liberdade de conhecimento e a reforma educacional brasileira dos anos 1990

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  • 8/18/2019 Liberdade de Conhecimento e a Reforma Educacional Brasileira Dos Anos 1990

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    Liberdade de conhecimento e a reforma educacional brasileira dos anos1990

    Ialê Falleiros Braga

    Neste breve artigo, proponho refletir sobre como as políticas públicas para aeducação básica no Brasil atual – especialmente as relativas ao estabelecimento deparâmetros curriculares nacionais – vêm contribuindo ou não para a edificação deuma proposta educacional voltada liberdade de conhecimento!

    "ntes de tudo, gostaria de contar uma conversa #ue tive com um amigo professorde uma escola estadual na periferia de $ampinas, na #ual ele di%ia #ue, vendo seusalunos desmotivados com o estudo, resolveu #uestioná&los sobre o estado de ânimogeral da turma! 'm dos adolescentes desabafou( a escola, com todos a#uelesconteúdos, tarefas e provas, o aprisionava! )eu amigo, desolado, passou a seperguntar( *$omo convencê&los do contrário+ u acredito #ue o conhecimentoliberta---. 

    'ma nova concepção de educação pode ser percebida nas políticas encaminhadaspelo )$ ao longo dos governos /0$! "finada ao novo modelo de stadoimplantado nesse mesmo governo, a educação pública passa nos anos 1223 a serentendida como responsabilidade de todos, embora as diretri%es curriculares e aavaliação escolar devam ficar a cargo do )$! No caso dos 4arâmetros $urricularesNacionais 54$N6, a comunidade escolar tem a opção de aderir ou não a eles, masserá avaliada pelo )$ a cada etapa de seu trabalho! 7 stado, preestabelecendoum corpo de conhecimentos e uma forma específica de analisá&los – atrav8s dos4$N – e avaliando as escolas públicas a partir desses mesmos conteúdos – via9"B, N), 4rovão –, *dei:a livre. as redes estaduais e municipais de ensino e asunidades escolares para *gerenciarem. e *operacionali%arem. o novo currículo5im6posto!

    )as no #ue esse corpo de conhecimentos difere do anteriormente trabalhado nasescolas+ 4or #ue adotar esse novo modelo curricular+

    " *educação para a cidadania. proposta pelos 4$N tem em vista desenvolver entrecrianças e ;ovens – a partir dos

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    "inda #ue os apologistas das competências afirmem #ue o #ue se prop=e 8 apenasum novo m8todo de trabalho dos conteúdos escolares básicos em substituição aoseu antigo tratamento tradicional desconte:tuali%ado e estan#ue dado pelasdisciplinas escolares, a mudança de foco do saber acumulado para o saber vivido doaluno pode p?r em risco a liberdade de conhecimento se essa bagagem pr8via deconhecimentos tra%ida pelas crianças e ;ovens para a escola não for trabalhada

    arduamente para se chegar ao conhecimento científico e aos embates mais amplos#ue o caracteri%am! Nos 4$N, ao contrário, o conhecimento sistemati%ado aparececomo desvinculado da hist@ria, *desideologi%ado., assim como as competências aserem trabalhadas para a vida profissional e cidadã!

    7s ;ovens devem sair da escola básica 5o #ue, a partir da Gei de Hiretri%es e Basesde 122I, significa ensino fundamental e m8dio6 com a certe%a de #ue s@ terão bomdesempenho profissional e pessoal se continuarem aprendendo ao longo da vida!ssa verdade se torna cruel, no entanto, #uando analisamos o #uadro dedesemprego estrutural #ue assola o mundo e em especial os países capitalistasperif8ricos! Hiante dele, os indivíduos passam a ser responsabili%ados pela suacapacidade pessoal ou não de competir e garantir os recursos para sua

    sobrevivência e, ao mesmo tempo, de contribuir para a diminuição dos contrastessociais e:istentes!

    ssa nova proposta educacional acredita ser capa% de preparar futurosprofissionaisJcidadãos a partir de valores e atitudes a la *faça sua parte. e, aomesmo tempo, valores e atitudes agressivas para competir num mercado detrabalho cada ve% mais precari%ado e restrito no conte:to do aclamado *progressotecnol@gico.! " escola tem um papel fundamental na difusão desse novo modelo decidadania e, num país tão grande e com tamanhas diferenças regionais como oBrasil, os programas escolares passam a sofrer, nos anos 1223, um processo depadroni%ação atrav8s de parâmetros curriculares e avaliaç=es nacionais!

    Nos 4$N, não cabe educação escolar básica, nem no seu último estágio 5o ensinom8dio6, a preparação para a pes#uisa científica e o desenvolvimento de novosconhecimentos! "o contrário, a ênfase está no manuseio das novas tecnologias e napreparação sub;etiva dos educandos para lidar com as instabilidades característicasdo atual mercado de trabalho e com as novas formas de participação política #uemarcam nossos dias!

    Não por coincidência, os valores ligados *nova cidadania. difundidos pelos 4$N seassemelham visão do Banco )undial, como podemos visuali%ar neste trecho dorelat@rio do seminário *Novas parcerias em políticas de combate pobre%a.,reali%ado em Belo 0ori%onte, em 122K, por esse banco, com o apoio do BancoNacional de Hesenvolvimento con?mico 9ocial 5BNH96 e do governo estadual de

    )inas Lerais(

    7 seminário foi convocado como parte do 4lano de "ção de 4articipação para a"m8rica Gatina, #ue previa seminários regionais em toda a "m8rica Gatina! 5!!!6Hurante o seminário se debateu #uest=es mais amplas como as relaç=es entregoverno&sociedade civil, novos atores da sociedade civil enga;ados no combate pobre%a, e estudos de caso sobre programas específicos de combate pobre%a dosgovernos e da sociedade civil! 5Larrison, D333, p!IK6

    No #ue se refere s escolas públicas brasileiras, esses *novos atores da sociedadecivil. são principalmente empresas #ue, atrav8s de fundaç=es, institutos e demais7NLs, vêm buscando reali%ar atividades voltadas responsabilidade social direta

    ou indiretamente vinculadas educação! 'm e:emplo disso 8 o manual *7 #ue asempresas podem fa%er pela educação., publicado pelo nstituto thos de mpresas

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    e Cesponsabilidade 9ocial, composto atualmente por M3M empresas, das #uais#uase E3 são de grande porte! Neste manual, a produção de materiais didáticos 8um dos focos de ação sugeridos a empresas #ue dese;am colaborar com a escolapública no país 5pp!FD&FO6! Nessa mesma direção, o 4ro;eto $uidar do nstituto9ou%a $ru% e o 4rograma de ducação "fetivo&9e:ual da $ompanhia 9iderúrgicaBelgo&)ineira assumem a tarefa de implementação dos temas transversais nas

    escolas da rede pública, fornecendo gratuitamente materiais didáticos pr@priosancorados nos princípios gerais delimitados nos 4$N!

    Perificamos assim #ue os 4$N se configuram num instrumento de controle porparte do stado do #ue se deve ensinar e aprender nas escolas públicas de todo opaís, de acordo com os princípios gerais definidos pelos organismos capitalistasinternacionais – tanto no #ue se refere adaptação de tecnologia pelos países decapitalismo perif8rico #uanto com relação ao modelo de cidadania *colaboradora.,#ue não #uestione os fundamentos da nossa sociedade –, bem como numaimportante via de acesso do setor empresarial nacional s políticas públicaseducacionais, favorecendo a possibilidade de intervenção direta das empresasprivadas no currículo, na seleção de materiais e na gestão dos recursos das escolas

    públicas brasileiras!

    nfeli%mente, a liberdade de conhecimento não 8 garantida nesse modelo deeducação, e talve% por isso professores como meu amigo sintam tanta dificuldadeem convencer seus alunos de #ue *o conhecimento liberta.!

    Ialê Falleiros Braga é mestre em educação pela UFF e membro do Coletivo deEstudos de Política Educacional - grupo de pesuisa do C!P"

    Referências Bibliográficas

    BC"L", alê /alleiros! 7s 4$N e a formação escolar do novo homem( um estudosobre a proposta capitalista de educação para o Brasil do s8culo AA! Niter@i, Qs!n!R,D33E! 5Hissertação de mestrado! 'niversidade /ederal /luminense – ducação6

    BC"9G! 9ecretaria de ducação /undamental! 4arâmetros curriculares nacionais!9ecretaria de ducação /undamental! – Brasília( )$J9/, 122K!

    BC"9G! 9ecretaria de ducação )8dia e