e combate febre amarela que a Fundao organizaria subsequentemente, com o apoio do Governo Federal.

    De certo modo, os objetivos das duas comisses deiniram o escopo de atuao da Rockefeller no Brasil nas dcadas seguintes quando suas aes se desdobraram em dois grandes campos voltados para a Sade Pblica e Medicina, como apontado anteriormente. Em grande parte, o escritrio de Niteri centralizou, coordenou e irradiou aes de preveno e campanhismo que se estenderam pelo Brasil, em especial no Nordeste brasileiro.

    Por outro lado, a cidade de So Paulo concentrou atividades relacionadas ao ensino mdico, fomento a reas e grupos de pesquisa e estruturao do modelo de formao proissional para a Educao Sanitria. Mais tarde, a partir da dcada de 1950, outras aes relevantes, como o apoio Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo em Ribeiro Preto, se destacariam entre os recursos destinados ao Brasil.

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    Na dcada subsequente, os apoios se deslocariam para a rea da pesquisa agrcola, com intensivos aportes em escolas de Agronomia, como Lavras e Viosa, temas que ainda carecem de estudos. Evidentemente no se trata de estabelecer demarcaes rgidas, mas de perceber nfases e nuances que a documentao e estudos disponveis tm permitido entrever, embora muito ainda esteja por ser sistematizado e analisado.

    aMriCa Do sul: uM territrio a sanearO quadro geopoltico do incio do sculo XX favoreceu a expanso

    da presena norte-americana ao longo do continente. As anexaes de territrio mexicano em meados do sculo XIX, a interveno na guerra hispano-americana no inal do sculo XIX, e a subsequente ingerncia nos rumos da sociedade cubana at 1959, a atuao e efetivo controle do Canal do Panam, e a decorrente sustentao do movimento separatista na Colmbia que deu origem ao estado do Panam, entre outros episdios, assegurou aos Estados Unidos uma posio de fora na regio. As aes intervencionistas resultantes da Doutrina Monroe, ou a poltica do Big Stick, conferiram ao pas uma posio de predomnio e crescente.

    No amplo contexto, portanto, de alargamento da hegemonia norte-americana, a Comisso Mdica para o Brasil partiu na manh do dia 22 de janeiro de 1916 de Nova York com destino ao Rio de Janeiro com escala em Salvador. A longa viagem, que se estenderia at 18 de abril, permitiu que os membros da Comisso visitassem escolas de Medicina, hospitais, dispensrios, servios de sade centros de pesquisa e realizar pesquisa de campo. Ao mesmo tempo, puderam estabelecer contatos com algumas das principais lideranas cienticas, mdicas e institucionais do pas, como Oswaldo Cruz, Adolfo Lutz, Carlos Seidl, Aloysio de Castro e Arnaldo Vieira de Carvalho.

    Ao longo de quatro meses, foram visitados os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paran, So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. O grupo produziu relatrios detalhados acerca dos locais visitados, inclusive com auxlio dos consulados e da embaixada americana. Desse modo, sistematizou informaes de interesse geral sobre as condies de vida social, econmica e poltica, alm de recursos naturais, hbitos, caractersticas e composio racial das populaes nas regies visitadas.

    Na primeira escala, na cidade de Salvador no dia 6 de fevereiro, o grupo realizou uma breve visita Faculdade de Medicina e ao Hospital Santa Isabel. Contavam como trunfo para as visitaes e contatos locais, o beneplcito do Governo Federal brasileiro, conforme revelam as mediaes registradas na troca de correspondncia entre embaixada brasileira, o Departamento de Estado norte-americano. Em Salvador foram recebidos pelo cnsul e vice-cnsul americanos que acompanharam as visitas realizadas.

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    Amparada por credenciais formais em nome da Fundao, a Comisso portava tambm cartas pessoais de autoridades brasileiras e norte-americanas para cientistas e outras personalidades locais. Na documentao oicial que a Fundao emitira constavam, entre os objetivos do grupo, estudar a educao e o sistema de assistncia mdica, incluindo hospitais e dispensrios as doenas recorrentes, as condies sanitrias e as agncias de Sade Pblica9. Assim, ao desembarcar no Rio de Janeiro, na quarta-feira, 9 de fevereiro, a Comisso foi recebida pelo segundo secretrio da embaixada americana que apresentou a lista dos contatos que haviam sido articulados, entre os quais estavam encontros com Carlos Seidl, diretor-geral de Sade Pblica, e respectivos assistentes Graa Couto e Edmundo de Oliveira. Estavam previstos tambm encontros com Adolfo Lutz, Thomaz Alves e Amarlio de Vasconcellos, alm de entrevista com dois oiciais do Departamento Mdico do Exrcito Brasileiro.

    Uma vez instalada no Hotel Internacional, a Comisso deveria preparar uma sinopse completa referente histria, ao povo, geograia e condies econmicas do Brasil, inicialmente para uso prprio, alm de sumrios completos relativos aos principais fatos de cada estado visitado. Cada etapa da viagem era comunicada diretamente a Wickliffe Rose em Nova York, primeiro por cabogramas ou telegramas, depois por via postal. Nos dois dias seguintes, 10 e 11 de fevereiro de 1916, efetivaram-se as visitas e contatos, inicialmente com o Departamento de Sade Pblica e seu diretor, Carlos Seidl, no dia seguinte em Manguinhos, com Oswaldo Cruz, que disponibilizou acesso aos estudos e instalaes de pesquisa do Instituto.

    A partir do contato com Oswaldo Cruz, a Comisso decidiu dividir-se. Ashford permaneceria no Rio de Janeiro, secretariado por Garvey, de onde mais tarde partiu para o distrito de Capela Nova, em Betim, Minas Gerais. Na ento zona rural, nos arredores de Belo Horizonte, Ashford passou a desenvolver estudos em torno da ancilostomase, em articulao com o Instituto Oswaldo Cruz. Pearce e Ferrell, em acordo com Seidl, decidiram prosseguir viagem por quatro estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paran e So Paulo. Ainda no dia 11 de fevereiro, Lutz foi encarregado por Oswaldo Cruz de jantar com o grupo para acertar os detalhes do trabalho no dispensrio que icaria sob a responsabilidade de Ashford, acompanhado por Garvey.

    No dia seguinte, sbado, 12 de fevereiro de 1916, o diretor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Aloysio de Castro, recebeu Pearce e Ferrell que puderam visitar, alm da prpria Faculdade, tambm a Policlnica e o dispensrio, ambos vinculados escola mdica. Mais do que um estudo aprofundado, Ferrell e Pearce pretendiam com a visita conhecer as linhas gerais de atuao da principal escola mdica do pas antes de conhecer as escolas menores. No mesmo dia, Ashford visitou o Hospital Militar e os laboratrios e foi recebido pelo ministro da Guerra e pelo Cirurgio-Chefe do Hospital.

    9 RAC Appendix The Jounal of The Commission Transcrito do Relatrio apresentado em maio de 1926 ver.. IMS/UERJ.

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    ruMo ao sul Do Brasil: oBservar, Conferir, Coletar, sisteMatizar

    No domingo, dia 13, almoaram com Lutz e inalizaram os preparativos para a viagem do dia seguinte. Decidiram que sairiam do Rio na segunda-feira, 14 de fevereiro, ao meio-dia, com destino aos portos de Santos e Paranagu, de onde alcanariam Curitiba. O roteiro previa o retorno a Paranagu, de onde seguiriam para Florianpolis, depois Pelotas e Porto Alegre. Depois voltariam para Santos com destino a So Paulo.

    Tendo sado do Rio de Janeiro a 14 de fevereiro, chegaram pela primeira vez ao Porto de Santos no dia seguinte e visitaram logo cedo, s 7h da manh, o Departamento de Tuberculose no Hospital de Isolamento e na Santa Casa, alm de manter contatos com o representante do Servio Federal de Sade e inspecionar instalaes porturias e servios de engenharia sanitria. Uma rotina semelhante foi cumprida no dia 16 no Porto de Paranagu. De l seguiram para Curitiba, onde permaneceriam por trs dias.

    O tempo na cidade foi suiciente para visitar a Faculdade de Medicina e sua maternidade, realizar audincia com o governador, assistir parte de uma sesso da Assembleia Legislativa, conhecer o Asilo de Alienados, o Instituto Pasteur, o Departamento Mdico da Polcia, o Departamento de guas e Esgotos, o Lactrio e o Dispensrio Infantil, alm de empreender uma curta viagem aos arredores da cidade para conhecer os stios e fazendas da regio. Visitaram tambm a penitenciria, o sanatrio e quatro jornais da cidade compromisso que, relatam, tentaram evitar. Todas as despesas foram custeadas pelo Governo do Estado, arranjo aceito com relutncia pelo grupo.

    Na manh do dia 19 de fevereiro, a Comisso rumou de volta Paranagu de onde esperavam partir s 11h30min para Florianpolis, mas o atraso da embarcao obrigou que a tarde fosse destinada a visitas pelo mercado da cidade ao escritrio de obras pblicas e estao de bombeamento de guas. Adiada, a partida para Florianpolis s se efetivaria s 12h do dia seguinte, 20 de fevereiro, com desembarque no dia subsequente, quando foram visitadas a Santa Casa, o Hospital Militar, o Instituto Pasteur, alm de realizarem audincia com o governador do estado.

    A viagem prosseguiu rumo ao Rio Grande Sul por todo o dia 22 de fevereiro. Logo aps a chegada, no dia seguinte, seguiram para Pelotas, onde cumpriram o roteiro de praxe visitas Santa Casa e ao Hospital Portugus e aos locais de interesse no campo da Sade e da Medicina. Retornaram a Porto Alegre no dia 24 e permaneceram no Rio Grande do Sul at o inal de fevereiro quando rumaram de volta ao Rio no dia 29. Em Porto Alegre, igualmente visitaram a Faculdade de Medicina, o Instituto Pasteur, a Escola de Veterinria, a Faculdade de Medicina Homeoptica, a Escola Mdico-Cirrgica, o Hospital Militar, o Asilo de Alienados e o Departamento de Sade.

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    uMa visita DetalHaDa e DeCisiva Para so Paulo

    Na viagem de volta no houve escalas e a Comisso permaneceu no mar entre 29 de fevereiro e 4 de maro. Oito dias depois, Richard Pearce e John Ferrell retomaram a jornada, dessa vez em direo a So Paulo. Chegaram no mesmo dia ao Porto de Santos e foram recebidos por comit designado pelo Governo do Estado, formado por Alexandrino de Moraes Pedroso e Benedicto Montenegro. Como ex-aluno de Pearce na Pennsylvania, Alexandrino pde desempenhar um papel relevante como guia, conselheiro e companhia constante da Comisso, assinalou o Relatrio de Viagem, reconhecendo, em particular, seu dbito pela assistncia na pesquisa em So Paulo. (Brazil Medical Commission/Journal, 1916:27).

    Na cidade de So Paulo, o grupo se instalou no Hotel Grande de La Rotisserie Sportsman e iniciaram, pela manh do dia 13 de maro de 1916, o detalhado roteiro de visita aos equipamentos e infraestrutura sanitria e de assistncia mdico-hospitalar da capital, com uma breve viagem ao interior. O conjunto de locais visitados oferece uma perspectiva interessante acerca do quadro que ento se julgava relevante expor e a detalhada jornada se alongou por seis dias, encerrando-se a 19 de maro, quando partiram de volta para o Rio de Janeiro.

    As visitas na capital paulista comearam pela Santa Casa e Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo, consideradas ambas as principais instituies mdico-hospitalares da cidade. No mesmo dia, tarde, Pearce se dirigiu para o Asilo dos Expostos10 e ao Asilo dos Invlidos, antigo Asilo da Mendicidade, mantidos pela prpria Santa Casa. Enquanto Pearce visitava as instituies, Ferrell se reunia com o diretor do Servio Sanitrio11. No dia seguinte, as visitas prosseguiram pelos Institutos Pasteur, Vacinognico, Soroterpico, Butantan e pelos departamentos do Servio Sanitrio. Nesse mesmo dia, Pearce retornou Faculdade de Medicina para conhecer as reas de Patologia, Bacteriologia e Histologia e incluiu no roteiro uma visita ao Liceu de Artes e Ofcios. Alm do Liceu, a Faculdade Mackenzie foi outra instituio visitada fora do escopo biomdico, sanitrio ou de assistncia mdico-hospitalar.

    No penltimo dia na capital, Pearce, Ferrell e Alexandrino Pedroso se dirigiram para o Hospital de Isolamento, o Desinfectrio, o Laboratrio de Anlises Qumicas e de Alimentos, o Bureau de Demograia e Estatstica do Servio Sanitrio, o Laboratrio Farmacutico, o Lactrio e o Servio de Inspeo de Amas de Leite12, onde puderam conhecer o material de instruo materno-infantil. O roteiro incluiu ainda a Escola de Farmcia e

    10 Consultar Rocha (2005). 11 Provavelmente Guilherme lvaro, em substituio a Emlio Ribas. Conferir Mascarenhas, 1973, p.436.12 Conferir Rocha e Rocha (2010 e 2011).

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    Odontologia e a Escola de Medicina de So Paulo, instituio particular de ensino que tambm possua os departamentos de Farmcia e Odontologia13. Ainda em So Paulo, a comisso incorporou o mdico Emerson Smith como tradutor e intrprete para o restante da viagem14.

    Finalmente, no dia 16 de maro, a Comisso cumpriu a ltima etapa da viagem na cidade e optou por voltar ao Liceu de Artes e Ofcios, para acompanhar um perodo de trabalho nas oicinas de fundio e carpintaria e visitar tambm a Escola Politcnica. Mais tarde seguiram para a o Hospital de Maternidade, o Instituto de Anatomia da Escola de Medicina, e seu Museu, e logo depois se encontraram com funcionrios do Consulado Americano em So Paulo. A viagem ao interior comeou no dia seguinte, com a visita Fazenda de Caf do Conde Prates, prxima a Rio Claro, e retorno noite para So Paulo onde jantaram com o cnsul americano. No litoral, visitaram Santos e Guaruj, no dia 18 de maro, e retornaram a So Paulo no mesmo dia para encontro com o governador do estado.

    O ltimo compromisso em So Paulo aconteceu na Sociedade de Medicina e Cirurgia, no domingo, 19 de maro, quando viajaram noite de volta ao Rio de Janeiro. Dali, Ferrell e Smith partiram para Belo Horizonte onde se encontrariam com Ashford. Pearce e Garvey permaneceram no Rio para organizar as informaes coletadas e preparar as primeiras verses dos extensos relatrios que seriam enviados sede da Fundao Rockefeller em Nova York. Contudo, o relatrio enviado por Smith sobre a Faculdade de Medicina em Belo Horizonte foi considerado incompleto e insatisfatrio por Pearce, que partiu em seguida para inspecionar diretamente a instituio mineira.

    A Comisso permaneceu em Minas Gerais, entre Belo Horizonte e Capela Nova, onde Ashford havia instalado seu posto de pesquisa com a ancilostomase15, at o inal de maro, quando retornaram ao Rio de Janeiro para visitas e encontros inais. Interessava especialmente a Richard Pearce assistir as atividades letivas da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, o que de fato ocorreu no comeo do ms de abril. Finalmente, a 18 de abril de 1916, o grupo embarcou de volta aos Estados Unidos, depois de 76 dias longe do pas de origem.

    Aclimatando-se a So Paulo: a cidade

    vista pelo olhar estrangeiroA longa jornada da Comisso culminou nos desdobramentos que

    foram analisados no estudo anterior e resultaram, entre outras consequncias, na remodelao da Faculdade de Medicina, introduzindo pela primeira vez no pas o regime de tempo integral, no caso para as disciplinas pr-clnicas.

    13 Consultar Mota e (2010, 2011, 2012). 14 Smith havia sido professor de Patologia na Universidade do Mississippi e chegou a ensinar a disciplina

    em escolas brasileiras por cerca de dois anos. Conferir: RAC BRAZIL. Medical Education Vol. 1. 15 Um relato muito interessante da passagem de Asford pelo Brasil pode ser conferido em sua autobiogra-

    ia, publicada em 1997, denominada A Soldier of Science.

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    A rica experincia de perseguir um projeto cientico em terras estrangeiras poder ser brevemente entrevisto pelos fragmentos selecionados da extensa correspondncia produzida, reproduzidos a seguir. Os trechos transcritos so elucidativos, pois conferem mais substncia ao cotidiano desse conjunto de pesquisadores, como poder ser acompanhado a seguir.

    No primeiro fragmento, o jovem Wilson George Smillie, ento com 31 anos, relata a Wickliffe Rose as atribulaes de sua viagem em direo ao Brasil16.

    Rio de Janeiro, 2 de Abril de 1918

    Caro Mr. Rose Chegamos ao Rio no dia 22 de Maro depois de uma longa e acidentada viagem. Desafortunadamente, a Companhia deixou a nossa maior arca no Par, desembarcando-a com muitas outras arcas nas quais estava amarrada. Dr. Hackett aconselhou-me a permanecer no Rio at que o prximo barco venha do Par de modo a que eu possa recuperar minha arca porque ele percebe que eu poderei jamais t-la de volta caso no proceda dessa forma. Por essa razo, gastamos uma semana ou dez dias com os Hacketts em Niteri e ainal nos divertimos bastante. Dr. Hackett tem uma casa encantadora em uma localizao ideal, e Mrs Smillie e o beb tiveram um maravilhoso repouso nos poucos dias que passamos l.

    Tive a oportunidade de passar um curto tempo em campo no Rio Bonitoe tambm visitei o trabalho da Ilha do Governador. Foi uma grande oportunidade de passar tambm alguns dias em Campos com o Dr. Hackett onde ele abriu seu novo laboratrio em uma plantao de cana-de-acar. Fiquei surpreso pelo interesse e cooperao que o trabalho do Dr. Hackett tem despertado entre as pessoas do Brasil e fcil perceber que seu trabalho ir expandir muito rapidamente, caso consiga pessoas que possam ajud-lo. Ele icou muito desapontado quando contei que era quase impossvel agora obter jovens aprendizes nos Estados Unidos e ele est trabalhando sob considerveis diiculdades por depender de mdicos locais. Os jovens que encontrei esto surpreendentemente interessados e ansiosos por fazer o melhor, mas claro que eles precisam ser muito bem treinados no trabalho de sade pblica e por vezes suas ideias esto distantes do desejvel.

    O trabalho em Campos parece-me particularmente promissor porque o ano foi bem prspero e o tamanho da plantao da cana-de-acar enorme. Os proprietrios da plantao esto

    16 As verses em portugus so de minha autoria.

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    muito ansiosos pelo tratamento de seu pessoal e aparentemente tm absoluto controle sobre cada um de seus empregados. Apenas desejaria para o Dr. Hackett que ele pudesse ter mais assistentes por que percebo que ele est trabalhando muito intensamente.

    Planejo ir para So Paulo to logo minha arca venha, o que provavelmente acontecer nos prximos dias, e comear ali o novo trabalho. Lamento bastante que eu tenha me alongado para assumir o posto, mas isso se deve inteiramente ao descuido e incompetncia da Companhia Lloyd Brasileira e a inerente procrastinao da natureza brasileira.

    Com os melhores votos, sou, Sinceramente seu,

    Wilson George Smillie

    Ao contrrio de Smillie, quando Samuel Taylor Darling foi designado para se estabelecer em So Paulo ele j era um homem maduro. Aos 46 anos, Darling era um patologista reconhecido: havia trilhado uma carreira substantiva, tendo atuado no Projeto do Canal do Panam, onde trabalhara com William Gorgas e Henry Carter. A partir dessa experincia, em 1915, Gorgas e tambm Simon Flexner recomendaram vivamente seu nome para cheiar na Fundao Rockefeller a Comisso de Ancilostomase para o Extremo Oriente. Entre 1915 e 1917, Darling atuou em Java, Malsia, Sumatra e Fiji. Em 1917 foi indicado para assumir o Departamento de Higiene em So Paulo. A seguir, um trecho de seu relato sobre a experincia em So Paulo.

    So Paulo, Brasil, 25 de Junho de 1918

    Caro Dr. Rose, Mrs Darling e as crianas chegaram aqui em segurana

    na ltima semana. Fiquei efetivamente aliviado e feliz por encontr-los sadios, intactos, bem alimentados e com aparncia rejuvenescida. A presena de submarinos em torno de Barnegart me atemorizou de tal modo que eu iquei visualizando-os por vrias noites.

    As reformas no prdio de nosso laboratrio17 esto prestes a se completar: pisos foram lixados e polidos, mesas foram relixadas e repolidas, espera do material encomendado. Mr. Morgan, o embaixador americano, nos honrou com sua visita outro dia. Ele estava muito contente e agradavelmente surpreso

    17 O Laboratrio foi instalado no antigo solar da baronesa de Piracicaba, na Rua Brigadeiro Tobias, 45.

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    em perceber que o governo tem sido generoso conosco e que temos um local to apresentvel. de fato muito agradvel que isso possa ser mencionado nos despachos. Entendo que o nosso Departamento de Estado poderia manifestar sua satisfao ao governo de So Paulo por meio do Governo Federal, em razo do fato de a Faculdade de Medicina estar cumprindo inteiramente com suas obrigaes. Espero que isso possa ser feito.

    Pessoalmente, me sinto grato ao Dr. Carvalho por sua cooperao extremamente generosa em vista das reformas no edifcio, bem como em relao moblia. Expressei minha posio publicamente na aula inaugural e sei que lhe agradaria saber que estou fazendo o mesmo perante a Fundao.

    Fiquei desapontado com o fato de o Dr. Smillie no ter trazido o material de suprimento, mas minha coniana em Mr. Kirk permanece inalterada, mesmo porque Smillie perdeu uma arca grande em Pernambuco e outra entre o Rio e So Paulo e talvez tenha sido melhor que as caixas de suprimentos no lhe tenham sido coniadas.

    Apresentei minha aula inaugural do curso no dia 6 de abril, em ingls, e desde ento tenho ministrado uma aula por semana. Preparo a matria e repasso para o Dr. Paula Souza, meu 1 assistente. Ele traduz para o portugus com verdadeiro frenesi pedaggico, algumas vezes imitando os gestos e linhas imaginrias, diagramas e movimentos que eu inconscientemente iz enquanto falava com ele. Ele trabalha muito bem e sempre est feliz. Depois que Paula Souza seguir para os Estados Unidos em setembro, eu poderei me valer do Dr. Pedroso para a tarefa. Aparentemente, no se espera muito de meu primeiro ano nenhum dos professores importados poderiam usar o portugus no primeiro ano. Ele difcil o suiciente para que se possa adquiri-lo recorrendo apenas ao Bazaar Portuguese, manual didtico que quase sempre pode socorrer um falante adulto do ingls.

    H um claro despertar de interesse para as coisas americanas entre os mdicos e tambm entre os engenheiros. bem grande o nmero de mdicos entre os estudantes de ingls. Outro dia, estava a caminho de casa depois de uma visita a um criadouro de anopheles, quando encontrei trs mdicos do Instituto Sorolgico, cada um com seu Berlitzs First Book em ingls em suas mos. Tenho percebido que as altas autoridades oiciais do Brasil mais e mais olharo para os Estados Unidos em busca daquilo que antes obtinham na Europa. O portugus uma lngua bastante difcil para os falantes de ingls embora o ingls seja apenas difcil para os brasileiros. Consequentemente, so menos inclinados ao contato conosco que tem sido mais tardio do que em relao aos franceses e italianos, para os quais se voltam com facilidade. Mas uma resistncia que poder se reduzir ao longo do processo.

    Artigos populares sobre Higiene Rural com referncias

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    ancilostomase, alcoolismo, alimentao e salrios tm aparecido no Rio e em So Paulo em textos escritos por leigos. A Liga Nacionalista de Jovens Brasileiros tem prometido se empenhar na propaganda da Higiene Rural e o jornal Combate acusou um proeminente oicial de ter se referido ao controle do Brasil pelas agncias da Rockefeller. O Secretrio de Agricultura me enviou recentemente um Questionrio sobre o tema da puriicao da gua que tive muito prazer em responder. Fui recentemente informado que o Embaixador italiano (para Assuntos de Guerra) visitar o Laboratrio amanh para discutir temas relacionados Higiene e ancilostomase. Em pouco tempo, o Laboratrio poder se tornar um local de visitao para nativos ou estrangeiros e os turistas no se esquecero de visitar o Instituto de Higiene de So Paulo, exatamente como agora visitam o Instituto Sorolgico do Butantan para ver as cobras.

    Haver um congresso mdico no Rio de Janeiro em setembro e fui convidado para a Conferncia de abertura, o que signiica que terei um auditrio inteiro durante uma hora, em seguida uma salva de palmas e congratulaes, sem maiores discusses. Espero apresentar as questes mais importantes e de interesse geral sobre a anemia provocada pela ancilostomase.

    Dr. Hydrick est iniciando o trabalho em um novo municpio a trs horas de So Paulo e nos convidou a cooperar com ele neste comeo, a im de se veriicar o quanto as pessoas estaro interessadas e disponveis quando comear a primeira contagem de vermes. Assim, a Campanha poder ser aberta de modo a envolver as prprias pessoas na demonstrao da ancilostomase.

    O tempo foi cruelmente frio na ltima semana e fomos obrigados a usar ao mesmo tempo cobertores e mantas em nossos leitos. Um centmetro de gelo recobriu o meu bairro e trs centmetros perto do rio. As casas no esto providas de lareiras ou outras comodidades e tivemos que tentar manter o aquecimento com fogareiros a querosene que eram transportados cmodo a cmodo. O querosene custa 60 centavos o galo em lotes de 10 gales. Evidentemente, Dr. Hackett no incluir o querosene ou outros produtos da Standard Oil entre os 40% de permuta.Com os melhores votos, Sinceramente seu,

    Samuel Taylor Darling

    Depois de coordenar os trabalhos da Comisso Mdica, em 1916, Richard Pearce voltou duas vezes a So Paulo. Porm, mesmo distncia, manteve uma interlocuo constante, fosse com os pesquisadores designados pela Fundao, fosse com os mdicos locais ou, ainda, como

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    mediador entre as diferentes instncias envolvidas nos processos, como pode ser veriicado pelo trecho abaixo.

    Nova York, 31 de Agosto de 1918

    Caro Dr. DarlingFoi um grande prazer receber sua carta esta manh com

    suas impresses sobre a situao de So Paulo e de tudo que voc tem feito. Sua descrio do prdio indicado pela Faculdade na Brigadeiro Tobias, 45, solar da Baronesa de Piracicaba, foi bem generosa. Lamento bastante pelo atraso nos equipamentos, mas as possibilidades do trabalho de campo podem oferecer uma boa oportunidade a despeito da ausncia de equipamentos cienticos. Estou encantado em saber que o Dr. Carvalho cooperou to intensamente e que isto resultado de minhas duas breves visitas a So Paulo. Tenho um grande respeito por ele, e no s por suas habilidades, mas em razo de seus pontos de vista e descortino.

    Eu tratei com o Dr. Rose o tema da representao a ser feita junto ao Departamento de Estado para indicar o reconhecimento pelos esforos do Dr. Carvalho e de outros da Faculdade em So Paulo. Penso que talvez a questo possa ser apropriadamente encaminhada pela Fundao, mas o Dr. Rose deseja voltar ao tema comigo. Pretendo tratar dele pessoalmente tanto no Departamento de Estado como na Embaixada Brasileira. (...).

    Com os melhores cumprimentos,Richard Mills Pearce

    A intensa correspondncia produzida por vezes era encaminhada diretamente aos escales mais altos da Fundao, principalmente para Wickliffe Rose, que acompanhava de modo criterioso o desenvolvimento das atividades. Pouco antes do infortnio que o atingiria mais diretamente com a morte da esposa em outubro de 1918, Smillie escreveu a Rose relatando o modo pelo qual o casal estava se adaptando a So Paulo. No longo e detalhado relato, Smillie vai progressivamente se afastando das questes pessoais para discorrer sobre as contradies que identiicava na vida do pas distante, especialmente as iniquidades sociais, decorrentes da profunda distncia entre pobres e ricos, entre cidade e campo. Do relato sobre a vida em So Paulo, emerge um observador dos costumes que, se mostrava, na maioria das vezes, inconformado com as disparidades sociais e o regime de trabalho a que estavam submetidos os trabalhadores do campo, como pode ser conferido a seguir.

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    So Paulo, 01 de Setembro de 1918

    Caro Mr. Rose,Estamos agora em So Paulo h mais de trs meses e

    comeamos mesmo a nos sentir em casa. Gradativamente, estamos ampliando nosso vocabulrio e, em decorrncia, ampliando nossos contatos com o povo e seus costumes.

    A cidade de So Paulo em si ao mesmo tempo interessante e bonita. Foi construda no alto de uma cadeia de montanhas que esto em seus trs lados. O clima agradvel, embora minha esposa e a famlia do Dr. Hydrick tenham sofrido com o frio durante o ms de julho. A temperatura atinge de 8 a 10 mas as casas so construdas com grandes varandas e, ao contrrio das nossas, sem aquecimento. Apesar da temperatura gelada do lado de fora, se a gripe ou resfriado se anunciam somos amontoados de caf. Isto bem diferente de minha primeira impresso sobre um clima tropical. Correspondentemente, contudo, bem quente aqui no vero, quando quase insuportvel estar em outros locais menos favorveis como Santos ou o Rio. A despeito de nossos pequenos problemas estamos muito confortveis, encontramos amigos simpticos, que so capazes de nos assegurar as mais modernas convenincias e temos experincias novas e interessantes para ocupar nosso tempo ao longo do dia. Dr. Darling disse que j relatou os resultados de meu trabalho e que , devo dizer, um simples texto com minhas impresses do povo. Minha primeira impresso do Brasil baseada apenas em minhas observaes feitas no Rio de Janeiro e em So Paulo e foram muito favorveis. Sinto que, embora muita coisa possa ser melhorada, por outro lado, os brasileiros tm muitos costumes e instituies que poderiam ser boas para ns. Nas cidades, as pessoas so prsperas, felizes, saudveis, com casas confortveis, parques esplndidos, e playgrounds municipais, e muitos deles so notavelmente reinados e inteligentes. Mas ao deixar as cidades, contudo, o quadro muda rapidamente e o grande problema da nao ento se torna visvel. O primeiro deles, creio, o analfabetismo. Uma proporo muito grande de pessoas do campo no pode ler ou escrever. E mais a mais com o analfabetismo viaja a superstio, a ausncia de conhecimento e de mtodo para lavrar o solo, assim como a falta conhecimento para cultivo e melhoria dos celeiros, alm do uso de ferramentas muito precrias e rudimentares tornam cruel o grande esforo despendido para resultados pequenos, e a pobreza caminha em cada casa, stio e por todo lado. Os recursos do pas so maravilhosos, e quase no h limites para as possibilidades de crescimento e desenvolvimento do cultivo do solo, porm estes recursos permanecem como ouro

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    oculto, somente esperando o momento quando o povo estiver instrudo nos modernos mtodos agrcolas para desabrochar em abundncia. Outro problema que me causou grande surpresa foi o destempero. O povo da cidade sempre muito equilibrado, mas o povo do campo bebe uma grande quantidade de Pinga, como aqui chamado. Pinga a primeira destilao do processo de fabricao do acar proveniente da cana-de-acar: um lquido lmpido e limpo, com um odor leve e picante e um sabor ardente. Contm uma alta percentagem de lcool e muito barata. Pelo equivalente a 10 ou 15 centavos, um homem pode icar muito bbado e todo domingo um grande contingente de trabalhadores se embebeda. De fato, lavradores quase que universalmente icam bbados no domingo tarde. Os homens brancos no bebem como norma, mas os negros bebem demais. Outro importante fator da vida do povo do campo e que teve grande importncia no desenvolvimento de nosso prprio pas o sistema de Absentee-landlordism [uma forma de arrendamento da terra]. Muitos dos ricos arrendatrios vivem nas grandes cidades e tem feitores em suas fazendas. Estes homens no melhoram a terra e nem se interessam pelo povo que nela trabalha. Eles exploram a terra e o povo obtendo o maior e mais imediato retorno possvel e jamais sonham em reinvestir qualquer vantagem inanceira ou dinheiro ganho na forma de fertilizantes, melhores maquinrios ou acomodaes mais confortveis e mais saneadas para o povo. O povo, por outro lado, como no proprietrio da terra, no melhora as casas onde vivem ou sequer constroem a prpria latrina. Quem poder culp-los, eles podem ser dispensados a qualquer dia, deixando todos os melhoramentos que izeram. O dinheiro, ento, est nas cidades, e ele usado para construir residncias reinadas, teatros, edifcios municipais e parques, esplndidas ruas e muito pouco retorna para a terra que a ganhou. Um grande elemento na sade do povo a nutrio pobre. Eles comem apenas um alimento, e ele muito pobre feijo preto, com caf preto. O feijo fornece carboidrato, protenas e gordura, e o caf o estimulante. Caso um homem, de algum modo, melhora sua situao, ele adiciona arroz dieta, mas isso pode ser interrompido. Vegetais de todo o tipo crescem rapidamente, mas eles no sabem como cuidar deles e suas mulheres no sabem como cozinh-los. As frutas igualmente crescem bem, mas exceto as bananas, elas no so cultivadas pelos pobres. Milho cresce em abundncia, mas nunca so feitos pes. Algumas vezes, eles trituram para fabricar uma farinha spera, que aquecida rapidamente sobre uma panela rasa, e usam tambm essa farinha para espalhar sobre o arroz e o feijo. A carne quase nunca consumida pelas pessoas pobres, nem manteiga, leite, po, ovos,

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    queijo, vegetais ou frutas. Eu nunca havia me dado conta do que um fermento Fleishman capaz de realizar. Aqui no h fermento, portanto, no h po. Mesmo na casa dos muito ricos do interior, no h po. Um tpico caipira, ou homem do campo, vive em uma pequena choupana, com paredes sujas e teto de palha. No h chamin ou lareira, mas o fogo acesso na quina das paredes sujas e a fumaa encontra a melhor maneira de se desfazer. A norma trabalhar conforme a necessidade de subsistncia, e um trabalho muito pesado, o que os mantm muito prximos da condio de famintos. Eles usam calas e camisas de algodo, e algumas vezes um chapu ou um leno em torno da cabea. No cinto, h uma faca amarrada, com uma lamina de 10 a 24 polegadas de comprimento que usam para todo tipo de propsito. Em suas viagens para as cidades, eles tambm carregam um pedao de pau ou uma espingarda de dois canos do tipo bem comum antes da guerra civil. Eles so normalmente anmicos, magros e mal nutridos, morenos, tmidos, desconiados de estranhos, supersticiosos, mas amigveis e comunicativos quando a aproximao apropriada. Comeam o seu dia ao nascer do sol, com caf muito forte, com isso trabalham at as dez da manh, quando come o inevitvel arroz com feijo. s cinco da tarde come o arroz e feijo com caf e quando o sol se pe ele vai para a cama. No domingo ele anda muitas milhas at o comrcio mais prximo, onde gasta tudo que tem em pinga e jogos de azar. A religio toca muito pouco sua vida. Chega ao mundo sem cuidados mdicos e vive sua vida inteira sem visitar um mdico. Dorme confortavelmente sem ajuda de qualquer droga. Naturalmente, bastante desconiado dos mdicos e prefere remdios do doutor curandeiro, pessoa que coleta seus medicamentos assustadores na mata e ao mesmo tempo conselheiro espiritual e mdico. As principais doenas que o homem do campo sofre so a malria e a ancilostomase, mas os sintomas da malria so mais fortes e suas consequncias mais evidentes e severas. A ancilostomase mais insidiosa e o que ela representa para ele e sua famlia do meu maior interesse, tema no qual estou trabalhando e que pretendo iluminar. A pedra fundamental segurando esta ponte de pobreza, iniquidade, m nutrio, infelicidade e insalubridade a falta de qualquer rudimento de educao e eu no consigo me afastar da ideia que o trabalho mais importante de todos educacional a educao do prprio povo, mas antes disso a educao daqueles que lideram e governam o povo. Estas so impresses bastante apressadas, resultantes de apenas alguns meses trabalhando com o povo e se referem principalmente ao estado de So Paulo. mais do que possvel que depois de um ano de residncia aqui minhas ideias venham

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    a ser completamente alteradas. Depois, poderei escrever mais profundamente sobre a vida e os costumes deste povo interessante.

    Com os meus melhores votos, Sinceramente,

    Wilson George Smillie

    Consideraes Finais A escala e amplitude das aes empreendidas pela Fundao

    Rockefeller, sobretudo o tipo de projeto modelador que procurou difundir por todo o planeta, continuam a suscitar anlises e provocar interrogaes. Ainal, amparada por recursos vultosos, a agncia buscou difundir valores que se encontram alojados no cerne de um modelo de produo de conhecimento que tambm a expresso de uma sociedade e de uma racionalidade ainda hegemnicas. Sustentada pelo poderoso establishment econmico norte-americano e associada muito estreitamente ao espectro poltico ultraconservador dos Estados Unidos, suas aes contriburam para aprofundar vnculos de poder, ao mesmo tempo em que ao se revisar sua trajetria a histria que a se constri permite entrever as contradies inerentes aos processos sociais.

    Referncias ASHFORD, Bailey K. A Soldier of Science. The Autobiography of Bai-

    ley K. Ashford. Universidad de Puerto Rico Publisher, 1999.

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    FARIA, Lina Rodrigues de. Cincia, Ensino e Administrao em Sade: a Fundao Rockefeller e a criao do Instituto de Higiene de So Paulo. [tese] Rio de Janeiro: Dept de Cincias Humanas e Sade/IMS-UERJ, 2003.

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    SANTOS, Luiz Antonio de Castro e FARIA, Lina Rodrigues de. A Refor-ma Sanitria no Brasil: ecos da Primeira Repblica. Bragana Pau-lista/SP: Edusf, 2003.

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    a viageM De geralDo Paula souza Para os estaDos uniDos, 1918-1920: fragMentos De uMa Histria Da relao entre a funDao roCkefeller e o instituto De Higiene De so Paulo

    Cristina de Campos

    Muitos brasileiros foram contemplados com bolsas fornecidas pela Fundao Rockefeller destinadas formao de tcnicos para o trabalho em diversas frentes da sade pblica brasileira. As primeiras bolsas foram concedidas logo no incio das atividades desta fundao ilantrpica norte-americana no pas, em 1916. Em So Paulo, os primeiros acordos entre a Rockefeller e o governo estadual datam tambm de 1916 (Candeias, 1984; Marinho, 2001). O primeiro convnio previa que a Fundao despenderia somas considerveis para equipar as comisses sanitrias que atuariam no combate s verminoses no interior, dar um novo impulso Faculdade de Medicina, instituindo o tempo integral e atividades de pesquisa, o que inclua a vinda de tcnicos estrangeiros para incio das atividades. O acordo tambm previa a concesso de bolsas para treinamento de tcnicos nacionais em renomadas escolas norte-americanas para serem instrudos no que havia de mais avanado nos novos mtodos de administrao sanitria e preceitos de higiene e sade pblica (Candeias, 1984).

    Em So Paulo, os dois primeiros contemplados com bolsas da instituio foram Francisco Borges Vieira e Geraldo Horcio de Paula Souza, respectivamente auxiliares da Cadeira de Higiene junto Faculdade de Medicina, sob a direo de Samuel Taylor Darling. Os dois jovens mdicos foram enviados para a realizao de ps-graduao em Sade Pblica na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, Estados Unidos. Permaneceram por dois anos e trouxeram para So Paulo uma bagagem de conhecimento que marcariam suas vidas pblicas desde ento. Juntos trabalharam para manter a autonomia do Instituto de Higiene, desmembrado da Faculdade de Medicina e atuando como instituio independente, bem como a prpria consolidao do campo cientico da higiene e sade pblica.

    O conhecimento adquirido, propiciado pela Fundao Rockefeller, foi replicado no apenas nos meandros do Instituto de Higiene, mas tambm em rgos pblicos como o Servio Sanitrio. Vieira e Paula Souza ocuparam alto posto dentro desta instituio e implantaram polticas pblicas em concordncia com os pressupostos cienticos adquiridos no exterior e ressigniicados para o contexto nacional (Campos, 2002). Ao invs de analisar as polticas pblicas implantadas e a ressigniicao das ideias veiculadas pela Fundao Rockefeller, iremos investigar a origem, como foi a formao e os contatos iniciais destes dois mdicos brasileiros,

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    em especial de Geraldo Paula Souza1, em sua estadia na Universidade Johns Hopkins e o posterior relacionamento com a Fundao at o inal da dcada de 1920. Tal empreitada reveladora de que estes anos marcaram profundamente Paula Souza e Borges Vieira e estaro presentes em quase todas as suas aes ligadas sade pblica.

    Este trabalho foi dividido em trs partes. Na primeira abordamos a formao acadmica de Paula Souza e seus primeiros trabalhos de pesquisa cientica que o levaram ao campo cientico da sade pblica. A segunda parte trata de sua permanncia nos Estados Unidos para a realizao do doutoramento em Sade Pblica. Como parte de sua formao estava a realizao de visitas tcnicas, o que outrora chamamos de expedies sanitrias, que resultaram em um conjunto de imagens feitas pelo prprio Paula Souza, algumas das quais reproduzimos. A terceira parte enfoca o retorno a So Paulo e as funes assumidas junto ao Instituto de Higiene, assim como as diiculdades encontradas para coloc-lo em funcionamento. Nesta seo possvel notar como era o relacionamento de Paula Souza com os membros do International Health Board da Fundao Rockefeller, relao que nos levou a airmar que Paula Souza estava em total acordo com os preceitos difundidos pela Fundao. Nas consideraes inais, trazemos alguns indcios que permitem veriicar que esta relao perdurou por muitos anos e manteve-se, em embargo, at o inal da vida de Geraldo Paula Souza.

    forMao aCaDMiCa e a inClinao ao CaMPo CientfiCo Da saDe PBliCa

    Os dois primeiros a receberem a bolsa de estudos da Fundao Rockefeller foram Geraldo Paula Souza e Francisco Borges Vieira. Ambos trabalhavam na Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo, junto nova Cadeira de Higiene, fruto do convnio com a Rockefeller. Paula Souza trabalhava desde 1914 como assistente da Cadeira de Qumica da Faculdade de Medicina, mas poca do acordo com a Fundao Rockefeller acabou sendo transferido para a de Higiene, tornando-se assistente de Samuel Taylor Darling, o primeiro tcnico norte-americano responsvel por dirigir os trabalhos iniciais na disciplina junto Faculdade (Rockefeller Archive Center).

    A familiaridade de Paula Souza com a pesquisa e o trabalho em laboratrio vinha, porm, de outra poca. Esta aproximao ocorreu entre 1906 e 1917, quando iniciou os estudos em qumica pela Escola Politcnica de So Paulo com o professor Roberto Hottinger (Rockefeller Archive Center e Campos, 2002). Simultaneamente aos estudos da qumica orgnica, Paula

    1 No dispomos de fontes primrias para analisar a trajetria de Francisco Borges Vieira, entretanto deixamos registrado que sua contribuio ao campo cientico da epidemiologia e do servio pblico de sade foi igualmente profcua.

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    Souza cursou tambm a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, apesar de j possuir a formao em Farmcia. O trabalho realizado com Hottinger merece ateno. Ambos desenvolveram uma srie de estudos, no mbito do Laboratrio de Biologia Geral da Escola Politcnica, sobre a qualidade da gua consumida na cidade de So Paulo, realizando testes laboratoriais que detectavam a existncia de microrganismos e outros elementos nocivos ao homem.

    A tese Contribuio ao estudo da autodepurao de nossos rios, especialmente do Tiet (1913), defendida ao trmino da Faculdade de Medicina, tambm versou sobre a gua, no bojo dos estudos desenvolvidos no laboratrio da Escola Politcnica. Alm da tese, os resultados obtidos aps anos de estudos foram publicados no Anurio da Escola Politcnica. Em meio aos resultados estava a constatao de que a gua distribuda para os paulistanos apresentava uma serie de riscos sade, uma vez que, os processos de puriicao no lquido quase que inexistiam. Com estes resultados em mos e vivenciando os graves problemas decorrentes da falta de gua para abastecimento em So Paulo, sobretudo nas pocas de estiagem, Hottinger e Paula Souza, associados ao professor Roberto Mange, resolvem apresentar uma soluo para o problema. Em artigo publicado na Revista da Escola Politcnica, os trs pesquisadores airmavam ser possvel distribuir as guas poludas do rio Tiete para So Paulo desde que passassem por um sistema de puriicao. O sistema consistia em iltragens com areia, cal, sulfato de alumnio e por ltimo a ozonizao, realizada atravs do dispositivo Perfector, aparelho desenvolvido pelos trs pesquisadores (Campos e Gitahy, 2011).

    Proposta e aparelho acabaram por no convencer o governo e a opinio pblica da poca, representada aqui principalmente pela Sociedade de Medicina e Cirurgia de So Paulo2, mas o episodio signiicativo ao ilustrar como Paula Souza estava envolvido com os problemas de sade pblica anos antes de sua entrada como assistente na Cadeira de Higiene da Faculdade de Medicina. Outro dado o seu envolvimento com a cincia, em disciplinas como a microbiologia, a bioqumica, e a pesquisa cientica, presente praticamente desde o incio de sua formao acadmica.

    As pesquisas com a gua revelam, alm da aptido para a pesquisa cientica, a inclinao para um campo de conhecimento que no perodo em tela estava em pleno destaque e consolidao, o da higiene. Estes antecedentes de pesquisa de Paula Souza, segundo consta nos registros da Fundao Rockefeller, foram os diferenciais que izeram com que Darling o escolhesse para ser seu assistente junto Cadeira de Higiene. Assim, Paula Souza acabou sendo transferido da Cadeira de Qumica, sendo um dos primeiros a receber a bolsa de estudos da Fundao Rockefeller, formao que viria a complementar seus estudos na rea de Higiene.

    2 Sobre os debates da gua de abastecimento aps apresentao da proposta Hottinger, Mange e Paula Souza ver Campos e Gitahy (2011) e para o papel da Sociedade de Medicina e Cirurgia de So Paulo ver Teixeira (2001).

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    o Curso De DoutoraDo na universiDaDe JoHns HoPkins

    A criao do Instituto de Higiene, ou melhor, a separao da Cadeira de Higiene como um instituto autnomo da Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo era um projeto defendido, principalmente, pelo International Health Board da Fundao Rockefeller, endossado pelos tcnicos norte-americanos, sobretudo Samuel Darling. No era um projeto defendido pelas elites paulistas e, ao que as fontes indicam, foi uma das reivindicaes da prpria Fundao Rockefeller para que os acordos de cooperao caminhassem, como bem indicou Marinho (2001). Assim, seria incorreto atribuir somente a Geraldo Paula Souza o projeto de criao do Instituto de Higiene: havia foras e jogos polticos de mais lastro.

    Geraldo Paula Souza havia causado boa impresso aos norte-americanos desde os contatos iniciais. Darling reconheceu a dedicao pesquisa de Paula Souza, tanto que o recomendou a uma das bolsas da Rockefeller. Outra importante igura que se impressionou com as aptides de Paula Souza foi William Henry Welch, do International Health Board. Paula Souza e Welch estreitaram os laos aps a estadia deste primeiro no curso da Universidade Johns Hopkins, mantendo troca de correspondncia. Das consideraes acima, conclui-se que o Instituto de Higiene era um projeto da Fundao Rockefeller e que Paula Souza havia sido eleito pelo alto staff do International Health Board como o tcnico que deveria assumir a direo do novo Instituto, assim que os tcnicos norte-americanos cumprissem seu tempo de permanncia no Brasil. Sem embargo, Paula Souza era o homem da Fundao Rockefeller.

    Junto com Paula Souza, o segundo bolsista escolhido para o curso da Universidade Johns Hopkins foi o outro assistente da Cadeira de Higiene, o jovem mdico Francisco Borges Vieira. No tivemos acesso ao material do Rockefeller Archive Center sobre Borges Vieira, mas supomos que certamente possua atributos anteriores de pesquisa e aproximao com a disciplina higiene que chamaram a ateno de Darling. Os dois estudantes deveriam, segundo o International Health Board, concluir os estudos e depois retornar para assumir funes junto Cadeira de Higiene da Faculdade de Medicina. Todas as despesas seriam pagas pela Rockefeller (Rockefeller Archive Center).

    Partiram para os Estados Unidos e em 22 de setembro de 1918 matricularam-se como estudantes de doutorado na School of Hygiene and Public Health da Universidade Johns Hopkins, localizada na cidade de Baltimore. De acordo com sua icha preservada pelo Rockefeller Archive Center, Paula Souza matriculou-se no curso de Higiene (full course), pegando ainda outras disciplinas da qumica e nutrio. Alis, ser a nutrio a rea em que Paula Souza ir dedicar suas pesquisas aps seu retorno a So Paulo.

    Os estudantes desta primeira turma de doutorado em Higiene e

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    Sade Pblica procediam de vrios