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LITERATURA: AUTONOMIA E COMPETÊNCIA EXPRESSIVA

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Page 1: LITERATURA AUTONOMIA E COMPETÊNCIA EXPRESSIVA · O BRASIL REPUBLICANO: CONFLITOS E CONTRASTES A Proclamação da República, em 1888, não representou uma mudança grande no cenário

LITERATURA: AUTONOMIA E

COMPETÊNCIA EXPRESSIVA

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• No início do século XIX, a Europa assiste a um

conjunto de transformações em todos os domínios

das atividades humanas. Invenções,

desenvolvimento científico e tecnológico, lutas

sociais, guerra mundial – tudo isso forma o

cenário em que surge a arte moderna.

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A literatura brasileira atravessa um período de

transição nas primeiras décadas do século XX. De

um lado, ainda há influência das tendências

artísticas da segunda metade do século XIX; de

outro, já começa a ser preparada a grande

renovação modernista, que se inicia em 1922,

com a Semana de Arte Moderna.

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A LUTA ENTRE O VELHO E O NOVO

Nas primeiras duas décadas do século XX, a

maior parte dos escritores que surgiram antes ou

após o Realismo estavam vivos e produzindo.

Desse modo, os autores que deram origem ao Pré-

Modernismo, foram contemporâneos de Machado

de Assis, Olavo Bilac e Aluísio Azevedo. Ao

mesmo tempo, começavam a se fazer notar as

primeiras influências dos movimentos artísticos

europeus, que impulsionariam o surgimento do

Modernismo.

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Os primeiros anos da República são agitados no

Brasil: o Nordeste é flagelado pela seca e

sacudido pela guerra de Canudos. No Norte, a

borracha traz riqueza e prosperidade para uma

região isolada e desconhecida. A riqueza de SP é

proveniente do café, o ―ouro negro‖. Imigrantes

começam a chegar, com costumes e culturas

diferentes.

Como dar voz à diversidade de um país cada vez

mais complexo?

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ASPECTO ORIGINAL

A urbs monstruosa, de barro, definia bem

a civitas sinistra do erro. O povoado novo surgia, dentro

de algumas semanas, já feito ruínas. Nascia velho. Visto

de longe, desdobrado pelos cômoros, atulhando as

canhadas, cobrindo área enorme, truncado nas

quebradas, revolto nos pendores — tinha o aspecto

perfeito de uma cidade cujo solo houvesse sido sacudido

e brutalmente dobrado por um terremoto.

Feitas de pau-a-pique e divididas em três

compartimentos minúsculos, as casas eram paródia

grosseira da antiga morada romana: um vestíbulo

exíguo, um atrium servindo ao mesmo tempo de

cozinha, sala de jantar e de recepção; e uma alcova

lateral, furna escuríssima mal revelada por uma porta

estreita e baixa.

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Traíam a fase transitória entre a caverna

primitiva e a casa. O mesmo desconforto e, sobretudo, a

mesma pobreza repugnante, traduzindo de certo modo,

mais do que a miséria do homem, a decrepitude da raça.

(...)

Vinham de todos os pontos, carregando os

haveres todos; e, transpostas as últimas voltas do

caminho, quando divisavam o campanário humilde da

antiga Capela, caíam genuflexos sobre o chão

aspérrimo. Estava atingido o termo da romagem.

Estavam salvos da pavorosa hecatombe, que

vaticinavam as profecias do evangelizador. Pisavam,

afinal, a terra da promissão — Canaã sagrada, que o

Bom Jesus isolara do resto do mundo por uma cintura

de serras...

Chegavam, estropiados da jornada longa, mas

felizes.

CUNHA, Euclides da. Os sertões. P.227-232

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Descrição do povoado que está sendo construído

pelos seguidores de Antonio Conselheiro;

Ao concluir que aquelas casas traziam ―mais do

que miséria ao homem, a decrepitude da raça‖, o

narrador nos diz que a raça humana está em

decadência, como se as casas estivessem

regredindo ao primarismo das cavernas

primitivas.

Que função a religião poderia desempenhar na

vida dessas pessoas?

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O BRASIL REPUBLICANO: CONFLITOS E

CONTRASTES

A Proclamação da República, em 1888, não

representou uma mudança grande no cenário

econômico brasileiro. A situação das famílias que

viviam no campo, dois terços da população do

país, continuava sendo determinada pelos

grandes latifundiários, que controlavam extensas

proporções de terra tanto no litoral quando no

interior.

Reforma das cidades: o espaço urbano passou por

um processo de ―europeização‖. Cidades foram

afetadas pelo bota-abaixo: abertura de avenidas e

a imitação de prédios europeus.

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Reurbanização das grandes cidades:

deslocamento de milhares de famílias pobres das

áreas centrais.

Reurbanização superficial: nos centros urbanos,

escravos libertos viviam em completo abandono.

A elite econômica preferia ―importar‖ imigrantes

europeus.

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[...]Estávamos fatigados da nossa mediania, do nosso relaxamento; a visão de Buenos Aires, muito limpa, catita, elegante, provocava-nos e enchia-nos de loucos desejos de igualá-la. Havia nisso uma grande questão de amor-próprio nacional e um estulto desejo de não permitir que os estrangeiros, ao voltarem, enchessem de críticas a nossa cidade e a nossa civilização. Nós invejávamos Buenos Aires imbecilmente. Era como se um literato tivesse inveja dos carros e dos cavalos de um banqueiro. Era o argumento apresentado logo contra os adversários das leis voluptuárias que aparecem pelo tempo. A Argentina não nos devia vencer; o Rio de Janeiro não podia continuar a ser uma estação de carvão enquanto Buenos Aires era uma verdadeira capital européia. Como é que não tínhamos largas avenidas, passeios de carruagens, hotéis de casaca, clubes de jogo?‖

BARRETO, Lima. Recordações do escrivão Isaías Caminha. p. 209-210,fragmento.

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PRÉ- MODERNISMO: AUTORES EM BUSCA

DE UM PAÍS

As mudanças não deixavam espaço para a

idealização. Era o momento de buscar um

conhecimento mais real e profundo das condições

de vida que podiam ser observadas em um país tão

grande. Por isso, o foco da produção literária se

fragmenta e os autores escrevem sobre as

diferentes regiões, os centros urbanos, os

funcionários públicos, sertanejos, caboclos e

imigrantes.

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AS NOVIDADES DO PRÉ-MODERNISMO

O interesse pela realidade brasileira: os modelos literários realistas-naturalistas eram essencialmente universalizantes. A preocupação central dos autores daquele período era abordar o homem universal, sua condição e seus anseios. Aos pré-modernistas, interessavam assuntos do cotidiano dos brasileiros, gerando, assim, obras de claro caráter social.

Canaã, de Graça Aranha – imigração alemã no Espírito Santo.

Os sertões, Euclides da Cunha – violência e fanatismo religioso em Canudos.

Lima Barreto – análise das populações suburbanas do RJ.

Monteiro Lobato – miséria do caboclo na região decadente do Vale do Paraíba

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A busca de uma linguagem mais simples e

coloquial: essa busca é explícita na obra de

Lima Barreto e representa um importante passo

para a renovação modernista de 1922. O autor

procurou ―escrever brasileiro‖, com simplicidade,

ignorando muitas vezes as normas gramaticais e

de estilo, provocando a ira dos conservadores e

parnasianos.

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OS CONFLITOS NO NORDESTE

A região Nordeste do país enfrentava o problema crônico da seca. Vivendo de modo precário, muitos aderiram à pregação messiânica de Antonio Conselheiro, o beato que profetizava a transformação do sertão em mar, anunciando a aproximação do dia do juízo final.

Conselheiro criou a comunidade Belo Monte, para onde iam inúmeros fiéis em busca da salvação. Logo, o líder religioso se desentendeu com os poderes republicanos e os embates transformaram-se em um dos piores confrontos internos do Brasil: a guerra de Canudos (1896-1897)

Religião ou cangaço.

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CANUDOS: MISÉRIA, FANATISMO E

VIOLÊNCIA

Ocorrida entre 1896-1897, foi um dos conflitos mais violentos da história do país, ocasionando a morte de 15 mil pessoas, entre sertanejos e militares.

Em pouco tempo, em torno de Antônio Maciel Conselheiro formou-se uma cidade de pessoas miseráveis e largadas à própria sorte.

Isolados, alheios a pagamentos de impostos e à oficialização da cidade, o povoado passou a ter problemas com a Igreja e com as leis locais.

Os sermões de Conselheiro tratavam não apenas da salvação das almas, mas também de problemas concretos, como a miséria e opressão política.

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OS SERTÕES: DENÚNCIA DA VIOLÊNCIA

O país recebia apenas a versão oficial da guerra:

a luta da República contra focos monarquistas no

sertão baiano.

Os sertões (1901), de Euclides da Cunha, é uma

tentativa de rever a versão oficial da guerra de

Canudos.

Narrativa literária histórica e científica: o

autor pretendia contar o que presenciara no

sertão e compreender e explicar o fenômeno

cientificamente (determinismo, positivismo,

sociologia, geografia).

O meio determina o homem: a obra organiza-

se em três partes: ‗A terra‘, ‗O homem‘, ‗A luta‘.

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A TERRA

Então, a travessia das veredas sertanejas é mais exaustiva que a de uma estepe nua. Nesta, ao menos, o viajante tem o desafogo de um horizonte largo e a perspectiva das planuras francas. Ao passo que a outra o afoga; abrevia-lhe o olhar; agride-o e estonteia-o; enlaça-o na trama espinescente e não o atrai; repulsa-o com as folhas urticantes, com o espinho, com os gravetos estalados em lanças, e desdobra-se-lhe na frente léguas e léguas, imutável no aspecto desolado; árvore sem folhas, de galhos estorcidos e secos, revoltos, entrecruzados apontando rijamente no espaço ou estirando-se flexuosos palo solo, lembrando um bracejar imenso, de tortura, da flora agonizante…

p. 38

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O SERTANEJO

O sertanejo é antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.

A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempeno, a estrutura corretíssima das organizações atléticas. [...] Este contraste impõe-se ao mais leve exame. Revela-se a todo momento, em todos os pormenores da vida sertaneja – caracterizado sempre pela intercadência impressionadora entre extremos impulsos e apatias longas.

p.92-93

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A GUERRA

―Decididamente era indispensável que a campanha de Canudos tivesse um objetivo superior à função estúpida e bem pouco gloriosa de destruir um povoado dos sertões. Havia um inimigo mais sério a combater, em guerra mais demorada e digna. Toda aquela campanha seria um crime inútil e bárbaro, se não aproveitassem os caminhos abertos à artilharia para uma propaganda tenaz, contínua e persistente, visando trazer para o nosso tempo e incorporar à nossa existência aqueles rudes compatriotas retardatários.

p.405

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1. Por que se pode afirmar que a estrutura da

obra se prende aos modelos naturalistas de

análise do comportamento humano?

2. Considerando a visão do autor, de não aceitar a

versão oficial do Exército de que Canudos era

um foco monarquista: quais são as causas desse

fenômeno social?

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(ENEM 2013) Os elementos da paisagem descritos no texto correspondem a aspectos biogeográficos presentes na

A composição de vegetação xerófila.

B formação de florestas latifoliadas.

C transição para mata de grande porte.

D adaptação à elevada salinidade.

E homogeneização da cobertura perenifólia.

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Com o café dá-se uma cousa interessante. O café é tido como uma das maiores riquezas do

país; entretanto é uma das maiores pobrezas. Sabem por quê? Porque o café é o maior "mordedor" das

finanças da Bruzundanga.

Eu me explico. O café, ou antes, a cultura do café é a base da oligarquia política que domina a nação. A

sua árvore é cultivada em grandes latifúndios pertencentes a essa gente, que, em geral, mal os

conhece,[...].

Os proprietários dos latifúndios vivem nas cidades, gastando à larga, levando vida de

nababos e com fumaças de aristocratas. Quando o café não lhes dá o bastante para as suas imponências

e as da família, começam a clamar que o país vai à garra; que é preciso salvar a lavoura; que o café é a

base da vida econômica do país; e — zás — arranjam meios e modos do governo central decretar um

empréstimo de milhões para valorizar o produto.

A riqueza mais engraçada da Bruzundanga é a borracha. De fato, a árvore da borracha é

nativa e abundante no país. Ela cresce em terras que, se não são alagadiças, são doentias e infestadas

de febres e outras endemias. A extração do látex é uma verdadeira batalha em que são ceifadas

inúmeras vidas. É cara, portanto. Os ingleses levaram sementes e plantaram a árvore da borracha nas

suas colônias, em melhores condições que as espontâneas da Bruzundanga. Pacientemente, esperaram

que as árvores crescessem; enquanto isto, os estadistas da Bruzundanga taxavam a mais não poder o

produto.

Durante anos, essa taxa fez a delícia da província dos Rios. Palácios foram construídos,

teatros, hipódromos, etc.

Das margens do seu rio principal, surgiram cidades maravilhosas e os seus magnatas faziam

viagens à Europa em iates ricos. As cocottes caras infestavam as ruas da cidade. O Eldorado...

Veio, porém, a borracha dos ingleses e tudo foi por água abaixo, porque o preço de venda da

da Bruzundanga mal dava para pagar os impostos. A riqueza fez-se pobreza...

BARRETO, Lima.. Os Bruzundangas, p.47-48.

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PRÉ-MODERNISMO

• Século XX: coexistência de manifestações que

davam continuidade à arte do século anterior;

• Revisão do nacionalismo;

• Crítica da organização social do país (Exército,

administração das cidades, políticas agrícolas).

• Consolidação da república e pela política do ―café

com leite‖

• Prosperidades X contradições

• Lima Barreto; Euclides da Cunha; Augusto dos

Anjos.

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• Artificialismo das classes superiores

• Novo posicionamento das camadas populares

Não foi inútil a espionagem. Sentado no sofá, tendo ao lado o tal sujeito, empunhando o "pinho" na posição de tocar, o major, atentamente, ouvia: "Olhe, major, assim". E as cordas vibravam vagarosamente a nota ferida; em seguida, o mestre aduzia: "É 'ré', aprendeu?" Mas não foi preciso pôr na carta; a vizinhança concluiu logo que o major aprendia a tocar violão. Mas que coisa? Um homem tão sério metido nessas malandragens!

—Policarpo, você precisa tomar juízo. Um homem de idade, com posição, respeitável, como você é, andar metido com esse seresteiro, um quase capadócio — não é bonito!

- Mas você está muito enganada, mana. É preconceito supor-se que todo homem que toca violão é um desclassificado. A modinha é a mais genuína

expressão da poesia nacional e o violão é o instrumento que ela pede. Nós é que temos abandonado o gênero, mas ele já esteve em honra, em Lisboa, no século passado, com o Padre Caldas, que teve um auditório de fidalgas. Beckford, um inglês notável, muito o elogia.

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FUGA DO ESTETICISMO

• Optaram por uma linguagem mais direta e próxima da

realidade, (Monteiro Lobato e Lima Barreto).

• Euclides da Cunha: linguagem formal e rebuscada.

• Augusto dos Anjos: orientações simbolistas associadas a

outras tendências.

Linguagem vaga, fluída;

Presença abundante de metáforas, aliterações, assonâncias,

sinestesias;

Subjetivismo

Antirracionalismo

Misticismo, religiosidade

Desejo de transcendência, de integração cósmica

Interesse pelo noturno, pelo mistério e pela morte

Interesse pelas áreas desconhecidas da mente humana (inconsciente e

o subconsciente) e a loucura.

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Pintura acadêmica Pintura dadaísta

SILVA, Oscar Pereira da. Retrato do arquiteto Ramos de Azevedo, 1929.

PICABIA, Francis. Parada

amorosa, 1917

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MANIFESTAÇÕES DO MODERNO

• ―vanguarda‖: avant-garde, designa a parte da

tropa que, numa batalha, seguia à frente de todo o

pelotão.

• Caráter combativo das vanguardas – abertura de

novas possibilidades artísticas.

• Radicalizar as experiências formais: romper com

a sintaxe e a coerência.

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CUBISMO (1907)

Proposta de ruptura com os conceitos de proporção e perspectiva, exigia um público participativo.

• Decomposição do objeto;

• Simultaneidade;

• Valorização de formas geométricas;

• Recorte e montagem.

Les demoiselles d’Avignon.Pablo Picasso

Page 32: LITERATURA AUTONOMIA E COMPETÊNCIA EXPRESSIVA · O BRASIL REPUBLICANO: CONFLITOS E CONTRASTES A Proclamação da República, em 1888, não representou uma mudança grande no cenário

Mulher chorando.

Pablo Picasso.

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DESDOBRAMENTO NA LITERATURA

hípica

Saltos records Cavalos da Penha Correm jóqueis de higienópolis Os magnatas As meninas E a orquestra toca Chá Na sala de cocktails (Oswald de Andrade)

• Fragmentação da realidade,

• predominância de substantivos,

• flashes cinematográficos.

São José del Rey

Bananeiras

O sol

O cansaço da ilusão

Igrejas

O ouro da serra de pedra

A decadência

(Oswald de Andrade)

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FUTURISMO (1909)

Arte agressiva que propunha a destruição violenta

das tradições.

Corrente de cachorro em movimento,

Giacomo Balla.

.

Nu descendo a escada, Duchamp, 1912.

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Ode ao burguês

Eu insulto o burguês! O burguês-níquel, o burguês-burguês! A digestão bem-feita de São Paulo! O homem-curva! O homem-nádegas! O homem que sendo francês, brasileiro, italiano, é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Eu insulto o burguês-funesto! O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições! Fora os que algarismam os amanhãs! Olha a vida dos nossos setembros!

Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio! Morte ao burguês de giolhos, cheirando religião e que não crê em Deus! Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico! Ódio fundamento, sem perdão! Fora! Fu! Fora o bom burguês!...

(Mário de Andrade, IN: Paulicéia desvairada)

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EXPRESSIONISMO (1910)

Declínio do mundo burguês, função combativa. Seu

processo criativo previa a perda do controle do consciente.

• A arte é expressão dos sentimentos;

• A arte se desvincula do conceito de belo e feio, torna-se

uma forma de contestação.

• A intimidade e a vivência da dor derivam do

sentido trágico da vida e causam uma

deformação significativa, torturada.

• Uso de cores expressivas

• Reflete a crise de consciência gerada pela I Grande

Guerra.

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O grito (1893), de Munch. ―Certa noite,

eu caminhava por uma via, a cidade de

um lado e o fiorde embaixo. Sentia me

cansado doente, o sol de punha e as

nuvens tornavam-se vermelho-sangue.

Senti um grito passar pela natureza;

pareceu-me ter ouvido o grito. Pintei esse

quadro, pintei as nuvens como sangue

real. A cor uivava.‖

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Os comedores de batata, Van Gogh.

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Aos emudecidos (Georg Trackl)

Oh a loucura da grande Cidade, quando à noite junto ao muro negro aleijadas árvores se erguem boquiabertas,

E por uma máscara de prata o Espírito do Mal se ri; a luz com flagelo magnético a pétrea noite expulsa. Oh, o submerso dobrar dos sinos pelo anoitecer.

Prostituta, que em convulsões de gelo pares uma criança morta. A ira de deus chicoteia a fronte do homem possesso, purpúrea pestilência, fome, verdes olhos quebra. Oh, o horrendo riso do ouro.

Mas quieta na caverna escura uma humanidade mais silente sangra, forja no duro metal a redentora cabeça.

• Linguagem fragmentada, elíptica, constituída por frases nominais; despreocupação formal.

• Visam combater a fome, a inércia e os valores do mundo burguês.

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DADAÍSMO (1916)

• Nonsense, abolição da lógica, negava toda a

premeditação da composição artística.

• ―Será arte tudo o que eu disser que é arte‖ Duchamp.

• Orientação anarquista e niilista

• Na literatura, agressividade, pela improvisação, pela

rejeição ao equilíbrio, livre associação de palavras.

Ready made

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LEIRNER,Tronco com cadeira,1964.

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SURREALISMO (1924)

• Estimulado pela psicanálise, elementos do sonho, da

loucura e dos impulsos sexuais.

• Escrita automática e o imaginário extraído do sonho

• Uma arte livre da razão (ilogismo, hipnose, humor

negro, inusitado)

• Na literatura: interesse pelos mitos e sonhos, imagens

oníricas, metáforas surreais, anticonvencionalismo.

Um elefante

caiu do teto

Mário Quintana

Pré- história

Mamãe vestida de rendas

Tocava piano no caos.

Uma noite abriu as asas

Cansada de tanto som,

Equilibrou-se no azul,

De tonta não mais olhou

Para mim, para ninguém!

Cai no álbum de retratos.

Murilo Mendes

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A LINGUAGEM MODERNISTA

- Aproximação da linguagem literária com a língua

falada;

- Temas voltados para a exploração do cotidiano;

- Predominância do verso livre;

- O desejo e a busca de uma expressão artística nacional;

- A renovação dos meios e das formas de fazer e

consumir arte.

• No Brasil, a todas essas tendências chamou-se

Modernismo.

• Segundo Antonio Candido, a orientação que marcou a

transição da literatura ainda presa ao beletrismo

parnasiano para as experimentações formais e a

renovação temática modernista – variou dialeticamente

entre o localismo e o cosmopolitismo.

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“Se na Europa as vanguardas conviviam com uma

sociedade de tradição racionalista, em estágio

industrialização avançada, com poderosa burguesia e

em meio à convulsão bélica, os ecos que penetram no

Brasil interagem com um país de tradição colonialista,

largas faixas latifundiárias, de incipiente industrialização,

desenvolvimento desigual e alto hibridismo cultural”.

(HELENA, 1989. p. 41).

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Manifestado especialmente pela arte, mas manchando também com violência os costumes sociais e políticos, o movimento modernista foi o prenunciador, o preparador e por muitas partes o criador de um estado de espírito nacional. A transformação do mundo com o enfraquecimento gradativo dos grandes impérios, com a prática europeia de novos ideais políticos, a rapidez dos transportes e mil e outras causas internacionais, bem como o desenvolvimento da consciência americana e brasileira, os progressos internos da técnica e da educação, impunham a criação de um espírito novo e exigiam a reverificação e mesmo a remodelação da inteligência nacional. Isto foi o movimento modernista, de que a semana de arte moderna ficou sendo o brado coletivo principal.(p. 231)

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CARACTERÍSTICAS DA LINGUAGEM MODERNISTA

• Fragmentação e flashes cinematográficos

O capoeira (p.34)

• Síntese

AMOR

Humor

Oswald de Andrade

• Busca de uma língua brasileira

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros

Vinha da boca do povo na língua errada do povo

Língua certa do povo

Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil

Ao passo que nós

O que fazemos

É macaquear

A sintaxe lusíada (MB)

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• Nacionalismo

―Meu avô foi buscar prata

mas a prata virou índio.

Meu avô foi buscar índio

mas o índio virou ouro.

Meu avô foi buscar ouro

mas o ouro virou terra.

Meu avô foi buscar terra

mas a terra virou fronteira.

Meu avô ainda intrigado

foi modelar a fronteira:

E o Brasil tomou forma de harpa‖

(Cassiano Ricardo)

• Ironia, humor, piada, paródia

senhor feudal

Se Pedro Segundo

Vier aqui

Com história

Eu boto ele na cadeia.

• Temas do cotidiano

Então me levantei,

Bebi o café que eu mesmo preparei,

Depois me deitei novamente, acendi um

cigarro e fiquei pensando...

- Humildemente pensando na vida e nas

mulheres que amei.

• Urbanismo

Os caminhões rodando, as carroças

rodando,

rápidas as ruas se desenrolando,

rumor surdo e rouco, estrépitos, estalidos...

E o largo coro de ouro das sacas de café!...

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Semana de Arte Moderna (1922)

1) Representou a confluência das várias tendências de

renovação;

2) Chamou atenção dos meios artísticos ao mesmo

tempo em que aproximou os artistas;

3) Troca de ideias e técnicas.

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• Paranóia ou mistificação? Monteiro Lobato

Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêem normalmente as coisas e em consequência disso fazem arte pura, guardando os eternos ritmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres [...]. A outra espécie é formada pelos que vêem anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro [...].

Estas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso e companhia. Essa artista possui um talento vigoroso, fora do comum. Poucas vezes, através de uma obra torcida para má direção, se notam tantas e tão preciosas qualidades latentes. Percebe-se de qualquer daqueles quadrinhos como a sua autora é independente, como é original, como é inventiva, em que alto grau possui um sem-número de qualidades inatas e adquiridas das mais fecundas para construir uma sólida individualidade artística. Entretanto, seduzida pelas teorias do que ela chama arte moderna, penetrou nos domínios dum impressionismo discutibilíssimo, e põe todo o seu talento a serviço duma nova espécie de caricatura.

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1ª GERAÇÃO

- Tentativa de solidificação do movimento e pela divulgação das ideias modernistas.

- Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Manuel Bandeira.

- Promover uma visão crítica do país e suas tradições culturais;

Pronominais Dê-me um cigarro Diz a gramática Do porfessor e do aluno E do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro

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OSWALD DE ANDRADE

Estilo crítico e irônico; nacionalismo crítico; poemas piadas; romances com estruturas inovadoras.

Brasil

O Zé Pereira chegou de caravela E preguntou pro guarani da mata virgem — Sois cristão? — Não. Sou bravo, sou forte, sou filho da Morte Teterê Tetê Quizá Quizá Quecê! Lá longe a onça resmungava Uu! ua! uu! O negro zonzo saído da fornalha Tomou a palavra e respondeu — Sim pela graça de Deus Canhém Babá Canhém Babá Cum Cum! E fizeram o Carnaval

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Pobre alimária

(Oswald de Andrade)

o cavalo e a carroça

estavam atravancados no trilho

e como o motorneiro se impacientasse

porque levava os advogados para os escritórios

desatravancaram o veículo

e o animal disparou

mas o lesto carroceiro

trepou na boleia

e castigou o fugitivo atrelado

com um grandioso chicote

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"De tal modo o estranhamento se impunha e era difuso, que envolvia a própria identidade da cidade. Afinal, São Paulo não era uma cidade nem de negros, nem de brancos e nem de mestiços; nem de estrangeiros e nem de brasileiros; nem americana, nem européia, nem nativa; nem era industrial, apesar do volume crescente das fábricas, nem estreposto agrícola, apesar da importância crucial do café; não era tropical, nem subtropical; não era ainda moderna, mas já não tinha mais passado. Essa cidade que brotou súbita e inexplicavelmente, como um colossal cogumelo depois da chuva, era um enigma para seus próprios habitantes, perplexos, tentando entendê-lo como podiam, enquanto lutavam para não serem devorados". (SEVCENKO, p. 31)

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MÁRIO DE ANDRADE

- Critica os valores burgueses; pesquisa estética e cultural; narrativa experimental; erudição.

INSPIRAÇÃO São Paulo! comoção da minha vida... Os meus amores são flores feitas de original... Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e Ouro... Luz e bruma... Forno e inverno morno... Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes... Perfumes de Paria... Arys! Bofetadas líricas no Trianon... Algodoal! São Paulo! comoção de minha vida... Galicismo a berrar nos desertos da América!

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MANUEL BANDEIRA

Poeta do cotidiano humilde; fusão do lírico com o biográfico; diálogo com a tradição; lirismo intenso.

Pneumotórax Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: — Diga trinta e três. — Trinta e três . . . trinta e três . . . trinta e três . . . — Respire. ............................................................................................................... — O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado. — Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax? — Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.

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Porquinho-da-Índia Quando eu tinha seis anos Ganhei um porquinho-da-índia. Que dor de coração me dava Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão! Levava ele prá sala Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos Ele não gostava: Queria era estar debaixo do fogão. Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas . . . — O meu porquinho-da-índia foi minha primeira namorada.

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O que eu adoro em ti

Não é a tua beleza

A beleza é em nós que

existe

A beleza é um conceito

E a beleza é triste

Não é triste em si

Mas pelo que há nela

De fragilidade e incerteza

O que eu adoro em ti

Não é a tua inteligência

Não é o teu espírito sutil

Tão ágil e tão luminoso

Ave solta no céu matinal

da montanha

Nem é a tua ciência

Do coração dos homens e

das coisas.

O que eu adoro em ti

Não é a tua graça musical

Sucessiva e renovada a

cada momento

Graça aérea como teu

próprio momento

Graça que perturba e que

satisfaz

O que eu adoro em ti

Não é a mãe que já perdi

E nem meu pai

O que eu adoro em tua

natureza

Não é o profundo instinto

matinal

Em teu flanco aberto como

uma ferida

Nem a tua pureza. Nem a

tua impureza.

O que adoro em ti lastima-

me e consola-me:

O que eu adoro em ti é a

vida!