linha de pensamento mítico da grécia arcaica

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Nerize Portela Madureira Leoncio 1 Filosofia I – Resumo Histórico. Linha de pensamento mítico da Grécia arcaica Sobre as lógicas: 1. lógica dos contrários complementares- pensamento mítico religioso 2. lógica dos contrários contraditórios – sofistas 3. lógica da Unidade – seitas filosófico-religiosas 4. lógica da Identidade- Filosofia de Parmênides Sistemas: 1. Sistema palaciano – 1º momento Anax (Soberano) (poetas/profetas/escribas) Guerreiros Basileus Camponeses Mestres da Verdade: Rei de justiça (soberano) – Rei é o pastor dos Homens- Função de soberania- inseparável da organização do mundo, dimensão da potencia cósmica, possui talismãs que garantem sua relação com os Deuses, detentor e distribuidor das riquezas, favorece a fecundidade do solo e rebanhos, distribui os bens, algumas vezes é mago. O Anáx centraliza os poderes, econômicos, religiosos, e políticos. Manutenção da ordem e da justiça (Dike), se dela se esquece, o caos e a desordem tomam conta; Decreta a verdade (thémistes), e leva seu cetro, prova de autoridade. Sua força no Anáx era maior porque estabelecia a ordem do cosmos; Algumas vezes também tinha poderes de adivinho (Minos). Rei é um mestre da verdade na Grécia arcaica, pois traduz a mesma através das potencias divinas, do Ancião do Mar, cuja Alethéia se define pela aplicação de julgamentos ordálicos. A verdade é inseparável de certos homens, e seu papel na sociedade grega. Poetas – Interprete de Mnemosýne, instrumento das Musas. Função Soberana (Mito de Soberania): explica porque o rei esta no topo, legitima o poder do Rei; Função dupla: celebra os imortais e relata as façanhas dos homens corajosos 1 Graduanda em Artes Visuais da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Colegiado de Artes Visuais do Centro de Artes, Humanidades e Letras – Cachoeira-Ba.

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Page 1: Linha de pensamento mítico da grécia arcaica

Nerize Portela Madureira Leoncio1

Filosofia I – Resumo Histórico.

Linha de pensamento mítico da Grécia arcaica

Sobre as lógicas:

1. lógica dos contrários complementares- pensamento mítico religioso2. lógica dos contrários contraditórios – sofistas3. lógica da Unidade – seitas filosófico-religiosas4. lógica da Identidade- Filosofia de Parmênides

Sistemas:

1. Sistema palaciano – 1º momento Anax (Soberano) (poetas/profetas/escribas)

Guerreiros

Basileus

Camponeses

Mestres da Verdade:

Rei de justiça (soberano) – Rei é o pastor dos Homens- Função de soberania- inseparável da organização do mundo, dimensão da potencia cósmica, possui talismãs que garantem sua relação com os Deuses, detentor e distribuidor das riquezas, favorece a fecundidade do solo e rebanhos, distribui os bens, algumas vezes é mago. O Anáx centraliza os poderes, econômicos, religiosos, e políticos. Manutenção da ordem e da justiça (Dike), se dela se esquece, o caos e a desordem tomam conta; Decreta a verdade (thémistes), e leva seu cetro, prova de autoridade. Sua força no Anáx era maior porque estabelecia a ordem do cosmos; Algumas vezes também tinha poderes de adivinho (Minos). Rei é um mestre da verdade na Grécia arcaica, pois traduz a mesma através das potencias divinas, do Ancião do Mar, cuja Alethéia se define pela aplicação de julgamentos ordálicos. A verdade é inseparável de certos homens, e seu papel na sociedade grega.

Poetas – Interprete de Mnemosýne, instrumento das Musas. Função Soberana (Mito de Soberania): explica porque o rei esta no topo, legitima o poder do Rei; Função dupla: celebra os imortais e relata as façanhas dos homens corajosos

1 Graduanda em Artes Visuais da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. Colegiado de Artes Visuais do Centro de Artes, Humanidades e Letras – Cachoeira-Ba.

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(dualidade). Aprendizagem e preparação, improvisação, técnicas de dicção, exercícios mnemotécnicos, repetição e memorização nas confrarias de aedos.

Adivinhos – responde questões do futuro, vidência, ver o invisível, revelação divina por meio de oráculos.

No pensamento arcaico há 3 domínios: poesia, mântica e justiça, funções sociais nas quais a palavra desempenhou papel importante, antes de se tornar autônoma. Poetas e adivinhos tem em comum o dom de vidência, e adivinhos e Reis de Justiça dispõem de um mesmo poder utilizando as mesmas técnicas. Os três revelam-se mestres da Palavra, através da concepção de Alethéia

Sistemas palaciano – 2º momento: (invasão dórica)

Guerreiros/basileus/ Noção de igualdadeAristocratas e poetas

Com a invasão, a pirâmide se dissolve o poder de rei também, mas os basileus conservam alguns privilégios do rei, em ser senhor de justiça, adivinho, consulta a oráculos (através do sono) como concessão de favor aos oficiais. A consulta Oracular mais célebre é a de Trofonios em Lebadia. O cunho adivinhatório tem relação estreita com o poder Político: como em Tebas e Esparta. Passa a haver a noção de igualdade, as potencias temidas são o Louvor e a Censura.

Poetas: Não é mais funcionário da soberania, está a serviço da comunidade. Narra as façanhas dos melhores guerreiros e tem poder de definir seu status na sociedade. Principal preocupação: era a notoriedade. Graças concedidas: Kudos (dom direto de Deus para o Guerreiro, e gloria mesmo após sua morte) e Kléos (gloria que passa de boca em boca);

Guerreiros: as Musas - função importante - sociedade guerreira – civilização EspartaDois valores pelo quais eram obcecados: Kléos (gloria que passa de boca em boca); Kudos (gloria que ilumina o vencedor, graça divina). Sua vitória é favor dos Deuses, a sua façanha apenas toma forma através da palavra de Louvor do poeta. Conferindo Ser, Realidade. Por outro lado a Censura, maledicência – Momos – filho da Noite irmão de Léthe (siliencio), a vida do guerreiro se joga entre estes dois pólos.Neste contexto a palavra é uma faca de 2 gumes:

Alethéia Luz trevas

Vida MortePalavra Silencio

Louvor Censura

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Memória Eternizada EsquecimentoHá uma correlação uma não existe Sem a outra

Palavra:

1. Palavra mágico-religiosa – em Hesíodo: palavra cantada inseparável da memória, palavra de Louvor, tradição puramente oral dos gregos. Só tinham acesso os Mestres da verdade: poetas, adivinhos e reis de justiça. Os poetas inspirados pelas musas, a cantavam para transmitir a Alethéia, sua palavra Laudatória, legitima o poder do rei (mitos de soberania); os reis de justiça para decretar as thémistes (julgamentos que são como oráculos) na manutenção da ordem e justiça; adivinhos: responde a questões do futuro, vidência, ver o invisível; revelações divinas através de consulta a oráculos.Estava conectada ao todo universal, no pensamento mítico religioso, através de Alethéia, se funde com os gestos, atitude corporal confere potência a palavra, ritual. A palavra estava sujeita a não-realização, era considerado mero acidente, não havia falso, mentira, persuasão, simplesmente acaso, palavra vazia, inútil, ineficaz, inexistente.Palavra verídica – Phísis – Natureza / Verdade = RealTrês aspectos: idêntica ao que é verdadeiro, eficácia, uma potencia realizadora, força inseparável de uma ação: Ato divino; Ação atemporal, não se dá no tempo, atos eternos, engloba o que foi o que é, e o que será; não é a expressão de uma vontade pessoal, e sim expressão do real segundo as potencias divinas, função social.Dupla relação: conhecimento – real – verdadeiro – Louvor – Mnemosyne- Alethéia – Dike:

Comunicação – intervenção das potencias divinas – Pistis/peithó/apate

1. Pistis – é a confiança fé do interlocutor na palavra eficaz, na verdade dos Deuses. (positiva +).

2. Peithó – persuasão, a doçura mágica, revestir a palavra de encantamento, sedução e charme, potencia feminina, benéfica ou maléfica (ambígua). (ambígua -) relação com Léthe.

3. Apáte – é o engano, nos separa ou nos aproxima da verdade. A elevação do engano a décima potencia, é considerada como eficácia da comunicação. È preciso gerar o esquecimento para que a verdade seja comunicada e absorvida. (ambígua -)

Aletheia -Dike_____________________Lethe - Peitho/Apate (+) dupla relação (-) Pístis Peitho (ponte)

Esquecimento-sono – Hypnos - esquecimento-morte – Thanatos (negro)Apaziguadora, alegria, amor malefica, astuciosa, violenta Afrodite, luz, sedução, suave Apáte engano, duplicidade, Noite, Hermes

Os Deuses, mestres da verdade, conhecem a Verdade, mas também conhecem a arte de enganar, o mundo divino é fundamentalmente ambíguo, correspondendo a dualidade do

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humano. As musas, sabem dizer a Alethéia, mas também a Apáte. Lógica do mito: Pares correspondente: Memória/esquecimento; Louvor/censura; Dia/Noite.

2. Palavra diálogo (1) – se desenvolveu simultaneamente, é contraria a mágico religiosa, laicizada, autônoma, esta inscrita no tempo, precede a ação, sendo-lhe complementar, se estende a uma coletividade, neste caso, o grupo dos guerreiros aristocráticos, atende a interesses de guerra, era utilizada em 3 instituições: A partilha do Butim – divisão e distribuição de prêmios e pilhagens. Jogos funerários -Assembléias deliberativas- espaço material dos Jogos, centrado, dispostos em círculo, os prêmios, a partilha do butim eram depositados no centro; a palavra era proferida no centro da Ágora, e com o cetro lhe conferem autoridade, soberania impessoal do grupo. O centro, portanto, tinha a função de tornar comum, os interesses do grupo: definindo-se um espaço organizado pré-político, onde todos tinham direito à palavra, que era:Simétrica – publicidade – tornar publicaHorizontal – igualdade - semelhançaReversível – reversibilidade – comunidade

Lei comum- nomos – IsonomiaIgualdade perante a lei – Isocracia Igualdade perante a palavra – isegoria

Ponto de partida para o processo de laicização e democratização da palavra, que não é mais privilégio de um homem excepcional e sim a linguagem como instrumento de um grupo. Neste momento surge a noção de persuasão, aquele que sabe emitir opiniões, se faz ouvir. Primeira forma de retórica. Nestas assembléias preparam-se as futuras assembléias políticas da Grécia. É utilizada pelos guerreiros ate a reforma Hoplita, quando os privilégios são estendidos aos cidadãos- através da democratização da função guerreira; esta reforma e o nascimento da cidade grega estão vinculados à ruptura com o pensamento religioso, e construção de um pensamento racional, secularização da forma de pensamento. O declínio da palavra mágico-religiosa coincide com a reforma do direito, onde o julgamento de caráter ordálico dá espaço para a discussão ao diálogo.

Palavra diálogo (2) Sofistas – democracia – 1ª linha de evolução: 1) Nova poesia com a nova cidade. Simônides de Céos - precursor da sofistica, característica da sua poesia: poesia líricas (fala do eu); reconhecimento da poesia, como uma arte da ilusão através da pintura e de seu valor comercial, sua poesia era a arte do engano. A palavra não se confunde com o real, é uma imagem da realidade, mudança na significação das estátuas, o poeta se reconhece por sua palavra (poesia), como agente, criador. não tem função de comunicar, mas sim seduzir, encantar o interlocutor (arte do engano); domínio da ambigüidade da palavra, por isso tinham um bom discurso; Doxa- cultivo de antíteses, coisas opostas, jogo da ambigüidade, retórica; A opinião é a forma de conhecimento que convém ao mundo da mudança, movimento, da ambigüidade e da contingência, tem valor importantíssimo nesta democracia, instável, ambígua, contingente, frágil, intermediaria, oscilante,

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manipulável, saber inexato de coisas inexatas; a idéia de uma escolha que varia em função da situação, como tirar partido de situações em seu beneficio; não é vinculada ao tempo real e sim ao tempo individual; este saber não procura estabelecer a objetividade, ela é incapaz de estabelecer a verdade (epistéme). Quebra da estrutura – a lógica dos contrários complementares deixara de existir.A PALAVRA: conhecimento

Comunicação – sofistas – Pistis / Peithó / Apate

3. Palavra diálogo – 2ª linha de revolução palavra diálogo – também utilizadas nas seitas, em reuniões, onde havia conversações, com objetivo de encontrar a verdade através da unidade. A verdade não é mais transmitida pelos Deuses, nem poetas (laicização). Tentam se afastar da ambigüidade, eles atribuem aos sofistas a negatividade.A PALAVRA: conhecimento – amor a verdade/educação/Aléthe/Dike/Pístis

Comunicação – negação – ambigüidade – Prazer

4. Palavra diálogo – Parmênides de Eléia – o princípio de identidade se estabelece quando há uma relação de igualdade entre o sujeito e o predicado (A é A). As proposições devem ser idênticas para haver verdade, do contrario ela é uma contradição.

Memória/Alethéia/tempo:

1.2 Mnemosýne: Memória para os gregos (não como reconstrução do passado, numa perspectiva temporal) é sacralizada, onisciência de caráter adivinhatório, poder de rememoração do passado atemporal, potencia religiosa que confere ao verbo o estatuto da palavra mágico-religiosa deusa titã, mãe das musas, divindade, onisciência divina, decifra o invisível, geografia sobrenatural, ponte entre passado e presente, evocação da verdade, pelos poetas, transmitida na palavra cantada. Anámnesis – mistério revelado pelas Musas, em Hesíodo, espécie de iniciação da reminiscência: a visão dos tempos antigos libera-o dos males do tempo presente, escapa o tempo da miséria e da angustia (5ª raça-humana), a rememoração do passado carece do esquecimento do tempo presente. Oráculo de Lebadéia (Trofônios de Lebadia) – iniciação do adivinho através do sono (Etálida, Tirésias e Anfiarau), após um ritual e sacrifícios, descida ao Hades – o consultante bebia da fonte de Léthe – esquecendo-se da sua vida humana, e em seguida de Mnemosýne – guardando a memória do outro mundo. O contato com o além lhe trouxe a revelação do passado e futuro. Esquecimento- água de morte, a Memória – fonte de imortalidade. Mnemosýne neste ritual- função de revelar o que foi e o que será (parente da musa em Hesíodo, inspiração poética); associada a Léthe é força infernal, oferece ao iniciado acesso ao além (mundo dos mortos). Em virtude da Água de Memória o consultante se beneficia do estatuto de um adivinho: se torna um vivo dentre os mortos. Como Tirésias e Anfiarau. Neste momento a Alethéia judicial ganha sua significação.

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1.3 Alethéia: Verdade para os gregos concedida através de Mnemosýne e as Musas, por intermédio dos Poetas, através da Palavra cantada. As musas dizem o que é o que foi e o que será, palavras da Memória. Memória e Alethéia tem a mesma representação. Segundo registro de Hesíodo: a Alethéia toma significado: Louvor e a Censura (elogio x crítica). Alethéia é triunfante solidária ao Louvor, opõe-se a Léthe e a Momos, luz, o poeta capaz de vê-la é um mestre da verdade. Verdade – arte – religião são indissociáveis. Mas para os gregos Alethéia não é um conceito, é uma potencia divina. Está conectada com o real.Ancião do Mar: Nereu – benigno e nemertés, apseudés e alethés, a Alethéia abrange dois domínios: mântica e da Justiça. A função primeira esta ligada ao saber mântico que confere a Alethéia predomínio da verdade, Nereu é mestre de Alethéia, possui saber oracular. A segunda confere a ele a equidade, pensamentos justos e benignos, é um Justiceiro. Afinidade entre Alethéia e Dike, seus campos não são distintos, Alethéia são as coisas de Dike, potências equivalentes, uma não existe sem a outra. Não há distancia entre Verdade e Justiça. A justiça tem caráter ordálico: recorre a adivinhação e ao uso do mar justiceiro para encontrar respostas, através de provas, para se retornar dele é preciso do consentimento dos deuses. O ancião do mar encarna a forma da justiça, pois assume o papel dos deuses-rios da Anatólia e Mesopotâmia; ou através da balança, presidida por um personagem real, e pelo signo de Alethéia. Ela representa tanto as funções econômicas: judicial – através do pronunciamento de veredicto ganhavam talentos de ouro quem acertasse. O veredicto final era dado por Zeus, decidindo a sorte de uma batalha ou de guerreiro; instrumento de medida de todos os foros: tributo, olhos do rei, justiça divina. Duas formas de Justiça do rei mítico: pela água e pela balança.As formas de justiça trazem uma nova instituição: a função de soberania, relacionadas ao ancião do Mar: principio de autoridade dos homens idosos. Nereu é doce, benévolo, pai de família. Função de soberania: Nereu – mestre da verdade – Alethéia – Justiça – função de Soberania – Rei Mítico.Alethéia – Mnemosýne _________oposição_________Lethe (equivalentes) complementares Onisciência Passado/presente/futuro

Ancião do MarVerídico/ Alethes/Thémistes Palavras enganosas/esquecimento Justiça/benevolente/saber mântico Velhice maldita/Vidência

A alethéia no Ancião do Mar: seu conteúdo deixa de ser a palavra cantada, são procedimentos adivinhatórios, e modos de Justiça, através dos julgamentos ordálico a verdade se veicula através do Rei.

1.4 Tempo: os poetas orientavam-se pelo passado (tempo antigo, idade primordial) como um tempo presente imediato (atemporal) através da memória eles têm o conhecimento do que é do que foi e do que será como um tempo absoluto mítico, o passado histórico não tem relevância, o tempo que muda não era refletido. Não há cronologia, e sim genealogia, e cosmologia o tempo se estabelece pela sucessão de raças, e origem do cosmos. O tempo antigo ainda

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subsiste, e com ele seus deuses: Olímpicos (ordem) e Titãs (desordem). O passado e parte do cosmo, dimensão do além, evocado através de Mnemosýne.

2. Alethéia: Simonide de Céos - por sua obra há uma desvalorização de Alethéia. Afirma-se um mestre de Apáte. As Musas com ele tornam-se cobiçosas, devido reconhecimento comercial de sua arte. Apesar de romper com Alethéia, ele afirma sua vontade em secularizar a poesia, substituindo um modo de conhecimento excepcional, por um tipo de saber mais político e menos religioso. Alethéia que ele condena não é dos filósofos, mas sim a dos poetas, neste processo de secularização, a revelação poética cede lugar à técnica de fascinação. Ao fazer da memória uma técnica secularizada, ele condena Alethéia e consagra Apáte. Não tem espaço para Alethéia na cidade, mas sim para Doxa. Aletheia se opõe Doxa que é da ordem de Apáte (ambigüidade, engano, dupla) que se opõe a Dike. A Doxa também é regida por Peithó (sedução, instabilidade, retórica). Este é o momento em que o ambíguo separa-se de Alethéia. A sofistica retórica, formas de pensamento direcionadas para a ambigüidade, são também a teoria ou a lógica desta mesma, permitindo agir com eficácia neste plano. A brilhante geração de sofistas do sec. V, são também especialistas na ação política, e inteligência prática. Utiliza-a seus talentos em seu próprio proveito.Sofistas e retóricos são técnicos no logos:contradição de duas teses sobre cada questão (principio de contradição); o lógos nunca visa neste plano dizer a alethéia.Memória: Até Simônides, a memória era função religiosa, privilégio do poeta, aqui ela torna-se uma técnica, uma faculdade psicológica, acessível a todos. Há uma inovação técnica a mnemotécnica, e invenção do alfabeto. Neste plano a antiga relação de Alethéia com a memória, esta definitivamente rompida. Há uma perfeita relação entre a secularização da memória e a desvalorização de Alethéia. A memória, não é mais que uma função secularizada, cujo desenvolvimento é trabalhado tanto na sofistica quanto na política. Ela passa a se desenvolver no tempo, tornando-se qualidade do homem, faculdade mental acessível a todos. Tempo: em Simonides o tempo é prudente, pois é nele que se aprende e se memorizaa noção de tempo do homem é supervalorizada (Kairos) o tempo da ação humana possível é o tempo individual de cada um (percepção fundamental para o encantamento através do jogo de palavras).

PeithóDoxa______oposição_____AlethéiaApáte__________________DikePoesiaPintura

3. Alethéia:Contrários aos sofistas, preocupados com a vida interior e a salvação individual, resgate do mito. Disposição cosmológica, proveniente do pitagorismo: Planície de Alethéia: a verdade está no interior desta planície, há princípios, formas e modelos de tudo o que foi e de tudo que será. À ela se opõe a Planície de Léthe, que traduz a oposição em Platão entre a anámnesis e a ignorância humana. Alethéia esta articulada à memória. Alethéia esta associada a Dike e reforçada por Pístis, a fé no ser. O plano Alethéia-Dike-Pistis está

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radicalmente separado de Lethe-Peithó. Nas seitas o pensamento e dicotômico radicalmente dividido, o homem não vive mais em um mundo onde os contrários são complementares, mas num universo dualista de oposição nítida: Hedoné, e Ponos. A via da salvação é a do esforço (meléte), do exercicio de Memória, a outra é a via do prazer do vicio, esquecimento, a primeira é rude escarpada a outra plana e fácil, é um pensamento de alternativa. A evolução de Alethéia nos meios filosóficos religiosos é complementar àquela que desenvolvem os sofistas. Pois a Alethéia aqui tem o mesmo papel absoluto que possui Apáte para os últimos. Mas ao contrario dos sofistas, nas seitas o mundo da ambigüidade não é negado, aqui é um universo de escolha. A Alethéia não é mais uma potencia eficaz, e sim um plano do real. Prefiguração do Ser, do Um, ao se opor a tudo que é duplo, ambíguo. Nas seitas a distancia entre os deuses e homens se agravam, Alethéia não esta mais ligada a função social, o mago aqui é individuo, e sente o que faz dele uma exceção aos homens.

Aléthe – Dike – Ponos (amor à verdade) – Ponidéia- educação é a ponte entre Esquecimento e verdade – Via de Salvação da Alma.

AbismoLethePeithó – Apáthe – Hedoné – Afastamento, ambigüidade, prazer, esfera humana

Vida, existência, Devir (tempo).

Mnemosýne: O pensamento filosófico religioso é obcecado pela salvação da alma, o tempo humano. Só uma vida regrada, permite ao iniciado beber da fonte da Memória, que irá purificá-lo do tempo, consagrando-o ao divino. Existe a crença na reencarnação da alma, que é lançada na planície de Alethéia, e no corpo esquecia-se de tudo (alma esburacada) de todas as verdades. A salvação da alma e do ciclo de reencarnação só é conseguida através do conhecimento, da unidade, do isolamento interior, por isso, o afastamento dos prazeres e da cidade onde tudo é ambíguo, contraditório. Refugio às periferias, como forma de alcançar a verdade não por meio dos Deuses, mas por meio do conhecimento, o saber. Em Hesíodo a crença ia do mito do caos a unidade de Soberania; aqui se figura da Unidade (interior / conhecimento) à degradação ou caos. A memória aqui se constitui como ultimo elo da cadeia de reencarnações, é a água de vida tomada na fonte de Mnemosýne. È a vitoria sobre o tempo e morte, fonte do saber. Deusa, ela permite acesso as faculdades mentais do homem, ao poder de rememoração: anámnesis. Tempo: a vida terrestre está engrenada pelo tempo, sinônimo de morte e esquecimento, através do qual é jogado no mundo de Léthe. Para transcender o tempo humano, é necessário afastamento interiorização e isolamento na busca do conhecimento, e técnicas e exercícios de memória, vida regrada, visando liberar a alma dos laços corporais.

4. Parmênides de Eléia- filósofo do Ser. Alethéia se inscreve na linha de tradição Hesiodica do pensamento religioso. A problemática do ser surge na problemática das relações palavra-realidade. A verdade está articulada a dike, como o rigor do pensamento. A reflexão sobre a linguagem como forma de conhecimento do real desenvolve-se em torno da pequena palavra ser. O ser tem uma significação Um, abole a diversidade de significações a pluralidade de predicados. A Alethéia se opõe ao duplo a verdade só é alcançada através da unidade, está ligada às

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faculdades mentais, e não é possível concebê-la no tempo. O pensamento como potência, é capaz de estabelecer a unidade através de princípios de Identidade: se estabelece quando há uma relação de igualdade entre sujeito e predicado. A verdade se dá para Parmênides pela exigência de não contradição. Por isso ela é fixa, demonstração do vínculo entre permanecia e unidade. Diferentemente de seus precedentes, ele e Epimenides, confirmam a ruptura lógica entre pensamento mítico e pensamento racional: o universo de Parmênides é o da escolha. Parmênides não deixa de consagrar a Apate. E ao mesmo tempo a Alethéia conferida pelos Deuses, mas sua verdade submete-se a verificação (exigência de publicidade- regime da cidade) à confrontação. A escolha não tem mais a mesma significação que nas seitas filosóficas, nelas alethéia se opõe inteiramente a Lethe, em Parmênides ela não e mais exclusiva, suas nuanças variam conforme a discussão. A oposição se faz agora entre o ser e o não ser. Os contrários são posto simultaneamente no plano da linguagem, ele confia ao publico um saber, proclamando-o ao mesmo tempo inacessível.Duas vias da verdade para Parmênides:O ser é – Verdade – conhecimento/prazeresO ser não é – Equivale a nada (falso não existe)A verdade dele é a primeira a se abrir a uma confrontação de caráter racional, primeiro esboço de uma verdade objetiva instituída pelo diálogo.Tempo – é impossível conceber a verdade no tempo onde as coisas são múltiplas, o individuo se fragmenta, perdendo sua identidade. Já o pensamento está fora do tempo, por isso só se concebe a verdade através dele. Memória – a memória não é mais necessária para o estabelecimento da verdade, pois a mesma se fragmenta, no tempo. Já o pensamento é imutável.

Reflexões sobre a Alethéia:

A Alethéia é o termo que mais marca a ruptura entre o pensamento mítico e o pensamento racional, de acordo com os tipos de homens e os quadros de pensamento, a sua concepção de verdade. Mas dos mestres da verdade aos filósofos mais abstratos a verdade continua a ser privilegio de determinados tipos de homem, é atributo. A filosofia que se opõe as concepções religiosas tradicionais, apresenta sob alguns aspectos como herdeira do seu pensamento, o inquérito racional desenvolve-se dentro do quadro de pensamento religioso.A relação fundamental de ruptura se desenvolve na solidariedade entre Alethéia e Léthe, ora como contrários antitéticos, ora como complementares. No jogo do verídico e enganoso, a verdade se colore de engano. Na contradição que organiza o plano de pensamento das seitas, o verídico exclui o enganoso. Portanto é na Alethéia que se mede a distância entre dois sistemas de pensamento, ora obedecendo a lógica da ambigüidade, ora a lógica de contradição.Através da secularização da palavra, o advento de novas relações sociais e estruturas políticas inéditas tornaram a Alethéia conceito racional. A exigência de não contradição foi formulada através da instituição, na prática jurídica e política, de duas correntes, dois partidos, que exigiam escolha.

Aspectos míticos da memória II - Platão

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Mnemosíne – Transformou-se, está ligada a historia mítica dos indivíduos e suas reencarnações, não é segredo das origens nem canta o passado, é meio de atingir o fim, interrompendo o ciclo das gerações. Da cosmologia à escatologia, a Terra é agora lugar de provações, não mais o Hades, reino das sombras, ligadas ao esquecimento, morte. As águas de Léthe, não acolhem os que passam da vida para a morte, sim apagam as lembranças daqueles que voltam à terra, agora esquecimento agora é símbolo de vida não mais de morte.Tempo – sobre a Terra reina a lei do devir reiniciando num ciclo de provações onde não há começo nem fim. A alma está presa à roda da fatalidade: dirá Platão: a alma desses infelizes, incapazes por esquecimento, de não deixar escapar seu conteúdo como numa peneira. Atitude de repulsa a existência temporal. A memória é exaltada como força de saída do tempo e volta ao divino.O esquecimento (erro essencial da alma) é a ignorância. A lembrança só é recuperada através de Anamnesis – rememoração. Mito Platônico da Republica: estrada da esquerda – evitar beber da fonte; pela direita: o bom caminho, a fonte de mnemosýne. A alma que toma o caminho da direita é saudada, tendo pagado o preço das ações injustas, livras-se do ciclo de dores.Pindaro e Empédocles: idéias de purificação e expiação da alma.devido a faltas antigas, outras existências. Ao termino da expiação encarnam em reis, sábios, médicos. Pindaro se apresenta como liberto da condição mortal. Ao contrario dos homens de rápido destino, limitados em sua existência nascimento-morte.A evasão dos ciclos dos nascimentos, a salvação da alma, contitui exercício espiritual, o esforço da memória é purificação. Através deste esforço permitimo-nos o conhecimento de nossa psiché, o Daimon encarnado em nós. A purificação da alma por anámnésis, a liberação do corpo que acorrenta ao presente.A anámnesis para:Empédocles: tensão de todas as forças do espírito através da rememoração. O diafragma cuja tensão regula ou mesmo retém a respiração, os elos que unem a alma ao sopro respiratório.Platão: concentração da alma, através de longa data, que contrai-se em si mesma, separando-se do corpo. Lembra a crença onde a alma é dispersada através do corpo, que é introduzida pelos ventos, durante a respiração: o sopro de vida o sopro respiratório. Por isso os exercícios de rememoração exigem técnicas de controle do sopro respiratório, permitindo a alma viajar para o alem e retornar enriquecida por um saber profético.Epimênides: a partir dos ritos de purificação ela lava impurezas, revelados os erros antigos.Anámmésis: confere a historia individual um alcance moral e metafísico, que antes não tinha. A vida representa o ultimo elo que permite a cadeia de reencarnações fechar-se sobre si mesma. A rememoração traz seu objetivo: Juntar o começo ao fim, conquista da salvação. A crença na metempsicose se origina paralelamente ao interesse pela memória, no sentido de rememoração das vidas anteriores.Chronos e a noção de tempo: situado como a origem do cosmos. Da sua semente nascem os elementos antitéticos: ser vivo e noção abstrata. Sendo o inicio das coisas, representa o principio de unidade que transcende os contrários. O tempo sacralizado em chronos é imortal e imperecível não envelhece, sua imagem é uma serpente enrolada em circulo sobre si mesma, um ciclo envolvendo e ligando o mundo, fazendo do cosmo uma esfera única e eterna. Chronos

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apresenta-se na qualidade de principio de unidade e de permanência, negação radical do tempo humano, força de instabilidade e destruição levando ao esquecimento e morte. O tempo ao lado de Mnemosyne torna-se objeto de inquietações quando o domínio de experiência temporal é incompatível com a concepção de um devir cíclico. Essa crise se produz no sec.VII, com o nascimento da poesia lírica, o abandono do ideal heróico, valores ligados a vida afetiva, submetidos aos prazeres. Na concepção arcaica o devir cíclico se enquadrava na concepção de tempo humano. Ao se voltar para sua vida presente, o homem é irresistivelmente arrastado pelo fluxo móvel da vida cambiante, a partir daí o tempo lhe aparece como força de destruição, o tempo humano esvai-se sem retorno, revelando uma ordem cíclica do universo. Nas seitas há uma direção dupla: atitude fortemente negativa em relação a este tempo; de outro um esforço a fim de purificar a existência divina de tudo que a liga há uma forma qualquer de temporalidade. O sempre da vida dos deuses, significa a permanência em um identidade eternamente móvel. A alma que pela anámnesis de suas vidas anteriores souber unir o fim ao começo torna-se semelhante aos astros, ela não procurar o recomeçar sem fim mas evadir-se do tempo pra sempre. A importância dos exercícios de rememoração vem desta necessidade, de transformar esse tempo cíclico da vida individual, em uma totalidade, reintegrando-s na eternidade divina.No pitagorismo a reminiscência é um meio de conhecer-se a si mesmo, saber qual é a nossa alma, reconhecendo-nos pela multiplicidade das nossas reencarnações, essa psiché- apresenta-se sobre a forma de um Daimon, ser sobrenatural, que leva em nos uma existência independente. Se a psiche é mais pura quanto mais se afasta do corpo, ela não se confunde com a vida psíquica. Através da reminiscência das reencarnações que o Daimon de nossa alma adquire, ele se torna a ponte entre a nossa existência e o resto do universo. Por isso o esforço dos indivíduos nos exercícios de rememoração. Diferentemente de apreender nosso passado trata-se de nos situarmos dentro do quadro de ordem geral, estabelecendo o lugar do individuo e sua existência, a natureza inteira, a parte do todo. A memória aqui é exaltada como objeto de veneração, exaltando-se nela a fonte do saber, da onisciência, instrumento de escape do tempo. Aqui ela é necessidade de salvação individual, não ´pe orientada para o auto conhecimento, mas uma purificação que o eleva para o nível dos deuses. Mnemosýne interiorizou-se para tornar-se no homem a faculdade de conhecer, o esforço de rememoração confunde-se agora com a pesquisa do verdadeiro. Não tem a função de restituir o passado, não implica numa cronologia, revela o ser imutável e eterno.Platão transforma a Psiché humana – aproximando a alma do homem interiorA alma é o nosso ser espiritual. Porem ela não se confunde inteiramente com o nosso ser, pois pode encarnar-se em outro corpo ou animal. A psiche, é o decalque da vida humana. Este duplo espiritual sobrevive, permanecendo com um Dáimon, que liga nosso destino individual a ordem cósmica. Cada alma esta ligada a um astro ao qual ela retorna ao se purificar pela reminiscência, portanto existe um mesmo numero de astros e de alma, este numero fixo é o que garante o percurso circular integrando-a ao tempo cíclico, cobrindo a existência individual, a anamnesis não visa organizar a esperiencia temporal quer ultrapassá-la. Conclusão não há elo necessário entre o desenvolvimento da

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memória e os progressos da consciência do passado. A memória é a anterior a consciência do passado.