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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado 1 Juizado Especial Cível e a democratização do acesso à justiça Luciana Gross Siqueira Cunha APRESENTAÇÃO O debate atual sobre a administração e a distribuição da justiça pode ser organizado em torno de dois eixos principais: um que diz respeito à posição central que o sistema de justiça ocupa na arena política desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, quando foram alargadas as áreas sujeitas a sua apreciação, se tornando o principal árbitro nas disputas entre os poderes executivo e legislativo. O segundo eixo, específico ao poder judiciário, corresponde a sua eficiência na prestação de um serviço público. Sob esta ótica, o que está em jogo é o acesso à justiça. Assim, questões como o tempo dos processos, os altos custos processuais, a complexidade dos procedimentos judiciais e a falta de transparência na prestação dos serviços são apontadas como algumas das causas para a dificuldade de acesso. Como objeto de análise estou investigando a atuação dos Juizados Especiais que, sem pretender solucionar a "crise do Judiciário", foram concebidos para democratizar o acesso à justiça, ou seja, resolver os conflitos do dia-a-dia que afetam o cidadão de forma rápida, simples e econômica. O argumento geral é que os Juizados Especiais vêm cumprindo a finalidade para a qual foram criados: a democratização do acesso à justiça.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

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Juizado Especial Cível e a democratização do acesso à justiça Luciana Gross Siqueira Cunha

APRESENTAÇÃO

O debate atual sobre a administração e a distribuição da justiça pode ser organizado em

torno de dois eixos principais: um que diz respeito à posição central que o sistema de justiça

ocupa na arena política desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, quando foram

alargadas as áreas sujeitas a sua apreciação, se tornando o principal árbitro nas disputas entre os

poderes executivo e legislativo.

O segundo eixo, específico ao poder judiciário, corresponde a sua eficiência na prestação

de um serviço público. Sob esta ótica, o que está em jogo é o acesso à justiça. Assim, questões

como o tempo dos processos, os altos custos processuais, a complexidade dos procedimentos

judiciais e a falta de transparência na prestação dos serviços são apontadas como algumas das

causas para a dificuldade de acesso.

Como objeto de análise estou investigando a atuação dos Juizados Especiais que, sem

pretender solucionar a "crise do Judiciário", foram concebidos para democratizar o acesso à

justiça, ou seja, resolver os conflitos do dia-a-dia que afetam o cidadão de forma rápida, simples e

econômica. O argumento geral é que os Juizados Especiais vêm cumprindo a finalidade para a

qual foram criados: a democratização do acesso à justiça.

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Acesso à justiça

Em sentido amplo, o termo acesso à justiça indica o direito do cidadão de ter seus

conflitos resolvidos de forma pacífica. Na construção clássica do conceito de cidadania, T. H.

Marshall encaixa o direito de acesso à justiça no rol dos direitos civis, como a possibilidade de ter

acesso aos tribunais1. Com o estado de bem-estar social, o direito de acesso à justiça passou a ser

requisito para a garantia e efetividade dos demais direitos da cidadania, isto porque sem a

possibilidade de reivindicar os direitos da cidadania ao Estado, torna-se inócua a sua garantia

formal2.

A literatura apresenta dois enfoques sobre a questão do acesso à justiça3. Num primeiro

enfoque, acesso à justiça possui um sentido mais amplo, correspondendo a toda e qualquer forma

de resolução pacífica dos conflitos sociais, seja por meio das instituições do sistema de justiça

estatal, seja por canais informais, como as associações de moradores ou as comunidades

religiosas. O que se privilegia nesta perspectiva são os resultados obtidos.

Numa segunda vertente, o acesso à justiça está ligado à aplicação do direito estatal e tem

no Estado e, mais especificamente, no poder judiciário a instância para a mediação dos conflitos

sociais. Sob esta perspectiva, acesso à justiça corresponde ao acesso às instituições do sistema de

justiça e tem a ver com a atuação e com a performance do poder judiciário na distribuição da

justiça. Neste contexto, o desafio é atender com eficiência as demandas de solução dos conflitos

que a sociedade apresenta e beneficiar um número cada vez maior de pessoas4. O sistema que

pretender enfrentar esta questão estaria superando os obstáculos que dificultam o acesso à justiça.

Sob esta vertente, é possível identificar três linhas de análise sobre a questão da

democratização do acesso à justiça: uma primeira linha liga o tema à eliminação dos obstáculos

que dificultam o acesso à justiça, que podem ser de três tipos - econômicos, sociais e culturais; o

segundo enfoque ocorre dentro da ciência política que toma a democratização do acesso à justiça

como uma das premissas da democratização do Estado; e, por fim, uma terceira perspectiva que

1 Marshall, 1967. 2 Cappelletti, 1988. 3 Botelho, 1996. 4 O termo eficiência é utilizado aqui conforme a definição adotada pelos organismos internacionais para avaliar a performance dos sistemas de justiça dos países em desenvolvimento. De acordo com esta definição os sistemas de justiça eficientes são aqueles que conseguem resolver de forma rápida, imparcial e com os menores custos possíveis os conflitos que a sociedade apresenta. Neste sentido ver Cappelletti, 1988 e Puymboekc, 2000.

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aproxima as duas tendências anteriores e adota como critério para a democratização do acesso à

justiça a participação da comunidade na solução dos conflitos sociais, atendendo um número cada

vez maior de pessoas.

Sob a primeira perspectiva, Mauro Cappelletti e Bryan Garth chamam a atenção para as

questões econômicas – inclusive os honorários advocatícios -, a disponibilidade das partes em

ajuizarem uma ação e a existência ou não de tutela, por parte do Estado, dos interesses difusos5.

Os obstáculos econômicos correspondem às custas processuais, ao valor da causa e à duração dos

processos. Quanto menor o valor da ação, o custo do processo é maior, sendo que este valor pode

aumentar ainda mais quanto mais tempo demorar para que o litígio seja resolvido6. Assim, um

fator que poderia ter como causa apenas os altos custos processuais, envolve também os ritos

processuais e a estrutura do poder judiciário.

Boaventura de Souza Santos enfatiza as questões culturais e sociais que bloqueiam o

acesso do cidadão aos tribunais7. Os obstáculos sociais correspondem à dificuldade que as classes

mais pobres e menos escolarizadas têm em conhecer seus direitos e reclamá-los ao Estado.

Por fim, tem-se a questão cultural que tem a ver com a familiaridade que a população

possui com as instituições do sistema de justiça e com os agentes responsáveis pela solução dos

conflitos de forma pacífica, como advogados, promotores e juízes.

Sob esta ótica, o fenômeno e a discussão sobre a democratização do acesso à justiça teve

início entre o final da década de 50 e o início da década de 60 a partir de dois fenômenos: a

eclosão da crise da administração da justiça, sobretudo no que diz respeito à positivação dos

novos direitos coletivos, e à importância que a lei assume como instrumento para proporcionar

desenvolvimento e incrementar a democracia.

Mauro Cappelletti e Bryant Garth chamam esta conscientização sobre a importância do

acesso à justiça nas democracias ocidentais como “movimento de acesso à justiça”, que por sua

vez seria composto de três fases ou "ondas" (waves of reform) que procuraram, por meio de

reformas nos sistemas jurídicos, superar os obstáculos ao acesso à justiça, tornando-o efetivo para

todas as camadas da população.

5 CAPPELLETTI, Mauro, 1988 e 1991. 6 Esta pesquisa teve como objetivo analisar as diferentes formas de acesso à justiça, os obstáculos jurídicos, econômicos, sociais e psicológicos que dificultam ou impedem o uso do sistema jurídico, assim como os esforços desenvolvidos por diferentes países (democracias modernas) no sentido de superar estes obstáculos. (Cappelletti, 1975, I, vii). SANTOS, Boaventura de Sousa, 1989, ver nota 22, p. 62. 7 SANTOS, Boaventura de Sousa, 1989 e 1996.

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A primeira “onda” do "movimento de acesso à justiça" atendeu à necessidade de

incrementar os serviços jurídicos para os pobres, através da Assistência Judiciária. Foi neste

momento que surgiram os diferentes modelos de assistência judiciária procurando não somente

remover os obstáculos econômicos que impediam a população de ter acesso aos tribunais e à

justiça, como também eliminar as barreiras sociais e culturais, tornando mais acessível o mundo

jurídico – o vocabulário, os agentes da justiça e suas instituições.

A "segunda onda" enfrentou a questão dos interesses difusos. Os direitos difusos são

direitos de "massa" – espalhados e informais – que buscam a tutela das necessidades referentes à

qualidade de vida. Eles se caracterizam pelo alto grau de desagregação e intensa mutação em

relação às escolhas políticas que os definem e conforme o tempo em que são auferidos. Pela

indeterminação dos sujeitos e indefinição do objeto a ser tutelado, os interesses difusos

representam uma nova configuração do sistema normativo tradicional. A sua proteção impôs

mudanças no processo civil e no papel dos tribunais.

No âmbito do direito processual, estas mudanças ocorreram quanto à legitimidade para

propor ação, que foi estendida à coletividade – grupos e associações; e quanto ao efeito da coisa

julgada que, nas ações em defesa de direitos difusos, não mais se restringe aos litigantes.

A terceira "onda" do "movimento de acesso à justiça" corresponde ao conjunto de

medidas que vem transformando o sistema de justiça e o Direito nos últimos vinte anos,

incorporando resoluções informais dos conflitos e o uso alternativo do Direito, chegando até

mesmo a quebrar o monopólio estatal da justiça. Nas palavras de Mauro Cappelletti:

"essa "terceira onda" de reformas inclui a advocacia, judicial ou extrajudicial, seja por meio de advogados particulares ou públicos, mas vai além. Ela centra sua atenção no conjunto geral de instituições e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para processar e mesmo prevenir disputas nas sociedades modernas. (…) É um novo enfoque do acesso à justiça, (…) que encoraja a exploração de uma ampla variedade de reformas, incluindo alterações nas formas de procedimento, mudanças na estrutura dos tribunais ou a criação de novos tribunais, o uso de pessoas leigas ou paraprofissionais, tanto como juízes quanto como defensores, modificações no direito substantivo destinadas a evitar litígios ou facilitar sua solução e a utilização de mecanismos privados ou informais de solução dos litígios." (Cappelletti, 1988:71) Os sistemas como os Juizados Especiais fariam parte deste conjunto de reformas que vêm

informalizando o sistema de justiça estatal.

Paralelamente a esta discussão, a ciência política, ainda que de forma esparsa, trata da

democratização do acesso à justiça como parte da democratização do Estado. Este ponto está

profundamente ligado à institucionalização do sistema de justiça e à democracia.

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Como aponta a literatura sobre democracia em países em desenvolvimento ou, mais

especificamente, na América Latina, a limitação no exercício de direitos, principalmente dos

direitos ligados ao sistema legal como acesso ao Judiciário e a processos justos, compromete o

processo de democratização em todos os níveis da sociedade. Para esta literatura há uma estreita

ligação entre democracia, princípio da lei e estado de Direito.8

Segundo Guillermo O’Donnell, nestes países, ao menos formalmente, os direitos típicos

da poliarquia são preservados, porém as deficiências relacionadas à aplicação da lei, às relações

das burocracias que afetam os cidadãos comuns, ao acesso ao Judiciário e a processos justos e à

legalidade, mesmo quando recaem sobre pequenas parcelas da população ou atingem áreas

periféricas afetam a caracterização do regime como democrático.9 Neste sentido, pode-se dizer

que um Judiciário distante, embaraçoso, caro e lento demais contribui para a existência de

sistemas subnacionais que não podem ser caracterizados como poliarquias.

A existência de micro-sistemas jurídicos, como os Juizados Especiais que visam

aproximar o Judiciário da população por meio de procedimentos informais, rápidos e com custos

mais baixos para a solução de conflitos sociais, indicam a possibilidade de incrementar a

democracia.

Por fim, é possível identificar uma terceira corrente que, sem deixar de lado os obstáculos

de acesso à justiça e a democratização do Estado, define democratização do acesso à justiça como

popularização da justiça, ou seja, a ampliação do acesso a um número cada vez maior de pessoas

e a participação da comunidade na solução dos conflitos que chegam até o poder judiciário. Esta

literatura parte da premissa de que o Judiciário é parte integrante do Estado e, desta forma

também tem a tarefa de aperfeiçoar os mecanismos de representação impostos pelo ideal

democrático. Sob a ótica do acesso à justiça esta função implica no equacionamento dos conflitos

sociais beneficiando um número cada vez maior de pessoas por meio da participação popular.10

A participação da comunidade na solução dos conflitos pelo Estado, através de

conciliadores ou juízes leigos, como é a proposta de criação dos Juizados Especiais no Brasil, é

um dos caminhos possíveis para aperfeiçoar estes mecanismos de representação democrática.

8 Na Ciência Política, me refiro especialmente aos trabalhos de Guillermo O’Donnell, Paulo Sergio Pinheiro e Adam Przeworski. Em áreas afins são úteis os trabalhos de José Murilo de Carvalho e os relatórios do Banco Mundial acerca da necessidade um poder judiciário ágil e acessível para todas as camadas da população para a institucionalização da democracia. 9 O’Donnell, Guillermo, 1998, p. 47. 10 Falcão, 1981 e Vianna, 1999.

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No Brasil, parte da literatura11, seguindo os estudos de Mauro Cappelletti e Bryant Garth,

vê as mudanças processuais que tiveram início no anos 80 e que culminaram com a Constituição

Federal de 1988 que institucionalizou a atuação do Ministério Público em áreas como os direitos

difusos e dispôs sobre a criação das Defensorias Públicas e os Juizados Especiais, como uma das

reformas desta "terceira onda do movimento de acesso à justiça". Neste sentido, Luiz Werneck

Vianna afirma que os Juizados Especiais ao utilizarem métodos informais e mais rápidos

baseados na oralidade e na economia processual, fazem parte do processo de democratização do

sistema de justiça que teve início com a emergência dos direitos difusos12. Além disso, a lei que

criou este sistema prevê a participação da comunidade, através dos juízes leigos e dos

conciliadores, na solução dos conflitos, o que corrobora a idéia de popularização da justiça.

Por outro lado, alguns estudiosos13, a partir dos trabalhos de Boaventura de Sousa Santos,

argumentam que estas mudanças no ordenamento jurídico correspondem a reformas pontuais que

fazem parte da estratégia dos poderes legislativo e Judiciário de recuperar suas respectivas

imagens numa situação de crise. Sob esta perspectiva, o Brasil ainda não teria vivenciado o

“movimento de acesso à justiça” e, quanto aos Juizados Especiais, eles fazem parte de um projeto

de auto-reforma do Judiciário, sem qualquer mobilização da sociedade civil e sem que a primeira

e a segunda "onda" de reformas tivessem ocorrido. Neste contexto, os Juizados Especiais têm

menos a ver com a facilitação do acesso à justiça, mas seriam uma forma de legitimação do

Judiciário pelo procedimento e, exatamente por isso, estariam "contaminados" pelos mesmos

problemas que afetam a justiça comum, sem representar a ampliação do acesso à justiça.14

Diante da ausência de um consenso sobre o termo democratização do acesso à justiça, mas

com a necessidade de fixar o conceito a fim de analisar o funcionamento dos Juizados Especiais,

adotou-se, neste trabalho, a definição apresentada pela exposição de motivos da lei que criou os

Juizados Especiais Cíveis e Criminais15. De acordo com esta definição, democratizar o acesso à

justiça corresponde a facilitar o acesso do cidadão à Justiça através da conciliação, simplicidade

dos procedimentos, celeridade e economia. Esta definição tem a vantagem de englobar as

questões apresentadas pelas diferentes perspectivas que tratam do tema: ela aborda a eliminação

dos obstáculos de acesso à justiça, a necessidade de um Judiciário eficiente para a

11Campilongo, 1994; Vianna, 1999; Watanabe, 1985 e 1999; Grinover, 1985; Carvalho, 1996. 12 Vianna, 1999. 13 Junqueira, 1992; Falcão, 1984; D’Araujo, 1996. 14 Junqueira, 1992. 15 Lei 7.244/84 revogada pela Lei 9.099/95.

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institucionalização da democracia e a possibilidade da participação da comunidade na solução

dos conflitos por meio da conciliação. Neste sentido, este será o parâmetro que irá orientar a

presente trabalho: são os Juizados Especiais uma forma de democratização do acesso à justiça na

medida em que equacionam os conflitos sociais do cidadão por meio da conciliação,

simplicidade, celeridade e economia ou sofrem dos mesmos problemas que afetam a justiça

comum?

Juizados Especiais

A idéia de criação dos Juizados Especiais, antigos Juizados de Pequenas Causas, surgiu no

início da década de 80 no Ministério da Desburocratização sob a coordenação do ex-ministro

Helio Beltrão, a partir da percepção de que o cidadão, envolvido em causas de reduzido valor

econômico ou de menor complexidade, não encontrava no poder judiciário a possibilidade de ter

respostas eficientes, ou devido às altas custas processuais ou em decorrência da morosidade e do

excesso de formalismo jurídico16.

Formalmente, motivados pela necessidade de ampliar o acesso à justiça da população, os

Juizados Especiais, sem pretender resolver os problemas que atingiam e, ainda atingem o poder

judiciário, têm como público alvo o cidadão que deixava de recorrer à justiça para a solução dos

conflitos do dia-a-dia.

A sistemática dos "juizados" é orientada pelos princípios da busca permanente de

conciliação; da simplicidade, através da informalidade e oralidade; da economia; celeridade e

amplitude dos poderes do juiz. Ao contrário da justiça comum, na qual são cobradas custas

processuais, a presença do advogado é obrigatória e o processo judicial é cercado de

formalidades, respeitando prazos longos e a possibilidade, quase interminável, de se recorrer das

decisões judiciais, os procedimentos nos Juizados Especiais são gratuitos, podem ser

encaminhados oralmente sem qualquer formalidade e, em alguns casos, quando a presença do

advogado é dispensável, o próprio reclamante pode dar andamento a sua questão, tendo contato

direto com o juiz.

16 Watanabe, 1985.

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A primeira experiência deste sistema ocorreu no Rio Grande do Sul, onde foi instalada,

ainda no início dos anos 80 o Conselho de Conciliação e Arbitragem, com competência para

decidir extrajudicialmente, causas com valor até 40 ORTNs17.

Em 1984 foi aprovada a lei que instituiu os Juizados de Pequenas Causas – Lei 7.244/84 –

e que definiu os princípios norteadores de seu procedimento.

Com a Constituição Federal de 1988, os Juizados Especiais passaram a fazer parte da

estrutura do poder judiciário, sendo obrigatória a sua criação no âmbito da União, no Distrito

Federal, nos Territórios e Estados (artigo 98, inciso I).

No âmbito estadual a regulamentação dos Juizados Especiais veio em 1995, através da Lei

9099. Esta lei retirou a expressão “pequenas causas” do nome dos Juizados Especiais, ampliou a

sua competência para a área criminal e, na área cível, estendeu as causas ao teto de até 40 salários

mínimos e a possibilidade de execução, sem processo de conhecimento, de título executivo

extrajudicial até o valor permitido. Em 1999, a Lei 9.841 estendeu a competência dos Juizados

Especiais para as microempresas.

No âmbito federal, os Juizados Especiais foram organizados por meio da Lei 10.259 em

2001. De acordo com esta lei os Juizados Especiais Federais têm competência absoluta para

processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal na área cível até o valor de

sessenta salários mínimos e na área criminal as infrações de menor potencial ofensivo, ou seja os

crimes com pena máxima não superior a dois anos.

Em 1999, última data em que o Banco Nacional do Poder Judiciário realizou um censo

sobre o número de “juizados” em funcionamento, contabilizou-se 2.564 Juizados Especiais em

todo o país18. Em alguns estados, desde o início do seu funcionamento, as atividades dos

"juizados" chegaram a superar a movimentação da justiça comum. Este é o caso, por exemplo, do

estado do Amapá, onde no período entre 1996 e 1999, o número de novos processos nos Juizados

Especiais foi maior do que o de processos entrados na justiça comum. Contando com 30 juizados

especiais cíveis e criminais19, em 1996, deram entrada no Juizado Especial do Amapá 17.931

novos casos, enquanto que na justiça comum, este número foi de 10.153 processos. Em 1997, os

casos nos "juizados" representaram mais que o dobro do número de novos processos na justiça

comum: nos Juizados Especiais deram entrada 24.631 novos processos, enquanto que na justiça

17 Na época da instalação do Conselho, 40 ORTNs correspondiam a 4,76 salários mínimos. 18 Fonte: Supremo Tribunal Federal, BNDPJ – Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário. Não estão disponíveis dados mais recentes acerca do número total de Juizados Especiais em funcionamento no país. 19 Fonte: Supremo Tribunal Federal, BNDPJ – Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário.

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comum foram 11.758. Em 1998, a diferença caiu um pouco, apesar de ainda receberem mais

processos – 19.307 nos Juizados Especiais e 17.836 novos processos na justiça comum. Da

mesma forma, em 1999: 24.387 nos "juizados" e 21.268 novos processos na justiça comum.

Tabela 1 – Amapá – Movimento Judiciário

Ano Nº de processos distribuídos Justiça Comum Juizados Especiais 1996 10.153 17.931 1997 11.758 24.631 1998 17.836 19.307 1999 21.168 24.387

Fonte: Poder Judiciário, Justiça do Estado do Amapá, Corregedoria-Geral da Justiça

No Rio Grande do Sul, está em funcionamento o maior número de Juizados Especiais –

220 em todo o estado. Neste estado, os Juizados Especiais, desde 1999, já fazem parte da

organização do poder judiciário estadual, contando com varas específicas e com juízes titulares.

Este estado é também o único que conta com a atuação de juízes leigos. O Paraná aparece em

segundo lugar quanto ao número de Juizados Especiais – 218 -, seguido do Rio de Janeiro que,

em 2001 possuía 193 juizados cíveis e criminais em todo o estado20.

Mas, se numericamente a movimentação processual nos Juizados Especiais indica a

ampliação do acesso à justiça, em que medida eles vêm democratizando de fato este acesso, no

sentido de tornar a justiça mais rápida, mais barata e menos formal?

Esse é o objetivo do presente trabalho: analisar a atuação dos Juizados Especiais em São

Paulo, tendo como parâmetro a conciliação, a celeridade e a economia processual. Para tanto

deverei me concentrar na análise dos Juizados Especiais cíveis. Ao contrário do que ocorre na

área criminal, na área cível é possível identificar o acesso efetivo ao sistema de justiça e a forma

pela qual o cidadão tem seus conflitos do dia-a-dia solucionados pelo Estado. O funcionamento

do Juizado Especial cível depende da procura da população, estando implícitas na sua atuação as

demandas encaminhadas pelo cidadão e as suas expectativas, além da visibilidade do sistema, que

de acordo com o seu desempenho, pode tornar-se, ou não, uma opção em relação à justiça

comum. A fim de viabilizar o desenvolvimento da pesquisa foi escolhido como objeto de estudo

os Juizados Especiais de São Paulo. A escolha deveu-se pelo número de casos que atende -

594.359 de processos21 -, sendo hoje o maior sistema em funcionamento. Neste sentido, deverei

20 Fonte: Supremo Tribunal Federal, BNDPJ – Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário. 21 Fonte: Grupo de Movimentação do Judiciário de São Paulo, referente ao mês de março de 2003.

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me concentrar na análise do Juizado Especial Cível Central de São Paulo, que possui mais de

80.000 processos em andamento22.

Juizado Especial Cível

O Juizado Especial cível tem competência para solucionar causas de menor complexidade

e de valor até 40 salários mínimos, como questões de direito do consumidor, cobranças, conflitos

de vizinhança, acidentes de trânsito, despejo para uso próprio etc. Não cabe ao "juizado" julgar

causas relacionadas ao direito de família; causas trabalhistas; de direito de sucessão; de criança e

adolescente; casos de falência e concordata e causas que sejam de interesse público ou tenham

como autor ou réu o Estado.

Nas causas de valor maior que 20 salários mínimos é obrigatória a presença de um

advogado. Abaixo deste valor, as reclamações podem ser encaminhadas diretamente - sem

intermediários – pelo próprio cidadão.

Qualquer cidadão maior de 18 anos pode encaminhar reclamações no Juizado Especial.

De acordo com a Lei 9.099/95 as pessoas jurídicas não podem propor ações no Juizado Especial,

podendo figurar apenas como réus. Recentemente contudo, a Lei nº 9.841/99 estendeu o

procedimento do Juizado Especial às microempresas.

Juizados Especiais: a realidade paulista

Em São Paulo, os Juizados Especiais, antigos "tribunais de pequenas causas", começaram

a funcionar em 1985. O primeiro tribunal foi instalado no bairro da Lapa, zona oeste da capital.

Nos dez primeiros anos de funcionamento, os tribunais de pequenas causas funcionavam durante

o período noturno e não havia juízes ou cartórios específicos para o sistema. Estes últimos eram

aproveitados da justiça comum, enquanto que os juízes trabalhavam através de rodízio. Em

outubro de 1996, os tribunais foram convertidos em Juizados Especiais, passando a funcionar

com cartórios próprios e juízes que atuam exclusivamente no sistema23.

Na cidade de São Paulo, estão em funcionamento 15 juizados especiais cíveis (Central,

Jardim São Luis, Encosta Norte, Santana, Santo Amaro, Jabaquara, Lapa, São Miguel Paulista, 22 Fonte: Diretoria Juizado Cível Central, referente ao mês de maio de 2003. 23 Os Juizados Especiais em São Paulo estão regulamentados pela Lei Complementar nº 851, de 9 de dezembro de 1998.

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Penha de França, Tatuapé, Vila Prudente, Guaianazes, Vila Voith, Ipiranga e Pinheiros) e 1

juizado especial criminal (Itaquera). No interior, estão em atividade 263 juizados especiais, que

atuam tanto na área cível quanto na área criminal e funcionam, conjuntamente, com as varas da

justiça comum.24

Os colégios recursais, responsáveis pelo julgamento dos recursos, são formados, cada um,

por três juízes de 1º grau. Em maio de 2003, a cidade contava com 6 colégios recursais em

atividade e, no interior do estado, estão em funcionamento 59 turmas.

Os magistrados que atuam nos Juizados Especiais da cidade de São Paulo são juízes

auxiliares com designação especial para exercerem atividades nos Juizados Especiais. No

interior, não existem juízes com designação especial. Assim, nos locais onde estão instalados

Juizados Especiais, os juízes são responsáveis pelas varas da justiça comum e também

desempenham funções no Juizado Especial.

Desde 1988, quando foram instalados os primeiros "juizados" no estado de São Paulo, até

o mês de março de 2003, a procura pelos Juizados Especiais cresceu de forma extraordinária.

Tabela 2 – Juizados Especiais Cíveis

Movimento Judiciário, Estado de São Paulo – (capital e interior) Processos em Andamento

1988 1.736 1989 4.736 1990 7.789 1991 14.162 1992 25.522 1993 37.418 1994 51.891 1995 94.101 1996 142.609 1997 164.146 1998 196.575 1999 278.350 jan. – jun./2000* 321.699 2001 470.461 2002 575.406 jan. – mar./2003 594.359

Fonte: Grupo de Movimentação do Judiciário de São Paulo *Não foram disponibilizados dados referentes ao 2ºsemestre de 2000

Como indica a Tabela 2, passou-se de 1.736 casos em 1.988 para 575.406 em 2002 – um

aumento de 33.000%. A tendência ao aumento na demanda parece estar ainda em progresso.

24 Dados referentes à dezembro de 2002. Fonte: Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

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Tanto assim que só nos três primeiros meses de 2003 entraram mais processos do que em todo o

ano anterior. Sublinhe-se que o crescimento no número de processos, de 1994 para 1995, e de lá

para cá, coincide com a promulgação da nova lei que tratou da sistemática dos Juizados Especiais

– lei 9.099/95 – e com a instalação dos "juizados" autônomos na cidade, como foi o caso do

Juizado Especial Cível Central.

Apesar da demanda crescente nos Juizados Especiais em São Paulo, eles ainda não fazem

parte da estrutura do poder judiciário estadual, não dispondo de varas próprias, de cargos e nem

de juízes nomeados. Os juízes que atuam nos Juizados Especiais de São Paulo são juízes

auxiliares da capital com designação especial, definida pela presidência do Poder Judiciário local.

Os conciliadores que atuam no “juizado” paulista, não são remunerados e não recebem a

formação e o aperfeiçoamento necessário para o desempenho desta função. Assim, os Juizados

Especiais, em São Paulo, estão sujeitos à oscilação da vontade política dos dirigentes do Tribunal

de Justiça, o que afeta a estabilidade e institucionalização do sistema.

Juizado Especial Cível Central

O Juizado Especial Cível Central, localizado no bairro do Paraíso, região central da

cidade, foi o primeiro a ser instalado sob os moldes da Lei 9.099/95, com juízes atuando

exclusivamente no sistema. Além de fazer o atendimento no prédio central, o Juizado Especial

Central também cuida dos casos que são atendidos pelo Juizado Itinerante25 e aqueles que

chegam até os anexos que funcionam em quatro faculdades de Direito, localizadas próximas à

região central da cidade: a Faculdade Mackenzie, localizada no bairro da Consolação; a

Faculdade São Judas, localizada na Mooca; a Faculdade Metropolitana Unida, que fica no bairro

da Liberdade e a UNIP localizada no bairro da Lapa.

O Juizado Central atende toda a região central da cidade, incluindo os bairros do Brás,

República, Santa Cecília, Consolação, Bela Vista e Liberdade; na zona leste: Cabuci, Mooca e

Água Rasa; zona norte: Belém, Pari e Bom Retiro; zona oeste: Barra Funda, Perdizes e Jardim

Paulista; e na zona sul Itaim Bibi, Moema, Vila Mariana.

25 Desde agosto de 1998 está em funcionamento, em São Paulo, o Juizado Itinerante. Este modelo corresponde a um Juizado Especial que funciona em um trailer que percorre os bairros da periferia na capital e as comunidades mais distantes das comarcas do interior. Na capital, existe uma unidade do juizado e, no interior, quarenta e um juizados deste tipo.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

13

Compreendendo a maior região da capital, o Juizado Central, em maio de 2003, contava

com uma estrutura de 11 juízes, todos auxiliares da capital; 82 funcionários, entre escriturários,

oficiais de justiça, auxiliar do judiciário, atendentes; e 95 conciliadores.

O Juizado Central chama a atenção pelo volume de processos com que trabalha. Desde a

sua instalação como Juizado Especial cível, em 1996, até o final de 2002, o número de processos

que deram entrada cresceu mais de 450%. Em 1996, entraram 4.992 processos; no segundo ano

de funcionamento (1997) foram 8.511 processos; em 1998, 13.355; em 1999, 14.927 processos.

Em 2000, foram distribuídos 16.914, este número se estabilizou em 2001 – 16.151 -,

principalmente em decorrência da greve do poder judiciário nos meses de agosto, setembro,

outubro e novembro. Em 2002, o número de processos que entraram no sistema mais uma vez

surpreendeu chegando a 23.693, o que representa, em média, 65 novos processos por dia.

Tabela 3 – Juizado Cível Central

Processos Distribuídos 1996 4.992 1997 8.511 1998 13.355 1999 14.927 2000 16.914 2001 16.151 2002 23.693 jan.-abril/2003 7.922

Fonte: Diretoria Juizado Cível Central

O movimento no Juizado Especial Cível Central também pode ser verificado na tabela 4

abaixo referente aos anos de 1999, 2000, 2001 e 2002. Neste período foram atendidas 78.491

pessoas. Deste atendimento 73% resultou em novos processos. Ainda, foram realizadas em

média, 35 audiências e resolvidos 56 processos por dia no Juizado Central da cidade de São

Paulo.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

14

Tabela 4 – Juizado Especial Cível Central

Movimento Judiciário 1999 2000 2001 2002 TOTAL atendimentos 21.047 23.645 20.689 28.037 78.491 processos distribuídos 14.927 16.914 16.151 23.693 56.758 audiências26 10.758 9.299 7.985 7.523 24.807 processos resolvidos27 8.432 13.324 11.837 14.697 39.858 recursos interpostos 1.411 1.904 1.341 1.921 5.166

Fonte: Diretoria do Juizado Especial Cível Central

Com o objetivo de conhecer de que forma o sistema dos Juizados Especiais vem

processando os casos que chegam até ele e se este modelo representa de fato, a democratização

do acesso à justiça, analiso neste trabalho os processos encerrados no Juizado Especial Cível

Central da cidade de São Paulo desde sua instalação como Juizado de Pequenas Causas, em 1992,

até dezembro de 2002. A análise destes processos permite que sejam verificados os tipos de caso

que chegam até os "juizados", a forma pela qual eles são encaminhados, o tempo de resolução

dos conflitos, a forma de solução destes conflitos.

HIPÓTESE

Se o critério utilizado para a definição do termo democratização do acesso à justiça fosse o

atendimento de um número cada vez maior de pessoas, o levantamento preliminar da

movimentação processual nos Juizados Especiais Cíveis de São Paulo indica que o sistema vem

democratizando o acesso à justiça. Porém, adotando como parâmetro o critério definido pela

legislação que criou o sistema dos Juizados Especiais – Lei 7.244/84 -, a hipótese principal

levantada nesta pesquisa é que o Juizado Especial vêm democratizando o acesso à justiça na

medida em que soluciona os conflitos encaminhados pelo cidadão comum por meio da

conciliação, simplicidade, celeridade e economia.

De forma menos abrangente é possível desdobrar esta hipótese em outras mais específicas:

26 Estas audiências compreendem as audiências de conciliação conduzidas por conciliadores e as audiências de instrução e julgamento presididas por juízes. 27 No número de processos resolvidos não estão computados os casos que foram extintos sem decisão do mérito e os casos extintos por impossibilidade de execução.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

15

1. Os casos que chegam até o Juizado Especial Cível Central da cidade de São Paulo

são, em sua maioria, de baixo valor – até 20 salários mínimos –, mostrando que o

sistema atende conflitos do dia-a-dia envolvendo o cidadão.

2. Os casos encaminhados ao Juizado Especial Cível Central são, em sua maior parte,

conflitos decorrentes de relação de consumo, acidente de trânsito ou direitos de

vizinhança, o que significa que os Juizados Especiais atendem os conflitos do dia-a-

dia envolvendo o cidadão.

3. Os casos processados pelo Juizado Especial Cível Central são resolvidos, em sua

maioria, na audiência de conciliação, significando que os Juizados Especiais

solucionam os conflitos por meio da conciliação, com rapidez e simplicidade.

4. Os casos processados pelo Juizado Especial Cível Central são resolvidos em sua

maioria por meio de acordo, significando que os Juizados Especiais solucionam os

conflitos por meio da conciliação e de forma simples.

5. Os casos processados pelo Juizado Especial Cível Central são encaminhados, em sua

maioria, com o acesso direto da população, sem a presença de advogados. Isto

significa que o sistema dos Juizados Especiais democratizam o acesso à justiça pois

atendem aos critérios da simplicidade e economia na solução dos conflitos.

METODOLOGIA

Para testar estas hipóteses foi utilizado como método de pesquisa o método quantitativo.

A partir do levantamento do número de processos encerrados no Juizado Especial Cível Central

desde 1992 até dezembro de 200228 – 32.666 processos – foi elaborada uma amostra, com

significância estatística, que correspondeu a 10% do total dos casos encerrados, ou seja 3.266

processos. Sorteados os casos, passou-se então à coleta dos dados. Ao final, esta amostra,

28 Com exceção dos processos encerrados em 1999.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

16

eliminando os erros estatísticos, foi reduzida a 3.174 processos, que corresponde a 9,71% do total

de casos encerrados no período analisado.

Uma das dificuldades enfrentadas neste momento da pesquisa refere-se ao tipo de material

que estaria disponível a fim de analisar os processos desde a instalação do Juizado Especial

Central da cidade de São Paulo até o ano de 2002. Como era previsto, grande parte destes

processos resolvidos já estavam arquivados, o que dificultava o nosso acesso a estes dados. Outra

parte dos processos (relativos aos anos de 1997, 1998 e 1999) foram desmontados e destruídos.

Esta situação impediu que o processo fosse utilizado como documento de pesquisa. Desta forma,

optou-se pela utilização dos Livros de Registro de Pedido e Livros de Registro de Sentença os

quais possuem não somente as informações necessárias para compor as variáveis da pesquisa,

como também todo o histórico dos processos. Estes livros estão datados e catalogados e são

formados na medida em que os processos vão sendo extintos. Os Livros de Registro de Pedido e

de Registro de Sentença possuem todas as informações dos processos finalizados até 1998. No

total, desde 1992 até 1998, o Juizado Especial Cível Central possui 240 Livros de Registro de

Pedido e 540 Livros de Registro de Sentença. O Livro de Registro de Pedido possui todos os

processos que deram entrada e foram extintos no Juizado Especial Cível Central desde a sua

instalação em 1992. Neste registro consta o nome das partes, o tipo de causa, a presença ou não

de advogado, a data da entrada do pedido, as datas da audiência de conciliação e da audiência de

julgamento (caso tenha sido necessário), a forma de solução do caso – seja por meio de acordo

dentro do processo, acordo fora do processo ou decisão do juiz –, em favor de quem foi decidido

o caso, a existência ou não de recurso e o resultado do recurso. Já no Livro de Registro de

Sentença – 540 livros – estão registradas todas as sentenças e os acordos homologados. No

momento do levantamento dos dados, todos os processos encerrados em 1999 já tinham sido

transferidos para o arquivo central do Tribunal de Justiça, o que impedia nosso acesso aos dados.

Já os processos encerrados em 2000, 2001 e 2002 ainda estavam disponíveis em cartório, o que

tornou possível o exame do material. Assim, até 1998 foi utilizado como fonte de pesquisa o

Livro de Registro de Pedido e com relação às informações dos processos iniciados em 2000,

2001 e 2002 foi utilizado como fonte de pesquisa os processos arquivados no cartório do Juizado

Especial Cível Central.

Definida a amostra e a fonte que seria utilizada para a coleta dos dados, passou-se então à

definição das informações necessárias para testar as hipóteses. Assim é que se construiu uma

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

17

“máscara” a partir da qual seriam coletados os dados. A definição das informações que

compuseram a “máscara” dependeu de pré-teste realizado com uma amostra equivalente a 0,5%

do total de processos que seriam analisados, ou seja, 150 processos. Ao final deste processo,

foram definidas como relevantes para a realização da pesquisa as seguintes informações:

1. Data de entrada do processo

2. Qualificação das partes

3. Tipo de conflito

4. Valor da causa

5. Presença de advogado

6. Data da audiência de conciliação

7. Resultado audiência de conciliação

8. Data da audiência de julgamento

9. Resultado audiência de julgamento

10. Existência de acordo

11. Tipo de acordo

12. Existência de sentença

13. Tipo de sentença

14. Existência de recurso

15. Solução do recurso.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

18

Com estas informações foram verificadas as seguintes variáveis de acordo com as

hipóteses previamente definidas:

Variável Objetivo / Hipótese

a) valor da causa; Verificar se o Juizado Especial Cível atende os

conflitos do dia-a-dia envolvendo o cidadão. (hipótese 1)

b) tipo de conflito; Verificar se o Juizado Especial Cível atende os

conflitos do dia-a-dia envolvendo o cidadão. (hipótese 2)

c) qualificação das partes; Verificar se o Juizado Especial Cível atende o cidadão. (hipótese 1 e 2)

d) momento em que o conflito foi solucionado;

Verificar se o caso foi resolvido na audiência de conciliação, o que garante a rapidez e a simplicidade do sistema. (hipótese 3)

e) forma de resolução do conflito; Verificar se o caso foi resolvido por meio de acordo. (hipótese 4)

f) existência de recurso; Verificar se o caso foi resolvido com rapidez, simplicidade e economia (hipótese 3 e 5)

g) presença de advogado; Verificar se o caso foi encaminhado diretamente pela

população, o que garante a simplicidade e economia do sistema. (hipótese 5)

RESULTADOS PRELIMINARES

A escolha da metodologia utilizada e o modo pelo qual foram coletados os dados é a

tentativa de estudar o funcionamento e o fluxo de casos da forma mais imparcial possível. É certo

que os resultados obtidos a partir da análise quantitativa dos processos no Juizado Especial Cível

Central da cidade de São Paulo desde sua instalação até 2002, possuem algumas limitações,

principalmente no que diz respeito à qualidade das soluções dos processos analisados e a

efetividade ou não da execução destas soluções. Estas questões, no entanto, não são objetos de

estudo neste trabalho.

Os dados que serão aqui apresentados, como foi dito acima, são específicos de um

"juizado" na cidade de São Paulo. Mas, por ser aquele que possui o maior número de casos em

andamento e por cobrir a maior área do município, é possível considerar que, de forma geral, o

sistema dos Juizados Especiais, produz resultados muito próximos dos aqui apresentados.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

19

Dos 3.174 casos analisados no Juizado Especial Cível Central da cidade de São Paulo,

3.150 casos foram encaminhados por pessoa física e 24 casos por pessoa jurídica (microempresa).

A Lei 9.099/95, com o objetivo de atender as demandas por resolução dos conflitos que

envolvem o cidadão no seu dia-a-dia, definiu que qualquer pessoa maior de 18 anos pode

encaminhar reclamações no juizado especial. As pessoas jurídicas, desta forma, não seriam parte

legítima para propor ações neste sistema.

Em 1999, a competência dos Juizados Especiais foi estendida às microempresas que

passaram a ser parte legítima para encaminhar processos nos “juizados”.

O aumento de competência produziu reflexos diversos nos diferentes estados. No

Encontro Nacional dos Juizados Especiais, realizado em maior de 2000, em Vitória, foi possível

perceber que, em alguns estados, extrapolando a competência definida por lei, os "juizados" vêm

recebendo reclamações e processando pedidos de microempresas e de outras pessoas jurídicas,

mesmo antes da lei 9.841/99. Este é o caso de Rondônia, do Pará, de Goiás, do Mato Grosso, de

Piauí, de Sergipe e da Bahia. No Amapá, onde os processos encaminhados por microempresas

começaram a dar entrada em dezembro de 1999, tais demandas já correspondem a 50% do total

de casos que deram entrada nos quatro primeiros meses do ano 2000, refletindo um aumento de

80% no número de processos distribuídos, se comparado com o mesmo período do ano anterior29.

Em São Paulo, a ampliação de competência dos Juizados Especiais gerou discussões

acirradas entre os operadores do direito. Em entrevistas realizadas no início de 2000, alguns

meses depois da promulgação da lei, muitos juízes viam esta ampliação de forma positiva, na

medida em que comprovava a eficiência do sistema na solução dos conflitos de forma rápida e

efetiva:

“… a ampliação (da competência) do Juizado para as microempresas é sinal de nosso

sucesso… não haveria um lobby do SEBRAE, das Associações ligadas às microempresas, para incluir os microempresários no nosso sistema, se não fossemos bem sucedidos…” (Juíza de Direito, maio de 2000)

“… eu vejo a questão das microempresas com muito otimismo, …, o crescimento do

sistema dos "juizados" é irreversível e, no futuro, quem sabe a justiça comum não esteja tão contaminada pelos nossos procedimentos que seja incorporada por este sistema…” (Juiz de Direito, setembro de 2000)

29 No estado do Amapá, em 1999, foram distribuídos 24.387 processos. Até abril de 2000, tinham dado entrada 6.900 novos casos e destes 3.448 tinham como autor microempresas. Fonte: Poder Judiciário, Justiça do Estado do Amapá, Corregedoria Geral de Justiça.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

20

Por outro lado, os próprios juízes argumentavam que, sem o incremento da infra-estrutura

dos "juizados", corria-se o risco do sistema entrar em colapso passando a sofrer os mesmos

problemas da justiça comum. Disse-nos um juiz entrevistado:

“é um problema aumentar a competência sem aumentar a estrutura, podemos virar um

braço da justiça comum e trazer todos os problemas que lá existem, como a lentidão, por exemplo.” (Juiz de Direito, setembro de 2000)

Kazuo Watanabe foi ainda mais longe na sua avaliação da ampliação de competência dos

Juizados Especiais. Segundo ele, o problema não estaria somente na falta de infra-estrutura, mas

no desvio da finalidade do sistema dos Juizados Especiais que é o de atender o cidadão e os seus

conflitos do dia-a-dia. Este desvio já teria ocorrido com a Lei 9.099/95 e estaria se aprofundando

no caso das microempresas:

“A ampliação da competência promovida pela lei 9.099/95, …, procurando acelerar a solução (julgamento e execução) de certas causas, como as de valor não excedente a 40 vezes o salário mínimo, as de despejo para uso próprio, as possessórias e as execuções de títulos extrajudiciais no valor de até 40 vezes o salário mínimo, o que significa, em nosso sentir, desvio daquela finalidade maior, que é a de facilitação do acesso à Justiça pelo cidadão comum e principalmente pelos mais humildes, até então quase completamente marginalizados. Seguem o mesmo caminho todas as propostas legislativas que, sem exigir a melhoria das infra-estruturas materiais e pessoas que possibilitem aos Juizados Especiais um adequado desempenho, procuram ampliar mais a sua competência.” (Watanabe, 1999, p. 3)

Os números relativos ao Juizado Especial Cível Central mostram, no entanto, que o

aumento da competência para propor ação no sistema do Juizado Especial não alterou o perfil das

demandas que chegaram lá: as ações propostas por microempresas, correspondem a 0,8% do total

de demandas que encaminhadas ao "juizado". Analisando a distribuição desta variável ao longo

do período estudado (Gráfico 1), tão pouco é possível afirmar que existe uma tendência de

crescimento da participação deste tipo de autor nas demandas que chegam até o Juizado Especial

Cível Central.

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

21

Na análise do perfil do réu, o quadro é bastante diferente: 58,1% dos casos apresentam

como réu pessoa jurídica, enquanto que em 41,9% dos casos foram acionadas pessoas físicas.

Estes números são, em parte, reflexo do tipo de demanda que chega até o sistema dos Juizados

Especiais. Como mostra o Gráfico 2 aproximadamente a metade dos casos no período analisado

correspondem a conflitos decorrentes de relação de consumo – 49%. Este número acompanha o

resultado de outras pesquisas realizadas sobre os Juizados Especiais, que também constataram a

importância do sistema como um canal de proteção de um tipo específico de cidadão – o

consumidor30.

30 Vianna, 1999 e D’Araújo, 1996.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 2000 2001 2002

Gráfico 1 - Distribuição, tipo de autor / Ano

Pessoa Física Microempresa

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

22

As demandas típicas de relações individuais, como acidente de trânsito, locação e direito

de vizinhança, representam em conjunto 38,6% do total de casos analisados.

Ao contrário do resultado do estudo desenvolvido no Rio de Janeiro31, a distribuição da

variável – "tipo de conflito" – durante o período analisado (Gráfico 3), ou seja desde a criação do

Juizado Especial Cível Central em 1992 até dezembro de 2002, mostra que os conflitos

envolvendo relação de consumo continuam predominando, correspondendo em média, a 50% dos

casos que entram no sistema por ano. Neste sentido, é possível observar que a partir de 1988

houve um aumento no número de conflitos sobre direito do consumidor: em 2000 e de lá até o

final de 2002 este tipo de conflito atingiu o percentual de 60% do total de casos encaminhados ao

Juizado Especial Cível.

No Rio de Janeiro, entre 1994 e 1999, os casos de conflito relativos a defesa do

consumidor tiveram um decréscimo de 33,4%32. Assim, como afirma Luiz Werneck Vianna na

análise dos Juizados Especiais cariocas:

31 Vianna, 1999. 32 Vianna, 1999, p. 207.

Grafico 2 - Tipo de conflito

Relação de Consumo49%

Acidente de Trânsito21%

Locação10%Direito de Vizinhança

8%

Outras12%

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

23

“… os Juizados Especiais, a par de terem introduzido um sistema de proteção dos indivíduos contra as empresas, vêm-lhes permitindo exercer seus direitos em suas relações interpessoais …” (Vianna, 1999, p. 207)

Outro dado importante envolvendo os conflitos que tratam de relação de consumo diz

respeito ao valor da causa. Apesar de não haver grandes variações quanto a esta variável, se

comparado com os outros tipos de conflito, a categoria "relação de consumo" apresentou a maior

média de valor da causa medido em salários mínimos: o valor médio das ações de relação de

consumo é de 12,72 salários mínimos, seguido dos casos de locação que apresentaram valor

médio em salários mínimos de 12,32 salários mínimos (Gráfico 4).

O tipo de conflito que apresentou o menor valor, em média, foram os conflitos de

vizinhança: 10,27 s.m., sendo que 50% destes casos tinham valor até 6,62 s.m. (mediana).

0%

20%

40%

60%

80%

100%

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 2000 2001 2002

Gráfico 3 - Distribuição - Tipo de conflito/Ano

Rel. Consumo Ac. Trânsito Locação Dir. Vizinhança Outras

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

24

Apesar de apresentar, em média, o maior valor da causa, os processos envolvendo relação

de consumo não correspondem àqueles que mais contaram com a presença de advogado. O tipo

de conflito que, com maior freqüência, foi apresentado por meio de advogado foram os casos de

locação, quando 41% do total de conflitos deste tipo contaram com a presença de advogados,

seguidos dos casos de acidente de trânsito (28,5%). Enquanto que nos casos envolvendo relações

de consumo, somente 25,4% foram apresentados por advogados (Gráfico 5).

0

2

4

6

8

10

12

14

Val

or d

a ca

usa

em s.

m. (

méd

ia)

relação de consumo acidente de trânsito dir. vizinhança locação outros

Gráfico 4 - Valor da causa por tipo de conflito

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

25

Estes números mostram a eficiência do sistema dos Juizados Especiais como um canal de

acesso direto do cidadão à justiça, na medida em que a grande maioria dos casos são

encaminhados sem a presença de advogado: do total de casos analisados, 71% foram

encaminhados diretamente pelo autor da ação, sem a presença de advogado, enquanto que 29%

dos processos foram encaminhados por advogados.

Este padrão sofreu um pequeno desvio em 1996, quando houve uma aproximação entre o

número de casos encaminhados por advogados e aqueles apresentados diretamente pela parte:

naquele ano deram entrada no Juizado Especial Cível Central 598 casos, sendo 270 casos

(45,2%) apresentados por advogados e 328 (54,8%) reclamações apresentadas diretamente

(Gráfico 6).

A explicação para este fenômeno pode estar na promulgação da Lei 9.099/95 que alterou a

competência dos Juizados Especiais para casos até 40 salários mínimos e tornou obrigatória a

presença de advogados nas causas com valor entre 20 e 40 salários mínimos. A Lei nº 7.244/84,

que até aquele momento disciplinava o funcionamento dos Juizados Especiais definia como

facultativa a participação dos advogados em todos os casos de competência daqueles

"juizados"33. Com a expansão da competência dos Juizados Especiais e a obrigatoriedade da

33 Casos com valores até 20 salários mínimos (artigo 3º da Lei 7244/84).

0% 20% 40% 60% 80% 100%

Outros

Dir. Vizinhança

Acidente de Trânsito

Relação de Consumo

Locação

Gráfico 5 - Presença de advogado por tipo de conflito

Presença de Advogado Postulação Direta

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

26

presença de advogado em casos com valor entre 20 e 40 salários mínimos, cresceu o número de

processos encaminhados por meio de advogado.

A partir de 1996, o número de casos encaminhados por advogados diminuíram, sendo

possível afirmar que desde o ano 2000, a participação dos advogados nos processos do Juizado

Especial Cível Central vem decrescendo34.

O valor médio das causas que chegam no Juizado Especial Cível Central é de 11,7

salários mínimos, sendo que até 50% dos casos apresentaram valor igual a 8,3 salários mínimos e

14,7% dos processos analisados apresentaram valor entre 2 e 3,99 s.m. A segunda categoria com

maior número de casos corresponde à aquela com valor maior que 20,01, seguida das causas com

valor entre 4 e 5,99 salários mínimos (Gráfico 7)

34 A variável "presença de advogado" foi definida no momento da apresentação da reclamação no Juizado Especial Cível Central.

0 100 200 300 400 500 600

2002

2001

2000

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

Gráfico 6 - Distribuição, presença de advogado / Ano

Presença de advogado Postulação direta

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Luciana Gross Cunha LCunha_Juizado

27

Se, como foi demonstrado acima, o valor da causa, com relação ao tipo de conflito, não

determina a presença de advogado, analisando separadamente o cruzamento entre as variáveis

“valor da causa” e “presença de advogado”, é possível afirmar que quanto maior o valor da causa,

mais freqüente é a participação dos advogados nos processos. Conforme demonstrado no Gráfico

8, esta relação é diretamente proporcional até os conflitos com valor máximo de 19,99 salários

mínimos.

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Até 1,99

2 – 3,99

4 – 5,99

6 – 7,99

8 – 9,99

10 – 14,99

15 – 19,99

20

Gráfico 8 - Presença de Advogado por Valor da Causa

Presença de advogado Postulação direta

0 2 4 6 8 10 12 14 16

nº de processos

Até 1,99

2 – 3,99

4 – 5,99

6 – 7,99

8 – 9,99

10 – 14,99

15 – 19,99

20

20,01 e maior que este valor

salá

rio m

ínim

oGráfico 7 - Valor da causa em salário mínimo

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28

A situação se inverte, porém, nos casos com valor igual a 20 salários mínimos. Duas

causas podem explicar este fenômeno: uma das explicações possíveis para esta inversão, talvez

esteja na própria definição legal que impõe a presença obrigatória de advogados para os casos

com valor maior que 20 salários mínimos. Sendo este o valor máximo para que o caso seja

apresentado no Juizado Especial Cível sem a presença de advogado, a quantidade de casos com

este valor pode indicar que o autor, no momento da apresentação da sua reclamação, tende a

abaixar o valor da causa, a fim de que seja possível a postulação direta, sem intermediários. Outra

explicação possível é a possibilidade que o autor vê em ser recompensado em seus danos ao

máximo, sem que para isso precise contratar um advogado. Assim, tende a aumentar o valor da

causa até o limite autorizado por lei para encaminhar pessoalmente sua reclamação no Juizado

Especial cível.

A partir de 40 salários mínimos, sendo obrigatória a participação de advogados não há

correlação a ser estabelecida.

Do total de processos analisados, 43% foram resolvidos através de acordo e 24,3% por

decisão do juiz com análise do mérito (Gráfico 9). Este número indica a eficiência do sistema dos

Juizados Especiais na busca constante da conciliação como forma privilegiada de solução dos

conflitos. A quantidade de casos extintos por desistência do autor – 31% - também merece

atenção, já que pode indicar que, a ausência de custas processuais permite o uso aleatório ou sem

fundamento do sistema dos Juizados Especiais.

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29

Outro dado revelador do funcionamento dos Juizados Especiais refere-se ao tipo de acordo obtido

(Gráfico 10).

Os acordos nos Juizados Especiais podem ser obtidos em três momentos e por três formas

diversas: durante a primeira audiência, através do conciliador; na audiência de instrução e

julgamento, sob a orientação do juiz; e extrajudicialmente, quando as partes, depois de

encaminhada a reclamação e antes de prolatada a sentença, entram em acordo sem a interferência

do conciliador ou juiz.

Dos casos resolvidos por meio de acordo, 81,6% foram solucionados na audiência de

conciliação. Este resultado indica não somente a eficiência do sistema no que diz respeito à

informalidade e economia, mas também quanto à rapidez na solução dos conflitos.

Gráfico 9 - Tipo de solução do processo

Acordo43%

Sentença com análise do mérito24%

Extinção do processo sem julgamento do mérito

2%

Desistência do autor31%

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30

Dos casos resolvidos por meio de sentença com análise do mérito, 71,5% tiveram como

resultado sentenças favoráveis ao autor (Gráfico 11). O que temos com este dado é a indicação de

que, quando o caso não é resolvido por meio de acordo ou quando não ocorre a desistência do

autor, é grande a possibilidade do autor ter o direito pleiteado, garantido.

Gráfico 10 - Tipo de acordo

Na audiência de julgamento11%

Acordo Extrajudicial7%

Na audiência de conciliação82%

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31

A presença de advogado, não deve ser vista como um instrumento que interfere

positivamente no resultado do processo. De um lado, a presença de advogado não interfere na

existência de acordo (Gráfico 12).

Gráfico 11 - Tipo de sentença com análise do mérito

Sentença favorável ao autor72%

Sentença favorável ao réu28%

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

presença de advogado

postulação direta

Gráfico 12 - Presença de Advogado por existência de acordo

existência de acordo não houve acordo

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32

O mesmo diagnóstico é feito na análise do cruzamento entre as variáveis “presença de

advogado” e “tipo de sentença”: a presença de advogado não interfere no resultado da ação,

quando existe análise do mérito, conforme nos mostra o Gráfico 13.

A presença de advogado também não interferiu na possibilidade de interposição de

recurso. Analisando o cruzamento das variáveis "presença de advogado" e "existência de recurso"

(Gráfico 14), é possível verificar que do total de recursos interpostos, 41,7% corresponde a casos

que contaram com a presença de advogado desde a entrada no "juizado", enquanto que em 58,3%

dos casos, houve a necessidade de constituir advogado a fim de que fosse interposto recurso.

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Presença de advogado

Postulação direta

Gráfico 13 - Presença de Advogado x Tipo de Sentença

Sentença fav. ao autor Sentença fav. ao réu

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33

Esta tendência permanece quanto à solução do recurso. O cruzamento das variáveis

"presença de advogado" e "solução do recurso" mostrou que o fato de o processo ser conduzido

por um advogado desde a sua entrada no sistema do "juizado" não interfere na possibilidade de

modificar a decisão determinada pelo juiz: como nos mostra o Gráfico 15 do total de processos

que tiveram suas sentenças alteradas, 46,2% contavam com advogado desde o início enquanto

que 53,8% somente contaram com a presença de advogado na interposição do recurso; da mesma

forma, do total de processos que tiveram suas sentenças confirmadas, 42,9% contavam com

advogado desde o início, enquanto que 57,1% contaram com advogado somente no momento da

interposição do recurso.

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Não houve recurso

Existência de recurso

Gráfico 14 - Existência de recurso por presença de Advogado

Presença de Advogado Postulação direta

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A presença de advogado é, porém, um fator que retarda a solução do conflito. Como

demonstrado no Gráfico 16 os casos encaminhados por meio de advogado levam em média, 95

dias para serem solucionados, enquanto que os casos encaminhados diretamente pela parte o

tempo médio de duração é de 80 dias. Nestes últimos, 50% dos casos foram resolvidos em até 64

dias. Por outro lado, 50% dos casos que contaram com advogado levaram até 84 dias para serem

resolvidos (mediana).

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Recurso Provido

Recurso Improvido

Gráfico 15 - Resultado do Recurso por Presença de Advogado

Presença de Advogado Postulação Direta

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35

O tempo de duração dos processos solucionados no Juizado Especial Cível Central entre

1992 e 2002 é em média 84 dias, sendo que 50% dos casos foram resolvidos em 71 dias

(mediana) e o tempo entre a entrada e a data de solução do conflito, seja por meio de acordo, seja

por meio de sentença com análise do mérito, que mais apareceu na coleta de dados (moda

estatística) é de 50 dias.

O estudo dos casos no "juizado" mostrou que a chance de ter uma resposta rápida é muito

grande se a reclamação puder ser encaminhada para o sistema do Juizado Especial. A rapidez na

produção de respostas aos conflitos que chegam até o Juizado está, por um lado relacionada com

o grande número de casos que são resolvidos por meio de acordo: 43% do total de casos, Gráfico

8. Por outro lado, esta rapidez pode ser resultado da simplicidade na condução do processo, ou

seja, na adoção dos princípios da oralidade e informalidade dos procedimentos processuais.

Desde a instalação do Juizado Especial Cível Central em 1992, ainda como Juizado de

Pequenas Causas, o ano que apresentou maior eficiência na solução dos conflitos em termos de

duração dos processos foi 1992, quando os casos foram resolvidos em média em 54 dias. Com a

Lei 9099/95 e o funcionamento do sistema como Juizado Especial Cível, o ano de 2000 foi

aquele que apresentou melhor índice na solução dos casos: em média, em 2000, os processos

levaram 65 dias para serem solucionados, sendo que até 50% dos casos foram resolvidos em 43

dias (Gráfico 17).

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100

Tempo, mediana

Tempo, média

Gráfico 16 - Tempo do processo (nºdia) por Presença de advogado

Presença de advogado Postulação direta

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Comparando estes dados com a distribuição dos processos entrados por ano, é possível

notar que a rapidez na solução dos casos que chegam no Juizado Especial Cível Central nem

sempre tem a ver com o número de processos entrados. Como mostra o Gráfico 18, entre os casos

analisados, não houve grande variação entre o número de processos iniciados em 1998 e aqueles

iniciados em 2000, porém em 1998 os casos levaram em média 159 dias para serem resolvidos,

enquanto que em 2000, como foi dito acima, os casos foram resolvidos em média em 65 dias.

0

100

200

300

400

500

600

700

800

900

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 2000 2001 2002

Gráfico 18 - Distribuição, processos iniciados / Ano

nº de processos iniciados

0 20 40 60 80 100 120 140 160 180

média em nº de dias

2002

2001

2000

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

Gráfico 17 - Distribuição, tempo do processo (nº dias) / Ano

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De acordo com a diretora do Juizado Central, Dra. Mônica Rodrigues de Carvalho, em

entrevista realizada no mês de maio de 2002, a rapidez na solução dos conflitos em 2000 foi

resultado dos diversos “mutirões” realizados com o objetivo de melhorar o atendimento da

população:

“Em 1996, quando eu vim para o Juizado Central, não haviam juízes fixos no Juizado. As

atividades eram feitas através de plantões e de rodízio. Então, a situação era a seguinte: a pessoa vinha até o juizado e aguardava nove meses para ser atendida, fazer o requerimento inicial, para dali a três meses, marcar a audiência de conciliação. Ou seja: se esperava quase um ano para a primeira audiência. Num primeiro momento, nós fizemos um esforço para cair a pauta, que passou em 1997 para três, quatro meses. No final de 1998, a audiência de conciliação demorava quatro meses. Aí, mais uma vez, convocamos todos os juízes que atuavam no Juizado, formamos uma equipe fixa, que é esta que trabalha com a gente até hoje - 12 juízes - e fizemos um mutirão para diminuir a pauta e melhorar o atendimento à população. Neste mutirão, conseguimos reduzir o tempo da primeira audiência para 15 dias, que é um tempo muito curto, pois não permite a citação. Agora, no começo de 2000, estendemos a pauta de novo e, hoje, ela está em 30 dias que, para mim, é o tempo ideal: 30 dias para a audiência de conciliação e, não havendo conciliação, 15 dias para a audiência de instrução e julgamento.” (Juíza de Direito, maio de 2000)

A partir de 2001, porém, os "mutirões" de juízes deixaram de ser utilizados como

estratégia para diminuir o tempo de solução dos conflitos no Juizado Especial Cível Central.

É certo que a eficiência do Juizado Especial não pode ser medida, levando-se em conta

somente o tempo de solução dos processos. O tempo para a solução dos casos nem sempre

depende da estrutura do "juizado", mas da colaboração das partes envolvidas e do grau de

complexidade dos casos que chegam até lá. Assim, por exemplo, o não comparecimento, desde

que justificado, de uma das partes na audiência pode provocar a designação desta audiência o que

retarda a solução do conflito. Porém, é preciso considerar que, de acordo com os dados

levantados, houve casos cuja solução demorou até dois anos e, no caso limite o "juizado" levou

quase três anos para ser resolvido. Por outro lado, este tempo, se comparado com a justiça

comum, onde a simples distribuição do processo pode levar até um ano, os dados do Juizado

Especial revelam a eficiência do sistema.

A utilização do recurso como forma de rever as decisões no Juizado Especial Cível

Central parece não ser uma estratégia muito utilizada nos Juizados Especiais. Eles correspondem

a 16,8% do total de casos com julgamento do mérito Gráfico 19.

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Este número, além de ser indicativo da satisfação das partes com o resultado obtido no

processo, pode ser explicado pelo fato de que, para encaminhar um recurso ao Colégio Recursal,

é necessário constituir advogado e pagar custas processuais que correspondem a 2% do valor da

ação, o que pode significar um obstáculo para a parte que, até aquele momento, vinha conduzindo

a sua reclamação pessoalmente e sem qualquer ônus financeiro. Levando-se em conta que o

número de processos que são encaminhados pessoalmente é bastante grande (70,7%), a

obrigatoriedade em constituir advogado representa um custo que deve ser considerado.

A análise do resultado dos recursos pode indicar que o sistema vem produzindo decisões

de qualidade: conforme nos mostra o Gráfico 20, somente 23% dos processos nos quais foi

interposto recurso, tiveram suas sentenças reformadas. É certo que precisa-se levar em conta que

esses recursos são julgados por Colégios Recursais formados por juízes que por sua vez atuam

nos próprios Juizados Especiais.

Gráfico 19 - Existência de Recurso

Interposição de Recurso17%

Não nouve recurso83%

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39

CONCLUSÃO

A partir dos resultados simples da pesquisa é possível fazer algumas especulações a cerca

da confirmação ou não das hipóteses que nortearam este estudo.

A análise da variável "qualificação das partes" constatou que 99,2% dos casos que

compunham a amostra, foram encaminhados por pessoas físicas e 0,8% por microempresas. Este

resultado parece indicar que o Juizado Especial Cível Central da cidade de São Paulo cumpre

com um dos objetivos pelo qual foi criado que é atender as demandas individuais do cidadão

comum.

Com relação à variável "tipo de conflito", foi possível verificar que: 49,2% dos casos

analisados correspondem a relação de consumo, 21,3% são de acidente de trânsito, 9,6% são

casos de locação, 7,7% se referem a conflitos envolvendo direito de vizinhança. Por fim, 12,2%

dos casos referem-se a questões que não foram previamente classificadas. Estes números indicam

que o sistema dos "juizados" atende preferencialmente um tipo de conflito – direito do

consumidor -, e pode suscitar algumas reflexões: a) os conflitos relativos ao consumo são aqueles

que mais afetam o cidadão; b) o cidadão está bem informado sobre os seus direitos como

consumidor e por isso recorre mais à justiça para resolver problemas relacionados a este tipo de

Gráfico 20 - Solução do Recurso

Recurso Provido23%

Recurso Improvido70%

Sem Preparo7%

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questão; c) o sistema do Juizado Especial é reconhecido primordialmente, pela população, como

um fórum que tem como objetivo solucionar conflitos na área do consumo; d) os demais conflitos

que afetam o cidadão no seu dia-a-dia não são reconhecidos como conflitos que podem ser

resolvidos pelo sistema de justiça estatal; e) outros canais, externos ao sistema de justiça estatal,

são utilizados para resolver conflitos que não aqueles relativos ao direito do consumidor. Porém,

a partir do resultado aqui apresentado não é possível afirmar que o Juizado Especial falha quanto

à tarefa de atender os conflitos do dia-a-dia que envolvem o cidadão.

O sistema do "juizado" se mostrou, a partir dos casos analisados, que é um canal de

acesso direito do cidadão à justiça estatal e que garante a solução dos casos por meio da

simplicidade e economia. Isto porque, 71% dos casos foram encaminhados diretamente pela parte

e os casos que foram apresentados por meio de advogado corresponderam a 29% do total de

processos analisados.

Na análise dos processos selecionados, constatou-se que o valor médio das causas que

entram no Juizado Especial Cível Central é de 11,7 salários mínimos, sendo que até 50% dos

casos apresentam valor de 8,3 salários mínimos (mediana) e o valor que mais apareceu na coleta

dos dados é de 20 salários mínimos. Estes números confirmam a institucionalização dos Juizados

Especiais como um órgão do sistema de justiça estatal capaz de atender os conflitos do dia-a-dia

que afetam o cidadão comum.

A conciliação é a forma mais utilizada como solução das demandas que chegam até o

"juizado", o que mostra a eficiência do sistema na solução dos conflitos de forma simples: a

maior parte dos casos foi resolvida por meio de acordo, representando 43% dos processos

analisados. Em segundo lugar aparecem os casos solucionados por meio de sentença com análise

do mérito – 24,3%. Os casos em que houve extinção do processo sem julgamento do mérito

correspondem a 1,7% do total analisados.

O tipo de acordo mais comum no Juizado Especial Cível Central corresponde aos acordos

que ocorrem na audiência de conciliação, representando 81,6% dos casos que se encerraram por

meio de acordo. Em segundo lugar aparecem os acordos celebrados durante a audiência de

julgamento – 11,2%. Por fim temos os casos resolvidos por meio de acordo extrajudicial – 7,2%.

Este dados indicam que o "juizado" atinge um dos objetivos do sistema, qual seja, solucionar os

conflitos de forma simples e rápida.

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Esta informação pode ser confirmada pelo número de recursos encaminhados ao sistema:

16,8% do total de casos que terminaram por meio de sentença com análise do mérito foi

interposto recurso e em 83,2% dos casos não houve recurso.

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