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1º PERÍODO PALMAS-TO/ 2005 MATRIZES E MÉTODOS DA LINGUAGEM FORENSE Kyldes Batista Vicente Sibele Letícia Rodrigues de Oliveira Biazotto

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EAD UNITINS – MATRIZES E MÉTODOS DA LINGUAGEM FORENSE – FUNDAMENTOS DA PRÁTICA JUDICIÁRIA

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1º PERÍODO

PALMAS-TO/ 2005

MATRIZES E MÉTODOS

DA LINGUAGEM FORENSE

Kyldes Batista Vicente Sibele Letícia Rodrigues de Oliveira Biazotto

EAD UNITINS – MATRIZES E MÉTODOS DA LINGUAGEM FORENSE – FUNDAMENTOS DA PRÁTICA JUDICIÁRIA

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APRESENTAÇÃO

Este caderno de estudos e atividades da disciplina de Matrizes e Métodos da Linguagem Forense tem como objetivo incentivar em você o desenvolvimento da prática da reflexão no que se refere ao conhecimento da linguagem jurídica.

Para que você possa desenvolver melhor o seu raciocínio, as

atividades, ora apresentadas, fundamentam-se, sobretudo, na comparação entre os níveis de linguagem, no conhecimento da língua padrão e da linguagem técnica jurídica. Esses estudos têm o objetivo de levá-lo a compreender de forma satisfatória a linguagem dessa área, como também a produção textual, utilizando a estilística, o vocabulário e a estrutura referentes à redação jurídica.

Com o intuito de combinar reflexões teóricas com propostas práticas, este material não só traz contribuições relevantes para o aprendizado da linguagem jurídica, como também motivará você para um trabalho mais prazeroso com este gênero textual.

“O homem tem várias vantagens em relação às bestas; por exemplo, o fogo, as roupas, a agricultura, os instrumentos (...). A mais importante, porém, é a linguagem.”

Bertrand Russel (1977, p.49)

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PLANO DE ENSINO

CURSO: Seqüencial de Formação Específica em Fundamentos e Práticas Judiciárias

PERÍODO: 1º DISCIPLINA: Matrizes e Métodos da Linguagem Forense

PROFESSORES: Kyldes Batista Vicente / Sibele Letícia Rodrigues de Oliveira Biazotto

EMENTA: O discurso jurídico. Discurso e Argumentação – pressuposições,

marcos intencionais e os operadores argumentativos. O discurso judicial e a argumentação. OBJETIVOS:

• Incentivar o desenvolvimento reflexivo-teórico sobre a língua; • Ler, interpretar e redigir textos do gênero jurídico; • Conhecer as condições estilísticas de produção textual do gênero

jurídico; • Dominar e perceber as várias formas de argumentar.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO:

• O Discurso Jurídico: linguagem, sistema, norma, língua e fala • Níveis de Linguagem • Petição Inicial • Discurso e Argumentação: Argumentação e Informações Implícitas,

Operadores Argumentativos • Estilística: a importância da estilística na linguagem jurídica; seleção e

combinação, colocação dos termos; tonalidade emotiva das palavras (afetivo, julgamento e avaliação)

• Vocabulário Jurídico: denotação e conotação; o sentido das palavras na linguagem jurídica, polissemia e homonímia; sinonímia e paronímia, arcaísmos; neologismos; estrangeirismos; latinismos, o verbo jurídico; dificuldades do vocabulário na linguagem jurídica

• Enunciação e Discurso: texto, contexto e intertexto, coesão e coerência textual; coesão no discurso jurídico

• O Parágrafo e a Redação Jurídica: unidade e coerência, ênfase e estrutura, tipos de desenvolvimento, descritivo, narrativo e dissertativo

Leituras Complementares: Livro: “A Arte de Argumentar”, de Antônio Suárez Abreu Filme: “Tempo de Matar”

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Referências Básicas: BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Linguagem Jurídica. 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2003. DAMIÃO, Regina Toledo e HENRIQUES, Antonio. Curso de português jurídico. 9.ed., São Paulo: Atlas, 2004. MEDEIROS, João Bosco e TOMASI, Carolina. Português Forense – a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004. NASCIMENTO, Edmundo Dantes. Linguagem Forense. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 1997. STRUCHINER, Noel. Direito e Linguagem. 1.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

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SUMÁRIO

Tema 01 - Discurso Jurídico.........................................................................06 Tema 02 - Níveis de Linguagem...................................................................11 Tema 03 - Petição Inicial..............................................................................17 Tema 04 - Discurso e Argumentação: Argumentação e informações

implícitas ...........................................................................................25 Tema 05 - Operadores argumentativos........................................................31 Tema 06 - Estilística: A importância da Estilística na Linguagem

Jurídica...............................................................................................40 Seleção e Combinação.................................................................................40 Tema 07 - Modalidades Estilísticas Frasais..................................................41 Tema 08 - Colocação dos Termos................................................................47 Tonalidade Emotiva das Palavras ................................................................48 Tema 09 - Discussão do livro “A Arte de Argumentar” ................................51 Tema 10 - Discussão do filme “Tempo de Matar”.........................................55

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DISCURSO JURÍDICO

Nesta aula estudaremos a linguagem no discurso jurídico. Veremos que esta linguagem é técnica, prática e está a serviço do direito.

• Compreender os elementos do discurso; • Identificar características do gênero discurso jurídico.

1. LINGUAGEM, SISTEMA, NORMA, LÍNGUA E FALA

Para começarmos nossos estudos, é importante que coloquemos em discussão algumas expressões relacionadas ao discurso, como linguagem, sistema, norma, língua e fala.

“Linguagem é a capacidade específica à espécie humana de comunicar por meio de um sistema de signos vocais, que coloca em jogo uma técnica corporal complexa e supõe a existência de uma função simbólica.” (DUBOIS, 1988, p. 387) Não podemos esquecer que a linguagem tem uma dupla função:

representação do mundo e do pensamento e instrumento de comunicação. A partir da definição acima, concluímos que linguagem está relacionada à exposição do pensamento e conhecimento humanos, como as formas que utilizamos para nos comunicar (gestos, olhares, a expressão corporal e também a fala).

“Sistema é um conjunto de termos estreitamente correlacionados entre si no interior do sistema geral da língua. Fala-se, assim, do sistema do número no português (singular vs. Plural), do sistema fonológico, do sistema vocálico etc.” (DUBOIS, 1988, p. 560)

Nesse sentido, entendemos por sistema traços distintivos entre uma unidade da língua e outra. Por exemplo: qual se distingue de cujo, mas o que irá definir o uso de um ou de outro é a norma e não o sistema.

TEMA 01

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“Norma é o conjunto de regras que regulam as relações lingüísticas. A norma sofre afrontas ou é contrariada devido a vários fatores: alterações devidas às classes sociais diferentes, alterações devidas aos vários indivíduos que utilizam a língua. Do ponto de vista da norma, toda transgressão à gramática constitui erro, que pode vir a alterar a norma ou enfraquecê-la. Daí considerar-se a norma força conservadora da linguagem”.(MEDEIROS e TOMASI, 2004, p. 21)

Porém, para outros autores, como Silva (1997, p. 14), além da norma descrita acima, chamada de norma padrão, existem também as normas normais ou sociais. Estas são normas que definem grupos sociais de uma determinada sociedade. Em geral, distinguem-se em “normas sem prestígio social” e “normas de prestígio social”. O domínio da norma é muito complexo e varia conforme o tempo, espaço, classe social ou profissional e nível cultural do falante. Por exemplo, a norma-padrão é tida como um nível de prestígio, dominada pela elite, considerada classe culta, escolarizada. Mas, como veremos na próxima aula (Níveis de Linguagem), essa norma padrão não passa de uma variedade lingüística e não apresenta “qualidades” superiores a outras quaisquer.

O que é variedade lingüística? Chamamos de variedades lingüísticas as formas diferenciadas de falar uma mesma língua, como diferenças regionais, sociais, de níveis de escolaridade etc.

“Língua é um sistema de signos convencionais usados pelos membros de uma mesma comunidade. Em outras palavras: um grupo social convenciona e utiliza um conjunto organizado de elementos representativos – os signos lingüísticos.” (INFANTE, 2001, p. 25)

Assim, língua é o que permite a comunicação de determinada comunidade lingüística, de determinado grupo social. Diferencia-se da fala (ou discurso) porque enquanto a língua é um conjunto de potencialidades da fala, esta é um ato de concretização da língua. Vamos esclarecer essa diferença. Veja a definição de fala:

“Caracteriza-se a fala como atualização da língua pelo indivíduo. O uso individual é denominado Discurso ou Fala e é o resultado da necessidade de comunicação.” (MEDEIROS e TOMASI, 2004, p. 19)

Então, o que diferencia fala e língua é que a língua é sistemática, tem certa regularidade e é falada por uma determinada comunidade; já a fala é assistemática, é variável e é realizada individualmente.

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Recapitulando: a linguagem é uma característica humana universal, enquanto a língua é a linguagem particular de uma comunidade, um grupo, um povo. Já a fala é a realização concreta da língua feita por um indivíduo. Sistema é uma organização que rege a estrutura de uma língua, e norma é um conjunto de regras de uma língua.

Agora que já conhecemos esses conceitos básicos, vejamos o que é a Linguagem Jurídica.

2. A LINGUAGEM JURÍDICA

Leia o trecho abaixo:

“Deliberando a maioria sobre administração da coisa comum, escolherá o administrador, que poderá ser estranho ao condomínio; resolvendo alugá-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que não o é.” (Art. 1.323, Código Civil)

Em uma primeira leitura, é possível que não compreendamos o texto acima. Isso ocorre não só com pessoas “menos instruídas”, mas também com pessoas cultas. Por quê?

Em primeiro lugar, a linguagem jurídica não faz parte das “conversas”

que ocorrem freqüentemente em nosso dia-a-dia. São utilizadas expressões com precisão técnica que não têm seu equivalente na linguagem popular.

Em segundo lugar, certas palavras podem ter sentido somente dentro

do direito, podem mudar de sentido no direito, são utilizadas somente para exprimir noções jurídicas, às vezes nomeadas de “termos de pertinência jurídica”, ou seja, que pertencem à área jurídica.

Esses termos reunidos muitas vezes dificultam a compreensão textual

de não juristas e podemos assim considerar que há uma linguagem jurídica, porque o direito dá um sentido particular a certos termos, e porque enuncia de modo diferente o que diz. Ou seja, “a linguagem do direito não está somente nos termos que emprega, mas também nos textos que ele produz” (PETRI, 2004, p.41).

É IMPORTANTE: “A juridicidade do discurso refere-se à sua finalidade. É jurídico todo discurso que tem por objeto a criação ou a realização do direito.” (PETRI, 2004, p.41)

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Assim, para que a linguagem jurídica atinja seu objetivo (realização do direito), é imprescindível que ela tenha da sua língua (portuguesa) a correção, a pureza e a elegância, ou seja, que se utilize a variedade padrão. Mas veja bem: a linguagem jurídica é construída a partir da língua padrão, mas tem a especificidade de ser técnica, pois essa é a função social do direito. Por isso, podemos dizer ainda que não há disputa entre essa linguagem e a língua padrão, já que se complementam.

Arcaísmos: modo de falar ou escrever utilizando palavras que não são de uso corrente na língua, pois já têm substitutas. Neologismos: podem ser consideradas neologismos expressões ou palavras antigas com novo significado ou criadas por necessidade, tanto nas linguagens técnicas como sociais.

É comum para o leigo confundir a tecnicidade da linguagem jurídica com o uso de arcaísmos. Vamos esclarecer dois pontos:

• primeiro, a linguagem jurídica utiliza expressões “antigas” que não têm nenhum equivalente no léxico (vocabulário) atual da língua, então, não são arcaísmos, mas termos de precisão, estranhos pela raridade de suas aplicações;

• segundo, a linguagem do direito não é fixa, tanto que encontramos neologismos criados pela necessidade de renovação da linguagem do direito, como acontece com quaisquer outras linguagens, como a médica, da informática etc.

Se a linguagem jurídica é técnica, especializada e com uma determinada finalidade, por que a estamos estudando? “A ‘família’ dos juristas é mais ampla do que o círculo das profissões jurídicas. A linguagem do direito é um traço comum daqueles que têm uma formação jurídica. Nesses casos, ela é uma linguagem cultural.” (PETRI, 2004, p. 42)

A partir de agora, fazemos parte dessa “família lingüística”, por isso devemos dominá-la para o cumprimento eficiente da nossa profissão, já que

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a linguagem do direito não diz respeito somente aos “iniciados” e sim a todos sujeitos ao direito, pois ela é pública, social e cívica. Agora que nós tivemos contato com a linguagem jurídica, vamos praticar um pouco?

1. Vimos que esse tipo de linguagem possui algumas características próprias de uma comunidade jurídica. É nesse momento que iremos, então, iniciar nossa prática de interpretação da linguagem jurídica com o estudo do seguinte trecho do Código Civil, já apresentado no início da aula.

“Deliberando a maioria sobre administração da coisa comum, escolherá o administrador, que poderá ser estranho ao condomínio; resolvendo alugá-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que não o é.” (Art. 1.323, Código Civil)

2. Qual foi a maior dificuldade em relação à interpretação desse artigo? Vocabulário? Estrutura? Liste as dificuldades encontradas e discuta com o seu grupo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: DUBOIS, J.et al. Dicionário de Lingüística. São Paulo: Cultrix, 1988. INFANTE, U. Curso de Gramática: aplicada aos textos. São Paulo: Scipione, 2001. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004. PETRI, M. J. C. Linguagem Jurídica. 7.ed. São Paulo: Plêiade, 2004. NOVO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Coord. Giselle de Melo Braga Tapai. 3.ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. SILVA, R.V.M. Contradições no Ensino de Português: a língua que se fala x a língua que se ensina. 2.ed., São Paulo: Contexto, 1997.

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NÍVEIS DE LINGUAGEM

Nesta aula veremos que uma mesma língua pode sofrer variações (dialetos).

• Compreender os níveis de linguagem de uma língua; • Selecionar adequadamente níveis de linguagem, conforme a situação

de uso. Na aula anterior, vimos o que é linguagem, sistema, norma, língua, fala e linguagem jurídica. Vimos também que a linguagem jurídica utiliza a variedade culta, também chamada de língua-padrão. Mas temos vários níveis de linguagem e a eficiência da nossa comunicação depende da escolha adequada do nível de linguagem em relação à finalidade do nosso texto.

Quais são esses níveis de linguagem?

Antes de citarmos esses níveis, é importante salientar que também há

variações quanto à classificação, conforme o autor. Seguiremos a classificação de Petri, 2004. Petri cita que esse processo de variação dialetal pode ocorrer tanto horizontal, quanto verticalmente. Se imaginarmos o processo horizontal, teremos a variação por motivos geográficos. Principalmente no nosso país, ocorrem variações de dialetos geográficos por causa da extensão territorial. Temos como exemplo: mandioca, aipim, macaxeira, que variam seu uso conforme a região. Já no processo vertical, a variação ocorre conforme os níveis sociolingüísticos, como profissional, classe social, cultural, grau de escolaridade, sexo etc. Por exemplo, na nossa sociedade, é permitido ao sexo masculino o uso de expressões vulgares, o que já não é aceito para o sexo feminino. Assim como, segundo pesquisas, as mulheres dominam mais a língua culta do que os homens. Vejamos então a classificação dos níveis de linguagem:

TEMA 02

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• Língua Culta ou Língua-padrão – variedade praticada pela classe

social de prestígio, é usada na elaboração de documentos oficiais, na imprensa e, principalmente, na forma escrita. Segue as regras da gramática normativa.

Exemplo: “Na Antigüidade, a aplicação da pena ao criminoso ficava a critério do juiz que, assim, aplicava a pena que lhe parecia mais adequada. No Iluminismo, foi questionado esse modelo especialmente com o argumento de que o castigo ficava sujeito aos humores do juiz. Em razão disso, passou-se a adotar um sistema de aplicação de penas com critérios matemáticos, ou seja, para o crime de mesma natureza, aplicar-se-ia sempre pena idêntica, o que também não se revelou um bom critério em razão de que tirava do julgador a possibilidade de fazer a aplicação da lei de acordo com as circunstâncias de cada caso concreto.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

• Língua Coloquial – utilizada sem muita preocupação em seguir as

regras da gramática normativa, é mais espontânea e natural.

Exemplo: “Na Antigüidade, a aplicação da pena ao criminoso ficava a critério do juiz que, assim, aplicava a pena que parecia a ele mais justa. No Iluminismo, foi questionado esse modelo especialmente com o argumento de que o castigo ficava sujeito aos humores do juiz. Em razão disso, se passou a adotar um sistema de aplicação de penas com critérios matemáticos, ou seja, para o crime de mesma natureza, se aplicaria sempre pena parecida, o que também não se revelou um bom critério em razão que tirava do julgador a possibilidade de fazer a aplicação da lei de acordo com as circunstâncias de cada caso acontecido.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

• Língua Familiar – linguagem de caráter afetivo, menos formal e de

relativa obediência às regras gramaticais, com uso recorrente de diminutivos.

Exemplo: “- Papai, como é que o bandido vai pra cadeia? - Filhinho, no tempo antigo, quando alguém fazia um crime, o juiz castigava, que era para ele mais certo. Depois, os outros começaram a achar que desse jeito não era bom porque ficava na vontade do juiz o tamanho do castigo. Podia acontecer que quem fez alguma coisa muito, muito errada, mais que outra, tivesse castigo parecido ou até que o outro acabasse tendo um castigo muito pior. - E depois? - Então, querido, começaram a fazer assim: o que a pessoa fez e como era castigada já estava escrito, tudinho. Aí, não era bom, porque como nunca tem crime igual, era preciso deixar que o juiz

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olhasse o erro de cada um para aplicar o castigo merecido.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

• Língua Popular – utilizada pelas pessoas de baixa escolaridade, sem

preocupação com regras gramaticais, carregada de gírias e regionalismos. Exemplo: “Antigamente o castigo do bandido ficava por conta do juiz que dava o castigo que ele achava melhor. Depois acharam que não tava certo, porque só o dotô decidia. Aí, usaram uma tal de matemática: todo bandido que matava, era castigado igual. Mais também num gostaro porque cada um é cada um.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

• Língua Grupal – é dividida em subníveis, conforme o grupo que a

utiliza. Por exemplo:

- regionalismos: é diferenciada principalmente pela pronúncia, mas também pelo vocabulário e pela sintaxe;

Exemplo: “Antigamente o juiz é que tomava de conta do corretivo do cabra que matava um vivente. Depois acharam que não tava certo, porque só o dotô decidia. Aí, usaram uma tal de matemática: todo cabra que matava, era corrigido igual. Mas também num foi do agrado porque cada um é cada um.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

- gírias: são consideradas efêmeras, ou seja, de pouca

duração, conhecidas, principalmente, pelos meios de comunicação de massa. Mas há também as gírias de grupos como: de marinheiros, surfistas, caminhoneiros etc.

Exemplo:

“Antigamente o castigo do meliante ficava por conta do juiz que dava o castigo que ele achava melhor. Depois acharam que não tava certo, porque só o doutor decidia. Aí, usaram uma tal de matemática: todo meliante que matava, era castigado igual. Mais também num gostaram porque cada um é cada um.” (Texto adaptado de MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

- línguas técnicas: são utilizadas pelas várias

profissões existentes, de vocabulário específico e de nível culto.

Exemplo:

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“Na Antigüidade, a fixação da pena ficava inteiramente ao arbítrio judicial. Esse injusto sistema foi substituído, em decorrência do Iluminismo, por um sistema de penas rígido, em que pouca ou nenhuma flexibilidade se dava ao juiz pra aplicar a sanção. Mostrou-se esse critério também inadequado por não poder o julgador sopesar devidamente as circunstâncias do delito para uma melhor correspondência da sanção penal ao agente do fato criminoso” (MIRABETE, 2003, vol. 1, p. 291)

A partir das classificações propostas e dos exemplos expostos, podemos analisar as diferenças existentes entre eles. Vejamos:

• Na língua culta ou padrão, podemos perceber a obediência às regras gramaticais, como a posição dos pronomes em relação aos verbos (... que lhe parecia mais adequada.../ ..., aplicar-se-ia.../..., passou-se.../);há obediência também à regência verbal e nominal (... ficava sujeito aos humores do juiz.../ ... um sistema de aplicação de penas.../... passou-se a adotar...), entre outros. Observamos também, que o léxico (vocabulário) é mais bem trabalhado, com palavras escolhidas que realmente representem o que se quer dizer, sem ambigüidades.

• A linguagem coloquial já ‘burla’ algumas regras gramaticais. Por

exemplo, as regras que regem o uso de pronomes não são seguidas (... se passou.../... se aplicaria...), entre outras. Quanto à escolha do léxico, notamos que foram utilizadas palavras mais freqüentes entre os falantes, como idêntica/parecida, caso concreto/caso acontecido.

• Quanto à linguagem familiar, qualquer falante de uma língua a

utiliza. A questão é a escolha do momento em que podemos utilizá-la, porque contém expressões emotivas, particulares e diminutivos. Vejamos: ...filhinho..., ...querido..., ...tudinho..., ...aí..., etc.

• Já a linguagem popular, do ponto de vista das regras gramaticais

normativas, contém erros por se afastar da norma culta estabelecida. Podemos notar exemplos no texto como: ...tava..., ...dotô..., ...mais também..., ...gostaro..., etc.

• Para classificação, dividimos a linguagem grupal em:

• Regionalismos: podemos citar as expressões: cabra,

vivente, corretivo, tomava de conta, utilizadas na nossa região, o Tocantins. Talvez em outros estados os falantes achem diferente tais expressões.

• Gírias: nos concentraremos mais nas gírias

profissionais, que são menos volúveis. No texto encontramos a expressão meliante, que é considerada

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gíria do grupo lingüístico de que fazem parte os policiais, por exemplo.

• Línguas técnicas: no exemplo dado, podemos

identificar claramente que se trata de uma linguagem do campo jurídico, pois contém expressões como: arbítrio judicial, sanção, delito.

Vimos que os níveis de linguagem variam por muitos fatores, como

nível social, de escolaridade, econômico, por região, profissão e até mesmo por idade, sexo, situação de comunicação etc. Observamos também que nenhum nível é ‘melhor’ que outro, são apenas utilizados em comunidades lingüísticas distintas ou em situações específicas.

Fique atento! O nível de prestígio social é a língua culta,

e se não quisermos ser discriminados por grupos que a praticam, devemos dominá-la.

Falando em níveis de linguagem, vamos exercitar os conhecimentos

adquiridos nessa aula por meio de um exercício. Na próxima aula, veremos um nível que muito nos interessa, o das línguas técnicas. Começaremos estudando o gênero petição inicial.

1. Discuta com seu grupo de estudo o seguinte texto de Marcos Bagno (1999, p.17).

"O que muitos estudos empreendidos por diversos

pesquisadores têm mostrado é que os falantes das variedades lingüísticas desprestigiadas têm sérias dificuldades em compreender as mensagens enviadas para eles pelo poder público, que se serve exclusivamente da língua padrão. Como diz Maurizzio Gnerre em seu livro Linguagem, escrita e poder, a Constituição afirma que todos os indivíduos são iguais perante a lei, mas essa mesma lei é redigida numa língua que só uma parcela pequena de brasileiros consegue entender. A discriminação social começa, portanto, já no texto da Constituição. É claro que Gnerre não está querendo dizer que a Constituição deveria ser escrita em língua não-padrão, mas sim que todos os brasileiros a que ela se refere deveriam ter acesso mais amplo e democrático a essa espécie de língua oficial que, restringindo seu caráter veicular a uma parte da população, exclui necessariamente uma outra, talvez a maior.”

2. Qual a sua opinião: a Constituição é que deve mudar o seu nível de

linguagem ou todos os usuários da nossa língua é que devem dominar essa “língua oficial”? Faça um texto argumentando em favor de seu posicionamento.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BAGNO, M. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004. MIRABETE, J. F. Manual do Direito Penal. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2003. PETRI, M. J. C. Linguagem Jurídica. 7.ed. São Paulo: Plêiade, 2004.

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PETIÇÃO INICIAL

Para darmos continuação aos nossos estudos e para ajudá-los na compreensão de outras disciplinas desse curso, veremos, entre os níveis de linguagem, a chamada linguagem técnica. Neste semestre, estudaremos, dentro da produção textual jurídica, o gênero petição inicial, que utiliza essa linguagem. Outros gêneros jurídicos serão vistos no segundo semestre.

• Reconhecer a estrutura argumentativa de uma petição inicial.

Mas, o que é uma petição inicial? “A petição inicial é o ato formal do autor que introduz a causa em

juízo. Nela, em essência, está descrito o pedido do autor e seus fundamentos e sobre esse pedido incidirá a prestação jurisdicional.” (VICENTE GRECO FILHO, 1999)

O mais conhecido dos símbolos da justiça é o da deusa Themis, segurando uma balança e uma espada, com os olhos vendados. A balança significa o equilíbrio na análise dos pedidos das partes envolvidas numa disputa de interesses; a espada significa o poder do Estado de impor a decisão tomada; a venda nos olhos da deusa significa que a justiça não se guia pela aparência das pessoas, decidindo a questão de acordo com as informações que são trazidas ao seu conhecimento. Nas comunidades antigas, em que predominava a linguagem oral, as partes levavam seu problema verbalmente ao conhecimento do julgador, e este decidia quem tinha razão. Hoje, os conflitos de interesse são levados ao conhecimento do Poder Judiciário mediante a linguagem escrita. Imaginemos um acidente de veículo. Se as partes envolvidas chegarem a um acordo sobre quem foi o culpado pelo acidente e sobre o

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quanto deverá pagar pelos prejuízos causados, não haverá necessidade do Poder Judiciário se manifestar sobre o problema, uma vez que não se estabeleceu um conflito de interesses. Existe conflito de interesse quando alguém pretende obter algo de outro e este não está de acordo com o pedido que lhe foi apresentado. Então, não havendo possibilidade de acordo entre as partes interessadas, será preciso que o Estado, por meio do Poder Judiciário, diga quem tem direito e a que tem direito.

A petição inicial é um instrumento pelo qual a pessoa que se sente prejudicada por outra apresenta ao Poder Judiciário pedido para que lhe seja dado aquilo que entende ser de seu direito.

O Código de Processo Civil, no artigo 282, determina que:

Art. 282 - A petição inicial indicará: I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida; II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do autor e do réu; III - o fato e os fundamentos jurídicos do pedido; IV - o pedido, com as suas especificações; V - o valor da causa; VI - as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados; VII - o requerimento para a citação do réu.

Os incisos I, II, V, VI e VII apresentam exigências que fazem parte das formalidades processuais que serão estudadas nas disciplinas referentes ao Processo Civil. Os incisos III – o fato e os fundamentos jurídicos do pedido – e IV – o pedido, com as suas especificações – dizem respeito à descrição do problema que o cidadão pretende ver solucionado e aquilo que pretende obter por meio de decisão do Poder Judiciário. Estes incisos, por serem considerados redacionais, são os que interessam ao estudo dessa disciplina. Vejamos primeiramente os fatos. Fato é tudo aquilo que acontece com ou sem interferência humana. A chuva é um fato, o movimento das marés é um fato, a venda de um imóvel é um fato, a morte de uma pessoa é um fato. Alguns fatos criam, conservam, modificam, transferem ou extinguem direitos; outros não. Os primeiros são chamados de fatos jurídicos.

Na petição inicial são descritos fatos gerais e fatos jurídicos. Os fatos gerais são apresentados para fins de contextualização. Os fatos jurídicos são apresentados como razão para a pretensão apresentada.

Por exemplo, na seguinte descrição “Fulano de tal, foi nadar no mar,

quando a maré começava a subir. Arrastado pelas águas, morreu, deixando dois herdeiros, que agora buscam a partilha da herança”, a subida da maré é um fato de natureza geral, sem qualquer interferência no mundo jurídico. A

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morte do pai dos dois herdeiros é um fato jurídico, pois a morte do pai fez com que os filhos se tornassem proprietários dos bens que pertenciam àquele.

Assim, na petição inicial se descrevem os fatos gerais e jurídicos. Os

primeiros para contextualização; os últimos, para justificar a razão do pedido apresentado.

Os fundamentos jurídicos estão previstos na Lei como um direito

hipotético. Por exemplo, existe uma previsão no Código Civil estabelecendo que

sempre que alguém comete um ato ilícito, fica obrigado a reparar o dano que causou a outrem. Assim, na petição inicial a pessoa apresentará os fatos e apontará que aqueles fatos apresentados lhe dão direito a exigir do outro um bem ou um comportamento, porque o Direito prevê que, ocorrendo fatos semelhantes aos que narrou, as conseqüências serão aquelas previamente estabelecidas em forma de Lei.

Já o pedido é aquilo que a pessoa pretende que lhe seja dado, por

ordem do Poder Judiciário. Por exemplo, se uma pessoa pagou uma dívida e mesmo assim a

empresa em que devia mandou inscrever seu nome no SPC. Por conta disso, a pessoa não conseguiu um empréstimo bancário e, além disso, foi tido como mau pagador. A pessoa tem três problemas: está indevidamente inscrito no SPC, teve prejuízo material, pois não conseguiu o empréstimo de que necessitava, e foi atingido em sua honra e imagem, sofrendo dano moral. Na petição inicial, descreverá os fatos, apontará a previsão existente no Direito de que a empresa agiu de forma errada e deverá corrigir sua conduta, bem como deverá lhe indenizar pelos danos materiais e compensar pelos danos morais causados. Ao apresentar o pedido, especificará que pretende que seja determinado que seu nome seja retirado do SPC, que lhe seja pago o valor dos prejuízos materiais que sofreu e que lhe seja pago um valor monetário, como compensação pelos danos morais a que foi submetido.

É muito importante que a petição inicial tenha precisão, clareza e

concisão, e contenha nela todos requisitos do art. 282 do Código de Processo Civil. Caso contrário, o juiz determinará que seja emendada ou complementada pelo autor em determinado prazo, ou então será indeferida.

Para podermos entender melhor como se organiza, como se estrutura

esse gênero textual jurídico, daremos um exemplo de uma petição inicial. Reúna seu grupo de estudos e identifique no texto todas as partes que uma petição inicial deve ter, principalmente a parte redacional, que são o fato, o fundamento jurídico e o pedido.

Bons estudos.

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Exemplo:

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE ______________________ – TO Ação de Indenização por danos materiais e de compensação por danos morais Autor: J. S. Ré: Transportadora do Progresso Ltda

J. S., brasileiro, solteiro (convivente), vaqueiro, CPF xxx.xxx.xxx-xx, residente e domiciliado na Rua das Flores, 10.600, Jardim das Flores, Porto Nacional – TO, através de seus advogados que esta subscrevem, com escritório profissional na Av. XXXXXXXX, Centro, Porto nacional – TO, onde recebem as intimações de estilo, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência para propor a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS em face de Transportadora do Progresso Ltda, pessoa jurídica de direito privado, com endereço na Avenida Santos Dumont, 000, Porto Nacional - TO, pelos fatos e fundamentos que a seguir aduz:

DOS FATOS E DO DIREITO

1. No dia 28 de junho de 2003, o Autor trafegava de motocicleta por via

preferencial de direção quando, num cruzamento de ruas o foi colhido pelo caminhão a serviço da Ré e dirigido por empregado ou preposto da mesma.

2. Peritos apontaram, em Laudo Técnico Pericial, o empregado ou

preposto da Ré como sendo o causador do acidente automobilístico.

3. O Autor ficou gravemente ferido. Laudo de Exame Médico Pericial descritivo de exame realizado em 15/08/2003 apontou que o Autor sofreu “trauma de múltiplas costelas e fratura de glenóide da escápula esquerda e contusão pulmonar direita”. Quando da realização do supra referido exame, os peritos deixaram de responder ao sexto quesito, qual seja, se das lesões sofridas “resultou debilidade permanente ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função”. Demonstrando prudência, os peritos entenderam por bem

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aguardar que o Autor convalescesse para, em exame complementar, avaliar se o Autor teria suas capacidades físicas reduzidas.

4. Em 25 de julho de 2004, peritos médicos que realizaram Laudo de

Exame de Corpo de Delito Complementar (doc. anexo) chegaram à seguinte conclusão: “À perícia evidenciamos que o paciente sofreu lesão extensa ao nível escapular esquerdo; mostrando afundamento nesta localização e com comprometimento funcional do membro esquerdo (Limitação movimentação, extensão, flexão) e abdução – queda ombro esquerdo”.

5. Os peritos haviam solicitado avaliação de médico ortopedista. Este

concluiu que o Autor “Apresenta seqüela de lesão escapular com queda de ombro e limitação importante de abdução. Como o paciente é lavrador, está incapacitado para o trabalho (estando, portanto, inválido para a sua profissão).” (doc. anexo).

6. Desde o acidente o Autor está submetido a tratamento médico.

Gastou todas as poucas economias que tinha e hoje sobrevive e compra remédios graças à caridade de parentes. O Autor apresenta inchaço na porção superior esquerda do tórax e sente dores intensas e constantes.

7. A Ré jamais prestou qualquer auxílio ao Autor.

8. Não se fazem necessárias maiores digressões para se inferir que o

Autor sofreu danos materiais intensos, especialmente no que se refere á sua impossibilidade de doravante prover o próprio sustento e o de sua companheira.

9. Também são relevantes os danos morais, posto que o Autor está a

mais de um ano sob tratamento médico, perdeu parte das funções do braço esquerdo, sofreu dano estético, posto que apresenta rebaixamento do ombro esquerdo, sente dores intensas e constantes e, por fim, vive o constrangimento de depender de parentes – pessoas pobres como ele – para morar, se alimentar, comprar roupas, calçados, remédios.

10. Os danos materiais e morais são evidentes.

11. A culpa do condutor do veículo a serviço da Ré está patente nas

conclusões do Laudo Técnico Pericial, subsumindo-se a conduta do lesante ao tipo civil previsto no artigo 186 do Código Civil1, e a Ré deverá responder pela reparação civil, por força dos dispostos nos artigos 927 e 932, III do mesmo Código2.

1 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. 2 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: (...) III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;

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12. Também não pairam dúvidas sobre a existência do nexo de

causalidade entre a conduta do lesante e os danos suportados pelo lesado.

13. Assim, é inafastável a obrigação da Ré de indenizar o Autor pelos

danos materiais e compensá-lo pelos danos morais sofridos.

14. DO VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS – Como, em razão do acidente, o Autor se tornou incapacitado para o trabalho, a Ré deverá ser condenada a pagar-lhe os valores que receberia pelo seu trabalho, se pudesse continuar realizando-o. No exercício da profissão de vaqueiro, o Autor recebia mensalmente, nos últimos anos, valor equivalente a pouco mais de dois salários mínimos. Porém, como o Autor não tem meios hábeis para provar que recebia mensalmente tal valor, pleiteia o pagamento de valor mensal de um salário mínimo, como pensão, em razão de sua incapacidade para o trabalho, resultante das lesões produzidas pelo acidente automobilístico de que foi vítima. O Autor tem hoje 45 anos de idade.

15. DO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DE

FORMA ACUMULADA OU DO PAGAMENTO MENSAL, COM CONSTITUIÇÃO DE RENDA – O Autor pleiteia a condenação da Ré ao pagamento acumulado de um salário mínimo mensal, 13º salário anual e um terço do valor de um salário mensal a cada ano, a título de adicional de férias, até a data em que completará 75 (setenta e cinco anos), ou o pagamento de tais valores mensal e anualmente, respectivamente, sendo que nesse caso, considerando a natureza alimentícia da verba pleiteada, é cabível a determinação à Ré para que constitua renda em favor do Autor, com fundamento no artigo 602 do CPC.

16. DO VALOR DA COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS – O Autor

pleiteia compensação por danos morais no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

DO PEDIDO

17. O Autor pleiteia:

a) Indenização por danos materiais no importe de R$ 104.000,00 (cento e quatro mil reais)3, podendo tal pagamento ser feito parceladamente, conforme exposto na causa de pedir, sendo que neste último caso deverá a Ré constituir renda em favor do autor.

3 Salários: R$ 260,00 X 12 meses X 30 anos

13ºs salários 1/3 sobre o valor das férias

Total

R$ 93.600,00 R$ 7.800,00 R$ 2.600,00 R$ 104.000,00

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b) Compensação por danos morais no importe de R$ 100.000,00

(cem mil reais).

DO REQUERIMENTO

Ante o exposto, requer a citação da Ré para comparecer à audiência de conciliação a ser designada por esse MM Juízo, sob pena de sofrer os efeitos da revelia e confissão quanto à matéria fática. Caso não haja acordo em primeira audiência, que o presente feito tenha o seu normal curso nos termos da Lei 9.099, para, ao final, condenar a Ré ao pagamento dos valores pleiteados a título de indenização por danos materiais e compensação por danos morais, nos termos do pedido. O Autor provará o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, sejam documentais, periciais e/ou testemunhais, bem como pelo depoimento pessoal do Representante do Réu, o que desde já requer. Dá à causa o valor de R$ 204.000,00 (duzentos e quatro mil reais).

Pede deferimento. Porto Nacional – TO, ___ de _________ de 2005

xxxxxxxxxx xxxxxxxxxx OAB-TO 00000 OAB-TO 00000

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: GRECO FILHO, V. Direito processual civil brasileiro. Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 1999. PETRI, M. J. C. Linguagem Jurídica. 7.ed. São Paulo: Plêiade, 2004.

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DISCURSO E ARGUMENTAÇÃO: Argumentação e Informações Implícitas

Entraremos agora no campo da argumentação. Nós a utilizamos para tornar uma idéia aceitável, e argumentos e provas motivam o convencimento, levam à persuasão.

• Saber ler as entrelinhas, as informações implícitas: pressupostos e subentendidos.

Esse tipo de discurso está muito presente em nossa vida: na publicidade, jornais, comentários diversos, literatura, música, novelas, política etc.

E por que aprender a argumentar? O domínio da língua é “transformado com freqüência em instrumento

de poder pelos dominadores, mas que pode também vir a ser a liberação dos dominados.” (MARTINS, 1994, p. 19)

Segundo Medeiros e Tomasi (2004), a marca do texto argumentativo é convencer ou persuadir por meio de recursos que a língua nos dá, e precisamos dominar e conhecer esses recursos para nos utilizarmos deles. A linguagem serve para alcançarmos objetivos e defendermos intenções. Desta forma, o primeiro item a ser observado é a escolha adequada do nível de linguagem, conforme visto na aula 2. Devemos levar em conta para essa escolha quem é o nosso leitor, o objetivo do nosso texto e o gênero em questão. Por exemplo: vimos na aula passada que a linguagem adequada para petições iniciais é a linguagem técnica. Se utilizássemos o nível popular, certamente o poder de convencimento, a argumentação, seriam prejudicados.

Temos à nossa disposição vários expedientes argumentativos. Os mais comumente utilizados são as informações implícitas: pressupostos

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e subentendidos. Em todos os textos, certas informações são transmitidas explicitamente, enquanto outras o são implicitamente, estão pressupostas ou subentendidas. Um texto diz coisas que parece não estar dizendo, porque não as diz explicitamente. Uma leitura eficiente precisa captar tanto as informações explícitas quanto as implícitas. Um leitor perspicaz é aquele capaz de ler nas entrelinhas. Se não tiver essa habilidade, passará por cima de significados importantes ou - o que é bem pior - concordará com idéias ou pontos de vista que rejeitaria se percebesse.

Explícito: é o que está, de fato, escrito no texto. Implícito: é o que é sugerido por algumas expressões ou pelo contexto.

É o que veremos a seguir.

1. PRESSUPOSTOS

Pressupostos são idéias não expressas de maneira explícita, que decorrem logicamente do sentido de certas palavras ou expressões contidas na frase. Observe as frases abaixo:

Maria tornou-se muito estudiosa.

A informação explícita é que hoje Maria é muito estudiosa. A

informação implícita que o verbo ‘tornar-se’ introduz é de que Maria não era estudiosa antes. Se Maria fosse antes muito estudiosa, não se poderia usar o verbo tornar-se.

João é o último a entregar a prova.

A informação explícita é que João entregou a prova depois de todos

os outros. Se ele foi o último a entregá-la, está implícito que todos entregaram antes dele.

Os pressupostos devem ser verdadeiros ou, pelo menos, admitidos

como verdadeiros, porque é a partir deles que se constroem as afirmações explícitas. Isso significa que, se o pressuposto é falso, a informação explícita não tem cabimento.

Assim, por exemplo, se: Maria sempre tira notas boas, não tem o menor sentido dizer Todos tiraram notas boas; até Maria. Até, no caso, contém o pressuposto de que é inesperado ou inusitado

que Maria tire boas notas.

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Na leitura, é muito importante detectar os pressupostos, pois eles são

um recurso argumentativo que visa a levar o leitor ou ouvinte a aceitar certas idéias.

Como assim? Ao introduzir um conteúdo sob a forma de pressuposto, o falante

transforma o ouvinte em cúmplice, pois a idéia implícita não é posta em discussão, é apresentada como se fosse aceita por todos, e os argumentos explícitos só contribuem para confirmá-la. O pressuposto aprisiona o ouvinte ao sistema de pensamento montado pelo falante.

A aceitação do pressuposto estabelecido pelo falante permite levar adiante o debate; sua negação compromete o diálogo, uma vez que se destrói a base sobre a qual se constroem os argumentos e daí nenhuma proposição tem mais importância ou razão de ser.

Quais são os termos que, em geral, servem

de marcadores de pressupostos?

1) Adjetivos (ou palavras similares): João foi meu primeiro namorado. Primeira pressupõe: a) que tive outros namorados; b) que os outros foram depois de João.

2) Verbos que indicam mudança ou permanência de estado (por

exemplo, permanecer, continuar, tornar-se, vir a ser, ficar, passar (a), deixar (de), começar (a), principiar (a), converter-se, transformar-se, ganhar, perder):

Pedro continua jogando futebol. O verbo continuar indica que Pedro já jogava futebol no momento an-

terior ao presente. 3) Verbos que indicam um ponto de vista sobre o fato expresso pelo

seu complemento (por exemplo, pretender, supor, alegar, presumir, imaginar):

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Os eleitores pretendem que seu voto seja válido. O verbo pretender pressupõe que seu objeto direto é verdadeiro para

o sujeito (no caso, os eleitores) e falso para o produtor do texto.

4) Certos advérbios:

As decisões da justiça são totalmente imparciais. O advérbio totalmente pressupõe que não há nenhuma interferência

de interesses nas decisões judiciais. 5) Orações adjetivas: Os brasileiros, que querem punição para os corruptos, esperam

que a lei seja cumprida.

O pressuposto é de que todos os brasileiros, sem exceção, esperam que os corruptos sejam punidos.

6) Certas conjunções:

Freqüentei uma auto-escola, mas aprendi a dirigir.

O pressuposto é que na auto-escola não se aprende a dirigir.

2. SUBENTENDIDOS

Subentendidos são insinuações, não marcadas lingüisticamente, contidas numa frase ou num conjunto de frases. Suponhamos que uma pessoa estivesse em visita à casa de outra num dia de calor intenso e que todas as janelas da casa estivessem fechadas. Se o visitante dissesse Que calor!l! poderia estar insinuando Abra as janelas.

Há uma grande diferença entre pressupostos e subentendidos. O

primeiro é uma informação estabelecida como indiscutível tanto para o falante quanto para o ouvinte, uma vez que decorre necessariamente de algum elemento lingüístico colocado na frase. Ele pode ser negado, mas o falante coloca-o de maneira implícita para que não o seja.

Já o subentendido é de responsabilidade do ouvinte. O falante pode

esconder-se atrás do sentido literal das palavras e negar que tenha dito o que o ouvinte depreendeu de suas palavras. Assim, no exemplo dado acima, se o dono da casa disser que entra muita poeira na casa se as janelas ficarem abertas, o visitante pode dizer que também acha e que apenas constatou que o calor era muito intenso.

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O subentendido serve, muitas vezes, para o falante proteger-se. Com ele, transmite a informação que deseja dar a conhecer sem se comprometer.

Por exemplo, uma pessoa passou em um vestibular de uma faculdade

pouco conhecida. Num dia, um amigo diz a essa pessoa que naquela faculdade não há concorrência. Se a pessoa perguntar se o amigo o acha incapaz de passar em um vestibular de uma faculdade de muita concorrência, o outro poderá dizer que na está falando dele, mas que está falando em tese, que o caso dele é uma exceção. Na verdade, o amigo que fez a afirmação não disse explicitamente que o outro não tinha méritos para passar no vestibular, mas deu a entender, deixou subentendido para não se comprometer.

O subentendido diz sem dizer, sugere, mas não diz. Então, notamos que há possibilidades lingüísticas para jogarmos com conteúdos implícitos, passando nossos valores e convencendo o nosso receptor sem que ele perceba, principalmente se não for um leitor experiente.

Vamos agora praticar nossa experiência para encontrar informações implícitas???

1. Leia as informações abaixo e responda ao que se pede: a) A praça do bairro foi reformada. b) Uma praça do bairro foi reformada. A escolha do artigo definido (a praça) ou do indefinido (uma praça) estabelecem pressupostos diferentes para cada enunciado. Quais são esses pressupostos? 2. Leia com atenção os dois segmentos que vêm a seguir: a) Os políticos que são corruptos serão cassados. b) Os políticos, que são corruptos, serão cassados. Os dois trechos acima não possuem o mesmo significado, pois contêm pressupostos diferentes. Supondo que existam apenas essas duas opções para incluir num projeto de lei, qual delas contaria com o apoio dos políticos?

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3. Analise com atenção os trechos abaixo: a) A declaração do advogado não é evidentemente falsa. b) Evidentemente, a declaração do advogado não é falsa. Em ambos os enunciados o advérbio evidentemente estabelece o mesmo pressuposto? Explique sua resposta. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: MARTINS, M.H. O que é leitura. 19.ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004. PLATÃO, F. & FIORIN, J. L. Para Entender o Texto: leitura e redação. 16 ed. São Paulo: Ática, 2002.

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DISCURSO E ARGUMENTAÇÃO: Operadores Argumentativos

Estudaremos agora, algumas marcas do discurso que revelam nossa intencionalidade discursiva, ou seja, marcas que mostram o nosso ponto de vista sobre determinado assunto.

• Identificar os operadores argumentativos nos textos; • Utilizar com eficiência esses marcadores discursivos.

Os operadores argumentativos ou discursivos orientam o discurso para determinadas conclusões. São classificados, pela gramática tradicional, como simples conjunções ou não se encaixam em nenhuma das dez classes gramaticais. Esses elementos gramaticais deixam marcas precisas da argumentação lingüística no discurso, por isso dizemos que não há discurso neutro. Como a característica do discurso jurídico é ser altamente argumentativo, faz uso freqüente desses operadores. Vejamos alguns deles, segundo Petri (2000).

1. Conectivos de oposição: mas, porém, embora etc. João estuda muito, mas não consegue ser aprovado nos exames. O “mas” muda o rumo argumentativo para uma conclusão inesperada. A

conclusão natural que decorre da primeira proposição é de que João deverá ter sucesso em qualquer exame. Não é o que a segunda proposição afirma. Ao contrário, há uma negação implícita decorrente. Vejamos a representação abaixo: (então) João é aprovado (mas) João não é aprovado nos exames. nos exames. Desvio João estuda muito.

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Um outro que marca especialmente a oposição é o “embora” e seus sinônimos: ”ainda que”, “mesmo que” etc.

Embora (ainda que, mesmo que) chova, sairei. Há uma oposição implícita. O fato de chover poderia impedir o falante de sair, mas, ao dar certeza de que sairá, ele afirma a negação de uma outra possibilidade conclusiva, orientando a argumentação para um novo rumo e permitindo ao interlocutor a confirmação de que nada o impedirá de sair. Há necessidade de observarmos em relação à diferença entre o "mas" e o "embora" o seguinte: primeiramente, o "mas" nunca inicia o período composto, salvo em situações particulares de estilo ou de mudança de assunto, como acontece com o "embora"; secundariamente, o "embora" leva o verbo da oração iniciada por ele a flexionar-se no subjuntivo, diferenciando-se do "mas", que faz "seu" verbo permanecer no indicativo.

2. Advérbios: ainda, quase, já, agora etc.

Daiane ainda mora no Tocantins. Esse tipo de advérbio introduz pressupostos. No exemplo dado, o pressuposto é de que Daiane já morava no Tocantins antes.

3. Denotadores de inclusão: até, mesmo, também, inclusive etc.

Hoje há muitas oportunidades para quem quer estudar: cursos tecnológicos, cursos de férias e até mesmo cursos a distância.

O exemplo acima estabelece uma escala em sentido positivo. O argumento mais forte é introduzido por “até”. Isso dá maior importância aos cursos a distância.

4. Denotadores de exclusão: só, somente, apenas, senão etc.

Todos querem o progresso do Brasil, somente os pessimistas não. A expressão denotadora de exclusão “somente” determina o grupo que não comunga da idéia dos demais.

5. Denotadores de retificação: aliás, ou melhor, isto é etc.

A secretária contratada tem muita experiência, isto é, sabe digitar, fala duas línguas e tem curso de etiqueta.

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Quando queremos retificar ou explicar melhor um enunciado, lançamos mão desse tipo de denotadores, como a expressão ‘isto é’ contida na frase, que determina que tipo de experiência a pessoa contratada tem para merecer o cargo. Já Koch (1992) acrescenta mais operadores argumentativos em sua lista, como os que vamos ver abaixo:

6. Operadores de causa: já que, visto que, uma vez que, pois etc.

João está estudando porque quer ser um profissional atualizado.

Podemos observar que a proposição iniciada por porque aponta para

a causa. A proposição inicial é a conseqüência. A relação de causalidade no exemplo ocorre entre a informação de João estar estudando, que podemos considerar uma conseqüência, e a informação do motivo pelo qual ele estuda, que é para se atualizar profissionalmente, ou seja, a última informação é a causa da conseqüência, citada anteriormente.

7. Operadores de conformidade: conforme, de acordo, como, segundo etc.

De acordo com o governo federal, há vagas suficientes nas universidades.

A relação de conformidade manifesta o acordo entre duas

informações. O exemplo demonstra isso. Em lugar de “de acordo”, poderíamos usar do articulador conforme, para, segundo, todos apontam para o mesmo sentido.

8. Operadores de finalidade: para, para que, a fim de etc.

Precisamos ter o hábito de leitura para que entendamos melhor o mundo.

Temos de observar com cautela o articulador “para”, que pode indicar

finalidade. Esse articulador indicará finalidade entre duas proposições, quando ele puder ser substituído por “para que”, “a fim de (que)”, implicando a idéia de fim previsto para uma determinada ação expressa na primeira oração.

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É preciso atentar para a flexão do verbo, quando se usa o “para que”. Diferentemente das outras construções, esse articulador leva o verbo para o presente do subjuntivo.

9. Operadores de temporalidade: quando, enquanto, sempre que, logo que, antes que, assim que, cada vez que, depois que, até que etc.

Pretendo continuar meus estudos, assim que termine a universidade.

A idéia veiculada acima é de temporalidade. A oração iniciada por “assim que” indica tempo futuro.

10. Operadores de conclusão: portanto, logo, por isso, por conseguinte etc.

Terminamos o trabalho de língua portuguesa, portanto podemos entregá-lo à professora.

O conector “portanto” introduz um enunciado de valor conclusivo em relação a dois (ou mais) atos da fala anteriores que contêm as premissas, uma das quais, geralmente, permanece implícita, por tratar-se de algo que é voz geral, de consenso em dada cultura, ou, então, verdade universalmente aceita.

11. Operadores de comparação: (tanto, tal, tão)... Como (quanto), mais... do que, menos... do que etc.

João escreve tão bem quanto Maria. A relação comparativa possui um caráter eminentemente argumentativo: a comparação se faz tendo em vista dada conclusão a favor ou contra a qual se pretende argumentar. Assim, se a uma pergunta como: “Maria escreverá a carta?”, se obtivesse como resposta: “João escreve tão bem quanto Maria”, a argumentação seria desfavorável a Maria (embora não negando a sua capacidade de escrita) e favorável a João. Pelo exemplo acima, verifica-se que, do ponto de vista argumentativo, não há “igualdade” entre João e Maria.

12. . Operadores de adição: e, também, não só... mas também, tanto ... como, além de, além disso, ainda, nem etc.

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Hoje em dia, não basta só termos um curso superior, mas também precisamos nos especializar.

A função desses articuladores é encaminhar o interlocutor da comunicação para uma mesma conclusão. No exemplo citado, temos um operador que soma um argumento adicional a um argumento já dito.

13. Operadores de condição: se”... então, caso etc.

Não teremos problema de água no planeta no futuro, se hoje nos educarmos para o consumo consciente.

Como podemos notar, a primeira informação dada (não termos problemas de falta de água no futuro) depende de nos condicionarmos à segunda informação (educarmo-nos para o consumo racional da água). É essa informação que o articulador “se” introduz.

14. Operadores de disjunção: ou.

a) Na festa, precisamos ir com traje de gala ou esporte fino? b) Todos os estudantes poderiam vir de blusa branca ou calça

jeans. Tal relação pode ser tanto de tipo lógico, quanto de tipo discursivo e se expressa através do conectivo “ou”. Esse conector, porém, é ambíguo, ora correspondente à forma exclusiva (isto é, um ou outro, mas não ambos, conforme o exemplo (a)), ora à forma com valor inclusivo (ou seja, um ou outro, possivelmente ambos, conforme o exemplo (b)).

Para reforçar o estudo teórico, vamos praticar neste ensaio de Roberto Pompeu de Toledo “Os Sertões e o caso Tim Lopes”.

Os Sertões e o caso Tim Lopes O bárbaro assassinato do jornalista da Globo, à luz de um clássico

centenário da literatura brasileira

O leitor quer conhecer o substrato histórico, social e moral do caso de Tim Lopes, o jornalista da TV Globo barbaramente assassinado num morro carioca? Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha. Está tudo lá. Os Sertões está fazendo 100 anos. Foi publicado em 1902, cinco anos depois do fim do episódio que lhe serve de tema, a Guerra de Canudos. Nem seria preciso dizer, mas diga-se: o livro continua um monumento. É um monumento

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literário e também um monumento de reflexão sobre esse tema sempre intrigante chamado Brasil. Para ilustrar o ponto que nos interessa, tomemos os parágrafos, lá pelo fim do livro, em que o autor descreve a sorte que mereciam os seguidores de Antônio Conselheiro ao cair nas mãos do exército. Canudos, cercada sem remissão pela tropa repressora, agonizava. Ainda resistia, como resistiu até o último suspiro, mas sem esperança. Seus defensores, quando não eram abatidos em combate, eram capturados aos montes. E então, que lhes acontecia? Procurava-se um recanto mais encoberto e... Os soldados começavam a impor ao preso um viva à República, poucas vezes satisfeito. Seguia-se o pior: “Agarravam a vítima pelos cabelos, dobrando-lhe a cabeça, esgargalando-lhe o pescoço”, descreve Euclides; “e, francamente exposta a garganta, degolavam-na.” Podia ocorrer que os assassinos não tivessem paciência para todas as preliminares. “O processo era então mais expedito: varavam a vítima a facão. Um golpe único, entrando pelo baixo ventre. Um destripamento rápido.” Euclides da Cunha, neste ponto, está no auge da indignação. “Aquilo não era uma campanha, era uma charqueada”, escreve. Ele mostra como os supostos agentes da civilização, encarregados pelo Estado de levar a lei a sertanejos tidos como selvagens, acabaram se transmudando em agentes da barbárie. O hábito de degolar o inimigo não figura em exclusivo no conflito de Canudos. Está presente em outros episódios da história do Brasil. Em Canudos, mostra-se ainda mais cruel quando se tem em conta que corria entre os seguidores de Conselheiro a crença de que a morte pela faca impedia que a alma fosse para o céu. Os soldados sabiam disso. Por isso mesmo, para aterrorizar o inimigo não só com a morte, mas com a própria interdição da salvação, dedicavam-se a ela com volúpia. Nos tempos que correm a crueldade está em voga. Não só se seqüestra e mata, mas se tortura e mutila. Tim Lopes resume essa tendência. Ele não só foi torturado, mas morto por um golpe de espada a trespassar-lhe o ventre, como se fazia em Canudos quando se estava com preguiça de degolar. Os Sertões – este o primeiro ponto em que o grande livro ilumina o recente caso do jornalista – mostra que a crueldade insana tem raízes antigas. Certo, no episódio citado da Guerra de Canudos são os agentes do Estado que a praticam, enquanto nos casos recentes são bandidos privados. Isso só prova que a bandidagem não inova. Apenas copia, ou reproduz, ou espelha, padrões longamente estabelecidos nas melhores esferas do Estado e da sociedade. Mas não é apenas nesse ponto que Os Sertões tangencia o caso Tim Lopes. Há também outro, resumido na frase que o gênio de Euclides da Cunha forjou para explicar por que os militares que combateram em Canudos não apenas agiam na certeza da impunidade como não temiam o juízo do futuro: “A história não iria até lá”. O sertão era demasiado pobre e distante, demasiado inglório, para merecer a atenção da posteridade. “O sertão é homizio”, acrescentou Euclides. Escreveu ainda: “Canudos tinha muito apropriadamente, em roda, uma cercadura de montanhas. Era um

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parêntese; era um hiato; era um vácuo. Não existia. Transposto aquele cordão de serras, ninguém mais pecava”. Eis um conceito, este de que “a História não iria até lá” que comporta larga aplicação. Vale não só para o juízo do futuro, mas mesmo do presente. Há crimes cometidos na certeza de que estão imunes não só à História, mas ao mero registro dos contemporâneos. Nos porões da ditadura, reinava a certeza de que a História não chegaria lá. Em certas delegacias de polícia, hoje e sempre, opera-se com esse pressuposto. Isto quanto aos agentes do Estado. Quanto à bandidagem privada, os morros cariocas exemplificam por excelência um rincão onde a História não chega. Assim como o sertão, na descrição de Euclides, o morro é um homizio. Ele está no alto, não num vale como Canudos, mas também é um parêntese, um hiato, um vácuo. Não existe. Com isso voltamos a Tim Lopes. Aliás, não a ele próprio. Tim Lopes era conhecido e tinha boas conexões. Por isso mesmo, a ele a História não tardou a chegar. Mas, quando lhe procuravam o corpo, foram encontradas as ossadas de muitas outras vítimas. A quem teriam pertencido? Quem teria a coragem de reclamá-las? Neste caso, sim, o morro era o perfeito homizio. Se a História chegou ao depósito de ossos, foi por acaso. Se um dia identificar seus donos, será outro acaso – mas, admita-se, muito remoto, muito improvável.

Revista Veja

1. No trecho “Ele mostra como os supostos agentes da civilização, encarregados pelo Estado de levar a lei a sertanejos tidos como selvagens, acabaram se transmudando em agentes da barbárie”, quais palavras utilizadas pelo autor nos mostram que ele tem o mesmo ponto de vista de Euclides da Cunha e que é contra a atitude que o Estado tomou em relação a Canudos.

a. civilização e selvagens b. sertanejos e barbárie c. supostos e tidos d. Estado e lei e. mostra e transmudando

2. [...] os militares que combateram em Canudos não apenas agiam na

certeza da impunidade como não temiam o juízo do futuro: “A História não iria até lá”.

[...] os morros cariocas exemplificam por excelência um rincão onde a História não chega.

O que significa, no texto, o conceito “A História não iria até lá” e “.... onde a História não chega.”?

a. Que existem grupos sociais por cujos problemas a sociedade e o Estado não se interessam, pela insignificância social desses grupos.

b. Que os historiadores não se interessam em escrever sobre problemas sociais.

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c. Que não se registram alguns fatos por eles ocorrerem em locais de difícil acesso.

d. Que alguns grupos sociais, por serem perigosos, dificultam a ação dos agentes do Estado.

e. Que mesmo que alguns grupos sociais sejam discriminados, há interesse da sociedade e do Estado em registrar e resolver seus problemas.

3. Assinale a alternativa que não se pode deduzir das informações contidas no último parágrafo do ensaio.

a. Tim Lopes era conhecido e houve empenho na solução do seu desaparecimento.

b. Outras vítimas foram encontradas e foram identificadas. c. O caso de Tim Lopes não demorou para ser esclarecido. d. Pessoas que têm ligação com outras importantes têm seus

problemas resolvidos. e. O cidadão comum não desperta o interesse da sociedade e

das autoridades na solução dos seus problemas.

4. O emprego das aspas serve para produzir sentidos variados. No ensaio lido elas foram empregadas para:

a. indicar que o autor não concorda com o que foi dito. b. ironizar a fala do outro. c. indicar que o que foi dito tem outro sentido. d. indicar que o responsável pelo dito é outra pessoa. e. indicar o emprego de gírias no enunciado.

5. Dados os períodos abaixo, marque a opção em que o conectivo

utilizado não tem o mesmo sentido do utilizado no trecho “... para aterrorizar o inimigo não só com a morte, mas com a própria interdição da salvação, dedicavam-se a ela com volúpia.”

a. “Não só se seqüestra e mata, mas se tortura e mutila.” b. “Ele não só foi torturado, mas morto por um golpe de espada a

trespassar-lhe o ventre...” c. “Nem seria preciso dizer, mas diga-se: o livro continua um

monumento.” d. “... os militares que combateram em Canudos não apenas

agiam na certeza da impunidade como não temiam o juízo do futuro.”

e. “Vale não só para o juízo do futuro, mas mesmo do presente.”

6. Assinale a alternativa que expresse, respectivamente, a relação de sentido estabelecida pelas palavras grifadas nos enunciados abaixo, na ordem em que se apresentam. “Ainda resistia, como resistiu até o último suspiro, mas sem esperança.” “Ele não só foi torturado, mas morto por um golpe de espada a trespassar-lhe o ventre, como se fazia em Canudos quando se estava com preguiça de degolar.” “Apenas copia, ou reproduz, ou espelha...” “Se a História chegou ao depósito de ossos, foi por acaso.”

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a. Oposição, tempo, conformidade, condição, alternância b. Conformidade, oposição, tempo, alternância, condição c. Tempo, oposição, conformidade, alternância, condição d. Alternância, oposição, conformidade, tempo, condição e. Oposição, conformidade, tempo, alternância, condição

7. Assinale a alternativa que contenha a conjunção que estabelece a

relação de sentido adequada entre os enunciados substituindo o ponto final. “Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha. Está tudo lá.” (Linhas 2 e 3)

a. Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha, embora esteja tudo lá. b. Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha, mas está tudo lá. c. Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha, porque está tudo lá. d. Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha, por isso está tudo lá. e. Leia Os Sertões, de Euclides da Cunha, se estiver tudo lá.

8. Analise os trechos abaixo e assinale a opção em que tenha sido

utilizada a norma culta da língua contemporânea. a. Houveram vários protestos contra a violência depois da morte

de Tim Lopes. b. O comportamento dos criminosos vai de encontro às regras

sociais estabelecidas. c. Os criminosos e o governo já tiveram comportamentos a fins. d. Fazem vários anos que segmentos da sociedade são

controlados por criminosos. e. Nem todos os segmentos da sociedade têm a proteção policial

que precisam. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: KOCH, I. V. Inter-ação pela Linguagem. São Paulo: Contexto, 1998. MARTINS, M.H. O que é leitura. 19.ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004.

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ESTILÍSTICA A importância da estilística na linguagem jurídica

Seleção e combinação Modalidades Estilísticas Frasais I

Nesta aula veremos por que a estilística é importante na linguagem jurídica e como ela pode nos ajudar no desempenho da nossa profissão.

• Compreender o conceito de estilística; • Saber selecionar termos e combiná-los na frase; • Identificar tipos frásicos retóricos inadequados ao discurso jurídico.

No nosso dia-a-dia, ao falar, escrever, pensar, argumentar, temos que fazer escolhas lexicais. Entre muitas opções, escolhemos uma palavra que deverá combinar com várias outras já selecionadas. Selecionamos também, além de palavras, o modo de dizê-las, ou seja, as frases. Essa escolha que fazemos sem perceber é o que chamamos de estilística. Veremos no tópico seguinte, como selecionar e combinar essas escolhas. Após, estudaremos as principais modalidades estilísticas frasais.

1. SELEÇÃO E COMBINAÇÃO

Para proceder a seleção e combinação estilística, temos dois mecanismos:

• A escolha e substituição dos termos. • A escolha e a combinação desses termos na frase.

Assim, percebemos que o estilo é, antes de tudo, a escolha das

palavras e a combinação entre elas. Observe os exemplos a seguir. “A teoria clássica, elaborada por Carrara, dizia que dolo é a intenção

mais ou menos perfeita de praticar um fato que se conhece contrário à lei. Age com dolo, segundo a teoria da vontade, quem tem como objetivo

a prática de um fato definido como crime. Em outras palavras, é dolosa a conduta em que o agente tem vontade de alcançar o resultado, de conseguir que ocorra, se materialize a conseqüência de seu comportamento.” (TELLES, 2002, v. 1, p. 160)

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“Para a teoria da vontade, age dolosamente quem pratica a ação consciente e voluntariamente. É necessário para sua existência, portanto, a consciência da conduta e do resultado e que o agente a pratique voluntariamente.” (MIRABETE, 2003, v. 1, p. 139)

Exemplos retirados de MEDEIROS & TOMASI. Português Forense, 2004, p. 250. No texto de Telles, notamos que é citado Carrara. Isso se chama argumento de autoridade. Em outro trecho, lança mão da paráfrase quando explica novamente o que foi dito antes, com outras palavras. Já no texto de Mirabete, o sentido é construído em cima de dois advérbios: “dolosamente” e “voluntariamente”. Vemos que o autor optou por destacar os elementos essenciais da definição. 2. MODALIDADES ESTILÍSTICAS FRASAIS Há diversos tipos frásicos retóricos, mas nem sempre são adequados ao discurso jurídico. Veremos a seguir as principais modalidades estilísticas frasais que devem ser evitadas nesse discurso.

• Frase de arrastão: seqüência de coordenações normalmente construídas por quem tem dificuldade em fazer períodos subordinados. Veja o texto abaixo:

“O julgamento iniciou e o juiz deu a palavra ao advogado e este

apresentou sua tese com entusiasmo, mas os jurados não aceitaram a legítima defesa e condenaram o réu.”

Podemos observar no exemplo que temos cinco orações coordenadas entre si, o que torna o texto “arrastado”. A reelaboração em um período mais complexo, com orações subordinadas, seria mais adequado.

• Frase de ladainha: é construída com o uso em excesso da conjunção “e”, sendo uma variedade da frase de arrastão. Chamamos atenção ao fato de que esse recurso pode ser utilizado no discurso oral, mas não deve ser empregado repetidamente, pois perderá sua validade no discurso jurídico. Porém, na modalidade escrita, deve ser evitado.

“O réu entrou na sala e caminhou lentamente em direção à vítima e a olhava friamente, com riso perverso nos lábios e balançava uma faca brilhante e afiada na mão direita e, com violência, enfiou o instrumento perfurante no ventre da mísera mulher.”

No exemplo acima, foi utilizada a conjunção “e” cinco vezes, o que é reprovável na modalidade escrita da linguagem jurídica. Mas voltamos a chamar atenção: no discurso oral, em um júri, por exemplo, se utilizada com habilidade, poderá ter sucesso.

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• Frase entrecortada: muito imprópria ao discurso jurídico, a frase

entrecortada é muito curta e, como recurso estilístico literário, denuncia a incapacidade de o homem pensar.

“O réu entrou na sala. Estava abatido. Sentou-se. Colocando as mãos na cabeça. Ela estava abaixada. Ele parecia desanimado. Ele previu o resultado adverso. Ele esperava a condenação.”

Como podemos notar, o texto é fragmentado, sem elementos coesivos, que apresentam descontinuidade de pensamento.

• Frase fragmentária: parecida com a frase entrecortada, é de incompletude sintática.

“Condenado o réu, será encaminhado a presídio de segurança máxima.”

Vemos que a primeira informação (condenado o réu) não é completada pela informação seguinte. Poderíamos dar sentido a ela se a reformulássemos, como “Se o réu for condenado...”

• Frase labiríntica: ao contrário da frase de arrastão, a frase labiríntica peca pelo excesso de subordinações, afastando-se da idéia principal apresentada.

“O Direito é a aplicação da lei que é imperativa, não convidando seus

subordinados a obedecer a ela, por exigir seu acatamento, sendo a norma jurídica a vontade do ordenamento jurídico.”

Quando ocorrem muitas subordinadas, encontramos dificuldade na interpretação do texto, por não conseguirmos identificar qual é, de imediato, a idéia principal defendida, pois há muitas idéias secundárias agregadas a ela.

• Frase caótica: embora muito empregada na literatura contemporânea, é inaceitável no discurso jurídico. É uma estrutura desorganizada e sem lógica, também chamada de fluxo do consciente.

“O réu entrou na sala e caminhou lentamente em direção à vítima. Por que a olhava friamente com riso perverso nos lábios? O balanço da faca brilhante e afiada na mão direita a fez lembrar-se de sua infância, quando viu sua mãe ser assassinada. Com violência, ele enfiou o instrumento perfurante no ventre da mísera mulher. Qual seria o motivo de tanta frieza?”

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O estilo caótico traz questionamentos e divagações que não podem ocorrer no discurso jurídico, por ser ele conciso e objetivo. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: DAMIÃO, R. T. & HENRIQUES, A. Curso de Português Jurídico. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2004. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004.

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ESTILÍSTICA Modalidades Estilísticas Frasais II

Continuando nosso estudo sobre modalidades estilísticas frasais, veremos a estruturação de frases que são mais adequadas ao discurso jurídico.

• Estruturar períodos simples e compostos, conforme a retórica jurídica; • Combinar frases para elaboração de parágrafos gráficos e formais.

A medida retórica é a mais adequada para o discurso jurídico. Vejamos algumas formas de estruturar frases.

a) Período Simples: estrutura sintática mínima com expansão moderada.

Exemplo: O réu, de repente, atacou a indefesa vítima. b) Período Composto: a estrutura mínima do período

composto deve ser a medida retórica de três orações.

Exemplo: O réu parecia desanimado, pois previa o resultado adverso e esperava condenação. c) Parágrafo Gráfico: a medida retórica do parágrafo

gráfico é de três frases e cada uma deve conter três orações.

Exemplo: Apaixonado pelo dinheiro, o rei Midas conseguiu o poder de transformar tudo que tocasse em ouro. Mas logo percebeu a loucura que era esse desejo: ele não conseguia nem mais se alimentar. É o caso de quem acumula conquistas, mas nunca se satisfaz plenamente.

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d) Parágrafo Formal: a medida retórica aqui, será de três argumentos no desenvolvimento do discurso dissertativo.

Exemplo: Introdução + Desenvolvimento (idéia 1, idéia 2, idéia 3) + Conclusão. Em tempo algum deparamos com a atual e caótica situação de segurança pública (Introdução). Parece que a vida humana pouco ou nada vale (idéia 1). Onde foram parar aqueles valores que povoariam e enobreceriam a generosidade da alma humana? (idéia 2) Se para algumas pessoas o direito à vida não tem qualquer sentido, para o Estado, pela sua própria razão de ser, deve erigir-se em primeiro e mais sagrado dos direitos fundamentais ou absolutos. (idéia 3) Assim, para não se incorrer em contradição e inaceitável desvio de finalidade, providências urgem, afinal, um “amontoado” de pessoas que denominamos “nação” um dia se organizou política e juridicamente para formar um ente, protetor maior, denominado “Estado”. (conclusão) (Adaptado de Elias Mattar Assad, Revista Jurídica Consulex, 15 de junho de 2005, p. 12)

A medida retórica deve servir de parâmetro ao discurso jurídico, mas não é rígido, permitindo-se variações aos parágrafos gráficos.

Já que conhecemos os aspectos iniciais da estilística da linguagem jurídica, vamos praticar seu uso?

1. Construa períodos compostos com os períodos simples dados. a) O réu alegou inocência. As provas foram insuficientes. b) O advogado estava animado. Os jurados pareceram interessados. c) O juiz vai encaminhar o réu à penitenciária. Ele será conduzido

algemado. d) A audiência foi movimentada. Houve muitos depoimentos

contraditórios. e) Este advogado fala muito bem. Ele convence qualquer auditório.

2. Os períodos abaixo devem ser organizados de forma subordinada.

Para isso, eleja a idéia principal e faça os ajustes necessários.

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a) Este promotor me lembra os homens desalmados. b) (Estes) só pensam em sua ambição. c) (Ele) lança sem piedade inocentes nas masmorras.

a) O acusado não sentia remorsos. b) Para ele a vida nada vale. c) A vítima era uma criança.

Os exercícios foram retirados de DAMIÃO & HENRIQUES. Curso de Português Jurídico. 2004, p. 97.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: DAMIÃO, R. T. & HENRIQUES, A. Curso de Português Jurídico. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2004. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004.

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ESTILÍSTICA Colocação dos Termos

Tonalidade Emotiva das Palavras Nesta aula, estudaremos as possibilidades de colocação dos termos na oração e quais esquemas podem ser utilizados. 1. COLOCAÇÃO DOS TERMOS O esquema clássico seguido na língua portuguesa é o S+V+C (Sujeito + Verbo + Complemento). Freqüentemente esta ordem pode ser alterada e isso não constitui erro. Observe: Princípios são gerais, enquanto as peculiaridades são restritas. Temos nesse período, na primeira oração, o sujeito (Princípios), o verbo (são) e o complemento (gerais). A segunda oração também segue esta ordem: sujeito (as peculiaridades), verbo (são) e complemento (restritas). Quando na linguagem jurídica há inversão, busca-se a ênfase de algum termo. Assim, as palavras que estão no início ou as que estão no fim das frases têm maior destaque. São gerais os princípios, enquanto são restritas as peculiaridades. Fazendo esta inversão (V+C+S), demos ênfase à característica do sujeito e não ao sujeito em si, conforme o exemplo anterior. É uma questão de estilo. Quanto ao uso de adjetivos, precisamos estar atentos para o fato de ele vir antes ou depois do substantivo que caracteriza. Quando usamos o adjetivo antes do substantivo, estamos carregando o texto de afetividade, ou

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seja, utilizamos a linguagem conotativa. Na próxima aula, entraremos em mais detalhes sobre denotação e conotação.

Conotação: conjunto de alterações ou ampliações que uma palavra agrega ao seu sentido literal (denotativo) por associações de diversos tipos ou por identificação com algum dos atributos de coisas, pessoas, animais ou outros seres da natureza, ou do mundo social ou com coisas, personagens ou pessoas que inspiram sentimento de admiração.

Denotação: extensão do conceito que constitui o significado de uma

palavra. Designa o sentido literal das palavras, ou como costumam chamar “significado real” das palavras.

HOUAISS, A e VILLAR, M. S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. Ao colocarmos o adjetivo depois do substantivo, utilizamos a linguagem denotativa, própria da linguagem jurídica, que, aliás, tem um emprego menor de adjetivos. Vamos observar os exemplos abaixo e ver como a posição do adjetivo em relação ao substantivo, pode mudar consideravelmente o seu significado. Por isso, na modalidade jurídica, temos que ter atenção redobrada quanto ao uso dos adjetivos. A mulher pobre foi abandonada pelo marido. A pobre mulher foi abandonada pelo marido. No primeiro caso, o adjetivo “pobre” caracteriza o seu substantivo “mulher” como não tendo recursos financeiros. Já no segundo caso, o mesmo adjetivo caracteriza a “mulher” como sofredora, carente de atenção. 2. TONALIDADE EMOTIVA DAS PALAVRAS Ao produzirmos um texto, principalmente utilizando a linguagem jurídica, devemos ter cuidado na escolha da palavra, pois a tonalidade afetiva é evidente no contexto. Veremos algumas formas de demonstram mais facilmente nosso posicionamento emocional diante dos fatos que apresentamos.

• Palavras de significado afetivo: esse tipo de palavra deixa transparecer a emoção, o sentimento, o estado de alma de quem produz do texto. O adjetivo caracteriza emocionalmente quem fala; o substantivo abstrato, destaca o sentimento. Veja os exemplos os exemplos:

O réu nervoso incomodou o advogado. O nervosismo do réu incomodou o advogado.

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Podemos notar que o segundo exemplo seria mais adequado, ou seja, o substantivo abstrato está menos ligado ao sujeito, causando menos emoção.

• Palavras que exprimem julgamento: os profissionais da área jurídica devem estar muito atentos à escolha das palavras como adjetivos que atribuem qualificações positivas ou negativas, como substantivos abstratos, verbos e advérbios a eles correspondentes. Ao utilizar essas expressões, o falante poderá estar julgando sem perceber, e em alguns gêneros jurídicos, isso não é aconselhável.

Encorajado pela amante, o covarde réu matou seu rival.

Pela seleção de palavras utilizadas, identificamos o posicionamento do autor do texto acima. O verbo “encorajado” traz um julgamento implícito de que o réu não agiria por si mesmo; da mesma forma o adjetivo “covarde” traz a idéia de que o réu foi cruel, que a vítima não teve meios de se defender.

• Avaliação: aqui, mais uma vez, ressaltamos a importância da escolha estilística na escrita de um profissional da área jurídica, que deve ser clara, objetiva e liberta de palavras preconceituosas, que trazem uma idéia abstrata pejorativa.

O pai do réu previu um futuro negro para o filho. A vítima foi encontrada em seu casebre mortalmente ferida.

Quando o autor do texto escolheu a palavra ”negro” para acompanhar o substantivo “futuro”, foi preconceituoso, pois relacionou fatos ruins à cor negra. Já no segundo exemplo, a escolha da palavra “casebre” demonstra que o autor avalia a residência da vítima como sinônimo de pobreza, de pequenez.

Vamos analisar os trechos de um inquérito policial. Segundo Mirabete (1996:81), o gênero inquérito policial deve conter “certas provas periciais que (...) contêm em si maior dose de veracidade, visto que nelas preponderam fatores de ordem técnica que, além

de mais difíceis de serem deturpados, oferecem campo para uma apreciação objetiva e segura de suas conclusões”

Procure exemplos de como os termos foram colocados, se há tonalidade emotiva nas palavras empregadas: de significado afetivo que exprimam julgamento ou avaliação.

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1. “Emérito Julgador e Douto Promotor de Justiça, atentem agora para o absurdo da explicação feita por Maria...” 2. “Vejam Doutas Autoridades – Juiz e Promotor de Justiça, na explicação da interrogada, primeiro os assassinos tiraram sua aliança de seu dedo ‘ela não acordou’ e depois o colar do pescoço ‘continuou dormindo’. Meu Deus!! Incrível! Retiraram Maria da rede ‘alguém a carregava’.” 3. “Saltam aos olhos da mais leiga criatura do mundo, o álibi montado por Maria para não dar conta de quem foram os assassinos de seu esposo João, está amolentado em conteúdo incerto e mentiroso. Não tenho dúvida disso.” 4. “Mentiu novamente, caindo por terra, o álibi montado por Maria em suas falácias...” 5. “Falseou com a verdade Maria, portanto, está dificultando as investigações...” 6. “Outro absurdo dessa mulher, Maria. Quando ela gritou por Joana, só disse: ‘Joana, Joana, socorro! Tem dois ladrões aqui dentro da minha casa.’ Ora, meu Deus!” 7. “Por que ela não gritou pelo marido embora deitado na cama sem poder se levantar? Porque ela sabia que ele já estava morto. É claro, não tenho dúvida disso!” 8. “Douto Magistrado e Douto Promotor de Justiça, não podemos embarcar nessa canoa furada de Maria.” 9. “Vejam vossas excelências, não é uma situação vexatória e duvidosa?” 10. “Sempre respeitosamente é o relatório. Deus seja louvado! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: HOUAISS, A e VILLAR, M. S. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. MEDEIROS, J. B. & TOMASI, C. Português Forense: a produção do sentido. São Paulo: Atlas, 2004. MIRABETE, J. F. Manual do Direito Penal. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

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“A ARTE DE ARGUMENTAR”

GERENCIANDO RAZÃO E EMOÇÃO”

Nesta aula discutiremos o livro “A Arte de Argumentar – gerenciando razão e emoção”, de Antônio Suárez Abreu. Veremos em que esse livro mais contribuiu para melhorar nosso poder de argumentação. Depois, assistiremos ao filme “Tempo de Matar” para relacionarmos situações vividas pelos personagens à arte de argumentar.

• Entender os motivos pelos quais devemos saber argumentar; • Compreender as técnicas argumentativas que temos à disposição na

língua.

Discutiremos item por item, para vermos se

há dúvidas e se compreendemos bem as informações principais que a obra traz.

1. Por que aprender a argumentar? “Saber argumentar é, em primeiro lugar, saber integrar-se ao universo do outro. É também obter aquilo que queremos, mas de modo cooperativo e construtivo, traduzindo nossa verdade dentro da verdade do outro.” 2. Gerenciando informação “Por meio da leitura, podemos, pois, realizar o saudável exercício de conhecer as pessoas e as coisas, sem limites no espaço e no tempo. Descobrimos, também, uma outra maneira de transformar o mundo, pela transformação de nossa própria mente.”

3. Gerenciando relação “Conseguimos diminuir a distância que nos separa das partes mais longínquas do mundo, por meio da aviação a jato, da tevê a cabo, da

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Internet, mas não conseguimos diminuir a distância que nos separa do nosso próximo.”

4. Argumentar, convencer, persuadir

“Argumentar é a arte de convencer e persuadir. Convencer é saber gerenciar informação, é falar à razão do outro, demonstrando, provando. (...) Persuadir é saber gerenciar relação, é falar à emoção do outro.”

5. Um pouco de história “Os métodos retóricos da exploração da verossimilhança e dos diferentes pontos de vista sobre um objeto ou situação têm sido o motor que vem impulsionando o grande avanço moderno da ciência e da tecnologia.”

6. Condições da argumentação “A primeira condição da argumentação é ter definida uma tese e saber para que tipo de problema essa tese é a resposta. (...) A segunda condição da argumentação é ter uma ‘linguagem comum’ com o auditório. (...) A terceira condição da argumentação é ter um contato positivo com o auditório, com o outro. (...) Finalmente, a quarta condição e a mais importante delas: agir de forma ética.”

7. O auditório “O auditório é o conjunto de pessoas que queremos convencer e persuadir. (...) É preciso não confundir interlocutor com auditório.”

8. Convencendo as pessoas “Ao iniciar um processo argumentativo visando ao convencimento, não devemos propor de imediato nossa tese principal, a idéia de que queremos ‘vender’ ao nosso auditório.”

9. As técnicas argumentativas “Técnicas argumentativas são os fundamentos que estabelecem a ligação entre as teses de adesão inicial e a tese principal. Essas técnicas compreendem dois grupos principais: os argumentos quase lógicos e os argumentos fundamentados na estrutura do real.”

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10. Dando visibilidade aos argumentos “Recursos de presença são procedimentos que têm por objetivo ilustrar a tese que queremos defender.”

11. Persuadindo as pessoas “A primeira lição de persuasão que temos a aprender é educar nossa sensibilidade para os valores do outro.”

12. Emoções e valores “Raiva, medo e tristeza são emoções disfóricas. Amor e alegria, eufóricas. Nossos valores estão ligados à emoções eufóricas.”

13. As hierarquias de valores “Fatores culturais, históricos e ideológicos influem na elaboração dos valores e hierarquias.”

14. Alterando a hierarquia de valores “Para re-hierarquizar os valores do nosso auditório, podemos utilizar algumas técnicas conhecidas desde a Antigüidade e que recebiam o nome de Lugares da Argumentação.”

15. Afinal de contas, o que é argumentar? “Argumentar é, em primeiro lugar, convencer, ou seja, vencer junto com o outro, caminhando ao seu lado, utilizando, com ética, as técnicas argumentativas, para remover os obstáculos que impedem o consenso.”

16. Aprendendo a ‘desenhar’ e ‘pintar’ com palavras “Para sermos criativos na escolha das palavras-chave que pretendemos usar em nossa argumentação, precisamos silenciar, por alguns momentos, nosso pensamento lógico, e divagar por entre sentidos e sons, anotando as palavras que vão surgindo por livre associação, para só então fazer escolhas.”

Agora já podemos assistir ao filme programado observando quais técnicas argumentativas foram utilizadas pelos personagens.

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A releitura do livro é muito importante!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ABREU, A. S. A Arte de Argumentar: gerenciando razão e emoção. 5. ed., São Paulo: Ateliê Editorial, 2002.

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“DEBATE SOBRE O FILME ‘TEMPO DE MATAR’”

Já discutimos a obra de Antônio Suárez Abreu, “A arte de argumentar”. Agora, iremos relacionar o livro ao filme “Tempo de Matar”, do diretor Joel Schumacher , distribuidora Warner, 1996.

• Identificar situações argumentativas no filme; • Relacionar as situações argumentativas a itens do livro.

Sinopse

Uma garota negra de apenas 9 anos de idade é estuprada por dois racistas brancos completamente bêbados. Em um ato desesperado de ódio e vingança, seu pai mata os homens a tiros. Agora Carl Lee Hailey (Samuel L. Jackson) irá a julgamento pelo assassinato de dois homens brancos. É assim que a lei pretende tratar o caso. Para defendê-lo, Hailey conta com o corajoso Jake Brigance (Matthew McConaughey) e a idealista Ellen Roark (Sandra Bullock), dois jovens advogados em busca da verdade. Em poucos dias o julgamento transforma-se em uma violenta batalha racial, em que a vida de todas as pessoas envolvidas com o caso está correndo perigo. O destino de um homem injustiçado está nas mãos de Jake e o tempo está se esgotando…

Você deverá retomar a teoria de cada item e

escolher situações do filme que os representem. - Condições de argumentação; - Convencendo as pessoas; - Recursos de presença;

TEMA 10

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- Dando visibilidade aos argumentos; - Persuadindo as pessoas; - Emoções e valores; - Hierarquias de valores;

- Alterando a hierarquia de valores.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ABREU, A. S. A Arte de Argumentar: gerenciando razão e emoção. 5. ed., São Paulo: Ateliê Editorial, 2002. Tempo de Matar. Direção: Joel Schumacher , distribuidora Warner, 1996.