lampiao o invencível duas vidas, duas mortes livro

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5 José Geraldo Aguiar LAMPIãO O INVENCíVEL: DUAS VIDAS, DUAS MORTES — O outro lado da moeda —

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A verdade sobre lampião.

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José Geraldo aguiar

Lampião o invencíveL:duas vidas, duas mortes

— O outro lado da moeda —

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Copyrigth by José Geraldo Aguiar – 2009

Ficha técnica

Arte da capa:Michelle cunha

Revisãoautor

Editoração eletrônicacláudia GoMes

A282l Aguiar, José GeraldoLampião, o invencível: duas vidas, duas mortes / José

Geraldo Aguiar. — Brasília : Thesaurus, 2009.276 p. : il.

ISBN: 978-85-7062-887-9

CDD 929 CDU 920

Contato Com o autor:Rua Ferreira 585 - centro

39300-000 - São Francisco-mGTelefenes: (38) 3631-2589/9920-2233/9138-5540

e-mail: [email protected]

Todos os direitos em língua portuguesa, no Brasil, reservados de acordo com a lei. nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópia, gravação ou informação computadorizada, sem permissão por escrito do autor. tHESauruS EDItora DE BraSÍLIa LtDa. SiG Quadra 8, lote 2356 - cep 70610-400 - Brasília, DF. Fone: (61) 344-3738 - Fax: (61) 344-2353 – end. eletrônico: [email protected] – página na internet: www.thesaurus.com.br

Composto e impresso no Brasil

Printed in Brazil

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Lampião, aos 90 anos de idade.

Faleceu em 3 de agosto de 1993 aos 96 anos de idade.

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Biografia do autor

José Geraldo aguiar aos 47 anos de idade

Filho de José aguiar e cecília Santos aguiar, 12º filho de 17 irmãos, José Geraldo aguiar, nasceu em vila do morro (município de São Francisco), em 16 de outubro de 1949. iniciou o curso primário ali mesmo e o concluiu no Grupo escolar coelho neto, em São Francisco. cursou o ensino fundamental no Ginásio de São Francisco e na escola estadual professora Dulce Sarmento, em montes claros.

mudou-se para São paulo, onde fez o curso técnico em contabilidade no colégio Santos Dumont, no bairro do Braz. ainda em São paulo, frequentou outros cursos, entre eles o básico e o superior de fotografia e foi diplomado também pelo curso de caligrafia Dê Franco.

Retornando a São Francisco em 1974, montou seu ateliê fotográfico, trazendo algumas inovações, como a fotografia em cores, a polaroid (fotos instantâneas) e o pôster 50x60. Sempre religioso, fez o encontro de casais com cristo, é cursilhista, vicentino (confrade) e também identificador ad hoc aprovado pelo instituto de identificação do estado de minas Gerais.

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o que para o homem sábio é descoberta, para os outros pode ser loucura.

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esta obra só foi possível graças à colaboração de inúmeros amigos, que confiaram em mim e em meu trabalho.

À minha esposa, edny prestes aguiar e aos meus filhos: Roberto, michelle e Daniel prestes aguiar, mãe nana e ao meu querido Tiago moreno.

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agradeço a Deus a dádiva a mim concedida de anunciar a sobrevida de virgulino Ferreira da Silva, o Lampião.

para concluir esta obra, foram necessários 17 anos.

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Sumário

Biografia do autor ............................................................ 9introdução ....................................................................... 19prefácio ............................................................................ 21Fé e devoção .................................................................... 27Lampião expressa seu sentimento ..................................... 31pelas referências, pela colaboração, pelo incentivo, pelas informações, agradeço a: .................................................. 33Lampião, de angico a Buritis ............................................ 35

capítulo iFatos e suspeitas

o exame ........................................................................... 37Suspeitas .......................................................................... 39Que teria mesmo ocorrido ................................................ 48e a prova definitiva? ......................................................... 50

capítulo iio primórdio do cangaço

os antecessores de Lampião ............................................. 53Joaquim Gomes (o cabeleira) ......................................... 53Lucas da Feira .................................................................. 54João calangro ................................................................... 54Jesuíno Brilhante .............................................................. 55adolfo meia noite ............................................................ 55manoel Batista de moraes (antônio Silvino) .................... 55antônio porcino e Sinhô pereira ....................................... 55Família de Lampião ......................................................... 59porque tudo começou ....................................................... 61Feitos de Lampião ............................................................ 64a morte de João cavalcante .............................................. 65a invasão da casa da baronesa .......................................... 69a proteção do Governador .............................................. 71o convite do Deputado .................................................... 72Força e Tramoia................................................................ 73

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arrecadação de recursos ................................................... 75Recordações do poeta ....................................................... 78Dinheiro em árvore .......................................................... 84Galo de prata.................................................................... 89Sapo cururu .................................................................... 90notícias do morto vivo ..................................................... 92no caderno e no mesmo cemitério ................................... 95na trilha de Lampião ........................................................ 97cangaceiros que se tornaram célebres .............................. 102cangaceiras que ficaram na história ................................. 105o homem escreve torto com linhas retas .......................... 107

capítulo iii

como encontrei Lampião ........................................................109

capítulo iv Lampião conta sua história

a vida, até a morte do pai ................................................. 115a entrada no cangaço ....................................................... 117a família ........................................................................... 119o cangaço: a crueza, as peripécias e as técnicas ............... 120alta periculosidade ........................................................... 121as amizades ...................................................................... 124o cansaço ........................................................................ 125o zelador do chafariz ....................................................... 126a “morte” de Lampião ...................................................... 127a fuga para minas ............................................................ 132o temor da revelação........................................................ 134estados nordestinos por onde andou Lampião ................. 136mapa das cidades mineiras poronde andou Lampião ........ 137a confissão aos últimos vizinhos ....................................... 138a segunda morte .............................................................. 141

capítulo va vida em minas

De Januária a São Francisco ............................................. 145João Bogó ......................................................................... 145

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Desentendimento em capitão enéas................................. 147na fazenda do prefeito ..................................................... 151a ambientação .................................................................. 153a chegada da família......................................................... 158a vida na fazenda ............................................................. 160Galinha com guizo ........................................................... 160João, cabra macho ............................................................ 162a venda da Buriti do meio ................................................ 164Reflexos do tempo do cangaço ......................................... 167marcado para morrer ....................................................... 167compromisso é para ser cumprido ................................... 169“você não é homem pra isso!” .......................................... 170estranho jeito de ser ......................................................... 172Um dia na casa de carneiros, outro, na tenda de farinha ... 172Homem de fé ................................................................... 173Sem visitar ninguém ......................................................... 174enquanto um for vivo, o outro também estará .................. 175o Gaiola.......................................................................... 176alta periculosidade ........................................................... 177meu nome é virgulino Ferreira ......................................... 178Três identidades................................................................ 180a família ........................................................................... 183maria, Bonita ................................................................... 183nomes e alcunhas usados por maria Bonita ..................... 183Dona Severina .................................................................. 186Filhos ............................................................................... 190capítulo vi os cabras de Lampião também em minas ...... 193asa Branca ....................................................................... 193Revelações de asa Branca ao delegado ............................. 198o amigo de asa Branca .................................................... 205“o ser humano mais perverso” ......................................... 206a emenda do dia “cortado” .............................................. 212Boaventura, o “sogro” de João Teixeira............................. 213Subir para o “céu” ............................................................ 219Dantas e maurício ............................................................ 219moreno e Durvinha, ex-cangaceiros de Lampião, confiden- ciam com o autor ....................................................... 221versos da ex-cangaceira Durvinha .................................... 228

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versos do ex-cangaceiro moreno ...................................... 228

capítulo viinomes e documentos de ficção

pseudônimos .................................................................... 229muitos nomes, um pai. ..................................................... 237

capítulo viii acróstico, músicas e poemas do autor em homenagem

a Lampiãoacróstico de Lampião ....................................................... 243música Lampião: o cabra macho ...................................... 244no tempo de Lampião ...................................................... 245capitão e coronéis música ............................................... 246poemas ............................................................................. 248meu Rincão ..................................................................... 248por isso eu digo que: ........................................................ 251

capítulo iX informações coincidentes .......................................................253

capítulo X o cangaço em São Francisco

o cangaceiro de São Francisco ......................................... 259versos a antônio Dó ......................................................... 265a imprensa e antônio Dó ................................................. 265preceitos Bíblicos cumpridos ........................................... 269

capítulo Xi

agradecimentos ................................................................ 271pessoas que deram depoimentos ....................................... 273Referências ...................................................................... 275Livros ............................................................................... 275Jornais ............................................................................. 276Revistas ............................................................................ 276

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introdução

ao longo do tempo em que escrevi este livro, sem tréguas fui acompanhado pelas críticas, inclusive

em minha própria família, pois bem sabemos que profeta da terra não faz milagre. em minhas pesquisas, viagens e estudos, isso foi uma constante. mas, por incrível que pareça, para mim serviu de grande incentivo, pois a cada dia que se passava era maior minha vontade de vencer. vencer os falsos amigos, os falsos advogados, os falsos escrivães, a mesma crítica, a inveja, o sono, o cansaço, a dor de cabeça, a preocupação, os obstáculos. vencer a história oficial, mostrar o outro lado da moeda, a realidade dos fatos, enfim, a verdadeira saga de Lampião.

Doutor em psicologia pela Universidade de maryland, eUa, Belizário marques disse em uma matéria veiculada na revista vida e Saúde de janeiro de 1997: “Sei que vencer é importante para o estilo de vida da pessoa. Sei que a vida de quem vence é melhor do que a de quem perde. aprendi que nascemos para vencer e não para perder, quem não vence é um fracassado, quem não luta é um derrotado”.

no entanto, para vencer é preciso enfrentar obstáculos, coisa a que poucas pessoas se arriscam, temendo perder o que ainda lhes resta. e, antes de deparar com os obstáculos, é necessário ter um alvo, um objetivo, um sonho.

e tocar em frente, mas, como diz o Dr. Belizário, no vencer, o fazer, o empreender nunca pode ocorrer em detrimento do ser. a pessoa está sempre presente no que

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faz, no que quer, no ser. não se tortura com o passado, nem se apavora com o futuro. ela não perde energia ou tempo, preocupando-se com o que os outros estão pensando, fazendo ou erigindo. ela se preocupa com a sua obra, a sua atividade. não se orgulha, nem se envergonha, tampouco se exibe, esconde, inveja ou provoca. não se sente superior e nem inferior. para ela, o importante é acertar. o erro precisa ser corrigido. aprendendo com o erro, vem o acerto, com ele, o vencer. vencer é fazer, errar e corrigir o erro. com isso a pessoa cresce, aprende e muda.

para quem é assim e age assim, não existem verdades sacrossantas, intocáveis, pois certamente a maior parte delas é passível de revisão. colocadas no pedestal, sufocam a possibilidade de reavaliação e aparecimento do novo. no entanto, não se pode ser irresponsável. por isso, no livro que agora entrego a você, leitor, procurei provar a revelação que ele traz com depoimentos, documentos, fatos.

entendo que muitos que tiverem a audácia de ler esta obra antes de chegar até aqui ou ir bem mais adiante estarão aferrados à suspeita ou à certeza de que ela constitui uma impostura. entendo também, entretanto, que todo leitor é alguém a ser vencido. Se o livro não vencê-lo, não terá cumprido sua missão. vencer o leitor é demovê-lo das certezas, às vezes prepotentes e finais, que ele leva até então.

corrijo: se o livro não mover pelo menos uma pedra da montanha de certezas, não terá cumprido sua missão.

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prefácio

a vida e a morte de virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, o mais conhecido cangaceiro brasileiro,

já foram contadas em prosa, verso, filmes e seriados na televisão. Talvez a sua divulgação tenha sido maior na literatura de cordel, cuja atuação fica muito ao gosto do povo nordestino, que tem o salutar costume de contar suas aventuras, suas vitórias e seus fracassos em versos, idealizados no momento pelos poetas populares, denominados de “repentistas”.

a história conta que Lampião nasceu em 7 de julho de 1897, no sítio ingazeira, e foi criado em vila Bela (atual Serra Talhada, pernambuco). participou do cangaço nordestino de 1917 a 1938 e foi assassinado na madrugada de 28 de julho de 1938, por uma patrulha policial do estado de alagoas, na localidade de angico, município de poço Redondo, Sergipe.

contudo, sempre houve dúvida quanto ao fato de ter a patrulha policial realmente assassinado 11 pessoas, sem que Lampião e seus seguidores tivessem oportunidade de dar um tiro sequer. isto não coaduna com o temperamento, a inteligência, a perspicácia e a sabedoria do verdadeiro Lampião, que nunca se deixou ser pego de surpresa. vários escritores já levantaram essa dúvida, mas o segredo envolvendo os detalhes que cercaram a “morte” de Lampião e a determinação das autoridades de então em dar muita divulgação à “vitória da polícia” (que teria capturado o

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famoso Lampião e seu bando, inclusive transportando as cabeças dos cangaceiros para outras cidades e expondo-as em praça pública) inibiram a pesquisa dos fatos com maior profundidade.

agora, porém, aparece um novo escritor, que tem a “petulância” de afirmar que Lampião não foi assassinado naquela madrugada de julho de 1938. afirma que tudo foi um acordo e uma trama entre Lampião e as autoridades, porque ele há muito tempo queria abandonar o cangaço e ser fazendeiro em minas Gerais, mesmo porque já passava dos 40 anos de idade e não se sentia em condições de continuar naquela vida. este autor trata-se de José Geraldo aguiar.

Será loucura? É mais um querendo vender livros às custas da fama de Lampião? Será que Geraldo aguiar, como é mais conhecido, tem argumentos suficientes para sustentar sua estrambótica tese? como ficará a história oficial depois deste livro?

com efeito, conheci Geraldo aguiar e sua esposa edny prestes aguiar na década de 70, quando tomei posse como juiz de Direito da comarca, por ocasião do centenário de São Francisco, em 1977. Trata-se de um casal unido, cristão e com o espírito caridoso, tanto que restabelecendo a conferência de São vicente de paula naquela cidade, convidei-os para fazer parte daquela sociedade, no que fui atendido. ele, na época, era um exímio fotógrafo. ainda como juiz, fui para Janaúba, Francisco Sá e depois para Brasília-DF.

após 30 anos da minha saída de São Francisco, continuei com as amizades e fui convidado para prefaciar este livro: Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes.

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Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes 23

com toda certeza, este livro irá mudar o curso da história do cangaço brasileiro. pediria aos críticos que não emitam a sua opinião antes de ler o conteúdo do livro. Geraldo aguiar agiu como um bom detetive, daqueles de antigamente, que iam a fundo para resolver as questões, para descobrir e esclarecer os fatos, pesquisando, ouvindo as pessoas, catalogando dados e informações.

Sendo novo nas lides da escrita, o autor agiu como um experiente escritor. investigando os dados que chegavam ao seu conhecimento, indo atrás das informações, comparando dados, rejeitando os fatos não confirmados, escrevendo aquilo que teve certeza de ser a informação verdadeira.

mas Geraldo aguiar não se esqueceu de sua São Francisco querida. colocou no seu livro a história de antônio antunes de França, o antônio Dó, o que ele denomina de “o cangaceiro de São Francisco”, o que enriqueceu a sua obra.

a história contada por Geraldo aguiar sobre Lampião impressiona pela sua riqueza de detalhes. as entrevistas conseguidas, a identificação e tomada de depoimento de quase todos os companheiros de Lampião que vieram com ele para minas Gerais. as histórias contadas pelo próprio virgulino Ferreira da Silva, que em minas Gerais teve muitos nomes diferentes, justamente por viver na clandestinidade, como: policarpo Lima, João Teixeira Lima, antônio Teixeira Lima, Luiz Teixeira Lima, João Baiano, João Bogó, João mangabeira, João pernambucano, José pereira, Luiz antônio de Lima, antônio Luiz de Lima, Luiz Fulício Lima (na Bahia, em 1968, utilizou a alcunha de “viúvo”) e, finalmente, antônio maria da conceição,

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nome com o qual faleceu e foi registrado o óbito em Buritis de minas, embora na lápide do cemitério se encontre escrito o nome de antônio Teixeira Lima.

Fiquei impressionado com as informações de que Lampião e seus companheiros vieram do nordeste para minas Gerais, subindo o rio São Francisco, e mantiveram contatos ou receberam a proteção de pessoas que foram minhas conhecidas, como o capitão enéas mineiro de Souza, Brasiliano Braz, oscar caetano Gomes, Dr. manoel Ferreira, odilon Rodrigues Barbosa, o Dr. Joaquim costa, diretor do DnocS (antigo iFocS), manoel José de Souza, o neco de Santa maria, os dois últimos de montes claros e outros.

Também me surpreendeu o fato narrado no livro de que, como juiz da comarca de São Francisco, proferi decisão em ação possessória contra o verdadeiro Lampião, só que a ação fora movida contra João Teixeira Lima, um dos nomes falsos que ele usou na clandestinidade.

o livro registra que Lampião não era aquele monstro que espetava crianças em seu punhal de prata, ao contrário de que registram setores da história. o autor o retrata como um homem bom. caridoso, sensível à miséria que reinava e ainda reina no nordeste, agia contra as injustiças, era protetor dos amigos e implacável com os inimigos.

o autor retrata o homem que conheceu em minas Gerais e com quem manteve muitos contatos como astucioso, enigmático, misterioso, audacioso e corajoso, todas essas qualidades conhecidas e próprias do verdadeiro Lampião.

com este livro sobre a vida e morte de Lampião, vê-se que o chefe do cangaço brasileiro sempre teve saídas estratégicas e poderei indicar três delas. a primeira foi a

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negociação com o então governador de Sergipe, Dr. eronides de carvalho, de quem era amigo, para sair do cangaço. e então abandonou o estado na calada da noite enquanto deixava para trás outros cangaceiros menos famosos, que cientes de tudo permaneceram no couto onde se deu o morticínio, no lugar dele e de outros companheiros. a segunda foi o acordo inteligente com o tenente João Bezerra. e a terceira saída estratégica, quando o autor propôs colher mais detalhes de sua vida, inclusive tirar fotografias e filmá-lo, e ele se retirou, sem nada dizer, para Buritis de minas, onde ficou até falecer, em 3 de agosto de 1993, com 96 anos e vinte sete dias de idade.

pelo que li na imprensa, o lançamento do livro Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes está cercado de enorme expectativa por parte da grande imprensa e esperado com ansiedade pelos escritores e curiosos que se dedicam a pesquisar a vida e morte de Lampião.

parabéns, Geraldo aguiar. Seu livro vai dar um novo curso à história do cangaço no país. Diante da riqueza de detalhes, do grande número de pessoas ouvidas e dos dados que possui, inclusive fotografias do Rei do cangaço e a mulher mais famosa do sertão brasileiro, você fica devendo ao público um livro para completar a história, retratando a vida e morte de maria Teixeira Lima, a mesma maria de Brito Lima, maria ventura, a conhecida “maria Bonita”, a dileta companheira de Lampião, que também usou de diversos nomes durante o tempo em que passou na clandestinidade.

Dr. avay miranda, Juiz de Direito aposentado

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Fé e devoção

“Quando a madrugada, despertada, se sacudia nos assanhos do sol nascente, ou a mornidez do fim das tardes amolegava as almas, costumava este famoso místico e Rei do canganço – capitão virgulino Ferreira da Silva – fincar-se de pé, nos altos dos tabuleiros, para contemplar, demoradamente e farto de orgulho, as vastidões do seu Reino, mantido na sujeição do seu ferro e sinal, e conquistado numa grande guerra de vinte anos – a guerra de Lampião!”

“Sou senhor absolutoDe todo esse sertãoaqui quem quiser passarprecisa apresentarLicença de Lampião” .

(versos de Lampião) Lampião seu tempo e seu reinado, padre Frederico

Bezerra maciel, p.24, do primeiro volume.

M

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28 José Geraldo aguiar

– “Diante da sagacidade, destimidez e periculosidade de Lampião, as volantes procuravam nunca enfrentá-lo a sós, dentro de igualdade numérica de pessoal.”

sinhô Pereira (mestre de Lampião).

M

– “É verdade que você anteviu a genialidade de Lampião?” – “Dos homens que deixei em armas no pajeú, só virgulino podia chegar a celebridade”.

Sinhô pereira (mestre de Lampião).

M

– “Liberato comandou mais de dois mil soldados em toda a campanha da Bahia contra o Rei do cangaço: – “ Lampião tinha o espírito de napoleão!”.

Liberato de carvalho (oficial de polícia).

M

– “Revolucionário destemido, enérgico e sensato Secretário de Segurança pública em pernambuco adestrado em curso contraguerrilha: – Lampião tinha a intuição guerrilheira!”

silvio de melo Cahú (oficial de polícia).

M

– “e se hoje a respeito dele, falo e escrevo com entusiasmo, é por uma razão de imposição de sua genialidade, que é o traço dominante de sua personalidade”.

“Lampião era um gênio em tudo”.

major oPtato Gueiros.

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Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes 29

– “Lampião dentro de uma trincheira era um leão. capaz de brigar o dia inteiro, destemido”.

Coronel hiGino josé Belarmino.

M

– “Da polícia de pernambuco, oficial de grande coragem e autor do livro de memórias – Lampião:

mui cedo (Lampião) deu provas de admirável capacidade tática e estratégica que assombraram os inimigos”.

major oPtato Gueiros

M

– “considero Lampião o maior guerrilheiro das américas”.

FranCisCo Flávio iBraim de lira, oFiCial PernamBuCano.

M

– “Lampião era um gênio militar de insuperável estratégia”.

Tenente Luiz mariano.

M

– “Lampião era uma raposa de sagacidade atraindo o adversário para os piores campos de combates”.

tenente luiz mariano.

M

– “o chefe das volantes alagoanas, ao ser atacado por Lampião não quis acreditar que fosse ele o comandante é por alguma alta patente ou oficial egresso do exército!”.

josé luCena de alBuquerque maranhão (o matador do pai de Lampião).

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30 José Geraldo aguiar

o General do exército, perseguidor de Lampião na Bahia:

– “Lampião tinha o espírito de napoleão, inclusive porque depois das vitórias, gostava da publicidade.”

General liBerto de Carvalho.

M

– “Lampião tinha tática especial de despistamento, nunca se deixando pegar de surpresa”.

Coronel manoel neto.

M

– “persegui Lampião durante 10 anos e sei quanto era valente e astucioso.”

CaPitão arlindo roCha.

M

– “Lampião era um redemoinho de valentia e coragem, perigoso de se enfrentar e arrasando tudo por onde passava”.

tenente lero ChiCo.

M

– “a grande periculosidade de Lampião era a sua incrível mobilidade”.

Coronel hiGino josé Belarmino.

(obra citada, páginas 65,67 e 201)

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Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes 31

Lampião expressa seu sentimento

– “mas, o destino impiedoso, foi cruel para comigo.e a sorte caprichosame impôs esse castigo.Quando eu não esperava nem em tal coisa pensavaTinha terrível inimigo!

– meu rifle atira cantando em compasso assustador.Faz gosto brigar comigoporque sou bom cantador.em quanto meu rifle trabalhaminha voz por longe se espalha.Zombando do próprio horror!

– a vida é como um segredo,o mundo um cruel degredoonde um mistério se encerra...”.

“versos de Lampião”

(obra citada, páginas 138,145 e 150)

a fama é como a calúnia, depois de feita, falsa ou verdadeira se alastra com facilidade.

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pelas referências, pela colaboração, pelo incentivo, pelas informações, agradeço a:

alagoas:Dr. Weber almeida.

Bahia:Jackson Rubens, autor de irecê, um pedaço histórico

da Bahia.

ceará:– Fortaleza: Ângelo osmiro Barreto, escritor.– Juazeiro do norte: João Ferreira da Silva (João

peitudo), filho de Lampião; Hamurabi Batista, artista plástico e presidente da Fundação memorial padre cícero de Juazeiro; mozar de castro Silva, historiador; Rubens Ferreira, filho de João peitudo; Luíza Tomaz.

Distrito Federal:Dr. avay miranda, Dr. maurílio dos Santos vieira e

Dr. eduardo de almeida Reis.

minas Gerais:José Teixeira mendonça de assunção (antropólogo),

primeiro revisor; Diogo mesquita maia (jornalista), segundo revisor; a todos os meus irmãos, sobrinhos e cunhados, Dr. Sebastião dos Santos vieira, alberto dos Reis assunção (escritor), ex-prefeito de São Francisco

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34 José Geraldo aguiar

Severino Gonçalves da Silva, Fernando Rodrigues da Silva, vagner Barbosa, antônio Geraldo antunes, maria cleide marques Ribeiro, Dr. Francisco Rafael miranda de Figueiredo, adson Lima cavalcante (digitador).

pernambuco:– Recife: José alves Sobrinho, autor de Lampião e

Zé Saturnino.– Serra Talhada: Grupo de Xaxado cabras de

Lampião.

Rio Grande do norte:– mossoró: Dr. paulo medeiros Gastão, escritor e ex-

presidente da Sociedade Brasileira de estudo do cangaço; Kidelmir Dantas, atual presidente da SBec.

– natal: Duarte da costa, escritor.

São paulo:Dr. Humberto augusto calligaris e Willian França,

jornalista da Folha de São paulo.

e principalmente aos personagens cujos depoi-mentos integram esta obra e a fundamentam de modo incontestável.

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Lampião, o invencível: duas vidas, duas mortes 35

Lampião, de angico a Buritis

nos idos, de 1938, o capitão virgulino abandonou definitivamente o cangaço e as regiões rochosas,

montanhosas e secas, as altas temperaturas e o clima semiárido das caatingas do Sertão nordestino.

Safou-se passando por morto.De onde estava, alcançou a cachoeira de paulo

afonso. Dali, percorrendo as margens do grande rio São Francisco, atravessou a Bahia e grande parte do estado de minas Gerais, até a cidade de pirapora. De lá, alcançou o estado de Goiás, onde se tornou conhecido com o nome de João mangabeira. posteriormente, trocou Goiás por minas Gerais, fixando residência no município de São Francisco, na margem esquerda do rio, chegando a possuir cerca de mil alqueires de terra, em direção à planície urucuiana, de águas fartas, com densa vegetação e temperaturas variadas, cujo clima tropical registra 26ºc em média.

curioso que a vida do famigerado cangaceiro e a maior parte de suas façanhas no nordeste brasileiro se deram sempre nas bordas direita e esquerda do rio São Francisco.

ao norte de minas Gerais, lugar que escolheu para viver na clandestinidade como fazendeiro, encoberto por falsos nomes, o célebre capitão virgulino chegou em 1950, no dia 28 de fevereiro, doze anos após a farsa armada em angico.

Lampião deixou o município de São Francisco sete meses antes da sua morte, ocorrida em 3 de agosto de 1993, às três horas da manhã, no município de Buritis

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de minas. Tinha 96 anos de idade e estava ao lado da sua última companheira, Severina alves de moraes.

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capítulo i Fatos e suspeitas

o exame

Lampião e antônio maria da conceição: semelhanças, segundo exame comparativo de fotos

O IML (Instituto Médico Legal) de Brasília-DF concluiu ontem um exame comparativos de fotos, revelando que

há várias semelhanças entre Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e o fazendeiro enterrado em Buritis (MG), em 1993, diz texto do jornal Folha de São paulo de 15 de novembro de 1996.

O exame, feito com duas fotos de Lampião, uma com 40 anos e outra com 29 anos, e outra do fazendeiro, supostamente Lampião [aos 90 anos] tirada pelo autor, aponta três semelhanças: a coincidência do olho direito com a pálpebra caída – uma das características mais marcantes de Lampião –, o mesmo formato da silhueta do rosto e uma pequena depressão na sobrancelha esquerda.

a reportagem diz ainda: o exame, tecnicamente conhecido como prosopométrico (de comparação de

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medidas da estrutura do rosto, mediante comparação fotográfica), foi complementado ainda com uma simulação de regressão em computação gráfica. Por essa simulação, o computador ‘envelhece’ ou ‘rejuvenesce’ a pessoa com base em suas características principais.

A coincidência entre o rosto de Lampião e o do fazendeiro foi muito forte quando feita essa regressão, quase exata, disse Dr. Eduardo Reis (presidente do IML).

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Suspeitas

a cabeça daquele que seria Lampião, morto com outros cangaceiros em angico. Reprodução do autor, do livro Lampião,

o rei dos cangaceiros

o engenheiro alagoano Weber de almeida, ex-professor da Universidade Federal de Lavras–mG, foi vizinho

da família do cangaceiro corisco, na vila de Bananal, município de viçosa. presenciou muitas vezes a chegada do Diabo Loiro à casa, onde aparecia sempre no final de ano.

em 1938, aos 18 anos, Dr. Weber estudava em Recife, cursando o segundo ano complementar de pré-engenharia. no final de julho daquele ano, ele recebeu um convite do amigo e jornalista José osvaldo de Souza para acompanhá-lo em uma reportagem para o Diário de pernambuco. era em Sergipe e sobre a morte de Lampião. o repórter e o amigo estavam prontos para a partida, quando receberam a notícia de que as cabeças-troféu dos cangaceiros já estavam seguindo para piranhas, em alagoas.

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ali encontraram uma verdadeira multidão ao redor da praça pública, nos limites fixados pela polícia com densas cordas. no centro, havia sido construída uma espécie de palanque, com alguns degraus de tábuas, onde seriam colocados os troféus macabros, que foram expostos na frente da prefeitura.

Um caminhão surgiu, aproximando-se da praça. a polícia militar ultrapassara os limites das cordas e estacionou rente aos degraus. Da carroceria do caminhão, foram tiradas diversas latas de querosene e colocadas no chão: cada uma delas trazia, em sal grosso e vinagre, a cabeça de um ser humano. Uma a uma elas foram tiradas e colocadas nos degraus. a polícia disse que as cabeças pertenciam aos cangaceiros.

o acadêmico Weber e o amigo osvaldo assistiram a tudo. a polícia não deixou que o público se aproximasse – o mau cheiro também impedia isso. Dr. Weber confessa que naquele dia não foi capaz de identificar a fisionomia de ninguém e nunca poderá afirmar, com convicção, que ali estava mesmo a cabeça da cangaceira maria Bonita, e muito menos do célebre capitão virgulino.

a multidão se afastou do local, cheia de dúvidas, mas por respeito à polícia e às autoridades calou-se. o Dr. Weber se lembra de que naquele tempo corria a notícia de que Lampião havia feito sua despedida, para abandonar o cangaço.

– “chegamos à conclusão de que o que houve em angico, realmente, foi a despedida de Lampião, maria Bonita e seus sequazes, uma festa em que usaram muita bebida cara, inclusive champanhe e uísque importado”.