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Prefácio Embaixador António Martins da Cruz EDIÇÕES SÍLABO LABIRINTOS MUNDIAIS SEBASTIÃO MARTINS MUNDIAIS LABIRINTOS As revoluções pós-modernas e os caminhos da incerteza global Posfácio General Loureiro dos Santos

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Labirintos Mundiais: As Revoluções Pós--Modernas e os Caminhos da IncertezaGlobal surge proficuamente num momentoem que a democratização dos meios deacesso à tomada de poder e as «rela-ções diplomáticas, económicas e militares,nas quais circulam agentes com inte-resses diversos, por vezes antagónicos,em muitas ocasiões cruzados», permitemvagas de aparente contestação ou apoioa medidas, actos pontuais ou políticasestruturais por parte dos actores políticos.

, no seu modelo de aná-lise, aplica à realidade de alguns países aTeoria da Estratégia com a narração das«Revoluções Coloridas» e das «Primave-ras Árabes», detecta indícios de umaameaça à Segurança Nacional na Repú-blica de Angola, corporizada na eventualocorrência de uma alegada «PrimaveraAngolana» e sugere como o Governo,estrategicamente, deverá responder.

Reflectindo sobre a adequação e a eficá-cia das medidas neutralizadoras dos ale-gados movimentos subversivos, haveráuma real ameaça dos ditos movimentoscontestatários com aspirações a uma«Primavera Angolana»?

Sebastião Martins

Prefácio

Embaixador António Martins da Cruz

EDIÇÕES SÍLABO

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S E B A S T I Ã O M A RT I N S

Sebastião José António Martins nasceuem Angola, em 1961. Especializou-se em Estra-tégia, no Instituto Superior de Ciências Sociaise Políticas, da Universidade de Lisboa, coma dissertação de mestrado

.

Bacharel em Economia, licenciado em Gestão,pós-graduado em Segurança Nacional e emGestão aplicada às Administrações Públicas,é, também, diplomado em Altos Estudos Inter-nacionais.

Actualmente, frequenta o doutoramento emCiência Política.

Em Angola, foi Chefe do Serviço de Inteli-gência e de Segurança de Estado, Ministrodo Interior, Director-Geral do Serviço de Infor-mações e Vice-Ministro do Interior.

Exerceu funções de Director Nacional de Pla-neamento e Finanças do Ministério do Inte-rior e do Comando-Geral da Polícia Nacional,e de Direcção e Chefia ao serviço do Minis-tério da Segurança de Estado.

Nos anos 80, integrou as FAPLA (ForçasArmadas Angolanas), atingindo a patente deTenente-Coronel.

Em 1995, foi transferido em comissão de ser-viço para o Ministério do Interior/Polícia Nacio-nal, onde fez carreira, alcançando a patentede Comissário-Chefe que mantém actualmente.

A Subversão Polí-tica e a Revolução: Cenários Globais e a Pers-pectiva Angolana

MUNDIAISLABIRINTOS

As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

«Com a sua experiência nos domínios político, militar,da segurança e da gestão, o Mestre Sebastião Martins analisa

situações, traça paralelismos com outras latitudes,procura explicações e antecipa cenários.»

Embaixador António Martins da CruzAntigo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal

«Sebastião Martins escalpeliza a problemática das iniciativasnão violentas para atingir objectivos políticos, que não conseguem

sem antes passarem por períodos por vezes longosde grande violência e conduzem com frequência

a situações inesperadas e caóticas.»

General Loureiro dos SantosEx-Chefe do Estado-Maior do Exército e Antigo Ministro da Defesa Nacional

«Chamo a este texto a ciência do poder e, em particular, a matrizde análise ao fenómeno da mudança social e política, na linha

do proposto por Norberto Bobbio, em [...].»Teoria Geral da Política

Professor Doutor Manuel MeirinhoProfessor Catedrático de Ciência Política e Presidente do ISCSP

«O livro é, pois, de grande actualidade e interesse geopolítico egeoestratégico, não apenas para Angola, mas para vários países

africanos, com particular destaque para os da África Austral.»

Professor Doutor Paulo de CarvalhoSociólogo e Professor Titular na Universidade Agostinho Neto

MUNDIAISLABIRINTOS

As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

MUNDIAISLABIRINTOS

As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

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Posfácio

General Loureiro dos Santos

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LABIRINTOS

MUNDIAIS

As revoluções pós-modernas

e os caminhos da incerteza global

SEBASTIÃO MARTINS

EDIÇÕES SÍLABO

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É expressamente proibido reproduzir, no todo ou em parte, sob qualquer forma

ou meio, NOMEADAMENTE FOTOCÓPIA, esta obra. As transgressões

serão passíveis das penalizações previstas na legislação em vigor.

Visite a Sílabo na rede

www.silabo.pt

Editor: Manuel Robalo

FICHA TÉCNICA

Título: Labirintos Mundiais – As revoluções pós-modernas

e os caminhos da incerteza global Autor: Sebastião Martins 1.ª Edição – Lisboa, Junho de 2015.

Impressão e acabamentos: Cafilesa – Soluções Gráficas, Lda.

Depósito Legal: 394181/15 ISBN: 978-972-618-804-9

EDIÇÕES SÍLABO, LDA.

R. Cidade de Manchester, 2

1170-100 Lisboa

Telf.: 218130345

Fax: 218166719

e-mail: [email protected]

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Índice

Agradecimentos 13

Prefácio 15

Comentários à obra 19

Introdução 25

Objectivos 30 Metodologia 31 Questão de partida 33

Parte I

Estratégia: deserto intelectual ou oásis

da pragmática?

Capítulo I – A subversão e a revolução no quadro da estratégia

e da pós-modernidade

1. Estratégia: subsídios para a definição de um conceito em pós-modernização 39

2. Conflito, subversão e revolução: abordagem crítica à história e à prática 44 2.1. O conflito e a coacção 45 2.2. A subversão 46

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2.3. A revolução 50

3. O processo estratégico: um olhar de relance sobre os elementos essenciais 54

Parte II

«Revoluções Coloridas» e «Primaveras Árabes»:

crónica e análise estratégica

Capítulo I – Os sistemas estratégicos das superpotências: a interacção estratégica e a actuação das superpotências

1. O fenómeno da profissionalização revolucionária 59

Capítulo II – «Revoluções Coloridas» e «Primaveras Árabes»

1. «Revoluções Coloridas» 65 2. Pretensas «Revoluções Coloridas» 67 3. Revoltas da «Primavera Árabe» 68

Parte III

Perspectivas estratégicas dos vários contendores

Capítulo I – Revolução vs. orquestração: análise de uma realidade perene

1. Interlúdio: revolução vs. orquestração e o discurso do acontecimento 82

2. Contendores e governos: posicionamento e estratégias 84 2.1. Contendores revolucionários 85 2.2. O papel das redes sociais 89

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3. A perspectiva estratégica dos Estados alvo dos movimentos revolucionários 91

4. A comunidade internacional 92 4.1. Estados Unidos da América: a potência imperial

em contenção 95 4.2. China: coexistência e potencial liderança futura 99 4.3. Rússia: alianças e bloqueios em busca de estatuto 100 4.4. União Europeia: o trunfo da diplomacia, a ferida

da realpolitik 102

5. Avaliação dos resultados das «Revoluções Coloridas» e das «Primaveras Árabes» 107

Parte IV

Geopolítica africana

Capítulo I – O continente africano e a tempestade política perene

1. Religião, democracia, revolução e terrorismo 114 2. O «travão» subsariano 118

Parte V

O caso Angolano

Capítulo I – O caso Angolano

1. A posição geopolítica da República de Angola 121 2. Caracterização do Estado Angolano 129

2.1. Breve contextualização histórica – séculos XX e XXI 130 2.2. A organização do Estado na República de Angola 133 2.3. Poder Executivo 135

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2.4. Poder Legislativo 138 2.5. Poder Judicial 142

3. A actual política do Executivo 143 3.1. Plano Nacional de Desenvolvimento 145 3.2. Políticas nacionais de desenvolvimento e respectivas

reformas estruturais 147 3.2.1. Política de população 148 3.2.2. Modernização do sistema de defesa

e segurança nacional 149 3.2.3. Política de apoio à reintegração socioeconómica

de ex-militares 149 3.2.4. Política de estabilidade e regulação macroeconómica 150 3.2.5. Política de reforma tributária e das finanças públicas 150 3.2.6. Política de promoção do crescimento económico,

do aumento do emprego e de diversificação económica 152 3.2.7. Política de repartição equitativa do rendimento

nacional e de protecção social 153 3.2.8. Política de modernização da administração

e gestão públicas 153 3.2.9. Política integrada para a juventude 155

3.2.10. Política de promoção do desenvolvimento

equilibrado do território 155 3.2.11. Política de reforço do posicionamento de Angola

no contexto internacional e regional, em particular

na União Africana e na SADC 156

3.3. Concretização prática das políticas nacionais 157 3.3.1. Sector Económico 158 3.3.2. Sector das Infra-Estruturas 160 3.3.3. Sector Social 161 3.3.4. Sector Institucional 165

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4. A relação do Estado com o cidadão 171 4.1. Discurso na Abertura da IV Sessão Legislativa

da Assembleia Nacional (Luanda, 18 de Outubro de 2011) 172 4.2. Discurso por ocasião da investidura de José Eduardo

do Santos como Presidente da República de Angola (Luanda, 26 de Setembro de 2012) 178

4.3. Entrevista a José Eduardo do Santos concedida

à estação de televisão portuguesa SIC

(Luanda, 3 de Junho de 2013) 181 4.4. Discurso do Presidente da República José Eduardo

dos Santos na Cimeira de Chefes de Estado

e de Governo do Comité da Conferência Internacional da Região dos Grandes Lagos

(Luanda, 25 de Março de 2014) 186 4.5. Discurso do Presidente da República

José Eduardo dos Santos sobre o Estado da Nação (Luanda, 15 de Outubro de 2014) 187

4.6. Discurso do Presidente da República

José Eduardo dos Santos na 31.ª Reunião do Conselho da República (Luanda, 10 de Fevereiro de 2015) 188

5. O poder político 189 6. Condições para realização de uma «Primavera Angolana» 192

6.1. Da aspiração à «Primavera Angolana» 193 6.2. Do perfil dos activistas 194 6.3. Da perspectiva político-estratégica dos movimentos

contestatários 197 6.4. Da capacidade de mobilização 199 6.5. Do tipo de conflito 200 6.6. Considerações gerais da operacionalização

do objectivo político subversivo 202 6.7. Considerações finais 205

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6.8. Da perspectiva político-estratégica do governo 207 6.8.1. Objectivos teleológicos do Estado e respectiva ameaça 207 6.8.2. Modelo de acção estratégica 210

6.9. Considerações gerais relativas à execução estratégica 214

Conclusões 223

Posfácio 229

Referências bibliográficas 233

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Dedico este trabalho aos meus netos, Ivano, Kyara e

Ian, meus tesouros e pilares do meu amanhã, com a

esperança de lhes deixar uma reflexão e uma expecta-

tiva de um mundo melhor.

Dedico-o, também, à Rosa Martins, minha mulher e

grande amiga, sempre presente na minha vida, pela

cumplicidade, companheirismo e apoio incondicional,

marca importante de carácter e determinação.

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Agradecimentos

Agradeço, em primeiro lugar, a Deus por iluminar bondosamente

todos os meus caminhos. O que seria de mim sem a Fé que tenho em

Vós, meu Senhor?

Ao Professor Doutor António Manuel Silva Ribeiro, nosso orienta-

dor e jurado, mestre que desde a primeira hora, em Angola, nos incentivou e fez sonhar, amigo que tão bem nos acolheu em Portugal,

pela sabedoria, estímulo e por acreditar na realização deste trabalho.

Aos Senhores Professores Doutores António Sousa Lara e Heitor

Romana, também jurados do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, por todo o apoio e incentivo

demonstrados durante a prova e pelo debate doutrinal que proporcio-

naram.

À minha família, aos meus filhos, Sérgio, Yannick e Jacqueline e,

em especial, à minha mulher, Rosa Martins, pelo incentivo e força, e a

quem tantas vezes deixei para me dedicar por inteiro a este trabalho.

Aos colegas de trabalho e amigos que, pela sua generosidade e dis-

ponibilidade, nos apoiaram nas pesquisas e na discussão dos temas,

nunca permitindo que fraquejássemos na elaboração e finalização

deste trabalho.

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Prefácio

Provavelmente daqui a 30 ou 40 anos os historiadores chegarão à

conclusão de que a Idade Contemporânea acabou entre 1989 e 2007 –

entre a queda do Muro de Berlim e a queda do Lehman Brothers – e,

sem termos noção disso, estaríamos já a viver outra era, como Fabrí-cio, o personagem que Stendhal criou n’A Cartuxa de Parma, que per-

corre Waterloo durante a batalha que acabou com o Império de

Napoleão sem se aperceber do que se passava.

Curiosamente todas as épocas, em que nos ensinaram na escola a dividir a História, terminam em quedas: a queda de Roma, a queda de

Constantinopla, a queda da Bastilha. Deve ser uma lei da gravidade

histórica. O Muro de Berlim ou o banco Lehman Brothers seriam mais

uma. Uma queda cujas consequências directas e indirectas ainda nos

influenciam.

São dois marcos essenciais para compreender o mundo em que

vivemos hoje, dominado por factores que se contagiam:

⎯ a instabilidade geopolítica e os riscos consequentes;

⎯ as crises económica, financeira, social e política que provavel-

mente se prolongarão ainda por mais alguns anos em diversos

continentes;

⎯ a descrença e o pessimismo generalizados da opinião pública

europeia e americana;

⎯ os ciclos rotativos de percepção optimista e negativa dos deci-

sores políticos e económicos nos últimos anos;

⎯ a descontinuidade das políticas na Europa: se olharmos para os

países da zona euro, todos os governos desde 2007 perderam as

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eleições, com excepção do governo da Senhora Merkel, que mesmo

assim perdeu uma coligação e foi forçada a aceitar outra;

⎯ a tensão criada com as chamadas «Primaveras Árabes» que em diversos casos, como a Líbia, obedeciam a agendas externas e

nem sempre visíveis;

⎯ o tempo, que deixou de ser um factor controlável no que à polí-

tica internacional diz respeito;

⎯ a multiplicação de actores, na África, na América Latina e na

Ásia, que dificulta os perímetros de afirmação externa dos países;

⎯ a afirmação progressiva de sistemas de segurança regionais em

detrimento de respostas globais;

⎯ a geometria variável dos blocos, com abordagens que deixaram

de ser ideológicas e assumiram contornos estratégicos, prag-

máticos, económicos, afirmando geografias e cultivando alianças;

⎯ a ambiguidade de algumas intervenções, internas ou externas,

aproveitando emoções populares, classificações apressadas ou

desafios contraditórios.

A todos estes elementos há que juntar a aceleração da globaliza-

ção, a desregulamentação que trouxe e o facto de esta mesma globali-

zação ter significados distintos para políticos, militares, estrategas ou

empresários, conforme a região onde estão ou onde querem intervir.

Importa ainda ter em conta os novos pólos de poder que estrutu-ram e fragmentam a comunidade internacional. Não apenas no âmbito

geopolítico, mas também em função da revolução numérica trazida

pela internet e pelas redes sociais, que acrescentam a instantaneidade

às acções e às possíveis respostas.

Além disso, e embora a perenidade dos Estados não esteja em

causa, novos actores vieram acrescentar-se na vida internacional.

Hoje, além dos governos, existem outros actores a marcar a agenda

internacional: as organizações internacionais, sejam mundiais ou regionais, os mercados financeiros, os lobbies, os partidos políticos

internacionais, as empresas multinacionais, as organizações empresa-

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P R E F Á C I O 1 7

riais e sindicais, os meios de comunicação social, sobretudo via inter-

net, as organizações não-governamentais e as redes terroristas.

Todos estes factos estão a conduzir, porventura de modo imper-ceptível, a uma redistribuição dos poderes e das iniciativas, em simul-

tâneo com a afirmação assertiva crescente dos países emergentes e da

reconfiguração dos blocos em função das relações entre os mais fortes (Estados Unidos, China, Rússia e Europa). Esta redistribuição está a

ser desenhada em tempos de crise. O que se traduz, por vezes, em

reacções das opiniões públicas ou das opiniões publicadas, que nem

sempre são consequentes com as decisões.

O futuro em termos de prospectiva política é imprevisível, mas depende de factores que são possíveis. Para as situações que vivemos,

múltiplas e diversas, as respostas dependem da capacidade de anteci-

pação das alianças e das acções a empreender para alcançar os objecti-

vos. Em política, as margens de manobra variam conforme as cir-cunstâncias, as expectativas e a geografia. Por isso, os desafios nunca

são os mesmos, apesar de denominadores comuns que facilitam a

análise. Do mesmo modo que as ambições ou os objectivos condicio-

nam as decisões e a sua implementação.

Esta dicotomia entre a estratégia e a táctica, entre os fins e os

meios, é uma das principais valências do livro que temos entre mãos.

A dissertação de Mestrado do Comissário-Chefe Sebastião Martins

traz novos enquadramentos à visão conceptual e histórica da geopolí-tica e a sua aplicação a situações concretas, em África e sobretudo em

Angola, inventariando, de caminho, as perspectivas dos principais

actores da comunidade internacional, focando os diferentes ângulos estratégicos e os resultados das «Revoluções Coloridas» e das «Prima-

veras Árabes», num percurso pelas realidades políticas assimétricas e

complexas dos últimos anos, com as metamorfoses sempre contextua-

lizadas em sólido pano de fundo teórico.

A narrativa académica nunca se esgota em si mesma, dá lugar à desconstrução da realidade, nos casos de África e principalmente

Angola, e à análise lúcida das diferentes componentes daquela reali-

dade e das soluções propostas.

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Assistimos a alterações recentes de estratégias, em relação a

África, por parte dos principais actores internacionais, positivas e negativas, muitas vezes condicionadas pela procura de matérias-pri-

mas, de energia, de mercados e por alianças.

No plano externo, o regresso ao Conselho de Segurança das

Nações Unidas, a Presidência da Conferência Internacional para a Região dos Grandes Lagos, o protagonismo na Comissão do Golfo da

Guiné, o empenho nas missões de paz em África, a liderança no pro-

cesso do Kimberley e a visibilidade na OPEC são exemplos do pragma-

tismo com que Angola respondeu aos novos desafios a par com o reca-

librar das relações bilaterais com os parceiros estratégicos.

Para se afirmar como potência regional, com o sucesso dos últimos

anos, Angola teve, no plano interno, de construir a paz e criar condi-

ções políticas, sociais e económicas que estruturaram um projecto

próspero e consensual no âmbito nacional.

Com a sua experiência nos domínios político, militar, da segurança e da gestão, o Mestre Sebastião Martins analisa situações, traça para-

lelismos com outras latitudes, procura explicações e antecipa cenários.

Mesmo invocando que as suas conclusões «não se encontram

isentas de inquietações académicas» reflecte o pragmatismo de quem, com altas responsabilidades de Estado, muitas vezes teve de decidir

aliando um sólido enquadramento estratégico ao conhecimento da

realidade e à defesa dos interesses nacionais.

São todas estas as razões que tornam este estudo incontornável

para se conhecer a realidade angolana e se poderem antecipar linhas

de futuro.

Como dizia São Tomás de Aquino: «o estudioso é o que leva aos

outros a verdade que ele próprio encontrou».

António Martins da Cruz

Embaixador

Antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal

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Comentários à obra

Manuel Meirinho

Professor Catedrático de Ciência Política

Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (Lisboa, Portugal)

O problema das revoluções pós-modernas

Da necessidade de um modelo observante

A Universidade é o espaço, por excelência, para o estudo aturado

do fenómeno do poder. Foi neste espaço, no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas que o autor, Sebastião Martins, desenvol-

veu o trabalho seminal, em sede de dissertação de mestrado, que ori-

ginou o presente volume dedicado ao enquadramento teórico do estudo dos conflitos, à abordagem genérica a algumas das chamadas

«Revoluções Coloridas», centrando-se, depois, na análise da configu-

ração de uma possível «Primavera Angolana» e dos seus efeitos na

estabilidade do respectivo regime político.

O eixo analítico seguido pelo autor privilegia uma abordagem ao fenómeno contestatário das sociedades contemporâneas, alargado à

temática da subversão e da revolução, numa perspectiva da Estratégia.

Esta opção tem, como consequência, um olhar especialmente dedicado à forma como os regimes políticos compreendem, ou não, aqueles

fenómenos e, sobretudo, à forma como devem, no caso estudado, rea-

gir aos seus previsíveis efeitos.

Ainda que esta opção seja válida e que o autor releve já maturidade

analítica nos terrenos da Estratégia, cremos que a crescente emergên-cia de movimentos de contestação aos regimes, o grau de ameaça à sua

estabilidade e até mesmo a análise das estratégias reactivas a estes

movimentos por parte de quem governa podem beneficiar da adopção

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de um modelo observante que ajude a compreender melhor os funda-

mentos e a natureza destes novos actores sociais e políticos.

Ora, é aqui que o campo da Ciência Política, enquanto ciência-mãe da Estratégia, é especialmente adequado na determinação de modelos

observantes que ajudam a clarificar o seu objecto de estudo. Chamo a

este texto a ciência do poder e, em particular, a matriz de análise ao fenómeno da mudança social e política, na linha do proposto por Nor-

berto Bobbio, em Teoria Geral da Política, que evidencia, a propósito

das categorias de análise, a necessidade de distinguir claramente as

múltiplas formas que aquela mudança pode assumir. Por exemplo, é útil, quando se aborda o problema da revolução, que se distingam as

categorias de análise referentes a fenómenos como a insurreição, a

rebelião, a contestação e a revolta. É que, ainda que todas façam parte do processo de mudança política, a sua natureza e os seus efeitos nos

regimes são muito diferentes.

Em complemento à análise do autor, o enquadramento do estudo

no âmbito da teoria dos novos movimentos sociais poderá beneficiar a

reflexão futura e, sobretudo, a compreensão mais ampla e aturada do

problema que constitui o objecto de análise.

A abordagem dos novos movimentos sociais constitui uma área de

forte desenvolvimento teórico e empírico na Ciência Política, benefi-

ciando, por exemplo, da revisão crítica às famosas teses do apazigua-

mento ideológico, na esteira de Daniel Bell e Raymond Aron e do «fim da História» tão caro a Francis Fukuyama. Nesta revisão encontramos

novas abordagens, como a da repolitização da sociedade civil (por via

da transformação de ideologias), o surgimento de novas clivagens, o aumento do mapa de recursos para a acção política, a emergência das

formas de participação não convencionais e o aumento da capacidade

de mobilização dos cidadãos por via da «revolução» no panorama

mediático e tecnológico.

Tudo isto somado, nos termos de um dos mais eminentes estudiosos destes fenómenos, Claus Offe, terá levado a uma redução drástica da

capacidade de resposta dos regimes políticos a muitas mudanças recla-

madas pela sociedade civil: vagas de democratização, mudanças na

classe política e novos direitos sociais, políticos e de terceira geração, etc.

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C O M E N T Á R I O S À O B R A 2 1

A teoria sistémica, por via de David Easton, já tinha alertado para

o problema da sobrecarga dos sistemas políticos, decorrente de apoios

e exigências (em volume e complexidade) emitidos pelos cidadãos e

não respondidos pelas instituições de governo. O alerta de Easton, e de

muitos outros seguidores, foi para a necessidade de os sistemas políti-

cos ajustarem a sua acção em face da demanda social e política, man-

tendo o equilíbrio do seu funcionamento. No limite, a tensão provo-

cada pela resposta demorada ou mesmo pela incapacidade de resposta

às exigências e até por respostas desajustadas levaria a um desgaste

incontrolável dos sistemas políticos, onde podemos incluir o seu colapso.

Não é, pois, novo para a Ciência Política o mapa analítico da cha-

mada emergência e mobilização da sociedade civil no mundo contem-

porâneo, de que são exemplo as «Revoluções Coloridas» mencionadas

pelo autor. Na última década do século XX emerge na Ciência Política

a preocupação com o estudo dos novos movimentos sociais, que

incluiu olhares sobre a repolitização da sociedade, confirmando os

efeitos previstos na teoria sistémica, nomeadamente, na já referida

estabilidade dos sistemas políticos, na reconfiguração dos partidos, no

processo de tomada de decisão política e na relação dos grupos de

interesses e de pressão com o poder. No fundo, a tese da repolitização,

e mesmo a da politização, surge como pano de fundo para compreen-

der os novos desafios que os movimentos sociais colocam à organiza-

ção política das sociedades modernas, mas, sobretudo, ao modo de

funcionamento das várias fórmulas de estruturação do poder nos

diversos países.

A contribuição da Ciência Política nesta área é vastíssima. Refira-

-se, em síntese, os trabalhos de Donatella Della Porta, Charles Tilly e

Neil Smelser, na operacionalização do conceito de novo movimento

social, bem como a interessante análise de Klandermans sobre a nova

vaga de ciclos de protesto nas sociedades contemporâneas.

É muito importante, como mapa conceptual, a abordagem às cor-

rentes clássicas dos novos movimentos sociais, com a revisão das teo-

rias do comportamento colectivo, das tensões estruturais, das teorias do

conflito e da sociedade de massas que recuperam Pareto e Michels,

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Parsons, Weber e Dahrendorf, Merton e Kornhauser. A esta revisão

junta-se o contributo da abordagem contemporânea, com especial

destaque para as teorias da acção colectiva, da mobilização colectiva e

da estrutura de oportunidades, com os trabalhos de Olson, Tullock,

Tilly e Kriesi.

No conjunto, estas abordagens fornecem instrumentos muito úteis

para a análise de aspectos, como os factores individuais e estruturais

que incidem sobre a mobilização dos cidadãos (individual e colectiva-

mente) e dos efeitos do processo de modernização social (orientações

ideológicas, mudança de valores e estrutura de oportunidades políti-

cas) no processo político.

Noutro plano, estes contributos são importantes para a compreen-

são de algumas das vertentes mais significativas desta área de estudos

da Ciência Política: as condições para a formação dos novos movi-

mentos sociais, o estudo dos processos de mobilização e, não menos

importante, o estudo dos factores de sucesso da sua acção.

É precisamente neste plano que temas como: as condições políti-

cas (oportunidades e constrangimentos) num determinado regime; o

desenvolvimento de estruturas orientadas para a mobilização política

e mesmo para a sua representação; o nível de institucionalização e de

radicalização dos movimentos; bem como o seu rendimento (grau de

êxito político) entroncam no estudo de Sebastião Martins.

Regressemos ao início e à necessidade de modelos observantes. Os

novos movimentos sociais colocam, inevitavelmente, desafios espera-

dos e inesperados às democracias (a todas as democracias), que tanto

podem materializar-se em modificações circunstanciais ao modo do

seu funcionamento como levar a mudanças profundas na estrutura

dos regimes políticos.

Por isso, o estudo das estratégias de acção dos governos para lida-

rem com estes desafios pode beneficiar de uma reflexão prévia dirigida

à compreensão profunda dos novos movimentos sociais, enquanto

modelo observante, para entender um dos fenómenos mais imprevisí-

veis das sociedades modernas.

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C O M E N T Á R I O S À O B R A 2 3

Paulo de Carvalho

Sociólogo

Professor Titular na Universidade Agostinho Neto (Luanda, Angola)

Neste seu primeiro livro, Sebastião Martins aborda um assunto actual que diz respeito às sociedades africanas em geral e à sociedade angolana em particular: as revoluções conhecidas pela designação «Primavera Árabe», que ocorreram nesta década em vários países árabes e provocaram sérias mudanças ao nível dos respectivos siste-mas políticos e da estratificação social.

A intenção dos defensores desta autoproclamada «acção liberta-dora» (incluindo alguns dos principais opositores de governantes afri-canos) era a difusão deste tipo de manifestação violenta, com derrube dos líderes políticos, um pouco por todo o continente africano, num claro atentado às regras democráticas. Nos seus argumentos a favor desta opção, esquecem-se de que o direito constitucional à manifestação não pode ser utilizado como sinónimo de um suposto direito à subversão.

Mais a Sul, não vingou a ideia de difusão deste tipo de violência subversiva, seja devido à presença das instituições do Estado, seja devido à ausência de apoio popular, seja ainda por ausência de suporte por parte de Estados ocidentais – as duas últimas, condições indispen-sáveis para o sucesso destas iniciativas.

No caso Angolano, Sebastião Martins refere a ideia (que chegou a haver nalguns círculos subversivos) de uma «Primavera Angolana» com derrube do governo legítimo e alterações no regime político – mais como aspiração do que real ameaça, seja por falta de estruturação desses movimentos embrionários seja devido à ausência de apoio inter-nacional efectivo.

O livro é, pois, de grande actualidade e interesse geopolítico e geoestratégico, não apenas para Angola, mas também para vários paí-ses africanos, com particular destaque para os da África Austral. O conhecimento factual e a vivência política do autor contribuem para a avaliação positiva que se tem a fazer do livro e para a sua importância para investigadores e estudantes das áreas da Ciência Política, da Sociologia Política, das Relações Internacionais e dos Estudos Militares.

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Introdução

«No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era

Deus» (João 1:1). A harmonia bíblica descrita no «Livro dos Livros» é

hoje uma recordação que vive da crença e uma aspiração que a Huma-

nidade, ou pelo menos parte significativa dela, gostaria de alcançar.

A harmonia original que o mito judaico-cristão gravou na crença histórica de muitos encontra-se hoje em face da inevitabilidade das

oposições, ou numa forma mais suave, na dialéctica entre forças mate-

riais e ideias.

Cidades, países, empresas multinacionais, partidos políticos, gru-pos de pressão convivem num mesmo «caldo» de interacções em que,

alternadamente, são aliados ou adversários, sem padrões definitivos e

com resultados, embora previsíveis em certa medida.

Na teia das relações diplomáticas, económicas e militares, circu-

lam agentes com interesses diversos, por vezes antagónicos, em mui-tas ocasiões cruzados que esgrimam forças entre si, aliando-se contra

terceiros, de forma transversal, a Estados soberanos, a empresas e a

grupos étnicos, que constituem o seu ecossistema e objecto de acção.

O resultado desta interacção traduz-se numa tensão que, como

uma espécie de espectro, ensombra à vez e recorrentemente, certas partes do globo. Um espectro que, tendo elementos ideológicos, é

diverso na sua natureza; que não sendo ubíquo, tem a capacidade de

ser simultâneo, e que, tendo uma génese aparentemente política, é

bem mais vasto no seu alcance e profundidade.

A cidade, a polis, com a sua dinâmica agregadora de influências e mobi-

lizadora de multidões, é frequentemente palco de mudanças que afectam

toda a envolvente e, portanto, os países a que pertencem, os cidadãos

que albergam e a que servem de morada, ambiente cultural e abrigo.

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Na polis, como no país, entenda-se sobretudo, na nação, o avanço

da tecnologia e da organização político-administrativa e social dos Estados, das nações e dos movimentos políticos e sociais diversificou o

leque de opções bélicas e não bélicas de exercício do poder. E o acesso

às mesmas, por soberanos ou líderes eleitos, mas também por súbdi-

tos ou cidadãos, veio, de algum modo, a ser democratizado.

Com a democratização dos meios de acesso à tomada de poder, são

comuns as vagas de aparente contestação ou apoio a medidas, actos

pontuais ou políticas estruturais por parte dos actores políticos. Essas

vagas, que são vertidas em acções simbólicas, mediaticamente traba-lhadas, têm uma verdadeira influência nos discursos popular e político

sobre a realidade social. Na verdade, são ferramentas de construção

desse discurso e de construção social da realidade, como notam bem

os sociólogos Berger e Luckman (1988:40):

«A realidade da vida quotidiana, além disso, apresenta-se a mim como

um mundo intersubjectivo, um mundo de que participo junto com

outros homens. Esta intersubjectividade diferencia nitidamente a vida

quotidiana de outras realidades das quais tenho consciência.»

Este caldo tecnocientífico e político, à luz da intersubjectividade da

realidade quotidiana, favorece a existência de um mundo de partilha e

opinião, mas também, naturalmente, de discórdia, debate e poten-cialmente, quando numa escala macro, a eclosão de conflitos, por todo

o globo ou na concepção de Johan Galtung (1969), revista por Rams-

botham, Woodhouse e Miall (2011:30), ocorre «a persecução de

objectivos incompatíveis por diferentes grupos».

Porém, mais do que apenas uma situação conceptual, política e académica, trata-se de um conjunto de mudanças profundas, produto

da interacção entre Estado e contendores, em que se joga o futuro de

cada Estado e a própria prevalência ou a emergência do Estado de

Direito. Em cada caso, trata-se, bem entendido, de um uso da Estraté-gia (Ribeiro, 2010:22) enquanto «(A) ciência e a arte de edificar, dis-

por e empregar meios de coacção num dado meio e tempo, para se

materializarem objectivos fixados pela política, superando problemas

e explorando eventualidades em ambiente de desacordo».

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I N T R O D U Ç Ã O 2 7

Ora, uma abordagem séria e responsável no âmbito da Estratégia

deve escolher bem o seu objecto de trabalho, assim como a metodolo-gia adequada ao mesmo. Nessa medida, foi efectuada uma selecção de

autores que, em conjunto com o raciocínio de quem escreve, confere

mais solidez e apoio científico ao trabalho erguido. A esta situação não é alheio o facto de este volume consistir numa adaptação, abreviada

em alguns aspectos, expandida noutros, adaptada no caso de outros

ainda, da dissertação para a obtenção do grau de mestre em Estratégia

defendida no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Uni-versidade de Lisboa, em Portugal, e cuja receptividade gerou no autor

o ensejo de poder levar mais longe a investigação destas temáticas,

assim como o caminho que elas abrem.

O tema escolhido permanece o mesmo. Um trio de processos, acontecimentos, aspirações revolucionárias ou revoluções consuma-

das, ocorridas ou ambicionadas, ao longo dos últimos 15 anos: as

«Revoluções Coloridas», que rebentaram na Europa e no Médio

Oriente, no início do século XXI, e já em anos mais próximos, a «Pri-mavera Árabe»; adicionalmente, a alegada aspiração de alguns ele-

mentos da sociedade angolana a uma «Primavera Angolana» e a reac-

ção governamental aos seus actos.

Esta temática tripartida inspira, ao longo do trabalho, um modelo

de análise aplicável ao rumo das mudanças políticas de fundo nos regimes políticos. Esse modelo, que surge implícito e decorre da

metodologia dedutiva utilizada, será tornado mais explícito nas con-

clusões, de modo a lançar as sementes para uma pesquisa futura mais

aprofundada.

O volume que se apresenta é um trabalho de pesquisa assente em

cinco grandes partes, que se resumem de seguida.

A primeira parte da obra é dedicada à contextualização e ao

enquadramento teórico, que situam o leitor no campo do conheci-

mento da Estratégia, no estudo dos conflitos e da sua tendente pós- -modernização. Os conceitos básicos formam uma primeira vertente

estudada nesta parte, sendo explorada a abordagem do investigador e

a forma como este pode analisar e classificar os fenómenos que observa. A evolução da Teoria Geral da Estratégia, em concomitância

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com o seu objecto de estudo, inserido num mundo cada vez mais reti-

cular, desterritorializado e aparentemente pós-moderno, é o caminho

que se segue depois.

Na segunda parte, dedicada aos fenómenos das «Revoluções Colo-

ridas» e das «Primaveras Árabes», procura passar-se em revista o

essencial de cada situação, nos países envolvidos. Sendo este um texto que pretende ser sistemático, optou-se por abreviar o relato de cada

situação nacional até à medida mais adequada para uma compreensão

essencialista, mas não demasiado focada nos factos históricos. A

escolha efectuada deriva da necessidade de se ter a noção operacional de cada situação e que, em simultâneo, é estimulada por duas outras

situações: tratando-se de fenómenos muito recentes, o seu tratamento

mediático fornece uma fonte de conhecimento bastante menos con-sensual ou rigorosa do que aquela que a História trabalhará, a seu

tempo; adicionalmente, há uma actualização constante de aconteci-

mentos que, não podendo esta obra seguir, deve ficar cristalizada de

um modo que permita uma maior durabilidade da sua análise.

De seguida, na terceira parte, analisam-se as perspectivas estratégi-cas dos vários contendores – revolucionários e Governos – nas revolu-

ções, assim como aquelas que não chegaram a ser. A comunidade inter-

nacional e a sua influência não são esquecidas, sendo encaradas como

players activos no tabuleiro geoestratégico de cada um dos cenários analisados, mas observados numa perspectiva singular e, depois, agre-

gada, mais focada na sua influência global e nas relações entre si, bem

como na sua estratégia de interacção diplomática e militar.

A avaliação dos resultados destas revoluções é, naturalmente, o aspecto que remata o segmento do livro. Somando os resultados em

vários países, é possível configurar regularidades que, no seu con-

junto, forneçam pistas para compreender melhor as tendências e as

dinâmicas presentes em mudança de regime.

Na quarta parte, realiza-se uma breve abordagem à geopolítica africana e à sua aparente «tempestade política» perene, na qual a

República de Angola parece apresentar-se como excepção de estabili-

dade e de evolução sustentada.

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Labirintos Mundiais: As Revoluções Pós--Modernas e os Caminhos da IncertezaGlobal surge proficuamente num momentoem que a democratização dos meios deacesso à tomada de poder e as «rela-ções diplomáticas, económicas e militares,nas quais circulam agentes com inte-resses diversos, por vezes antagónicos,em muitas ocasiões cruzados», permitemvagas de aparente contestação ou apoioa medidas, actos pontuais ou políticasestruturais por parte dos actores políticos.

, no seu modelo de aná-lise, aplica à realidade de alguns países aTeoria da Estratégia com a narração das«Revoluções Coloridas» e das «Primave-ras Árabes», detecta indícios de umaameaça à Segurança Nacional na Repú-blica de Angola, corporizada na eventualocorrência de uma alegada «PrimaveraAngolana» e sugere como o Governo,estrategicamente, deverá responder.

Reflectindo sobre a adequação e a eficá-cia das medidas neutralizadoras dos ale-gados movimentos subversivos, haveráuma real ameaça dos ditos movimentoscontestatários com aspirações a uma«Primavera Angolana»?

Sebastião Martins

Prefácio

Embaixador António Martins da Cruz

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Sebastião José António Martins nasceuem Angola, em 1961. Especializou-se em Estra-tégia, no Instituto Superior de Ciências Sociaise Políticas, da Universidade de Lisboa, coma dissertação de mestrado

.

Bacharel em Economia, licenciado em Gestão,pós-graduado em Segurança Nacional e emGestão aplicada às Administrações Públicas,é, também, diplomado em Altos Estudos Inter-nacionais.

Actualmente, frequenta o doutoramento emCiência Política.

Em Angola, foi Chefe do Serviço de Inteli-gência e de Segurança de Estado, Ministrodo Interior, Director-Geral do Serviço de Infor-mações e Vice-Ministro do Interior.

Exerceu funções de Director Nacional de Pla-neamento e Finanças do Ministério do Inte-rior e do Comando-Geral da Polícia Nacional,e de Direcção e Chefia ao serviço do Minis-tério da Segurança de Estado.

Nos anos 80, integrou as FAPLA (ForçasArmadas Angolanas), atingindo a patente deTenente-Coronel.

Em 1995, foi transferido em comissão de ser-viço para o Ministério do Interior/Polícia Nacio-nal, onde fez carreira, alcançando a patentede Comissário-Chefe que mantém actualmente.

A Subversão Polí-tica e a Revolução: Cenários Globais e a Pers-pectiva Angolana

MUNDIAISLABIRINTOS

As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

«Com a sua experiência nos domínios político, militar,da segurança e da gestão, o Mestre Sebastião Martins analisa

situações, traça paralelismos com outras latitudes,procura explicações e antecipa cenários.»

Embaixador António Martins da CruzAntigo Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal

«Sebastião Martins escalpeliza a problemática das iniciativasnão violentas para atingir objectivos políticos, que não conseguem

sem antes passarem por períodos por vezes longosde grande violência e conduzem com frequência

a situações inesperadas e caóticas.»

General Loureiro dos SantosEx-Chefe do Estado-Maior do Exército e Antigo Ministro da Defesa Nacional

«Chamo a este texto a ciência do poder e, em particular, a matrizde análise ao fenómeno da mudança social e política, na linha

do proposto por Norberto Bobbio, em [...].»Teoria Geral da Política

Professor Doutor Manuel MeirinhoProfessor Catedrático de Ciência Política e Presidente do ISCSP

«O livro é, pois, de grande actualidade e interesse geopolítico egeoestratégico, não apenas para Angola, mas para vários países

africanos, com particular destaque para os da África Austral.»

Professor Doutor Paulo de CarvalhoSociólogo e Professor Titular na Universidade Agostinho Neto

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As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

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As revoluções pós-modernase os caminhos da incerteza global

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Posfácio

General Loureiro dos Santos