lealconselheiroo00duar

714

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LEAL

CONSELHEIRO

PARIZ.

MA

OFFICINA TYPOGRAPH1CA DE FAIN E THCEHOTKF.Af.-

,

TYP00KAPHOS DA

INIYERSIOADE,

Dti

FRANA,

Rua Racine,

28

junto ao OtJeon.

LEAL CONSELHEIROO QUAL FEZ DOM DUARTE,Pela graa de Deos Rei de Portugal e do Algarve,

e

Senhor de Ceuta

,

SEGUIDO

DO LIVRO DAQuefez

HINA1AmesmoRei,

DE BEI CAVALGAR TODA SELLA,o qual

o

comeou em sendo

Infante

;

PRECEDIDO

DUMA 1NTRODUCO, ILLUSTBADO COM

VABIAS NOTAS, E PUBLICADO DEBAIXO DOS AUSPCIOS

Do Excel lentssimo Senhor Visconde de Santarm,Scio da Academia Real das Sciencias de Lisboa, do Instituto de Frana, etc-, ele.

FIELMENTE TRASLADADO DO MANUSCRITO CONTEMPORNEO,QCE SE CONSERVA NA RIBLIOTHECA REAL DE PARI/, REVISTO, ADDICION ADO COM NOTAS PQILOLOGlCASDAS PALAVRAS E PURASES ANTIQUADAS E OBSOLETAS QUE NELLE SE ENCONTRO,E

UM CLOSS ARIO

.

IMPHEi-SO

*

Cl

M

*

DE

J.

I.

ROQUETE,

PRESBYTERO.

ijMW**

PARIZ,EM CASA DEJ.

P.

AILLALD,

II,

QUAI VOLTAI BE

E

EM PORTUGAL..

EM CASA UE TODOS OS MERCADORES UE LIVROS

DE LISBOA PORTO E COIMBRAMDCCCXLI1.

INTRODUCCO. ^

Porlugal, para serPrncipes que antes

em

tudo grande nos tempos remotos, at teverestaurao dasLettras, no sat as cultivaro.

mesmo da chamada,

protegero as sciencias

mas, o que

mais,

EIRei

Dom

Diniz, contemporneo dos dous maiores sbios da Idade Media,

d'Alberto

Magno,

e de Rogrio

Bacon

,

nao s fundou a clebre Univerde toda a Europa oselle

sidade que possumos,

qual viero desde logo

homens mais

sbios

do seu sculo, mas at cultivou,

mesmo

as

sciencias e as lettras

escrevendo

um

tratado da milcia, e

compondod'isso

varias poesias

que

se

encontro no seu Cancioneiro, fazendo alm

traduzir do rabe a Chronica do clebre

Mouro Rhazis

;

EIRei

Dom

Pe-

dro

I

honrou tambm a poesia

(1)

;

EIRei

Dom

Joo

I,

alm do profundo

conhecimento que linhada lngua latina, de quepozelle

fizera traducces,

com-

mesmo algumas

obras de que logo trataremos.

Porm

entre os escriptosde taoillustres Monarcas, osquaes pela maior

parte se extraviaro, ou inteiramente se perdero, muito se destinguempelo seu numero, e pelo seu objecto, as obras do illustre Rei

Dom Duarte.s os

Este Prncipe desde a sua infncia recebeo os exemplos de seu grandepai,

e da clebre Princezaillustres Prncipes

que teve a gloria de dar a Portugal nao

mais

de que podemos gloriamos, mas os mais clebres

O Senhor Dom Duarte, mais applicado do que os outros, que o precedero, philosophia do seu tempo, e mais dadoda Europa daquelle tempo.a este gnero destudos,

em

quasi todos os seus escriplos, que

em

outra

(1)

f^ule os Cancioneiros

: ,

VI

parte indicaremos

,

tem por objecto a philosophia moral;

e esta conside-

rao bastava para fazer mais sensvel a perda de suas obras.

Segundo o Abbade Barbozaexistio

,

das muitas obras d'este Prncipe no,

em

Portugal seno dez

as quaes se conservavo

na Cartuxa

dEvora eme obras de

um Mss., com

o titulo de

Memorias

varias, e os Tratados

maior extenso, e importncia, perdro-se de lodo, restandottulos.

nos somente d'elles a lembrana nos

Entre as produces dose

Senhor

Dom

Duarte as que por muito tempo

julgaro perdidas, ero

justamente as mais importantes, e que hoje apparecem pela primeira vez;i

luz, a saber o

Leal Conselheiro ,,

e o Livro da-

Ensynanca de bem

cavalgar toda sella

trasladadas fielmente do magnifico Cdice 7007 da

Bibliolheca Real de Pariz.

Para provarmos que estas importantes obras que hoje saem ao publico,,

no ero conhecidas dos nossos Escriptores, referiremos aqui o que acercadelias dizem os mais clebres.

Ruy de Pina, comfalia

ser to

prximo da poca dElReid'este

Dom

Duarte,,

dum modo toa conhecer:

vago e to superficial das obras

Monarca

que

d

bem

que nunca as viofoi

;

e at foi e

muito injusto a seu reslgico(1).

peito, pois diz

Somente

grammatico

algum tanto

Duarte Nunes de Leo diz no cap.

XIX

da Chronica d'aquelle Monarca

Naelles

lingoai latina escreveo alguns livros de cousas moraes, e entre

hum

tratado do regimento da justia, e dos ofliciaes delia

,

de que

uma

parte se v ainda agora na casa da Supplicao. Escreveo outro

tratado dirigido Rainha sua molher, cujo titulo era dolheiro.

Leal Conse-

Outro

livro para os

homens que ando a cavallo em que parece,

daria alguns preceitos de

bem

cavalgar, e governar cavallos.

Ora j por

este passo nos

mostra este clebre Escriptor que,

elle

no

vira o Leal Conselheiro, e s delle tinha noticia

e

quanto arte de ca-

valgar as que linha ainda ero mais imperfeitas Explicando se Duarte

Nunes de modo que pareceUnhosido escriptas

indicar que todas as obras,

dEIRei

Dom Duarte

em

latim

prova que aquelle hbil Chronista no

(1)

Veja-se T.

I

dos Inditos, pag. 79.

,

VII

conhecera o Leal Conselheirofallaria

,

pois sendo hbil philologo

sem duvida

mais circumstanciadamente de urna obra que naquelle tempo devia

ser j preciosa pela antiguidade e pelo autor.

Aem

incerteza

com que Duarte,

Nunes

fallou das obras,

que publicmos,

fez dizer a

D. Nicolo Antnio

que todas

as obras deste Rei foro escriplas

latim.

Fr. Bernardo de Brito diz apenas no elogio, que fez deste Monarca, queh

na philosophia moral escreveo alguns tratados por muito

bom

estilo

em particularvi

Ao fiel conselheiro, do

bom governolivro tidos

da justia, de que eu,

huns grandes fragmentos,

em hum

da misericrdia deixou

que naquelle tempo foro

um

livro da arte de cavalgar

muy antiguo e em grande estima... e domar bem hum cavallo. pequeno etitulo

Ora jcmos,

se v,

que

este

Chronista

nem o

exacto do livro, que publi-

sabia

preciosa

nem no formato por elle indicado se podia encontrar esta obra que occupaum grande Cdice in-fol., como adiante mos-

traremos.

Vrios escriptores seguiro a autoridade de Fr. Bernardo de Brito,fazendo meno daquelles tratados, e conviro que de todosse sabiaelles

nada

que

existisse j naquelles

tempos

em

Portugal.

Os autores, queos dous que

se seguiro a estes,

soubro apenas a este respeito o que

mencionmos havio(1)

dito.

Manoel de Faria

e

Souza na sua

Europa Portuguezanocitasse,

copiou exactamente Duarte Nunes, posto que o

e sobre o

testemunho do mesmo Duarte Nunes(2).

se

fundou

Dom

Antnio Caetano de Souza

A' vista pois do que deixmos dito no resta a menor duvidadestas duas obras d'ElRei

,

que

Dom

Duarte, que o benemrito editor d pela

primeira vez luz

,

os Chronislas

que mencionmos dro d

ellas noticias

por informaes

,

e que de

nenhuma

delias viro cousa alguma-, e Bar-

boza entendeo mal quando julgou que Fr. Bernardo de Brito tinha vistofragmentos do Leal Conselheiro;

pois das palavras daquelle Chronista,

(1) T. II, P. III, c. 2. (2) Hist.

Geneal. da Casa Real Portug.,

liv. Ill,

cap. 70.

VIII

ero somente do

se

mostra que os fragmentos quejustia.

elle vira,

bom governo

a

Taeserao as noticias que havia das obras dEIRei

Dom,

Duarte, quando,

Joo Franco Barreto descobrio, na Livraria da Cartuxa dEvora

umdeo

grande numero dobras, compostas pelo dito Soberanona sua Bibliotheca Ms.,

cujos ttulos

e da qual

Dom

Antnio Caetano de Souza os

copiou, e imprimio nas Provas da Historia Genealgicaaddies, e que reproduzimos no rim desta Introduco,

com algumas

(1).

Pelo que deixmos substanciado se mostra que das duas grandes obras

do Senhor Rei

Dom

Duarte, que

vem

pela primeira vez a luz publica

neste livro, os nossos escriptores tinho apenas noticias confusas, e se

no Unho podido descobrir

em

Portugal, e s se soube pela primeira

vez onde paravo pela erudita noticia, que delias deo

em 1820 um

dos

benemritos redactores dos Annaes das Sciencias

,

e pela

que ns mesmos

apontmos

em

a nossa noticia dos Mss. portuguezes da Bibliotheca Real

de Pariz pelo

mesmo tempo

inserta

nos ditos Annaes. Vinte e douslitterato tivera

annos

se passaro depois

que o publico

conhecimento dosalvai as

logar onde existio estas duas obras, e a

ningum lembrouNaoe ao

do

esquecimento

em que jazio,

restituindo-as e

mundo

litterario

por meio da estampa.

O

nobre

bem

desinteressado patriotismo do

Snr. Jos Ignacio Roquete veio no fim deste longo perodo fazer este importantssimo servio; tanto feito custa

Naoelle

mais digno de apreo, quanto

de sacrifcios verdadeiramente portuguezes, pois esta publie magnificncia, tirada daslitterarios

cao, feita

com admirvel luxo

economias

que

fizera

do fructo dos seus trabalhos

em

paiz estranho,

no

cobrindo as subscripes metade das despezas; e no se satisfazendoestes sacrifcios se

com

deo alm disso ao mprobo trabalho de

tirar

a copia do

Cdice com a maior fidelidade, e de enriquecer o textoimportantes notas philologicas(2)

com numerosas e

A

nao dever pois ao benemrito

(1) (2)

Souza,

Hist.

Geneal.,

liv. III,

Prov. 41.

As notas marcadas com a

lettra (U) so todas

do Editor.

IX

editor a restituio das obras deella

um

dos mais illustres Monarcas que sobre

imperaro; devl-a-ha finalmente liberalidade com que M.

Cham-

polion-Figeac, Conservador dos Manuscriptos da Bibliotheca Real dePariz, pz nossa disposio o Cdice que as encerra, e a

M. Naudet, sbio

Director deste magnifico estabelecimento

,

que promoveo que a licena

nos fosse concedida para o darmos ao publico.

As obras d'ElRei

Dom

Duarte, que se contm neste volume, so pois

importantssimas, pela poca

em

que foro escriptas

,

pelo autor que as

compoz,antigo

e pelas matrias

que encerro. Pela poca, por serem o mais

monumento da

nossa lingua que temos

em

corpo dobra

(1)

;

pelo

autor, porque foi indubitavelmente o mais sbio Soberano do seu tempo,e se

nos no enganmos, o nico autor entre os Monarcas seus contem-

porneos,

como mostraremos

adiante; e pelas matrias, porque

mximaslhe

de phiiosopbia moral que

um

Rei compe nos

momentos vagos que,

permitte o cuidado da administrao dos seus povos

devem

ser de

mui

interessante lio, porque lheoria dos princpios junta a sanco daprticaillustre,

e o

merecimento no vulgar, e o peso da autoridade da penna

que os escrevera, como mui judiciosamente observa o benemrito autor do artigo inserto nos Annaes das Sciencias. Com efTeilo no nosconsta que os dous Soberanos que imperavod'EIRei

em Allemanba no tempo

Dom

Duarte, a saber os Imperadores Roberlo, e Segismundo,scien tifica,

compozessem obra alguma

posto que o primeiro tivesse grandes;

talentos e saber, e o segundo fosse dotado de grande engenho tam pouco podemos descobrir produco alguma dAlberto d'Austria, Rei d'Hongria, nem deparmos com noticia alguma que nos indicasse, que Hen-

rique

V dlnglalerra

tivesse

composto alguma obra, apezar das suas emiEIRei

nentes qualidades,

nem tam pouco

Dom Joo II

de Caslella. Pelohistoria para

que respeita a Carlos VII, Rei de Frana, basta

lr a

(1)

Ferno Lopes, s escreveo

as Chronicas1-134(

por ordem d'este

mesmo Soberano,

.01110 se

v da Carla de 19 de Maro de3

vide

Confirmao do Senhor Rei

Dom Afno Real

tonso

V de

de Junho de 1409,

liv.

19 da Chancellaria d'este Rei, foi. 32,

Archivo da Torre do

Tombo V

,

vr-mos a impossibilidade des Prncipe

se

occupar de produces

litterarias.

Um

daquella poca pode

em

certo

modo

ser

comparado com oevidente supe,

Senhor

Dom

Duarte, resultando d'esta comparao

uma

rioridade da parte do nosso sbio Monarca.cipe a

Cosme de Medicis

o Prn-

que alludimos.tinha

O Senhor Dom Duarte

como

aquelle Prncipe no s o gosto

,

e

amor do estudo, mas almde Medicis juntava

d'isso

compoz

um

grande numero de obras,

o que no fez o seu illustre contemporneo.

Do mesmo modo que Cosme,

em

torno de

si

os

homens instrudos ElRei Dom Duarte

nos mostra no Leal Conselheiro que praticava o

mesmo

systema. Selivros

Cosme de Medicis noElReisua Livraria

se

poupava a despezas para alcanar os bonsaquelle Prncipe,

Dom Duarte imitava,

como

se v pelo

Catalogo da

e pela citao de muitas obras de

que

faz

meno no Leal

Conselheiro, etioo lanou os

em

outros de seus escriptos

;

e se o sbio Prncipe Floren-

fundamentos da Bibliotheca conhecida hoje com o nome

de Laurenciana, o Monarca portuguez lanouBibliotheca Real

tambm

os da primeira

em

Portugal

;

finalmente se

Cosme de Medicis protegeo,

por

modo

to destincto as lettras e as sciencias

deve attender-se a que

ElB.ei

Dom

Duarte

fez

muito mais, relativamente fallando, do que aquelle

illustre

restaurador das lettras, pois o Monarca portuguez viveo apenas

trinta e sette

annos, tendo reinado s cinco, e Cosme de Medicis viveo(t).

sedenta e cinco annos, tendo governado trinta e quatro

A erudio

do Senhor

Dom Duarteelle citados s

era pasmosa para o seu

tempo

e

para a sua idade.

Os nomes dos AA. porlio, e

no Leal Conselheiro provo a sua

nos do

uma

ida dos livros de que se servio os nossos sbios nos

princpios do sculo xv.

A

erudio que o Senhor

Dom

Duarte tinha dos Livros Santos, e dos

PP. da Igreja era immensa, nos seus poucos annos, e na sua qualidadede Prncipe, pois cita a cada passo o antigo e novo Testamento (epredileco Salomo e S. Paulo (2))(1),

comJoo

S-

Gregrio

,

S.

Agostinho

,

S.

Veja-se o que dizemos

em,

a nota 2 e 83.

,

pag. 352.

(2) Veja-se a

nota da pag. 2

)

.

,.

XI

Cassiano, S. Bernardo, S.

Thomaz

d' Aquino, S.

Joo Climaco,

S. Isi-

doro de Sevilha, e outros.

A

leitura das obras

,

que damos ao publico

mostra que este Prncipe era igualmente instrudo na lio dos livros daantiguidade clssicae princpios,

e

que o seu

espirito estava,

recheado das mximas,

de Plato, e d'Aristoteles

de Ccero, de Sneca, e outros;

vendo-se todavia a grande predileco que tinha pelas obras do philosopho de Stagira.

No

era

menor

a lio que tinha dos,

AA.

estrangeiros que escrevero,

durante a Idade Media

e

que conhecia os mais notveis,

pois cita muitas

vezes as obras de Boecio (1)

de Fr. Gil de

Roma

,

o Livro da arvore das

Batalhas d Honorato Bonet,

Vicente de Beauvais

,

Hugo de S. Victor, o clebre encyclopedista Raimundo L"ullo, o Livro do Amante, Andr deJoodeLignano (2),eat das obraspelas traduces(3);

Pace, as de LudolfoCartuziano, asde

dos

AA. rabes

tinha

algum conhecimento

mostra-

se finalmente

que o Senhor

Dom

Duarte conhecia todas as obras dElRei(4),

Dom

Affonso o sbio de Castella:

pois

sem

as citar designadamente

,

diz todavia

e

aquel honrado

Rej

estrollogo quantas multides fez

de

leituras.

que acima mencionmos, indica-nos outros inteiramente desconhecidos dos bibliographos at mesmo do laborioso autor da Bibliotheca Luzitana, como so o,

Alm

dos

A A.

citados pelo

Senhor

Dom Duarte

Livro de

Dom Joio I

Martim Pires, o Tratado da Montaria composto por EIRei o de bem administrar as rendas do Estado, composto por um,

certo Bernardo,

um

Conselho escripto por Fr. Gil Lobo, seu confessor,(5;,

um

Tratado de Ideologia, e vrios outros

O

conceito

como

litterato

que EIReiparte,

Dom

Duarte merecia entre a sua famliaillustre

se manifesta

por outra

vendo-se que seu

irmo o Infante

Dom

Pedro lhe dedicara

(

1

Veja-se o que dizemos

em

a nota 2 a pag. 290.

(2) Veja-se a(3) (4)

nota de pag. 242, e 409.

Veja-se

que dizemos

em,

a notae nota

1

de pag. 344.1

Veja-se o texto a pag. 169

(5)

Veja-se a nota 2 da pag. 436.

; ,

as suas traduces de Cicero:

XII

,

De

ofliciis

e a

de Vcgecio

:

De Re

mili-

r (l).Eno era menor o que gozava entre LitleratoseTheologos, pois udslhe

submettio suas obras para as eorregir no que respeitava linguagem,

entrando neste numero o Doutor Diogo ATonso Mangancha, e a outros

dava thenias para sermes, comoCondestavel

foi

o das exquias dElRei seu pai, e do

Se a obra

Dom Nuno Alvares Pereira (2). dElRei Dom Duarte nos d uma

ida dos Livros principaes de

que

se serviao os nossos sbios antes

da chamada restaurao das Let-

lras(3), ellano nos offerecee usos dos

menor interesse noque respeita aos costumes,

Portuguezes nos princpios do sculo xv, maneira de viver

dos Prncipes portuguezes d'aquella poca, da sua educao litterariadas suas relaes

com

os

homens,

instrudos

,

por ultimo doutras particu,

laridades de grande

momento

e curiosidade

sobre as quaes

chammos

frequentes vezes a atteno do leitor

em

as notas.

Pelo que respeita lingua este o mais precioso thesouro que nosresta daquellaillustre

idade

;

pela multiplicidade de matrias que trata seu

Autor, e de que nao fallou

nenhum

outro escriptor; pela po-

lidez,

nobreza, decncia, gravidade de suas expresses e discursos,

em

que sobreexcede os escriptores do tempo dElRei,

Dom,

Manoellatina,signifi,

pelo conhecimento que tinhae d'outras

no

s

da lingua maternafixa

mas da

da Europa

;

pelo cuidado

com que;

muitas vezes as,

caes das palavras e sua

synonymia

pelo

est ylo fcil

cavalheiro

quasi

sempre didctico

e proverbial,

mas algumas,

vezes familiar e engraado, e

sempre acompanhado de clareza d'idasdeza dengenho, e

penetrao despirito,,

agu-

d'um cunho d'elevaao dalma

bondade de ndole, e

grandeza de corao, qualidades que difficilmente se encontraro reunidas

(1)

Veja-se Barboza, Biblioth. Luzit., artigo Infante

Dom

Pedro.

(2) Veja-se o texto a pag. 324, e 336, e Barboza

no Catalogo de suas obras.lista

(3)

Sobre este importante assumpto o

leitor

dever confrontar a

dos AA. que

acima citmos, e de que EIRei

Dom

Duarte se srvio,

com

os citados por Azurara

na

Chronica da Conquista de Guin, e que igualmente indicmos na Introduco quefizemos quelle livro, pag.ix e x.

XIII

em um mesmopara se estudar

escriptor,

(1). Finalmente o Leal Conselheiro um livro sem cujo conhecimento, nem a lingua nem os costumes,

daquella poca se podero justamente apreciar. Seria portanto empreza temerria e no menos diBcil, apontar ao leitor todos os passos impor,

tantes

que encerrajulgar

,

que s pela

leitura

,

e notas

que os acompanho

,

se

podem bem

(2).

O

cioso,

Livro da Ensjnanca de bem cavalgar toda sella tambm preporque ainda mais se devisa o illuslre mestre da arte nas regras que,

estabelece

e

na discusso delias transluz o philosopho, mostrando

se

na

ligao de todas o Escriptor hbil, elevando ElRei

sumpto

tal

at dignidade da

penna de

Dom Duarte um asum philosopho, recorrendo sem mais digno de

pre s causas moraes para explicar os efleitos pbysicos. Esta produeo

admirao, que a sua leitura nos mostra que ElRei desde a sua mocidade se guiava nas suas composies pelos princpios da alta philosophia. A pezar disto como,

no somente mui methodica

mas o que

o illustre Autor era dotado

duma

grande e exemplar modstia, no

levando

em

conta que a arte da equitao tinha sido

em

todos os tempos,

cultivada pelas personagens do nascimento mais illustre

e de

que os

Gregos tinho composto tratados sobrebre Aenophonte,

esta matria

,

e entre estes o cle-

temendo que o no arguissem de

ter

composto

uma

obra sobre este assumpto, justiQca-se nobremente, lembrando que Csartinha

como

elle,

nos momentos vagos, recorrido ao estudo, e composto

(1) Veja-se pag. 28, 56, 103, 150, 360,

sobre a lingua

;

10, 33, 67, 141,

sobre a po-

1G8, 169, sobre as lnguas que sabia; 78, 79, 115 at 130, 141, 245 a 248, sobre o estylo.lidez;

(2)

Os lugares que nos parecero mais notveis so os seguintes

:

O Prologo, oue 32; a

Dedicatria

Rainha, pag.

1

;

a descripo

que

faz dos estados, pag. 31;

recommendao sobre

a leitura dos bons livros, pag. 75,

qual era sua vida

em quanto

se preparava a expedio de Ceuta

pag.

1 1

6 a

1

19

;

o que diz a respeito das liberdades;

da Igreja, pag. 209

;

o capitulo da amizade, pag. 245 a 248;

tudo o que diz a respeitoPai,

da prudncia, pag. 290, e seguintese seguintes; a traduco

a prtica

que tinha com ElRei seu

pag. 438,

em

verso da Orao Justo Juiz, pag. 478; da guarda da

lealdade, na concluso, pag. 491.

,

XIV

ieitor curioso

Memorias. Resta-nos a

este respeitoillustre

reconimendar ao

que

compare

esta obra

do nosso

MoDarca,

,

no s com as do mesmo

gnero que nos restao da antiguidade

e da Idade

Media

,

mas lambema do

com

a

do Florentino Eiaschi, que escreveo no xvr sculo, com a mais,

moderna do Marquez de New-Castlerato de Santa Maria (1), parafoi

e finalmente

comse

P Honoe

melhor

a appreciar

segundo a poca

em

que

composta. Trataremos agora do Cdice

em

que

encontro as duas

obras, que hoje

vem

pela primeira vez a luz publica.

Eemas

o Cdice 7007

um

volume de

folio

magno,

,

escriplo

em ptimo,

per-

gaminho, e

em

gothico,

com 128

folhas

ou 255 paginas

e cada pagina

duas columnas. Acha-se encadernado,

armas de

em marroquim encarnado com Frana encadernao mandada fazer em tempos modernoseste,

que nos prova quescripto illustre

Cdice pertence ao fonas du Boi. Este manuo

uma

copia

mas em nosso entender a copia authenlica quetirar

Autor mandou

debaixo das suas vistas, e talvez a;

mesma

que dedicou Rainha Dona Leonor sua esposa

tanto mais que feita

com

a maior perfeio e luxo, vendo-se que fora conferida

com

o maior

escrpulo,

como

se

mostra d'algumas palavras essenciaes ao sentido, e

at leltras, que o copista por

engano varias vezes tinha omittido,

as

quaes se vem escriptasentre as linhas do texto.

comNo

ase

mesma

linta

,

e

com

o

mesmo

caracter

encontro

nem

raspadellaslettras

nem emencapites, ou,

das^iniciaes

nao serem as que acabamos de notar. As

em

principio de cada capitulo, sio admiravelmente desenhadas

e illuminadas

com primorosas

cores, muitas vezes recamadas

d'ouro, e

cujos accessorios occupo pela maior parte toda a extenlo da

columnapri-

em quepoiso

o capitulo principia (2),

como o

leitor ver

no fac smile da

meira que o benemrito editor

fez gravar,

fazendo nisto mais

um

servio,

mesmo fac

smile nos mostra quanto entre ns a calligraphia, e

(1) Dissertazioni istoriche e criliche

sopra

la cavalleria antica e

moderna.

Brescia, 1761.(?)

A execuo

calligraphica d'este Cdice

mui superior

do Cdice que encerra

a Clironicn da Conquista de

Guin por Azurara.

XVarte da illuminao dos

pergaminhos estava levada a grande perfeio

em

Portugal muitos tempos antes que EIReie

Dom

Manoel

subisse ao trono,

que por sua ordemse

se

executassem os admirveis Cdices dos Brazes

que

conservo no Real Archivo da Torre do

Tombo,

e

em

poder do

ArmeiroMr, bem como os sumptuosos Livros chamados de leitui a nova;mostra finalmente quanto esta arte se achava entre ns aperfeioadaantes do nascimento do clebre Perugino, mestre de Raphael,

e

do nosso

Gram Vascode 1428isto,

(1)

;

pois a nosso vr este Cdice foi escripto entre os annosvisto

e 1437,

que tendo sido trasladado a rogos da Rainha,

,

s

poderia ter logar depois do primeiro annofoi

que

foi

o do seu casa-

mento, e o de 38 que

o da prematura morte dElRei.,

No

foi

o Leal

Conselheiro composto antes de 1422Rei Henrique

pois

que o A. trata da morte d'EI-

V d'Iogla(erra.e

Ignoramos inteiramente quando,portuguez veio parar a Franca.scriptos

por que modo, este precioso Mss.

A

historia

da peregrinao dos manudifficil

muito curiosa, mas tambm muirespeito

de fazer. Seja- nos

porm permittido aventurar a este

uma

simples conjectura, a qual

poder talvez abrir caminho a outros investigadores, que lenho mais meios do que ns para resolverem este problema.

Convencidos como estamos de que o Cdice, de que

se

trata, o

mesmo exemplar queque posto no

EIRei

Dom

Duarte dera Rainha Dona Leonor suase l:

mulher, pois at no flm do Leal Conselheiro,seja a assignatura

D.

EDUARDUS,em capitesque

aulographa

,

por ser escripto

gothicas e illuminadas,

com tudo pordebaixo daspois

esta circumstancia, junta s

acima referimos, nos parece no poder duvidar-se de que fora mui provavelmente esta copiafeita

vistas

do seu grande autor, e collacio-

nada com o

original.

Pensamos

que no havia cousa mais natural do

que estaPrinceza

tl-o

sempre conservado em seu poder, levando-o assim

(1)

Perugino nasceo

em

1446. Vja-se a nossa obra intituladaleurs caracteres et par les

:

Notice sur quelques,

manusents remarquables par

ornements donl ih sont embellisvol. Xll das

qm

se trouvent

en Portugal,

noticia

que publicmos no

Memorias da

Sociedade Real dos Antiqurios de Frana.

3

XVIpara Caslella quando se retirou para aquelle reino,

em

razo dos acon-

tecimentos que sobreviero depois da morte dElRei seu marido-, e quedepois da morte desta Princeza,

occorrida

em Toledo

a 19 de Fevereiro

de lii5, o nosso Cdice passasse para outras mos, e de BibliothecaBibliolheca viera parar de Pariz:

emdos

na qual

,

pela liberalidade inimitvel

com

que os (besouros que possue sao

como o patrimnio commumfoi

sbios e dos estudiosos que delles se desejo aproveitar, nosnfio s consultl-o,

permillido

mas

tl-o

cm

nosso poder, e confll-o ao zeloso Editor

debaixo de nossa responsabilidade, concorrendo por lodos os modos possveis

para que a Nao recobrasse impresso

,

e accessivel a toda a gente

este precioso

monumento da

sua litteratura

,

que ao mesmo tempo o

nico tratado de philosophia moral que possumos do sculo xv, final-

mente uma obra

escripta

,

e

composta por

um

dos seus mais illustres

Monarcas, e que fora

um

dos mais eminentes e sbios do seu tempo.

V. DE

S.

Pariz, 28 de Maro de

184

,

XVII

CATALOGO DAS OBRAS

Impressas.

I

o

Papel que escreveoem-i.

,

quando seus irmos foro

a

Tangere

7 paginasfoi

2

o

Conselho que deo ao Infante

Dom

Henrique, quando

com uma

armada sobre Tangere3o

1 7

paginas.

Motivos que teve para fazer a guerra

2 paginas.seus filhos

k

Lembrana que escreveo do nascimento detodos

8 artigosem San-

em

17 linhas.

5

Observao da Lua Cousas de quetarmfoi

5

linhas.

6

o

requerido nas primeiras Cortes que fez

1

pagina.

T8

Cousas que pertencem aolatim.

bom

Capito

2

linhas escriptas

em

Observao sobre as cores de pedras de mina de metal

27 linhas.,

9

o

Lembrana acerca dos prmios devidos

a certas classes de creados

etc

13Todos

linhas.

estes

pequenos escriptos

se

achavo no Livro que

se

conservava,

na Cartuxa dEvora donde

os fez copiar o

Conde da

Ericeira

e se

acho hoje impressos por Souza no

Tomo

I

o

das Provas

da Historia

Genealgica da Casa Real. pag. 529 e seguintes.

.

,

XVIII

OBRAS MIUS*s5e-

XXIII

PROLOGO DO EDITOR.As antiguidades (d'um PovoJ no podem ser cabalmente investigadas sem

um

perfeito

conhecimento da sua linguagem, nas varias pocas de sua existncia.

M"

DE IiITTER. PORTCG.

TomO

1

DO Prologo

Possudos desta importante verdade, que a Academia Real das Sciencias

de Lisboa estampou no Prologo do primeiro tomo das Memorias,

de Lilteratura Portuguezad

por

ella

publicadas

,

desejosos de tirar do p,

uma

livraria estranha

um

livro

composto pelo eloquente Rei

que ou-

trora illustrra Portugal

com

suas leltras e relevantes virtudes: e con-

vencidos que

nenhum outro daquella

idade oiferece to vasto,

campo

s

investigaes philologicas de nossa lingua

e

ao estudo de nossos antigostraslado,e logo a

usos e costumes,

emprehendemos primeiramente o

publicao do leal conselheiro e do livro da ensinana de bem cavalgar

toda sella, tratados compostos por EIReis

Dom

Duarte

,

e juntosleitores.

em ume o que

Cdice

,

que ora temos a fortuna de offerecer a nossos

Quemseja

fosse EIRei

Dom,

Duarte, considerado

como

litterato,

sbia e eruditamente o mostrou o III 1110 e mo Senhor Ex Visconde de Santarm na Introduco que precede; no pois deste

o Leal Conselheiro

assumpto que nos cumpre

fallar,

mas somente dar conta,

a

nossos leitores do

modo como

nos houvemos no traslado

e

do fim que

tivemos nas notas que lhe juntmos.

Seguindo o systema

,

que o douto Abbade Corra adoptara na pu-

blicao dos Inditos, que o do Archivo real da Torre do

Tombo, po-

semos por extenso todos os breves do Cdice

;

separmos as palavras dos

;

XXIVartigos e das preposies, e assim

mesmo doutras

palavras, a que muitas

vezes estavo juntas

;

supprimimos as consoantes dobradas no comeoj

das dices, ou depois d'outra consoante

conservmos porm as vogaesfalta d'ac-

dobradas por serem signal de pronuncia longa ou grave, na

centos vogaes ou prosodicos, de que os nossos antigos carecio; substi-

tumos os vv aos uuexigia;

,

e os jj aos i, e vice versa,

,

sempre que o caso

o

conservmos todas as desinncias

que representavao algum

soido ou pronuncia d'aquelle tempo, ou que ero inflexes verbaes da antiga linguagem; e finalmente,,

dmos,

pontuao aquella regulari-

dade que o estylo do autor comportavaas regras da

e

que era mais conforme com,

grammatica geral

,

desprezando a do Cdice

que sobre

irregular por vezes errnea,

como vimos

pela confrontao de vrios

Captulos

com

o texto latino

,

de que ero traduces.

Em

tudo busc-

mos tornar o maisRei eloquente, sem

fcil possvel

a leitura e intelligencia dos escriptos do

com tudo

os desfigurar, antes conservando

no tran-

sumplo todas

as feies de sua

linguagem e locuo

(1).

Anotar cabalmente as obras d EIReisuperior nossa capacidade,

Dom

Duarte

seria

empresa mui

e por ventura para mais,

d'uma hbil,

penna.rio,

O

theologo,

,

o philosopho, o moralista

o historiador

o antiqu-

o philologo;

ahi achario

abundante matria para suas investiga,

es

no

se

nos attribua pois esta preteno,

que por certo no

tive-

mos

;

fizemos sim algumas notas

que

Ex m0 Senhor Visconde

permittio

que misturssemos com as suas, as quaes posto que numerosas, poispasso de 460, no tivero outro fim seno,

em

primeiro lugar aclarar a

mente do sbioe

Rei, e facilitar a intelligencia de seus ditos e linguagem,

em segundo,

lugar

mostrar que os archaismos

,

que

em

suas obras se

lem

ero pela maior parte

ainda usados no

tempo d'EIRei

Dom

Manoel.Para conseguir este duplicado fim,

fizemos diligencia por explicar al,

gumas palavras

e phrases

,

hoje totalmente esquecidas

fixando a signi-

(I)

Veja-se ofac smile no comeo da Obra, e compare-se

com

o impresso.

XXVficao d outra*,

de que os nossos diccionarios so escassosa

,

ou de lodo

fallecem

;

comparmos muitas vezesmais notveis escriptores,

linguagem do Prncipe philologoe seguiro, efieis

com

a dos

que o precedero,

com

vriostrios

documentos importantes d'aquella pocada lngua materna(t),,

que so os

deposi-

comeando pelo Cancioneiro do Collegio dos

Nobres

que

se cr

composto

em tempo dEIRei Dom

Deniz

,

ou

tal-

vez antes, seguindo pelos Captulos das antigas Cortes, os Documentos

appensos s Memorias da Academiainsistindo especialmente

,

Ferno Lopes, Azurara, etc, ele,,

no Cancioneiro de Resende

e obras

de Gil

Vicente, por serem riqussimo lhesouro da linguagem e costumesquella idadelelligencia;

da -

e desta

comparao resultou no,

s utilidade para a in-

do Leal Conselheiro,

mas

certa noticia comparativaeste

de

lin-

guagem

antiga

que no desagradar aos que amo

gnero de

litleratura (2).

Como no

Leal Conselheiro se achassem muitos Captulos que ero,

traduzidos dobras latinas

recorremos sempre aos originaes para os,

confrontarmos com as traducese o

transcrevendo muitas vezes o texto,

mesmo

fizemos

com

as passagens da

Sagrada Escritura

,

no tanto

pela curiosidade de ver

como

nossos antigos entendio e traduzio o

latim

,

seno para fixar a significao de muitos vocbulos obsoletos, pela

confrontao das dices latinas a que ento correspondio. Este trabalho nofoi

sem

frueto,,

como se pde

ver dos Captulos

RVII,LXXX\I,

LXXXVIII,rigir

e

LXXXIX

acerescendo de mais a mais a vantagem de cor-

muitos descuidos e erros do amanuense, e at restabelecer o texto

por vezes alterado, ou pelo menos signalar algumas omisses e inexactides, que s por este meio se poderio descobrir e remediar.

(1) Este

Cancioneiro

foi

impresso por Lord Stuart1

em

1823

em

Pariz, e

como

tal

o

citmos sempre. Vej. a nota(2)

da pag. 35.transcrevemos conservmos fielmente a orthographia

Em todas as passagens quedo texto;

e pontuao

assim que , no se admirem os leitores de ver no Cancioneiro

de Lord Stuart pontos

em

lugar de virgulas, eescritos.

nenhuma

virgula no Cancioneiro de

Resende, porque assim so

Posemos somente versaes onde cumpria.

)

XXVI

Finalmente, para completar esta pequena tentativa acerca dos archasmos de nossa lingua,

ajuntmos no fim,

um

Glossrio das palavrasse

e phrases antiquadas e obsoletas

que nos dous tratados

encontro

,

com mandas, ou citaes remissivas ao corpo da obra(l), no s paracommodidade dovirleilor,

mas (se a

tanto nos permiltido aspirar) para ser-

como de

clave

linguagem d'aquella idade para sempre digna de!

nossa admirao e de nosso estudoteros,

Idade vigorosa

,

de costumes aus,

em quemesmos

os Portuguezes,

,

mais briosos que facundos

concentrados

em

si

formaro aquella admirvel escola, donde sairo os Ba-

res assignalados,

que assombraro o mundo com seus

feitos

,

arvorandoat ao

triumphantes as quinas lusitanas,

em mar

terra,

desdo Tejo

Ganges

!

!

Declarmos no

ter tido

inteno de defender, e menos de combater

nenhum systema ou

opinio acerca da origem e filiao de nossa lingua.

Se alguma vez recorremos aos Diccionarios ou Vocabulrios dos differentesidiomas da Europa latina, noefoi

porque supponhamos o nosso secundrio,seno porque, sendo to parecidas suas

menos bem dotado do que,

elles,

feies

to similhante seu gnio, e to,

communs

entre

si

muitos voc-

bulos e locues

desejmos signalar estes factos para maior extenso de,

nossas investigaesdiarias

aproveitando ao

mesmo tempo

estas provas subsi-

onde faltavo

as positivas tiradas de nossos escriplores.

Avvel

todas as difficuldades philologicas do Leal Conselheiro

dmos

solu-

o, seno;

dum modosella, ,

terminante e positivo, ao

menos

plausvel e pro-

j

no assim pelo que pertence ao Livro da ensinana de bemo qual por conter preceitos e regras dartes total-

cavalgar toda

mente esquecidasluta,

e de

que nossos escriplores no fallro(2), e

,

como

so a

ajusta

,

o torneio

serem alm disso matrias para ns es-

( 1

Advertimos que no Glossrio se encontro duas sortes de citaes,

;

n'umas indicadizer

se

simplesmente a pagina,

e n'outras diz-seler

:

Vej. pag.

;

estas

querem

que

no texto ha uma notalocuo(2);

que necessrio

para cabal intelligencia da palavra ouse acha a

naquellas aponta-se o lugar

em que

passagem citada.foi

Se alguns de nossos antigos escriptores fallro de torneios, justas, e luta,a descripo d'estes jogos,

simplesmente fazendo

com pouca miudeza

,

e

nunca

tra-

XXVII

no podemos descobrir a significao dalgumas palavras, posto que no muilas; isto no obstante sempre as posemos no Glossrio,iranhas,

para que mais babeis esquadrinhadores posso algum dia descobrir-lhes

o sentido

,

e fixar a sua significao.

No nos

lisonjemos de ter semprese,

acertado, antes muitas vezes ficmos

em

duvida, o que facilmente,

conhecer pela maneira

com que nos exprimimosdalgumasuspeitos.

dizendo, parece-nos

em

nosso entender

;

espermos pois que os

Iitteratos,

que lerem

estas

notas, no nos criminaro

interpretao inexacta,

quando ns

mesmos nos damos porquanto havemos escritoter feito,

Ao

seu

juizo submettemos tudo

reservando somente para ns a convico de

quanto

em

ns era para acertar.

Se da publicao do Leal Conselheiro alguma gloria pde resultar,reverta toda

em honra doquese

sbio

,

virtuoso

,

e eloquente Prncipe que oillustres e respei-

compoz, da Nao que teve a fortuna de o possuir, e dastveis pessoas

dignro tomar parte nella por meio de suas subs-

cripes,

aqum

por este

modo testemunhmos

nosso sincero reconhe-

cimento.

tando-os

como

artes,

nem

nos transmittindo seus preceitos e technologia; a qual,ficaria

sem a publicao do Livro da Ensinana de bem cavalgar,esquecida ,Vegecio.

para sempre

como o

teria sido a

da arte militar dos Romanos sem a publicao de

Hariz, 29 de Marco de 1843.

Jos Ignacio

ROQUETE.

-

r

r-

>

;;

S I

'

i

gI

lwh Sisal

Pigliare

,

lo stesso

che prendere ,

usandosi tuttaddue questi verbi negli stcssi sensi;

e nelle stesse

maniere; ridurre in sua podest, o con violenza, o senzasi

la variet,

di quegli significati

distingue delle parole che gli accompagnano. Prendre

saisir.

Pigliare, per accettare, ricevere; ed in questo significato dicesi anche pigliare

in

buona ed

in

mala

parte. Prendre, recevoir, accepter.Illustre Autor. Este,

justamente

nesta accepo

que aqui o emprega oclssica

verbo comeou a cair

em

desuso na pocha

da

nossa litteraturaler,

e foi substitudo pelo

seu synonimo tomar.;

Em Gil Vicente

no nos lembra de o comprovo:

mas sim tomar em seu lugarPorque nose

eis

aqui duas passagens que o

tomo

trutas

Assi a bragas enxutas.

Tomo

a orelha

achey eseama

Donde vem vossa prumagem."Canc. Ger.,tol. 32. (R.)

(2)

Este verbo, que ElRei

Dom

Duarte, e Azurara emprego constantemente

como

reciproco,

sempre usado como neutro

em

Barros

:

trabalhar por,

em

vez de traba-

Ihar-se por. (R.)

.

20

CAPITOLLODo entendere

II.

memoria.

{j0J^-^f u

fao deferena

do entendimento, segundo nossoo entenderscilieet

NRSiT^ custume de fallar, ao entender, porque 3v partem os leterados em quatro ramos,i^Jjy tender agente, possivel, speculativo, e desto vy huu trautado que largamente

en-

pratico; efallava(1),

mas por me parecer que nora muyto perteece a meu propsito leixo de fazer sobrello mayor declaraom. Mas quanto ao booentendimento,

segundo nosso custume de

fallar,

se

requere

mais grande memoria e boa votade.

Na memoriariencia

fao duas deferenas,

hua que perteece aa alma

racional, e outra aa sensualidade (2). Esto filho

pro que

a espe-

me demostra, que dalgumas

cousas tristes averaos lem-

bramento, que nora recebemos alguu sentido, a qual lembrana

me

parece principalmente aa cabea perteecer; e aquello

me-

(

1

)

Vejo-se as notas das pag. 9 e

1 1

(2) Esta

palavra tomada quasi sempre n'uma accepeo desusada, significando osgeral

sentidos

em

ou

a faculdade sensitiva,

por opposio a racionalidade.

A origem,

d'esta accepo

deve buscar-se na palavra italiana sensuah ou sensuahtade

que

significa sentido absolutamente. Alberti d o seguinte

exemplo

:

Ponghiamo che Vuomo

ridoglia secondo

la sensualit.

Tambm

commum

lngua antiga franceza.,

Yeja-se o Complemento

do Diccionario da Academia Franceza. Paris

1842. (R.)

,

,

coraom comosentia.

21

quandoel

des (1) per vista de pessoas, ouvir de palavras, trespassa ose o feito presente fossese

nembra

e

o

Nodelias

filhar

dalgumas mezinhas que o corpo ja torvaromfaz fora,

,

se

avemos hua simprez lembrana nomtal vista,

e se as

veemos, porquenifestates

representa o queja sentimos, faz maestas,

mudana por trepassareme

lembranas e semelhane tornar a sentir o

em bem

nocontrairo ao coraom

que

ja sentimos;

mas no quefazer conta,

perteece ao intendimento da gerala qual se departe

memoria he de

em muvtas

defe-

renas (2), ca huus filham logo qualquer cousa que

ouvem em

(1)

Esta palavra muito antiga na lingua portugueza

;

e se

dermos credito ao que

diz Faria e

Souza, j era usada sculos antes do estabelecimento da Monarchia, pois

se encontra,,

com

a significao de

mesmo, mesma, como aqui a emprega EIRei

Dom Duarte no fragmento d'um poema sobre a occupao d'Hespanha pelos Mouros em 714, que se achou no castello da Louz quando foi tomado por EIRei Dom Sancho I pelos annos de 187, e que se attribue a Dom Rodrigo, ultimo Rei Godo. Raynouard1

sustentaa

com

boas razes que este

monumento daCramm.;

litteratura portugueza

no remonta

uma

to alta antiguidade (vide

rom., Disc. prl., pag. 40), e ns subscreisso

vemos de bom grado

sua opinio

mas

no obstante temos que

este

um

dos

monumentos maisrimos:

antigos de nossa Litteratura. Eis aqui a passagem a que nos refe-

Et tendo atimada a

tal

crueldade

O temploVoltando

e

orada de Deos protanarom

em

mesquita nu logo adorarora

Sa besta Mafoma a medes maldade.

Veja-se Faria e Souza,

Europa Portugueza,

;

e Ralbi, Essui statislique

,

tome II, Appenduc

la Gographie Lttraire

pageij.

Esta expresso s se encontra nas obras d'ElRei

Dom

Duarte

,

nas ordenaes do

Reino, e

em

alguns documentos do sculo xiv, citados por Fr. Joaquim de Santa Rosa;

de Viterbo no Elucidrio

Azurara j

d'ella se

no srvio, e diz sempre

esso

mesmo

em

lugar tfesso medes,

como

d'antes se dizia. Veja-se o nosso Glossrio appenso Chro-

nica da Conquista de Guin. (R.)(2)

Esta palavra tomada

n'uma accepo hoje desusada

,

mas que ainda

se usa,

na

lingua castelhana a que

coinmum. O Diccionario da Academia Hespanhola depois

;

alguus

22

sentena e nora de todo a letera, e outros per o contrairo;

lembram das estorias e feitos que se passam, e dos nomes prprios nom podem ser lembrados poucos acharom em todo perfeitos, mas abasta que o sejam em razoada maneira

bem

se

;

;

e

quanto mais for para o entendimento dar grande avantagem. Dou porem conselho que por grande que algum asynta, que

nunca em

ella

muyto

se fy,

porque

fallece ligeiramente

onde

compre per muytas guisas; e porem sempre se proveja em toda cousa, que bem poder, depoer(1) as cousas em scripto (2),ou mandar que o lembrem comoca,se pensasse

que a fraca

tivesse

hea mais certa maneira da arte memorativa ainda que bem sey como a outra muytas vezes presta em tempo de necessidade aos que a bem sabem se teemsegundo tenho praticado,,

esta

,

razoadamente a natural.

da primeira accepo geralcosas de(1)

,

d-Ihe a

em

que

ella aqui

empregada, variedade entre

uma

misma espcie. Veja-se o dito Diccionario, art. Diferencia. (R.)ainda usa do verbo poer, que

BARROSrazo caio

uma

contraco do castelhano poner ,(R.)

com

em

desuso sendo substituido porpr, do italiano porre.esta particularidade

(2)

Comparando

que o autor nos

revela,

com

o que dissemoselle

em

a nota 2 a

da pagina 3, se v quanto este Prncipe era laborioso, quanto

estudava

as suas prprias faculdades, v-se

em

fim

como

elle se

entregava ao estudo, e medi-

tao. (S.)

w

.,

23

CAPITOLLO

III.

Da declaracom das vontades.

ossas votandes se departem de

muvtas maneiras

segundo sentimos delias desvairados desejos, mas

noque

livro das Collaoes dos Santos Padres (1) se

'demostra que geeralmente som quatro. Primeirase

chama

carnal; segunda spiritual

;

terceira

tiba prazenteira; quarta perfeita e virtuosa.

E

filhando grande

parte do dito livroseguinte.

,

com algus adimentos

as declaro na

maneira

A

votade carnal deseja vio, folgana do corpo

,

e

cuidado,espiritual

arredandosse de todo perigo, despeza e trabalho.

A

quer seguir aquellas partese faz aos

em que

se

mais inclinom as virtudes,

que se despoem aa vida de religiom requerer que

(1)0

livro das Collaes dos Santos Padres ;

um

livro asctico,

composto porser

S. Joo

Cassiano

livro

mui

lido e citado

em

toda a idade media

e

que parece

um

dos

mais estimados d'ElRei

Dom

Duarte. Collao significa conferencia ou conversao que;

tinbo os antigos Monges sobre cousas espirituaesestas conferencias se

a leitura

do

livro

que continha

chamou tambma

Collao ; e, porque esta leitura se fazia

quando

os

Monges comearo

tomar

uma

refeio noite nos dias derefeio. S.

jejum

,

do

se iguala

mente o nome de Collao quella

Bento recommenda na sua regra

leitura das Collaes dor Santos Padres. Legai unus Collationes, vel vilas Palrum. Veja-se

Richard , Dictionnaire des Sciences Ecclsiastiques,

art. Collaiion.

Ao diante haver

occasio de fallar mais largamente d^ste livro e de seu autor. (R.)

jejuem,

24

vigiem

,

leam

,

e

rezem quanto mais poderem semfeitos

nehua desclicom; aos que andam emse

de cavallaria que,

ponham

a todos perigos e trabalhos

que

se lhes oferecerem

nom avendolhe

reguardo aos que segundo seu estado e poder lheesto

som razoados. E

medes

faz

nos cuidados dalguas obras que

parecerem boas

e virtuosas,

que

se

despoem a

ellas

assy

destemperadamente quenomteem cuydado de comer, dormir,

neme as

da folgana ordenada que o corpo naturalmente requeredespezas,

;

onde lhe parece que he bem

,

conselha que se

faom logo sem nenhuu resguardo do que sua fazenda podeabranger e governar. E aquestas duas votades continuadamentese

contrariom dentro

em

nos, segundo cadahuu per sy acharafazer alguas cousas e,

speriencia de

hua votade que o conselhapor querer ambas

outras

em

coinxairo. Dantre estas duas nace a terceirasatisfazer,

prazen-

teira e tiba, a qual

sem nenhuu

agravamento, poe o que a segue emviver

tal

stado que nunca o leixa

bem nem virtuosamente, porque ella assy conselha jejuar que nom senta nenha fame (1) nem sede, e assy vigiar que nom haja pena em sofrer o sono, e queria percalar honra de cavallaria nom se despoendo a perigos nem a trabalhos, a acabar pesados feitos sem filhar grande cuidado, e aver nome de graadosemfazertal

despeza que lhe algua mingua ou empacho fezesse,

(1)

Hoje dizemos fome

em

lugar de

fame ,

talvez

com pouca

razo, porque na pa,

lavra antiga havia mais conformidade

comdiz

a etimologia latina,

e d'ella usarofez

bons

autores

,

dos quaes s citaremos Luiz Henriques,:

que nas Trovas que

em

louvor de

Nossa Senhora sobre a Ave Maris Stella>

Por tua grande cremencea raynha angelycal

Pyd ao rey

celestryal

Calevante a pestelencea

E (ames de Portugal.

foi.

Canc. Ger.,

101. (R.)

e

25

fynalmente assy queria seguir o que hua volade requere que;

aa outra nora contrariasse

e

naquesta se afirma que ha muyto

em que muytos fallccem. A quarta votade muyto perfeita e virtuosa nom segue sempre o que estas requerem e segue muytas vezes o que nom lhe praz, todo por determinaom emal,

,

mandado da razom e do entender; e daquy se diz, seguimento de votade comprimento de maldade (1), eo quehrantamentodelia seerse

muyto grande

virtude, e aquesto se faz por esta guisa

:

ras,

homem (2) vive segundo cada hua das trs votades primeinom se governando nem regendo por razom ou entenderellas

senom sollamente per o quemente quese perca

desejom, convm necessaria-

da alma ou do corpo, porque hua demanda

cousas tam viis e tam baixas que logo manifestamente se de-

mostram derribarem homemque lhe convmviir a

a todo

mal,

e

outra tam altas per

morte, sandice ou enfermidade, perdidesci icom

mento de toda sua fazenda, pois nom guardaha defazer.

no quee

E

a terceira

,

por querer complazera estas ambas

as de todo concordar, o

que fazer nom pode por seer batalha quefaz seguir(3)

Nosso Senhor Deos nos ordenou por nosso provecto,as virtudes

tam friamente que jamais nunca trazeravotade se governar a

aquel

que per(1) Eis

tal

nem huu boom

(4) estado,

aqui

tempo d'ElRei

um provrbio, fundado na razo e na experincia, que era usual no Dom Duarte, de que os nossos Diccionarios no fazem meno, e queDomDuartea

sem

a

publicao do Leal Conselheiro ficaria ignorado. (R.)

(2)

frequente em EIRei

omisso dos artigos indefinitos; devei

ia

ler-se o(3)

homem.

(R.)

Trar. No nos devemos admirar que no

tempo d'ElRei

Dom

Duarte ainda osGil.

tempos do verbo trazer no estivessem regularizados, quando no tempo de

VICENTEpugeste,

se dizia trager

(tomo

III, pag.

269), assim como se dizia fager, faga,III,

em

vez de Jazer, Jaca , poseste (tomo

pag. 268 e 269). Os rsticos dos

subrbios de Lisboa ainda hoje dizem trazer. (R.)(4)

esta a primeira vez

que

se encontraa

no Leal Conselheiro4a

escrita a palavra

bom

d'este

modo. Veja-se o que dissemos em

nota

da pagina 3 (R.)

;

e assi

26

em,

o comprimento destas

trs faz seguir e cair

grandes

erros e maldades.todal las cousastrs as oferece

Ese

a

quarta todo per o contrayro

porque

que

apresentam ao coraom de cada hua destas;

ao entender que julgue se som defazer ou leixar

segundo

elle

determina, muvtas vezes

nom

segue o

que

ellas

demandam, e faz o que nom querem, e as quebra de todo. E assy como os ourivezes (1) querendo conhecer alguu ouro se he dereceber ou dengeitar o

metem no cimento

(2), e a

prata na cen-

rada; e segundo seus ysames a engeitam ou recebem, assy esta

quarta votade todallas cousas faz ou leixa de fazer per exsame

do entender

e

razom. Quando a votade carnal

se

quer deitar a

aquellas cousas ja dietas, e esta

nom

lho consente mais faz-lhe

sofrer fame, sede, sono, edespoerse a grandes perigos e tra-

balhos

,

despezas e cuidados

,

quando o entender

e

razom deter-

(I

Ourwezes no plural era usado antigamente, de que se encontro vrios exemplos na;

ordenao do Keino'?)

mas ha muito que

caio

em desusoque

;

Vieira dizia

sempre ourives.

(R.)

Os ourives tem

uma

espcie de cimento dea

se

servem para purificar o ouro,art.

conhecer o seu quilate. Segundode cimentopanhola:

grande Encyclopedia,

Ciment , ha duas espcies

o ordinrio e o real. Fallando d'este diz o Diccionario da Academia Hes-

Composicion que, unida con;

el

oro, y puesta

ai

fuego, sirve para dulcili

cario y purificai-lo

e fallando d'ambos diz a Encyclopedia

Ces sortes de cimenls

sont

faits,

de seis et autres ingrdients, qui par leur acrimonie rongent et sparentle

l'argent

cuivre

ou

les

autres matires d'avec Por.

Por esta passagem d'ElRei

Dom Duartee

se v

que no seu tempo nod'este processo

s era conhecido o

pelo cimento,

mas queque

chimicose formara

um

smile de

se fazia uso;

na linguagem ordinria.

modo de purificar o ouro uma locuo mui expressiva, Cimento em italiano significafoi

prova, ensaio, experincia

e nesta aecepo

que aquella palavradiz o Licenciado:

usada por GIL

VICENTE. Na fara do AUTO DA LUSITNIA" >

E para

claro cimento.

Ea

obra no ser escura

Direi

cma

prosa o argumento

>

Porque

cousa que he segura

i

Procede do fundamento.

Tomo

111. pag. i28. (R.)

minora que he bem detual

27

medesfaz a

se fazer; e esso

outra spirie

que lhe nom da lugar

a

mais seguir seus altos

grandesa

desejos do

que o entender,

e a

razom mandam, consiirando

desposiom de sua pessoavaira esta quarta votade

estado, fazenda.

E

naqtiesto se des-

muyto da

terceira,

porque aquella

nomalgui

consente

em

tal

guisa contradizer as duas primeiras que,

agravamento sentam

e aquestae

de todo lho contradiz

quando determina o entendimentofazer assy.

razom que he bem de o

Ocontrariamento daquel las duas votadesguisa

faz

muyto ao enten-

der julgar dereitamente o que he melhor que se faa, per esta:

quando

a votade spiritual requere

que jejuem, ou por

cousa que meritria

parea obrem destemperadamente, e a

carnal desejando vio e proveito do corpo relembra o trabalhoe

perigoo que dello se lhe pode seguir, fazem antressi hia con-

tenda, per que se retm cada bua de comprir o que deseja, e

dam

lugar aa quarta votade que haja tempo de representar esto,

ante o juizo da razom e do entender

e

segundo sua determinafaria se tal contrarie-

om assydade

se faz executar; o

que

se

nom

nom ouvessem, nemtodallas cousas

se faz naquelles

que assy bestialmentea

vivem queseu poder,e se

que o desejo carnal requere seguem

lhe

nem esso medes nos que vivem presuntuosamente, gloriam em esta votade carnal nom nos contrariar, nem nembrar algua cousa do que desejam mas querendo sem,

descliom comprir quanto esta votade spiritual

demanda caa-

em

grandes queedas, das quaaes

hi

ha muytos exemplos.

E

per

aquesto que screvy alguus que tanto

nom sabem

poderoni co-

nhecer como destas votades continuadamente somos tentados e requeridos; e como as primeiras trs nom devemos seguir, mastodos nossos feitos e cuidados governar per a quarta,

fazene

doos, consentindo

em

elles

por determinaom da rezom

do

entender,e

28

feitos

norn do nosso sollamente, mas naqnelles

que

o requerem de que

nom avemos grande certa,

speriencia per boo

saber avendo conselho pcra alma, corpo, staclo, e fazenda daspessoas que razoado for

nom

nos tendo perfiosamente na

teencom que requerem nossas votades, obedeamos a seus boosconselhos.

E

aqueste he o caminho da discliom, quesiso,

em

nossa

linguagem chamamos verdadeiro

que per os sabedores he

muvto louvada por trazer os que se per ella regem com a graa de Dcos a todo bem e arredar de grandes malles. E sobresta,

quarta votade

faz

fundamento,

a real prudncia,

porque scolhe-

mos o bem do mal

dos beens o(1).

mayor

,

e

do mal o menos em

todos nossos prprios feitos

(1)

Quanto

interessante a concluso d'este capitulo, assim!

na parte philologica,

como na moral

sbio Rei nos mostra

que

elle sabia

bem

a sua lingua;

fixando a

significaro e aceepo das palavras, e estabelecendo a sua

synonymia

e

no menos

nos manifesta quaes ero as bases de sua Real prudncia, que promettia a Portugal

um

venturoso Reinado, se

uma prematura morte

lh'o

no roubara.

(R.)

29

CAPITOLLOComo muytos

IV.

errara na maneira de seu viver per aquella tiba voontade

suso scripta.

or tentaom desta terceira tiba voontade vejoJtos errar

muy:

em

sua maneira de viver

,

per esta guisa

'os estados geeralmente

som cinquo. Primeiro, dosclrigos, frades

^oradores (1),

em que se entendem

dee

'todas ordeens, e os ermitaes,

porque seu prprio

principal oficio destes he per suas oraoes rogar Nosso Senhor

(1 ) Orador, na accepo de pessoa que ora pede , faz oraSes ou preces , vocbulo da lingua romana como se pde ver no Lexique de Raj-nouard o qual cita a seguinte , passagem da traduco de Beda Dieus regarda le cor dei Orador, .

plus

que;

las

pa-

raulas

;

hoje desusado

,

posto que tenha boa analogia na lingua

mas GIL

VICENTE,

um

sculo depois, ainda o:

empregou na sobredita accepo. No Dialogo da

Resurreio diz Christo Cananai

Porque tens muito soflndo

Como

constante oradoralogo nessora

"

Mando que

Se cumpra o que tens pedido.

TomoF.

I, pag. 37G.

na Tragicomedia intitulada

CORTES DE JPITER

diz a Providencia, fatiando

dos qui

pedem

e oro a >

Deos

:

Sobre o qual lodos pastoresLeixo sem pasto as manadas,

E

se fazem oradores,oflerta

Em

dando

flores

E suas pobres soldadas.

Tomo

11,

pag. 397. iR.)

por todos outros stados,

30

e

e

per seus ofcios louvalo,

honrar per

suas boas vidas e devotas eirimonias

e aos outros

ensynar

per palavra

e

boo exemplo

,

e

ministrar

os sacramentos.

Segundo, dos defensores, os quaes sempre devem ser prestespara defender a terra de todos contrairos, assi dos aversairos

querem empeecer como dos soberbos e maleciosos que moram em ella, de que nom menos empeecimento muytas vezes recebem. E antes convm no tempo da pazque deforalhe,

viver

como nos conselhou Sam Joham, avendo consiiracom de trs maneiras dhomecs com que ham de conversar, scilicet, os de baixo stado que lhes mandou que alguu delles nom trilhassem, aos seus semelhantes

nom

injuriassem, e de seus

senhores trouxessem boo contentamento do que lhes dessem,

sabendo que naquestas

trs partes osellas,

mais falleciam, e guar-

dandossede

fallecer

em

aprovou o stado dos defensores

nom

mandando desprezar nem leixar, sabendo que he tam necessrio para o bem publico que sem elle se nom podem asoterras e senhorios

longamente soportar

e

defender, que dos

seus ou dos stranhos

nom mandemciadas

buscar para os defenderem.e privillegios

E

a estes defensores

som

grandes liberdadeselles

por

comunydade som alguas vezes no tempo do grande mester acorridos (1). E porema

grande necessidade a que per

toda

(1)

O verbo

acorrer j

no tempo de BARROSfrequncia.

e

CAMES

era desusado,diz

mas:

Gil,

VICENTE ainda usou d^lle com > >

MARIA PARDA1

no seu pranto

Branca mana, que fazedes

Meu amor, DeosSe

vos ajude

:

Que eslou no atade,

me

vs no aecorredes.

TomoAdvertiremos aqui que EIReigular

III, pay. 369.

Dom

Duarte nsa muitas vezes dos collectivos no sin-

com

o verbo no plural

,

d'onde resulta alguma obscuridade e menos elegncia

lhes perteece

31e

saber taaes manhas

na paz aprendere

como no

tempo que comprir possam

saibam

bem husar

daquello perque

som antre

e tenham armas e cavados para estar prestes como convm para logo socorrer onde for

os outros

tam avantajados,

necessrio por servio e

mandado de

seu Senhor, poendosse a

perigos de morte, e outros grandes trabalhos e despezas,

man-

tendo gente e taaes corregimentos segundo a cada huu perteecer,

que honrem o

real stado,

sua corte e senhorio. Terceiro,

como pees, em que toda a cousa publica se mantm e soporta, som chamados (1); aosquaaesna phraseexceptuar;

dos lavradores e pescadores, que assi

mas que muito,!

se todos os nossos clssicos fizero outro,

tanto,

sem

CAMES

Nos Lusadas

III

,

9, diz elle

:

Aqui dos Scylhas grande quantidadeVivem, que antiguamente grande guerraTivero sobre a humana antiguidade.

Advertiremos outrossim que nos escritos d'ElRei Dom Duarte so mui frequentes os hyperbatos ; de que no s muito usaro os quinhentistas , mas abusaro alguns seiscentistas de boa nota, sem exceptuar Jacyntho Freire. Mouzinho de Quebedodisse

no

seu Affonso Africano

,

IX

,

73:

>

Entre todos c'o dedo eras notado

Lindos moos de Arzilla

,

em

galhardia

isto

:

Entre todos os lindos moos de Arzilla,

com

o dedo eras notado

em

galhar-

dia, etc.

E Franco Barreto, Eneid.,

1,

132, disse:

Por ver

Livrou, anda vagando, e

em que montanhas se dos mares em que lugarese

:

isto

:

Por ver Ora,

em que montanhas,hyperbatos

em que

lugares anda vagando, dos mares se,

, e ao uso.de vocbulos antiquados, torno algumas vezes a phrase empeada e amphibologica tal a de que falamos, a qual , despida dos archasmos , e construda;

livrou.

estes

juntos a algumas irregularidades de linguagem

em melhore

ordem

,

ser

mui

clara e intelligivel

;

d'esta

maneira

:

Per

elles toda

communidade

algumas vezes soccornda no tempo da grande/n/n ou necessidade. (R.) (1) Veja-se o que dissemos em a nota precedente acerca dos hyperbatos. Esta phrase ser mais intelligivel construda regularmente, d'esta maneira Terceiro,:

dos

lavradores e pescadores, quepublica se

som chamados

assi

como

pees,

em que

toda a cousa

mantm

e supporta. (R.)

)

muvtoservio,

32

fazei'

perteece era esto sempre continuadamente se ocupar, seendo

relevados quanto se mais poder

dechado outro

maao trilhamento, mas darlhesQuarto, dos

lugar, favor para tira-

rem per

seu trabalho aquelles fruitos da terra e do(1).

todos nos governamos

officiaes,

mar em que em que se en-

tendem os mais principaaes, conselheiros, juizes, regedores,veedores,

scrivaes, e semelhantes, os quaaes boos, leaaes,

entendidos, sollicitos, tementes a Deos devem seer scolhidos.

Quinto, dos que husam dalguas artes aprovadas

e

mesteres,

comoque

fsicos, celorgiaes (2),

mareantes, tangedores, armeiros,

ourivezes, e assy dos outros (3) que

som per

tantas maneiras

nom

se

poderiam brevemente recontar, aos quaaes convm

bem

e lealmente e

com devidaestes

deligencia husar de sua boa,

ma,

neira de viver.

De todos

por seguir esta voontade

tiba

de que

faz

em

o capitlio passadoai

meenom(5) a

(4),

muytos

falle-

cem

,

porque

nom

lie

veencer-se

aquella

voontadee

senom querer daquel stado, que cada huu tem, possuirlograr o folgado e seguro, e rigoos que a cada

nom

soportar os trabalhos e pe-

huu muylo convm.Dom Duartese deve concluir

( 1

Por estas expresses cTElRei

que

as bases de toda a,

riqueza e prosperidade nacional n'aquella idade ero a lavoura e a pesca

e por isso

merecio tanto a solicitude d'aquelle sbio Principe. (R.)(2)

A linguagem

d'ElRei

Vicente, que escreveo quasidiflerena de cirurgio,

Dom Duarte algumas vezes mais culta que a de Gil um sculo depois; o Principe dizia celorgio com poucadisse

como

Cames:

e

hoje dizemos, e o poeta dizia surlugio.

Na fara dos FSICOS

diz

BIUSIA DIAS

Vos sodes surlugio.

Tomo3)

111,

pag. 3ii.

R.

Sobre estes empregados e

officios se

deve consultar a importantssima colleco,

das Cortes ondee

vm mencionados,(S.):

e se trata dos seus privilgios

e

bem

assim o Livro,

Regimento da guerra.(4) (5)

Deve entender-se

De que

este livro faz

meno,

etc. (R.)

Este verbo reciproco hoje desusado, e melhor dizemos deixar-sc vencer de,

,

Exemplo destohonras, reverenasc:

33

(1

se os oradores,

)

quereme fraca

as riquezas

liberdades, segurana de sa geral justia,,

dos

feitos

da guerra

husando de pouca

oraom

,

nomsuas

querendo perigrejas,

ofcios e

corregimentos honrar Deos

nem

nom ensynando,

regendo, ministrando sagramentos

aos que

som obrigados, ea todos dam exemplo descandallo e >lc pouca devaom e mal viver, taaes como esses que ai seguem senom esta tiba voontade, querendo aver as honras, riquezas,poderios, soltura de todas folganas, aos defensores e casados

outorgados,

nom

soportandoseus perigos, trabalhos edespezas?

Contra os quaes diz Sancto Agostinho, que se querem alegrar

comelles.

os Sanctos, e as tribullaes

nom querem

soportar

com(2)

E se nomcomo

quiserem seguir os bemaventurados mrtires

per trabalhos e afiioes, aa sua bemaventuranaviir,

nom poderom(3).

diz o Apostolo Paullo

:

Se formos companheiros das

paixoes assy o seremos na gloria das consollacoes

ou render-se

a

,

que

venecr-se

a.

Em CAMES no

se

encontra, mas GIL

VICENTE

se

srvio d'elle na paraphrase.

do Psalmo L, Miserere mei ,se tu quizesses

Deus

,

dizendo

:

Porque, Senhor,

Sacrifcio da-Io-hia;

Se por peitas

te

vencesses,

Tudo

te oflereceria.

Tomo(1) (2)

III,

paR.235. R.)

Veja-se o

que dissemos ema:

a nota

da pag. 29 acerca

d'este vocbulo.

Notaremos aqui que

linguagem d'ElReio Rei dizia mrtir,

Dom

Duarte algumas vezes mais

cultatalvez

que a de

Gil Vicente

arremedando o povo,l-se:.>

dizia marlel, e marleirar.

como ns hoje dizemos, e o Poeta, Na Farca do CLRIGO DA

BEIRA

E que alimpe bemNoEtire as teas

a pia,

asse sempre castanhas:

d'aranhas

A' mrtel Sancta Luzia.

Tomo3)

III, pag. 235. (R.)II

Scientes qucl sicut socii passionum estis, sic erilis et consolationis. Epist.I, 7. (R.)

de

S.

Paulo aos Corinthios,

Os defensores, quetodos privilgiostotlallas

34

comtrazer capas de

avantageens ja declaradas

querem possuir, querendo

beguinos(1) ou alguus avitos e maneira de oradores, tirandosse

(1)

Beguinos, Begghards ou Bgars,

,

ero irmos da terceirapelos fins do sculo

ordem da penitencia;

de S. Francisco

que

existio

em Allemanha

xm defendero com

pertincia a doutrina de Pedro Joo d'01iva, e foro

condemnados como herejes pelo

Papa Clemente V no Concilio de ViennaFleury, ffistoire du Christanisme,

em

1311. Sobre esta seita e seus erros veja-se731. Paris, 1840.

tomo V, pag.

Com

este

mesmo nome de Beguinos ou Bgardse

ero conhecidos os irmos da terceira

ordem da

penitencia de S. Francisco existentes,

em

Flandes pelo

mesmo tempo, mas

que no participaro dos erros em que cairoguinos allemes. D'esla conformidade de

por que foro condemnados os Beo povo tomado occasio,

nome tendo porm

de lhes imputar os erros d'aquelles, declararo os Papas Clemente V e Benedicto XIIpor bulias expressas , que os terceiros de Flandes no ero de

modo algum comprehen-

didos nos anathemas fulminados contra os Beguinos ou Bgards da Allemanha. Veja-sea

Grande Encyclopedia,Quanto

art. Bguins.

origem d'cste nome, que era popular segundo diz Fleury, pretendem os

Encyclopedistas que elle veio de que esta espcie d'ordem ou congregao da penitencia j viviaS.

em communidadee tinha

,

antes de ter recebido a regra da terceira,

ordem de

Francisco

,

tomado por sua padroeira Santa Bcgghe,

filha

de Pepino o velho,

e d'aqui lhe

deo o povo o nome de Begghards,

Bgards ou Bguins. Posto que esta

origem

seja satisfatria

ns inclinamo-nos mais que d Boquefort no supplemento

ao seu Glossrio da Lingua

Romana transcreveremos;

as suas palavras

:

a

Les tymo-

logistes se sont

donn ben de

la

peine pour trouver 1'origine de ce mot, et sans y

parvenir. Le

nom

de ces religieux (Bguins ou Bgards) vient de ce qu'ils taient

de Tordre de Saint Lambert Bgue, prtre de Lige au

xm

c

sicle, qui institua la

premire communaut de Bguins Lige, en

1

173, laquelle fut transfre Nivelle1

en 207 Calcndrier1.

hisl.

de VEglise de Paris, pages 4 1

et suivantes

,

et

Jrt de

rri/ier

les

daes,

tome

1,

page Go.

Beguino

em

italiano (Begbino) significa,e

homem quee pelo

traz habito de religio vivendohistrica, teve

no sculo

;

na lingua romana,

no antigo francez, alm da significao,

tambm

a de beato falso

hjyocrila

etc.

,

que lemos em EIRei

Dom

Duarte

parece que

tambm

nesta accepo era tomada entre ns a palavra beguino, a qual,

sem dvida nos

veio de Flandes

ou

d'Italia.

Pantaleo d'Aveiro, S de Miranda, e outros escriptores portuguezes fallro debeguinos e beguinas,

mas no

indico precisamente que sorte de penitentes ero,

nem

se

35

ai lhe faz teer tal

das despezas, perigos e trabalhos, que

geito

nom

esta tiba

voontade?

E,

assi

quando desemparoma

a

hon-

rada maneira de seu viver e se laneom a lavrar, ou trautar de

mercadaria, todo

dalli

vem o que

hus

e a outros

nunca deve

seer consentido, salvo se alguu defensor passasse de lx annos, eja

bem

se

ouvesse governado;

em

sa

mancebia

(1) e fosse trazido

a fraca

disposicom

a

tal

bem

lhe deve seer outorgado

que

cesse d'algutis carregos de cavallaria, se a necessidade

muyto

se ero terceiros

de So Francisco. Fr. Joaquim de Santa Rosa diz no Elucidrio que

os Beguinos gosro

em Portugal

da estima dos povos ; que os Eremitas da Serra d'Ossaeste

,

e os Loyos talvez foro

chamados comse descobrio

nome, que

equivalia ao de bons

homens,

masque

a

maldade que,

nos Beguinos fora d'Hespanha tornou mui suspeitos,

os de Portugalcrita, o

e ficou sendo

nome de opprobrio comoque

Jacoheo falso e simulado hypo1

que

d'antes fora titulo de santidade e honra. Nas Cortes d'Evora de 141I,

pediro os povos a EIRei D. Joo

corrigisse a relaxao

no

s dos Clrigos e

Frades, mas dos Beguinos e Beguinas que ero o escndalo do povo. Vej. Elucidrio,art. Biguinos.

No tempo d'ElRei Dom Manoel ainda havia destes Beguinos,

e

formavo

uma

espcie

de Congregao religiosa, sem com tudo sabermos se ero terceiros Franciscanos,

comoqual

se colligefoi

da tragicomedia de Gil Vicente, intitulada

CORTES DE JPITER,

a

representada,

em presena;

d'aquelle Monarchaa

,

partida:

da Senhora Infanta

D. Beatriz

Duqueza de Sabia er estas virtudes nos retemos de seguir as trees voon7Vy-0mades desordenadas; e nos regemos pra quarta vire

^Tl/r^^luosa. Primeira, temor das penas do inferno

das

-l^J^lex

(1)

presentes;

postas per os senhores, ou per

=-S*-J^8 aquellesgunda,

que sobre nos teem poder e regimento. Se-

desejo de gallardom que speramos de cobrar

em

estafie

vida, e despois na outra, por fazer

sempre bem

e nos arredar

1)

So mui frequentes os exemplos de se escrever antigamente lexleis,

em

lugar de

lys ou

como

se

pode ver nos Inditos, nos Documentos para a Historia daseste plural

Cortes, ete. No

vem

da lingua romana, que nella similhante ao nosso,,

como

se pde ver

em:

o Lxico de Raynouard

art.

Leg, ley ou;

lei

,

em que

elle:

adduz

a seguinte

passagem

Eis feyron

lejrs

per terras guazanhar

que quer dizer

Elles

fizero leis para

ganhar

terras.

Talvez que esta variedade provenha de que osis

nossos antigos davo

aojo

soido de

ou de

ich

,

pois

encontrmos algumas vezes:

e-r

em

lugar de,

eis

(ecce lat.); S de Miranda diz;

na Egloga VIII, estancia 22,

i& nos

c

e

ex nos

l

e d'este

modo

ficar

sendo no erro de grammatica

como parece,

mas sim orthographiatinha caducado,

viciosa.

No tempo d'ElRei

Dom

Manoel

j esta

forma do plural

como vemos das

seguintes passagens extrahidas do Cancioneiro de

Kesende

:

NemNem

(vy)

oms mais enganados

Vereys com ijuanla graveza Busca leys de gentileza

(Jue os prncipes e reys

ser has

mesmas

leys. foi. 51.

No lyndo

esljlo

romano.

"

Trovas de D. Joo Manoel

Trotas de Gil Vicente,

foi.

210

v.

(It.)

lodo mal. Terceira, portias

40

e

amor de Nosso Senhor Deos,fe,

afeiom

virtudes.

E

o primeiro, que perteece ao temor, no livro das

Collaeoes (1) se apropria aa

creendo que se mal fezernios

sem duvida averemos porbes e gallardom, se

ello

scarmento e pena.

E E

o segundo

aa esperana, pella que esperamos

com graa de Deos grandeso terceiro,

bemel,

e

virtuosamente vivermos.

aa caridade, per a qual se

ama Deos sobre

todallas cousas

e

virtudes pra plazer a

e se avorrece toda cousa contrair

da

virtude pore

nom

desplazer a aquel que sobre todos he damar;

nom embargando;

que cada hua destas virtudes per sy hecarreira per poucos,

suficiente pra enderenar naquella real

seguida

porem

antrellas (2) he grande deferena

porque as

primeiras duas perteecem aos que comeom e prosiguem de viir

ao mais perfeito stado,servos, que servem

e a terceira

aos que leixando de seer

com medo das

feridas,

que passam

a

con-

diom de servidores, que ja speram

por seu boo servio galar-

dom,

vem ao stado de boo e leal filho, que todas cousas de seu padre ha por suas, e porem nom tanto por temor das penas ou sperana de galardom o servem honram e receame dally,

como por dereito amor, no qual ha temor mais continuado danojar quem muyto ama, por nom lhe fazer desplazer, ou min-

(1)

Veja-se o que dissemos pag. 23 acerca d'este livro.

(2)

Anlre

,

em lugar

tfentre,

que usado por quasi todos nossos antigos Escriptores

incluindo Barros, c do antigo dialecto portuguez-galliziano. N'uma das Cantigas do

Cancioneiro de C. Stuart, diz o Trovador

:

Comanlras pedras bem

rubi.ui.

"

Sodes anlre quantas eu

E deus uus fez por ben de mi. Que len comigo gran amorPard's

ay dona Leonor.

Veja-se o que dissemos acerca d^ste Cancioneiro pag. 35 e 36. (R.)

41

seer

guando se perde o amor do que pode

no servo, o qual

a

olho

soomente sguarda Eaquestehe sempre guardado, porque dentro

em

sy tem aquel grande

fallece,

amor que per mingua de presena nom mas em todo lugar a sente de que perfeitamente ama

pra se guardar de toda cousa a seu plazer (1) contrair; e na

sperana se ha mais avondosamente, porque mais

amando ha

mais desejo,

e

mais desejando, pois o que deseja spera receber,

sua sperana convm seer de

temor, ainda o desejo e ooutra cousae,

mayor sentido. E quem serve por amor ficam livres pra se juntai- aa fora

e crecendo

muyto farom passar

do temor;

quem soomente por alguu galardom serve, ainda o amor lhe fica livre pra poder haver mayor sentido e deleytaom em presena doutro bem, que mais ame do que deseja aquello que spera; mas quem de todo coraom, toda voontade, e de todas foras amar, todo em sy tem. E porem nom se pode desatar, minguar, nem fazer cousa contrair de quem assy ama, porque teme, como disse, muyto, e continuando por aquel temor, que nace do grande amor, e assy spera, e se alegra e deleita em amar e seguir de boa voontade sem contradiom aquel que por tal amor he atado. E aalem desto o legamento na afeiom das virtudes, e contynuada husana delias faz muyto perfeitamenterefrear de todo mal e pecados, nos quaaes

caaem os seguidores

das trs voontades ja declaradas

,

e aderencar, guiar, e regerse

per a quarta, pella qual nos praz sempre fazer aquello que nossa

razom demostra que he melhor, por servio de Nosso Senhorguarda das virtudes. E aquesto screvi por fazeralgia

e

declaraom

(1)

Os nossos antigos trocavo muitas vezes a

lettra r pelo

/

e vice versa. EIRei

Dom

Duarte diz plazer edesplazer, e no Cancioneiro de Resende l-secraro,

com mnita frequncia

grorea, etc. (R.)

42destes trs freos, os quaes cada

huu deve

trazer

em

se coracoin

por sentir,

e conhecer, e

guardar bondades

(1) e virtudes.

(1)

Bondades, na accepo deboas qualidades, boas partes, e quasi como synonymotudes, era locuo

de

i

ii

mui usada

e cortez

em

todo o sculo XVo e ainda no XVI"e nas Trovas

:

Barros usou d'ella

com frequncia no Clarimundo,:

de lvaro de Brito

tanibcni se encontra

Os scientes sabedores

Guarnecydos de bondadesHatn de ser; Assy modernos autores

"

Que suas autoridades

Devem

crer.

>-

Vunr. Gvr.de Resende,

folti. ^6.

(R.)

,

43

CAPITOLLOl>outra

VI.

declaraom que fao sobre as voontades.

>ora

embargando que a declaraom suso

scripta

das voontades

bem me

parea, eu fao, segundo

;em raygeeral'as

e

nos outros sento, outra repartiomestas quatro partes,

em

segundo declarom,

almas vegetativa

sensitiva

e

racional

,

e

quarta do livre alvidro(l), que per nosso prazer fazemos.

manda comprir

toda cousa que

A voontade que

perteece aa parte vegetativa

,

que

lie

seme-

lhante aa que teem as arvores,

de comer, beber, dormir, e vestirsidade de vyda.

A

sensitiva,

demanda sade, mantiimento, com as outras obras da necesque com a das bestas concorda,

(1)

Este vocbulo ainda se encontra

ema

Ordenao Manuelina,

,

mas bem depressado mesmo Rei que

caio

em

desuso

,

e foi substitudo

fizera a

Ordenaro

dizia

em presena GIL VICENTE no ACTO DA ALMApor alvedrio

porque

:

8

Vosso

livre alvedrio

Isento, forro, poderoso,

Vos he dadoPolo divinal poderio