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A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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Page 1: Livro de Actas da II Conferência
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A temática da Saúde é hoje, claramente considerada em todas as socie-dades, um direito fundamental do ser humano, devendo esta ser orien-tada no sentido da promoção do bem-estar individual e social. Como condição essencial para o exercício de uma cidadania mais activa e para o desenvolvimento de um projecto de vida que favoreça a auto-

nomia dos indivíduos, nomeadamente da população recluída e dos demais par-ticipantes no universo prisional (no pressuposto da adopção de estilos de vida mais saudáveis e da prevenção de comportamentos de risco), a organização deste evento reflecte um esforço conjunto das várias instituições e actores envolvidos no processo de ensino-aprendizagem da população recluída, designadamente Es-tabelecimento Prisional Regional de Bragança, Agrupamento Vertical de Escolas Augusto Moreno (Escola Associada), Reclusos, Formandos e Docentes/Formadores, no sentido de se estimular o debate sobre o actual estado da Saúde e os de-safios a enfrentar no meio prisional, objectivando-se uma articulação concertada entre as estruturas que interagem nesta matéria e promovendo-se, em simultâ-neo, boas práticas que cativem a comunidade prisional no sentido de a seduzirem para os cuidados de saúde indispensáveis a tomar. Assim, as áreas prioritárias a abordar nestas conferências estarão, indubitavelmente, relacionadas com as pro-blemáticas que presentemente assolam a comunidade recluída em Portugal, em geral, e este Estabelecimento Prisional em particular, nomeadamente doenças infecto-contagiosas, adições, doenças do foro psiquiátrico e outro tipo de patolo-gias, de que esta população normalmente padece. Foram, assim, cuidadosamen-te elencadas todo um conjunto de áreas temáticas que, seguramente merecerão, ao longo destas conferências, especial destaque, e entre as quais se salientam: Ambiente e saúde; Modelos e estratégias de promoção e educação para a saú-de; Consumo de substâncias psicoactivas lícitas e ilícitas; Doenças contagiosas e não-contagiosas; Saúde mental; Comportamentos (auto)destrutivos; entre outras. Por conseguinte, partilhar, reflectir e divulgar práticas e saberes que impliquem uma maior participação e adesão a vivências mais saudáveis, que conduzam a maiores ganhos e que contribuam para a excelência de cuidados, serão, segura-mente, os principais objectivos a cumprir com o IIº Ciclo de Conferências, este ano, subordinado à temática da Educação para a Saúde.

Objectivos do Evento

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Actas do II Ciclo de ConferênciasBragança, 22 de Maio, 2009

Estabelecimento Prisional Regional de Bragança Agrupamento de Escolas Augusto Moreno

IIº CICLO DE CONFERÊNCIAS

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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FICHA TÉCNICA

Título A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde Comissão de Organização Ana Paula Monteiro Gomes LopesArtur António Vara RodriguesArtur José FernandesCarlos Alberto Xavier da SilvaJoão Paulo VazJosé Alberto Pereira PintoMaria Margarida Pires DiasMaria Olinda Simão Transcrição das Comunicações Álvaro Silva Capa José Carlos Martins Fotografia João Paulo Vaz Impressão Artegráfica Brigantina - Bragança Design Gráfico José Carlos Martins Data de Edição Maio de 2010 Editor Câmara Municipal de Bragança Depósito Legal 310437/10 Tiragem 300 exemplares

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António Montes Moreira Bispo da Diocese de Bragança-Miranda

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SumárIO

Sessão de Abertura 11 Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança Dr. mário Torrão Presidente da Câmara Municipal de Bragança Eng.º Jorge Nunes Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas Dr. Luís martins Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno Dr.ª Emília Estevinho Coordenador Pedagógico dos Cursos de Educação de Adultos no EPR de Bragança Prof. Carlos Silva

Apresentação das Comunicações (período da manhã) 25 mestre José Alberto Pinto (moderador de debate) Agrupamento de Escolas Augusto Moreno Formador do Curso EFA-B3 no EPR de Bragança

1ª Conferência 29 Toxico(in)dependências em ambiente de reclusão Prof. Dr. J. Pinto da Costa (Universidade Portucalense Infante D. Henrique / Universidade Lusíada)

2ª Conferência 38 Comissão para a Dissuasão da Toxicodependência e Centro de Respostas Integradas: a interligação necessária Dr. rodrigo Versos (Presidente da Comissão para a Dissuasão da Toxicodependência de Bragança) Dr.ª Sandra Valdemar (Centro de Respostas Integradas de Bragança)

3ª Conferência 48 Da Dependência à Educação para a Autonomia Prof.ª Dr.ª Conceição Azevedo (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro)

Apresentação das Comunicações (período da tarde) 54 Dr.ª Olinda Simão (moderadora de debate) Técnica Superior de Reeducação do EPR de Bragança

A Secretaria-Geral do Ministério da Justiça e a Ordem dos Advogados pu-blicaram em 2005 um belo álbum de artísticas fotografias, entremeadas de pequenos textos incisivos e interpeladores, sob o título de Prisões-Espaços Habitados.Este qualificativo encerra todo um programa. Os estabelecimentos pri-

sionais não podem definir-se apenas pela negativa, isto é, serem repositório de pes-soas privadas de liberdade. Mais do que noutras instituições e serviços da nossa vida colectiva, a sua natureza específica de lugares de reclusão exige que aí se promovam acções e sobretudo se vivam atitudes de humanização. Está em jogo a dignidade huma-na de pessoas que é preciso estimular e valorizar para tornar mais fácil no futuro a sua reintegração na sociedade. São, pois, bem-vindas, todas as iniciativas de qualificação dos reclusos nomeadamente no âmbito cultural. Também para eles e sobretudo para eles, a elevação das suas habilitações escolares e culturais garante melhor o bom êxito da sua posterior reinserção social. A Igreja Católica participa activamente na empresa da humanização do mundo prisional através do ministério dos seus cape-lães e visitadores. E fá-lo com a motivação acrescida de fundamentar a dignidade da pessoa humana na sua criação à imagem e semelhança de Deus. É um título mais interpelador e responsabilizante. Jesus personalizou esta fundamentação no conhecido texto sobre um juízo final do Evangelho de S. Mateus: “Vinde, benditos de meu Pai. Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde o princípio do mundo. Porque tive fome e destes-me de comer… estive na prisão e fostes visitar-me… Sempre que fizestes isto a um dos meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25, 34, 36 e 40).

António Montes Moreira Bispo da Diocese de Bragança-Miranda

NOTA DE ABERTURA

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4ª Conferência 57 Recluso ou Incluso: Qual dos dois sou EU? Prof. Dr. rui Abrunhosa Gonçalves (Universidade do Minho)

5ª Conferência 65 Porquê Educar para a Saúde? Enf.ª maria João Eliseu (Enf.ª Directora do Hospital Prisional S. João de Deus)

6ª Conferência 71 HIV – Retalhos de uma Vida José Bártolo (Formando do Curso EFA-B3 do EPR de Bragança)

7ª Conferência 75 Doenças Infecto-contagiosas: principais cuidados a ter Dr.ª Eugénia madureira (Centro Hospitalar do Nordeste) Dr.ª Cristiana Pinto (Centro Hospitalar do Nordeste)

8ª Conferência 82 O Papel da Sub-Região e Centros de Saúde de Bragança nos cuidados de saúde a Reclusos Prof.ª Dr.ª Berta Nunes (Directora Executiva do Agrupamento de Centros de Saúde do Nordeste) Dr.ª Fátima Valente (Centro de Saúde de Bragança) Dr.ª Solange Barreira (Centro de Aconselhamento e Detecção Precoce do VIH/SIDA de Bragança)

Sessão de Encerramento 94 Jorge Gomes Governador Civil do Distrito de Bragança

Conclusões 97

AGrADECImENTOS 99

GALErIA DE ImAGENS 103

IIº CIClo DE CoNFERÊNCIAS

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

SESSÃO DE ABERTURA

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Começaria por saudar nobres eclesiásticos, instituições e civis presentes, que muito nos honram com a vossa presença, bem como de agradecer a disponibilidade de tão ilustres convidados que aqui se deslocaram, nomeadamente o Sr. Prof. Pinto da Costa e outros notáveis oradores, que, seguramente, irão abrilhantar estas jornadas, dedicadas a tão rele-

vante temática e, com toda a certeza, ensinar-nos a repensar a Saúde, não somente em termos prisionais, mas a Saúde como um direito de todos os cidadãos deste País.Em relação às conferências propriamente ditas, gostaria de aqui deixar uma palavra de apreço ao corpo docente da Escola Augusto Moreno (Escola Associada deste Es-tabelecimento Prisional) pelo excelente trabalho que, tal como é seu apanágio, aqui tem desenvolvido, e a quem este estabelecimento penitenciário está profundamente agradecido, não só pela postura profissional, bem como pela vontade e, porque não referi-lo, pela coragem de em condições tão peculiares desempenhar, tão nobre-mente, as suas funções. Gostaria, ainda, de agradecer a presença dos nossos reclusos e a eles desejar que estas conferências sirvam como um impulso para uma preocupação constante que convém, cada vez mais, terem em relação à temática da Saúde, estando certo de que muito do que aqui, hoje, será dito servirá, não só para uma maior consciencialização, da vossa parte, de acordo com um «espaço aberto», que esta instituição vos propõe, visando o esclarecimento de questões ou dúvidas que entendam ser úteis apresentar à discussão de todos, para que deste modo, e em conjunto, melhor se possa reflectir sobre possíveis propostas de resolução.Permitam-me terminar a minha intervenção com um especial agradecimento à Sr.ª Enf.ª Maria João, que aqui se encontra na qualidade de conferencista e de represen-tante da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, o agrado de ter, pela primeira vez, V. Exa. no Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, fazendo votos para que o organismo que ambos servimos, saia daqui hoje mais fortalecido, não só com o contributo que aqui nos vem trazer, bem como da troca de experiências e saberes com os demais participantes, que estou certo muito contribuirão para um avanço da nossa intervenção nesta área, nomeadamente da capacidade de resposta de nossos serviços junto da população recluída. Obrigado pela vossa presença.

SESSãO DE ABERTURA

Mário Torrão Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança

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SESSãO DE ABERTURA

Senhor Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, sua Excelência Reverendíssima, Senhor Bispo da Diocese de Bragança-Mi-randa, Senhora Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, representante do Senhor Coordenador da Equipa de Apoio às Escolas, autoridades presentes, Formandos do Estabelecimento Prisional e do

Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, Senhores Conferencistas, convidados e comunicação social.Felicito o Estabelecimento Prisional e o Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, pela realização deste segundo ciclo de conferências, orientadas para um tema de capital importância – a Saúde – um bem precioso, o melhor que qualquer um de nós pode ter, pois qualquer que seja a nossa condição, todos ansiamos por uma vida saudável, sendo que todos os restantes problemas, em comparação com este, afigurar-se-ão de mais fácil resolução.Neste pressuposto, estas conferências assumem particular relevância numa óptica de qualidade de vida, do bem-estar de todos e, particularmente, dos utentes deste Estabelecimento Prisional. O programa destas jornadas conta com conferencistas de grande qualidade científica e por isso vos felicito pela capacidade de mobilização de pessoas de elevado conhecimento, com natural benefício para os formandos dos cursos que aqui se realizam (Alfabetização e EFA-B3).Este estabelecimento tem tido uma prática de abertura ao exterior muito importante, funcionando em ‘regime aberto’. Devo, por isso, assegurar-vos que tal postura é, tam-bém, formar e é, de igual modo, qualificar as pessoas, preparando-as para uma etapa subsequente das suas vidas, devendo, esta instituição prisional, continuar de forma empenhada com este trabalho em colaboração com a autarquia, com as empresas e com as diversas instituições da região. É, por conseguinte, meu entendimento, e entendimento da autarquia, ser este o caminho a percorrer, visto que estão a dar um contributo muito importante para a reinserção social dos utentes desta instituição.Sei que estão na forja algumas reformas a nível dos estabelecimentos prisionais no País e, talvez, seja esta a oportunidade de lhe referir, Senhor Director do Estabeleci-mento Prisional Regional de Bragança, que este estabelecimento deve ser alvo de algum tipo de intervenção a nível de reestruturação do edifício, no sentido de, se edificar um auditório para o III Ciclo de Conferências, visto não ser desejável manter as mesmas condições de há quarenta ou cinquenta anos, enquanto que para o litoral, nomeadamente, para cidades como Lisboa e Porto o investimento público vai sendo, cada vez mais, elevado. As instituições têm que ser ajudadas, não podem ser es-quecidas, porque, não o sendo, continuarão a agravar-se as assimetrias e a coesão do País. É, por isso, nossa obrigação «levantar a voz» e lançar um grito de alerta, tal como o estou a fazer neste momento, pedindo-lhe para V. Exa., de igual modo, o fazer junto de quem de direito, para que no próximo ano nos possamos reunir novamente (assim espero), num espaço físico mais condigno e porque, também, os funcionários e utentes deste estabelecimento não merecem ser discriminados como cidadãos,

Jorge Nunes Presidente da Câmara Municipal de Bragança

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SESSãO DE ABERTURA

em termos comparativos, com os estabelecimentos prisionais da capital.Que estas conferências corram o melhor possível, continuem com ânimo com espe-rança, para superar as adversidades. Evidentemente que estamos num período em que o País atravessa grandes dificuldades, dificuldades complexas de vária ordem, onde cada um de nós tem a sua quota-parte de responsabilidade na resolução da situação em que nos encontramos.Parabéns por estas segundas jornadas e eu ficaria muito satisfeito que as próximas tivessem lugar num auditório a ser construído para esta instituição, até porque no âmbito da reforma que se antevê, este não será um estabelecimento anelar, bem pelo contrário, um espaço a valorizar em regime aberto e nessa perspectiva fará, ainda mais, sentido que as actuais instalações sejam melhor apetrechadas.

Muito obrigado.

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Luís Martins Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas

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SESSãO DE ABERTURA

Membros da mesa, senhores conferencistas, caros colegas, convida-dos e ilustres formandos.Em primeiro lugar devo dizer-vos que o Senhor Coordenador da Equi-pa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas, não pode estar presente, bem como o Senhor Director Regional Adjunto da Di-

recção Regional de Educação do Norte, por motivos profissionais, mas agradecem a vossa intenção de os convidarem e esperam que este segundo encontro seja, ainda, mais produtivo, em termos de troca de saberes e experiências, que o primeiro.Em nome da administração educativa, que aqui represento, faço votos para que, em relação aos internos aqui presentes, este tipo de iniciativas promotoras de conhe-cimento, os ajude a uma melhor integração na sociedade exterior, visto ser essa a função, não só de todos quantos aqui estudam, bem como os que pensam continuar a sua formação fora deste Estabelecimento Prisional e que estas jornadas, sirvam como motivação ao aumento de competências de todos vós, através de programas de formação desenhados de acordo com as vossas necessidades de desenvolvi-mento pessoal, escolar e profissional.E nada mais me resta acrescentar, tão-somente agradecer o convite endereçado e esperar que tudo corra pelo melhor.A todos, muito obrigado.Desejo-vos um bom dia de trabalhos.

(1) Presentemente exerce funções de Coordenador da Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas

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Maria Emília Estevinho Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno

Começo por desejar um bom dia a todos, aproveitando para saudar a Mesa, Sua Eminência Reverendíssima, o Sr. Bispo de Bragança-Miranda, o Sr. Presidente da Câmara, o Sr. Director do Estabelecimento Prisional Regional, o Sr. Dr. Luís Martins em representação da Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas, restantes individualidades

públicas, da educação, da saúde, senhores conferencistas aqui presentes, um agra-decimento também à presença da Sr.ª Enf.ª Maria João Eliseu, em representação do Dr. José Ricardo, da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, aos residentes desta casa, à equipa técnico-pedagógica de formadores dos cursos de adultos e a todos aqueles que trabalham neste Estabelecimento Prisional, sem muitos dos quais, esta actividade não seria possível.Devo referir que estas jornadas são uma actividade incluída no nosso projecto edu-cativo, tendo vindo a ser preparada desde Setembro de 2008 pelos professores, elementos do Estabelecimento Prisional e respectivos formandos, os quais desde o início do ano lectivo trabalharam arduamente para que, uma vez mais, pudésse-mos ter um novo ciclo de conferências (a exemplo do ano passado), este ano de-dicado à temática da Saúde e que correu o risco de não se realizar. Devo, por isso, agradecer o empenho do Sr. Director do Estabelecimento Prisional e também do Sr. Subdirector-Geral da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, Dr. José Ricardo, toda a disponibilidade para que estas jornadas sejam hoje uma realidade.Aproveito, também o ensejo, para agradecer a presença de todos os convidados (alguns deles, formandos dos cursos EFA da Escola Augusto Moreno, que aceitaram o convite formulado pelos colegas formandos do Estabelecimento Prisional) e dizer que, o Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, se orgulha do trabalho que o seu corpo docente tem vindo a desenvolver nesta instituição penitenciária. Como é sa-bido, os nossos professores encontram-se, há mais de uma década, ligados a esta instituição gostam de aqui desenvolver a sua profissão, consideram que o trabalho aqui encetado ao longo destes anos, tem sido produtivo, nomeadamente pela me-lhoria registada na formação pessoal, académica, profissional daqueles que por esta casa têm passado (e pelos que, ainda, aqui se encontram) não nos podendo esque-cer que o mercado de trabalho, é cada vez mais competitivo. Assim sendo, maiores habilitações escolares, mais competências desenvolvidas e um outro espírito de cidadania, será fundamental para poderem vencer aquando da vossa reinserção na sociedade e no mercado de emprego, sendo que da nossa parte (e falo em nome do nosso corpo docente) é com enorme orgulho e satisfação que prestamos tal contributo. Como instituição de ensino existimos para formar e para instruir não só os jovens, mas também os adultos, isto é, todos aqueles que, através das nossas ofertas educativas/formativas, queiram agarrar estas Novas Oportunidades que lhes permitam uma vida e um futuro melhor, pleno de sucessos, a nível pessoal/social e, obviamente, profissional.A todos muito obrigado pela vossa presença e desejos de umas boas jornadas.

SESSãO DE ABERTURA

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SESSãO DE ABERTURA

Caríssimo auditório. Faz precisamente, um ano, um mês e quatro dias que se realizaram as primeiras conferências subordinadas à Formação e Educação de Adultos em Contexto Prisional. Este ano, no mesmo âm-bito, escolheu-se como subtema, A Educação para a Saúde.Se as primeiras alertaram para o crescimento global do indivíduo adul-

to privado de liberdade, as segundas pretendem ser um processo que vise criar condições, que permitam ao mesmo e ao grupo, boas práticas de Saúde na procura de soluções e de esclarecimentos aos seus e para os seus problemas.O Projecto Educativo delineado para este Estabelecimento Prisional, tem explicitado de forma clara e concisa todas as preocupações que enformam o trabalho escolar nesta instituição, tanto mais que se contempla o resultado da participação efectiva de todos, quantos estão comprometidos na educação e no desenvolvimento da co-munidade prisional, através de um processo dinâmico e abrangente, conducente à reintegração destes indivíduos. É, por isso que, à volta deste projecto que se cria e recria a realidade “Escola”, que se (re)equacionam necessidades de formação, que se (re)organizam tarefas e que se reforça o sentido de identidade cultural.Com base nestes princípios e dando continuidade ao trabalho que tem vindo a ser realizado nesta área, irão, hoje, as duas instituições: Estabelecimento Prisional e Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, promover a realização destas segundas Conferências, subordinadas ao tema: A Educação e Formação de Adultos em Contex-to Prisional – Educar para a Saúde.

“Educar para a Saúde” em contexto prisional, consiste, através da informação re-cebida, dotar, esta população de todo um conjunto de conhecimentos, que lhes permita aumentar as suas capacidades e potenciar a sua autonomia na aquisição e desenvolvimento de competências, de forma a, adequadamente, optarem por boas práticas de Saúde, quer na vertente física, quer na vertente mental.A Saúde de todos, e para todos, é hoje considerada na maior parte das sociedades, um direito fundamental da pessoa humana. Assim, a organização deste evento pro-põe, com estas jornadas, uma reflexão conjunta e articulada entre as várias institui-ções e actores envolvidos no processo de educação/formação destes indivíduos. Estamos, assim, certos de que partilhar, reflectir e dialogar práticas e saberes com um leque tão variado e distinto de conferencistas, só nos poderá conduzir a maiores ganhos em termos de prevenção e excelência de cuidados.Resta-me, por isso, agradecer a todos os presentes (e ausentes) que, directa ou indirectamente, possibilitaram que estas conferências fossem hoje uma realidade, a saber: Câmara Municipal de Bragança, Governo Civil de Bragança, Direcção Geral dos Serviços Prisionais Juntas de Freguesia da Sé e Santa Maria, Fundação Inatel, Instituto Português da Juventude, Caixa Geral de Depósitos, Caixa Agrícola, Associa-ção de Apicultores do Parque Natural do Montesinho, firma JPI, Casa de Pessoal do Estabelecimento Prisional, Associação Cultural Recreativa e Ambiental de Palácios, Núcleo Empresarial da Região de Bragança, entre outros…

SESSãO DE ABERTURA

Carlos Silva Coordenador Pedagógico dos Cursos de Educação de Adultos no EPR de Bragança

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Aos senhores conferencistas uma palavra de apreço e um enorme agradecimento meu e da equipa que organizou o evento. Muito obrigado.Ao Senhor Director, Corpo de Vigilância e Directora do Agrupamento de Escolas Au-gusto Moreno um “Muito Obrigado” por acreditarem em nós e no nosso trabalho. Só com uma articulação precisa é que se colhem os frutos desejados.Não me quero esquecer de agradecer a todos os formandos dos cursos EFA-B3 e Alfabetização, pelo empenho, contributo e dedicação que deram também à organi-zação deste evento. A eles o meu o nosso, muito obrigado.Termino, fazendo votos para que todos os presentes desfrutem com alegria e sa-tisfação um dia diferente que aqui irão passar. Novamente, os meus agradecimen-tos a esta Instituição Prisional por de ter aberto as suas portas ao mundo exterior, convidando-o a partilhar experiências e saberes em matéria de Saúde, mormente em contexto prisional, uma vez que o que se faz num dia é semente de felicidade para os dias seguintes, trazendo progresso e dinamismo para o Homem e para a socieda-de, da qual é parte integrante.Muito obrigado a todos.

SESSãO DE ABERTURA

IIº CIClo DE CoNFERÊNCIAS

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

APRESENTAÇÃO DASCOMUNICAÇÕES

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APRESENTAçãO DAS COMUNICAçõES

A todos vos saúdo, em particular, ao Senhor Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, também, uma saudação cordial dirigida à Senhora Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, às mais diversas instituições aqui representadas, nomeadamente ao Se-nhor Presidente da Câmara e restantes individualidades, ao Dr. Luís Mar-

tins, na qualidade de representante do Senhor Coordenador da Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas, aos Senhores Conferencistas, aos colegas da Equipa Técnico-Pedagógica de Formadores, por fim ao Chefe e Corpo da Guarda Prisional, a todos os convidados e, obviamente, uma saudação muito especial para os formandos e restante comunidade recluída deste Estabelecimento Prisional. Minhas Senhoras / Meus Senhores, Tal como em anterior edição a temática da ‘Educação de Adultos’ volta a estar na nossa agenda e a ser analisada, desta feita, com um cunho particular nas questões da Saúde.Como todos sabemos, as questões da Saúde são hoje assumidas como um bem comum. Se por um lado é dever do Estado garantir o livre acesso das populações a cuidados básicos de Saúde, por outro é um dever de todos, a adopção de estilos de vida saudáveis, que promovam o bem-estar individual/social e que previnam com-portamentos de risco, como condição essencial para o exercício de uma cidadania mais activa e para o desenvolvimento de um projecto de vida assente na autonomia e na individualidade.Por conseguinte, se a promoção da Saúde e de estilos de vida saudáveis das popu-lações é necessária, então se nos fixarmos no universo prisional ela (mais do que necessária) é urgente, uma vez que a quantidade e gravidade de doenças que se verificam actualmente, ocorrem em maior número, nas prisões do que fora delas.Deste modo, nos Estabelecimentos Prisionais (em Portugal) e de acordo com núme-ros da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais datados de 31 de Dezembro de 2008, registavam-se 2.643 casos de doenças infecto-contagiosas, incluindo Tuberculose, Sida e Hepatite, o que corresponde a cerca de 25% do total da população prisional, ou seja, 1 em cada 4 reclusos padece de uma destas patologias. Sabendo, de ante-mão, que muita desta população é proveniente de estratos sociais com poucos re-cursos económicos, e com um deficiente acesso à prestação de cuidados de saúde, tanto por questões de hábitos de educação, como também por outros factores de risco relacionados, por exemplo, com a Toxicodependência, e se a tudo isto lhe adi-cionarmos o contexto de privação de liberdade a que estes indivíduos são, normal-mente, sujeitos, a situação (como devem calcular), não se afigura de fácil resolução.Mas, não me irei alongar mais sobre esta matéria, porquanto será esta, a temática a abordar pelos Senhores Conferencistas ao longo das suas intervenções (deixo-vos, somente, esta nota no sentido de mote ao que hoje, aqui, irá ser debatido).Antes de concluir, por ora, e em nome da comissão organizadora, gostaria de deixar uma palavra de apreço e de agradecimento às instituições responsáveis pelo even-to, refiro-me, em particular, ao Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, na

José Alberto Pinto Docente do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno e Formador do Curso EFA-B3 no EPR de Bragança (moderador de debate – período da manhã)

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figura do Senhor Director, ao Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, na figura da Senhora Directora e, também, uma palavra de enorme gratidão às instituições que, desde a primeira hora, nos apoiaram, em especial à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais que, em muito, possibilitou a realização destas jornadas, aos colegas de organização (docentes/formadores da ‘Augusto Moreno’), aos Serviços de Educação e Ensino deste Estabelecimento Prisional e, finalmente, aos nossos formandos, e restante população reclusa deste EP, a razão da nossa presença aqui hoje e que, uma vez mais, tornaram possível a realização de um evento pensado e programado para eles, – tantas vezes votados ao esquecimento pela (nossa) sociedade e que importa aqui ressalvar que dela são parte integrante, apesar de, momentaneamente, privados do seu direito à liberdade.

Vamos, então, dar início às Conferências.

APRESENTAçãO DAS COMUNICAçõES

1ª CONFERÊNCIAToXICo(IN)DEPENDÊNCIAS EM AMBIENTE DE REClUSÃo

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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1º CONFERÊNCIA TOxICO(IN)DEPENDÊNCIAS EM AMBIENTE DE RECluSãO

Gostaria de começar por saudar o Dr. José Alberto, como a pessoa que me motivou para estar hoje aqui presente, no meio de vós, o que muito me gratifica. Cumprimento todos os membros da mesa, cuja presen-ça também me honra significativamente, por ter a oportunidade de com eles participar neste colóquio. Seja-me permitida uma saudação

especial a Sua Eminência Reverendíssima o Sr. Bispo de Bragança-Miranda, o Sr. Presidente da Câmara, o Sr. Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bra-gança e à Excelentíssima Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno. Aos senhores formadores rendo, também, as minhas homenagens, aos formandos, aos guardas prisionais e a toda a restante comunidade recluída. A minha intervenção está facilitada, uma vez que hoje, neste estabelecimento prisional, não tenho que voltar a repetir um protesto que há dezenas de anos vinha fazendo, nomeadamente sobre as condições sanitárias das celas. E digo isto por ser com muita satisfação que verifico que neste estabelecimento prisional estas se encontram equipadas com os apetrechos indispensáveis a uma boa higiene, nomeadamente lavatórios, bem como sanitas individuais. É o mínimo que se pode pedir em termos de dignidade hu-mana e que nos toca sempre de perto, quando aludimos à problemática da Saúde.No que concerne a minha intervenção, devo dizer-vos que talvez seja um pouco pa-radoxal interpretarmos à letra o conceito actual mais vernáculo da Organização Mun-dial de Saúde, de bem-estar físico, mental e social, visto que, a priori, parece, utópico «meter» um cidadão na cadeia e, de seguida, proferir-lhe todas estas palavras. Em boa verdade, verificamos que, a par e passo, existe uma vontade muito significativa de conseguir este desiderato (bem-estar físico, mental e social), tal como assistimos hoje aqui, logo de início, a uma asserção prática que traduz o que o povo diz “Quem canta seu mal espanta”. Ora, é exactamente nesta actividade lúdica da música, do cantar, do evocar, que reside uma moldagem do tal bem-estar físico, mental e social, que toca muito de perto um outro conceito, o de Liberdade.Nesta matéria, poderei quase inferir que não estará aqui ninguém que tenha liberda-de, porque esta implica a capacidade de um indivíduo tomar qualquer atitude, inde-pendentemente da vontade dos outros. A este respeito, posso dizer-vos que em Por-tugal só conheço uma pessoa que é, verdadeiramente, livre e que é, precisamente, o Sr. Eng.º Belmiro de Azevedo, visto que, às oito horas da manhã, de um determinado dia, fez com que Assembleia da República abrisse para o ouvir, porque se não fosse àquela hora, não iria (segundo o próprio, tinha mais que fazer). Por conseguinte, à excepção deste Senhor, talvez mais ninguém seja efectivamente, livre.Assim, liberdade significa, não só a autonomia de escolha, bem como a possibilida-de de uma pessoa se informar, porque sem informação, sem educação, não pode, em minha opinião, haver lugar a tal aspiração. Devo, por isso, asseverar-vos que o conceito é fundamental em todo o sistema da educação, uma vez que (felizmente), somos «compostos» por 30% de Genética (nascemos assim, desta ou daquela ma-neira, porque herdamos virtualidades e herdamos defeitos) e 70% de aprendizagem,

J. Pinto da Costa Professor Catedrático da Universidade Portucalense Infante D. Henrique e Universidade lusíada

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i.e., quem nasceu «muito torto» tem a possibilidade de, mercê de uma educação atempada, apropriada e personalística, vir a tornar-se numa pessoa excelente, sen-do isto que, actualmente, os nossos sistemas prisionais, de um modo geral, preten-dem, ou seja, proporcionar tais competências aos indivíduos que cá se encontram. Claro que este estabelecimento prisional goza de um privilégio que outros não terão, que é o facto de, praticamente, se considerar esta população como se de uma fa-mília se tratasse, um pequeno aglomerado de pessoas que se conhecem, que se tratam pelo respectivo nome, que reconhecem as qualidades e os defeitos uns dos outros e que, apesar do contexto, evidenciam alguma motivação para a reinserção. O que, por outro lado, já não sucede quando se trata de lidar com multidões, o que, frequentemente acontece (tal como tenho referido), um grupo de mais de trinta mil pessoas será, à partida, dificilmente governável.Pediram-me para falar da área da Saúde (o título não é meu, mas aceitei-o). E aceitei-o pelo seu carácter ambíguo e, por isso mesmo, tão apelativo. Tóxico, entre parênte-sis (in), dependências em ambiente de reclusão, este “(in)” provavelmente significa dentro, na tóxico(in)dependência. Em minha opinião, deve ser com toda a humildade que temos de aceitar que tanto dentro das prisões, como fora destas existe um fenómeno, do qual todos acabamos directa ou indirectamente por sermos vítimas. Refiro-me, obviamente, à droga. Contudo, o que é importante é que estejamos o mais informados possível para tentar fugir a este flagelo. É claro que no exterior, na dita vida em liberdade, reside uma certa tendência para a solidão, para a falta de relacionamento com os outros, aliciando o indivíduo para o contacto com esta, para que, fruto de uma qualquer necessidade biológica, ou na ânsia de encontrar um melhor bem-estar, ou de resolver os seus problemas, descubra uma saída possível, parecendo-lhe, assim, tal possibilidade, uma via alternativa.No entanto, teremos de, forçosamente, tomar em linha de conta que o recluso apre-senta, exactamente, o mesmo número de neurónios que todos nós (os que não esta-mos, pelo menos para já, em reclusão), ou seja, cerca de cem mil milhões. Senão, ve-jamos. Recuando atrás no tempo, até ao período pré-histórico, deparamo-nos com o homem das cavernas, com o mesmo número de neurónios que o Ser Humano actual, e que nas suas lides diárias tinha que resolver os seus problemas, tal como estes lhe apareciam. Por exemplo, quando ia caçar tinha que ponderar se levava um cajado maior ou mais pequeno, consoante a caça disponível e, «vá lá», de vez em quando, olhar para a sua companheira (com dificuldade porque os cabelos cobriam-na até aos pés), para ver se haveria, ou não, de satisfazer o seu instinto sexual. Tirando isso, os tais cem mil milhões de neurónios não serviam para mais nada. Pois nós temos que estar, continuamente, a resolver com a mesma capacidade de cem mil milhões de neurónios, todas as dificuldades, todas as ansiedades, todos os problemas, bons ou maus, visto ser difícil de etiquetar as situações, tal como estas se nos deparam, como mais positivas ou negativas, porque, em boa verdade, as coi-sas «nem são brancas, nem são pretas». Do ponto de vista matemático a maior parte

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destas é até mesmo cinzenta, sendo que, e nesta perspectiva, a «tal normalidade» em termos de comportamento é, de igual modo, cinzenta. O que nos leva à questão fundamental da conversa que proponho ter hoje aqui convosco: “Qual o problema da toxicodependência, em si mesma, num recluso e num não recluso?”Se querem a minha opinião, posso dizer-vos que é precisamente igual. E é igual porque «tudo» se processa ao nível do cérebro. Todos sabemos que os opiáceos, ou os seus derivados como, por exemplo, a heroína, modificam a personalidade duma pessoa ao ponto de contribuírem, de forma clara, para que este ‘heroinómano’ se torne num autêntico criminoso, indo, paulatinamente, destruindo os seus valores, de tal forma, que em determinada altura só um importa, – conseguir a próxima dose. Assim, quando já está muito «agarrado», quando o fenómeno da adição é prevalente, tal como a necessidade de um chuto de três em três horas, e a dose seguinte é o li-mite, perguntámo-nos: “Onde é que este indivíduo vai arranjar dinheiro para suportar tal vício?” Seguramente que não o possui. Contudo, tem de o arranjar. Devo dizer-vos, que a nível psicológico tal modus vivendi até é compreensível, começando, este, por levar as pratas de casa; passar cheques sem cobertura; tirar o dinheiro ao pai; se for preciso, vender a própria mãe; visto que a única preocupação é, simplesmente, anular aquela aflição, aquela ansiedade que lhe causa mal-estar físico e psíquico e, tão-somente, conseguir a próxima dose, custe o que custar.Voltando, novamente, ao tema da minha intervenção, Tóxico(in)dependências em am-biente de reclusão, devo confessar-vos que quando fui confrontado com o mesmo pensei, não, propriamente, nas drogas, mas no telemóvel. E digo-vos isto, porque considero a sociedade actual bem mais dependente do telemóvel do que das dro-gas. Existem pessoas na nossa sociedade (e algumas até estarão cá hoje, entre nós), que entram numa ansiedade tão grande, quando não têm o «dito cujo», que a única solução é dar-lhe um. Outros, até dormem com ele debaixo do travesseiro e os mais exigentes dormem com dois, um dum lado, outro do outro. Esta é, por si só, uma forma de dependência, tendo em conta uma vontade inexorável que temos de co-municar, tal como a droga, que nos permite alhear do mundo que nos rodeia, de criar um ambiente favorável e de anular aquela sensação de solidão que podemos sentir, pois o telemóvel, na realidade, confere-nos essa segurança, bem como estabilidade, ao nos permitir comunicar com os outros. Como tudo na vida, esta ferramenta apre-senta vantagens e desvantagens e o procedimento correcto a ter, será, obviamente, o uso temperado do mesmo. A sexualidade é, também, um dos temas que gostaria de abordar nesta minha in-tervenção. Como sabem, por opção dos reclusos, estes podem ter relações sexuais com as respectivas esposas ou companheiras. Evidentemente que não será logo no momento que chegam à beira do guarda e dizem: “Vem ali a Miquelina, que é a minha companheira, por isso, se não se importa, gostaria de privacidade e, já agora, não ser incomodado”. É óbvio que assim não pode suceder, caso contrário num dia seria a Miquelina, noutro a Josefina e assim sucessivamente, existindo, por isso,

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certos pressupostos a serem cumpridos neste percurso. Devo dizer-vos que a pri-meira vez que tal se verificou em Portugal, os senhores guardas prisionais, por não estarem, psicologicamente preparados para esta eventualidade, tomaram tal facto na galhofa: “Vir para aqui uma mulher/companheira de um recluso, para ter relações sexuais”. Contudo, devo-vos dizer que tal já não sucede no presente. Actualmente, os guardas prisionais estão, perfeitamente, integrados no sistema, i.e., tiveram, num primei-ro momento, uma reacção, que eu acho perfeitamente normal, mas que foi sendo gra-dualmente colmatada por uma série de acções de sensibilização e de formação, sendo que, hoje-em-dia, demonstram já o máximo respeito pelo recluso, não havendo a mínima coisa a apontar-lhes nesta matéria.Mas, voltando novamente ao tema da droga, visto que muitos, dos aqui presentes, se identificam com este assunto (o que me alegra sobremaneira), chamarei, de seguida, a vossa atenção para alguns aspectos que, em minha opinião, carecem de alguns esclare-cimentos, nomeadamente os relacionados com a problemática da Toxicodependência.Começando por uma das drogas «mais comuns» – a cannabis, é importante que saibam que esta não é tão inofensiva como se diz. A título de exemplo, posso dizer-vos que, se tivermos um indivíduo “excelente”, tal como aqueles sempre muito bem dispostos, que arranjam soluções para qualquer problema, que resolvem tudo, com grandes negócios, grandes projectos etc., o tal excelente poderá configurar um caso de “personalidade paranóide”, ou seja, não o deveremos considerar uma pessoa do-ente, mas apenas com uma personalidade paranóide óptima. Para este é, totalmente contra-indicado tomar contacto com o haxixe, porque se fumar um ou dois charros, aquela personalidade paranóide excelente transforma-se em psicose paranóide, i.e., ele matará o amigo, ele matará a mãe, ele matará o pai, ele transformar-se-á num ser psicótico, bem pior que um “esquizofrénico descompensado”.Ouço, por vezes, uma expressão que é algo usual por parte de muita gente, uns melhor informados, outros nem por isso: “Ah, a cannabis faz muito bem, até tem efeitos terapêuticos.” Devo dizer-vos que, efectivamente, a cannabis é utilizada no tratamento do glaucoma, que é uma doença grave. Contudo, aproveito, também, para chamar a vossa atenção, de que tal procedimento não significa, propriamente, fumar um charro, mas somente umas gotinhas que se colocam no olho com o intuito de diminuir a tensão ocular, devendo, por isso, considerar-se que, nestes casos, a sua utilização será benéfica. Ouço, ainda, muita gente defender que a cannabis deve ser administrada a doentes crónicos, principalmente, quando estes se encontram já em fase terminal. Bom, a esses direi que se já estão a morrer, com ou sem cannabis morrerão na mesma. Em situações do género, e em minha opinião, a sua toma, não deve ser, propriamente, considerada um crime de «lesa-pátria», pelo contrário, até é legítimo que a um individuo, numa fase terminal e em total sofrimento (quando os medicamentos habituais para estas situações não forem já muito eficazes), lhe pos-sa ser administrada morfina. Digo mais, até mesmo de forma continuada, até à sua morte, pese embora tal procedimento poder originar que este morra algum tempo

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mais cedo, o que, também, não será, assim, tão significativo.Por outro lado, um grupo de trabalho, no âmbito da sua investigação na área da toxi-codependência, chegou à conclusão de que a maior parte da população reclusa se encontrava detida por crimes directa ou indirectamente relacionados com a droga, sendo que tal facto não se deve apenas ao consumo, uma vez que tal, por si só, não será sinónimo de prisão, mas porque, possivelmente, estes indivíduos, de igual modo, se dedicavam ao tráfico. Não deixo, contudo, de considerar algo controverso o facto de os serviços prisionais terem tido, sob a sua alçada, durante vários anos, toxicode-pendentes condenados e não disporem dos meios necessários para os tratar. Hoje, na realidade, é proposta a hipótese de, voluntariamente, quem quiser, se submeter a tratamentos com bastante êxito. Existem opiniões de vária ordem e para todos os gostos, contudo, se estamos a falar de toxicodependências, com muita humildade teremos que apontar para a realidade actual. E a realidade é que os chutos são uma das causas de, entre outras patologias, de formação de esclerose nos vasos sanguí-neos ao ponto de provocar a morte. Posso citar-vos um caso verídico: Um certo indi-víduo queria dar um chuto, mas dado o seu estado de avançada dependência, não tinha, já possibilidades do produto entrar na veia. Por isso, escolheu injectar-se na veia dorsal do pénis – resultado: esta substância química ao, penetrar nessa veia, fez com que o seu próprio organismo (já bastante debilitado) não conseguisse suportar esta substância, tendo-lhe causado morte imediata por overdose.O exemplo citado serve como chamada de atenção a todos (sem excepção), de que o tempo é a grande cura, em termos de desintoxicação. Não tenhamos ilusões. Não é possível, actualmente, e digo isto aqui e agora, em Maio de 2009, que um to-xicodependente fique curado num período inferior a 5 anos! Quem disser que, com determinado tratamento, se consegue a cura ao fim de 6 meses, de 1 ano, de 2 ou de 3 está a mentir! Afirmo-o aqui e em qualquer parte do mundo. Serão necessários, pelo menos, 5 anos para que o cérebro possa, na realidade, mobilizar toda a sua capacidade bioquímica para que a pessoa se sinta bem. Infelizmente, está-se sujei-to a muita mentira e inúmeras campanhas de desinformação que, enfim, através de publicidade enganosa, visam, tão-somente, o lucro fácil à custa de desgraça alheia.Um outro problema de que, também, padece o nosso sistema prisional, é o alcoo-lismo. É certo e sabido que o alcoolismo é a toxicodependência, por excelência, em Portugal. Toda a gente bebe e para nós portugueses, não há melhor droga que o álcool. Aproveito, também, para chamar a vossa atenção, para a publicidade enga-nosa nesta matéria como, por exemplo, a cerveja sem álcool. Neste caso, cerveja sem álcool é mais uma mentira. Esta bebida (apesar da imagem que nos tentam vender), tem uma quantidade mínima de álcool, mas suficiente para fazer com que seja reactivado todo o sistema enzimático cerebral de um ex-alcoólico (que esteja, perfeitamente, curado) aumentando o seu risco de recaída.Ainda, em relação ao álcool, por exemplo, se nos depararmos com o caso de um indivíduo, com uma evolução do alcoolismo a nível do delirium tremens (que é já

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uma fase muito grave de uso prolongado e abusivo do consumo) ao lhe cortarmos o álcool abruptamente, matámo-lo! Neste caso, o procedimento correcto, a efectuar pelo profissional de saúde implica uma gradação do afastamento do paciente em relação à bebida. Contudo, se pela frente tivermos um indivíduo que esteja a tomar cocaína, pode retirar-se a cocaína, radicalmente, porque este não morrerá, visto o seu organismo desenvolver um tipo de dependência diferente, pelas características deste químico, em relação ao álcool. Agora, se este indivíduo quiser jogar futebol e se, por não tomar cocaína, não for capaz de mexer as pernas, aí o caso já muda de figura. No entanto, não podem colocar-se em «pé de igualdade» os efeitos desta droga (cocaína), com os de certos opiáceos e, em concreto, com a heroína, que é uma droga causadora de um elevado grau de dependência. Já agora, e por falar em ‘heroína’, convinha, aqui, analisar a sua origem.Assim, a heroína é uma criação do sec. XIX dos laboratórios Bayer, quando em de-terminada altura se depararam com o facto de indivíduos que tomavam morfina morrerem rapidamente, por esta conter um efeito depressor do sistema respiratório gra-ve, sendo que as suas consequências ao nível do aparelho respiratório resultavam em broncopneumonias e outras patologias pulmonares. Procurou-se, por isso, outra droga que não tivesse um efeito tão maléfico para o centro respiratório dos pacientes, a saber: a “diacetilmorfina”, vulgarmente conhecida por ‘heroína’.No entanto, com o seu uso generalizado chegou-se à «terrível» conclusão do aumento da criminalidade (tal como já referi). Ou seja, a heroína (pelas razões apontadas) vem substituir a morfina e, por sua vez, encontra-se, presentemente, a ser substituída com os mesmos fins (terapêuticos) que levaram à sua criação, por uma outra droga da mesma família de opiáceos, a ‘metadona’. Esta, pelo facto de não ser injectada mas consumida oralmente, evita sintomas de grande prazer súbito (que ocorrem com a heroína), o que ajuda a vencer a dependência psicológica.Meus senhoras e minhas senhoras, não tenhamos dúvidas de que nesta matéria, e tal como vimos, a história se repete, i.e., ao chegar-se à conclusão que a heroína, também, é má, arranjou-se uma outra droga (metadona), que, de igual forma, conduz à dependên-cia, e o que temos assistido é que, ao longo dos tempos, se tem vindo a aperfeiçoar es-tas substâncias de forma a minorar os efeitos indesejáveis que todas elas comportam.Em relação à toma da metadona, o que na prática se tem vindo a assistir é que os resultados terapêuticos nem sempre são os mais desejáveis, isto porque se o espíri-to for fraco, o paciente toma a dose de metadona no período da manhã e à tarde já toma tudo o «que vier à rede», ou seja, chutos de heroína, mete cocaína, mete LSD, mete aspirinas, mete Atarax, etc… e se não o faz de forma intravenosa (porque tem medo da SIDA), ingere-a das mais variadas formas e feitios, visto que, hoje-em-dia, a heroína entra por tudo que é cavidade do corpo humano, seja pela boca, seja pelo nariz, até, imaginem, pelo ânus, … enfim, dá para tudo.Chamo, contudo, a atenção dos mais incautos para com a heroína, que estão a meter dentro do próprio corpo, porque de heroína se calhar não tem nada. Uma ocasião

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autopsiei (e na literatura há outros casos também), um indivíduo que morreu por uma injecção que continha pó de cimento, vejam bem: Pó de Cimento! Um outro exemplo é quando se mete estricnina a mais (que é o que se usa como substância de corte), e heroína a menos, julgando que estão a meter uma boa dose de heroína e que, por isso, quando muita gente diz, coitado, morreu de overdose, a esses direi, morreu sim mas de “mini dose”, porque na seringa poucos ou nenhuns vestígios de droga haviam. Portanto, é preciso estar-se precavido, quando se injecta ou ingere qualquer uma dessas drogas que vos vendem mais baratas, aliciando-vos muitas vezes com a conversa de que: “Olhe, isto veio agora directo da Colômbia, esta é da boa”. uma ocasião, houve um cavalheiro que morreu nestas circunstâncias, disse ao outro: “Ó pá tens aqui um chuto maravilhoso, que chegou agora, é desco-nhecido, veio da Holanda, nunca ninguém usou isto”. Este comprou-lhe o produto, meteu a dose toda na seringa e… morreu. Aquela droga maravilhosa que tinha vindo da Holanda, era, afinal, insulina. Ao meter insulina na veia, ficou em coma insulínico, falecendo de seguida. Julgo, por isso, que graças a um equilíbrio dos sistemas de saúde, os reclusos terão, se assim o entenderem, a possibilidade de se tratarem, de se desintoxicarem e tudo isto com acompanhamento psicológico. Não é fácil à partida. Compete, também, ao profis-sional de saúde alertar o recluso toxicodependente para as dificuldades inerentes ao processo de tratamento, do género: “Olhe, você quer-se curar, tudo bem. Não vai ser fácil. É preciso muita força de vontade da sua parte, mas nós cá estamos para o ajudar a ultrapassar as dificuldades que surgirem. Vai ver que no final valeu a pena todo o esforço e sofrimento. E é isso que importa”. Deste modo, ao longo do processo ir-se-á notar um aumento da auto-estima e ao fim de cinco anos este indivíduo poderá estar, completamente, reabilitado. Antes disso, e tal como referi anteriormente, não é possível.Para terminar, e ainda nesta matéria, devo assegurar-vos que não é biologicamente pos-sível uma cura antecipada deste período, porque os canais que estão entupidos pelas drogas que metemos cá dentro, são os mesmos que, se estiverem livres, nos hão-de permitir escolher, se temos sensações de prazer ou de dor, se sentimos maior ou menor bem-estar, demorando, todos esses cinco anos «a limpar». Antes do final deste período, não teremos a liberdade, sequer, de utilizar as substâncias químicas que temos dentro do nosso organismo (endorfinas), que fazem parte do grupo dos opiáceos (morfinas, heroí-nas, metadonas) e, por isso, para termos capacidade de as mobilizar, temos de ter esses canais abertos.Julgo ser este o sumo da minha intervenção, apesar de muito mais haver para dizer, mas, infelizmente, não há tempo, pois seguem-se outros prelectores que, também, nos querem presentear com o seu contributo. Por isso, uma vez mais, agradeço a vossa presença.

Obrigado a todos.

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2ª CONFERÊNCIACoMISSÃo PARA A DISSUASÃo DA ToXICoDEPENDÊNCIA E CENTRo DE RESPoSTAS INTEGRADAS: A INTERlIGAÇÃo NECESSÁRIA

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

Rodrigo Versos Presidente da Comissão para a Dissuasão da Toxicodependência de Bragança

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Obrigado a todos. Antes de mais, permitam-me que cumprimente os organizadores deste ciclo de conferências, e lhes dirija o devido agra-decimento pelo honroso convite que me endereçaram, nomeadamen-te aos docentes/formadores do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno e ao Estabelecimento Prisional Regional de Bragança. É com

muito gosto que aqui estou. Sr. Director do EPR de Bragança, Sr.ª Directora do Agru-pamento de Escolas Augusto Moreno, excelentíssimos membros da mesa de honra, senhoras e senhores conferencistas, minhas senhoras e meus senhores, aqui se incluindo os senhores reclusos, muito bom dia a todos.Atendendo ao tema que me foi proposto e ao tempo disponibilizado, irei de forma breve, tanto quanto possível, procurar fazer a caracterização das políticas públicas de combate à droga, sinalizando a sua evolução cronológica e programática. Quando Portugal assumiu a responsabilidade de presidir à Organização da Sessão Especial da Assembleia Geral das Nações unidas, que teve lugar em Nova Iorque em Junho de 1998, teve ocasião de dirigir em Viena as negociações para a elaboração de uma histórica declaração política que seria acompanhada por diversos planos de acção, e devo-vos dizer que não foi uma negociação fácil, cada palavra, incluindo as que, simplesmente, designavam a problemática da droga, foi, atentamente, examinada e objecto de discussão, o consenso porém começou a desenhar-se quando alguém sugeriu que se usasse a expressão “o problema mundial da droga” – em Inglês (The World Drug Problem) e, assim, o mundo finalmente concordou, ou seja, teve que con-cordar que tinha um problema – um problema comum.O parágrafo acabado de ler consta do texto que aprova a estratégia nacional de luta contra a droga, aprovada em 1999. Julgo conveniente citar este excerto para que nos entendamos. Assim, quando falamos de droga, seja em que dimensão for, falamos, de facto, de uma realidade particularmente complexa, que suscita opiniões, debates, controvérsias, sendo certo que a divergência maior reside em saber qual/quais as res-postas mais adequadas, de modo a minorar as consequências do seu consumo. Mas, se estamos de acordo relativamente a este facto, também me parece que estaremos de acordo que as respostas mais adequadas terão que constar de planos e objectivos delineados pelo poder político com o contributo da comunidade científica. A abordagem político-legislativa das questões suscitadas pela droga tem privilegia-do, desde a aprovação da estratégia nacional de luta contra a droga, o consumo e o consumidor, enquanto actor social que protagoniza a realidade do fenómeno da toxicodependência. Mas, nem sempre assim foi. É por isso que talvez valha a pena fazer uma referência aos principais e mais recentes documentos que procuram de-linear o contexto do combate à droga e à toxicodependência, estabelecer o quadro evolutivo em matéria de políticas públicas dirigidas ao combate a este flagelo e aprimorar as respostas a estas questões. Por exemplo, sabemos hoje que a pior resposta que um toxicodependente precisa de ouvir (e é de respostas integradas de que, aqui, vos falo) é uma sentença judicial a condená-lo ao cumprimento de uma

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pena de prisão efectiva, apesar do Professor Pinto da Costa ter referido que não existiam nas cadeias presos por consumo, e de facto não os há, pese embora tal ser, hipoteticamente, possível, por estar previsto na lei e por serem essas as respostas que, regra geral, ouviam os toxicodependentes no nosso país.Entendamo-nos, refiro-me a toxicodependentes que nessa qualidade, e só nessa qualidade, eram condenados a cumprir penas de prisão, abstraindo-nos, por isso, da eventualidade do cometimento de outros crimes relacionados ou não com a situa-ção específica de toxicodependência.Mas o que evoluiu entretanto? Que tipo de respostas procurou o legislador, ou o poder político, dar ao problema da toxicodependência? Podemos falar hoje de resposta inte-grada ao fenómeno da toxicodependência? Estamos a saber combater o fenómeno e as suas consequências concretas? Estamos a salvar pessoas? Estamos, efectivamente, a criar condições para o exercício de uma cidadania mais activa e para o desenvolvimento de um projecto de vida autónomo e responsável?Durante um período de tempo (em minha opinião, demasiadamente longo), privilegiou-se, em matéria de drogas, o vigiar e o punir em detrimento do prevenir e do tratar, con-fiando-se aos juristas e aos técnicos penitenciários aquilo que não lhes competia e que, à partida, desconheciam. A urgência de um novo modelo era, por essa via, flagrante.Tal surge, finalmente, com a estratégia nacional de luta contra a droga, à qual a lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, veio pouco depois dar a necessária sequência. Era evidente que o modelo criminalizador estava esgotado. As prisões por força de crimes conexos com o consumo haviam-se transformado em depósitos de toxico-dependentes. Resumindo, era absolutamente necessário um novo modelo assente na descriminalização (já que, se calhar não existia vontade política de evoluir noutro sentido) e uma resposta global que congregasse o saber de cientistas e técnicos articulando práticas, experiências e saberes, com vista ao reequacionamento e à re-avaliação dessas políticas. Em suma, era necessário, que se privilegiasse o prevenir e o tratar, em detrimento do punir e do vigiar.No que ao consumo e à posse para consumo de droga diz respeito, a engenharia jurídica perdeu a vertente penal clássica substituindo-se pelo direito contra-ordena-cional, utilizado como instrumento que se propõe servir o projecto de motivação dos consumidores ao tratamento. Manifestação clara dessa opção é, de facto, a referida lei que consagrou o regime aplicável ao consumo de droga, bem como a protecção social e sanitária dos consumidores. O objectivo da mesma (lei) reside, agora, em assinalar aos sujeitos que consomem substâncias a necessidade, possibilidade de uma mudança de atitude e de estilo de vida, disponibilizando-se o Estado para cola-borar nessa aposta. Porém quando os toxicodependentes permanecem no consumo, o Estado faculta-lhes condições para que o recurso a estas substâncias aconteça em observância com a higiene e sem os riscos que o consumo de rua oferece – o que demonstra que o legislador descobriu no toxicodependente o indivíduo que requer apoio e não castigo. Estabelece, por conseguinte, com os diplomas sobre re-

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dução de riscos e sobre as comissões para a dissuasão da toxicodependência, uma nova filosofia, que radica em concepções médicas e psicológicas visando a redução de riscos e encaminhamento dos toxicodependentes para programas de tratamento. Com o propósito de concretizar esta nova filosofia, o Estado dotou-se dos seguintes instrumentos político-legislativos: A 24 de Agosto de 2006 o Conselho de Ministros aprovou o Plano Nacional Contra a Droga e Toxicodependências 2005/2012, antes dis-so não podemos esquecer a importância dos seguintes documentos de referência, em 1999 pela resolução do Conselho de Ministros n.º 46/99, de 22 de Abril, foi apro-vada a estratégia nacional de luta contra a droga para o período de 1999/2004. Em 2001, a resolução do Conselho de Ministros n.º 39/2001 aprovou o correspondente plano de acção, ainda em 2001 o XIV Governo Constitucional aprovou o Decreto-Lei n.º 183/2001, de 21 de Junho, destinado à criação de programas, estruturas para sen-sibilização e encaminhamento para tratamento de toxicodependentes, bem como para a prevenção e redução de atitudes, comportamentos de risco e minimização de danos individuais e sociais provocados pela toxicodependência. Em 2002 o XV Governo Constitucional fundiu as duas instituições, nomeadamente o Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência e o Instituto Português da Droga e Toxicodependência, numa instituição única: o Instituto da Droga e da Toxicodepen-dência (IDT). Ainda, durante o mandato do XV Governo, em 2004 o IDT solicitou uma avaliação externa ao Instituto Nacional de Administração, a qual constituiu importan-te contributo para todo o planeamento futuro. Este foi, também, influenciado pela estratégia de luta contra a droga 2005/2012 da união Europeia, a qual visa a preven-ção e redução do consumo de droga, da dependência e das suas consequências nefastas em termos sociais e de saúde, e é disto que, de facto, aqui falamos. Esta estratégia visa, ainda, garantir a segurança para o público em geral e ampliar a co-ordenação europeia internacional, concentrando a sua actuação em dois domínios – redução da procura e redução da oferta e em dois temas transversais: a cooperação internacional e a investigação, informação e avaliação.Como se constata, parece que não nos podemos queixar de falta de estratégias e orientações programáticas nacionais e europeias. O Plano Nacional de 2012, não deixa de recolher os frutos desse trabalho de reflexão estratégica, avaliação e da consensualização progressiva em que assentam as linhas mestras daquilo que po-demos designar pela nova orientação a que preside o combate nacional contra as toxicodependências. O plano de acção em vigor visa, essencialmente, seis missões, a saber: redução da procura, prevenção, dissuasão, redução de riscos e minimização de danos, tratamento e reinserção. Mas como sabemos, e convém recordar, nem sempre assim foi, em Portugal até 2001. Em 2001, o toxicodependente era apenas, e tão-somente, considerado um criminoso, cuja conduta era criminalizada e penalizada pelo ordenamento jurídico com, pelo menos, e no abstracto, pena de prisão. Felizmente evoluímos, aliás, podemos dizer que da evolução registada, ao longo de um período de cerca de 90 anos, resulta uma

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conclusão, no dizer do Professor Carlos Poiares “à medida que a lei se foi permeabi-lizando ao conhecimento científico a severidade punitiva cedeu a vez a tentativas de compreensão, explicação dos comportamentos e dos seus actores, abrindo-se uma nova lógica científica na arquitectura jurídica, cada vez mais disponível para acolher os contributos de outros saberes”, por outras palavras, e continuando a citar a an-cestral omnipotência do jurídico, “(…) perdeu sentido e significado e a confluência pluridisciplinar entre o direito e as ciências do comportamento e da vida e passou a constituir a nova matriz na valoração das condutas”.Mas a verdade é que creio, que nos podemos orgulhar do trajecto que temos vindo a percorrer. Com efeito estamos, hoje, muito mais habilitados a fazer o diagnóstico da situação e corrigir o que for necessário. Estamos, assim, bem apetrechados, dispo-mos das melhores ferramentas, mas convém que não percamos de vista a necessi-dade de uma abordagem sistémica. Por exemplo, a lei que descriminaliza o consumo de drogas, deve ser analisada em articulação com os diplomas sobre redução de riscos e sancionamento do consumo. Trata-se de um conjunto normativo que assina-la o afastamento da intervenção jurídico-penal clássica revelando-se, cada vez mais, permeável ao conhecimento científico, visando contribuir para o encaminhamento dos consumidores para o tratamento e reinserção, ao mesmo tempo que assegura que, persistindo o uso de drogas, o mesmo se processe em condições que envolvam o menor número possível de riscos, quer para a saúde pública, quer para a saúde individual de cada um. Finalizo este parágrafo com palavras que serviram de suporte ao então Ministro da Saúde Correia de Campos, por ocasião da apresentação do dito plano:

“Qualquer destes objectivos tem sido amplamente discutido no passado, está previsto na lei, ou foi altamente recomendado pelo Provedor de Justiça e tem a seu favor variada experiência estrangeira. Respeitáveis vozes têm manifestado receios de permissividade, baixar de braços, quebra de segurança ou até argumentos financeiros, agora ditos eco-nomicistas. O Plano usa linguagem cuidadosa e prevê métodos progressivos, seguros e cuidadosamente medidos. Mas não faz concessões à hipocrisia de deixar entrar pela janela aquilo que não se quer fazer entrar pela porta. Rejeitar consumo assistido e tole-rar o consumo exposto, desregrado e contaminante, não é boa governação. Deixar que a doença infecciosa pulule nas prisões através de material grosseiramente improvisado, fonte de contágio incontrolável, em vez de tentar agarrar o doente ao sistema é um acto de inaceitável desimporte social. O País exige do Governo que cumpra as suas respon-sabilidades, também nesta matéria. Ele cumpri-las-á.”Para terminar, e creio que todos desejamos que tal aconteça, da nossa parte (Comissão para a Dissuasão da Toxicodependência de Bragança) cientes da responsabilidade que nos acresce, compete-nos articular com vários operadores, nomeadamente com o CRI, com os Estabelecimentos Prisionais, com as forças de segurança, com os Centros de Saúde, entre outros organismos, para, nesta área, fazer sempre mais e melhor.

Muito obrigado a todos.

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Gostaria de começar a minha intervenção por agradecer à organização o con-vite que me fez para estar hoje aqui presente. De igual modo, aproveito este momento para saudar o Sr. Director do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, a Sr.ª Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, a Equipa Técnico-Pedagógica de docentes e formadores desta Escola, os Ser-

viços de Educação e Ensino do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, os mem-bros da mesa, toda a comunidade prisional, bem como todos os presentes.A minha comunicação neste ciclo de conferências incidirá mais sobre o tratamento a prestar a toxicodependentes, por parte do Centro de Respostas Integradas (CRI) de Bragança.Este “tratamento” constitui um dos pilares fundamentais da acção estratégica do Insti-tuto da Droga e da Toxicodependência, I.P. (IDT, I.P.), designadamente na diminuição dos riscos e das consequências, dos consumos de substâncias psicoactivas lícitas e ilícitas. Assim, esta nossa missão tem em conta os pressupostos seguintes: garantir a toda a população (que o deseje) acesso em tempo útil a respostas terapêuticas integradas; disponibilizar uma oferta diversificada de programas de tratamento e de cuidados, con-templando uma vasta gama de abordagens psicossociais e farmacológicas orientadas por princípios éticos e pela evidência científica; promover a melhoria contínua da quali-dade dos serviços prestados ao nível dos programas e intervenções terapêuticas.De forma a atingir estes objectivos, o IDT, I.P. criou uma rede interna de serviços de tratamento que constituem a base da sua actividade específica, mas que só poderá funcionar plenamente se contar com a prestação de cuidados complementares de saúde e de suporte social, que deverão ser prestados pelas instituições, serviços e grupos sociais existentes na comunidade e que constituem a rede externa de apoio ao tratamento. Para além das Equipas de Tratamento inseridas nos CRIs, do qual faço par-te, existem ainda, as Equipas de Reinserção, as Equipas de Prevenção e as Equipas de Redução de Riscos e Minimização de Danos; fazem ainda parte das respostas do IDT, I.P., os Centros de Dia, as Comunidades Terapêuticas, as Unidades de Alcoologia e as unidades de Desabituação. Estas são constituídas por profissionais de vários sectores, nomeadamente psicólogos, médicos, assistentes sociais, enfermeiros, terapeutas, en-globando as principais valências de acordo com os fins a que se destinam, tais como o apoio psicoterapêutico, consultas médicas, programas terapêuticos com agonistas e antagonistas de opiáceos e, ainda, consultas destinadas a um público-alvo específico, como por exemplo, crianças e jovens, grávidas e doentes com patologia mental con-comitante, famílias – incluindo filhos de pessoas toxicodependentes. Nestas (equipas) é realizada a triagem, o rastreio de doenças infecto-contagiosas e é avaliado o plano para tratamento, iniciado com as consultas de Psicologia. Já no seu decurso é avalia-do todo o historial de consumos do toxicodependente, bem como as dificuldades que este sente em manter a abstinência, sendo fundamental tratar o seu estado físico e psicológico, de forma a lhe permitir algum suporte emocional, de acordo com os seus índices motivacionais, promovendo a sua reinserção. De igual modo, se procura ajudar este indivíduo a ultrapassar sentimentos de insegurança, angústia, desespero, falta de

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Sandra Valdemar Psicóloga no Centro de Respostas Integradas de Bragança

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confiança e de esperança (inerentes a algumas fases do processo), simultaneamente, precavendo (possíveis) recaídas.Disponibilizamos, também, como metodologia de tratamento de perturbações psíqui-cas, as consultas de Psicoterapia. Nestas pretende-se, por um lado, estabilizar emo-cionalmente o “paciente”, reduzindo os sintomas que manifesta, e por outro, identificar as causas do «adoecer psicológico» que deverão ser alvo de intervenção psicológica, diferenciando-se estas das consultas de Psicologia, sobretudo pelas características do contrato terapêutico a estabelecer com o “utente” deste programa, no respeito por períodos de tempo preestabelecidos (uma ou duas vezes por semana). Devo, tam-bém, referir que, como projecto terapêutico autónomo, a Psicoterapia não deverá ser indiferenciadamente indicada. Tal como acontece com outros projectos terapêuticos, existem requisitos obrigatórios que deverão ser cumpridos, dada a profundidade da intervenção em causa.Promovemos, também, como programa de tratamento de ambulatório, o “Programa de Antagonista dos Opiáceos”, destinado a indivíduos organizados, abstinentes de heroína e com algum suporte familiar ou social. Neste são prescritos medicamen-tos bloqueadores dos receptores opiáceos com tempo de actuação prolongado, que após tomados impedem o utilizador de sentir o efeito da substância, prevenindo a re-caída por impulso, sendo que para o tratamento desta dependência é dada prioridade ao antagonista. Contudo, aos ex-consumidores não pode, numa fase inicial, este ser ministrado (antagonista), uma vez que têm de passar por uma fase de limpeza do seu organismo face às drogas (com apoio de medicação ou não), pois podem desenca-dear uma crise de abstinência grave. Quando não o conseguem fazer em ambulatório ou em casa, são enviados para “unidades de desabituação”, onde permanecem, pelo menos, até dez dias, de forma a «limparem o organismo», sendo, somente após este período, ministrado o antagonista, que irá bloquear os receptores opiáceos e que, uma vez tomado, (estes indivíduos) não poderão consumir qualquer outra droga, caso contrário poderão incorrer em risco de overdose. Desta forma, para sentir o efeito da heroína, o “paciente” tem de planear com antece-dência a paragem da toma deste medicamento, dando-lhe espaço para reflectir sobre o acto que pretende realizar, sobre os seus motivos e, sobretudo, sobre as consequên-cias do mesmo. A toma de antagonista não confere qualquer sensação de prazer pelo que deverá haver um acompanhamento psicológico para que não haja recaída.Por fim o “Programa de Agonista dos Opiáceos”, que se desenvolve com medica-mentos opióides de efeito agonista (medicamentos morfinomiméticos indicados para heroinodependentes, como por exemplo, a metadona), os quais são administrados regularmente e em dose adequada, subtraindo o sofrimento provocado pela falta de heroína e a necessidade física de a consumir, ao mesmo tempo que reduzem o mau estar psicológico da falta da droga. No entanto, não deverá esta terapêutica ser equacionada como primeira resposta, mas apenas quando abordagens anteriores não

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foram suficientes para ajudar a curar o doente e nas quais, claramente, o tratamen-to com antagonistas não foi eficaz (pelos mais diversos motivos, como por exemplo, problemas familiares, indivíduos sem abrigo, grávidas, infectados com HIV, etc.), ou, então, quando existem indicações específicas para que a manutenção com opióides se assuma como tratamento de primeira linha. Assim, esta terapêutica desenvolve-se através do cálculo da dose de metadona correspondente à dose habitual de consumo de heroína (que estes utentes tomavam diariamente), para que não sintam a sua falta, coadjuvada por consultas Médicas e de Psicologia, o que, conjunta e paulatinamente, irão permitir uma diminuição gradual da toma de metadona, até se atingir o grau zero em termos de adição.É verdade que alguns doentes passam «uma vida inteira presos» ao tratamento desta substância (metadona). Devo, contudo, referir que estes casos não são já da incum-bência da equipa de tratamento, mas da equipa de redução de danos e de redução de risco, cujo papel é o de acompanhamento de utentes que não se querem tratar, ou que, mesmo se tratando, não querem deixar as drogas. Por conseguinte, o que se pretende é a diminuição do risco de propagação de doenças entre estes e outros to-xicodependentes, bem como de estes com a população em geral. Assim, visto que tais indivíduos têm de se deslocar, diariamente, ao CRI para aí tomarem «o seu agonista», a nossa intervenção vai no sentido de controlar o seu estado de saúde (p.e. aferir do histórico de consultas ao HIV), procurando promover a alteração de comportamentos de risco e hábitos de consumo. A título de exemplo, se o enfermeiro, que lhe ministra o agonista diariamente, observa nesse doente alguns sinais de que este pode estar com Tuberculose, o utente é rapidamente encaminhado para que se proceda ao diagnós-tico e se inicie o tratamento (caso se confirme a suspeita). Novamente, reafirmo que o objectivo primacial desta equipa é o da redução de danos e dos riscos, tanto para estes como para a população em geral e, por esse motivo, é que, infelizmente, existem utentes que, seguramente, tomarão metadona até ao resto das suas vidas.Para finalizar, devo, novamente, voltar a referir que, para a concretização dos objecti-vos deste Programa Terapêutico, deve ser elaborado um “Contrato Terapêutico” com regras e obrigações a cumprir, por ambas as partes, e com uma duração predetermi-nada. No final do programa ou mesmo antes, caso se alterem as condições iniciais, a situação é reavaliada e definido o futuro da intervenção.Com estas palavras termino. Uma vez mais aproveito para agradecer a vossa presença.

Muito obrigado.

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3ª CONFERÊNCIADA DEPENDÊNCIA À EDUCAÇÃo PARA A AUToNoMIA

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

Conceição Azevedo Professora Catedrática da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

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Muito bom dia a todos. Aceitem que, sem formalismos, a todos cumpri-mente dizendo simplesmente “Queridos amigos”. Permitam-me uma excepção, o Dr. José Alberto Pinto e a Comissão Organizadora destas conferências a quem agradeço o convite que me foi formulado.Gostaria de vos dizer, em primeiro lugar, que sei muito pouco sobre

“dependências” no sentido em que vulgarmente este termo é definido. O meu campo privilegiado de estudo é a Educação, designadamente a área de formação de pro-fessores e educadores. No entanto, no contacto que estabeleço com os jovens que estão a formar-se para virem a ser professores, e com os já formados, tenho vindo, a dar-me conta que, muitas vezes, eles e eu – todos nós – estamos dependentes de muitas coisas. Permitir-me-ei fazer ressoar, ao longo desta minha conversa convosco, algumas das observações que, antes de mim, e com maior saber, fez o Sr. Prof. Pinto da Costa. Referia ele o telemóvel, mas há outras dependências, como por exemplo as que sentimos uns dos outros e que, em minha opinião, talvez sejam as que mais nos deverão preocupar. O Sr. Prof. Pinto da Costa referiu, também, que tinha dúvidas que alguém fosse verdadei-ramente livre. Ora eu costumo dizer, as ilusões de liberdade as perdi no momento em que me puseram a primeira fralda. Nesse momento acabou-se a possibilidade de concretizar a cem por cento essa abstracção... e, no entanto, temos o conceito, temos a ideia do que possa ser a liberdade e, se temos o conceito, postulamos um referente para essa palavra. É, precisamente, sobre isto que reflectirei aqui, e em directo, com todos vós.Começo, assim, a minha intervenção partilhando convosco uma história simples e que, estou certa, traduzirá o muito que vos pretendo transmitir. Ouvi falar, aqui há muitos anos, de um homem que bebia muito, muitíssimo mesmo, já que ninguém da aldeia se lembrava de alguma vez o ter visto sóbrio. Pois bem, esse homem tinha dois filhos: um deles bebia tanto, ou até mais, que o pai, enquanto que o outro filho, pura e simples-mente, não tocava em álcool. Certo dia, houve um jornalista que, sabendo deste facto, se deslocou à aldeia com o intuito de proceder a uma reportagem. Ao pai não conse-guiu arrancar nem uma palavra, mas com os dois filhos lá conseguiu a tão desejada conversa. O jornalista fez apenas uma pergunta a cada um dos dois: “Por que é que você bebe? – Por que é que você não bebe?”. Para seu espanto, a resposta de ambos foi a mesma: “Com o pai que tive, o que é que queria que eu fizesse?”.Ora, concluímos: enquanto o primeiro reduziu a sua vida a “Eu sou o que fizeram de mim”, ou seja, eu resigno-me a ser como as bolas de bilhar, eu sou apenas um alfinete atraído por um íman, não sou mais nada, o segundo afirma, implicitamente na sua resposta: “Eu sou o que faço, com o que fizeram de mim!”. Tiveram o mesmo ambiente, genes idênticos, mas enquanto um deles se limitou a deixar que tal passasse por ele, o outro fez alguma coisa com isso, conquistou a liberdade. A interpretação, que nos assalta, é a de que quem segue a primeira alternativa, o faz por determinismo: dá o que lhe pede o corpo, o que lhe propõem as emoções, os impulsos da sociedade movimentam-no em qualquer sentido. No outro filho, pelo con-

3ª CONFErêNCIA DA DEPENDêNCIA à EDUCAçãO PARA A AUTONOMIA

trário, podemos encontrar uma capacidade de escolha, o que em Filosofia apelidamos de “livre arbítrio” (que não é exactamente o mesmo que liberdade).Se, porém, pode dizer-se que todos somos dotados de “livre arbítrio”, este, por outro lado, impõe-nos certas condições, nomeadamente físicas, psicológicas e sociais para que possa ocorrer, isto é, para nos “conduzir” a uma escolha. Tomemos como exemplo o que aconteceu comigo esta manhã (sendo que todos poderíamos apresentar expe-riência semelhante). Eu saí de Vila Real, pelas oito e meia, para me meter a caminho de Bragança – podia não ter vindo, mas vir foi a minha primeira escolha (para a qual é possível encontrar mil motivos e justificações). Depois de cá chegar, para me dirigir até este Estabelecimento Prisional, olhei o mapa, que o Dr. José Alberto, gentilmente, me forneceu, para que soubesse o caminho até aqui. Chegando à primeira rotunda, algo me fez pensar, ou seja, eu podia escolher de novo entre seguir a linha que o mapa me indicava ou outra qualquer... Mas se eu decidira vir para Bragança, se eu queria vir aqui ao Estabelecimento Prisional, tinha que seguir as indicações que o Dr. José Alberto me havia dado. O facto é simples, mas permite-nos reflectir: Será que a minha escolha não poderia ter sido outra? Ir por um qualquer outro caminho? Podia. Mas se queria vir ao Estabelecimento Prisional e ser pontual poderia fazer outra coisa? Não. Então sou livre ou não? E a resposta é: Sim, somos livres de escolher o sentido a dar à nossa vida, mas, depois de feita a escolha fundamental pela Vida, é ela que torna obrigatórios certos caminhos – e a isso chamamos nós, em Filosofia de “liberdade”. Mas haverá circunstâncias em que não seja capaz de escolher? Sim, se não for capaz de me dar conta do que sinto (ou não sinto), do que penso (ou não penso), do que que-ro (ou não quero), então não estarei em condições de optar – não sou capaz de “livre arbítrio”, menos ainda de liberdade. Naquilo que me impulsiona, me conduz para as acções que tenho que realizar, ou para aquilo que tenho que fazer, há, ainda que não pensemos nisso, uma opção, uma decisão e um assentimento. Notem que estamos, continuamente, a escolher. Escolhemos, por exemplo, entre estarmos aqui sentados e imóveis, ou levantarmo-nos e andarmos de um lado para o outro, ou desatarmos a cantar ou a gritar. Por que razão não o fazemos? A escolha resulta de nos darmos con-ta das circunstâncias que nos rodeiam (há coisas que são proibidas, haverá sanções para quem as realizar,...), mas também o que nos dá gosto ou prazer e, ainda, a con-sideração dos que estão ao nosso lado, o respeito que lhes é devido. Na conjugação destas três dimensões poderemos, se treinarmos bastante, ter a visão clara de que tal acção me permite (ou não) criar condições para se realizar no futuro a pessoa que quero ser e, de algum modo, concretizá-la no imediato. Entrando agora numa outra esfera, num campo que não é directamente o meu, o da Psicologia, podemos dar-nos conta que, nas escolhas que fazemos, normalmente não optamos da mesma maneira ao longo da nossa vida (quando temos três anos, ou dez, ou quando atingimos a maturidade). Não é pela mesma razão que não me empantur-ro de bolachas ou de chocolates aos três anos, ou aos dez, ou aos vinte... Mas, será sempre assim? Não ocorrerão anacronismos no nosso modo de fazer escolhas? Uma

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criança de três anos opta em função do que espera que seja a reacção da mãe ao que ela faz (“Não se mete o dedo no açucareiro, senão a menina leva dois açoites!”), a expectativa de manter ou o receio de perder o seu amor. De modo semelhante, ainda que tenha 20, 30 ou 50 anos, pode ocorrer que siga um comportamento idêntico ao do grupo apenas à procura do reconhecimento, do respeito e do apoio dos seus mem-bros (ou de algum deles, em especial) e bebo a primeira cerveja, ou o primeiro copo de vodka, porque todo o grupo bebe, e porque tenho medo de ficar de fora, de perder o grupo com o qual a minha identidade se confunde, apesar de saber (intelectualmen-te) das consequências e perigosidade do acto – isto é, opto exactamente como uma menina de três anos com medo de perder o amor da mamã. Pode também acontecer que o faça porque todos fazem desse modo, porque é a

“regra do grupo”, a condição para pertencer ao grupo e, dentro dele, é uma regra universal, a qual acaso se define por ser o oposto da estabelecida na sociedade dos mais velhos, dos pais e professores... Então, bebendo porque essa é a regra, estou a funcionar como uma menina de dez anos que acabou de descobrir a “norma sociali-zante” e vive a contradição de combater a norma porque é a norma (dos pais) e seguir a norma porque é a norma (do grupo).Em nenhuma destas situações poderemos falar de liberdade. A “liberdade” exige mais. Já vimos que ela tem como condição a capacidade de escolher (o livre arbítrio). Mas como exercer a capacidade de optar em ordem a fazer escolhas em que não me enga-ne? Como fazer escolhas que respeitem a minha capacidade de continuar a escolher?Em primeiro lugar, há que tomar consciência plena da situação em que me encontro. Assim, devo perguntar-me: Qual é a situação que estou a viver? O que é que nela me impele, me move? Quais são as circunstâncias? Quais os factos? Mas também: O que é que se está a passar dentro de mim? – Preciso de aprender a dar nome ao que sente o meu corpo: Estou cansada... Tenho frio... Tenho fome... Tenho sede... Tenho sono... Pre-ciso de aprender a dar nome também às minhas emoções: Tenho medo? Estou triste? Estou zangada? Tenho raiva? Estou furiosa? Estou tranquila? Estou em paz? Estou con-tente? Estou serena? Estou emocionada? Estou deslumbrada perante tanta beleza? O Sr. Professor Pinto da Costa dizia, ainda, na sua intervenção “o mundo não é bem, bem, a preto e branco”... Portanto, podemos concluir: as minhas escolhas, normalmen-te, não são a preto e branco. Existem grandes escolhas na nossa vida que, pese embo-ra a sua grandiosidade, são de resposta directa: sim ou não. Sim, aceito esta proposta de casamento, ou não, não aceito. Sim aceito este emprego, ou não, não aceito. Mas... e nas outras escolhas, as do dia-a-dia? Qual é o critério de opcção, numas e noutras?Este será, talvez, o passo mais difícil. Dar-me conta do que posso fazer, do que devo fazer, do que quero fazer. E quando me pergunto “O que é que eu quero fazer?” de imediato sou confrontada com esta outra: “O que quero ser?”. A minha Mãe costumava contar que, quando eu tinha três/quatro anos e me perguntavam “O que queres ser quando fores grande?”, eu respondia “Quero ser uma Senhora!”. Por acaso tive a sorte de fazer a mesma pergunta a um menino que me respondeu “Quero ser um Homem!”

3ª CONFErêNCIA DA DEPENDêNCIA à EDUCAçãO PARA A AUTONOMIA

(e eu pensei cá para comigo: este é do meu clube). Quem é que eu quero ser? Quem eu quero ser não é coisa que se decida de uma vez, mas é algo que eu decido real-mente nas pequenas escolhas de cada dia, porque nada é neutro. Não é indiferente o facto de eu beber um copo de água ou o derramar em cima da mesa, ou, até mesmo, o deitar fora. As pequenas escolhas que faço, as pequenas escolhas de cada dia e não apenas as grandes decisões, são algo que, ou radica em mim, na minha capaci-dade de escolher e na minha autonomia, ou pelo contrário, me tornam numa bola de bilhar. E eu creio que, quando vemos girar no pano as bolas de bilhar, que não sabem para onde vão, cujo movimento é apenas o resultado de uma força exercida no taco, nem sempre fiel ao pensamento do jogador, nenhum de nós quer ser essa bola de bilhar. Bem pelo contrário, todos queremos ser, não o taco que a impulsiona, mas sim o jogador que ganha. E este jogador ganha, não por uma qualquer tacada de sorte, mas porque pensou a jogada, foi capaz de realizar o movimento preciso que o seu juízo gizou e a jogada deu certo. O mesmo é para ser levado em conta num processo de análise, cuidada, aturada e ponderada por cada opção que tenhamos que realizar. Em jeito de ironia, confesso-vos que treino muitas vezes, diante da montra de uma qualquer sapataria: “Ah, que sapatos tão bonitos! Que sapatos tão bonitos de que eu não preciso!” e, assim, posso seguir em frente, não fosse uma outra escolha tornar-me numa segunda edição de Imelda Marcos (que ficou conhecida pela sua famosa

“adição” por sapatos).Agora, para terminar (que o tempo já vai longo), gostaria de vos colocar perante uma situação de “livre arbítrio”. O que é que muda face a esta minha capacidade de esco-lher, esta minha auto-educação para a autonomia? Do lado de fora, qual a minha capacidade para alterar o mundo? Chego onde chega o meu braço: posso mudar algumas coisas, mas poucas – só as que estão ao alcance do meu braço. Poderei mudar alguma coisa nos outros? Talvez, embora seja duvidoso que o consiga de modo duradouro. Mas, do lado de dentro, não tenho limites e, por isso, a escolha razoável não é querer mudar à força, nem o mundo nem os outros. Só posso mudar a mim mesma e, mesmo assim, não à força, mas reconhecendo o que me deu a natureza e tudo quanto de bom (e mau), ao longo da minha vida, tenho vindo a fazer. Quando quero definir o que pode mudar a minha acção, quem eu quero ser, estará, se-guramente, na minha mente, uma tripla capacidade: a capacidade de avaliar os meus próprios limites, de reconhecer a minha finitude; a capacidade de tornar conscientes as minhas qualidades e a capacidade de correr riscos. Não posso, por isso, mudar ninguém à força. Posso mudar apenas a mim mesma, mas se eu chegar a, verdadei-ramente, fazer viver em mim e em plenitude as minhas potencialidades (a par do re-conhecimento dos meus limites e da assumpção consciente dos riscos), é impossível que quem esteja à minha volta não mude também, é impossível que o mundo não venha a ser um sítio melhor para se viver.

Muito obrigado.

3ª CONFErêNCIA DA DEPENDêNCIA à EDUCAçãO PARA A AUTONOMIA

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IIº CIClo DE CoNFERÊNCIAS

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

APRESENTAÇÃO DASCOMUNICAÇÕES

Olinda Simão Técnica Superior de Reeducação do EPR de Bragança (moderadora de debate – período da tarde)

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APRESENTAçãO DE COMUNICAçõES

No início do período da tarde, destinado a estas conferências, é, já, notória uma expressão de satisfação em todos os participantes. A explicação po-der-se-á encontrar na actualidade do tema, bem como na competência das intervenções (até ao momento produzidas). Julgo haver razões para todos nos felicitarmos: os promotores, os intervenientes e os participantes.

No final deste dia espero poder afirmar que todos saímos daqui mais ricos e mais dina-mizados, para darmos o nosso contributo no combate à exclusão e caminhar para um viver saudável. Com base nesta abordagem faço votos para que sintamos como nossa, a missão dos Serviços Prisionais, tendo, contudo, presente que esta acção se enquadra num movimento da responsabilidade da Organização Mundial de Saúde, cuja meta é alcançar a “Saúde para Todos”.Devo aqui referir que, este evento constitui uma competência transversal no percurso de aprendizagem dos nossos formandos. Teve como prioridade formar e informar a po-pulação residente, vencendo aquela que pode ser considerada a sua maior debilidade – a ausência do bem-estar. Como pude observar de perto, a sua preparação constituiu um momento de reflexão e de trabalho de equipa, seguramente gratificante para formandos, docentes, e restantes residentes que, de uma ou outra forma, se viram envolvidos no processo. A entrada de outros organismos e participantes, trouxe um pouco do «mundo de fora» para o enriquecimento dos que aqui vivem. Permitiu contactos, deu à comuni-dade residente, a oportunidade de ter voz, de interagir e de afirmar o acto de pertença dentro do seu próprio território. Estou certa que ficará hoje, mais uma vez sublinhada, a importância da educação amiga da Saúde, a começar na infância, sendo que, indubita-velmente, a formação ao longo da vida a deverá encarar como prioritária.Findo este verdadeiro exercício de cidadania, será que temos uma resposta melhorada para a pergunta: Afinal o que é a Saúde?A vida não é infinita. Há, todavia, pequenas coisas que nos proporcionam o sentimento de felicidade. Mas…, que outro objectivo para a vida senão a felicidade? E de onde ad-vém? Qual o motor principal da mudança? Será que se encontra em cada um de nós? Quais os espelhos que nos permitem olhar para nós como totalidade física e psicológica, identificar as nossas patologias, ter consciência sobre nós próprios?Diria, de forma muito sumária, que ter saúde é o apelo à nossa capacidade de interpre-tação da vida e dos acontecimentos. É saber ouvir, e sendo terapêutico para os outros, também, o é para nós. É saber escolher as amizades, estilos de vida, é tomar atitudes, é sonhar. E é, também, recriar a nossa auto-estima, transformar as derrotas em coragem, é…, enfim, procurar com criatividade – respostas. Saliento, por isso, que a Educação, amiga da Saúde, não está presente em gestos muito distantes ou que de uma complexidade, de tal modo extrema, nos afaste do seu verda-deiro cerne, mas tão claramente existe em «pequenas acções», tais como, por exemplo, preservar a natureza, reciclar o lixo, deixar um bilhete a quem se ama ou elogiar as pes-soas que raramente são dignas de elogios.Concluo a minha intervenção, com a recomendação de que “Saúde para Todos”, em boa parte se concretizará na mudança de atitudes e de comportamentos, na inclusão do indivíduo, mas, e sobretudo, na assumpção de um compromisso social de/para todos.Pela vossa presença e participação, o meu - o nosso Muito Obrigado!

4ª CONFERÊNCIAREClUSo oU INClUSo: QUAl DoS DoIS SoU EU?

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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Boa tarde a todas e a todos. É com imenso prazer que aqui estou hoje. Um dos motivos que me fez aceitar o convite para este encontro foi, precisa-mente, o de saber que o mesmo se desenrolaria dentro de um estabeleci-mento prisional. Convém salientar que, pela minha experiência nesta área, este evento é, provavelmente, coisa única no país. É muito difícil reunir as

pessoas desta maneira e sobretudo reunir, também, aqueles que vivem cá, ainda que temporariamente, e por isso faço votos para que a conversa, que aqui vamos ter, atinja estes dois grandes grupos, ou seja, pessoas que, no fundo, estão em liberdade e a própria população recluída.Para começar, devo referir que iniciei a minha vida profissional nos serviços prisionais, já lá vão mais de 20 anos. Portanto, é sempre com prazer que regresso às prisões, sobretudo se já não estou cá a trabalhar, sabendo muito bem o quanto custa desem-penhar as funções de Técnico, de Director-Adjunto, ou até mesmo de Director e as responsabilidades que das mesmas advêm. No entanto, o tema de hoje tem mais a ver com os reclusos e, não tanto, com os profissionais que cá trabalham.Actualmente quando olhamos para o mundo prisional e para quem, no fundo, trabalha nas prisões, o que precisamos de compreender é o impacto que este tem nas suas vidas, nomeadamente dos problemas que se estendem desde o abuso de drogas ao desemprego, problemas físicos e mentais, envelhecimento da população prisional (que por si só, não é uma doença, mas que causa dificuldades de vária ordem), para além do impacto nas famílias, o facto de os reclusos serem detentores de baixa es-colaridade, a existência de cerca de 20% de presos estrangeiros nas prisões portu-guesas, as minorias étnicas, a pobreza (a maior parte da população prisional detém poucos recursos económicos, alguns são, até mesmo, sem abrigo) e o problema que se coloca depois, ou seja, o que estas pessoas irão fazer quando saírem daqui.Por conseguinte, uma questão se nos coloca: O que é que podemos considerar como boas e más notícias nas prisões portuguesas, na actualidade?Uma das boas notícias é que a sobrelotação tem vindo a diminuir, praticamente em todas as cadeias nacionais. Poderá, no entanto, haver um ou outro estabelecimento que apresente, ainda, algum excesso de população (julgo não ser o problema aqui do EPR de Bragança), uma vez que este tem sido, ao longo dos tempos, um dos principais pro-blemas dos serviços prisionais portugueses (e não só, tal como veremos mais adiante).Regra geral, tem-se registado uma melhoria das condições de vida dentro das pri-sões. A título de exemplo, posso citar a extinção do “balde higiénico”, bem como melhoras registadas em termos de habitabilidade das celas, fruto do investimento re-alizado nos estabelecimentos prisionais, designadamente após alguns relatórios efec-tuados pela provedoria da justiça, nos quais foram retratadas as pobres condições com que o sistema prisional se debatia. Devo-vos, por isso, referir que, foi muito bom que se tivesse procedido à elaboração e posterior publicitação do retrato das prisões em Portugal, uma vez que tal permitiu chamar a atenção dos actores institucionais para a resolução de todas estas situações. Foi, por isso, uma forma de dar a conhecer

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Rui Abrunhosa Gonçalves Professor Associado com Agregação da Universidade do Minho

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aquilo que algumas pessoas sabiam, que alguns tinham coragem de ir dizendo (outros nem tanto) e que uma entidade externa através da publicitação do seu relatório, “obri-gou” o ministro da justiça, de então, a alterar este estado de coisas, nomeadamente partindo para a execução de, entre outras, obras de restauro, melhores condições de habitabilidade, de aquecimento, colocação de sanitários nas celas, etc.Por outro lado, o bom clima prisional, que é mais um exemplo de ‘boas notícias’ é o facto de não existirem elevados níveis de agressividade, entre reclusos e, sobretudo, entre estes e os guardas, visto serem estes (guardas) quem desenvolve um contacto mais directo com os reclusos. Denota-se, por isso, que o número de agressões, ou de problemas graves registados entre presos e guardas, no nosso sistema prisional, em termos gerais, tem sido relativamente baixo. No que concernem as ‘coisas menos boas’, devo referir que, não obstante terem existido várias intervenções por parte da tutela no sentido de se melhorarem as con-dições de reclusão destes indivíduos, existe, de facto, muito pouca avaliação sobre os efeitos das mesmas, bem como de posteriores medidas, entretanto implementa-das. Quero com isto dizer que, para além das intervenções que citei, se fazem muitas mais coisas dentro das prisões, mas que, de uma forma geral, o público não sabe se o seu resultado na vida dos reclusos tem ou não sido positivo, i.e., não tem existido uma cultura vincada (salvo algumas situações pontuais) em termos da avaliação de processos e de produtos dentro do espaço prisional. Desconhecem-se, assim, os impactos de tais intervenções, nomeadamente em termos do seu objectivo primacial que é a reintegração destes indivíduos na sociedade quando, por exemplo, se descura o facto de se proceder a algum tipo de avaliação da formação escolar/profissional por si recebida dentro do espaço prisional e qual a influência na sua (não) reincidência criminal. Por conseguinte, uma vez mais aqui lanço um alerta a quem de direito, para o facto de não existirem estudos concretos que nos permitam aquilatar da relação custo/benefício de tais intervenções, no âmbito dos serviços prisionais. No que respeita os níveis de sobrelotação de cadeias na Europa, poder-se-á referir como bom exemplo, o caso da Islândia, devido à quase inexistência de sobrelotação dos seus espaços. Em relação ao nosso país, Portugal faz parte dos países incor-porados no grupo dos “100/149”, um bocadinho acima dos 100% (dados referentes a 2008), mas com alguma diferenciação à medida que nos vamos dirigindo no sen-tido da Europa de Leste. Aqui sim, as coisas são francamente piores. Por exemplo, a Federação Russa apresenta uma taxa de 500% de sobrelotação. Quer isto dizer que uma prisão, que supostamente deveria albergar 100 reclusos, tem 500 lá dentro. Isto só para terem uma ideia do que é viver como recluso, ou trabalhar como técnico, ou até mesmo como professor numa situação destas. Portanto não admira que, às vezes, quando em Portugal assistimos a reclusos oriundos destes países, para estes, apesar de tudo, as condições das prisões portuguesas são imensamente melhores que as dos seus países de origem. Posso, ainda, referir-vos outro exemplo, aqui bem mais perto, que são os casos de Espanha e de Inglaterra. Neste momento, em termos de

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sobrelotação, ambos países apresentam uma taxa a rondar os 200%, ou seja, o dobro do valor máximo aceite pelas normas internacionais, não obstante os seus níveis de desenvolvimento, sobretudo a nível económico, bem superiores aos nossos.Um outro dado, que já aqui vos referi, tem a ver com a percentagem de reclusos es-trangeiros em Portugal. Como sabem, este número tem vindo, consistentemente, a aumentar, situando-se, segundo dados relativos a Dezembro de 2008, nos 20%. Des-tes ‘estrangeiros’ a sua grande maioria são oriundos de países africanos de língua oficial portuguesa (PAlOP), concentrando-se a sua população, sobretudo, na zona da grande Lisboa. De qualquer forma, 20% é já um número bastante considerável e que nos serve para chamar a atenção de que esta questão terá de ser abordada com algum cuidado, visto que, se tivermos em conta que a actual população prisional ultrapassa os 10.000 presos, 20% da mesma corresponderá a 2000 (reclusos es-trangeiros), algo que é já bastante significativo e que poderá colocar as instituições prisionais perante outro tipo de obstáculos a enfrentar, designadamente culturais, sociais, políticos, religiosos, etc.Por outro lado, desde 2007 que Portugal tem um novo Código Penal. Na sua filosofia este documento remete-nos para, na medida do possível, «evitar que as pessoas sejam presas». Portanto não serão só os juízes a terem maiores dificuldades em decretar sentenças de prisão (visto terem de responder a um conjunto de requisitos muito específicos), como ainda por cima diminuíram os tempos para a prisão pre-ventiva em função da necessidade do Ministério Público acelerar a resolução dos processos que tem em mãos. Concomitantemente, surge em Portugal (a partir de 2002), algo que se tem vindo a expandir ao longo destes últimos anos, principalmen-te a partir de 2006. Tendo-se iniciado em Lisboa, depois passado para o Porto e que rapidamente se estendeu a todo o país. Refiro-me, concretamente, à utilização de meios de controlo alternativos, como por exemplo, medidas de vigilância electrónica (pulseira electrónica), que se tem feito repercutir, sobretudo em reclusos em regime preventivo. Tal medida significa, menos presos, o que em teoria se traduzirá em me-nos trabalho para os Serviços Prisionais, mas que, por outro lado, acarretará maiores afazeres para o antigo Instituto de Reinserção Social.Gostaria, agora, de reforçar um outro tema na minha intervenção. Há pouco, referi que um dos grandes problemas dos reclusos era precisamente o seu baixo índice de escolaridade. Existe uma percentagem muito grande de pessoas que praticamente só sabem assinar o seu nome. Este grupo rondará actualmente os 10% (homens). Nas mulheres o panorama é bem mais preocupante, sendo que nestas a taxa de analfabetismo rondará os 20% (10 pontos percentuais a mais que os homens). Por conseguinte, se existem problemas de escolaridade nos presos em geral, esses problemas são ainda mais vincados nas mulheres, sendo, por isso, fundamental um maior investimento destinado a esta área e a esta população. Para concluir este pon-to, em Portugal os mais recentes números de reclusão entre as mulheres cifram-se nos 800, sendo que destas uma grande percentagem é, de igual modo, estrangeira.

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Irei, agora, partir para um exemplo que nos servirá para uma melhor percepção do que aqui tem sido referido. Para este, apresentar-vos-ei um casal, no qual a mulher aparenta os seus 52 anos, o marido mais ou menos a mesma idade, sendo que se en-contram ambos presos. Somente dois indivíduos, os filhos deste casal, se encontram em liberdade, curiosamente um dos que está em liberdade é o filho mais velho. Este terá sido o que, claramente, mais factores protectivos conseguiu, i.e., «conseguiu escapar» ao impacto dos problemas. Existem, ainda, dois filhos mais novos, respec-tivamente de 9 e 8 anos, que já estão institucionalizados, e, ainda, dois netos de 4 e 5 anos (entregues a instituições de acolhimento de crianças), filhos da filha mais nova (25 anos), do casal que apresentei inicialmente, a qual se encontra também presa. Ao olharmos para este cenário rapidamente nos apercebemos que existe uma enorme probabilidade dos índices de criminalidade nesta família e dos problemas com a jus-tiça, longe de terminarem, se continuarem a reproduzir, isto porque, efectivamente, não é muito usual assistir-se a um filme do género, em que pessoas desfasadas dos seus lares vivam em instituições, longe de um contexto familiar «tradicional». Deste modo, e tal como é possível verificar, esta família encarna na perfeição um grupo desajustado da realidade, visto que não só os elementos mais velhos começaram por ter problemas com a Justiça, tal como (in)directamente contribuíram para que os seus filhos, quase sem excepção, tivessem tido, também, problemas com a mesma, sendo que tal conduta, infelizmente, se encontra já a “transferir-se” para a terceira geração desta família, os netos. Reparem que temos aqui homens e mulheres, muito jovens, gente com muito potencial, mas que já passou pela prisão, sendo por isso, essencial evitar que estes lá regressem, bem como acautelar que miúdos de 9 e 8 anos saiam das instituições para irem para a prisão e muito menos que crianças com 4 ou 5 anos venham, algum dia, a ter essa experiência. Existem, infelizmente, muitos casos de famílias como esta, e quem trabalha nas prisões sabe que isto é uma re-alidade, sendo, por isso, fundamental interromper este ciclo vicioso de reprodução de delinquência.Algo que será basilar para combater este estado de coisas será a acção dos Técni-cos de Reeducação nas prisões. Ora se não se investe nestes profissionais, dificil-mente se conseguirá combater alguns dos problemas que acabei de referir. Curiosa-mente soube que, há alguns dias atrás, abriu um concurso para, cerca de, 40 novos Técnicos, sobretudo com formação na área da Psicologia. Devo dizer-vos que, desde 1986, não se verificava qualquer procedimento concursal com esta dimensão. E digo-vos isto, com a sensação de satisfação de que ainda bem que se reflectiu sobre esta necessidade, porque é evidente que havendo mais técnicos em meio prisional, tal se repercutirá na conduta dos reclusos. Simultaneamente, tal medida servirá de enorme auxílio para os guardas que se vêm livres de todo um conjunto de situações (que, no fundo, sobram para eles) e que, para as quais, não possuem formação adequada.Por outro lado, devo-vos afirmar que com os reclusos a sinceridade deverá sempre ser a palavra de ordem. Confidencio-vos que, no âmbito das funções que desempe-

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nhei, sempre fui sincero para com eles, nunca lhes prometi algo que não pudesse cumprir, como por exemplo, uma saída precária, inserção em brigadas de trabalho, etc.. Era sincero com os reclusos e, recuperando a frase de um filme, em que o pre-so diz ao guarda “Nunca aldrabes um aldrabão”, julgo que, na nossa posição, nunca deveremos tentar aldrabar, indivíduos que são muito melhor que nós nesse ofício.Assim, uma das coisas que será fundamental para a mudança é, o facto de nós, efectivamente, a assumirmos como tal. A maior parte das pessoas que estão pre-sas, estão-no, porque, de facto, não querem mudar, escudando-se na ideia de que tal é muito difícil «porque a sociedade é má; porque a polícia está sempre contra mim; porque a maldita droga não me larga». A verdade é que a mudança pode ser conseguida de dentro para fora, mas também de fora para dentro. O essencial é que, em primeiro lugar, os estabelecimentos prisionais ofereçam condições para a sua efectivação, i.e., se não temos qualquer programa do tipo ‘ala livre de drogas’ ou ‘programa da metadona’, é evidente que tal nos causará sérias dificuldades na recuperação de toxicodependentes. Do mesmo modo, se tal for proporcionado aos reclusos, também, não podemos, simplesmente, estar à espera que estes por vonta-de própria os frequentem, ou seja, teremos de ser nós a “forçá-los” a entrar nestes programas e, se o fizermos, podemos ter a certeza que ao fim de algum tempo a sua motivação aparecerá. Temos, por isso, a maior parte das vezes, de os “empurrar”, de impor essa ajuda para que depois ao fim de algum tempo de inserção no programa, eles nos digam: “Olhe ainda bem que cá estou, de facto tenho vindo a descobrir um conjunto de coisas que me estão a ajudar a vencer”.O que faz parte da personalidade de muitas das pessoas que têm problemas com a Justiça, precisamente aquilo que nós apelidamos de uma certa «preguiça cognitiva», é o de assumirem o seguinte posicionamento: “Eh pá, isso dá muito trabalho, deixe pra lá, isso é pra outros, não é pra mim”, ou seja, muitos dos problemas dos reclusos têm, efectivamente, a ver com a sua forma de estar e de ser, com a ideia de que existem pessoas que nasceram com mais e outras que nasceram com menos sorte. Contudo, tal não vos deverá servir de desculpa. O que terão de fazer é de pegar nesse elemento e transformá-lo em algo positivo, visto todos terem uma quota-parte de responsabilidade naquilo que é o vosso presente e no que poderá ser o vosso futuro, não devendo, por isso, estarem, constantemente, a refugiar-se no passado, queixando-se: “Eu sempre fui assim e portanto não tenho outra hipótese. Vou conti-nuar a viver assim e assim irei morrer.” Acredito, por isso, na motivação das pessoas, mas acho que muitas das vezes, não se pode, simplesmente, estar à espera que a sua motivação surja de forma espontânea, temos que «forçar essa motivação» e tentar envolver, directamente, as pessoas nas situações. Por exemplo, as condições físicas de um estabelecimento prisional, limitam em muito aquilo que lá se pode fa-zer, isso é óbvio, agora se tal servisse de desculpa à organização deste evento, não estaríamos aqui, hoje, reunidos a debater todos estes problemas. Portanto, como devem calcular, terão de assumir uma atitude pró-activa, em vez de estarem à espera

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do «não sei quê», ou que: “isto se há-de resolver”, ou então “alguém há-de resolver isto por nós”. Nada mais errado e todos sabemos disso.Para terminar, e porque estamos em Bragança, houve um senhor natural aqui desta terra, de seu nome, Ferreira Deusdado, que há muitos anos escreveu um livro (1891), editado em Francês, a saber: Ensaios de Psicologia Criminal, do qual retiro a seguinte frase: “A existência do crime não deve fazer-nos pessimistas, a vida não é em si, nem um bem nem um mal, mas apenas o lugar, em que o homem pratica o bem ou o mal. Melhoremos as condições desse lugar e o mal enfraquecer-se-á, progressivamente.”Portanto, a minha palavra e o meu apelo final, é que um encontro como este sir-va precisamente para melhorar as condições deste Estabelecimento Prisional, mas também de toda a envolvente, i.e., a cidade e esta magnífica região, extensível às pessoas que aqui vivem, bem como às pessoas que vivem lá fora, para que todos juntos possamos fazer a diferença, na dignidade e no respeito que esta instituição e esta população nos merece.

Muito obrigado pela vossa atenção.

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5ª CONFERÊNCIAPoRQUÊ EDUCAR PARA A SAÚDE?

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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Boa tarde a todos. Gostaria de começar por apresentar cumprimentos em nome do Dr. José Ricardo Nunes (Subdirector-Geral da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais) e de igual modo, agradecer o convite que me foi dirigido. Quero também agradecer à organização que conseguiu juntar num lugar como este diferentes intervenientes e diferentes olhares sobre

o espaço prisional. Há muitos anos que trabalho nas prisões e devo dizer-vos que é a primeira vez que apresento uma comunicação dirigida a uma assembleia constituída na sua maioria por reclusos e, por isso, a minha enorme satisfação de fazer parte de tão particular iniciativa.Irei de seguida, apresentar-vos alguns dados estatísticos, que penso serem impor-tantes quando abordamos a temática da educação para a saúde nas prisões e para que realmente se perceba, que género de pessoas é que chegam diariamente aos nossos Estabelecimentos Prisionais. Segundo dados recolhidos, pelos serviços, em 31 de Dezembro de 2008, as prisões nacionais contavam com 10.807 reclusos, que é de certa forma o número actual, distribuídos por 50 estabelecimentos prisionais, a saber: 4 especiais, sendo eles, 2 de mulheres 1 de jovens e 1 hospital prisional, este último em Caxias (de onde provenho), 17 estabelecimentos prisionais centrais e 29 regionais. Em relação à distribuição por sexo, e apesar de ter já sido referido pelos meus colegas conferencistas, quer da parte da manhã, quer ainda há pouco, regista-se nas prisões nacionais, apenas, 6% de população feminina (quase que me atrevo a dizer que as mulheres são muito menos criminosas). No que diz respeito à sua situação penal regista-se, actualmente, um valor de apro-ximadamente 20% de preventivos e 80% de condenados. Em relação à duração das penas, verifica-se nos últimos tempos, uma ligeira alteração, ou seja: as condenações entre os 3 e os 6 anos aumentaram para sentenças entre os 6 e os 9 anos. A este re-gisto não é alheio o tipo de crimes que são presentemente cometidos. Neste momento aproximadamente 29% dos crimes são contra o património e 27% contra as pessoas, sendo por isso fácil de perceber que os crimes contra as pessoas têm vindo a aumen-tar em Portugal, aparecendo em terceiro lugar, os crimes relativos a estupefacientes, os quais se encontram, essencialmente ligados ao tráfico. Gostava por isso de parti-lhar convosco, uma preocupação minha, advinda do exercício da profissão e que pen-so deverá ser também, uma preocupação do sistema prisional e que se prende com o facto de crimes graves estarem a ser cometidos por um tipo de população cada vez mais jovem, i.e., indivíduos situados entre os 16 e os 25 anos, tal como o comprovam os dados de que dispomos. Cerca de 25% dos reclusos nesta idade, estão, actualmente, condenados por crimes de homicídio. No geral, a população prisional caracteriza-se pela sua juventude, rondando a média de idade os 36 anos. Devo, contudo, referir que reclusos com idade superior a 60 anos têm vindo a aumentar, o que não será de estranhar, dadas as condições económicas que o país enfrenta afectarem, também, esta franja da população.Em relação aos estrangeiros, registam-se à volta de 20% de reclusos, o que, de igual

5ª CONFErêNCIA PORQUê EDUCAR PARA A SAúDE?

Maria João Eliseu Enf.ª Directora do Hospital Prisional S. João de Deus

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modo, requer do sistema prisional alguma “ginástica”, nomeadamente em termos lin-guísticos, de hábitos culturais, alimentares, religiosos, etc.No que concerne a escolaridade, estamos em crer que os dados não são nada ani-madores, tal como se pode aferir pela seguinte distribuição: 10% de população é anal-fabeta, 34% detém, como habilitações literárias, o 1º Ciclo do Ensino Básico, 23% o 2º Ciclo e 20% o 3º Ciclo, o que significa que neste momento, mais de metade da popu-lação prisional portuguesa não detém, sequer, a escolaridade mínima obrigatória.Em relação à Saúde, e é nesse papel que me encontro aqui hoje, os dados são igual-mente pouco animadores, ou seja: praticamente 1/4 da população prisional encon-tra-se infectada com HIV, Hepatites (sobretudo Hepatite C) e Tuberculose. Verifica-se também nos EPs, uma taxa de cerca de 40% de consumidores de droga, não só de heroína e cocaína, mas também de “pastilhas”, sendo que ultimamente se tem regis-tado, sobretudo na população mais jovem, grandes hábitos de policonsumo. Chamo ainda a vossa atenção para o facto de nestes 40% não estar incluído o consumo de álcool, em grande parte por não se registar até ao momento, muita investigação nesta matéria, nas prisões portuguesas. Penso que seria importante aferir destes consumos, e também aqui, no norte do país. No que diz respeito à Saúde Mental, os dados nesta área, também, não são lá muito animadores, senão vejamos: há cerca de 1 ano fiz um estudo que compreendia um cohorte de reclusos de dois estabelecimentos prisionais. Um deles continha num determinado dia, 473 reclusos com uma média de idades de 28 anos, sendo que neste mesmo dia, 23% (e reparem que estamos a falar de gente muito jovem) fazia medi-cação anti-psicótica e anti-depressiva. Por comparação no mesmo dia, num outro es-tabelecimento com 491 reclusos, cuja média de idades rondava os 32 anos, quase 80% faziam medicação anti-psicótica, anti-depressiva e benzodiazepinas. Existe um pouco a ideia, espalhada pelos diversos actores prisionais, i.e., directores dos estabelecimentos prisionais, guardas e reclusos também, relativamente ao pessoal de Saúde, que este “dá muitos remédios aos reclusos”. Sendo em parte uma realidade, também não deixa de ser menos verdade que se “damos remédios” não é pelo simples prazer de “pôr as pessoas a dormir ou a babarem-se”, como normalmente se afirma. Em termos genéricos, esta é de certa forma a caricatura do que é o sistema prisional. O problema é que este não foi concebido para «cuidar da saúde das pessoas», mas sim para as conter (res)guardando-as e, simultaneamente, preparando-as para a rein-serção na comunidade. Contudo, a realidade é bem diferente.De facto, as pessoas chegam-nos muito doentes e é importante que as prisões se abram também para a Saúde. É neste sentido que para nós, pessoal da Saúde, os reclusos são considerados como doentes (quando o estão efectivamente), apesar de, para o sistema prisional, serem simplesmente, reclusos. Contudo, é certo que os “tem-pos de reclusão e os tempos da prisão” não são exactamente compatíveis com os

“tempos da Saúde”, tornando-se por vezes estas duas “realidades temporais” difíceis de conciliar. De qualquer forma, e honra lhe seja feita, o sistema prisional português

5ª CONFErêNCIA PORQUê EDUCAR PARA A SAúDE?

tem feito um enorme esforço, no sentido de acompanhar toda esta mudança dos tempos, faço aqui só um parêntesis, para vos dizer que para além daquele concurso que está neste momento aberto para cerca de 40 Psicólogos, a DGSP abriu, ainda, um outro (concurso) internacional para a área da Saúde, sendo que a partir do dia 1 de Julho (2009) todas as cadeias do país, irão ter cuidados prestados, não por pessoal do quadro da DGSP (por não existirem, nos quadros da Direcção-Geral, em quantida-de suficiente para acudir às 50 prisões do território nacional), mas por empresas do sector, a serem prestados dentro dos próprios estabelecimentos prisionais. Gostava no entanto de vos dizer que independentemente do concurso, de há uns anos a esta parte tem-se feito um enorme esforço para dotar, sobretudo os grandes estabeleci-mentos prisionais de Psiquiatras, Infecciologistas, Psicólogos, Enfermeiros, Estomato-logistas, etc. sendo que, neste último exemplo, a saúde oral é francamente melhor hoje, dentro das prisões, do que fora delas.Gostaria ainda de referir, que em relação a esta problemática, não basta simplesmente tratar as pessoas que nos chegam doentes (algo que o sistema prisional tem feito e com grande esforço nos últimos tempos), é sim necessário apostar na prevenção e, por conseguinte, na ‘Educação para a Saúde’. É evidente que este é um trabalho que irá ainda demorar o seu tempo e que não se traduzirá, no imediato, em “bons números” e “boas estatísticas”, apesar de estar convencida que é este o caminho a seguir.Por outro lado, não comungo da opinião que se desenvolvam em todas as 50 prisões os mesmos programas de ‘Educação para a Saúde’, visto que, do meu ponto de vis-ta, seria importante dirigi-los de acordo com a população que “temos pela frente”. Contextualizando, será importante que, quer o sistema prisional, quer outro tipo de instituições, que trabalhem dentro das prisões, sejam elas ONGs ou outros serviços da comunidade, tenham em conta o tipo de população com que lidam e o tipo de conteú-dos, como por exemplo (e nas prisões tudo isto é pertinente), a alimentação, o exercício físico, a higiene pessoal, o tabagismo, o alcoolismo, a vacinação, a saúde oral, a partilha de material infectado, quer pela prática de injecção, quer de tatuagens e piercings, o consumo de substâncias psico-activas, etc.A dificuldade de adesão à terapêutica, é um dos obstáculos mais importantes a vencer sendo, para tal, necessário “convencer” as pessoas de que estão doentes, provenham elas da área da saúde mental ou da área da infecciologia.Um outro aspecto que me parece importante aqui referir é a metodologia a aplicar. De acordo com os procedimentos que se desenvolvem nas prisões é, em minha opinião, fundamental proceder e potenciar a formação de pares dentro dos Estabelecimentos Prisionais. Quero eu dizer com isto, que é mais fácil ser um recluso a falar com os seus companheiros do que qualquer profissional da Saúde «do lado de cá das grades» a di-zer: “Meus meninos, isto não se pode injectar assim, têm que trocar as seringas, têm que utilizar os preservativos desta maneira, etc.”, acho que se obteriam melhores resultados se se conseguissem ganhar dois ou três reclusos, para esta causa, de forma a serem eles os divulgadores destas mensagens.

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Finalmente, uma outra questão que me parece, sobremaneira, relevante é a monitoriza-ção e a avaliação de todos estes programas. Penso que não basta desenhar projectos e divulgar modos de intervenção anunciando aos quatro ventos que “todas as prisões têm bons serviços de saúde, bem como bons programas de Educação para a Saúde”, se, porventura, estes não forem objecto de uma avaliação rigorosa, que se traduza na melhoria de cuidados, designadamente a nível da prevenção e, também, do tratamento. A título de curiosidade, refiro que embora existam, actualmente, nas nossas prisões, mais de dez mil reclusos, passaram pelas mesmas, durante o ano passado (e alguns ainda cá se encontram) vinte e um mil, ou seja, praticamente o dobro.Julgo assim, ser indispensável aproveitar o tempo de reclusão e aceitar o desafio de devolver à sociedade, homens e mulheres mais esclarecidos, mais informados e, por isso mesmo, mais responsáveis e saudáveis.É, por conseguinte, necessário que todos tenhamos consciência, de que as prisões ape-sar de instituições fechadas, não são instituições seladas e que tudo o que acontece cá dentro, mais tarde ou mais cedo, terá repercussões na sociedade. São encontros como este, que hoje aqui têm lugar, que poderão conduzir o barco da Saúde a bom porto.

Muito obrigado.

5ª CONFErêNCIA PORQUê EDUCAR PARA A SAúDE?

6ª CONFERÊNCIAHIV - RETAlHoS DE UMA VIDA

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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Olá, muito boa tarde a todos. Sou José Bártolo, tenho 33 anos, nasci em Espanha nas redondezas de León. Aí cresci e frequentei a escola até aos 14 anos. Tinha uma família humilde que vivia simplesmente do tra-balho árduo de um mineiro emigrante.Aos 9 anos comecei a fumar os meus primeiros cigarros e como vivia

num bairro problemático, por influência do grupo tive logo acesso à primeira droga – Tinha onze anos quando experimentei haxixe. Aos catorze anos com a aposentação de meu pai vim para Portugal. Aos 20 anos relacionei-me com outros jovens e foi a partir deste período que iniciei o consumo de drogas pesadas.Por esta altura estava, já, infectado com HIV. Tive a notícia no CAT de Bragança... Esta-va acompanhado de meus Pais... Foi um dia muito, muito mau. Os meus pais ficaram ainda mais perturbados do que eu. Já tinha ouvido falar do HIV, estava informado, sabia como se transmitia, mas nunca tinha pensado em me proteger, porque as con-dições em que me encontrava não me ajudavam. Pus-me a imaginar de onde poderia ter vindo este contágio. Tinha tido um relacionamento com uma amiga. Só poderia vir daí, porque nessa época ainda não me injectava. Os meus pais sempre preocupados já tinham essa suspeita. Vi a minha amiga dois meses mais tarde, mas não falei sobre isso. Não a culpo de nada. Eu tinha conhecimento do que devia fazer, mas como anda-va muito “enterrado” não quis saber.A minha vida desmoronou-se e caí bem fundo, porque reagi negativamente e o trata-mento que me propuseram não se realizou, pelo contrário, abandonei tudo inclusiva-mente a família, para passar a viver uma vida intensa no mundo da droga.Passado um ano como bons pais e irmãos que tinha, pensaram em fazer a minha recuperação e colocaram-me numa clínica chamada Projecto Homem em Ponferra-da – Espanha. O tratamento era gratuito e lá permaneci durante cinco meses, com visitas regulares da família. Tive muita ajuda nesta clínica onde a terapia passava por uma medicação adequada e articulada com várias tarefas diárias, desde fazer a cama, jardinagem, limpeza, reuniões sistemáticas para avaliar aquilo que fazíamos bem ou mal, muito rigor e normas de conduta precisas e rigorosas. Era fundamental ocupar as várias horas do dia com tarefas diversificadas e úteis.Após cinco meses de permanência nesta clínica fugi com uma jovem, porque a minha relação com ela ou com outras não era permitida dentro da clínica. Durante cerca de oito meses permaneci em Espanha de uma forma bastante marginal. Mais tarde cansado da vida, e como o bom filho à casa retorna, regressei a Portugal a casa de meus pais. Reto-mei o tratamento no CAT de Bragança. A minha mãe tentava controlar os meus passos e deslocava-se ela própria ao Centro de Saúde de Macedo de Cavaleiros para me trazer com ela as doses de metadona destinadas ao consumo semanal.A minha vida não tinha grande sentido nem objectivos futuros, conseguia extorquir a me-tadona à minha mãe e, por vezes, tomava-a sem controlo, para conseguir um bem-estar fí-sico e psíquico. Não sei como aguentava tanto o meu corpo, visto que, a par disto, não me alimentava de forma adequada. O consumo excessivo e os delitos que cometi trouxeram-

6ª CONFErêNCIA HIV – RETAlHOS DE uMA VIDA

José Bártolo Formando do Curso EFA-B3 do EPR de Bragança

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me para aqui, onde cheguei extremamente debilitado tanto a nível físico como mental.Devido ao cumprimento de normas, refeições a horas, convívio com os colegas de reclu-são, e a ocupação diária através da frequência no Curso EFA-B3, tenho sentido algumas melhorias. Posso dizer com alguma firmeza que apesar de ser seropositivo não tenho sentido discriminação por parte das pessoas que lidam no quotidiano comigo, desig-nadamente funcionários, colegas e professores. Na minha vida pessoal em liberdade, a família, os amigos e todos aqueles com quem me relacionava nunca me trataram de forma desigual. Devo sublinhar a forma como reagiu o meu patrão, carpinteiro de restauros, que além de me ter recebido sempre no trabalho, quando soube que estava infectado me apoiou e me continuou a dar trabalho.Frequento o CRI (ex-CAT) de Bragança há doze anos. Actualmente tenho consultas quinzenais com uma médica do CRI e de dois em dois meses com uma médica Infecciologista que se desloca do Hospital Joaquim Urbano (Porto). Falo também deste assunto com a minha educa-dora – Técnica de Educação deste Estabelecimento. Sinto-me, também, à-vontade para falar disto com a minha família e com alguns companheiros.Com isto quero apenas deixar o meu testemunho de alerta, para que sejamos cuidadosos na prevenção. Da minha parte tudo farei para ser um homem responsável e consciente das mi-nhas limitações, espero ter compreensão e apoio para continuar a ser feliz à minha maneira.Foi um privilégio poder partilhar convosco este retalho da minha vida. Vou em frente na procura do meu caminho, da minha identidade e de novas esperanças. O HIV e os consumos condicionaram a minha vida. Uma pessoa inteligente não precisa de errar para aprender, bastam-lhe os erros dos outros. Afinal todos temos a nossa história e… todos vivemos até ao último dia.

Obrigado.

6ª CONFErêNCIA HIV – RETAlHOS DE uMA VIDA

7ª CONFERÊNCIADoENÇAS INFECTo-CoNTAGIoSASPRINCIPAIS CUIDADoS A TER

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

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Gostaria de começar a minha intervenção, agradecendo o convite da or-ganização para estar aqui presente. Irei falar-vos um pouco sobre doen-ças infecciosas, essencialmente Hepatites (B e C) e SIDA. Como sabem estas doenças são, actualmente, consideradas um problema de Saúde Pública. A nível mundial, o número de casos tem vindo a aumentar, prin-

cipalmente à custa de alguns continentes onde as condições de saúde, são muito pre-cárias e a grande maioria da população vive em condições miseráveis. A prevenção é uma área em que muito ainda, terá de ser investido, de forma a se tentar ultrapassar o problema. Queria por isso dizer-vos que, apesar do aumento do número de casos de infectados, tanto pelo VIH/SIDA, como pelo vírus da Hepatite B e C, ser uma realidade cada vez mais evidente no nosso planeta, será necessário da nossa parte, profissionais de saúde, uma palavra de esperança, porque nesta altura, e nomeadamente em relação ao VIH/SIDA, a terapêutica farmacológica evoluiu muito nos últimos anos. Hoje em dia o diagnóstico é mais precoce, existem mais e melhores tratamentos, as escolhas farma-cológicas são mais diversificadas, os efeitos adversos dos medicamentos diminuíram muito em relação ao passado, a posologia é mais simples evitando a toma de múltiplos comprimidos no mesmo horário, o que veio facilitar a adesão à terapêutica com a con-sequente melhoria na qualidade de vida e, também, de sobrevivência.No entanto, «nem tudo são rosas» e, por isso, irei partilhar convosco uma história bem curiosa. Ainda há bem pouco tempo, nos Estados Unidos, assistia-se a uma situação um pouco caricata e isto porque as pessoas julgavam que se a SIDA, não tinha cura, andava muito perto disso, ou seja, apesar de a considerarem como uma doença cróni-ca, também, julgavam o seguinte: “Bom…, isto afinal até tem tratamento, nós podemos ter uma vida praticamente normal e, portanto, não precisamos de ter tantos cuidados.” É óbvio que este é um exemplo do que não deve ser feito e, como tal, não deve ser tomado em conta. A prevenção continua a ser fundamental, deixando depois a outra parte, «a parte da esperança», entregue nas mãos dos profissionais de saúde.No que concernem as Hepatites, o mesmo se poderá dizer. Em relação à Hepatite B, a palavra de ordem é a vacinação, sendo que tal procedimento oferece uma protecção na ordem dos 97%. De igual modo devo mencionar que, também, existe tratamento para os infectados. Embora a terapêutica não tenha, em alguns casos, resultados completamente satisfatórios, as recidivas acontecem com alguma frequência, devendo-se, tudo isto, às características muito próprias deste vírus e do modo como infecta as células humanas.Em relação à Hepatite C, tem-se, de igual modo, registado um aumento do número de ca-sos, apesar de, actualmente, existirem terapêuticas convincentes, as quais, na sua grande maioria, têm dado respostas bastante satisfatórias. Em relação a esta patologia, convém referir que o tratamento é feito com tempos e doses determinadas, possibilitando-nos a nós, profissionais de saúde, uma melhor abordagem, nomeadamente em termos da sua planificação. Assim, e apesar dos efeitos adversos, que são muito variáveis de doente para doente, já se consegue que muitos deles fiquem com “carga indetectável” e que a mantenham durante largos anos, sendo hoje aceitável que um indivíduo infectado, mas com carga indetectável durante cinco anos, se possa considerar de “curado”, pese em-

7ª CONFErêNCIA DOENçAS INFECTO-CONTAGIOSAS: PRINCIPAIS CuIDADOS A TER

Eugénia Madureira Especialista de Medicina Interna: Consulta de Doenças Infecciosas do Centro Hospitalar do Nordeste

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bora algumas reservas. E isto porquê? – Porque, apesar dos tratamentos efectuados no combate à doença, o vírus não é, totalmente, eliminado, podendo permanecer dentro do organismo (embora em número reduzido) levando a que complicações tar-dias, que poderiam eventualmente aparecer com o passar dos anos, tenham menos hipóteses de se concretizar. Deste modo, deve-se considerar o panorama actual, em relação a esta doença, como de bem diferente de há uns anos atrás, ou seja, é necessário diagnosticar cedo, adoptar todo o tipo de tratamentos adequados e acompanhar o doente, per-manentemente, até termos a certeza de que o vírus, de que é portador, se encontra clinicamente controlado.Para terminar, gostaria de vos deixar aqui uma última nota em relação ao contágio e ao desconhecimento das pessoas sobre o mesmo. Verifico nas consultas que efec-tuo no acompanhamento destes casos, quer por parte de reclusos, quer de não re-clusos, que existe ainda, muita «desinformação» da população em geral. E digo-vos isto, porque vejo os meus doentes completamente aterrados relatando-me casos em que as pessoas acham que estas doenças se transmitem por um simples aperto de mão ou por um abraço que se dá a uma pessoa e que, por isso, irão sentir-se alvo de exclusão social e até mesmo, nalguns casos, familiar, do género: “E agora, o que é que vai ser de mim…, e se o meu vizinho sabe…, e se o meu primo sabe (…) vou ficar com a minha vida estragada, toda a gente vai fugir de mim”. Mas, sobre este assunto não me irei alongar mais, porquanto tal irá ser abordado, de seguida, pela Dr.ª Cristiana Pinto. Apenas dizer-vos que podem e devem continuar a fazer uma vida normal, mantendo o vosso emprego e a vossa vida familiar, devendo procurar apoio junto dos profissionais de saúde para, em conjunto, se delinear uma estratégia que preserve, não só o vosso bem estar, bem como o de todos os que vos rodeiam.

Muito obrigado.

7ª CONFErêNCIA DOENçAS INFECTO-CONTAGIOSAS: PRINCIPAIS CuIDADOS A TER

Cristiana Pinto Médica Interna de Especialidade do Centro Hospitalar do Nordeste

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Antes de mais, muito boa tarde a todos, aproveito esta oportunidade para agradecer o convite que me foi feito pela organização deste certame. Irei, de seguida, falar-vos sobre doenças infecto-contagiosas, mais especifica-mente de Hepatites e de VIH/SIDA.Começando pela Hepatite B, numa definição muito simples, esta patolo-

gia pode ser definida como uma inflamação do fígado, causada por um vírus (o vírus VHB) causador da seguinte sintomatologia, a saber: febre, mal-estar geral, falta de apetite, náuseas, desconforto abdominal, icterícia e um certo prurido.Poderei referir-vos que, a nível mundial, a incidência da Hepatite B é mais incisiva no continente africano, nomeadamente na parte correspondente à África Subsaariana e no extremo Oriente. No que concerne o nosso país, Portugal situa-se numa área de ris-co intermédio, apesar de ultimamente se vir a notar um aumento da sua ocorrência.Por outro lado, temos, também, a Hepatite C. Esta caracteriza-se, de igual modo, por uma inflamação do fígado, mas aqui causada por um outro vírus (o vírus VHC), sen-do que, em caso de infecção, 80 a 90% dos portadores não manifestam especiais sintomas, para além dos habituais nestas situações, a saber: febre, cansaço, falta de apetite, náuseas, desconforto abdominal, icterícia, bem como urina mais escura e prurido, estes últimos (sintomas) em fases mais avançadas. Comparando com o exemplo anterior, a taxa de incidência da Hepatite C em Por-tugal apresenta, também, um valor intermédio, pese embora os números estarem a aumentar. Relativamente à sua transmissão poder-se-á referir que o contacto directo com sangue infectado ou outro tipo de secreções como a saliva, a urina, o sémen ou o leite materno, são os grandes responsáveis pelo contágio. De igual modo, o uso de drogas endovenosas, como a partilha de seringas já usadas, transfusões sanguíneas ou derivados (no caso concreto antes de 1992), a exposição ao sangue por material cortante ou perfurante de uso colectivo, sem esterilização adequada, como por exemplo, as tatuagens, os piercings, as manicures ou pedicures, ou o uso de material pessoal como a escova de dentes e lâminas de barbear, transplante de órgãos ou tecidos, recém-nascidos de mães portadoras do vírus e todo o tipo de contacto sexual promíscuo ou com parceiros portadores do vírus, são, também, fac-tores responsáveis pela transmissão da doença.Por conseguinte, a questão que se nos coloca é a seguinte: “Como prevenir estas infecções?” No que respeita a Hepatite B, tal pode-se combater através da vacina. Contudo, no caso da Hepatite C, esta (vacina), ainda, não existe. Por isso, deve-se evitar todo o tipo de contacto sexual promíscuo, bem como usar sempre o preser-vativo de forma correcta para todo o tipo de contacto sexual, não trocar seringas entre usuários de drogas endovenosas, não usar lâminas de barbear ou escovas de dentes de outras pessoas, evitar tatuagens ou piercings e se uma pessoa viajar para uma área endémica de alto risco, por um período superior a seis meses, deve, primeiro, vacinar-se. No que concerne o tema da SIDA, convém, antecipadamente, uma aclaração do ter-

7ª CONFErêNCIA DOENçAS INFECTO-CONTAGIOSAS: PRINCIPAIS CuIDADOS A TER

mo. Começando pelas suas siglas o S é o inicial para Síndrome, que é um conjunto de sintomas e sinais de uma doença; o I corresponde a Imuno, referente ao sistema imunitário, ou seja, o mecanismo que o nosso corpo tem para se defender de micror-ganismos patogénicos que causam a doença ou a infecção; o D, de Deficiência, que significa falha ou mau funcionamento; e o A, correspondente a Adquirido, ou seja não herdado. Portanto, a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA) é causada por um vírus – o Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH), que ataca e destrói os linfóci-tos (glóbulos brancos), enfraquecendo o sistema imunitário do indivíduo infectado ao ponto de não o conseguir proteger de todo o tipo de infecções que surjam. A par-tir do momento em que uma pessoa tenha contraído o ‘vírus da imunodeficiência hu-mana’ a doença pode vir a manifestar-se num período compreendido de entre dois a dez anos. De acordo com números globais esta (doença) regista maior incidência no continente africano, sendo que Portugal se enquadra numa zona de risco intermédio, apesar de, também, ultimamente se registar um aumento de novos casos.Convém, agora, fazer aqui uma referência à forma como o vírus não se transmite, de modo a combater alguma ignorância, que infelizmente, ainda, reside ao nível de uma larga camada da população portuguesa. Assim sendo, picadas de insectos; permanência no duche ou nas piscinas; contactos sociais (ex. um apertar de mãos); partilha de copos ou toalhas; beijar, desde que as mucosas estejam intactas; trocar de roupa; sexo seguro e ir à casa de banho quando uma pessoa infectada já a tenha usado, são alguns dos vários exemplos a ser considerados como de não contágio.No que concerne a sua prevenção, devo referir que o uso do preservativo é funda-mental para todo o tipo de relações sexuais, bem como a não partilha de seringas, agulhas, escova de dentes, máquinas de barbear, agulhas de tatuagem ou outro tipo de objectos perfurantes. Devemos, também, limpar as superfícies contaminadas de sangue ou líquido corporal, usando sempre luvas e desinfectando com lixívia; cobrir os cortes ou arranhões com pensos, e no caso de, por exemplo, a vossa companheira querer engravidar, convém realizar análises para saber se está infectada. Se, porventu-ra, estiver já grávida e for portadora do vírus, deverá consultar o médico de família para saber quais os riscos, os cuidados a ter e as várias alternativas ao seu dispor. Sumariamente penso ter aqui deixado o essencial em relação a estas patologias (Hepatites e SIDA), agradeço, por isso, a atenção dispensada, ficando à vossa dispo-sição para qualquer tipo de questões que queiram colocar.

Muito obrigado.

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8ª CONFERÊNCIAo PAPEl DA SUB-REGIÃo E CENTRoS DE SAÚDE DE BRAGANÇA NoS CUIDADoS DE SAÚDE AREClUSoS

A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

(2)

(2) De forma a enriquecer o seu contributo, solicitou a Prof.ª Dr.ª Berta Nunes à organização, que participassem, ainda, nesta 8ª Conferência, a Dr.ª Fátima Valente e a Dr.ª Solange Barreira.

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Boa tarde a todos os presentes. Como deverão saber, eu sou médica de fa-mília e até há bem pouco tempo fui Coordenadora da Sub-Região de Saú-de de Bragança. Presentemente, fruto de alteração legislativa, a designa-ção correcta não é Sub-Região de Saúde de Bragança, mas Agrupamento de Centros de Saúde do Nordeste, do qual sou Directora Executiva.

No que concerne a minha participação neste ciclo de debates, devo começar a minha intervenção por vos referir que nós (representantes regionais do Ministério da Saúde), temos tido, desde há cerca de dois anos a esta parte, uma colaboração muito estreita com os Estabelecimentos Prisionais de Bragança e de Izeda, superior-mente dirigidos pelo Dr. Mário Torrão, o qual em tempos idos nos colocou perante algumas situações concretas, que no terreno se estavam a agudizar e que exigiam, por parte da Administração da Saúde, uma resposta adequada. Considerámos, por isso, que seria importante encetar um trabalho conjunto, visando a resolução de vários problemas, que se verificavam nestes Estabelecimentos Prisionais. Refiro-me, em particular, aos problemas de saúde mental e às doenças infecto-contagiosas.É do domínio público que o nosso sistema prisional comporta vários reclusos infec-tados, nomeadamente com HIV, Hepatites e Tuberculose resultantes, na maior parte dos casos, do consumo de drogas, ou de relações sexuais desprotegidas. Com o Sr. Director já discutimos, e por várias vezes, a possibilidade de nos Estabelecimentos Prisionais se facultarem preservativos a reclusos, nas saídas precárias de curta ou longa duração, sendo que, em nossa opinião, tal procedimento deveria, de igual modo, permitir o livre acesso à sua utilização no interior das prisões, no respeito pelo indivíduo e pela sua orientação sexual.O que nos remete para uma questão relevante, que é, precisamente, a sexualidade dentro das cadeias. Isto é, as pessoas pelo facto de estarem presas não deixam de ter a sua actividade sexual, seja ela de natureza hetero ou homo. O importante é que tais situações sejam previamente consideradas pelas instituições, de modo a que seja possível conter, ou até mesmo diminuir o flagelo das infecções por contágio, sal-vaguardando-se, desta forma, o bem-estar de cada um, em particular, e o de todos em geral. Outra questão que importa aqui, também, referir é a das tatuagens e dos piercings. Como é do conhecimento geral é muito frequente os reclusos recorrerem às tatuagens, pelos mais variados motivos, como passatempo, marca identificadora da passagem pela cadeia, afirmação da sua identidade, etc. Deste modo, o grupo de trabalho, a que pertencemos e que se dedica a analisar a problemática da Saúde em contexto prisional, tem vindo a fazer algumas recomendações tendentes à resolução de algumas das situações aqui identificadas, sendo de opinião que, salvaguardadas as questões de segurança inerentes ao funcionamento de um estabelecimento pri-sional, seria importante que os reclusos pudessem aceder a material esterilizado, isto é, material livre de qualquer forma anterior de contágio.Ainda uma outra questão, que sabemos criar alguma polémica é a da troca de se-ringas dentro das prisões, ou melhor dizendo, o livre acesso a uma seringa não

8ª CONFErêNCIA O PAPEl DA SuB-REGIãO E CENTROS DE SAúDE DE BRAGANçA NOS CuIDADOS DE SAúDE A RECluSOS

contaminada. Todos sabemos ser esta uma prática em voga em vários países e que em Portugal é, ainda, uma experiência piloto em alguns estabelecimentos prisionais, sendo que até ao momento, os resultados verificados são pouco consentâneos com os propósitos que os conceberam. Convém, no entanto, reconhecer que no nosso País, através do programa de troca de seringas, o efeito desta medida de imediato se fez notar na diminuição de casos de contágio, nomeadamente de HIV entre to-xicodependentes. Contudo, a realidade portuguesa, nesta matéria, não se resume a medidas com esta eficácia, pois, como bem sabem, Portugal é dos países da Eu-ropa com uma das taxas mais elevadas de incidência de novos casos de Sida e, é importante aqui referi-lo – não é nas cadeias que este cenário se verifica, mas sim fora delas. E já agora seria pertinente perguntar por que é que tal acontece? – Talvez porque, provavelmente, aqui nos deparamos com um problema de mentalidades, ou seja, «que este tipo de coisas não nos acontecem a nós e que só acontecem aos outros». Pois bem, o problema é que quando a vida nos prega uma partida e quando damos por ela, já é tarde, nalguns casos, tarde de mais. Por isso, a palavra de ordem é prevenir. Prevenir, para não ter de remediar.Para terminar, passaria a palavra às minhas colaboradoras, que no terreno têm vindo a acompanhar estes problemas, nomeadamente a Dr.ª Fátima Valente – médica de família do Centro de Saúde de Bragança, que tem desenvolvido o seu trabalho, em particular, na área da Tuberculose e que vos irá aqui falar dessa experiência, seguin-do-se a Dr.ª Solange Barreira, Psicóloga, que tem estado a colaborar no apoio psico-lógico a reclusos seropositivos e que para as quais tomei a liberdade de, previamen-te, solicitar à organização deste evento autorização para as suas intervenções, pois julgo complementarem o que aqui foi dito. Ficaremos, depois, à vossa disposição para qualquer tipo de questão que queiram colocar.

Muito obrigado a todos.

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Boa tarde a todos. Aproveito para, desde já, agradecer a vossa presença e dizer-vos que é com todo gosto que aqui estou. Tal como a Dr.ª Berta referiu, irei falar-vos sobre a problemática da Tuberculose nas prisões do distrito de Bragança.Quando iniciámos o nosso trabalho de acompanhamento dos estabele-

cimentos prisionais nesta região transmontana, estes expunham algumas necessida-des, quer na área da infecciologia, quer na área da saúde mental, sendo que, desde logo, a Tuberculose se assumiu como o meu primeiro grande desafio, desde que em 1996 principiei este trabalho. Desta forma, dei início à tarefa fazendo o levantamento de um caso de Tuberculose no Estabelecimento Prisional de Izeda. Devo referir-vos que este foi o primeiro caso de multiresistência com que lidei, designadamente de um recluso proveniente do EP de Izeda e que veio a falecer no Hospital S. João de Deus, em Caxias, para tal (confesso-vos que naquela altura não tinha a mínima ideia do que se passava em termos de Saúde nas cadeias) tratei de contactar o EP de Izeda com vista a fazer o levantamento, através de um inquérito epidemiológico, de possíveis contágios de primeiro anel, permitindo-me tal procedimento aquilatar do histórico da Tuberculose naquele EP.Em 1997 procedeu-se, então, à pesquisa. Para tal pedimos ao Núcleo de Tuberculose da Direcção-Geral, porque o Porto não nos deu resposta (naquela altura, a Unidade Móvel de Radiorrastreio, estava parada, as máquinas estavam avariadas), sobre a pos-sibilidade de nos cederem o carro de radiorrastreio para procedermos ao respectivo levantamento no EP de Izeda. Em 1998 o rastreio e o acompanhamento de doentes com Tuberculose alargou-se, também, ao EPR de Bragança, tornando-se extensível, não só a reclusos mas também a guardas e funcionários, sendo de certo modo um ‘rastreio oportunista’ para todos, quantos pretendessem aferir do seu estado de saúde nesta matéria. Sendo certo que somente cerca de 10% das pessoas, que são contagia-das, desenvolvem a doença, também não é menos certo que o profissional de saúde necessita de saber quem foi contagiado para melhor poder intervir, de modo a tratar a infecção num momento anterior, prevenindo-se, assim, a propagação da mesma. Pelo acompanhamento realizado, e com base na experiência acumulada, sabemos que nos estabelecimentos prisionais existem pessoas que não são imunocompeten-tes em termos do seu sistema imunitário, sendo, por isso, altamente passíveis de contágio, caso dos doentes seropositivos, ou eventualmente indivíduos que tomam determinada medicação, como por exemplo, imunossupressores, i.e., depressores da imunidade, os quais poderão não conseguir travar o bacilo a nível do seu sistema respiratório e este rapidamente se propagar pelo seu organismo, podendo causar determinado tipo de lesões, nomeadamente pericardites, doenças renais e osteo-mielites, quando se instala a nível dos ossos, ou provocando um quadro de meningi-te, quando se instala a nível das meninges.Em 1998 desenvolvemos, por isso, um trabalho conjunto com os estabelecimentos prisionais de Bragança, no sentido de explicar a importância de um diagnóstico

8ª CONFErêNCIA O PAPEl DA SuB-REGIãO E CENTROS DE SAúDE DE BRAGANçA NOS CuIDADOS DE SAúDE A RECluSOS

Fátima Valente Médica de Família do Centro de Saúde de Bragança

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precoce, não só através de acções de sensibilização destinadas a reclusos, mas também dirigidas aos profissionais dos serviços prisionais, nomeadamente guardas e funcionários. Explicámos o modo de actuação do organismo e articulámos com os centros de saúde através de uma equipa no terreno, em contacto com estes dois EPs, de forma a promover a implementação da TOD – Toma Observada da Medica-ção Tuberculostática. Procurou-se, desta forma, combater a discriminação e criar líderes de sinalização, i.e., de pessoas sensibilizadas, de pessoas informadas que pudessem transmitir a sua informação e sinalizar sempre que surgissem sintomas, visto que os mais novos, normalmente desconhecem o problema.Tivemos, então, o cuidado de informar toda a comunidade prisional que o aumento do risco de contágio, bem como o aparecimento de novos casos estava relacionado com os novos entrados ou, eventualmente, com as ‘saídas de precária’. Por outro lado, confrontámo-nos com casos de infectados, simultaneamente por Tuberculose e SIDA, com a agravante de terem de efectuar longas viagens a diferentes locais de consulta. Por conseguinte, começou a verificar-se, por parte destes infectados, situa-ções de recusa de deslocação a consultas ao Hospital Joaquim urbano (Porto), bem como da toma da medicação retroviral. Para ultrapassar esta situação promovemos vários protocolos no sentido de melhorar a saúde nestes dois EPs, nomeadamente com a antiga Sub-Região de Bragança, ficando nestes consignado a importância do rastreio, designadamente um clínico, um radiológico e um rastreio tuberculínico à entrada do estabelecimento, complementando-se tais procedimentos com um ra-diorrastreio anual feito pela Unidade Móvel do Porto (que se desloca para o efeito a estes dois EPs). Nesses protocolos ficou, ainda, consagrado a importância da sinali-zação imediata dos doentes em tratamento, aquando da sua transferência de outras unidades, o registo da TOD e a sinalização de sintomas pela equipa clínica dos dois estabelecimentos, bem como a garantia de continuidade de medicação nas saídas de precária ou quando estes ficavam em situação de trânsito para outros estabe-lecimentos prisionais ou, eventualmente, para algum julgamento. De igual modo, se reforçou o encaminhamento das amostras de expectoração para o nosso laboratório de saúde pública e isto porque, neste, é-nos possível realizar um exame directo e um exame cultural, permitindo-nos, assim, uma resposta mais rápida no terreno.Foi posteriormente celebrado (2006), um protocolo com o Hospital Joaquim Urbano que contribuiu para que as consultas fossem realizadas localmente, evitando-se a deslocação dos nossos reclusos ao Porto, dentro de uma carrinha celular, fechados durante 200km para lá e outros 200km para cá (o que é perfeitamente desumano). Devo referir-vos que esta alteração de procedimentos contribuiu, e muito, para uma mais fácil adesão à terapêutica. Neste momento temos muitos reclusos a fazer a sua medicação sendo o seu estado de saúde considerado de controlado. Por outro lado, tais alterações contribuíram, ainda, para melhorar o diagnóstico da Tuberculose em doentes seropositivos, o tal diagnóstico que é muitas vezes difícil de realizar, porque o bacilo se vai localizando noutros órgãos, sendo-nos, assim, possível estabelecer

8ª CONFErêNCIA O PAPEl DA SuB-REGIãO E CENTROS DE SAúDE DE BRAGANçA NOS CuIDADOS DE SAúDE A RECluSOS

esquemas terapêuticos combinados, quer retrovíricos quer tuberculostáticos, quer através de uma terapêutica de substituição de opiáceos (com regras), de forma a permitir uma melhoria e uma melhor adesão por parte dos infectados, sendo que tais procedimentos contribuíram para uma efectiva diminuição do risco de contágio. A título meramente informativo, de 2000 a 2008 registámos 11 casos de Tuberculose notificados (em indivíduos com idades compreendidas entre os 20 e os 50 anos), 5 casos de Tuberculose e SIDA e fizemos, ainda, o acompanhamento de 142 casos de Tuberculose e infecção.Resta-me, por fim, agradecer a vossa colaboração.

Muito obrigado, pela atenção dispensada.

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Olá, boa tarde a todos e obrigado pela vossa presença. Tal como referiu a Dr.ª Fátima Valente, um outro contributo por parte da ex-Sub-Região de Bragança e actual ACES, foi, de facto, o combate ao VIH/SIDA, atra-vés da celebração de um protocolo com o Hospital Joaquim Urba-no (Porto), o qual envolve a deslocação de um Infecciologista desta

unidade aos dois EPs de Bragança, com a finalidade de assegurar o tratamento de reclusos infectados por VIH/SIDA.Esta foi uma forma de colmatar a não adesão por parte de alguns reclusos às con-sultas e, consequentemente, aos tratamentos, devido às deslocações que envolviam muito tempo, muito cansaço decorrente de tais viagens e que, por vezes, também originavam a sua transferência para outros estabelecimentos prisionais, de forma a melhor poderem frequentar as mesmas. Deste modo, desde o ano de 2007 que são realizadas consultas de infecciologia nos próprios estabelecimentos prisionais, facto que originou a que houvesse uma maior adesão, bem como à terapêutica, suscitan-do uma maior confiança no sistema por parte dos reclusos e, também, uma relação de maior proximidade e de empatia com o profissional de saúde - o Infecciologista, que é alguém exterior à instituição.Quanto à detecção precoce, esta também tem vindo a ser assegurada de forma um pouco diferente do habitual, sendo que a todos os reclusos novos entrados é-lhes realizado o teste rápido do VIH/SIDA, por uma Enfermeira pertencente ao Centro de Saúde de Bragança (extensão de Izeda) com aconselhamento pré e pós teste, o que permite uma tomada de decisão consciente e informada por parte do recluso, para além de lhe ser assegurado o apoio multidisciplinar nos casos de VIH positivos, quer por Psicólogo, quer por Médico e Enfermeiro.Também, o apoio psicológico direccionado a infectados por VIH/SIDA, reclusos e a outros em situações pontuais, tem vindo a ser efectuado, o mesmo é decorrente de encaminhamento por parte do Infecciologista, dos técnicos de reeducação e por vezes, por parte da responsável pela área da saúde do Estabelecimento Prisional de Izeda, na pessoa da Dr.ª Nair. Até ao momento estiveram em consulta psicológica, 42 reclusos e no decurso das mesmas trabalhamos, entre outras situações, o início da terapêutica anti-retrovírica e respectiva adesão por parte do indivíduo, o processo de aceitação da doença, o luto ou o confronto com a morte e, também, algumas situações de pressão, gestão de conflitos ou controle de impulsos.Foram, ainda, constituídos grupos de desenvolvimento de competências pessoais e sociais, com vista à promoção da reabilitação do indivíduo no seu todo, abarcando as dimensões, física, pessoal, psicológica e social e o desenvolvimento de meca-nismos facilitadores de reinserção social. Quanto aos estilos de vida saudáveis, têm vindo a ser promovidas sessões de esclarecimento e sensibilização envolvendo a distribuição de material de informação, na área da infecção VIH/SIDA e as mesmas têm vindo a ser levadas a cabo por elementos da Associação Promoção do Bem-Estar, que tem desenvolvido projectos extremamente úteis na área da infecção VIH/

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Solange Barreira Psicóloga do Centro de Aconselhamento e Detecção Precoce do VIH/SIDA de Bragança

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SIDA, aqui no distrito de Bragança.Por outro lado, não podia deixar de referir que fui muito bem recebida no estabele-cimento prisional de Izeda, quer por parte da direcção, quer por parte da chefia, dos guardas, dos reclusos, dos funcionários e gostaria de agradecer a todos e em parti-cular ao Sr. Director, Dr. Mário Torrão, o enorme respeito demonstrado por mim, como pessoa, e também como profissional, bem como pelo trabalho desempenhado. Não posso, por isso, deixar de referir que existe, de facto, um trabalho de equipa no Es-tabelecimento Prisional de Izeda, visando o bem-estar psicológico do recluso, nome-adamente entre psicólogos, técnicos de reeducação, outros técnicos e enfermeiros e o total respeito pela confidencialidade decorrente das consultas de Psicologia. Tal como já referi, gostaria, ainda, de salientar que sinto que a confiança demonstrada pelos reclusos e a adesão às consultas se deve ao facto de eu ser uma profissional de saúde externa ao próprio estabelecimento prisional de Izeda. Regressando, novamente, ao tema em questão, devo referir que, de um modo geral, a Tuberculose, infecção VIH/SIDA e as doenças infecciosas se assumem como um dos mais importantes problemas de saúde pública em meio prisional. O conheci-mento das características epidemiológicas gerais leva a compreender que, o am-biente social e físico das prisões, marcado pela restrição espacial, pela intromissão no espaço individual, pela tensão e pelos conflitos, pela distorção das escolhas e, às vezes, pela necessidade de se proporem novas respostas ou, pelo menos, diferentes face ao stress, constituem um meio promotor destas doenças. Por conseguinte, no sentido de integrar métodos diversificados, que permitam actuar sobre a multiplici-dade das causas, deverá ser reequacionada uma actuação articulada em conjunto, resultante de um trabalho de equipa (tal como o que tem vindo a ser efectuado nestes dois EPs).Por outro lado, não é possível falar de doenças infecciosas sem abordar a questão do contágio, directamente proporcional à natureza do espaço (com características especiais em meio prisional), à sexualidade que importam às Hepatites B e C, à in-fecção VHI/SIDA, à Sífilis e à Toxicodependência, como potenciais factores de risco que muito contribuem para a sua propagação. A título de exemplo, constato que um dos meios de prevenção de doenças sexualmente transmissíveis se encontra, somente, disponível nos serviços clínicos, sendo fornecido a reclusos aquando de ‘saídas precárias’. Refiro-me, obviamente, aos preservativos, não se verificando a sua entrega a reclusos novos entrados, o mesmo sucedendo com os lubrificantes que, pura e simplesmente, não se encontram disponíveis.No que concerne a abordagem, por parte dos Serviços Prisionais, à problemática da Toxicodependência, esta deve ser de todo reequacionada, devendo estes es-tabelecimentos dispor de um conjunto de instrumentos terapêuticos variados, que permitam a elaboração de um estratégica terapêutica adequada a cada caso. Refiro-me, em concreto, à necessária difusão de unidades de desabituação de programas de antagonistas dos opiáceos com toma observada (que já existe), a programas

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de substituição de opiáceos com toma observada (que já existe) e a comunidades terapêuticas no Sistema Prisional, ou em meio livre, devendo, de igual modo, ser as-segurado o apoio psicológico e psiquiátrico (que, também, já existe).Assim, e tendo em conta o que aqui expus, não posso deixar de (voltar) a recomen-dar aos responsáveis pelos serviços prisionais deste país que, os preservativos e os lubrificantes devem estar acessíveis de forma simples e discreta, sem que os reclu-sos sejam obrigados a solicitá-los; deve, também, tornar-se acessível o equipamento para tatuagens e piercings e assegurar o acesso a estes materiais não contamina-dos; devem ser promovidos, no meio prisional, os princípios e a prática do programa:

“Diz não a uma seringa em segunda mão!”; devem ser promovidas boas práticas de higiene na prisão; deve existir um correcto arejamento de todos os locais; devem ser criadas alas isentas de fumo. Finalmente, deverão, ainda, ser mantidos todos os mecanismos de divulgação da informação e de pedidos de ajuda.Gostaria de concluir a minha intervenção com uma mensagem de confiança baseada em dados estatísticos. Em termos do número de infectados nas prisões portuguesas, em 2005, 34% da população recluída encontrava-se contaminada com o vírus HIV e Hepatites B e C; em 2006 este valor diminuiu para 27% e, presentemente, ronda os 25%. Tal como se pode verificar, a pouco e pouco vamos reduzindo a taxa de infec-ção e de aparecimento de novos casos de contágio dentro das nossas prisões.Com esta nota de esperança, termino a minha intervenção, agradecendo, desde já, a vossa atenção.

Muito obrigado.

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SESSÃO DE ENCERRAMENTO

Jorge Gomes Governador Civil do Distrito de Bragança

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SESSãO DE ENCERRAMENTO

Senhor Director do Estabelecimento Prisional regional de Bragança, Senhora Directora do Agrupamento de Escolas Augusto moreno, Caros residentes que são, afinal de contas, os principais destinatários do trabalho que, ao longo deste dia, foi realizado, minhas Senhoras e meus Senhores;

Antes de mais, quero dizer-vos que é com enorme agrado que aceitei este convite. A Formação e a Qualificação das Pessoas é uma matéria de fulcral im-portância do actual Governo, e é também uma das suas prioridades. O reforço de competência, aliado a um processo contínuo de aprendizagem, constitui uma etapa essencial com vista à promoção de um desenvolvi-

mento que se pretende adequado aos dias que vivemos. Só desta forma, consegui-remos uma sociedade mais coesa, mais justa e mais equilibrada. Considerando as Pessoas envolvidas e o Programa em questão, estou certo de que sairão daqui um grupo de cidadãos melhor preparado para uma nova vida que os espera lá fora. Para quem aqui vive, para quem faz desta a sua residência temporária, não por von-tade própria, mas por força das circunstâncias, são imprescindíveis mecanismos que tornem a sua saída cada vez mais apoiada e sustentada. A Formação e Valorização Pessoal representam a via pela qual a sua reinserção na sociedade se faça de um modo mais condigno, mais célere e, concomitantemente, mais justo, de forma a melhor enfrentar os desafios que lá fora se vivem.

Senhora Directora, A si e ao seu Corpo Docente, os meus Parabéns! O sucesso e a pertinência deste programa faz sentido, desde logo, porque assenta num dos recursos mais valiosos que temos: as Pessoas, a sua qualificação e a sua inserção social. A Escola Augusto Moreno, assumindo a sua responsabilidade social, esta luta e este trabalho, encarando-o com um verdadeiro espírito de missão, que tanto resultado e proveito têm trazido a estas Pessoas, merece, da parte de todos nós, o profundo reco-nhecimento e o agradecimento pelo papel fundamental que tem prestado à sociedade. Especialmente, para aqueles que em breve deixarão esta casa, umas breves palavras: O quotidiano lá fora, é cada vez mais exigente! Por conseguinte, o meu conselho é que partam com coragem e determinação de refazer as vossas vidas, com vontade de singrar na sociedade à qual pertencem! Desejo-vos por isso, um regresso pleno de sucesso pessoal e profissional. Estou certo que jamais voltarão a esta casa e que serão no futuro cidadãos livres, mais justos e responsáveis. Muito obrigado!

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A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

CONCLUSÕES

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CONCLUSõES

Com a realização deste II Ciclo de Conferências – uma organização conjunta do Estabelecimento Prisional Regional de Bragança e do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno, este ano subordinado à temática da Saúde – foram seus objectivos contribuir para uma discussão sobre matéria de saúde em meio prisional, de forma a se deslindarem caminhos para um vasto conjunto

de problemas que tão fortemente têm preocupado a população prisional, em geral, e a comunidade reclusa deste estabelecimento prisional, em particular, nomeadamente, do-enças infecto-contagiosas (HIV, Tuberculose, Hepatites), adições (Droga, Álcool), doenças do foro psiquiátrico, entre outras patologias.Por conseguinte, com a colaboração prestada por destacadas personalidades provenientes de Instituições do Ensino Superior, dos Ministérios da Saúde e da Justiça, da Direcção-Geral dos Ser-viços Prisionais e de distintos convidados da sociedade civil, que ao longo do dia compartilharam com o público presente saberes/experiências adquiridos ao longo de suas vidas pessoais/profis-sionais, julgamos terem sido dados passos importantes no sentido de se avançarem com planos de acção, tão urgentemente necessários, nesta área de intervenção do sistema prisional.Deste modo, consideramos que o evento largamente ultrapassou as nossas expectativas iniciais, a avaliar pelo impacto regional e, sobretudo, nacional que obteve, tal como o comprovam, quer a sua promoção, quer a sua divulgação, por parte de instituições de referência, designadamente, Agência Nacional para a Qualificação; Direcção Regional de Educação do Norte; Direcção-Geral dos Serviços Prisionais; Associação “Direito de Aprender”, para além dos Media locais. Mas, acima de tudo, estamos certos de ter (este acontecimento) permitido à comunidade exterior, conhecer de perto o ambiente prisional, sendo que, para alguns dos intervenien-tes, terá sido o seu primeiro contacto com esta «realidade» e, porventura, a sua primeira experiência dentro de uma instituição penitenciária, mas, sobretudo, o trabalho de forma-ção que, no âmbito da “Educação de Adultos”, tem vindo a ser desenvolvido, num contexto tão peculiar à prática docente, bem como pelo esforço envidado por estes internos, em termos do aumento das suas qualificações, ao longo, não só, do presente ano lectivo, como em anteriores períodos escolares.Congratula-se, assim, esta comissão pelas inúmeras felicitações recebidas, que de uma forma geral nos foram sendo transmitidas, quer por parte das entidades patrocinadoras do evento, de conferencistas, de convidados, de docentes de outras escolas, da socieda-de civil, mas, sobretudo, por parte da comunidade prisional, na qual se inserem os nossos formandos – principais destinatários destas jornadas.Por fim, e fazendo votos para que no futuro outros eventos venham, de igual modo, a ser concretizados, despedimo-nos até um próximo Ciclo de Conferências, o terceiro, quem sabe, talvez já no próximo ano…

A Comissão de Organização

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A Educação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde

AGRADECIMENTOS

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Uma publicação, por bem pequena que seja, só se torna possível com a conjugação de vários esforços e de vária ordem. Não pode, por isso, esta comissão composta por docentes da escola associada (Augusto Moreno) e formadores do curso EFA B3, de Alfabetização, formador da actividade Extracurricular de Música e Técnica de Reeducação do Es-

tabelecimento Prisional Regional de Bragança, deixar de, muito reconhecidamente, agradecer a estas duas tão nobres instituições, designadamente na figura dos seus dirigentes Dr. Mário Torrão (Director do EPR de Bragança) e Dr.ª Emília Estevinho (Directora do Agrupamento de Escolas Augusto Moreno), bem como ao Chefe Prin-cipal desta instituição penitenciária, Carlos Cordeiro, pela forma como confiaram na capacidade desta equipa, de levar por diante tal empresa.Vem, assim, a comissão de organização deste segundo ciclo de conferências, A Edu-cação e Formação de Adultos em Contexto Prisional – Educar para a Saúde, em nome das instituições que representa, nomeadamente Agrupamento de Escolas Augusto Moreno e o Estabelecimento Prisional Regional de Bragança, agradecer aos senho-res conferencistas, o valioso contributo prestado e que muito elevaram o nível deste certame, pelos momentos de interacção, propositadamente, criados com o público, permitindo, deste modo, que este, de forma activa, participasse nos debates subse-quentes às suas alocuções, a saber: Prof. Dr. Pinto da Costa, Prof.ª Dr.ª Conceição Azevedo, Prof. Dr. Rui Abrunhosa, Prof.ª Dr.ª Berta Nunes, Dr. Rodrigo Versos, Dr.ª San-dra Valdemar, Enf.ª Directora Maria João Eliseu, Dr.ª Eugénia Madureira, Dr.ª Cristiana Pinto, Dr.ª Fátima Valente, Dr.ª Solange Barreira e Formando José Bártolo.Aproveitamos, ainda, para agradecer o importante apoio provindo de diversas ins-tituições da região, mormente do Governo Civil do Distrito de Bragança, Câmara Municipal de Bragança, Fundação INATEL, Juntas de Freguesia da cidade de Bra-gança (Santa Maria e Sé), Instituto Português da Juventude – Bragança, Caixa Geral de Depósitos, Caixa de Crédito Agrícola, Casa de Pessoal do E.P.R. de Bragança, Agrupamento de Produtores do Mel do Parque Natural do Montesinho, lda., firma JPi Informática e, também, Associação Cultural Recreativa e Ambiental de Palácios.Aproveitamos, de igual modo, para prestar os nossos agradecimentos a todos os vigilantes do Estabelecimento Prisional, pela organização, dedicação e desempenho, manifestado no decorrer das mesmas.Uma palavra, também de apreço, a todos os reclusos que estiveram presentes nestas conferências, com especial relevo para os formandos do Curso EFA-B3 e Alfabetização, foi por eles, e para eles, que este evento teve a razão da sua existência.Não podemos, igualmente, esquecer as várias Instituições que, ao longo do dia, pas-saram pelo Estabelecimento Prisional e que, da mesma forma, contribuíram para o bom funcionamento destas jornadas, nomeadamente, Escolas da Cidade de Bragança (ES/3 Abade de Baçal, ES/3 Emídio Garcia, ES/3 Miguel Torga, Agrupamento de Escolas Paulo Quintela), Equipa de Apoio às Escolas do Nordeste, Terra Fria e Arribas, Sindicato dos Professores do Norte, Centro de Emprego e Formação Profissional de Bragança,

AGRADECIMENTOS

PSP de Bragança, Delegação da Cruz Vermelha de Bragança, Associação ‘Reaprender a Viver’, Estabelecimento Prisional de Izeda, Centro de Saúde de Bragança, Parque Natural do Montesinho, Igreja Evangélica, Bombeiros Voluntários de Bragança, Pastoral dos Ciganos, Paróquia do Santo Condestável, entre outras instituições. Uma última referência e um agradecimento muito particular, que fazemos questão de aqui sublinhar, a Sua Excelência Reverendíssima o Senhor Bispo de Bragança-Miranda, pela presença assídua nas actividades desenvolvidas neste Estabelecimen-to Prisional e pelo legado, em forma de ‘Nota de Abertura’ com que iniciamos esta publicação. De igual modo, agradecemos ao Dr. José Carlos, docente na Escola Au-gusto Moreno, pelo trabalho executado ao nível do design e concepção do material promocional do evento, bem como ao Dr. Joaquim Alexandre Couto, por nos facilitar alguns contactos com alguns dos conferencistas convidados, e que, de inegável importância, se revelaram na concretização dos nossos intentos.Terminamos, com uma palavra de apreço, dirigida a todos, quantos não tenham sido referidos ao longo destas páginas, aproveitando para, publicamente, apresentar as nossas desculpas. Cumpre-nos, por fim, agradecer a todos, quantos emprestaram o seu contributo à organização deste evento, que tão arreigadamente se disponibilizaram para a sua efectivação e que, sem os quais, dificilmente, teríamos concretizado este desiderato.

A Comissão de Organização

AGRADECIMENTOS

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GALERIA DE IMAGENS

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Momento musical Cursos EFA-B3 e Alfabetização

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Momento musical Grupo de Gaiteiros da Associação Cultural, Recreativa e Ambiental de Palácios

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Lanche convívio

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