juventude e ditadura

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Juventudes e ditadura militar: As representações no cinema brasileiro contemporâneo Danielle Parfentieff de Noronha [email protected] NPPA / UFS Resumo Desde o início do golpe militar, em 1964, até os dias de hoje, a juventude do período foi representada por jornalistas, músicos, escritores e cineastas. O cinema brasileiro contemporâneo – que tem dado mais atenção aos jovens em suas temáticas – também retrata esta juventude em diversas produções que abordam o regime militar instaurado no país até 1985. A partir das pesquisas realizadas para a minha dissertação de mestrado, o presente artigo busca refletir algumas questões iniciais sobre quais são as representações que o cinema faz da juventude que viveu a transição ocorrida em 1968, com a implementação do AI-5, a partir da análise do filme Batismo de Sangue, de Helvécio Ratton. Palavras-chave: cinema, juventudes, ditadura, representações. Introdução As décadas de 1960 e 1970 foram períodos de transformações para a sociedade brasileira. A juventude da época foi protagonista de diversas mudanças culturais e comportamentais que ocorreram no país. A efervescência cultural, que iniciou nos anos 1960, trouxe à música brasileira as guitarras elétricas, os festivais, a tropicália e uma nova forma à MPB. No cinema buscava-se criar uma identidade, a partir de uma câmera na mão e uma ideia na cabeça 1 , com os movimentos do cinema novo e do cinema marginal. Outras áreas artísticas também estavam em ebulição e procuravam novas formas, como a literatura e o teatro. Além das novas possibilidades vivenciadas através da cultura, diversas mudanças de comportamento também foram inauguradas por jovens do período. Com uma certa influência do movimento hippie, parte dessa juventude vivia uma revolução sexual 2 . Diversos paradigmas da sociedade brasileira foram 1 Frase do diretor Paulo César Saraceni para definir uma nova forma de desafiar o cinema. 2 No livro 1968 – O ano que não terminou, Zuenir Ventura relata diversos casos de como os jovens vivam essa revolução sexual.

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Ditadura militar

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Page 1: Juventude e ditadura

Juventudes e ditadura militar: As representações no cinema brasileiro contemporâneo

Danielle Parfentieff de Noronha [email protected]

NPPA / UFS

Resumo

Desde o início do golpe militar, em 1964, até os dias de hoje, a juventude do período foi representada por

jornalistas, músicos, escritores e cineastas. O cinema brasileiro contemporâneo – que tem dado mais

atenção aos jovens em suas temáticas – também retrata esta juventude em diversas produções que

abordam o regime militar instaurado no país até 1985. A partir das pesquisas realizadas para a minha

dissertação de mestrado, o presente artigo busca refletir algumas questões iniciais sobre quais são as

representações que o cinema faz da juventude que viveu a transição ocorrida em 1968, com a

implementação do AI-5, a partir da análise do filme Batismo de Sangue, de Helvécio Ratton.

Palavras-chave: cinema, juventudes, ditadura, representações.

Introdução

As décadas de 1960 e 1970 foram períodos de transformações para a sociedade brasileira. A juventude da

época foi protagonista de diversas mudanças culturais e comportamentais que ocorreram no país. A

efervescência cultural, que iniciou nos anos 1960, trouxe à música brasileira as guitarras elétricas, os

festivais, a tropicália e uma nova forma à MPB. No cinema buscava-se criar uma identidade, a partir de

uma câmera na mão e uma ideia na cabeça1, com os movimentos do cinema novo e do cinema marginal.

Outras áreas artísticas também estavam em ebulição e procuravam novas formas, como a literatura e o

teatro.

Além das novas possibilidades vivenciadas através da cultura, diversas mudanças de comportamento

também foram inauguradas por jovens do período. Com uma certa influência do movimento hippie, parte

dessa juventude vivia uma revolução sexual2. Diversos paradigmas da sociedade brasileira foram

1 Frase do diretor Paulo César Saraceni para definir uma nova forma de desafiar o cinema. 2 No livro 1968 – O ano que não terminou, Zuenir Ventura relata diversos casos de como os jovens vivam essa revolução sexual.

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quebrados: mudava-se a forma de se vestir, a mulher agia diferente e novas ideias podiam ser

experimentadas. Os jovens também acompanharam o nascimento de uma velha conhecida da sociedade

atual: a televisão iniciava a sua carreira e começava a ocupar um pequeno espaço ao lado do tempo

dedicado à literatura e às outras artes.

Porém, não foi apenas no campo cultural e comportamental que os jovens da época acompanharam

transformações e tiveram a sua participação. As mudanças ocorridas na política do país durante o período

influenciaram parte dessa juventude a se posicionar diante dos novos rumos que o governo do país

tomava. A ditadura militar, instaurada no Brasil em 1964 até 1985, fez com que muitos jovens lutassem

contra os militares – e contra diversos civis que apoiavam a ditadura3 - a favor da democracia.

Esta juventude fez uma escolha política. Não necessariamente de esquerda ou a partir das premissas

comunista4 como buscava retratar o governo militar, mas principalmente contra a ditadura. É importante

lembrar que estamos tratando de uma parcela da juventude5 da época e que há uma identidade

relacionada a estes jovens. Uma juventude que estava influenciada pela vitória da revolução cubana, em

1959, e pelos trabalhos de diversos pensadores ou revolucionários como Marx, Marcuse e Che Guevara.

Aliado a estas influências, estavam indignados com a dominação e influência norte-americana no país e

criticavam os rumos das sociedades capitalistas (VENTURA, 2008).

Em 1968, no governo Costa e Silva, ainda presenciaram a implementação do ato institucional 56 que,

dentre as mudanças que previa, deu plenos poderes ao governo, decretou recesso ao Congresso Nacional,

às Assembléias Legislativas e às Câmaras de Vereadores, aumentou os mecanismos de censura à todos os

meios de comunicação e arte e instaurou de vez a prática da tortura e à “caça aos comunistas”.

Através dos movimentos estudantis7 nas instituições secundaristas e universitárias de todo o país e/ou a

partir de engajamento com líderes de movimentos ou partidos8 de esquerda, esta juventude acreditava

que a luta – armada ou pacífica9 – era uma solução possível para o término do regime militar. Existem

3 Alguns historiadores acreditam que o correto é chamar a ditadura que ocorreu no país de civil-militar, já que havia grande apoio de diversos empresários que financiavam o golpe, como por exemplo, Henning Albert Boilesen, presidente da Ultragás. Sobre este tema recomenda-se o documentário Cidadão Boilesen, de Chaim Litewski. 4 Todos os movimentos ou pessoas que eram contra a ditadura militar eram taxados de comunistas. Eram automaticamente relacionados aos partidos ou movimentos de esquerda existentes no período. 5 Não há a intenção de generalizar os jovens da época. Sabe-se que se trata de uma parte da juventude do período. Entre as juventudes que viveram o regime militar há também aqueles que apoiaram o golpe ou aqueles que eram acríticos e apolíticos, por exemplo. 6 O AI-5 foi promulgado em 13 de dezembro de 1968 com o objetivo de impedir o avanço “comunista” e preservar o interesse da “revolução”, como os militares chamavam o golpe de 64. Foi considerado “o golpe dentro do golpe”. 7 Segundo o livro Direito à memória e à verdade, publicado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos, em 2007, as passeatas dos movimentos estudantis, UNE e UME começaram a crescer em 1965, tendo o seu auge em 1968, ano em que foi instaurado o AI-5. 8 No governo de Castello Branco foi instituído o bipartidarismo, onde só estava autorizado o funcionamento de dois partidos: Movimento Democrático Brasileiro (MDB) e a Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Os demais partidos, incluindo os de esquerda, foram colocados na ilegalidade. 9 Existem diversos movimentos contra a ditadura, alguns acreditavam que a vitória aconteceria através da luta armada, assim como ocorreu em Cuba. Outros já eram a favor da luta pacífica, onde seria possível conquistar o poder no âmbito político, através de manifestações e união popular.

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diferentes visões sobre a eficiência desta luta jovem10, onde muitos foram torturados, exilados ou

simplesmente desapareceram11, porém há hoje algumas ideias pré-concebidas sobre quem eles foram.

Segundo Abramo (1997), a ideia que se tem atualmente dessa juventude é assimilada de uma forma

positiva: a imagem dos jovens dos anos 60 plasmou-se como a de uma geração idealista, generosa, criativa, que ousou sonhar e se comprometer com a mudança social, [...] acabou, desse modo, por fixar assim um modelo ideal de juventude: transformando a rebeldia, o idealismo, a inovação e a utopia como características essenciais dessa categoria etária. (ABRAMO, 1997, p. 31).

A participação destes jovens na luta contra o governo autoritário é conhecida através de diversos meios

que buscam representar esta juventude. A partir de suas memórias, diversas pessoas tentam contar mais

sobre um episódio recente da história do país. Dependendo de quem conta, a história ganha diferentes

versões. Grosso modo, de um lado estão os militares e do outro, os civis. Entre os militares há

torturadores e aqueles que dizem acreditar que faziam o melhor pelo país. Entre os civis, há aqueles que

lutaram pela democracia – e entre estes, muitos torturados - e aqueles que seguiam sem que a ditadura

interferisse diretamente em suas vidas. Desta forma, há duas versões: a memória oficial e hegemônica,

contada a partir da versão dos militares, e as várias memórias individuais, que lutam por um espaço, e são

contadas por aqueles que tiveram alguma outra relação com a ditadura. Estas memórias são representadas

em diversos meios, como a televisão, os livros, sítios da internet ou o cinema.

A partir destas considerações, a presente pesquisa busca refletir algumas questões iniciais sobre como as

juventudes do período ditatorial são representadas no cinema brasileiro contemporâneo, a partir da

análise do filme Batismo de Sangue. Entende-se por cinema brasileiro contemporâneo, a produção

realizada a partir da retomada12 do cinema brasileiro, em 1994. As questões assinaladas neste trabalho

são frutos dos primeiros apontamentos realizados para a minha dissertação para o mestrado em

antropologia da Universidade Federal de Sergipe, que se encontrando em fase de análise fílmica e

bibliográfica para início da redação.

10 Como demonstra Abramo (1997) enquanto diversos movimentos e civis viam na luta jovem uma possibilidade de renovação, diversos setores que também eram contra a ditadura, como os partidos comunistas e organizações sindicais tradicionais, “interpretavam tais manifestações juvenis como ações pequeno-burguesas inconseqüentes quando não ameaçadoras de um processo mais sério e eficaz de negociações para transformações graduais”, além de serem vistos por civis e políticos como responsáveis por acabar com a ordem social. 11 Segundo o livro Direito à memória e à verdade há cerca de 475 pessoas desaparecidas. Ainda segundo o livro “ao pesquisar os dados constantes de 707 processos políticos formados pela Justiça Militar entre 1964 e 1979, o projeto Brasil Nunca Mais contou 7.367 acusados judicialmente e 10.034 atingidos na fase de inquérito. Houve quatro condenações à pena de morte, não consumadas; 130 pessoas foram banidas do País; 4.862 tiveram cassados os seus mandatos e direitos políticos; 6.592 militares foram punidos e pelo menos 245 estudantes foram expulsos da universidade” (2007, p. 30). 12 Fernando Collor de Melo quando tomou posse como presidente da república, em 1990, extinguiu os mecanismos de sustentação do cinema brasileiro. Com o impeachment do então presidente, a retomada do cinema brasileiro começou em 1992, no governo de Itamar Franco. Antonio Houaiss, Ministro da Cultura da época, criou a Secretaria para Desenvolvimento do Audiovisual e começou a liberar recursos para produção de filmes. Em 1993 iniciaram a elaboração da Lei do Audiovisual (8.685), que entrou em vigor no governo de Fernando Henrique Cardoso, e começou a gerar frutos em 1994 e 1995. As leis de incentivo fiscais são os principais mecanismos de fomento do cinema até os dias de hoje.

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A escolha do cinema se deu devido à impressão de realidade causada pelas obras cinematográficas, que

podem ajudar a criar (ou a reforçar) um imaginário nacional sobre quem foram estes jovens. Porém, é

importante ressaltar que o cinema, um dos campos onde as narrativas do período são trabalhadas, traz

uma versão dos fatos, onde é possível criar uma representação sobre o período. É um espaço onde se luta

por uma memória e suas histórias estão vinculadas aos encadeamentos da vida social pós-ditaduras

(SOUZA, 2007).

Criado no final do século 18, o cinema é um importante meio de comunicação, de veiculação de histórias

e criação de identidade (STAM, 2003). Para Souza (2008), as ficções cinematográficas são uma das

formas de produção de novos sentidos em face da experiência passada. Cada cinematografia oferece, a

seu modo, termos em que as socialidades são reconstruídas e relidas por intermédio que o cinema faz

daquele passado. Marc Vernet acredita que a impressão de realidade sentida pelo espectador ao assistir

uma obra cinematográfica deve-se, essencialmente, “à riqueza perceptiva dos materiais fílmicos, da

imagem e do som [...] entre todas as artes ou todos os modos de representação, o cinema aparece como

um dos mais realistas” (VERNET apud SANTOS, 2009, p. 9).

Neste sentido, para este trabalho, será analisado o filme Batismo de Sangue (2006), de Helvécio Ratton.

Trata-se de uma obra de ficção, mas baseada em um livro biográfico, isto é, uma história considerada real

que traz memórias de um jovem que viveu no período militar, a partir de uma ótica pós-ditatorial13, uma

releitura sobre o passado. O filme é baseado no livro homônimo de frei Bett, que leva o mesmo nome,

lançado originalmente em 1983.

A relevância histórica do regime militar e as diferentes memórias existentes sobre este mesmo período

foram os principais motivos para escolha do tema para a pesquisa. Para Souza (2007), nos períodos pós-

ditatoriais, ocorre um processo de releitura sobre este passado, “o qual procura reelaborar sentidos ao dar

vazão a disputas de memórias e insere a discussão, sobre a necessidade de ações de reparo e justiça”,

trazendo à tona memórias reprimidas. Há um conflito na discussão sobre as memórias, [...] “pois alguns

grupos procuram impor hegemonicamente sua versão sobre as de outros grupos” (SOUZA, 2007, p.).

Entendemos essas memórias individuais no sentimdo de uma memória14 contra-hegemônica, que busca

apresentar uma nova versão dos fotos em relação às memórias oficiais. A memória é um importante

mecanismo de manipulação e criação de identidade. Os regimes totalitários deram à memória coletiva

conteúdos e forças oficiais (BALANDIER, 1994) e tornam poderosos aqueles que a geram e controlam: a

memória é ativada visando, de alguma forma, o controle do passado e, portanto, do presente (SEIXAS,

2001).

O que se aprende com a memória oficial, que é frequentemente mais transmitida, é uma versão dos fatos,

13 O livro foi escrito antes do término da ditadura, em 1985, porém foram feitos após o encerramento do AI-5, em 1978, quando o Brasil começava a caminhava para um processo de redemocratização. 14 Podemos pensar essa memória no mesmo sentido em que Foucault fala das memórias populares (FOUCALT, 2001, pp. 330-345).

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um lado da história. O mesmo acontece com o cinema. Como nos disse Paul Ricoeur, “ver uma coisa é

não ver outra. Narrar um drama é esquecer outro” (RICOEUR, 2007, p. 459).

Memórias da juventude de ontem no cinema de hoje

Abramo (1997) demonstra que nos últimos anos há uma crescente preocupação com a juventude, tanto

no que diz respeito à criação de políticas públicas voltadas a este público, como no meio acadêmico, que

começou a dar atenção aos jovens e a considerá-los importantes sujeitos sociais. A princípio, a juventude

era vista como um problema e se tornava objeto que merecia atenção quando apresentava alguma ameaça

de ruptura com a continuidade social, tanto para si ou para a sociedade. Segundo a autora, isto ocorre: Seja porque o indivíduo jovem se desvia do seu caminho em direção à integração social [...], seja porque um grupo ou movimento juvenil propõem ou produz transformações na ordem social ou ainda porque uma geração ameace romper com a transmissão da herança cultural15 [grifo nosso]. (ABRAMO, 1997, p. 29).

Parte da juventude dos anos 1960 aparece dentro dessa ideia de produção de transformações ou de

ruptura da ordem social. Os campos cultural, político, comportamental e moral sofriam diversas

influências e críticas destes jovens que buscavam a mudança e a transformação. Segundo Abramo

(1997), foi neste momento que a juventude se mostrou como uma categoria que podia realizar uma

“transformação profunda” para grande parte da sociedade: Portanto, condensava o pânico da revolução. O medo aqui era duplo: por um lado, o da reversão do “sistema”; por outro, o medo de que, não conseguindo mudar o sistema, os jovens condenavam a si próprios a jamais conseguirem se integrar ao funcionamento normal da sociedade. (ABRAMO, 1997, p. 31).

O golpe militar que ocorreu no Brasil em 1964 abortou uma geração cheia de promessas e

esperanças. Segundo Ventura (2008), esta juventude era “oniponente, generosa, megalômana, a

cultura pré-64 alimentou a ilusão de que tudo dependia mais ou menos de sua ação. Essa ilusão

terminou em 64; a inocência em 68”. (VENTURA, 2008, p. 46). Porém, a esperança de que era

possível transformar não acabou com o golpe e a partir dos movimentos estudantis diversos jovens

começavam a sua luta contra a ditadura militar.

Os jovens dividiam opiniões sobre a eficiência de seus atos, tanto do lado dos militares, como dos

movimentos contra a repressão e dos civis, mas de alguma forma assustavam os responsáveis pela

ditadura e eram considerados como elementos que poderiam prejudicar os objetivos do golpe

(Abramo, 1997). Porém, principalmente a partir de 1968 e da implementação do AI-5 no final deste

ano, aqueles que resolveram lutar sofreram diversos tipos de repressão, como censura, tortura ou

desaparecimento forçado: Políticos, estudantes, intelectuais, artistas, operários, foram cassados, presos, torturados, exilados e mortos. A censura foi implacável com as obras artísticas e com os meios de

15 Como exemplo, podemos citar a juventude que será analisada neste trabalho.

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comunicação, numa otentativa de acabar com as manifestações culturais e políticas contrárias ao regime. (PEDERIVA, 2004, p. 208).

Dados do Projeto Brasil: Nunca Mais demonstram que os jovens são responsáveis por uma grande

parcela dos processos contra os crimes da ditadura e ainda é importante lembrar que há muitos

casos que não foram julgados ou casos de pessoas que ainda estão desaparecidas, que pode

aumentar consideravelmente o número divulgado: Os números referentes à idade dos atingidos causam impacto e convidam à reflexão: 38,9% tinham idade igual ou inferior a 25 anos, realçando a forte participação dos jovens nas atividades de resistência ao Regime Militar e evidenciando sua corajosa predisposição ao enfrentamento de riscos. (PEDERIVA, 2004, p. 213).

Analisar esta juventude hoje possibilita um amplo campo de pesquisa devido à efervescência que

ocorria em diversos meios importantes para a formação da sociedade. Também para entender como

são representados hoje e como influenciam a juventude atual. O imaginário que temos hoje dos

jovens que viveram no período é criado a partir de diversas representações nos mais diferentes

meios, como por exemplo, no cinema. Robert Stam, no seu capítulo dedicado à representação,

lembra que: Se, por um lado, o cinema é mimese e representação, por outro é também enunciado, um ato de interlocução contextualizada entre produtores e receptores socialmente localizados. Não basta dizer que a arte é construída. Temos de perguntar: Construída para quem e em conjunção com quais ideologias e discursos? Neste sentido, a arte é uma representação não tanto em um sentido mimético quanto político, da delegação da voz. (STAM, 2003, p. 305).

O cinema brasileiro contemporâneo utilizou a ditadura militar como tema de diversas obras16. Os

filmes trouxeram uma releitura sobre o passado recente do país e deu voz às diversas memórias que

estavam silenciadas ou não evidenciadas – ou também deu espaço para a continuidade de um

discurso da memória oficial. Não devemos ser ingênuos e ver nessas obras uma verdade absoluta,

mas uma possibilidade de ter contato com diferentes versões que nos permita formar um senso

crítico mais apurado. Filmes inspirados em momentos históricos trazem em sua narrativa

subjetividades que levam o espectador a trabalhar a sua percepção de real. Desde o início do cinema,

a impressão de realidade causada pelas obras levou os espectadores a interpretá-lo como

reproduções do real. Porém, como demonstra Jean-Claude Bernardet, “o cinema representa um

ponto de vista”. O que vemos nas telas é uma interpretação, uma representação.

Da mesmo forma podemos pensar o conteúdo da memória oficial, que traz questões que não tocam

em pontos evidenciados por memórias individuais. Mais de 40 anos depois do golpe militar

ocorrido no Brasil em 1964, Barros (1994) mostra que a memória oficial do regime ditatorial que se

16 Tais como: Lamarca (Sérgio Resende, 1994), Ação Entre Amigos (Beto Brant, 1998), Tempo de Resistência (André Ristum, 2004), Cabra-Cega (Toni Venturi, 2005), Vlado — 30 anos Depois (João Batista Andrade, 2005) e Quase Dois Irmãos (Lúcia Murat, 2005).

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seguiu a ele pode parecer apenas um amontoado de generais-presidentes que desfilam de forma

impositiva pela história do Brasil: Hoje, nos novos tempos autoritários em que vivemos, mais do que nunca ficaram nivelados, em nome da “conciliação”, as vítimas e os carrascos. Foram “esquecidos” os torturadores, e notórios políticos liberticidas continuam, tranquilamente, usufruindo das maravilhas do poder” (BARROS, 1994, p. 11).

As memórias individuais se tornam importantes para contrapor a memória oficial e são muito

importantes para a formação da memória coletiva. “Cada memória individual é um ponto de vista

sobre a memória coletiva” (HALBWACHS, 1990, p. 51) e estas memórias têm a possibilidade de

dar outra versão à memória oficial e de ajudar a sociedade na criação de sua identidade. Através dos

filmes, os seus realizadores buscam, de alguma forma, rememorar os acontecimentos do passado. A

rememoração também significa uma atenção precisa ao presente, pois não se trata somente de não

se esquecer do passado. As imagens trazidas pelos filmes podem provocar reflexões e ser

construtoras de memórias, como nos coloca Halbwaschs, leituras do passado elaboradas no presente,

sendo individuais e coletivas ao mesmo tempo (ZANINI, 2008).

No caso do regime militar no Brasil, que durou de 1964 a 1985, a anistia concedida pelo presidente

Figueiredo determinou que não se investigasse agentes de órgãos de segurança implicados em

violência ou qualquer ato ilegal contra presos políticos. “Aos torturadores, bem mais que aos

torturados e “desaparecidos”, foi concedido perdão absoluto” (BARROS, 1994, p. 98). E também

Tancredo, quando estava em negociação para assumir o poder, “estabeleceu sólidos acordos nos

meios militares, comprometendo-se a impedir inquéritos sobre torturas, desaparecimentos e

escândalos financeiros”. (BARROS, 1994, p. 117).

Ricoeur (2007) acredita que se trata de uma amnésia comandada: Se esta conseguisse ter êxito – e infelizmente nada se constitui em obstáculo à ultrapassagem da tênue linha de demarcação entre anistia e amnésia -, a memória privada e coletiva seria privada de salutar crise de identidade que possibilita uma reapropriação lúcida do passado e da sua carga traumática (RICOEUR, 2007, p. 462).

A anistia “toca nas próprias raízes do político e, através deste, na relação mais profunda e mais

dissimulada com um passado declarado proibido” (RICOEUR, 2007, p. 460). Neste caso, o

interesse de trazer o período da ditadura militar para o esquecimento não é através da condenação e

castigo dos acusados, mas através das leis que tratam da anistia e a designam como um tipo de

perdão17.

17 Diferentemente de outros países da América Latina, como a Argentina , que estão mais adiantados no processo de revelar memórias oprimidas pela ditadura, que se instaurou em diversos países do continente, só agora o Brasil começou a dar passos mais efetivos para esclarecer os diversos abusos em relação aos direitos humanos que aconteceram no período militar, com a criação da Comissão Nacional da Verdade. Sancionada em novembro de 2011 pela presidente Dilma Rousseff, o objetivo da comissão é “efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional”.

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Batismo de Sangue

A memória está em constante disputa e o cinema se tornou um campo possível de luta. O filme

Batismo de Sangue é um exemplo. A partir da narrativa fílmica busca elencar fatos ocorridos

durante o regime militar que não são evidenciados na versão contada pela memória oficial. Utiliza-

se da facilidade que o cinema tem em narrar uma história – a partir do uso da imagem e do som –

para reproduzir o período e algumas memórias silenciadas.

É a partir do livro Batismo de Sangue, onde estão relatadas as memórias de frei Betto, que a história

do filme é formulada. O diretor Helvécio Ratton, que assim como os personagens principais da obra,

também lutou contra a ditadura, se propõe a representar outro ponto de vista sobre o período,

rompendo a barreira do silêncio e tocando em questões que não são fáceis de falar, como a tortura.

Diversos filmes brasileiros buscaram trabalhar memórias do período, seja se contrapondo ou

legitimando a memória oficial. A participação da juventude na oposição ao regime militar se tornou

um tema frequentemente exposto em obras que narram o período, algumas vezes sendo o foco

principal da trama e outras, o pano de fundo.

Batismo de Sangue é um desses filmes que tem como protagonistas jovens, porém, com uma

particularidade, eles são dominicanos. A história se inicia em São Paulo, no fim dos anos 1960.

Conta a participação dos frades dominicanos em apoio à luta contra a ditadura. A partir de ideais

cristãos, os freis Tito (Caio Blat), Betto (Daniel de Oliveira), Oswaldo (Ângelo Antônio), Fernando

(Léo Quintão) e Ivo (Odilon Esteves) passam a apoiar o grupo guerrilheiro Ação Libertadora

Nacional (ALN), comandado por Carlos Marighella (Marku Ribas). Os freis se baseiam na bíblia e

em filósofos, como Santo Thomas de Aquino, para demonstrar a importância da participação da

igreja na ação contra a ditadura. A relação entre os freis e Marighella foi descoberta pelo

Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), que levou à prisão dos freis, onde alguns foram

torturados.

Diferentes jovens, de distintos grupos, fizeram parte da resistência contra os militares. São diversos

os ideais que os levaram a militar a favor da democracia. No caso deste filme, o fato de se tratar de

uma juventude do convento dominicano, já nos aponta sobre qual juventude estão falando. Porém, é

importante lembrar que, mesmo se tratando especificamente de cristãos, estamos vendo jovens. A

relação com a igreja e a fé está presente em toda a obra, mas também o gosto pela música, pela

literatura, a vida na universidade e diversas questões que envolvem o universo juvenil.

O trabalho não tem a intenção de priorizar a questão estética do longa-metragem, porém, é

importante ressaltar alguns pontos referentes à linguagem e às técnicas utilizadas. Para ajudar a

contar a história foram utilizados mecanismos como roupas, cenários e acessórios que nos

remetessem para o momento passado no filme. Na universidade, por exemplo, vemos jovens de

mini-saia, uma das mudanças comportamentais da época, ou também de cabelos e barbas compridos.

Page 9: Juventude e ditadura

As capas das revistas e dos jornais, o cuidado em manter-se fiel em locais onde realmente se

passaram alguns fatos são alguns dos elementos que auxiliam a representação do período. Também

são referenciados marcos históricos, que aparecem como pano de fundo na imagem da novata

televisão, como a viagem do homem à lua e a possibilidade do milésimo gol de Pelé. O mesmo

acontece com fatos marcantes do regime, como a instauração do AI-5 e o sequestro do embaixador

norte-americano.

A fotografia do filme, desempenhada por Lauro Escorel, ABC, é outro detalhe fundamental para

transpor a obra para o fim da década de 1960. O branco e o preto fazem o papel de trazer a luz e a

falta dela. O início do filme traz cores vivas, claras, que escurecem conforme os fatos vão se

desenrolando, como se a esperança tivesse sido perdida. Também não são poupadas as imagens

duras e frias que retratam a tortura e a dor daqueles que foram presos.

O filme começa com o suicídio de frei Tito, durante seu exílio na França. O final é o ponto de

partida, e a história que se inicia a seguir tentará explicar os motivos que levará o jovem a acabar

com a própria vida. Os ideais aproximam os freis da luta armada de Marighella, que busca “a

consciência do povo pela ação”. Em nenhum momento eles pegaram em armas, mas serviram como

apoio para levar ou esconder pessoas, por exemplo. Diversos grupos da juventude da igreja católica

apoiaram a luta contra a ditadura, como a Juventude Universitária Católica (JUC) e a Ação Popular

(AP). Não fica claro no filme a importância e o tamanho do apoio dos setores da igreja, mas em

alguns momentos, como durante um sermão contra a repressão numa missa ou quando se fala da

possibilidade de encontrar apoio em uma igreja em Conceição do Araguaia, no Pará, tenta-se

demonstrar um pouco sobre esta relação.

A militância de grande parte da juventude aconteceu a partir de influências nas universidades ou

pelo contato de algum integrante dos grupos revolucionários, como familiares ou amigos. A

importância do papel da universidade na militância dos jovens está presente no filme. Tito,

estudante de filosofia, é interrompido durante uma aula para participar de uma reunião com outros

integrantes do movimento estudantil, que tinha como principal objetivo discutir sobre o congresso

da UNE e a eleição do novo presidente. Neste momento, nos deparamos com uma juventude

engajada e sonhadora, que acredita na transformação social.

Durante a caminhada de Tito pela USP vemos cartazes com fotos de revolucionários como Che

Guevara e folhetos contra o regime que tentam nos levar a entender as discussões que aconteciam

nos corredores universitários. Vemos jovens munidos de ideias, de livros e alguns com um violão.

Porém, também somos apresentados ao lado inexperiente e ingênuo desta juventude durante o

congresso da UNE em Ibiúna. Por mais que seja rapidamente representado no filme, já no momento

em que é invadido por militares e todos os estudantes são presos – com uma dose excessiva de

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violência – serve para demonstrar algumas das falhas que o movimento estudantil cometeu, quando

acreditou ser possível levar mais de mil estudantes para uma cidade do interior em segredo.

Como aponta Ventura (2008), a juventude da época se dividia entre a música e a literatura. Em

meio a efervescência cultural que o país vivia, temos a presença de Chico Buarque e Noel Rosa na

rádio e nas canções interpretadas por Tito em alguns momentos da trama. Os livros são

evidenciados em diversas ocasiões, como por exemplo, na cena em que Betto narra uma carta

escrita aos pais, em que descreve a situação na cadeia e menciona que os freis andam lendo muito.

Também devemos lembrar que o local onde os dominicanos marcavam os encontros com

Marighella é uma livraria.

O amor, outro tema recorrente do universo jovem, está presente em Batismo de Sangue, mesmo que

suavemente. Betto, que é jornalista e trabalha no Jornal da Tarde até um pouco depois da

instauração do censor nas redações, é abordado por uma colega fotógrafa que declara o seu amor

pelo frei, que por este motivo não pode corresponder o sentimento. A instituição familiar também

aparece na obra, principalmente após a prisão dos jovens freis. No filme, não há questionamentos

dos pais em relação às opções políticas dos filhos nem fica clara qual é a posição da família em

relação à ditadura. Os familiares aparecem como uma forma de apoio e de força.

O momento da tortura traz a tona o limite de cada um. Até onde suportamos a dor por uma causa?

Os primeiros freis presos, Fernando e Ivo, chegam ao limite e acabam por entregar informações que

levaram o delegado Fleury a encontrar e matar Marighella. Já a tortura que sofreu posteriormente

Tito foi uma das causas que o levou a cometer o suicídio, segundo o filme.

São diversas as juventudes que viveram o período. No filme, temos contato, primordialmente, com

uma juventude ligada à igreja católica, mas também temos contato com outros jovens, engajados,

como é o caso dos universitários. Sutilmente também são representados jovens apolíticos, como

vemos na cena onde, em um bar, a televisão exibe o Repórter Esso informando a morte de

Marighella e os jovens que estão no local não dão importância para a notícia e continuam

conversando sobre os diferentes fatos de suas vidas, como o futebol.

Conclusão

A arte faz parte da vida e devemos interpretá-la como parte da dinâmica do mundo (GEERTZ,

1997). Assim, o cinema é hoje um importante meio de comunicação, criatividade, histórias e

identidades (STAM, 2003), sendo uma forma possível de tematizar a juventude. O presente trabalho

não teve o objetivo de avaliar a qualidade do filme, mas de pontuar algumas questões sobre a forma

como é representada a juventude que viveu durante o governo militar, mais especificamente na

transição ocorrida entre 1968 e 1969, com a implementação do AI-5. O trabalho também não teve a

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intenção de relevar a história do período ou a fidelidade do filme em relação às memórias de frei

Betto descritas no livro ou até mesmo à memória oficial.

A partir de uma análise inicial, podemos perceber que a principal juventude tematizada na obra

Batismo de Sangue é sonhadora e impulsionada a lutar devido o momento histórico em que viviam,

que facilitava o engajamento. A universidade, o contato com livros e diversos pensadores aparecem

como fatores importantes para o apoio desta juventude na luta contra a ditadura. Temos contato com

jovens que estão vivendo uma grande mudança cultural, política e comportamental e que acreditam

na mudança. Os jovens que viveram a transição entre 1968 e 1969 viram as suas liberdades serem

confiscadas e a partir de diferentes ideologias buscaram mudar o cenário.

Estamos tratando aqui apenas de uma das possibilidades que esta juventude é representada no

cinema brasileiro contemporâneo. Também é importante ressaltar que se trata de apontamentos

iniciais, que serão posteriormente aprofundados e comparados com outras obras do cinema

brasileiro atual.

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