juliana elisa da silva · direitos ou quando possuíam era o mínimo possível, eram submissas e...

51
JULIANA ELISA DA SILVA A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E A LEI MARIA DA PENHA Centro Universitário Toledo Araçatuba 2017

Upload: others

Post on 30-Apr-2020

101 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

JULIANA ELISA DA SILVA

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E A LEI MARIA DA PENHA

Centro Universitário Toledo

Araçatuba

2017

JULIANA ELISA DA SILVA

A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER E A LEI MARIA DA PENHA

Monografia apresentada como requisito parcial de

Conclusão de Curso para obtenção do Grau de

Bacharelado em Direito sob orientação do

professor Renato Freitas

Centro Universitário Toledo

Araçatuba

2017

BANCA EXAMINADORA

RENATO ALEXANDRE DA SILVA FREITAS

Orientador

LEILIANE RODRIGUES DA SILVA EMOTO

Examinador 1

PAULO ROBERTO CAVASANA ABDO

Examinador 2

Dedico esse trabalho aos meus pais

Marcos Rogério da silva e Gislene

Machado da Silva, que lutaram e se

esforçaram, me dando todo o suporte

para que eu pudesse ingressar e concluir

o curso, pelo amor, carinho e por não

medirem esforços para que eu pudesse

chegar até aqui.

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a Deus pela vida, saúde, força e coragem para seguir

minhas metas e nunca desistir, e ainda, por dificuldades que enfrentei para que assim me

fortalecesse aprendesse a aproveitar as oportunidades oferecidas por Ele.

Agradeço aos meus pais, por tudo que me ensinaram, pela educação que me

ofereceram. Acima de tudo, pelo amor e dedicação e compreensão diante de todas as

dificuldades.

Ao meu orientador, professor Renato Freitas agradeço por tanta paciência,

compreensão, e por todos seus ensinamentos que foram de extrema importância, você é 10!

Agradeço ao meu namorado Marcos Vinícius, por me compreender, auxiliar e por todo

incentivo, e por aguentar todas minhas dificuldades, fazendo com que eu sempre acreditasse

que eu era capaz.

Agradeço ao meu irmão por me acompanhar nessa árdua caminhada.

Por fim, agradeço toda minha família que direta ou indiretamente contribuíram para

realização dessa pesquisa.

RESUMO

O objetivo dessa monografia é estudar a Lei nº 11.340/06, chamada de Lei Maria da Penha, a

qual foi nomeada pela luta incessante de uma cearense chamada Maria da Penha que por

pouco não teve sua vida acabada por meio da violência doméstica que sofreu de seu ex-

marido. Objetiva estudar também sobre as medidas protetivas, que visam proteger a vítima de

violência doméstica e familiar. Foi abordada também a eficácia dessas medidas e a falta de

intervenção do governo para um atendimento humanizado quando fosse procurado pela

vítima. Objetiva discutir a ineficácia da medida protetiva, embora a lei seja ampla, no Estado

despreparado.

Palavras chaves: Lei Maria da Penha; Violência Doméstica; Direito Penal.

ABSTRACT

The objective of this monograph is to study Law 11.340 / 06, called the Maria da Penha Law,

in which she was named after the ceaseless struggle of a woman from Ceará named Maria da

Penha who almost had her life ended through domestic violence suffered by her ex husband.

The objective was to study also the protective measures, which aim to protect the victim of

domestic and family violence. It also addressed the effectiveness of these measures and the

lack of government intervention for a humanized care, when it was sought by the victim. It aims to discuss the ineffectiveness of the protective measure, although the law is broad, in

the unprepared state.

Key words: Maria da Penha Law; Domestic Violence; Criminal Law.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 10

1. HISTÓRIA DA LEI MARIA DA PENHA ....................................................................... 11

1.1. A luta das Mulheres pelos seus direitos ..................................................................... 11

1.2. Histórico da Lei Maria da Penha ............................................................................... 13

1.3. A mulher nos dias atuais ............................................................................................ 15

2. AS DIFERENTES FORMAS DE VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES ................ 17

2.1. Conceito de violência doméstica ............................................................................... 17

2.2. Formas de violência doméstica e familiar contra a mulher ....................................... 18

2.2.1. Violência Física .................................................................................................. 21

2.2.2. Violência Psicológica ......................................................................................... 21

2.2.3. Violência Sexual ................................................................................................. 22

2.2.4. Violência Patrimonial ......................................................................................... 22

2.2.5. Violência Moral .................................................................................................. 23

2.3. Os sujeitos dos crimes domésticos ............................................................................. 23

2.3.1. A vítima segundo o Sistema Penal Brasileiro .................................................... 24

2.3.2. O perfil do agressor da violência doméstica ....................................................... 24

2.3.3. O perfil das vítimas da violência doméstica ....................................................... 26

3. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA ..... 28

3.1. Medidas protetivas obrigatórias do agressor ............................................................. 28

3.1.1. Suspensão da posse ou restrição do porte de armas ........................................... 29

3.1.2. Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida ............ 30

3.1.3. Proibição de determinadas condutas ...................................................................... 30

3.1.4. Restrição ou Suspensão de visitas aos dependentes menores ................................ 31

3.1.5. Prestação de alimentos provisionais ou provisórios ........................................... 32

3.2. Medidas Protetivas a ofendida ................................................................................... 32

3.2.1. Encaminhar à ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de

proteção ou de atendimento .................................................................................................. 33

3.2.2. Determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo

domicílio, após afastamento do agressor .............................................................................. 33

3.2.3. Afastamento do Lar ................................................................................................ 34

3.2.4. Separação de corpos ............................................................................................... 34

3.2.5. Medidas de Ordem Patrimonial.............................................................................. 34

3.2.6. Restituição de bens ................................................................................................. 34

3.2.7. Proibição temporária para compra, venda e locação da propriedade em comum .. 35

3.2.8. Revogação das procurações conferidas pela ofendida ao agressor ........................ 35

3.2.9. Caução provisório mediante depósito judicial. ...................................................... 35

3.3. Relatos de vítimas de violência doméstica ................................................................ 36

4. DA INEFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS E AS OPÇÕES DO GOVERNO

PARA AMPARAR AS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA ..................................... 38

4.1. Ineficácias das medidas protetivas para restringir a violência contra a mulher ......... 38

4.2. Decreto nº 8086/13: Há uma esperança ..................................................................... 43

4.3. O início da real e efetiva proteção à mulher. ............................................................. 46

5. CONCLUSÃO .................................................................................................................. 48

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 50

10

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de expor todos os problemas que envolvem a

violência doméstica e familiar contra a mulher. Não é novidade que isso já ocorre na

sociedade há muito tempo, mas após longo período de inércia do governo, a população passou

a abordar tema de forma mais atenciosa, cautelosa.

No Capítulo 1, iremos analisar todo contexto histórico das diversas lutas que as

mulheres tiveram para ter seu espaço na sociedade e para terem diversos direitos

reconhecidos, e ainda ressaltar a importante conquista feita pelas mulheres brasileira com a

criação de uma legislação específica sobre violência doméstica, Lei 11.340/06, chamada Lei

Maria da Penha.

No capítulo 2, serão abordadas as diferentes formas de violência contra as mulheres,

bem como quem são os possíveis sujeitos desse crime, quem é a vítima segundo o sistema

penal brasileiro. Abordaremos também, de forma aprofundada, quais são as medidas

protetivas de urgência, fundamentais para a vítima, dentre elas estão as medidas que: obrigam

o agressor a afastar da vítima, dos menores e do lar; proíbem o contato do agressor com a

ofendida por qualquer meio de comunicação; estipula que o agressor não frequente

determinados lugares, ficando proibido de se aproximar e de manter contado com a vítima. A

prisão preventiva do infrator também pode ser aplicada como medida protetiva de urgência

em alguns casos.

Serão abordadas também as medidas que são referidas à ofendida, como as que

encaminham a agredida para programa de atendimento e de proteção, as que reconduzem a

mulher ao lar, as que garantem seus direitos patrimoniais, trabalhistas e civis.

No Capítulo 3, abordaremos que, apesar de existirem diversas medidas que buscam

proteger, nem sempre elas são eficazes. Será abordada a problemática que está ligada a falta

de políticas públicas e falta de estrutura de diversas instituições governamentais para efetivar

a lei e principalmente as medidas protetivas, ou seja, falta atendimento mais humanizado.

Por fim será exposta uma esperança para quem sofre esse tipo de violência, o Decreto

nº 8.086/13 que institui a Casa da Mulher Brasileira onde surge uma nova esperança que a

vítima tenha um melhor atendimento e uma maior solução para seu caso, e onde ocorre o

início da real e efetiva proteção à mulher.

11

1. HISTÓRIA DA LEI MARIA DA PENHA

1.1.A luta das Mulheres pelos seus direitos

Desde a antiguidade, as mulheres obtinham um papel de inferioridade, eram

consideradas pessoas secundárias, tendo a figura masculina em destaque. Elas não possuíam

direitos ou quando possuíam era o mínimo possível, eram submissas e viviam em um mundo

preconceituoso e machista no qual o homem era soberano e fazia com que a liberdade da

mulher fosse restrita.

A mudança dessa situação teve início com a formação do movimento feminista que se

espalhou por todo o mundo. Esse movimento tinha caráter filosófico, social e político e o

propósito era a luta pela igualdade das mulheres e a transformação dos padrões que foram

impostos pela sociedade de que o homem era superior.

De acordo com o historiador Antônio Gasparetto Junior, o movimento feminista foi

partido em três ondas. Chamada de Primeira Onda Feminista foi concentrada com a fundação

da igualdade de direitos entre homens e mulheres, colocando fim a submissão sofrida pelas

mulheres ao longo da humanidade, seu discurso não era apenas político, mas também

filosófico, defendendo principalmente a igualdade entre os homens e as mulheres, onde até os

homens lutavam por essa causa.

Essa Primeira Onda, segundo Gasparetto, teve início no século XIX até o começo do

século XX, era concentrado em sua maioria no Reino Unido e nos Estados Unidos,

combatiam pela igualdade entre homens e mulheres, contra diferenças contratuais, pela

capacidade de conquistar propriedades e lutavam para o fim dos casamentos arranjados.

No final do século XIX, de acordo com Gasparetto, passou a objetivar o âmbito das

reivindicações do poder político, onde as mulheres eram proibidas até de votarem e elegerem

seus representantes, enquanto isso o movimento continuou na sua luta por direitos sexuais,

reprodutivos e econômicos. Foi um longo período de lutas, reivindicações, fazendo com que

tardasse as conquistas tão desejadas.

A partir do século XX, o efeito dessa luta começou a ser visto de forma progressiva.

No Reino Unido o voto foi permitido com algumas restrições, foi a partir do ano de 1918 e

apenas mulheres com mais de 30 anos tinham esse direito. Nos Estados Unidos a conquista

pelo voto ocorreu em 1919.

12

A Segunda Onda Feminista ocorreu no período da década de 1960 até 1980, era uma

continuação da primeira onda, no entanto com requisições características que diferenciavam

as duas ondas. Enquanto a primeira fase reivindicava direitos políticos em uma segunda

situação o movimento teve como temática a igualdade entre os sexos, elas queriam mais além

das conquistas da primeira onda. Esse movimento durou até a década de 1980 e ficou

conhecido como “O pessoal é político”, criado por Carol Hanisch.

Após a primeira onda alegar que o contrato matrimonial não abrangia o interesse

sentimental da mulher, a segunda onda atravessou por severas críticas no sentido de que as

mulheres se limitavam a cuidar do lar e dos filhos, resumindo, uma doméstica. Com isso a

situação das lutas e movimentos “pegou fogo”, em particular a sociedade dos Estados Unidos

onde as mulheres lutavam para trabalharem fora de suas casas, sustentando seus lares e seus

filhos inclusive a igualdade de capacidade e respeito.

A Terceira Onda teve início em meados da década de 1980, mencionando supostas

falhas da segunda onda. Essa terceira onda procurou destacar a “micropolítica”. Várias

feministas negras buscavam seus direitos e espaços no movimento. Essa terceira onda foi

caracterizada por debates internos, chamados de feminismo da diferença, tendo como objetivo

expor que as diferenças sexuais existiam realmente e reconhecidas essas diferenças os papéis

atribuídos a cada gênero iriam formar um contexto social diferente.

No Brasil, o movimento ganhou força e influência do grupo americano e inglês. Por

vários anos, as mulheres brasileiras reclamaram por seus direitos, principalmente o direito de

votar e ser votada.

As brasileiras que primeiro entraram nessa luta foram Nísia Floresta e Berta Luts e

fundaram a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, que lutava pelo direito de voto,

pela escolha do domicílio e pelo direito de trabalhar fora sem a autorização do marido.

Foi no século XIX que iniciou a busca pelos direitos civis, políticos e sociais. A

limitação das mulheres para trabalharem fora adveio do Código Civil de 1916, no artigo 233,

sendo permitido com a autorização dos maridos, mesmo assim não houve muito avanço, pois

o Código trazia a figura do homem como o chefe da família sendo ele quem determinava o

domicílio da esposa e dos filhos, administrava os patrimônios e autorizava a esposa trabalhar

ou não.

As mulheres foram à luta, pois queriam alterações que fossem efetivas, elas

apresentavam propostas para que houvesse mudança na situação social, política e econômica

que eram determinadas. Mas o projeto só chegou ao parlamento nacional em 1945 com a

volta da democracia, inclusive para mudar o Código Civil.

13

A mudança do Código Civil ocorreu em 1962, com a ampliação e modificação dos

direitos das mulheres casadas pelo presidente João Goulart, amparado na Lei nº 4121/62. Em

1933, o código eleitoral expandiu a mulher o direito ao voto e a representação do sexo

feminino.

Uma parte da conquista foi à criação da lei 11.340/06, nomeada Lei Maria da Penha

que vem com meios de restringir e combater a violência doméstica no Brasil.

Em 2015 foi sancionada pela presidenta Dilma o projeto de Lei nº 8305/14

denominado “feminicídio”, incluindo-o no código penal no art. 121 como uma modalidade de

homicídio qualificado, no rol dos crimes hediondos, ou seja, homicídio que é praticado contra

a mulher pelo seu gênero de sexo.

Apesar das grandes conquistas, o movimento feminista nunca parou e ao longo de

décadas elas foram conquistando espaço em todos os cenários, as lutas continuam para que

conquistem o espaço que é de direito de qualquer cidadão seja mulher ou homem.

1.2.Histórico da Lei Maria da Penha

Por meio da cultura machista se expandiu uma banalização da figura feminina. As

violências que elas sofriam ao longo desse tempo ensejaram uma enorme busca pelos seus

direitos, igualdades e dignidade. A vitória foi conquistada no cenário brasileiro com o

sancionamento da Lei 11.346/06, nominada de Lei Maria da Penha, onde se ajustou os

direitos humanos relacionados às mulheres e vítimas de violência doméstica. Foi um árduo

caminho até chegar nessa grande conquista.

Segundo o autor:

Compreender a difícil tarefa pretendida pela Lei n. 11.340/2006, denominada Lei

Maria da Penha, significa observar que o mundo manteve, secularmente, a

legitimidade da violência de gênero, tornando esta, portanto, institucionalizada, com

enfoques estigmatizados da cultura e da religião, impondo à mulher,

consequentemente, uma vida de subjugação. (Campos 2010, p. 37)

Publicado no site da ONU, no ano de 1975, a Organização das Nações Unidas

constituiu no México a Primeira Conferência Mundial sobre a Mulher, e ficou conhecido

como Ano Internacional da Mulher nos anos de 1975 a 1985.

No dia 03 de setembro de 1981 entrou em vigor a adoção da Convenção sobre

Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Mulher, por parte da Assembleia

Geral da ONU em 1979 a partir dessa conferência. Essa Convenção foi promulgada no Brasil

14

pelo Decreto nº 377/2002, ficou provado que mesmo com diversos instrumentos

internacionais que tendiam garantir direitos e a recriminação de qualquer discriminação às

mulheres, elas continuavam sofrendo preconceitos, atos violentos, etc.

Conforme opinião do autor:

Estabeleceu a referida convenção que a discriminação contra a mulher viola os

princípios da igualdade de direitos e do respeito à dignidade humana, dificultando a

participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política,

social, econômica e cultural de seu país, constituindo um obstáculo ao aumento do

bem-estar da sociedade e da família e impedindo a mulher de servir o seu país e a

Humanidade em toda a extensão das suas possibilidades (ANDREUCCI, 2013,

p.369).

Foi apenas em 1984, que o Brasil aderiu essa convenção, fazendo reserva ao direito de

família que, mais tarde, foi retirada, e a convenção se concluiu completamente somente em

1994, sendo aprovada pelo Senado Federal e promulgada pelo Presidente da República.

A Convenção da Mulher exibiu algumas recomendações, e a mais importante foi que

os Estados Unidos que participava, deveriam instituir legislações especiais que abordassem

violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa convenção deveria ser um exemplo para

que os Estados determinassem parâmetros para eliminação e punição para coibir os atos de

violência e discriminação contra as mulheres.

Em 1993, a violência contra a mulher ficou formalmente definida como violação aos

direitos humanos na Conferência das Nações Unidas sobre Direitos Humanos. No ano de

1994, a ONU abraçou a Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência

contra a mulher, chamada de Convenção de Belém do Pará.

Passada essa história de luta internacional por convenções e tratados para que fossem

erradicadas a discriminação e a violência e que os Estados criassem o seu próprio meio de

punir, em 2006 o Brasil sancionou a Lei 11.340/2006, chamada de Lei Maria da Penha.

Foi através dessa lei que o mundo inteiro conheceu a história que deu o nome a essa

lei Maria da Penha. Ela é cearense, biofarmacêutica e foi casada com um professor chamado

Marco Antônio Viveiros.

Publicado no site Porta Brasil, no ano de 1983, Marco Antônio, até então seu marido,

tentou assassiná-la atingindo-a com um tiro em sua costa enquanto dormia e dessa tentativa de

assassinato Maria da Penha ficou paraplégica, na época seu marido aduziu que foi ferido por

assaltantes. A segunda tentativa ocorreu meses após do disparo, onde empurrou sua cadeira de

roda embaixo do chuveiro tentando eletrocutá-la.

15

No início de junho do ano de 1983, o caso começou a ser investigado, mas o

Ministério Público só denunciou em setembro de 1984. Oito anos após o crime, ocorreu o

julgamento e em 1991, o advogado de defesa conseguiu anular o julgamento.

Marco Antônio foi julgado culpado e condenado a 10 anos de reclusão, no ano de

1996, mas conseguiu recorrer. A justiça brasileira não deu decisão ao caso após 15 anos da

tentativa de assassinato e nem justificou o porquê de tanta demora.

Em 2002, Marco Antônio foi preso, pois Maria da Penha enviou o caso a Comissão

Interamericana de Direitos Humanos e pela primeira vez sua denúncia de violência doméstica

foi acatada, porém Viveiros cumpriu dois anos dos 10 anos que foi condenado.

Dessa denúncia a corte, o Brasil acabou sendo condenado por omissão e negligência

ao caso de violência doméstica e advertido a criar uma legislação que fosse específica para a

violência doméstica.

Na opinião do autor:

Essa violência doméstica é silenciosa, não porque o chicote não tenha feito barulho,

mas porque o choro delas foi embargado. Porque elas, ou por medo ou por vergonha,

continuam a não revelar tudo que se passa, e isso não é só numa classe social

(ROCHA 2010, p. 15).

Com isso, em setembro de 2006, a Lei 11.340/06 entrou em vigor, fazendo com que o

os casos de violência doméstica deixassem de serem tratados como crime de menor potencial

ofensivo.

1.3.A mulher nos dias atuais

Após muitas lutas e de ter um objetivo de reconhecimento de seus direitos, foi que a

Constituição Federal Brasileira de 1988 certificou os direitos humanos e os direitos das

mulheres.

Segundo a autora Ana Cláudia Pereira:

A sensação de que muita coisa mudou na vida das mulheres como as políticas

públicas que veio como vitória, ao contrário das gerações antepassadas, hoje tem o

direito ao voto, o direito de ir e vir, até dirigir, trabalhar. Antes das conquistas a

mulher tinha que pedir autorização aos seus maridos, tem a lei que protege as

mulheres da violência, hoje a mulher não precisa mais pedir autorização de seus pais

ou maridos para fazer qualquer coisa ou negócios, tudo foi adquirido com muitas

lutas e conquistas pelas próprias mulheres (PEREIRA, 2011).

Na opinião do autor:

No momento em que a sociedade entender que igualdade é o respeito à diferença,

seremos todos homens e mulheres iguais. Estaremos igualmente libertos. A

igualdade é o pressuposto da liberdade, sendo esses os requisitos indispensáveis para

16

o desenvolvimento pleno e sadio da família, a qual deve valorar e praticar a

solidariedade e o afeto, elementos estruturantes do ser humano (DIAS, 2010, p.1).

Apesar de o papel das mulheres estarem se tornando maior e cada vez melhor, os

desafios a serem enfrentados ainda são muitos, pois é preciso melhorar as condições das

mulheres no trabalho, efetuar os direitos que eles têm sobre seu próprio corpo, sobre sua

liberdade individual e além disso, concretizar a proteção das mulheres ameaçadas em seu

cotidiano.

Segundo Brasil:

O aumento da escolaridade feminina foi uma conquista das mulheres, que ao longo

de todo o século XX se empenharam para ter acesso às escolas e universidades. Ao

analisar o acesso das mulheres a educação, verifica-se que, diferentemente de outros

países em desenvolvimento, de maneira geral, no Brasil, as mulheres estão em

igualdade de condições em relação aos homens ou apresentam níveis de escolaridade

superiores (BRASIL, 2004, p.51).

Conforme outros autores:

As mulheres estão quase todas inseridas nos postos de trabalho, já são até motoristas

de ônibus, professoras, bancárias, empregadas domésticas, autônomas e advogadas,

etc. Assim como a mulher e o homem podem trabalhar em qualquer função, os

direitos são iguais, isto é nossa realidade nos dias atuais, as mulheres estão

concentradas em algumas profissões e funções que pagam os menores salários, ainda

são as mais precárias (SANTOS, JACOB, SANTIAGO, 2008).

A violência contra a mulher é um fato que aumenta a cada dia na sociedade, os

companheiros, maridos e ex-companheiros são seus próprios agressores. É nesse âmbito de

desigualdade que a Lei Maria da Penha é criada com o propósito de igualar as relações sociais

entre homens e mulheres e garantir a todas elas um direito de fato.

17

2. AS DIFERENTES FORMAS DE VIOLÊNCIA CONTRA AS

MULHERES

2.1.Conceito de violência doméstica

Segundo a Organização Mundial da Saúde, OMS, (a violência é caracterizada por uso

de força física de poder e ameaça contra si mesmo ou então contra outra pessoa, que pode

resultar em morte, danos psicológicos, lesões corporais).

De acordo com os autores:

A violência contra a mulher pode ser considerada uma doença social provocada por

uma sociedade que privilegia as relações patriarcais marcadas pela dominação do

sexo masculino sobre o feminino (TELES E MELO, 2003, p.114).

E conceitua mais:

Violência doméstica é a que ocorre dentro de casa, nas relações entre as pessoas da

família, entre homens e mulheres, pais/mães e filhos, entre jovens e pessoas idosas.

Podemos afirmar que, independentemente da faixa etária das pessoas que sofrem

espancamentos, humilhações e ofensas nas relações descritas, às mulheres são o alvo

principal. (TELES E MELO, 2003, p. 19).

O artigo 5º da Lei Maria da Penha conceitua o termo violência doméstica contra

mulher qualquer “ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento

físico, sexual ou psicológico e danos moral patrimonial”.

Para a aplicação concreta da lei, é preciso esclarecer alguns pontos, vale destacar o

termo “baseado no gênero”.

Esse termo “gênero”, usado pelo legislador é utilizado para caracterizar o quesito do

sexo masculino e feminino. Segundo LOURO (1996, p. 09) define gênero:

Gênero não pretende significar o mesmo que sexo, ou seja, enquanto sexo se refere à

identidade biológica de uma pessoa, gênero está ligado à sua construção social como

sujeito masculino ou feminino. Não se trata mais de focalizar apenas as mulheres

como objeto de estudo, mas sim os processos da feminilidade e masculinidade, ou os

sujeitos femininos e masculinos.

No conceito de outro autor, define:

O gênero é concebido como uma forma de dar significado as relações de dominação

e de poder que terminam por ensejar as desigualdades de gênero, que concederam ao

longo do tempo aos homens funções nobres e valorizadas pela sociedade restando as

mulheres papeis menos apreciados social e culturalmente (CAMPOS, 2007, p.212).

Em um julgado de conflito de competência, a jurisprudência também apresenta o

conceito de gênero vinculado ao feminino e masculino:

TJDF: “A violência de gênero (que se faz presente nos conceitos e definições da Lei

11.340/2006) tem como paradigma a violência-preconceito, a violência-

18

discriminação, aquela cujo escopo é a objetalização da vítima. Se no contexto em

que o suposto delito foi perpetrado, resta evidente a vulnerabilidade e subjugação da

vítima, bem assim está demonstrando que o crime foi cometido em razão do gênero,

declara-se competente o juízo do 1º juizado de violência domestica e familiar contra

a mulher de Brasília/DF”. (Conflito de Jurisdição 20140020007837CCR, Câmara

Criminal, rel. Romão C. Oliveira, DJ 24.02.2014).

Sendo assim, o termo “baseado no gênero” encontrado no artigo 5º da Lei Maria da

Penha, é aquela violência praticada pelo fato da pessoa ser do sexo feminino e de situação de

hipossuficiência, ou seja, a violência-preconceito e a violência-discriminação, caso contrário

não se aplica a Lei Maria da Penha.

Segundo BRASIL (2004) a violência contra as mulheres se constitui em uma das

principais formas dos direitos humanos, consequentemente atinge seus direitos à vida, à

dignidade, a integridade física da mulher, sua saúde. É um fenômeno que atinge grandes

números das mulheres de todo mundo, de diferentes partes.

Para o autor:

Parece que a violência tornou-se um hábito, parte do cotidiano e, como tal banal...

Repetitiva... Coisa de pobre para alguns... Coisa de bandidos e de traficantes para

outros. Embora banalizada e naturalizada, a violência vem alimentando a cultura do

medo, levando as pessoas, sutilmente, a tecerem novas formas de relações sociais e

novos padrões éticos. (Baierl 2004, p. 51 e 52).

Portanto, a violência doméstica se refere a uma desigualdade entre o homem e a

mulher, problema esse que percorre por muitos anos só porque o sexo masculino sempre foi

tratado como superior, dando o “direito” de controlar, agredir e até acabar com a vida de uma

mulher por ser inferior a ele, sendo tratada como submissa, sexo frágil, e tratando desse tipo

de violência fica caracterizado a violência de gênero pelo fato da vítima ser mulher.

Por fim, o juiz só vai aplicar a Lei Maria da Penha caso a mulher esteja em situação de

violência preconceito em razão de ser mulher e situação de hipossuficiência.

2.2.Formas de violência doméstica e familiar contra a mulher

A Lei 11.340/06 elencou alguns tipos de violência doméstica, antes de elenca-las, é

importante ressaltar que o artigo 5º referenciou os ambientes que a mulher pode ser agredida,

por isso é de suma importância estudar o referido artigo e seus incisos para analisar as formas

de violências encontradas na lei.

Segue o artigo 5º e seus respectivos incisos:

19

Art. 5º Para os efeitos desta Lei configura violência doméstica e familiar, contra a

mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão,

sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

I- No âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio

permanente de pessoas, com ou sem vinculo familiar, inclusive as esporadicamente

agregadas;

O inciso I da Lei Maria da Penha é entendido como unidade doméstica o ambiente da

casa, domicílio do qual a mulher mora, e exige-se que a agressão, a violência ocorra no

âmbito do lar. O agressor pode ser até mesmo um agregado da família, dispensando-se o

vínculo parentesco entre o agressor e a vítima.

Conforme entendimento jurisprudencial:

Na jurisprudência: TJRS: “Como decidiu esta Corte em situação fática similar a dos

autos, „(...) Para configurar a incidência da Lei Maria da Penha, não é necessário que

o agressor e agredida tenham vinculo sanguíneo ou relação afetiva, bastando, para

tanto, que este se valha do ambiente doméstico para efetivar a agressão. No caso, a

partir dos dados até então coligidos, tem-se que se trata de vítima mulher, com

ofensor do sexo masculino, que integravam o mesmo ambiente familiar (eram

cunhados e vizinhos), razão por que há a incidência da Lei Maria da Penha.

Competência da Vara Criminal (...)‟ DECISÃO: Conflito negativo de competência

improcedente. Unânime.” (Conflito de Jurisdição 70059141292, 1ª Câmara

Criminal, rel. Sylvio Baptista Neto, j. em 29.01.2014).

Para o autor NUCCI (2014, p.441) “unidade doméstica é o local onde há o convívio

permanente de pessoas, em típico ambiente familiar, vale dizer como se família fosse, embora

não haja necessidade de existência de vínculo familiar, natural e civil”.

II- No âmbito familiar, compreendida como a comunidade formada por indivíduos

que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou

por vontade expressa;

No inciso II, a lei trata de violência no âmbito familiar, diferente do inciso I que não

depende do vínculo familiar, natural ou civil, no inciso II é necessário que haja vínculo de

parentesco com o agressor, ou seja, a violência tem que ter ocorrido no âmbito familiar.

Assim, nesse inciso, o indivíduo independe de sexo, seja homem ou mulher. O código

civil elenca todas as formas de família, sendo elas: família anaparental, monoparental

compreendendo o reconhecimento da união homoafetiva como família, sendo assim lésbicas,

transexuais, portando identidade feminina engloba a violência no âmbito familiar.

III- Em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha

convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

20

O inciso III sofreu algumas divergências entre alguns autores pelo fato de qualquer

relação íntima de afeto já estaria excluindo os outros incisos do artigo, pois a lei dita uma

relação familiar e não é possível não ser falado sobre afeto entre as partes.

Para NUCCI (2014, p.412) a relação íntima de afeto é “o relacionamento estreito entre

duas pessoas, fundamentado em amizade, amor, simpatia, dentre outros sentimentos de

aproximação”.

Neste inciso, os agressores podem ser os ex-maridos, ex-namorados, e mesmo o

agressor e a vítima não conviver no mesmo ambiente, exista entre eles a relação íntima de

afeto o qual se refere o inciso III.

Conforme o autor:

Diante desta nova realidade não há como restringir o alcance da previsão legal.

Vínculos afetivos que refogem ao conceito de família e de entidade familiar nem por

isso deixam de ser marcados pela violência. Assim, namorados e noivos, mesmo que

não vivam sob o mesmo teto, mas resultando, a situação de violência do

relacionamento, faz com que a mulher mereça o abrigo da Lei Maria da Penha. Para

a configuração de violência doméstica é necessário um nexo entre o agressor e a

situação que a gerou, ou seja, a relação intima de afeto deve ser a causa da violência

(DIAS, 2007, p.45).

Conforme a jurisprudência reafirma:

A Lei 11.340/06 buscou proteger não só a vítima que coabita com o agressor, mas

também aquela que, no passado já tenha convivido no mesmo domicilio,

contanto que haja nexo entre a agressão e a relação intima de afeto que já

existiu entre os dois. (CC 102832/MG, Min. Napoleão Nunes Maia Filo, Terceira

Seção, julgado em 25/03/2009). Para a configuração de violência domestica, basta

que estejam presentes as hipóteses previstas no artigo 5º da Lei 11.340/06 (Lei

Maria da Penha), dentre as quais não se encontra a necessidade de coabitação entre

autor e vítima. (HC 115857/MG, Min. Jane Silva (Des. Conv. Do TJ/MG), Sexta

Turma, julgado em 16/12/2008).

Após o artigo 5º, a Lei trouxe em seu artigo 7º as violências que a mulher poderá vir a

sofrer. Para o direito penal, violência é física ou corporal que se trata do emprego de força

física sobre a vítima, facilitando o agressor exercer o crime e a grave ameaça fica de escanteio

do termo violência, pois são meios que reduzem a possibilidade de resistência da vítima.

A Lei Maria da Penha caracteriza a violência em sentido amplo, pois abrange

violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral previsto no artigo 7º. É um rol

exemplificativo, pois o artigo reconhece outros tipos de violência doméstica que não estão no

artigo. Para que ocorra a violência, basta a caracterização de um inciso do artigo 7º,

21

combinado com o artigo 5º da lei, sendo assim, não é necessário a cumulação de todos os

incisos.

2.2.1. Violência Física

Prevista no inciso I do artigo 7ª, a violência física é a primeira espécie de violência,

que abrange desde uma via de fato até o homicídio. Compreende-se que “violência física é

emprego de força física contra o corpo da vítima com intuito de causar lesão à integridade ou

a saúde da vítima” (LIMA, 2014, p. 895).

Conforme autor:

A violência física é “entendida como qualquer conduta que ofenda a integridade ou

saúde corporal”. É o tipo de violência com maior facilidade de interpretação, pois

além de ser visível, deixando marcas pelo corpo da vítima (através de tapas, socos,

pontapés, uso de armas, etc.), tem uma proximidade do conceito de violência aceito

comumente pela população, dando a ideia de que a violência é como uma “ruptura

de integridade da vítima” (SAFFIOTI, 2004, p. 17).

É a forma insignificante com a violação da saúde da vítima até uma forma drástica,

que é o homicídio.

2.2.2. Violência Psicológica

O inciso II do artigo 7º prevê a segunda espécie de violência, a violência psicológica.

A lei conceitua como sendo qualquer conduta que cause dano emocional e diminuição da

autoestima ou que prejudique e perturbe o desenvolvimento ou degrade ou controla suas

ações, comportamentos, crenças e decisões, por intermédio de ameaça, humilhação,

isolamento, constrangimento, manipulação, vigilância constante, chantagem, exploração de

direito de ir e vir ou qualquer outro que cause danos à saúde psicológica.

Segundo LIMA (2014, p.895), a espécie de violência psicológica é a que “o agressor

procura causar danos emocionais a mulher, que geralmente é feito por meio de ameaça, de

humilhações, discriminação que tem como objetivo final reduzir a autoestima da vítima”.

Neste inciso, é possível observar citações de alguns crimes como o constrangimento

ilegal, baseado no artigo 146 do CP, cárcere privado, ameaças, entre outros.

22

2.2.3. Violência Sexual

A Lei Maria da Penha expõe a violência sexual, em seu art. 7º, inciso III, como sendo:

Qualquer conduta que [...] constranja [a mulher] a presenciar, a manter ou a

participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou

uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua

sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao

matrimônio, à gravidez, ao aborto, ou à prostituição, mediante coação, chantagem,

suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais

e reprodutivos.

A terceira espécie de violência que a lei estabelece é a violência sexual. Vale destacar

que o crime ocorrido contra a liberdade sexual, previsto no código penal no contexto de

violência doméstica não altera e nem afasta a espécie elencada pelo Código Penal, ou seja,

tais crimes continuam sendo penalizados pelo código penal.

Porém, a lei não qualifica como violência sexual somente o ato de manter conjunção

carnal com violência ou a prática de atos libidinosos violentos, pode ser qualquer desses e a

lei ainda cita que os atos de impedimentos de usar os métodos contraceptivos e outros

métodos, como usar a camisinha, para preservar a saúde, também pode caracterizar uma

violência sexual.

2.2.4. Violência Patrimonial

A quarta espécie de violência é a patrimonial, compreendida como qualquer conduta

que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de

trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os

destinados a satisfazer suas necessidades. É possível observar que essa espécie de violência

não há emprego de violência física ou corporal, sendo caracterizadas hipóteses dos crimes

patrimoniais sem grave ameaça.

Ocorre uma divergência doutrinária em relação às aplicações das imunidades absolutas

e relativas aos crimes patrimoniais praticados no âmbito doméstico e familiar contra a mulher

sem ocorrer o emprego de violência ou grave ameaça.

Segundo LIMA (2014, p.897):

Uma primeira corrente entende que as hipóteses de violência doméstica e familiar

contra a mulher não são aplicáveis as imunidades absolutas (art.181) e relativas

(art.182) previstas no Código Penal. É nesse sentido a lição de Maria Berenice Dias.

Para a autora, como a violência patrimonial é uma das formas de violência

domestica e familiar contra a mulher (Lei nº11.340/06, art. 7º, IV), quando a vítima

23

for mulher e mantiver com o autor da infração vínculo de natureza familiar, não será

possível a aplicação das referidas imunidades. Destarte, como o furto não mais será

tolerado nas relações afetivas, o agressor pode ser objeto de persecução penal,

sujeitando-se ademais, a aplicação de circunstancia agravante do art. 61, II, “f” do

CP; 28.

A segunda corrente sustenta que a Lei Maria da Penha não trouxe nenhum dispositivo

que proíba a aplicação dos artigos 181 e 182 do código penal, firmando que as imunidades

relativas e absolutas continuam sendo aplicadas para as infrações no âmbito de violência

doméstica e familiar contra a mulher.

2.2.5. Violência Moral

A última espécie de violência que trás o artigo 7º é a moral, que abrange como

“qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”. Ou seja, crimes como calúnia

que é imputar falsamente alguém; difamação, que é imputar a alguém fato ofensivo a sua

reputação e injúria que ofende a dignidade de alguém.

A competência para esses crimes seria do Juizado Especial Criminal, pois tem a pena

máxima igual ou inferior a dois anos, mas a Lei Maria da Penha veda a aplicação em qualquer

situação, fundamentado no artigo 41 da lei.

2.3.Os sujeitos dos crimes domésticos

Pode-se observar que há dois tipos de sujeitos, o passivo e o ativo. Segundo o artigo

5º, I-III, entre os sujeitos deve haver uma relação de afetividade, que decorre de um

relacionamento amoroso, de uma convivência no lar ou até mesmo um parentesco em outro

grau, a título de exemplo, o pai, padrasto, irmão, cunhado, entre outros.

De acordo com parágrafo único do artigo 5º, as preferências sexuais são irrelevantes

na classificação dos sujeitos do crime. Vale destacar um assunto que às vezes é polêmico, a

mulher que optou pela opção sexual diferente da que é tradicional, essa não perde a proteção

penal, ela não precisa ser titulada mãe ou esposa ou namorada para estar amparada pela lei,

basta ser do sexo feminino. Semelhantemente o agressor não pode usar sua opção sexual para

se isentar do crime.

24

2.3.1. A vítima segundo o Sistema Penal Brasileiro

Segundo Stela Valéria (2008) “a palavra vítima vem do latim victima, que significa a

pessoa ou animal sacrificado ou destinado aos sacrifícios, como pedido de perdão dos pecados

humanos. É derivada do verbo vincire, que significa atar ou amarrar, vez que o animal ou

pessoa a ser sacrificado deveria ser amarrado”.

No Dicionário Aurélio, vítima significa: “homem ou animal imolado em holocausto

aos deuses. Pessoa arbitrariamente condenada a morte, ou torturada. Pessoa ferida ou

assassinada, ou que sucumbe a uma desgraça, ou morre em acidente, epidemia. Tudo quanto

sofre dano”.

É possível constatar que a palavra vítima é conceituada como uma pessoa que sofre

com alguma consequência ilícita, infração, ou de outros tipos. Atualmente esse conceito ficou

mais abrangente, sendo consideradas as pessoas físicas, jurídicas, ente coletivo que foram

lesados por ação ou omissão de algum sujeito, constituindo infração penal.

O Sistema Prisional Brasileiro discorre sobre a ressocialização do criminoso, não

havendo preocupação com a vítima, discordando das linhas trazidas pelo direito internacional

da Declaração de 1948. Apesar de terem ocorridos alguns progressos, a vítima ainda não é a

prioridade, ficando em segundo plano.

2.3.2. O perfil do agressor da violência doméstica

Na maioria das vezes o agressor é a figura masculina e a mulher acaba sendo a vítima

da violência doméstica. A característica que predomina esse tipo de violência é o fato dele ter

ou tido relações afetivas e intimas com a mulher.

Pode ser qualquer tipo de homem, do mais rico ao mais pobre. O agressor muitas

vezes aparenta ser um homem de boa reputação, idônea, não demonstrando nenhuma postura

violenta, é um homem acima de qualquer suspeita, mas que dentro do lar agride a mulher.

Normalmente a mulher pede ajuda a algum conhecido, amigos, vizinhos, parentes, e eles

acabam não acreditando que um homem de boa aparência pratique tais atos violentos.

Geralmente são homens possessivos e ciumentos, que tem as mulheres como um

objeto. Segundo o relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito, são homens que quando

pequenos tinham seus pais autoritários e agressivos, sendo eles próprios vítimas de violência

quando menores.

25

É impossível descrever um perfil característico de um agressor, pois eles não mostram

que praticam tais atos violentos e, apesar de ser difícil de explicar o porquê desse tipo de

violência, é possível observar que alguns homens tem necessidade de dominar e controlar a

vida da mulher, é um sentimento de poder sobre elas e acabam liberando a raiva violentando-

as, pois acham que elas conquistando seu espaço ele estaria perdendo a posição de chefe de

família. Diante de algumas pesquisas, é possível afirmar que o maior índice de agressores se

encontra na classe média e baixa.

Os agressores se dividem entre alguns de transtornos, a título de exemplo transtorno

explosivo da personalidade, alcoólatras, dependentes químicos, entre outros. Há ainda aqueles

que negam a qualquer custo o tipo de comportamento agressivo, eles batem em suas

mulheres, mas afirmam que não as agridem, e alguns atribuem à vítima a culpa por eles terem

praticado esses atos de extrema violência.

Um estudo realizado por J. Medina, Garrido Stangeland e Redondo, conclui que o

consumo de álcool é a maior causa da violência abrangendo os agressores num percentual de

60%. A violência acontece quando o agressor tem uma dependência ou consome em excesso

o álcool, eles acabam perdendo a capacidade e agridem suas companheiras por qualquer

motivo. Nota-se então que o consumo do álcool tem sido um dos maiores fatores dos

agressores praticarem violência doméstica.

No entanto, apesar de na maioria o agressor ser a figura masculina, houve um caso em

que a agressora foi a mulher, o caso ocorreu em Cuiabá-MS e a decisão foi proferida pelo juiz

Mario Kono de Oliveira, conforme decisão:

Decisão interlocutória própria padronizável proferida fora de audiência. Autos de

1074/2008 Vistos, etc. Trata-se de pedido de medidas protetivas de urgência

formulada por CELSO BORDEGATTO, contra MÁRCIA CRISTINA FERREIRA

DIAS, em autos de crime de ameaça, onde o requerente figura como vítima e a

requerida como autora do fato.

O pedido tem por fundamento fático, as varias agressões físicas, psicológicas e

financeiras perpetradas pela autora dos fatos e sofridas pela vítima e, para tanto

instrui o pedido com vários documentos como: registro de ocorrência, pedido de

exame de corpo de delito, nota fiscal de conserto de veículo avariado pela vítima, e

inúmeros e-mails difamatórios e intimidatórios enviados pela autora dos fatos à

vítima. Por fundamento de direito requer a aplicação da Lei de nº 11.340,

denominada “Lei Maria da Penha”, por analogia, já que inexiste lei similar a ser

aplicada quando o homem é vítima de violência doméstica. Resumidamente, é o

relatório.

DECIDO: A inovadora Lei 11.340 veio por uma necessidade premente e

incontestável que consiste em trazer uma segurança à mulher vítima de violência

doméstica e familiar, já que por séculos era subjugada pelo homem que, devido a

sua maior compleição física e cultura machista, compelia a “fêmea” a seus

caprichos, à sua vilania e tirania.

Houve por bem a lei, atendendo a súplica mundial, consignada em tratados

internacionais e firmados pelo Brasil, trazer um pouco de igualdade e proteção à

mulher, sob o manto da Justiça. Esta lei que já mostrou o seu valor e sua eficácia,

26

trouxeram inovações que visam assegurar a proteção da mulher, criando normas

impeditivas aos agressores de manterem a vítima sob seu julgo enquanto a morosa

justiça não prolatasse a decisão final, confirmada pelo seu transito em julgado. Entre

elas a proteção à vida, a incolumidade física, ao patrimônio, etc.

Embora em número consideravelmente menor, existem casos em que o homem é

quem vem a ser vítima da mulher tomada por sentimentos de posse e de fúria que

levam a todos os tipos de violência, diga-se: física, psicológica, moral e financeira.

No entanto, como bem destacado pelo douto causídico, para estes casos não existe

previsão legal de prevenção à violência, pelo que requer a aplicação da lei em

comento por analogia. Tal aplicação é possível?

A resposta me parece positiva. Vejamos: É certo que não podemos aplicar a lei penal

por analogia quando se trata de norma incriminadora, porquanto fere o princípio da

reserva legal, firmemente encabeçando os artigos de nosso Código Penal: “Art. 1º.

Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação

legal.”

Se não podemos aplicar a analogia in malam partem, não quer dizer que não

podemos aplicá-la in bonam partem, ou seja, em favor do réu quando não se trata de

norma incriminadora, como prega a boa doutrina: “Entre nós, são favoráveis ao

emprego da analogia in bonam partem: José Frederico Marques, Magalhães

Noronha, Aníbal Bruno, Basileu Garcia, Costa e Silva, Oscar Stevenson e Narcélio

de Queiróz” (DAMÁSIO DE JESUS – Direito Penal - Parte Geral – 10ª Ed. pag. 48)

Ora, se podemos aplicar a analogia para favorecer o réu, é óbvio que tal aplicação é

perfeitamente válida quando o favorecido é a própria vítima de um crime. Por

algumas vezes me deparei com casos em que o homem era vítima do descontrole

emocional de uma mulher que não media esforços em praticar todo o tipo de

agressão possível contra o homem. Já fui obrigado a decretar a custódia preventiva

de mulheres “à beira de um ataque de nervos”, que chegaram a tentar contra a vida

de seu ex-consorte, por pura e simplesmente não concordar com o fim de um

relacionamento amoroso.

Não é vergonha nenhuma o homem se socorrer ao Pode Judiciário para fazer cessar

as agressões da qual vem sendo vítima. Também não é ato de covardia. È sim, ato de

sensatez, já que não procura o homem/vítima se utilizar de atos também violentos

como demonstração de força ou de vingança. E compete à Justiça fazer o seu papel

de envidar todos os esforços em busca de uma solução de conflitos, em busca de

uma paz social.

No presente caso, há elementos probantes mais do que suficientes para demonstrar a

necessidade de se deferir a medidas protetivas de urgência requeridas, pelo que

defiro o pedido e determino à autora do fato o seguinte: 1. que se abstenha de se

aproximar da vítima, a uma distância inferior a 500 metros, incluindo sua moradia e

local de trabalho; 2. que se abstenha de manter qualquer contato com a vítima, seja

por telefonema, e-mail, ou qualquer outro meio direto ou indireto. Expeça-se o

competente mandado e consigne-se no mesmo a advertência de que o

descumprimento desta decisão poderá importar em crime de desobediência e até em

prisão. I.C. (CONSULTOR JURÍDICO, 2008)

De acordo com o juiz, apesar desses casos serem minoritários, existem casos em que o

homem é agrido pela sua companheira, sofrendo qualquer uma dessas agressões seja ela

física, moral, financeira.

2.3.3. O perfil das vítimas da violência doméstica

27

Pesquisas mostram que não existe um perfil determinado de vítima e nem de agressor.

Mas é possível verificar alguns comportamentos que se manifestam frequentemente nos casos

de violência contra a mulher.

A violência se expressa de forma rápida e continuada, na maioria das vezes os

agressores são homens, maridos, ex-maridos, namorados, ex-namorados, ex-companheiros,

companheiros da vítima, que em sua infância sofreram algum tipo de violência, maus-tratos e

no futuro agridem suas mulheres.

As vítimas possuem baixa autoestima não se achando bonitas, não querem sair de

casa, apresentam problemas de saúde, são chantageadas por seus maridos e por terem medo

deles acabam cedendo às pressões, sentindo-se incapazes de denuncia-los, sujeitando a viver

uma vida de pânico e temor.

São mulheres que precisam de ajuda para encarar o problema e encontrar alguma

solução eficaz. A violência traz grandes consequências para as mulheres, não só físicas, mas

também psicológicas, pois vem gerando esse dano psíquico elas têm a própria vida e a

integridade física ameaçadas, obtendo uma lesão física grave, impedindo de ter uma vida

feliz.

As mulheres que trabalham fora são as mais conscientes dos problemas, pois com essa

independência econômica encorajam-nas a reagirem e não aceitarem esses tipos de problemas

e assim buscar uma solução. No Brasil a violência está correlacionada à situação econômica

de pobreza, ao nível baixo de escolaridade e a dependência econômica que as mulheres têm

de seus maridos. Muitas mulheres sentem vergonha de reconhecer e conversar com as amigas,

família, que seu companheiro, marido, ex-marido, praticam violência e acabam não

denunciando se submetendo a uma vida sofrida.

28

3. DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA DA LEI MARIA DA PENHA

Para dar uma maior efetividade a proteção da mulher que é vítima da violência

doméstica, o legislador elencou medidas protetivas de urgência. Essas medidas não tem

natureza de pena, mas sim natureza civil que intervém no âmbito penal, civil, administrativa e

na punição da violência doméstica.

A lei traz alguns dispositivos que tem o objetivo de combater a impunidade do

agressor e proteger a mulher vítima da violência doméstica. A lei trouxe medidas para as

vítimas e agressores, dividindo-se as medidas protetivas para que o agressor cumpra e as

medidas para as vítimas, restabelecendo direitos que foram retirados pelo agressor.

3.1.Medidas protetivas obrigatórias do agressor

As medidas protetivas de urgência que são obrigatórias ao agressor estão baseadas no

artigo 22 da Lei 11.340/06.

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos

termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou

separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão

competente, nos termos da Lei.

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) Aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o

limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) Contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de

comunicação;

c) Frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e

psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de

atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

Essas são medidas dirigidas especialmente ao agressor, que fica sujeito as restrições e

obrigações. Serão aplicadas de forma cumulativa ou de forma separada.

29

3.1.1. Suspensão da posse ou restrição do porte de armas

A Lei 10.826/06 regulamenta porte de arma. Conforme o estatuto, usar ou possuir

arma é proibido e para obter a posse de arma é indispensável o registro despachado pela

Policia Federal e dependendo de certas funções sejam elas públicas ou privadas, algumas

pessoas adquirem esse direito do registro de obter porte de armas.

Essa medida foi instalada porquê o legislador se preocupou pelo fato da arma poderia

estimular o agressor a agredir a integridade física da vítima de alguma determinada situação

de violência doméstica.

Para que haja o desarmamento do agressor, somente é possível de um pedido da

própria vítima a uma medida protetiva e é necessário que o agressor possua a posse da arma

com o devido registro na Polícia Federal, e caso a posse não esteja legalizada, o agressor

responderá pelo crime dos artigos 12, 14 ou 16 do Estatuto do Desarmamento, por estar

violando os dispositivos legais.

Sendo deferida a medida protetiva, o juiz comunica o órgão competente sobre a

decisão proferida, chamado de SINARM (Sistema Nacional de Arma) que delega à Polícia

Federal a competência para autorizar ou não o porte de arma de fogo no território nacional.

Se o agressor rejeitar a entrega da arma voluntariamente, a autoridade judiciária irá

determinar o pedido de busca e apreensão.

Na opinião da autora:

“Sendo legal a posse e o uso da arma de fogo pelo agressor, denunciando à vítima a

autoridade policial a violência e justificando a necessidade de desarma-lo, por temer

pela própria vida, será instalado expediente a ser remetido ao juízo. Deferido o

pedido e excluído o direito do ofensor manter a posse da arma, ou sendo, limitando o

seu uso, deve-se comunicar a quem procedeu ao registro e concedeu a licença: o

Sistema Nacional de Armas (SINARM) e a Policia Federal. Caso o agressor tenha

direito ao uso de arma de fogo, segundo o rol legal, o juiz comunicará ao respectivo

órgão, corporação ou instituição que impôs. O superior imediato do agressor fica

responsável pelo cumprimento da determinação judicial sob pena de incorrer nos

crimes de prevaricação ou desobediência. A restrição é válida para evitar tragédia

maior. Se o marido agride a esposa, de modo a causar lesão corporal, se possuir

arma de fogo, é possível que, no futuro progrida para o homicídio” (DIAS, 2008,

p.82).

A preocupação do autor foi tanta que ele quis cuidar de todas as formas da integridade

física da mulher vítima da violência doméstica, prevenindo que o agressor venha usar a arma

que possui em futuro.

30

3.1.2. Afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida

O agressor deve se afastar do lugar onde convive com a mulher, não importando qual

seja o ambiente nem domicílio. Esse afastamento é uma prevenção adiantada de um possível

crime que possa vir ocorrer diante do convívio com o agressor.

Esse afastamento do agressor do local de convivência com a mulher permanece até

constituir o cumprimento do mandado de separação de corpos.

3.1.3. Proibição de determinadas condutas

Sobre essas determinadas condutas que a lei cita é os acesso a vítima e aos familiares e

das testemunhas, firmando uma distância mínima entre o agressor e proibi-lo de manter

contato com a ofendida e proibir de frequentar determinados lugares com o fim de preservar a

integridade física e psicológica da vítima.

Será determinada pelo juiz essa conduta do agressor não se aproximar da ofendida,

nem dos seus familiares e testemunhas, é um limite imposto de aproximadamente de 100

metros.

Essa conduta é necessária porque a vítima, após ter sofrido a violência pode continuar

mantendo algum tipo de relação com o agressor, que poderá ser seguida de mais violência e

ameaças, não só a vítima, mas também aos seus próximos, como família e testemunhas que

presenciou a violência, pois mesmo com a medida protetiva imposta, o agressor pode

perseguir a vítima em outros locais que a vítima possa estar. O legislador visou a proteção da

vítima, dos familiares e das testemunhas.

O que fica imposto para o agressor é somente a não aproximação da vítima e não os

lugares que devem ser evitados, pois assim seria possível infringir a tal imposição.

O legislador criou uma outra conduta que é a proibição de contato com a vítima,

familiares e testemunhas. Quando o legislador editou essa medida, o objetivo foi proteger e

preservar alguma situação que colocaria em risco a vítima, além disso, proteger do

comportamento do agressor que poderia fazer novas ameaças e praticar uma nova violência

física.

O contato que a lei refere é amplo, visando todos os tipos de contatos, como além do

físico, por telecomunicação, mensagens de textos no celular, redes sociais, e-mails, entre

outros.

31

Quando se tratar de violação dessas medidas protetivas, deverá ser comunicado a

Autoridade Policial, ao Ministério Público ou a Autoridade Judiciária, podendo ser decretada

do juiz a prisão preventiva do agressor para manter a ordem pública, entretanto, além do

depoimento da vítima deve-se observar os elementos probatórios e o convencimento

motivado.

A proibição de frequentar determinados lugares é a última conduta que o legislador

citou, o objetivo é proteger a integridade física e psicológica da mulher.

Conforme o autor:

Apesar de o legislador fazer referência apenas à frequentação de determinados

lugares- a expressão frequência traduz a noção de repetição sistemática de um fato

ou comportamento, in casu, a repetição habitual do agressor em comparecer a

determinado lugar-, parece-nos que a proibição também pode abranger o mero

acesso a determinado lugar, no sentido de lhe ser vedada a simples ação de entrar ou

ingressar em determinado local, não tendo qualquer conotação de reiteração ou

repetição (LIMA, 2014, p.932).

O juiz deverá apontar quais são esses locais que o agressor está impedido de

frequentar, pois caso não seja apontado, o agressor terá livre movimentação, demonstrando

constrangimento ilegal e liberdade de locomoção.

3.1.4. Restrição ou Suspensão de visitas aos dependentes menores

A maioria das agressões acontece no ambiente familiar e são assistidas pelos seus

filhos, tanto menor de idade, dependentes ou até maiores de idade. Diante desse problema, a

legislação possibilitou que o juiz restringe ou suspenda o direito dos agressores visitarem os

filhos menores que são dependentes.

Conforme expõe o autor, “restringir” deve ser compreendido como uma limitação:

A restrição deve ser compreendida como uma limitação ao direito de visitas aos

dependentes menores. Em outras palavras, pode o juiz determinar que as visitas

sejam realizadas em local diverso da residência da vítima, acontecendo em um lugar

de forma supervisionada, sem que haja contato do ofensor com a vítima. Por outro

lado, a palavra suspensão é utilizada no sentido de privação temporária do direito de

visitas. Em ambas as hipóteses, a medida protetiva sob comento tem natureza

temporária, perdurando apenas enquanto houver ameaça de reiteração dos atos de

violência (LIMA, 2014, p.933).

Para que haja restrição e limitação, o legislador prevê que deve ser ouvida uma equipe

de atendimento multidisciplinar, pois há alguns casos que apesar do menor ter presenciado a

violência, o agressor poderá manter contato normalmente com os menores pois é garantido

que não irá ser prejudicial.

32

3.1.5. Prestação de alimentos provisionais ou provisórios

O código civil no seu artigo 1694 conceitua alimento como “a prestação devida para

satisfação das necessidades pessoais daquele que não pode provê-las pelo trabalho próprio”.

Nesse sentido, o autor caracteriza:

Em sentido amplo, os alimentos devem compreender as necessidades vitais da

pessoa, cujo objetivo é a manutenção da sua dignidade: a alimentação, a saúde, a

moradia, o vestuário, o lazer, a educação, entre outros. Sua fixação deve ser feita

dentro do binômio necessidade de quem os pleiteia versus possibilidade de quem os

deve prestar, ou nos termos do Código Civil “na proporção das necessidades do

reclamante e dos recursos da pessoa obrigada” (art. 1694, §1º) (LIMA, 2014, p.934).

O autor Pedro Rui da Fontoura Porto esclarece sobre alimentos provisórios:

“O legislador usou as duas expressões para eliminar as discussões semânticas sobre

a suposta diferenciação entre alimentos provisionais ou provisórios, visto que ambas

significam, em linhas gerais, a fixação de alimentos antes de uma decisão faz coisa

julgada, de modo que, demonstrada alteração no célere binômio necessidade e

possibilidade pode o quantum ser revisto a qualquer momento”.

[...]

Como regra, entende-se que alimentos provisórios são aqueles fixados

imediatamente pelo juiz, a título precário, ao receber a inicial, na ação de alimentos

do rito especial, disciplinada pela Lei 5478/68, ao passo que, provisionais, são

aqueles reclamados pela mulher ao propor, ou antes de propor, a ação de separação

judicial ou de nulidade do casamento ou de divórcio direto, para fazer face ao seu

sustento durante a demanda. Chamam-se também provisionais os alimentos fixados

na sentença da primeira instancia, na ação de investigação de paternidade, de acordo

com o artigo 5º da Lei nº 883/49. (2007, p.98).

O objetivo dessa medida é proteger aqueles que são dependentes economicamente da

pessoa do agressor, ou seja, a mulher e seus filhos, caso ocorra o afastamento do lar, ou

separação não tendo então condições de se manterem.

3.2. Medidas Protetivas a ofendida

Essas medidas estão previstas nos artigos 23 e 24 da Lei Maria da Penha, que

mencionam quais são as medidas protetivas de urgência a ofendida.

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:

I - encaminhar à ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de

proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo

domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos

a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos.

33

Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de

propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as

seguintes medidas, entre outras:

I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;

II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e

locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;

III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;

IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos

materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

O artigo 23 traz a proteção à vítima e o artigo 24 legisla sobre a proteção do

patrimônio do casal e bens que são de uso particular da vítima.

3.2.1. Encaminhar à ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário

de proteção ou de atendimento

O objetivo desse inciso, além de proteger a ofendida, é tornar efetiva a medida

protetiva por meio de programas direcionados a proteção da vítima e que atenda a vítima da

violência doméstica. Essa criação de programas multidisciplinares pode ser criada por

organizações não governamentais em atenção a grupos de apoio as mulheres vítimas da

violência, ou seja, não são criadas apenas pelo Estado.

Esses programas têm a função de garantir o atendimento à ofendida em uma base

estruturada, com segurança, pois a mulher pode ser encontrada em grave situação.

3.2.2. Determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo

domicílio, após afastamento do agressor

O inciso II do artigo 23 é resultado do artigo 22, II da lei, pois o juiz oferece a

proibição do agressor de se aproximar da vítima e de sua família e testemunhas que pode ser

aplicado cumulativamente com a recondução da vítima e seus filhos ao domicílio posterior ao

afastamento do agressor. Essa medida é necessária quando não couber acolhimento à vítima

da medida do inciso I.

Nesse caso ocorreu o afastamento da ofendida por causa da violência sofrida e o medo

de sofrer novas ameaças e violência preferiu se afastar por prevenção.

34

3.2.3. Afastamento do Lar

Nesse inciso, a vítima pode se afastar do lar sem colocar em detrimento seus direitos

aos seus bens, patrimônios, guarda dos filhos e os alimentos.

O autor Pedro Porto (2012) salienta que só será possível o afastamento do lar se

houver alguma notícia da prática ou risco concreto de algum crime que certamente irá

justificar o afastamento, não apenas como mero capricho da vítima, pois se sabe que muitas

vezes o afastamento do varão extrapolará os prejuízos a sua pessoa.

3.2.4. Separação de corpos

Durante o processo de separação de corpos, a vítima pode requerer a medida do inciso

III, o afastamento do lar, enquanto não houver finalizado a ação de anulação ou dissolução do

casamento, aqui compreende também a união estável.

A ofendida tem prazo de 30 dias para ajuizar a ação principal de separação judicial,

dissolver a união estável ou anular o casamento. Vale ressaltar que ambos são de competência

da Vara da Família ou Cível.

3.2.5. Medidas de Ordem Patrimonial

No artigo 24 da Lei Maria da Penha, é previsto pelo legislador medidas que protegem

tanto os bens particulares da vítima, como o patrimônio e bens do casal, como por exemplo,

ações como bloqueio de contas, restituição dos bens subtraídos pelo agressor.

De acordo com a lei, o juiz pode aplicar uma ou mais medidas em cada caso e pode ser

substituída por outra de maior eficácia.

3.2.6. Restituição de bens

O objetivo dessa medida é proteger e assegurar os bens do casal e bens particulares da

mulher, que será restituído caso o agressor tenha pegado de forma indevida.

Determinados pelo juiz, os bens de uso particular devem ser restituídos

imediatamente, já os bens imóveis ou propriedades será autorizado pelo juiz de uma

35

reintegração de posse cautelar, sendo necessário o ajuizamento da ação principal no prazo de

30 dias na competência cível.

3.2.7. Proibição temporária para compra, venda e locação da propriedade em comum

Essa medida é um impedimento de que o agressor arruíne o patrimônio adquirido com

vítima durante o tempo de relação. Para o autor “o juiz determinará a proibição temporária

para celebração de atos e contrato de compra e venda e locação de propriedade em comum”

(LIMA, 2014, p.939).

Fica a cargo da ofendida indicar quais bens pretende interditar medida protetiva.

3.2.8. Revogação das procurações conferidas pela ofendida ao agressor

A Lei prevê essa medida para precaver o agressor, com o objetivo de se vingar da

mulher, realize certos atos com esse documento. Geralmente as mulheres dão esses poderes

aos seus maridos para que eles cuidem dos negócios familiares, por isso, uma violência

doméstica e familiar, o agressor pode usar esse instrumento como forma de vingança, por isso

são revogados para que ele não represente mais a vítima nos negócios.

3.2.9. Caução provisório mediante depósito judicial.

A Lei Maria da Penha, além de abrigar o âmbito penal, também abrange o ilícito cível.

Sendo assim, a lei atribui um pagamento com título de indenização que tenha reconhecimento

no âmbito cível proposta pela ofendida e que obriga a prestação dessa caução pelo agressor.

Essa caução tem o objetivo de preservar e assegurar uma futura demanda por parte da

vítima diante do juízo cível relacionado à violência doméstica sofrida e relacionada também

as medidas protetivas sobre o patrimônio.

36

3.3.Relatos de vítimas de violência doméstica

Por meio de algumas pesquisas realizadas em blog chamado “ONG MULHER

MARAVILHA”, retirados de uma reportagem da revista VEJA, é possível ler alguns relatos

de vítimas reais que sofreram violência doméstica, é bom destacar esses relatos para observar

que isso não é história e nem exageros, e sim uma triste realidade que ocorre com muitas

mulheres. Segue alguns relatos:

O primeiro relato é da comerciante Tammy Santiago de 38 anos: quando me casei,

larguei meu trabalho para ser secretária do meu marido. Em 2004, depois de dez anos de

casada, descobri que ele tinha um caso com uma garota de 16 anos. Pedi a separação. Ele não

aceitou e começamos a ter brigas cada vez mais sérias, até o dia em que ele me derrubou com

um tapa. Como foi a primeira vez, fiquei calada. Mas aí começou uma fase de violência física

constante, e depois de muito apanhar resolvi registrar queixa na Delegacia da Mulher. O mais

triste foi quando minha filha (de outro casamento) revelou que meu marido a molestava.

Consegui na Justiça a separação de corpos e em seguida ele levou todos os móveis da casa.

Depois de tudo, eu fui a única que ficou presa. Tenho medo de sair de casa e de que aconteça

algo comigo e com minha filha. O mais chocante é que ele é um arquiteto e urbanista, com

pós-graduação, que não fumava, não bebia, não se drogava. Era um marido exemplar.

O segundo relato é de uma atriz Ingrid Saldanha de 32 anos: Eu tinha só 14 anos

quando a gente se conheceu e ele sempre teve muito ciúme. É até engraçado, porque o famoso

e bonitão era ele. Mas o fato é que desde o início do meu casamento volta e meia os

desentendimentos terminavam em violência física. A gente se separava e depois voltava.

Passei muito tempo evitando enxergar, acreditando no amor, tentando preservar a família. O

Kadu é um ótimo pai, do tipo que acorda cedo para fazer vitamina para as crianças, ajuda a

fazer o dever de casa. Eu não queria privar os meninos dessa convivência, mas hoje consigo

enxergar que isso foi um erro. Numa situação de violência a autoestima fica lá embaixo, você

não consegue produzir nada, só uma fantasia de que aquilo tenha algum futuro. Acaba se

prejudicando e também prejudica a família. No Carnaval, quando ele me bateu, acabei

explodindo e expondo todo mundo exatamente da maneira que sempre lutei para evitar.

Um relato de um cunhado de uma vítima fatal, Nelson Furtado, a vítima era a

professora Nubia Conte Haick: O sofrimento da minha cunhada começou um dia depois do

casamento. Ela apanhou do marido ainda na lua-de-mel. Mas, por medo e vergonha, ela dizia

que havia caído ou se batido. A família demorou a saber o que se passava, mas ela fez várias

denúncias à polícia. Dezenas de boletins de ocorrência e laudos do Instituto Médico Legal que

37

comprovaram as agressões que ela sofria não foram suficientes para colocar o Ismael (Haick,

ex-marido de Núbia) na cadeia. Fui uma testemunha do terror que esse homem impôs a toda

família. Um dia, já depois da meia-noite, recebi um telefonema da babá dos meus sobrinhos

dizendo que Núbia não havia chegado em casa. Na hora eu pensei: meu Deus, perdemos a

Núbia. Na manhã seguinte fomos à delegacia e soubemos que um corpo de mulher havia sido

encontrado num matagal. Quando reconheci o corpo no IML, fui tomado pela revolta. Todas

as denúncias que a Núbia apresentou à polícia não serviram de nada para evitar que ela fosse

morta.

O relato de Salma Terezinha de 46 anos: Casei com 19 anos e não imaginava que

existisse nada parecido com o que aconteceu comigo. A primeira atitude de violência foi um

mês depois, por causa de um armário que comprei sem avisar, para fazer uma surpresa. Ele

me deu um soco no queixo que me deixou com problema no maxilar para o resto da vida.

Passei fiascos em público com cena de ciúme. Aguentei esse tipo de coisa seis anos. Ele me

batia, me esgoelava me punha arma na cabeça. Eu continuava achando que ele precisava de

ajuda e que eu era a única pessoa que podia ajudá-lo. Não tinha medo. No dia em que tive

medo, saí de casa. Saí também da minha cidade, e só consegui voltar quase vinte anos depois.

Foi tamanho o bloqueio que não conseguia lembrar as coisas ligadas ao casamento. A

violência soterra lembranças, doçura, meiguice. Mas é possível se restaurar, juntar os cacos,

sem ficar dura e empedernida para sempre.

E um último relato de Sandra Fernanda de 36 anos: Estava separada do pai dos meus

filhos quando conheci um homem doze anos mais novo e me apaixonei. Isso foi há dois anos.

Durante seis meses minha vida foi muito boa. Depois ele passou a beber demais e começaram

as agressões. Foram três. A primeira, por ciúme de um primo meu. Ele me chamou de p... e

me bateu no rosto. Avisei que não fizesse de novo. A segunda vez foi porque eu cheguei tarde

da casa dos meus pais. Esperou no ponto do ônibus e me deu um tapão ali mesmo. Depois

pediu desculpas e eu dei mais uma chance. Em novembro do ano passado, foi a gota d'água.

Ele queria o meu cartão do banco. Recusei e levei vários chutes na barriga. Dessa vez foi

demais. Saí de casa e decidi dar queixa. Fui ameaçada, ele disse que não ia dar em nada

porque é primário e tem primo delegado. Dei queixa mesmo assim. Ele me procurou dizendo

que, se eu retirasse a queixa, ele voltaria para mim. Eu respondi: 'Entenda isso: não foi você

que me largou, eu é que larguei você. Acabou'.

Esses são apenas alguns que foram selecionados, mas há muitas outras histórias de

mulheres que sofreram e sofrem com a violência doméstica e familiar, uma triste realidade

que precisa ser mudada com urgência.

38

4. DA INEFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS E AS OPÇÕES DO GOVERNO

PARA AMPARAR AS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

4.1.Ineficácias das medidas protetivas para restringir a violência contra a mulher

A lei 11.340/06 foi criada para proteger a mulher da violência doméstica e familiar.

Embora o ano da lei seja de 2006, ela não deixa de ser usada e hoje em dia é mais que comum

ouvir falar dessa lei, pois é possível ver que o índice de mulheres que são agredidas e muitas

vezes mortas, aumentou drasticamente.

O Instituo Avon, em 2013, promoveu uma pesquisa e foi identificado que 56% dos

homens confessaram ter praticado algum tipo de agressão contra sua companheira, a título de

exemplo, socos, palavrões, xingamentos, e cerca de 3 a 5 mulheres jovens já foram vítimas da

violência doméstica em seu relacionamento.

São esses dados que nos mostram que apesar de haver uma lei específica que visa

reduzir esse tipo de violência, o machismo que vem aumentando ao longo do tempo não

intimida que o homem continua praticando esse tipo de violência com suas mulheres. Por

esses atos a mulher se intimida consumida pelo medo, e não vão até uma autoridade policial

competente para denunciar o agressor e na maioria das vezes omitem e escondem a situação,

buscando esconder os machucados, lesões e a tristeza da realidade perigosa que ela vem

vivendo, e isso ocorre porque o agressor ameaça a vítima intimidando-a alegando que ela não

tem para onde ir por dependerem economicamente dele.

Com a criação da lei 11.340/06, está à disposição da mulher um dispositivo que faça

com que ela não se intimide e solte a voz quando for agredida por um tapa ou soco no rosto,

em tese, a lei foi criada como um grito de socorro para mudar a vida das mulheres que vivem

essa triste realidade diante de tanta violência.

O legislador trouxe vários dispositivos que proíbe a violência doméstica contra a

mulher e penalizar, o agressor. Esses dispositivos têm o objetivo de proteger a vítima e

mostrar para o agressor que ele está proibido de praticar qualquer ato violento. Para ter uma

melhor aplicação, a Lei Maria da Penha alterou alguns artigos do Código Penal. Um deles é a

criação de uma circunstância que agrava a pena, conforme artigo 61, inciso II, f do CP:

Art. 61- São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou

qualificam o crime:

f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de

coabitação ou de hospitalidade.

39

Alterou também o artigo 129 do CP, criando a lesão corporal qualificada pela

violência doméstica, aumentando a pena:

Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Aumentando a pena

Violência Doméstica (Incluído pela Lei nº 10.886, de 2004).

§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendentes, descendentes, irmão, cônjuge ou

companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se

o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: (Redação dada

pela Lei nº 11.340 de 2006).

Para que a lesão corporal seja aplicada, é possível notar que é necessário o sofrimento

da vítima a uma violência doméstica e familiar e disso, trouxe danos a sua integridade física, a

saúde.

A função das medidas de punição é do direito penal, mas isso não impede e não deve

impedir que o Estado crie os programas que dão assistência a vítima e que possa também

oferecer ao agressor algum tipo de tratamento. O código penal prevê que os agressores,

praticantes da violência, sofra com a punição de limitação de fim de semana, ou seja, eles

devem cumprir a medida de ficar nos sábados e domingos, por uma hora diária em casa de

albergado ou outro estabelecimento (CP, art. 43, VI e art. 48) e nesse local devem ser

realizados palestras, cursos ou atividades educativas conforme prevê a lei (art. 152, LEP).

O juiz pode determinar ao agressor comparecer a algum programa de recuperação e

reeducação, estes são de cunho obrigatório e o juiz pode aplicar outras medidas a ele,

conforme a Lei 11.340/06.

Essas medidas tem o objetivo de fazer com que o agressor se conscientize que as

práticas desses atos violentos são ilícitas, visto que as mulheres não são objetos para ser de

sua propriedade e que a mulher deve ser respeitada e assegurada sua integridade física. É esse

ponto que abala a aplicação da lei e viola os direitos que a lei traz. A falta de estrutura judicial

e policial faz com que as medidas se tornem falhas, por mais que às vezes ser eficaz.

O Estado tem a função de punir diretamente o agressor e garantir a proteção à vítima,

para isso capacita profissionais que trabalham com a vítima e com o agressor, mas apesar da

lei trazer em seu primeiro artigo que seu objetivo é coibir e prevenir a violência,

estabelecendo medidas de assistência e proteção, quem não conhece a lei, pode pensar que

serão eliminados todos os tipos de violência contra a mulher.

40

As medidas protetivas foram criadas com o objetivo exatamente de proteger a mulher

e penalizar o agressor, se tornando uma fantasia e fazendo com que as mulheres sejam vítimas

da violência pelos seus companheiros.

Sobre essas medidas protetivas, a legislação é muito rígida em relação ao seu

cumprimento, a título de exemplo, no seu artigo 18 diz que caso a vítima tenha interesse em

alguma medida protetiva a autoridade policial deve solicitar ao juízo no prazo de 48 horas

alguma das medidas protetivas, tanto para o agressor quanto para a vítima. Já no artigo 20

define que em caso do descumprimento dessas medidas, poderá ser decretada a prisão

preventiva, podendo ser realizada durante o inquérito policial ou na instrução criminal e prevê

também que a vítima e seus dependentes sejam encaminhados ao programa oficial ou

comunitário de proteção ou algum atendimento.

Na teoria a lei funciona perfeitamente, mas na prática há alguns impedimentos quanto

à aplicação no atendimento das necessidades das mulheres. Ela é estruturada e junto dela

aduz que o Estado também deve ter uma estrutura, mantendo relação integrada, a chamada

responsabilidade em conjunto, do Ministério Público, da Defensoria, policiais e o Poder

Executivo, não podendo descuidar desses casos de violência doméstica, nem permitir que seja

tratado como um crime comum, pois o crime de violência doméstica deve ser tratado diferente

dos outros, fazendo com que a vítima tenha uma resposta rápida aos seus pedidos, pois ela

fica na mira do agressor e esperando alguma providência da lei para ser retirada da situação

de risco, modificando sua realidade e dando a devida proteção e segurança necessária.

Como o caso de Maria da Penha, outros casos semelhantes ocorrem, pela falta de

rapidez nas respostas de seus pedidos, no Brasil há casos muito grave como o da cabeleireira

Maria Islaine de Moraes que pagou com a própria vida, conforme relatos:

Maria Islaine era dona de um salão de beleza e foi assassinada por setes tiros pelo

ex-marido, do qual estava separada a um ano, porém mais ele não se conformava.

Ela teria feito pelo menos 8 boletins de ocorrência. O primeiro foi dia 31 de março

de 2009, boletim este feito na Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher e o

mesmo foi remetido a Vara Especializada da Mulher. Em 3 de abril de 2009 foi feito

outro boletim de ocorrência do qual ela narrou todas a agressões que vinha sofrendo

de seu ex marido, além de agressões físicas, ameaças, perseguições e etc, todas

citadas nos boletins de ocorrência feito em 30/06/2009, 04/08/2009, 02/09/2009,

27/09/2009 e 21/11/2009. Dos quase 8 boletins de ocorrência feito pela vitima

apenas 1 o do dia 31/03/2009 gerou medida protetiva após seu advogado interver no

caso. A medida protetiva da vítima era de direito a separação de corpos, o

afastamento do agressor do lar, proibição dele manter contato com vitima ou se

aproximar, e na mesma decisão proferida no dia 04/05/2009 a juíza determinou

também que em caso descumprimento ser decretada sua prisão preventiva. Após o

agressor tomar ciência da decisão em 25/05/2009, deixou a residência do casal.

Após esses fatos outros boletins foram lavrados, além daqueles citados acima, casos

em que nem registro da ocorrência foi feita pela polícia militar, muito menos

conduziu os envolvidos até autoridade policial. A própria policia militar em

determinadas situações presenciaram ameaças feitas pelo agressor a vítima e nada

41

foi feito por quem tinha o dever de fazer. Após longos períodos de ameaças e

descumprimentos as medidas protetivas, o advogado da vítima requereu a prisão

preventiva por 3 vezes no mês de julho, setembro e Outubro de 2009, mas o

promotor decidiu aguarda conclusão do inquérito o que foi efeito acatado também

pelo juiz, apesar de ter sido alertado sobre a urgência do caso. Isso mostra que o

caso de Maria Islaine foi tratado como os demais casos de crimes comuns que lotam

o poder judiciário e a apesar de ser uma vara especializada, não foi dado nenhuma

importância ao caso em si. Foi então que no dia 21 de janeiro de 2010 ela foi morta

com 7 setes tiros pelo seu ex marido (GLOBO, 2010).

E, apesar de 10 anos da criação dessa Lei, ela sofreu e sofre muitas críticas sobre a

eficácia dessas medidas protetivas, ela foi tratada de forma abrangente, porém a ineficácia é

por parte do Estado em fazer valer as medidas protetivas, por não existir órgão competente

para atender tamanha demanda para que cumpra o que traz a lei.

Sobre a ineficácia das medidas protetivas, aduz o autor:

O que se pode notar é a dificuldade da aplicação e também da fiscalização das

medidas protetivas quando se trata de conferir uma efetiva das determinações

judiciais, tendo em vista que muitas vezes torna-se impossível aplicar tais

dispositivos em sua integralidade; vários são os fatores que contribuem para a não

concretização dessas medias (SOUZA, 2014).

O autor expõe a crítica relacionada à ineficácia da lei e na prática a aplicação da lei e

das medidas protetivas. Acabam surgindo obstáculos que separam a aplicação regular da lei

da eficácia. Há vários fatores que interferem na falta de suporte para aplicação da lei, a título

de exemplo, a falta de estrutura do Estado é uma das maiores, pois não possuem serviços

específicos voltados à mulher e após o deferimento das medidas protetivas, essas não são

fiscalizada ficando a mercê e fazendo com que não sejam eficazes na prática.

É necessário que a mulher conheça quais são os meios que ela possui para apelar a

autoridade policial para poder informar que está sendo vítima da violência, não basta somente

aplicar as medidas e fazer com que o agressor se afaste dela. Levando ao conhecimento do

policial, é necessário que o Estado tome as devidas providências para ela recomeçar a vida,

dar um suporte a elas, porque a maioria dessas vítimas depende financeiramente de seus

companheiros, motivo pelo qual muitas não denunciam.

Há casos que as vítimas levam os casos às autoridades, mas pela falta de fiscalização

das medidas protetivas, o agressor sabendo que não vai acontecer nada, trapaça a lei e ameaça

a mulher para que ela fique constrangida, se sinta em perigo e retire a queixa contra ele. Com

medo do agressor e com a falta de fiscalização do Estado em coibir a violência e fiscalizar se

a medida está sendo cumprida, a vítima retira a queixa ou se retrata da representação, ficando

o agressor livre e possibilitado de cometer uma nova violência ou até ceifando a vida da

mulher.

42

A secretária Nacional da mulher da CUT (Central única dos Trabalhadores), Rosane

Silva expõe:

“O que necessitamos para tornar essa conquista ainda mais efetiva no combate à

violência contra a mulher é a conscientização, inclusive das próprias mulheres, para

que elas não tenham medo de denunciar os agressores. Há iniciativas do governo

federal que incentivam as denúncias, agora é tarefa nossa como sociedade, como

movimento social e sindical organizados, nos conscientizarmos da cultura machista

que nós temos e informar que as mulheres têm condições de amparo(2007; p.52)”.

É possível observar que a Lei Maria da Penha é eficiente, pois, abrange qualquer

conceito, formas de proteção a mulher. Mas quando se trata de medidas protetivas e sua

aplicação na prática, apesar de eficiente, o que a deixa a desejar é a dificuldade de aplicar e

fiscalizar, dar suporte, acompanhar as medidas protetivas em favor da vítima. Se espera do

Estado que além da Lei, invista em instrumentos de proteção a vítima, invista em recursos e

programas que protegem a mulher vítima da violência doméstica.

A lei nos mostra que as medidas multidisciplinares podem ser criadas por

organizações não governamentais, sendo até pelo próprio Estado, que ofereçam serviços as

mulheres. Esses serviços que se dirigem a mulher são delegacias especializadas, unidades

móveis de conscientização para mulheres, juizados e varas especiais e a proteção que diz a lei,

programas que protegem e dão assistência.

Segundo uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada (IPEA), a

média de assassinatos de mulheres quando comparado os períodos de cinco anos antes e após

a vigência da lei continua em 5,2 mortes por cem mil mulheres. Com isso deixa claro que não

basta somente o sancionamento da lei e a aplicação das medidas protetivas com o objetivo de

que reduza a violência doméstica e familiar no Brasil, é preciso de muito mais programas.

Por meio de um levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça, somente 2%

dos agressores são penalizados no Brasil, isso advém da falta de denúncias, da dificuldade que

a vítima tem de denunciar seu companheiro por medo dele ceifar sua vida, ou ameaçá-la.

Conforme aduz o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o Ministro

Gilmar Mendes, “uma série de aprendizados e é preciso subsídios multidisciplinares”, ou seja,

nesses casos de violência contra a mulher, a Justiça deve “calçar as sandálias da humildade e

consultar pessoas que são vítimas e profissionais de outras áreas”.

É com essas situações e problemas encontrados que é possível perceber que nesses

quase 11 anos de Lei Maria da Penha a violência doméstica e familiar contra a mulher é uma

dificuldade a ser dominada pelo governo. A criação dessa lei foi um enorme avanço, porém na

prática sua aplicação e efetivação deixam a desejar por falta de suporte.

43

4.2.Decreto nº 8086/13: Há uma esperança

A grande dificuldade da Lei Maria da Penha é a sua aplicação e a efetivação das

medidas protetivas, além de outros serviços oferecidos. No artigo 8º, inciso IV da referida lei,

prevê a implementação de atendimento policial especializado para as vítimas, nas delegacias

de atendimento a elas. Outros dispositivos criados fazem menção ao atendimento

multidisciplinar a vítima e às vezes ao agressor.

O governo nesses quase 11 anos de criação da lei, ficou inerte em relação a um

dispositivo da lei, o que é visível é o atendimento precário, falta de estrutura para receber a

vítima que queira denunciar o agressor e ocorrido essa denúncia, a falta de atendimento,

fiscalização, observar se as medidas protetivas estão sendo cumpridas e o acompanhamento

da vítima.

No ano da criação da lei, em 2006, não foi realizado nenhum plano para executar os

serviços que são específicos à mulher. De acordo com uma pesquisa realizada no ano de 2015,

apenas 10 municípios brasileiros instalaram organismos de políticas para as mulheres, que

está previsto no pacto nacional de enfrentamento contra a violência.

No Brasil, no ano de 2015, há apenas 77 casas de abrigo em 70 municípios e 214

centros especializados a mulher em 191 cidades, esses dados mostram que estão localizados

em sua maioria nas regiões sudeste e nordeste e existem 470 delegacias que são

especializadas no atendimento a vítima, sendo também localizadas na região sudeste e sul do

Brasil. Portanto, conclui-se que as instituições especializadas no atendimento a mulher e o

processamento das ações nesses casos de violência estão presentes em um percentual de 1%

dos municípios.

É possível visualizar que o Estado pouco fez, se tornando um desafio aumentar os

atendimentos pelo Brasil, são cheios de obstáculos, como por exemplo, o tratamento em

segundo plano que o governo oferece a falta de implantação de programas, não é priorizado,

além disso, há uma grande influência na parte da cultura que vem sendo sobreposto ao longo

do tempo sobre o homem e a mulher, sendo necessário que haja em primeiro lugar, uma

mudança de comportamento, extinguindo a cultura machista, e as pessoas que são envolvidas

e trabalham desses atendimentos de programas que prestam assistência à vítima, as que estão

na delegacia e juizados especiais, tenha uma mente aberta e possa agir sem preconceitos e

respeitar as mulheres que procuram ajuda, pois elas gritam por socorro.

Com esse objetivo de ampliar as políticas públicas, a ex Presidente do Brasil, Dilma

Rousseff, vigorou em 30 de agosto de 2013 o Decreto nº 8.086/2013, que estabelece a criação

44

do Programa Mulher: Viver sem Violência, com o propósito de unificar os atendimentos

especializados e dirigidos à mulher que é vítima da violência doméstica e atendendo as

necessidades e diretrizes trazidas pela Lei Maria da Penha.

O Decreto nº 8.086/13 tem o escopo de integrar e ampliar os serviços que já existem,

porém não realizados, as mulheres que se encontram nessa situação de violência doméstica,

essas medidas visam à pronunciação dos atendimentos especializados no ambiente da saúde,

da justiça, da socioassitência e da promoção da autonomia financeira.

De acordo com o artigo 1º § 2 do Decreto, a competência para a instituição e a

responsabilidade é da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República.

Os serviços que esse programa traz é a integração de outros serviços que objetivam garantir a

vítima uma acessibilidade mais ampla a justiça, além dos serviços que são oferecidos para as

vítimas de violência doméstica para que elas possam recomeçar suas vidas sem ter o agressor

por perto e não estar no ambiente violento que viveu.

O artigo 3º do decreto é um dos mais importantes, pois manda executar a Casa da

Mulher Brasileira, um serviço que compreende e concentram os atendimentos especializados

que são dirigidos a mulher vítima da violência, além do mais, oferecer ampla assistência e

incluir a mulher na sociedade, de maneira independente, depois de tantos sofrimentos.

A primeira Casa da Mulher Brasileira foi inaugurada em Fevereiro do ano de 2015 na

cidade de Campo Grande/MS e a segunda em Julho na cidade de Brasília. Desde quando foi

criado, o Decreto nº 8086/13 e a Casa da Mulher Brasileira, a ex-presidente Dilma prometeu

27 unidades espalhada por todo o Brasil em seu primeiro mandato, porém a meta foi adiada

para o segundo mandato com cumprimento até 2018, porém é sabido que não irá ser

cumprida, mas há a esperança de que o atual presidente possa cumprir tal meta.

Essa Instituição, Casa da Mulher Brasileira, é um serviço com fundamento de realizar

atendimento as mulheres que são vítimas de qualquer tipo de violência doméstica, ou seja,

desde a violência física até a violência sexual. No Brasil, é novidade esse atendimento a

vítima, tipo de programa o atendimento é mais humanizado, oferecendo suporte à vítima, um

aconchego para quem sofre tal agressão.

Quem coordena esse programa é a Secretaria de Políticas para as Mulheres, e seu

objetivo é facilitar o acesso a serviços específicos que são direcionados a mulher que enfrenta

a violência. Há uma integração de serviços, fazendo com que a mulher se sinta segura para

procurar ajuda. Na prática, o primeiro serviço que é realizado é a triagem e equipe de

acolhimento, aqui é possível se formar um laço de confiança com a vítima e dirigi-la para

outros atendimentos e serviços que serão necessários.

45

Quando a mulher é inserida nesse programa, outros serviços são oferecidos a ela,

como apoio psicossocial onde uma equipe multidisciplinar oferece esse atendimento

continuado e oferece outros serviços da casa, sempre auxiliando a vítima a superar os

impactos sofridos pela violência e resgatar sua autoestima, inserir na sociedade, dar

autonomia.

A Casa conta com a ajuda da Delegacia Especializada de Atendimento (DEAM), uma

unidade da Polícia Civil para preservar e investigar os crimes de violência sexual e doméstico,

etc., Juizados e Varas Especializadas de Violência Doméstica, tal qual são órgãos que

processam, julgam e executam as causas de violência doméstica, conforme aduz a Lei Maria

da Penha, também há a ajuda dos Ministérios Públicos com a função de promover a ação

penal desses crimes específicos e fiscaliza os serviços das demais redes e também conta com a

Defensoria Pública que orienta as vítimas de quais são os seus direitos, oferece assistência

jurídica e faz o acompanhamento de todas as fases do processo judicial, seja cível ou criminal.

O programa Casa da Mulher Brasileira objetiva também a autonomia econômica nessa

fase que a mulher busca por isso, buscando uma educação financeira, uma qualificação

profissional e entrar no mercado de trabalho. Com isso ela se afasta do agressor e sai dessa

situação de violência, como não depende mais do agressor para se sustentar e nem sustentar

os seus dependentes, tem a chance de recomeçar a vida com sua independência financeira. A

mulher que não tem condições de sustentar seus filhos e ela própria solicita a inclusão no

programa de assistência e social do governo Estadual, Federal e Municipal.

São vários os serviços oferecidos nesse programa à vítima da violência doméstica,

como para as crianças de 0 a 12 anos que são acolhidas tem a brinquedoteca, são crianças que

acompanham as mães que aguardam pelo atendimento, há também serviços de transporte que

oferece o deslocamento da mulher atendida pelo programa para os outros serviços oferecidos

pelo atendimento especializado, no caso de violência sexual há serviços de saúde que são

fornecidos contracepção de emergência e a prevenção de doenças contagiosas sexualmente

ocorrendo no período de até 72 horas e oferece também o serviço de alojamento um espaço

para abrigar por um período de 48 horas a mulher que corre risco de vida.

O horário de funcionamento da Casa da Mulher é de 24 horas todos os dias da semana,

pois a violência não tem hora nem data para acontecer. De acordo com a Secretaria Política, já

houve mais de 10 mil atendimentos na unidade do Mato Grosso do Sul, a primeira

inaugurada.

46

4.3.O início da real e efetiva proteção à mulher.

A Lei Maria da Penha é um grande avanço na luta das mulheres, uma evolução que

engloba todos os sentidos, mas não é porque houve a criação dessa legislação que proíbe e

erradica a violência doméstica que diminuiria os índices altos de agressões, mortes e outros

crimes contra o gênero feminino.

Mesmo sendo considerada por todo mundo e reconhecida internacionalmente como

sendo uma das legislações mais avançadas em relação ao tema que abrange as pesquisas,

reportagens que passam na TV, provam que mesmo assim muitas mulheres vivem totalmente

ao contrário do que aduz a lei.

Não basta somente a previsão da lei que proíbe erradicar o crime de violência contra a

mulher e punir o agressor para se afastar da vítima, o problema é que, apesar das medidas

protetivas, muitas mulheres não se sentem seguras, não há nenhuma garantia de que elas não

irão passar por essa situação novamente.

Depois de quase 11 anos da criação da Lei Maria da Penha, o governo começou

programar políticas públicas, os serviços que estão previstos na lei, fazendo com que se

tornem mais eficazes as medidas para combater a violência, medidas essas que são mais

eficazes do que aquelas trazidas pela Lei Maria da Penha.

O judiciário deve atuar ligado com medidas penais e civis baseadas na legislação,

como atendimento ao Programa Casa da Mulher Brasileira que já foi falado. São essas

medidas que faz com que aconteça a real proteção à mulher e garantir a elas um

acompanhamento em serviços psicossociais nas redes de atendimento, não que esses

programas diminuirão os casos, mas é possível que evite a violência demonstrando que a

mulher é protegida pela lei e há outras medidas que a ampara, estrutura e retira a vítima da

violência que sofre.

Para uma maior efetivação da lei 11.340/06, a rede de integração de atendimento

deveria ser mais eficiente e acolhedora, porém é encontrado muitos problemas que impedem a

eficácia da mesma, como a falta de recursos e de investimento por parte do Estado,

Municípios, e a falta de interesse de instituir essa integração no território brasileiro. Há

também a falta de informações sobre esses programas, a vítima muitas vezes não sabe que ela

tem esse amparo na legislação e social e acabam convivendo com as agressões por muito

tempo por falta de informação.

A lei sozinha não traz tantos benefícios, mas ela deve vir acompanhada de medidas

para que se torne mais eficácia na sociedade. Mas isso não basta, é necessário que haja

47

investimento do governo em melhorar medidas multidisciplinares, como a informação,

conscientização e a inclusão da mulher a esses programas que são desconhecidos por muitas

dela, fazendo com que vivem nesse ciclo de violência.

48

5. CONCLUSÃO

Conclui-se que, desde antigamente, a mulher já sofria violência doméstica e familiar,

fazendo com que ela fosse tratada como um sexo inferior. Foi então que começou uma

enorme luta para que elas ocupassem seu espaço na sociedade, no mundo, e conquistassem

todos os direitos e deveres que elas possuem no mundo e principalmente no ambiente

familiar, que geralmente é onde ocorre a inferioridade.

Foram anos de lutas, discussões, muitos sofrimentos até elas conquistarem um espaço,

ter seus direitos reconhecidos e começar a ter voz ativa, podendo manifestar seus

pensamentos e vontades. Com a criação da Lei 11.340/06, a Lei Maria da Penha tonou-se um

marco histórico no Brasil, pois era um avanço em relação à violência doméstica e familiar e a

proteção da mulher.

As pesquisas, programas de TV, internet, mostram que por causa desse tipo de violência

milhares e milhares de mulheres têm suas vidas ceifadas todos os anos por seus parceiros na

grande maioria ou com quem mantinha uma relação íntima de afeto.

Com a criação da Lei Maria da Penha nasceu uma nova esperança para as mulheres que

são vítimas dessa situação, o legislador trouxe medidas que punem o agressor e protege a

segurança da mulher. As medidas protetivas protegem as mulheres de qualquer forma de

violência, seja física, sexual, moral, acreditando-se que essas medidas fossem afastar a

violência doméstica no Brasil.

Infelizmente é possível observar que quase nada mudou para quem sofre a agressão. É

por isso que durante os anos, pode-se ver que a Lei 11.340/06 e as medidas protetivas não se

tornaram eficientes quantos deveriam ser e diversos fatores ocasionaram essa falta de eficácia,

como por exemplo, a falta de investimentos do governo em criar programas que atendam as

vítimas dessas agressões.

A lei traz que os Estados, Municípios possuam serviços especializados para que as

vítimas desse tipo de delito passem por atendimentos especializados e que haja uma

integração, como exemplo, nas delegacias.

Houve um longo período de inércia por parte do governo diante dessa situação, e apenas

alguns anos depois foi que a ex-presidente Dilma Rousseff procurou oferecer um atendimento

mais humanizado à mulher que é vítima e se preocupou em dar maior eficácia, lançando

politicas públicas para que os problemas que afligem milhares de mulheres no mundo todo se

solucionassem e começou a investir nesse ramo.

49

Com essa preocupação, no ano de 2013, foi sancionado o decreto nº 8086/13 que

instituiu o importante programa chamado de Mulher Viver sem Violência, que se desdobra o

nascimento da Casa da Mulher Brasileia, que são oferecidos às mulheres que são vítimas de

violência doméstica os serviços que são necessários para a sua proteção e que ela se retire da

situação em que se encontra.

Com isso conclui-se que não basta somente a criação de uma legislação especial que

fará erradicar o problema. A Lei Maria da Penha tem que ter outros anexos, outras ideias para

que se torne mais eficaz. É possível observar que se forem fornecidos à mulher serviços mais

especializados para o caso, atendimentos mais humanizados, fornecer a ela conhecimento de

que há solução para o seu problema, ai sim a lei se tornará eficaz. O Estado também deve

investir em pessoas capacitadas para prestar esse tipo de serviço, e criar instituições que

apliquem, fiscalizem e garantem a mulher que se encontra nessa situação tenha sua vida

transformada, preservada e protegida contra qualquer agressão.

50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDREUCCI, Ricardo Antônio. Legislação Penal Especial. 9ºed. São Paulo: Saraiva, 2013.

BAIERL, L. F. Medo social: da violência visível ao invisível da violência. São Paulo: Cortez,

2004.

BIANCHINI, Alice. Falta de delegacias especializadas: outra forma de violência contra a

mulher, Jus Brasil, atualizado em 22 de janeiro de 2013. Disponível em <

http://professoraalice.jusbrasil.com.br/artigos/121814298/falta-de-delegacias-especializadas-

outra-forma-de-violencia-contra-a-mulher>. Acesso em 04 jan. 2017.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1998, de 05 de outubro de 1988.

Disponível no endereço <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso 20

dez. 2016.

BRASIL. Decreto nº 8.80/2013, de 30 de agosto de 2006. Disponível no endereço <

http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/_Ato2011-2014/2013/Decreto/D8086.htm>. Acesso

20 dez. 2016.

BRASIL. Lei nº 11.340/2006, de 07 de agosto de 2006. Disponível no endereço: <

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso 15 dez.

2016.

BRASIL. Código penal, processo penal e Constituição Federal. 4. ed. São Paulo: Saraiva,

2008.

BRASIL, Portal. Mulheres conquistam direitos nos últimos 100 anos, 12 mar. 2014.

Disponível em < http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2014/03/mulheres-conquistam-

direitos-nos-ultimos-100-anos>. Acesso 01 dez. 2016.

CARVALHO, Pablo. Medidas protetivas no âmbito da Lei Maria da Penha e sua eficácia

atua. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 4064, 17 ago. 2014. Disponível em:

<http://jus.com.br/artigos/29229>. Acesso em: 15 dez 2016.

CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. Violência doméstica contra a mulher no

Brasil. Ed. Podivm. 2ª Ed. Salvador, Bahia, 2008.

DIAS, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na Justiça. Revista dos Tribunais, São Paulo:

2007.

DIAS, Mariana. Dilma inaugura com atraso Casa da Mulher Brasileira e promete mais 25.

Folha de São Paulo, São Paulo, 02 jun. 2015. Disponível <

http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/06/1636964-dilma-inaugura-com-atraso-casa-da-

mulher-brasileira-e-promete-mais-25.shtml>. Acesso em 10 fev. 2017.

FEDERAL, Senado. Debatedores apontam desafios para expansão do programa casa da

mulher brasileira, atualizado em 09 de junho de 2015. Disponível em <

51

http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2015/06/09/debatedores-apontam-desafios-

para-expansao-do-programa-casa-da-mulher-brasileira>. Acesso em 27 fev. 2017.

JÚNIOR, Antônio Gasparetto. Primeira onda feminista. Disponível em: <

http://www.infoescola.com/historia/primeira-onda-feminista/>. Acesso 03 jan. 2017.

LIMA, Renato Brasileiro. Legislação Criminal Especial Comentada. 2ºed. Salvador:

JusPODIVM, 2014.

MATIELLO, Carla; TIBOLA, Rafaela Caroline Uto. Medidas protetivas de urgência da Lei

Maria da Penha são eficazes?. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3680, 29 jul. 2013.

Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25018>. Acesso em: 15 fev. 2017.

NETO, Renato Drummond Tapioca, D‟ANGELO, Luisa Bertrami. A trajetória do movimento

feminista e suas lutas aos dilemas do século XXI. Disponível em:

<http://causasperdidas.literatortura.com/2013/10/27/a-trajetoria-do-movimento-feminista-e-

suas-lutas-frente-aos-dilemas-do-seculo-xxi/>. Acesso 04 fev. 2017.

NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas – Vol. 1. 8ºed.

Rio de Janeiro: Gen. /forense, 2014.

PACHECO, Indiara Leiliane Cavalcante. A (in)eficácia das medidas protetivas de urgência

Lei Maria da Penha. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 13 maio 2015. Disponível em:

<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.53427&seo=1>. Acesso em: 07 fev.

2017.

SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHEES PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.

Casa da Mulher Brasileira de 29 janeiro de 2015. Disponível em

<http://www.spm.gov.br/assuntos/violencia/cmb>. Acesso em 07 fev. 2017.

SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHEES PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA.

Viver sem violência é direito de toda mulher. Disponível em< http://www.spm.gov.br/central-

de-conteudos/publicacoes/publicacoes/2015/livreto-maria-da-penha-2-web-1.pdf>. Acesso em

20 jan. 2017.

SOUZA, José Alves de. Lei Maria da Penha e a duvidosa eficácia das medidas protetivas.

Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 10 jul. 2014. Disponível em:

<http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.48978&seo=1>. Acesso em: 15 jan.

2017.

TELES, M. A. de A.; MELO, M. de. O que é violência contra a mulher. São Paulo:

Brasiliense, 2003.

WESTIN, Ricardo. Criada em 2006, Lei Maria da Penha protege mulher de espancamento e

assassinato. Disponível em: <

http://www12.senado.gov.br/jornal/edicoes/especiais/2013/07/04/criada-em-2006-lei-maria-

da-penha-protege-mulher-de-espancamento-e-assassinato>. Acesso 15 dez. 2016.