lavra

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Lavra é um volume de poesia reunida de Ruy Duarte de Carvalho da altura entre 1970 e 2000.

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Page 1: Lavra
Page 2: Lavra

do autor (poesia)

Chão de oferta (1972)A decisão da idade (1976)Exercícios de crueldade (1978)Sinais misteriosos... já se vê...(1980)Ondula, savana branca (1982)Lavra paralela (1987)Hábito da terra (1988)Ordem de esquecimento (1997)Observação directa (2000)

Page 3: Lavra

LAVRA

Page 4: Lavra

Título: Lavra (Poesia reunida 1970-2000)

© Ruy Duarte de Carvalho e Edições Cotovia, Lda., Lisboa, 2005

Concepção gráfica de João Botelho

ISBN 972-795-135-X

A presente edição contou com o apoio de:

CASA DAS ÁFRICAS – São Paulo – Brasil(espaço cultural e de estudos sobre sociedades africanas)

IPLB – Instituto Português do Livro e Bibliotecas(Programa de Apoio à Edição de Obras de Literatura e Cultura Africanas)

Page 5: Lavra

Ruy Duarte de Carvalho

LavraPoesia reunida 1970-2000

Cotovia

Page 6: Lavra
Page 7: Lavra

Índice geral

LIVRO I Chão de oferta (1970-72) p. 11

LIVRO II Das decisões da idade (1972-74) 53

LIVRO III Exercícios de crueldade (1975-78) 103

LIVRO IV...Sinais misteriosos... já se vê... (1977-79) 131

LIVRO V Da lavra alheia I (ondula savana branca...) (1977-80) 153

LIVRO VI Hábito da terra (1979-86) 227

LIVRO VIILavra paralela (1983-86) 265

LIVRO VIII Ordem de esquecimento (1987-94) 283

LIVRO IX Da lavra alheia II (Observação directa) (1999-2000) 311

LIVRO XDiário (1993-98) 375

Adenda 403

Índice dos poemas 437

Page 8: Lavra
Page 9: Lavra

………. como não nasci ensinado e vivi muito, nem tudo, hoje, éevidente, nem me merece aqui o mesmo apreço………. a certaspeças conservei-as só por respeito à devoção e ao gosto de algunsleitores antigos e porque por essa via talvez tenham, quem sabe,chegado a fazer parte de um certo tempo muito localizado masque foi o nosso………. a outras dei pequenas voltas para as tor-nar mais as mesmas, inclusive a alguns inéditos, poucos, de quenunca consegui livrar-me….. a esses, juntos com avulsos publica-dos fora dos livros originais, agrupei-os numa adenda…….. achoque de 98 para cá, talvez, passei a creditar a outras vazões de es-crita os fluxos poéticos que se me foram atravessando……….

………. agradeço a quem entendeu oportuno e adequado fazerpublicar agora este volume de memórias…….

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LI V R O I

CHÃO DE OFERTA

(1970-1972)

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Page 13: Lavra

CHÃO DE OFERTA

O sul

O sol o sul o salas mãos de alguém ao solo sal do sul ao solo sol em mãos de sule mãos de sal ao sol

e sal do sul em mãos de sole mãos de sul ao sol

um sol de sal ao sulo sol ao sulo sal ao solo sal o sole mãos de sul sem sol nem sal

Para quando enfim no sulao soluma mão cheia de sal?

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Page 14: Lavra

Dorme Benguela

do meu cinturão de caça

pendem podres as palavras

de outras antigas caçadas

dorme benguelaventre gasto de poetas frustresexangue combustão de fé perdidafina poeira de raivas adiadasnoite clara e quente de morosa febrecopiosa exsudação de ódio senilpesada nuvem de culpa conquistada

dorme, benguelamal-amada sombra de um quintal vendidotapume podre de um remorso azedomangal viscoso de intenções veladascoceira ardente, chaga prometida

dorme, benguelafadiga permanentemeu perpétuo odorde sacrifício vão

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LIVRO I

Page 15: Lavra

Nas praias do sul

nas praias do sulàs terças-feirasfaz-se um silêncio de noitequando chegas.instalas-te embriãono útero da rochae inventas-te filhado rosto do mar.

os cães farejame as aves denunciamderrames placentários.menstrua-se a luae aguardamosa ejaculação dos mastros.

circulam-te as brisas e teus ossosde salfiligranam-se iminentes de puro mar.

o mais és tu e o chapinhar das frases.

O que tu és

um poço fundo(bem sei)

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CHÃO DE OFERTA

Page 16: Lavra

um mastromaré vivaum oceanopeixe-prataverde-maralga marinhaalga-zarra de mar.

Um esquium soe dizer-seuma maçã:verderoubada.

Uma curva quebradaum sobe e desceum martírio de espantouma piscina nuauma gota azulde reagentevapor de enxofresuor de grutaum vidrointransparente.

Um animalum brilhouma corridaum arum desafio.

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LIVRO I

Page 17: Lavra

o que tu és frequentemente:

Pés juntos de criançaurgência e vontades.

Peito feitopedra de toquepau de fileira.

Ogiva estreitaestátua de sallagoa morta.

Vento suãonordeste agrestedeserto brevemontanha crua.

o que tu és definitivamente:

A coisa rara:

A voz de um russoo caminhar de um mongeo Pólo.O baú de Marco Pólo.

e ainda:

A autópsia das coisas singulares.

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CHÃO DE OFERTA

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Era Janeiro

Hás-de lembrar-te que por aqui passei.Era janeiro e não tinha amigos.Vinha de longeE na mala trazia roupa sujaE alguns livros sem capa.

Dir-te-ei depoisdas lembranças que hoje ainda não sei—

Da surpresade dar pelo riso das criançase não estranharo ranço do embaraçona aventura.

Poderia dizer de tudo já.Dizer-te o que não vai acontecer.Dizer-te, enfimde como estar aqui não me pertencenem te pertencenem se prende a sábios loucosnem a santos revelados pelo martírio.

Poderia até dizer-te, hoje e aquineste quarto de hotel(familiarmente pobre e sujo)o quão pouco me basta para enfrentar o mundo:

é vir assim, ousadamente, resgatarduas horas de sol ao sudoeste.

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LIVRO I