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Universidade de Aveiro 2021 Departamento de Línguas e Culturas JINGWEN ZHANG TRADUÇÃO DE PORTUGUÊS PARA CHINÊS DOS LIVROS INFANTIS ILUSTRADOS

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Universidade de Aveiro

2021

Departamento de Línguas e Culturas

JINGWEN ZHANG

TRADUÇÃO DE PORTUGUÊS PARA CHINÊS DOS LIVROS INFANTIS ILUSTRADOS

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Universidade de Aveiro

2021

Departamento de Línguas e Culturas

JINGWEN ZHANG

TRADUÇÃO DE PORTUGUÊS PARA CHINÊS DOS LIVROS INFANTIS ILUSTRADOS

Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Português Língua Estrangeira, Língua Segunda, realizada sob a orientação científica da Doutora Wang Suoying, Professora Auxiliar do Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro

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Dedico este trabalho aos meus pais pelo incansável apoio.

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o júri

Presidente Prof. Doutor Carlos Manuel Ferreira Morais Professor Auxiliar da Universidade de Aveiro (Presidente)

Prof.ª Doutora Maria Teresa Costa Gomes Roberto Cruz Professora Auxiliar da Universidade de Aveiro (Arguente)

Prof.ª Doutora Wang Suoying Professora Auxiliar da Universidade de Aveiro (Orientadora)

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Agradecimentos

Gostaria de agradecer a todos que me apoiaram na realização deste trabalho, especialmente À Professora Doutora Wang Suoying, a minha orientadora, pela sua orientação cuidadosa, disponibilidade e conselhos valiosos. A todos os meus professores no Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro, que me ofereceram conhecimentos e auxílios. Aos meus pais, pelo amor incondicional. Obrigada por tudo.

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palavras-chave

tradução literária, livros infantis ilustrados, procedimentos da tradução, português-chinês.

Resumo

Na segunda década deste século, os livros infantis ilustrados começaram a ser populares na China e as obras portuguesas entraram em força no mercado chinês, tornando a sua tradução indispensável e procurada. O presente trabalho, com base na versão chinesa dos livros infantis ilustrados portugueses publicados na China, destinados ao público infantil chinês, estuda, analisa e comenta os procedimentos de tradução utilizados, visando dar uma pequena contribuição para a prosperidade da tradução da literatura infantil portuguesa para chinês, ao serviço da comunicação intercultural entre o mundo chinês e o mundo português.

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Keywords

literary translation, illustrated children’s books, translation procedures, Portuguese-Chinese.

Abstract

In the second decade of this century, illustrated children's books became popular in China and Portuguese works entered the Chinese market in force, making the translation indispensable and sought after. The present work, based on the Chinese version of Portuguese illustrated children's books published in China, aimed at the Chinese young audience, studies, analyzes and comments on the translation procedures used, aiming to make a small contribution to the prosperity of the translation of Portuguese children's literature to Chinese, in the service of intercultural communication between the Chinese world and the Portuguese world.

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Índice

Introdução .............................................................................................................................. 1

0.1 Justificação da escolha do tema do trabalho ................................................................ 1

0.1.1 Continuação dos estudos e aperfeiçoamento de conhecimentos ........................... 1

0.1.2 Contexto de tradução literária com álbuns infantis na China ................................ 1

0.1.3 Importância do estudo sobre a versão chinesa de álbuns infantis portugueses ..... 2

0.2 Objetivo do trabalho .................................................................................................... 3

0.3 Estrutura da dissertação ............................................................................................... 3

Capítulo I Enquadramento Teórico ....................................................................................... 5

1.1 Definição da tradução .................................................................................................. 5

1.2 Teorias da tradução ...................................................................................................... 6

1.2.1 Teorias ocidentais .................................................................................................. 7

1.2.1.1 Três escolas principais ........................................................................... 7

1.2.1.2 Teorias da escola linguística de Eugene A. Nida ................................ 15

1.2.1.3 Teorias de Michael Alexander Kirkwood Halliday ............................. 16

1.2.2 Teorias chinesas .................................................................................................. 17

1.3 Critérios e processo da tradução ................................................................................ 20

1.4 Metodologia da tradução ........................................................................................... 21

1.4.1 Tradução literal e paráfrase ................................................................................. 21

1.4.2 Estrangeirização e domesticação ......................................................................... 22

Capítulo II Tradução dos Álbuns Infantis Portugueses para Chinês ................................... 24

2.1 Contexto e status-quo na China ................................................................................. 24

2.1.1 Livrinhos ilustrados tradicionais da China .......................................................... 24

2.1.2 Entrada dos álbuns ilustrados infantis portugueses na China ............................. 28

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2.2 Análise dos procedimentos principais na tradução de português para chinês ........... 34

2.2.1 Conceitos de recontextualização ......................................................................... 34

2.2.2 Tradução de títulos no âmbito de recontextualização ......................................... 35

2.2.3 Recontextualização no âmbito de culturas diferentes ......................................... 39

2.2.4 Recontextualização para respeito de hábitos linguísticos ................................... 42

2.2.5 Recontextualização através da adição e omissão ................................................ 48

2.2.6 Recontextualização através da repetição ............................................................. 58

2.2.7 Recontextualização através da transposição e/ou modulação ............................. 60

2.2.8 Recontextualização através de combinação de textos e ilustrações .................... 64

2.2.9 Recontextualização através da simplificação ...................................................... 69

2.2.10 Recontextualização através de musicalização ................................................... 74

2.2.11 Propostas de tradução ........................................................................................ 76

Conclusão ............................................................................................................................ 81

Bibliografia .......................................................................................................................... 83

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Índice de Figuras

Figura 1- Crianças de Xangai a ler lianhuanhua numa livraria em 1951............................ 25

Figura 2- Cidadãos de Xangai a escolher lianhuanhua em 1951 ........................................ 25

Figura 3- Capa de Peregrinação ao Oeste .......................................................................... 26

Figura 4- Uma página de Peregrinação ao Oeste com desenho e legenda ......................... 26

Figura 5- Uma página de História na Sala Oeste com legenda vertical ............................. 27

Figura 6- Uma página de Vida errante de Sanmao ............................................................. 27

Figura 7- Quatro páginas de A Guerra das Estrelas ........................................................... 28

Figura 8- Os livros traduzidos para chinês (pela Zhang Xiaofei) ....................................... 30

Figura 9- Outros livros traduzidos para chinês 1 ................................................................. 32

Figura 10- Outros livros traduzidos para chinês 2 ............................................................... 32

Figura 11- Outros livros traduzidos para chinês 3 ............................................................... 33

Figura 12- Ilustração de Quando eu for…grande na edição chinesa .................................. 63

Figura 13- Ilustração de Barriga de baleia na edição chinesa 1 ......................................... 65

Figura 14- Ilustração de Barriga de baleia na edição chinesa 2 ......................................... 66

Figura 15- Ilustração de Coração de mãe na edição chinesa .............................................. 67

Figura 16- Ilustração de A maior flor do mundo na edição chinesa .................................... 68

Figura 17- Ilustração de O pai mais horrível do mundo na edição chinesa 1 ..................... 69

Figura 18- Ilustração de O pai mais horrível do mundo na edição chinesa 2 ..................... 69

Figura 19- Ilustração de Hoje sinto-me… na edição chinesa 1............................................ 70

Figura 20- Ilustração de Hoje sinto-me… na edição chinesa 2............................................ 71

Figura 21- Ilustração de Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? na edição chinesa

1 ........................................................................................................................................... 71

Figura 22- Ilustração de Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? na edição chinesa

2 ........................................................................................................................................... 72

Figura 23- Ilustração de Quando eu for…grande na edição portuguesa ............................. 78

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Introdução

O presente trabalho é realizado no âmbito de estudos do Mestrado em Português Língua

Estrangeira, ministrado no Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro

e está relacionado com o estudo dos procedimentos de tradução de português para chinês, na

área dos livros infantis ilustrados.

0.1 Justificação da escolha do tema do trabalho

A nossa escolha do tema deste trabalho é fundamentada por vários aspetos, relacionados

com o nosso próprio percurso escolar, com o contexto atual e com o nosso objetivo.

0.1.1 Continuação dos estudos e aperfeiçoamento de conhecimentos

Após termos concluído com sucesso a Licenciatura de Estudos Portugueses na China,

com parte de aprendizagem realizada em Portugal como aluna de mobilidade, continuamos

hoje os nossos estudos no Mestrado em Português como Língua Estrangeira/Língua Segunda.

Sendo nativa de língua chinesa e aprendente de língua portuguesa, surge-nos,

naturalmente, um grande interesse pela tradução entre essas duas línguas.

Por isso, esta dissertação é desenvolvida no âmbito dos nossos estudos, com o intuito

de aperfeiçoar e aprofundar os nossos conhecimentos na área tradução entre português e

chinês.

0.1.2 Contexto de tradução literária com álbuns infantis na China

A tradução envolve muitos temas e o nosso tema de tradução na área dos livros infantis

ilustrados resultou do contexto atual.

Nesta última década, a China e Portugal têm intensificado a cooperação em todos os

domínios, sendo um trabalho importante, no âmbito de intercâmbio cultural, a tradução da

literatura portuguesa para chinês e vice-versa. Tanto o 1º Fórum Literário Portugal-China

(de 2017, em Lisboa) como o 2º Fórum Literário China-Portugal (de 2019, em Pequim)

puseram em destaque a tradução mútua de obras literárias. Talvez por ser mais fácil traduzir

de português para chinês do que de chinês para português, deparamo-nos, hoje em dia, com

mais versões chinesas de obras portuguesas, em especial de livros infantis ilustrados.

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Os livros infantis ilustrados, ou mais simplesmente álbuns infantis, 儿童绘本/ertong

huiben em chinês, tal como o nome indica, representam uma forma da literatura infantil, na

qual se contam histórias acompanhadas de lindas ilustrações, com o intuito de cultivar nas

crianças as capacidades relativas à língua, observação, imaginação, criatividade, entre outras,

desempenhando um papel importante na educação infantil nos países desenvolvidos

europeus e americanos. A China também tem livrinhos ilustrados tradicionais, destinados ao

público infantil, os quais, porém, são muito diferentes dos álbuns infantis modernos, seja ao

nível do formato, da apresentação de histórias ou até da sua designação, 连环画/lianhuanhua

em chinês.

Na segunda década deste século, os álbuns infantis modernos começaram a ser

populares na China, tendo sido introduzido na China um grande número de obras ilustradas

estrangeiras. Aproveitando a maré, os trabalhos portugueses entraram em força no mercado

chinês, tornando a sua tradução indispensável e procurada.

Nesse sentido, esta dissertação tem enquadramento justificado no âmbito desse

intercâmbio cultural com tradução literária de álbuns infantis portugueses para chinês.

0.1.3 Importância do estudo sobre a versão chinesa de álbuns infantis portugueses

No entanto, devido às inúmeras diferenças entre as duas línguas e as duas culturas, para

além das dificuldades em encontrar uma maneira adequada de narrar histórias às crianças, a

tradução dos álbuns ilustrados portugueses para a língua chinesa revela dificuldades, sem

terem sido devidamente valorizadas e analisadas até agora.

Pois, apesar de nos depararmos com dezenas de álbuns infantis portugueses traduzidos

para chinês, não encontramos quase nada sobre o estudo e análise dessas traduções e

respetivas dificuldades. O mercado procura com ansiedade a tradução de português para

chinês visando promover os álbuns portugueses junto do público chinês, mas, na nossa

modesta opinião, para melhor levar para a frente essa promoção, a tradução assim como os

respetivos procedimentos de tradução, nessa área específica da versão chinesa de álbuns

infantis portugueses, devem ser analisados e abordados.

Essa análise e abordagem precisa de ser valorizada e concretizada, a fim de melhorar a

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qualidade da tradução e promover o desenvolvimento na área em questão.

0.2 Objetivo do trabalho

O presente trabalho visa abordar os procedimentos de tradução da língua portuguesa

para a língua chinesa utilizados em alguns álbuns infantis portugueses lançados no mercado

chinês, com a finalidade de fazer uma tentativa no sentido de originar outros trabalhos do

mesmo género, tal como um provérbio chinês diz, 抛砖引玉/paozhuan-yinyu, isto é, lançar

o tijolo para atrair o jade – dar uma modesta opinião para estimular outras mais valiosas.

Mais concretamente, vai apresentar o enquadramento teórico da tradução abordando

várias escolas e suas teorias, ocidentais e chinesas, ao serviço de tradução de álbuns infantis

portugueses para a língua chinesa; vai expor a história e o status-quo dos livrinhos ilustrados

tradicionais da China, em contraste com os álbuns infantis, ao serviço da nossa abordagem;

vai apresentar sobretudo os trabalhos portugueses lançados no mercado chinês,

exemplificando a análise dos procedimentos de tradução utilizados na versão chinesa com

propostas concretas conforme diferentes casos relacionados com as diferenças entre as duas

línguas e as duas culturas.

Espero poder dar uma pequena contribuição para melhorar a qualidade da tradução

nesta área, ajudando, ao mesmo tempo, os jovens interessados na tradução para chinês dos

álbuns infantis portugueses, de modo a promover a compreensão cultural mútua entre os dois

países, China e Portugal.

0.3 Estrutura da dissertação

Em termos estruturais, o presente trabalho divide-se em quatro partes, a saber:

Introdução, Capítulo I, Capítulo II e Conclusão.

A Introdução apresenta a nossa justificação da escolha do tema, o objetivo que tentamos

alcançar com o nosso trabalho, assim como a estrutura do trabalho.

O Capítulo I aborda o enquadramento teórico da tradução, apresentando definições,

teorias e critérios, para além da metodologia principal do processo de tradução.

O Capítulo II concentra-se em alguns livros infantis ilustrados lançados no mercado

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chinês, estudando e analisando os procedimentos de tradução utilizados, com exemplos

concretos.

Por último, em Conclusão, reiteramos e resumimos os procedimentos relativos à

tradução de português para chinês na área em questão.

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Capítulo I Enquadramento Teórico

1.1 Definição da tradução

Ao longo da sua história, desde o seu aparecimento no mundo até aos dias de hoje, os

seres humanos nunca pararam de comunicar entre si, mesmo pertencendo a grupos

linguísticos e culturais diferentes, pelo que a tradução surgiu tornando-se cada vez mais

importante.

Assim, a tradução serve de ponte para a comunicação entre seres humanos de diferentes

línguas através de uma nova versão do texto original, para que os recetores compreendam o

texto tal como os leitores da língua de partida.

Muitos académicos abordaram a definição da tradução, devendo ser mais citada a

definição formulada por Eugene A. Nida. Conforme Nida e Taber (1969, p.12), “translating

consists in reproducing in the receptor language the closest natural equivalent of the source-

language message, first in terms of meaning and secondly in terms of style.”

Ao falar sobre a importância da tradução para a cultura chinesa, o tradutor chinês Ji

Xianlin defendeu que o desenvolvimento de uma cultura passava por cinco fases, a saber, o

nascimento, o crescimento, a prosperidade, a decadência e o desaparecimento, o que é uma

lei universal e partindo da noção de que nenhuma cultura pode ser eterna; no entanto, a

cultura chinesa é uma exceção, pois durante cerca de cinco mil anos, a cultura chinesa nunca

foi interrompida ou extinta, apesar de ter passado períodos com dificuldades, como se fosse

um rio caudaloso, que podia enfrentar épocas com um nível baixo de água, mas nunca se

deparou com uma situação de seca, sem nenhuma água, porque a tradução de obras

estrangeiras trouxe águas novas ao rio chinês, sem o deixar ficar seco, e dessas novas águas

encontravam-se as procedentes da Índia (com a tradução de sutras budistas) e do Ocidente

(com a tradução de obras ocidentais).1 Conforme o que Ji disse, podemos ver a importância

da tradução para o desenvolvimento da civilização de uma nação.

A tradução é encarada em várias perspetivas. Em termos da língua, podemos ter uma

1 https://m.shexun.net/book/chapter/89427/2.html, consultado em 25/05/2021. A tradução é nossa.

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tradução intralinguística e uma tradução interlinguística; em termos de forma, podemos ter

uma tradução oral (interpretação) e uma tradução escrita (tradução); em termos do estilo,

pode ser aplicado, científico, argumentativo, artístico e jornalístico; em termos do tratamento,

pode ser uma tradução completa, tradução de secção, tradução do extrato, tradução da edição,

etc.

1.2 Teorias da tradução

Após a 2ª Guerra Mundial, a tecnologia, a linguística e a tradução têm conhecido

grandes e vigorosos desenvolvimentos, especialmente a tradução. As perspetivas sobre a

tradução vêm também sofrendo alterações acompanhando o desenvolvimento da teoria da

tradução.

Hoje em dia, a tradução não é considerada apenas como uma arte ou técnica, mas sim

um ramo de ciência, relacionado com outros ramos, tais como a literatura, a arte, a sociologia,

a psicologia, a informática, etc., o que já é de senso comum.

Portanto, o estudo sobre a teoria de tradução não se limita a filósofos, escritores ou

tradutores, constituindo também um tópico de grande significado para os trabalhadores de

línguas e traduções, pelo que as teorias de tradução continuam a desenvolver-se.

Sendo igualmente do conhecimento geral que o desenvolvimento das teorias

contemporâneas de tradução possui duas características principais.

Em relação à primeira característica, entende-se que o estudo das teorias de tradução

está incluído no âmbito da linguística, influenciado pelo estudo da linguística e da teoria de

informação, revelando-se muito diferente em comparação com as teorias tradicionais de

tradução literária.

No que diz respeito à segunda característica, os académicos exprimem o seu parecer

livremente através dos artigos, revistas e outros meios, em vez de elaborarem uma parte ou

a totalidade da sua investigação isolados dos outros e afastados da realidade. Para além disso,

com os progressos dos meios de transporte e publicação e com o aparecimento das

organizações académicas internacionais, os investigadores de países diferentes conseguem

contactar uns com os outros com maior frequência, intensificando os intercâmbios

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académicos entre si, nesta era de globalização.

1.2.1 Teorias ocidentais

Existem várias maneiras de dividir as escolas de tradução, sendo a história de tradução

geralmente elaborada conforme a época e o país. No entanto, desde meados do século XX,

acompanhando o desenvolvimento económico, moderno e integrado da sociedade ocidental,

as teorias da tradução entraram numa fase completamente nova, ultrapassando o limite da

nacionalidade e tendendo progressivamente a um desenvolvimento comum, pelo que será

difícil classificar no sentido restrito algumas teorias ou alguns académicos oriundos de certos

países ou regiões, sobretudo nesta “aldeia global”. Portanto, quanto à divisão das teorias

contemporâneas da tradução, o método mais popular da atualidade é classificá-las de acordo

com os seus meios básicos do estudo ou com as suas características essenciais.

A fim de sustentar melhor a nossa análise a ser desenvolvida no capítulo seguinte,

cumpre-nos fazer primeiro uma apresentação resumida acerca das principais escolas de

tradução. Estamos cientes de que todas essas teorias contribuem para a nossa análise, apesar

de recorrermos principalmente à teoria apresentada por Eugene A. Nida, da escola linguística,

além da teoria não propriamente de tradução de Michael Halliday, fundador da Linguística

Sistêmico-Funcional.

A divisão das escolas ou teorias de tradução varia conforme os diferentes autores e,

neste trabalho, baseamo-nos sobretudo em Hu, Wu & Shu (2011). De acordo com eles, na

perspetiva macroscópica do estudo de tradução, as teorias ocidentais da tradução dividem-

se em três escolas, a saber: a escola literária, a escola linguística e a escola cultural. A escola

literária inclui a escola tradicional filológica e a escola hermenêutica; a escola linguística

abrange a escola de equivalência, a escola funcional e a escola cognitiva; a escola cultural é

constituída pela escola de estudo da tradução, escola desconstrutivista, escola feminista,

escola pós-colonialista e escola integrada.

1.2.1.1 Três escolas principais

Escola literária

O período entre a época do Cicero da Roma antiga até ao ano 1959, quando o linguista

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Roman Jakobson publicou o seu primeiro livro On Linguistic Aspects of Translation, é

designado de fase do estudo tradicional da tradução, ou seja, período anterior à escola

linguística, de Peter Newmark.

Ao longo da história, independentemente da “tradução flexível” de Cicero e Horace,

deparamo-nos com a “tradução livre para literatura” e a “tradução literal para Bíblia” de

Quintilianus, “conteúdo e estilo” e “tradução palavra por palavra” de Manlius Boethius, “a

poesia é intraduzível” de Dante, os sete princípios na tradução de Martin Luther, os cinco

princípios de Etienne Dolet, os três métodos da tradução (metáfrase, paráfrase, imitação) de

John Dryden, as três espécies da tradução de Goethe (“informative translation”, “adaption”

e “interlinear translation”); “pure language” de Friedrich Holderlin, dois métodos da

tradução de Schleiermacher e o pensamento metalinguístico da traduzibilidade e

intraduzibilidade de Humboldt (Xie, T. Z., 2007, pp. 17-32); ou no século XX, com “a

tradução é a recriação da arte” de Croce, “a tradução é uma arte” de Aavory, “a tradução é

um processo de escolha” de Levy e a “interpretação criativa” de Pound.

Exceto algumas pessoas como Friedrich Holderlin e Schleiermacher, a maioria dos

académicos focava-se apenas na tradução dos documentos clássicos e obras literárias,

desenvolvendo a sua abordagem com base na experiência da tradução prática e com

discussões sobre algumas questões concretas, tais como “tradução literal” e “tradução livre”,

“traduzível” e “intraduzível”, “conteúdo” e “forma”, entre outras. Uma vez que eles

prestavam atenção à estrutura semântica, à escolha de conteúdo e modo de organização e à

análise comparada de valores, revelando características correspondentes às da escola literária

tradicional, receberam a designação de escola literária.2 (Hu, Wu & Shu, 2011, p.144)

Ao mesmo tempo, alguns estudiosos achavam que à “escola literária” faltava a

criatividade defendendo o estudo da tradução na perspetiva hermenêutica. Em 1813, ao

abordar a relação estreita entre a tradução e a compreensão, Schleiermacher propôs os

princípios e os meios de tradução pelo ponto de vista hermenêutico, apresentando dois

métodos, “o tradutor leva o autor a aproximar-se do leitor”, ou “leva o leitor a aproximar-se

2 A tradução das citações neste parágrafo é nossa.

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do autor”; Martin Heidegger dissertou sobre os problemas da tradução na perspetiva

filosófica e hermenêutica, achando que “a tradução é a interpretação e a interpretação é a

tradução”, pois a tradução não representa apenas uma reescrita literal das palavras, mas sim

uma transmissão do pensamento, pelo que o tradutor deve investigar a origem das palavras

e mostrar o pensamento escondido nelas; Hans-Georg Gadamer salientou a importância de

universalidade, história e criatividade da compreensão para a compreensão da tradução. A

abordagem destes académicos na perspetiva hermenêutica é inspirada no âmbito da tradução,

essencialmente relacionada com a língua, em particular com a compreensão e interpretação

da língua literária, pelo que é justificada a designação de escola literária.3 (Hu, Wu & Shu,

2011)

Resumindo o acima mencionado, seja “a escola tradicional filosófica”, seja “a escola

hermenêutica”, focavam-se na discussão da tradução na área literária, defendendo que a

tradução é um tipo de arte e os tradutores talentosos devem estudar o estilo e a literalidade

das obras, a fim de fazer uma recriação artística.

Escola linguística

No Ocidente, existem duas escolas tradicionais de tradução, a escola literária, acima

apresentada e a escola linguística, que vamos expor de seguida.

O tempo decorrido entre Santo Agostinho e a linguística estruturalista do século XX é

considerado o período que Newmark designou por “período da linguística”.4 (Li, 2004, pp.

5-6)

Em 1959, Jakobson analisou e abordou, pormenorizadamente, no seu livro On

Linguistic Aspects of Translation (1959) a relação entre a língua e a tradução, a importância

da tradução e alguns problemas na tradução, dando uma contribuição inicial para os métodos

teóricos da escola linguística. Ele dividiu a tradução em três categorias, “intralingual

translation”, “interlingual translation” e “intersemiotic translation”, resumindo nessa

classificação os âmbitos da tradução, o que vem influenciando profundamente a teoria e a

prática de tradução.

3 A tradução das teorias mencionadas neste parágrafo é nossa. 4 A tradução é nossa.

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Eugene A. Nida é um dos representantes mais importantes da escola linguística. Nida e

Taber (1969) apresentaram conceitos de correspondência formal e equivalência dinâmica,5

sendo esta última expressão alterada mais tarde para equivalência funcional. Os seus

conceitos contribuíram muito para o estudo contemporâneo de tradução.

O académico britânico Newmark (Li, W. G., 2004, pp. 5-6) formulou os seus conceitos

“Communicative Translation” e “Semantic Translation” para complementar a teoria de Nida.

O primeiro refere-se a uma nova organização da estrutura do texto traduzido a fim de torná-

lo fluido ao serviço do público e o segundo enfatiza a forma do texto traduzido aproximar-

se da do texto original.

Podemos constatar que Nida e Newmak apresentaram conceitos em termos diferentes,

mas a equivalência na tradução constitui a sua semelhança principal.

Em 1971, a investigadora alemã Katharina Reiss abordou o conceito da escola funcional

no seu livro Possibilities and Limitation of Translation Criticism. De acordo com ela, a

tradução ideal deve ser equivalente ao nível de conteúdo, forma e comunicação em relação

ao texto original, ou seja, “integral communicative performance”. No entanto ela lembra que

a equivalência não é o que as pessoas esperam na prática de tradução, devendo a relação

entre o texto original e o texto traduzido ser considerada com prioridade. Além disso, a

tradução também deve seguir “intratextual coherence rule” e “intertextual coherence rule”,

referindo o primeiro a coerência intratextual e o último, a coerência entre texto original e

texto traduzido, designado também de “fidelity rule”.

“Assim, a posição central do texto original na tradução é destruída, livrando os estudos

tradutórios das suas peias, de modo que a equivalência deixa de ser um critério de avaliação de

tradução, sendo substituída pela concretização plena dos objetivos que se esperam com a

tradução.” 6 (Hu, Wu & Shu, 2011, p. 146)

A académica Justa Holz-Manttari (Schaffner, C., 2011, pp. 157-162) usou como

referência a teoria comunicativa e apresentou a “theory of translation action”. Conforme essa

5 A tradução é nossa. 6 A tradução é nossa.

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11

teoria, a tradução é considerada como “translatorial action” entre as pessoas, incluindo texto,

imagem, som, língua, que são “message-tranmitter compounds”, além dos procedimentos de

adaptação, edição e pesquisa da informação, o que ampliou e aprofundou largamente a

compreensão das pessoas em relação à tradução.

Christiane Nord (Xie, 2008, pp. 135-138) apresentou pela primeira vez, de modo geral

e sistemático, os conceitos da teoria funcional em inglês, defendendo o princípio de

“Functionality plus Loyalty”. A palavra “functionality” explica que a tradução deve

desempenhar a sua devida função perante os seus leitores da língua de chegada, destacando

especificamente o recetor e a comunicação; a palavra “loyalty” pertence ao âmbito da

moralidade e chama atenção à relação dos intervenientes nas atividades de tradução,

enfatizando que os tradutores devem levar em consideração todos os objetivos e o desejo dos

participantes nas ações comunicativas de tradução.7 A escola funcional é considerada como

uma teoria independente por muitos estudiosos, mas esta tem raízes na teoria linguística,

recorrendo aos métodos do estudo linguístico, motivo pelo qual, na nossa modesta opinião,

ela representa uma manifestação da escola linguística, numa perspetiva macroscópica.

Simultaneamente, alguns investigadores consideram que o processo tradutório é um

processo cognitivo da psicologia e, aproveitando os conhecimentos de ciência cognitiva

moderna e psicologia, estudam o que acontece no cérebro dos tradutores quando estão a fazer

a tradução. Ernst-August Gutt (Liu, 2005, p. 282) formulou “Relevance Theory”,

defendendo que todas as línguas têm “psychological context”, ou seja, “cognitive

environment” para depositar conhecimentos, valores, crença, etc. A escola cognitiva

emprega algumas noções e métodos de psicologia, mas o estudo fundamental é linguístico

cognitivo, pelo que a teoria cognitiva também é considerada como parte da teoria linguística.

Em suma, todas as teorias apresentadas nesta secção, de equivalência, funcional, ou

cognitiva, revestem-se de um valor significativo para o melhor conhecimento da escola

linguística e servem para ajudar a aprofundar o estudo da tradução ao nível das palavras,

7 Os participantes incluem as editoras ou organizações lançadoras de livros ou coleções, assim como os

respetivos responsáveis pelo marketing destas entidades, que podem tomar decisões sobre a tradução dum título

ou mesmo sobre mais aspetos da tradução e da ilustração do livro.

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frases, e até textos.

Como a escola linguística serve de base teórica para o estudo tradutório ocorrido nesse

período, ela recebeu a designação de “escola linguística de tradução”, representando um

grande avanço na história do desenvolvimento das teorias ocidentais da tradução.

Escola cultural

Desde o ano de 1972, altura em que James Holmes publicou o seu livro The Name and

Nature of Translation Studies até agora, um número crescente de investigadores passou a

estudar a tradução a nível cultural tendo surgido várias escolas, por exemplo, a escola de

estudos da tradução, escola desconstrutivista, escola feminista, escola pós-colonialista, entre

outras, todas integradas na escola cultural. Essas escolas tentavam quebrar as limitações que

o estudo da tradução literária revelava, visando estabelecer um novo modelo na área, no

âmbito de “comprehensive theory” e estudo da prática.

O académico James Holmes (1972, pp. 66-80) deu uma grande contribuição para a

escola de estudos de tradução. Dividiu, no seu livro intitulado The Name and Nature of

Translation Studies, os estudos da tradução em “Pure Translation Studies” e “Applied

Translation Studies”, sendo os primeiros subdivididos em “Descriptive Translation Studies”

e “Theoretical Translation Studies” e os segundos, em “Translator Training”, “Translation

Aids” e “Translation Criticism”. Com a sua proposta e teoria, James Holmes construiu os

alicerces para a escola de estudos da tradução.

Mais tarde, Andre Lefevere (Xie, 2008, pp. 2-5) apresentou o conceito de rewriting,

defendendo que a tradução é uma forma de reescrever o texto original. No seu livro

Translation, Rewriting and the Manipulation of Literary Fame, sublinhou a importância dos

três elementos, “ideology”, “patronage”, “poetics”, para a manipulação da tradução. A sua

teoria serve como principal base teórica dos estudos de tradução.

Nos anos noventa do século XX, Andre Lefevere e Susan Bassnett apresentaram, no

seu livro Translation, History and Culture, o conceito de “cultural turn” nos estudos de

tradução, o que abriu um novo campo aos estudos da tradução. 8

8 https://iucat.iu.edu/iuk/8633679, consultado em 08/05/2021.

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No fim dos anos oitenta e no início dos anos noventa, os estudos da tradução registaram

a sua mudança cultural, usando amplamente várias teorias culturais modernas para dar nova

explicação à tradução, sendo os seus representantes mais importantes escolas

desconstrutivista, escola feminista e escola pós-colonialista.

A escola desconstrutivista enfatiza a posição central dos tradutores, defendendo que a

tradução não pode copiar o significado do texto original, sendo cada tradução uma

reconstrução do texto original e a relação entre o tradutor e o autor é contínua e criativa,

através de “dissemination”, “trace”, “dislocating” e “decentring”, pelo que a linguagem da

obra original fica constantemente avigorada e regenerada; alguns estudiosos recorreram à

estrangeirização, fazendo com que mais cultura estrangeira entre na cultura da língua de

chegada.9

Alguns estudiosos também aproveitaram a teoria desconstrutivista para abordar os

problemas dos géneros e poderes políticos, desenvolvendo teorias de tradução feminista e

de tradução pós-colonial.

A tradução feminista aborda a relação entre o texto original e o texto traduzido e censura

a comparação de tradução à “bela infiel”, a qual implica o desprezo não só à mulher mas

também ao texto traduzido; opõe-se ao androcentrismo na tradução e valoriza a consciência

do feminismo. (Wang, 2010)10 Atribui ao tradutor, durante o processo de tradução, maior

liberdade e espaço para colocar “supplementing”, “prefacing and footnoting”, “highjacking”,

entre outros procedimentos de tradução. (Sui e Song, 2019)11

A tradução pós-colonial “trouxe à prática da tradução a discussão de temas como

desigualdades sociais, opressão colonial e autoritarismo, entre outros, proporcionando, desse

modo, a pluralidade de vozes, encaminhando traduções e retraduções (translation back) à

descolonização e a interculturalidade.” (Agra, 2013)12 Entendemos que esta teoria combina

9 A tradução é nossa. 10 https://wenku.baidu.com/view/ c2bbb93327d3240c8547ef20.html?from=search, consultado em 06/05/2021.

A tradução é nossa. 11 https://new.qq.com/omn/20200219/20200219A05U4100.html?pc, consultado em 06/05/2021. A tradução é

nossa. 12 http://www.bocc.ubi.pt/pag/agra-klondy-2013-teoria-pos-colonial-pos-traducao.pdf, consultado em

07/05/2021

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a tradução com a política, apresentando uma nova visão para a tradução.

Conforme Hu, Wu & Shu (2011), alguns académicos tentaram encontrar o terceiro

caminho entre a escola linguística e a escola cultural, cuja representante é Mary Snell-

Hornby. De acordo com ela, a análise do texto deve passar do contexto macroscópico para

as palavras microcósmicas, combinando as palavras com a sua função e a sua posição no

texto; remediar as lacunas entre a linguística e a tradução de literatura, considerando a cultura

como o contexto da tradução; a tradução não é estável mas é dinâmica, sendo um processo

em que o tradutor manifesta completamente a sua compreensão da obra original numa outra

cultura, pelo que uma obra literária precisa de ser constantemente retraduzida, não existindo

nunca uma tradução perfeita. Nesse sentido, a tradução deve ser considerada uma disciplina

intercultural e integrada, como uma disciplina independente, relacionada com psicologia e

filosofia, além da linguística e literatura. Na nossa modesta opinião, uma vez que a escola

sintética usa muitas teorias culturais e não revela grande diferença quando comparada com

a escola de estudos da tradução, consideramos que pertence à escola cultural.

Resumindo o acima mencionado, podemos concluir que as diferentes escolas da

tradução não são opostas entre si, mas sim mutuamente complementares; as diferenças

verificadas entre elas representam respostas distintas na tentativa de resolver problemas e

perspetivas diversas de olhar, pensar e lidar com questões de tradução. O estudo da escola

linguística não se limita ao estudo da linguística, mas também ao estudo da cultura, o que

pode ser exemplificado por Nida e a sua teoria de tradução. A equivalência dinâmica

proposta por Nida, conhecida também como equivalência funcional, envolve contextos

culturais que influenciam a tradução.

Cumpre-nos salientar que a divisão mais significativa, em matéria de tradução, é entre

o texto literário e o texto não literário, sendo que pode existir literariedade em textos

funcionais (considerados não literários). Citamos como exemplo o seguinte texto de

publicidade de uma loja de óculos: “Os olhos são as janelas da alma. Para proteger a tua

alma, faz o favor de colocar os vidros nas tuas janelas”13. Com uma metáfora e com humor,

13 Texto original em chinês: “眼睛是心灵的窗户,为了保护您的心灵,请为您的窗户按上玻璃。” A

tradução é nossa. https://www.diyifanwen.com/fanwen/guanggaoci/gaoxiaoguanggaoci/3851110.html,

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este texto de publicidade revela obviamente a literariedade.

A apresentação destas escolas neste trabalho não é desnecessária ou inútil, tal como foi

referido anteriormente, pois todas as teorias de tradução contribuem, em maior ou menor

grau, para a nossa análise.

1.2.1.2 Teorias da escola linguística de Eugene A. Nida

Eugene A. Nida, académico dos Estudos Unidos da América, é um dos representantes

mais importantes da escola linguística. Aluno dos dois famosos professores doutores,

Charles C.Fries e Leonard Bloomfield, concluiu o seu doutoramento em 1943. Depois de se

formar, começou a traduzir a Bíblia e estudar as teorias da tradução, tendo sido classificado

como fundador indiscutível das teorias contemporâneas da tradução, com uma longa lista de

obras publicadas, tais como Principles of Correspondence, Toward a Science of Translaton,

The Theory and Practice of Translation, Language Structure and translation, entre outras.

Os conceitos mais conhecidos, influentes e importantes apresentados por Nida são,

provavelmente, os de equivalência formal, equivalência dinâmica ou equivalência funcional.

Conforme Wang e Lu (2000, p.157):

Nida e Taber (1969) apresentaram os conceitos de “correspondência formal” e “equivalência

dinâmica”. De acordo com eles, a consistência contextual tem prioridade sobre a consistência

verbal (ou concordância palavra por palavra) e a equivalência dinâmica tem prioridade sobre a

correspondência formal. Uma tradução com correspondência formal, conhecida também por

“equivalência formal”, significa que as características da forma do texto-fonte são reproduzidas

mecanicamente na língua recetora, pelo que distorce os padrões gramaticais e estilísticos da

língua do recetor, distorcendo também a mensagem. É oposta à “equivalência dinâmica”, que se

refere a uma tradução em que a mensagem do texto de partida é de tal maneira transportada para

a língua recetora que a resposta do recetor é essencialmente igual à dos recetores originais;

frequentemente a forma do texto de partida é alterada, mas a mensagem é preservada e a tradução

consultado em 23/06/2021.

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16

é fiel. A expressão “equivalência dinâmica” é alterada mais tarde para “equivalência funcional”

(Waard e Nida, 1986), pois valoriza a função comunicativa da língua.

Para esclarecer a equivalência funcional, Nida (1986) dividiu a função em nove

classificações: “expressive”, “cognitive”, “interpersonal”, “informative”, “imperative”,

“performative”, “emotive”, “aesthetic” e “metalingual”. Tradicionalmente, o texto objeto

serve como base para julgar a tradução, mas Nida entregou às reflexões psicológicas dos

leitores o direito de julgar a tradução. A sua proposta abriu novos horizontes para os estudos

da tradução. Em vez de equivalência da língua, a tradução deve atingir a equivalência

funcional ou a reflexão psicológica dos leitores. Por outras palavras, a reflexão dos leitores

acerca do texto traduzido deve ser semelhante à reflexão dos leitores do texto original, o que

envolve o contexto da língua de chegada, além do texto.

A teoria da tradução defendida por Nida exerce uma grande influência quer no Ocidente

quer na China.

1.2.1.3 Teorias de Michael Alexander Kirkwood Halliday

Michael Halliday, famoso linguista britânico, fundador de Linguística Sistêmico-

Funcional, interessa-nos em particular para este trabalho pela sua abordagem de dois níveis

de contexto: contexto de cultura e contexto de situação.

Conforme a tradução de Wagner Rodrigues Silva (Silva, 2014):

Contexto é um sistema semiótica de mais alto nível no qual a linguagem está “encaixada”. Mais

especificamente, linguagem está encaixada em um contexto de cultura ou sistema social.

Qualquer instanciação de linguagem como texto é encaixada no seu próprio contexto de situação.

Contexto é uma matriz ecológica para ambos o sistema geral de língua e para textos particulares.

Ele é realizado por meio da linguagem; e sendo realizado pela linguagem por meio da linguagem

significa que ele cria e é criado pela linguagem. (Matthiessen e Halliday, 2009, p. 88)

Apesar de não ser especificamente uma teoria sobre a tradução, fundamenta a nossa

reflexão sobre a equivalência funcional em contextos diferentes na tradução entre línguas

diferentes, com o recorrer à recontextualização que vamos desenvolver na nossa análise no

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Capítulo II.

É curioso verificar que Halliday, licenciado em Língua e Cultura Chinesa pela

Universidade de Londres, foi estudar para a China, primeiro na Universidade de Pequim,

entre 1947 e 1949, tendo como professor o famoso linguista chinês Luo Changpei e depois

na Universidade de Lingnan, entre 1949 e 1950, tendo sido discípulo do outro famoso

linguista, Wang Li. Halliday teve, inclusivamente, um nome chinês, Han Lide/韩礼德,

tradução fonética de Halliday, cujos caracteres significam liturgia e moral. Passados 3 anos

na China, voltou para Londres e fez doutoramento na Universidade de Cambridge com J. R.

Firth, tendo escrito a sua tese sobre a análise linguística de História Secreta da Dinastia

Yuan datada do século XIV. Trabalhou como professor universitário em vários países com

várias obras de peso e influência. 14

1.2.2 Teorias chinesas

Ao falarmos sobre a história de tradução da China, podemos referirmo-nos a quatro

fases de desenvolvimento com três culminâncias.

As quatro fases de desenvolvimento são:

1) A fase de tradução na Antiguidade Chinesa, do período anterior à Dinastia Qin (221

a. C.) até ao Reinado Qianlong (1736-1796) da Dinastia Qing (1616-1911).

Esta fase inclui a tradução dos textos budistas da Dinastia Han (206 a. C.-220) até à

Dinastia Song (960-1127) e a tradução das obras de religião, ciências e tecnologias entre os

finais da Dinastia Ming (1368-1644) e os princípios da Dinastia Qing (1616-1911).

É marcada por duas culminâncias, a primeira e a segunda na história de tradução

chinesa. A primeira refere-se à da tradução das sutras budistas no período entre a Dinastia

Han (206 a. C.-220) e a Dinastia Tang (618-907), com Xuanzang como o seu representante

mais conhecido. A segunda refere-se à da tradução das ciências e tecnologias ocidentais no

período entre o fim da Dinastia Ming (1368-1644) e o início da Dinastia Qing (1616-1911),

sendo os seus representantes mais importantes Xu Guangqi e Matteo Ricci, que traduziram

em conjunto os primeiros seis volumes de Elementos de Euclides.

14 https://baike.baidu.com/tem/韩礼德, consultado em 02/06/2021.

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18

2) A fase de tradução dos tempos modernos, a partir da Guerra do Ópio (1840) até ao

Movimento 4 de Maio (1919).

A China foi invadida pelos exércitos ocidentais e perdeu duas guerras do ópio (1840-

1842 e 1856-1860). Para enfrentar os canhões e as armas do fogo dos invasores, alguns

tradutores chineses começaram a traduzir livros ocidentais nesta área para promover a

tecnologia e a ciência na China.

Os tradutores mais famosos desta fase são Yan Fu e Liang Qichao, sobretudo Yan Fu,

por ter apresentado os famosos três princípios da tradução, fidelidade (xin), expressividade

(da) e elegância (ya), respeitados e observados até aos dias de hoje pelos tradutores chineses,

com abordagens constantemente renovadas.

As obras literárias estrangeiras também tiveram a sua versão chinesa, tais como

Robinson Crusoe, As Mil e Uma Noites, Os Miseráveis, A Dama das Camélias, etc. Os

tradutores Wang Guowei, Zhou Guisheng, Xu Nianci e outros estudaram e abordaram as

teorias da tradução através destas obras literárias.

Esta fase representa a terceira culminância de tradução na China.

3) A fase da tradução moderna, do Movimento 4 de Maio (1919) até à fundação da

República Popular da China (1949), em que surgiram vários estudiosos e tradutores com

enormes contribuições para a prática e a teoria da tradução, entre os quais, Lu Xun, Hu Shi,

Lin Yutang, Mao Dun, Guo Moruo, Qu Qiubai, que eram em si literatos de renome. As

teorias da tradução começaram a ganhar substância e desenvolvimento.

4) A fase da tradução contemporânea, a partir da fundação da República Popular da

China (1949) até aos dias de hoje, com a formação das teorias da tradução sistematizadas.

Durante a “Grande Revolução Cultural” (1966-1976), praticamente todo o trabalho de

tradução parou. Concluída essa “revolução”, Tan Zaixi, à frente de outros, propôs em finais

dos anos oitenta, a criação da disciplina da tradução. Em 1990, o livro Xiandai Fanyi Lilun

foi publicado e considerado um símbolo do sistema chinês das teorias contemporâneas da

tradução, pois apresentou as teorias da tradução de maneira científica e sistémica, em vez

das abordagens tradicionais.

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19

Apresentadas as quatro fases com três culminâncias da história da tradução da China,

segue a apresentação de algumas abordagens mais conhecidas, no âmbito das teorias da

tradução.

Sobre a relação entre o texto original e o texto traduzido:

“A tradução deve ser fiel e fluente”, conforme Xuanzang, proeminente tradutor das

sutras budistas na Dinastia Tang;15

“A tradução literária passa por usar uma outra língua para transmitir o significado da

obra original, fazendo com que os leitores sintam inspiração e beleza quando estão a ler,

como se estivessem a ler a obra original”, usando as palavras de Mao Dun numa palestra

nacional da tradução literária em 1954; 16

“A tradução deve assemelhar-se à pintura tradicional chinesa, à procura da semelhança

espiritual em vez da semelhança formal”, de acordo com Fu Lei (Jiang, 2019, p. 74);

A tradução deve “manter a conceção essencial e a atmosfera da obra original”, ideia

essa que é defendida por Zhu Shenghao;17

“Pode-se dizer que o padrão mais alto da tradução literária é a sublimação. Quando uma

obra é passada de uma língua para a outra, por um lado, não se deve revelar traços forçados

pelos hábitos linguísticos diferentes e por outro, deverá conseguir-se manter o total sabor da

obra original. Podemos designar esta de sublimação”, traduzindo as palavras de Qian

Zhongshu;18

“A tradução literária deve obedecer aos seguintes princípios: a beleza dos significados,

a beleza do som e a beleza da forma”, usando as palavras de Xu Yuanchong.

Na nossa modesta opinião, as teorias chinesas têm as suas características nacionais,

enraizadas na história e cultura chinesas. Apesar de serem apresentadas em abordagens e

linguagens diferentes, as teorias, tanto ocidentais como chinesas, focam, entre outros, o

relacionamento entre o texto original e a sua versão em outra língua, isto é, fazer os leitores

da língua de chegada compreenderem e sentirem o mesmo que os leitores nativos.

15 https://www.douban.com/group/topic/119274573/?type=rec, consultado em 19/06/2021. A tradução é nossa. 16 https://www.xzbu.com/5/view-1314652.htm, consultado em 20/06/2021. A tradução é nossa. 17 https://www.nuoha.vip/book/chapter/71201/9.html, consultado em 19/06/2021. A tradução é nossa. 18 http://www.tup.com.cn/upload/books/yz/063270-01.pdf, consultado em 20/06/2021. A tradução é nossa.

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1.3 Critérios e processo da tradução

Na história de tradução, foram propostos diversos critérios da tradução por tradutores e

teóricos de tradução em diferentes períodos. Tal como foi referido anteriormente, o famoso

tradutor Yan Fu apresentou três princípios que são também os três critérios da tradução:

fidelidade (xin), expressividade (da) e elegância (ya). O escritor e tradutor de renome, Lu

Xun, defendeu a fidelidade e a expressividade, com as seguintes palavras: “Qualquer

tradução deve levar em consideração dois aspetos, um é procurar a sua compreensão fácil e

o outro é preservar a beleza da obra original.”19

Em 1790, foram apresentados por Lefevere os três princípios no livro Essay on the

Principles of Translation:

1. That the Translation should give a complete transcript of the ideas of the original work. 2. That

the style and manner of writing should be of the same character with that of the original. 3. That

the Translation should have all the ease of original composition. (Lefevere, 1992, p. 128)

Hoje em dia, usam-se muito as palavras fidelidade e fluidez, sendo na verdade a nova

interpretação de lealdade e expressividade.

Fidelidade, é ser fiel ao texto original. Por outras palavras, os tradutores expressam

exatamente o conteúdo da obra original, não o devendo alterar, distorcer, eliminar ou

aumentar à vontade. Este conteúdo pode incluir a descrição de acontecimentos, verdades,

paisagens, sentimentos ou reflexões. Fidelidade também significa manter o estilo do texto

original, referente ao estilo da comunidade, da época, do texto, da linguagem do autor, entre

outros. Se o texto original empregar uma linguagem oral, o texto traduzido não poderá tomar

forma como linguagem escrita; se o texto original possuir matiz ocidental, o texto traduzido

não poderá ganhar um matiz oriental. Em suma, tenta-se manter aparência original tanto

quanto possível.

Fluidez, indica que o texto traduzido deve ser fácil de entender e corresponder aos

hábitos linguísticos da língua de chegada, sem apresentar as seguintes falhas: estrutura

19 https://zhuanlan.zhihu.com/p/51445616, consultado em 10/06/2021. A tradução é nossa.

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caótica, lógica confundida e palavras complicadas.

Conforme Nida (1969), o processo da tradução consiste em quatro fases: “analysis”,

“transfer”, “restructuring” e “test”. A análise significa analisar o texto original a nível

semântico e gramatical; a transferência passa por transmitir as informações analisadas na

língua de partida para a língua de chegada; a restruturação passa por restruturar as

informações transmitidas para a língua traduzida; o teste constitui a comparação entre o

significado do texto original e o significado do texto traduzido, a fim de verificar se o

primeiro está equivalente ao segundo.

No que diz respeito ao processo de tradução, diferentes escolas têm diferentes

perspetivas. De acordo com as teorias básicas e tradicionais de tradução, Yu Xiang dividiu

o processo da tradução em três fases: compreensão, expressão e revisão. (2011, p.16-18).

Alguns académicos também acreditam que a tradução tem três princípios ou elementos:

“meaning transference”, a significar que não se deve perder o significado do texto original;

“acceptability”, a explicar que o texto traduzido é fácil de entender para os leitores;

“similarity”, a sublinhar que o texto traduzido deve ser semelhante ao texto original.20

1.4 Metodologia da tradução

1.4.1 Tradução literal e paráfrase

Tanto na China como no Ocidente, a tradução literal e a paráfrase ou a tradução livre

são dois métodos mais usados na prática de tradução e logicamente, também os mais

discutidos entre os investigadores. O investigador italiano Lawrence Venuti apresentou

estrangeirização e domesticação no seu livro The Translator’s Invisibility (1995, pp. 19-20),

tornando a discussão entre a tradução literal e a paráfrase numa discussão entre a

estrangeirização e a domesticação.

A entrangeirização e a domesticação representam estratégias de tradução para muitos e

métodos de tradução para alguns. Neste trabalho, por tentarmos compará-las com a tradução

literal e a tradução livre, abordamos o seu conceito nesta secção de Metodologia. A tradução

literal e a tradução livre realizam-se a nível de linguagem, mas a estrangeirização e a

20 https://www.xzbu.com/4/view-6602042.htm, consultado em 05/06/2021. A tradução é nossa.

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domesticação concretizam-se nos âmbitos de linguagem, cultura, estética, pensamento, entre

outros.

No processo de tradução literal, o texto original é passado palavra por palavra para a

sua nova versão, a nível da linguagem. Por outras palavras, a nova versão mantém a forma

da língua de partida, sem abandonar, porém, o seu significado. Mais simplesmente, a

tradução literal recorre às expressões do texto original sendo semelhantes as estruturas

sintáticas. Por exemplo:

a. 一带一路/yi dai yi lu

Tradução literal: Uma Faixa, Uma Rota

b. Ele é português.

Tradução literal: 他是葡萄牙人。/Ta shi Putaoya ren.

No processo de tradução livre ou paráfrase, é traduzida a ideia da obra original, mesmo

se esta se desviar da sua estrutura formal. Normalmente é mais usada na tradução das frases

ou expressões idiomáticas, quando existe uma grande diferença entre a língua de partida e a

língua de chegada. Na perspetiva intercultural e comunicativa, a paráfrase enfatiza a

independência do sistema cultural da língua de partida e de chegada.

Mo Yan, o primeiro escritor chinês a ganhar o Prémio Nobel de Literatura em 2012,

apresentou numa palestra internacional da tradução literária: “a tradução é como dançar com

grilhões”, ou seja, a fidelidade e a fluidez não são coexistentes, sendo a sua relação

dialética.21

1.4.2 Estrangeirização e domesticação

A estrangeirização exige que o tradutor se aproxime do autor, empregando a forma de

expressão da língua de partida para transmitir as informações do texto-fonte, guardando ao

mesmo tempo a sua imagem cultural. Desta forma, é possível manter o estilo e a cultura da

língua de partida e apresentá-los ao leitor, enriquecendo a língua de chegada com

21 https://m.sohu.com/n/464805183/, consultado em 07/06/2021. A tradução é nossa.

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estrangeirismos ou expressões e estruturas novas. A estrangeirização é orientada pela cultura

da língua da origem, tendo em conta as diferenças entre as nações e preservando as

características estrangeiras, com o intuito de transmitir o tom exótico aos leitores.

A domesticação exige que o tradutor se aproxime do leitor, empregando a forma de

expressão da língua de chegada para transmitir as informações do texto-fonte, pelo que o

tradutor deve comportar-se como o seu autor. A domesticação é orientada pela cultura da

língua-alvo, usa a sua linguagem castiça e obedece aos seus hábitos linguísticos, para fazer

o texto traduzido mais simples de entender, pelo que o objetivo principal do uso da

domesticação é transmitir o espírito básico e o conteúdo semântico do texto-fonte, em vez

de manter a forma da linguagem original ou pormenores. A equivalência funcional referida

por Nida enquadra-se também no âmbito da domesticação que salienta a forma da expressão

mais natural, ao serviço do público-alvo.

Segundo Venuti, a domesticação é “the translator leaves the reader in peace, as much

as possible, and moves the author towards him”, enquanto a estrangeirização é “the translator

leaves the author in peace, as much as possible, and moves the reader towards him” (1995,

p.20). Por isso, a domesticação e a estrangeirização concretizam-se no contexto cultural.

A relação entre as duas é dialética e complementar. Na tradução, nomeadamente na

tradução literária, devemos combinar todas as características das obras originais e levar em

plena consideração o seu conteúdo, enredo, estilo de escrita e conceção artística, para

podermos optar pela domesticação ou pela estrangeirização. No entanto, tanto na primeira

opção como na segunda opção, a tradução deve ser coerente fazendo com que os leitores-

alvo sintam a mesma emoção artística e estética transmitida pela obra-fonte, de modo a ser

possível desfrutar de mais obras excelentes sem barreiras, no campo da literatura mundial.

Concretamente no caso de tradução para chinês, de álbuns infantis portugueses, inclinamo-

nos, por um lado, a defender a domesticação, porque os seus leitores são crianças que estão

a aprender a língua materna e por outro, a conservar devidamente o “exotismo” da obra,

porque as crianças, que se encontram também nesta aldeia global, precisam de contactar

outras culturas.

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24

Capítulo II Tradução dos Álbuns Infantis Portugueses para

Chinês

2.1 Contexto e status-quo na China

2.1.1 Livrinhos ilustrados tradicionais da China

Tal como foi anteriormente referido, a China tem, desde sempre, os seus livrinhos

ilustrados tradicionais, destinados ao público infantil, os quais, porém, são muito diferentes

dos álbuns infantis modernos, seja ao nível do formato, da apresentação de histórias ou até

da sua designação, 连环画/lianhuanhua em chinês.

连环画/lianhuanhua, aliás, 小人书/xiaorenshu, literalmente “desenhos em sequência”

ou “livros para crianças”, narra uma história ou um evento através de uma série de desenhos,

acompanhados de legendas. Normalmente é de tamanho 14.4cm×10.5cm.

Os livrinhos ilustrados tradicionais chineses têm uma longa história, remontando aos

anos antes de Cristo. De acordo com os registros históricos, no período Primavera e Outono

(770 a. C.-476 a. C.) e no período dos Reinos Combatentes (475 a. C-221 a. C.), já havia

histórias contadas em quadrinhos gravados nas peças de bronze. Os livrinhos ilustrados

surgiram durante a Dinastia Han (202 a. C.-220), Wei (220-266) e Jin (266-420) tendo

conhecido um grande desenvolvimento na Dinastia Ming (1368-1644). Ganharam

maturidade entre finais da Dinastia Qing (1616-1911) e princípios da República da China

(1912-1949) e ganharam prosperidade depois da fundação da República Popular da China

em 1949, sendo a leitura preferida tanto de crianças como de adultos.22

22 https://baike.baidu.com/item/%E8%BF%9E%E7%8E%AF%E7%94%BB, consultado em 10/06/2021

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Figura 1- Crianças de Xangai a ler lianhuanhua numa livraria em 1951

(Fonte: https://zh.wikipedia.org/wiki/连环画)23

Figura 2- Cidadãos de Xangai a escolher lianhuanhua em 1951

(Fonte: https://zh.wikipedia.org/wiki/连环画)24

Existiam razões para os livrinhos ilustrados se tornarem a forma de leitura preferida dos

chineses, pois narram todos os tipos de histórias e abordam temas variadíssimos, desde mitos

e lendas e outros temas clássicos, passando por temas modernos e contemporâneos, até a

temas estrangeiros e de ficção científica, entre outros. Constituem uma arte tradicional e

especial, que influenciou e educou gerações e gerações de chineses.

23 Consultado em 01/06/2021. 24 Consultado em 01/06/2021.

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26

Figura 3- Capa de Peregrinação ao Oeste

(Fonte: https://zhuanlan.zhihu.com/p/358991671) 25

Figura 4- Uma página de Peregrinação ao Oeste com desenho e legenda

(Fonte: Pintura Google)

25 A Peregrinação ao Oeste narra a viagem ao Oeste realizada pelo Monge Tang, escoltado pelo Rei Macaco,

Porco e Shaseng em busca de sutras budistas. Consultado em 01/06/2021.

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27

Figura 5- Uma página de História na Sala Oeste com legenda vertical

(Fonte: Pintura Google)

Figura 6- Uma página de Vida errante de Sanmao

(fonte: Pintura Baidu)26

26 Consultado em 16/05/2021.

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Figura 7- Quatro páginas de A Guerra das Estrelas

(Fonte: https://baike.baidu.com/)27

Mas, a partir de meados dos anos 80 do século passado, lianhuanhua começou a entrar

em decadência, cujos motivos eram vários, mas o principal, na nossa modesta opinião, está

intimamente relacionado com o avanço das novas tecnologias, a começar pela televisão,

seguida do computador, telemóvel, internet, etc., o que ampliou o horizonte dos leitores,

expostos a mais opções por causa da diversificação de artes visuais, no contexto da

globalização.

Das figuras acima apresentadas, podemos constatar uma grande característica dos

livrinhos tradicionais: os desenhos costumam ser acompanhados de legendas grandes. Para

quem não saiba caracteres chineses, é difícil apreciar as histórias. Para remediar a situação,

atualmente, já aparecem legendas acompanhadas de pinyin (letras latinas que indicam a

pronúncia dos caracteres) para ajudar as crianças na sua leitura. Mas mesmo assim, dum

modo geral, os livrinhos ilustrados tradicionais não conseguem resistir aos álbuns ilustrados

infantis, nacionais e estrangeiros, com desenhos e caricaturas de cores vivas, de temas

visivelmente adaptados ao gosto das crianças.

2.1.2 Entrada dos álbuns ilustrados infantis portugueses na China

Os álbuns ilustrados infantis ou livros infantis ilustrados surgiram na Europa e América

27 Consultado em 16/05/2021.

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29

no final do século XIX, tendo sido introduzidos no Japão no início do século XX. A China

Continental começou a introduzir os álbuns no princípio do século XXI.28

Na China, os álbuns infantis ilustrados, ou seja, 儿童绘本/ertong huiben em chinês,

começaram a ser populares primeiro em Taiwan, através do Japão, nos anos sessenta do

século XX, e depois entraram na China Continental no início do século XXI, tendo sido

introduzido no mercado chinês um grande número de álbuns estrangeiros. Com os seus

desenhos tipo cartoon de cores vivas e legendas simples, atraíram logo o público chinês.

Conforme os dados estatísticos fornecidos pelo openbookdata.com.cn, entre janeiro de 2018

e junho de 2019, a China publicou 4962 títulos de álbuns ilustrados, entre os quais, 2268

foram introduzidos na China após a aquisição dos respetivos direitos autorais.29

Aproveitando a maré, os álbuns portugueses entraram em força no mercado chinês.

Conforme a Exposição O Encontro das Línguas - Tradutores e traduções de escritores

portugueses para chinês (Wang, versão 2020), até aos finais de 2020, entraram na China 32

livros infantis ilustrados portugueses com a sua versão ou versões em chinês, tornando-se

conhecidos alguns dos seus autores, Isabel Minhós Martins, Catarina Sobral, entre outros.

Entre os tradutores chineses, Zhang Xiaofei é uma representante notável, pois a sua tradução

de Lá Fora, de Maria Ana Peixe Dias, Inês Teixeira do Rosário e Bernardo P. Carvalho,

ganhou em 2017 o “Prémio Wenjin” e o “Prémio Livro mais Popular”, concedidos pela

Biblioteca Nacional da China, logo depois de ser lançado no mercado em 2016, sendo

também incluída na lista “Os 10 Melhores Livros do Ano de Pequim News” e na

“Bibliografia Obrigatória das Bibliotecas das Escolas Primárias e Secundárias da China”.

Além de Lá Fora, também traduziu outros 6 livros, a saber, Versos para os pais lerem aos

filhos em Noites de Luar de José Jorge Letria e André Letria, Um ano inteiro de Isabel

Minhós Martins e Bernardo Carvalho, Tão, tão grande de Catarina Sobral, Greve de Catarina

Sobral, Achimpa de Catarina Sobral e A Maior Flor do Mundo de José Saramago.

28 http://www.xinhuanet.com//globe/2019-09/10/c_138358512.htm, consultado em 01/06/2021. 29 http://www.xinhuanet.com/book/2020-07/10/c_139200199.htm, consultado em 01/06/2021.

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Figura 8- Os livros traduzidos para chinês (pela Zhang Xiaofei)

(fonte: O Encontro das Línguas - Tradutores e traduções de escritores portugueses para chinês)

Além dos 7 títulos traduzidos por Zhang Xiaofei, os restantes 25 livros ilustrados

infantis portugueses são:

A Ilha de João Gomes de Abreu e Yara Kono, com tradução de Yang Lei (2014);

Coração de mãe de Isabel Minhós Martins, com tradução de Yang Lei (2014);

Ir e vir de Isabel Minhós Martins, com tradução de Yang Lei (2014);

A manta, uma história aos quadradinhos de Isabel Minhós Martins e Yara Kono, com

uma versão chinesa de Huang Youqing (2014) e a outra, de Zhang Xiaoge (2020);

Quando eu for…grande de Maria Inês Almeida, com tradução de Wu Xun (2015);

Hoje sinto-me…de A a Z de Madalena Moniz, com tradução de Gua Gua (2015);

Andar por aí de Isabel Minhós Martins, com tradução de Xu Fangzhou (2016);

O meu avô de Catarina Sobral, com uma versão chinesa de Cheng Liyan (2015) e a

outra, de Sun Lili (2016);

O mundo num segundo de Isabel Minhós Martins, com tradução de Sun Shan (2016);

O pai mais horrível do mundo de João Miguel Tavares e João Fazenda, com tradução

de Na Guo (2016);

Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? de Bernardo Carvalho (2016);

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Livro clap de Madalena Matoso, com tradução de Yu Jiayuan (2016);

Este livro está a chamar-te, não ouves? de Isabel Minhós Martins, com tradução de

Gong Xiaotu (2017);

O que há de Isabel Minhós Martins, com tradução Zhongqingwen (2017);

Para onde vamos quando desaparecemos? de Isabel Minhós Martins, com tradução de

Yuan Shenyi (2017);

Cem sementes que voaram de Isabel Minhós Martins, com tradução de Fan Xiaoxing

(2018);

A casa que voou de Catarina Sobral e Davide Cali, com tradução de Chem Feijiu (2018);

Mana de Joana Estrala, com tradução de Li Jialan (2018);

A bola amarela de Daniel Fehr e Bernardo P. Carvalho, com tradução Zhang Yiqi

(2019);

Com o tempo de Isabel Minhós Martins, com tradução de Liuyin (2019);

Horizonte de Carolina Celas, com tradução de Liang Dingman (2019);

O espelho de Adélia Carvalho, com tradução de Bai Shun (2019);

Uma história de dedos de Luísa Ducla Soares, com tradução de Hejie (2019);

Quando eu nasci de Isabel Minhós Martins, com tradução de Huang Xiaoyin (2020);

Barriga da Baleia de António Jorge Gonçalves, com tradução de Ren Shasha (2020).

Dos livros citados, A manta de Isabel Minhós Martins e O meu avô de Catarina Sobral

têm duas versões chinesas diferentes.

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Figura 9- Outros livros traduzidos para chinês 1

(fonte: O Encontro das Línguas, Tradutores e traduções de escritores portugueses para chinês)

Figura 10- Outros livros traduzidos para chinês 2

(fonte: O Encontro das Línguas, Tradutores e traduções de escritores portugueses para chinês)

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Figura 11- Outros livros traduzidos para chinês 3

(fonte: O Encontro das Línguas, tradutores e traduções de escritores portugueses para chinês)

Todos esses álbuns foram traduzidos para chinês e mais álbuns estão à espera de ser

traduzidos. Com base nos já traduzidos, pretendemos analisar os procedimentos utilizados

pelos tradutores no seu processo de tradução, a fim de dar uma pequena contribuição para

promover a tradução nessa área melhorando a sua qualidade.

Em relação às terminologias de tradução, não existe um consenso entre os académicos

sobre estratégias, métodos ou técnicas quando são referidos os diversos procedimentos no

processo de tradução (Molina, 2002). Na China, os académicos costumam ou preferem usar

as palavras “método” ou “técnica”. Sem a intenção de discutirmos a nomenclatura desses

procedimentos, adotamos o termo “procedimento” para a nossa abordagem e análise.

Cumpre-nos esclarecer o seguinte: Os antropónimos chineses, escritos em caracteres,

não indicam, na sua grande maioria, o sexo dos seus possuidores, pelo que não sabemos se

um certo tradutor é senhor ou senhora; para evitar a confusão, exceto casos em que temos a

absoluta certeza, os outros são todos tratados por “tradutor”.

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2.2 Análise dos procedimentos principais na tradução de português para

chinês

Estamos cientes de que o público infantil tem uma perceção de língua muito diferente

da do público adulto, tal como José Saramago disse logo no início de A maior flor do mundo:

“As histórias para crianças devem ser escritas com palavras muito simples, porque as

crianças, sendo pequenas, sabem poucas palavras e não gostam de usá-las complicadas.”

Estamos também cientes de que estamos perante a tradução entre português e chinês,

duas línguas e culturas totalmente diferentes.

Portanto, na tradução para chinês de literatura infantil portuguesa, nomeadamente de

álbuns ilustrados infantis, todas as teorias citadas no Capítulo anterior servem para preparar

o público infantil chinês para os temas dos álbuns infantis portugueses, isto é, tornar o seu

conteúdo acessível para os leitores infantis nativos de língua e cultura chinesa.

Portanto, na nossa modesta opinião, achamos que no processo de tradução, os tradutores

devem ter bem presentes as seguintes perspetivas:

1. Perspetiva funcional da tradução orientada para o público-alvo, que são crianças

chinesas neste caso concreto, com a perceção e a cognição próprias;

2. Perspetiva sociocultural, virada para a comunicação intercultural, respeitando os

valores socioculturais de ambas comunidades linguísticas;

3. Perspetiva linguística, virada para a domesticação, respeitando os hábitos linguísticos

chineses e a linguagem infantil chinesa, evitando a tradução literal e rígida;

4. Perspetiva de recontextualização e reescrita, realizadas através de diversos

procedimentos.

2.2.1 Conceitos de recontextualização

Conforme Wang & Lu, “o processo de tradução deve ser entendido como um processo

de recontextualização, pois o texto e o seu contexto, ao serem submetidos ao processo de

tradução interlinguística, implicam recontextualização” (2020, p.158). “Text and context in

translation: translation as re-contextualization”, usando as palavras de House (2006, p.343).

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A recontextualização é indispensável no processo de tradução, para podermos atingir uma

equivalência contextual e facilitar o entendimento do leitor do texto de chegada. Para Wang

& Lu, “uma equivalência contextual na tradução permite ao seu público da língua de chegada

entender exatamente o propósito da mensagem original no mesmo contexto em que é

produzida na língua de partida, pelo que pode ser considerada também uma equivalência

funcional” (2020, p.158).

Na nossa modesta opinião, a recontextualização é concretizada sobretudo a nível de

contexto de situação, através de muitos procedimentos de tradução, quase todos referidos

por Molina e Albir (2002): modulação, transposição, adição, omissão, entre outros. No

entanto, também constatamos alguns procedimentos específicos verificados na tradução de

álbuns infantis portugueses para chinês, por exemplo, a combinação de textos e ilustrações.

Segue-se a nossa análise sobre os procedimentos mais utilizados na tradução para

chinês de álbuns infantis portugueses. Cumpre-nos esclarecer que os casos em análise estão

agrupados pelo procedimento adotado, mas pode existir sempre uma mistura de

procedimentos na tradução de um parágrafo.

2.2.2 Tradução de títulos no âmbito de recontextualização

É curioso repararmos no seguinte fenómeno:

Assim que olhamos para os títulos em português e em chinês, podemos constatar que

em muitos casos os dois não são correspondentes a nível semântico.

Seguem alguns exemplos:

Título original em português Título traduzido em chinês

e o seu significado em português

A bola amarela 这本书吞了我的小黄球

Este livro engoliu a minha bolinha amarela

A Ilha 小岛和大桥

A ilha pequena e a ponte grande

A manta, uma história aos quadradinhos

拼布被 A manta de retalhos (versão de Huang

Youqing)

外婆的宝被 A manta-tesouro da avó (versão de Zhang

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Xiaoge)

Andar por aí 爷俩散步 O passeio do avô com o neto

Greve 点点罢工了 Os pontos entraram na greve

O meu avô 我的爷爷 O meu avô (versão de Chen Liyan)

我的爷爷和郑在忙先生 O meu avô e o senhor Zheng Zaimang

(versão de Sun Lili) O que há 咦,里面有什么?

Yi, o que há no interior?

Tão, tão grande 萨姆尔变形记 A metamorfose do Samuel

Um ano inteiro 看万物

Ver dez mil coisas

Versos para os pais lerem aos filhos em

Noites de Luar 月亮给你写了一首诗

A Lua escreveu-te um poema

Podemos concluir que os títulos em chinês transmitem informações mais concretas e

diretas, que respeitam os hábitos linguísticos chineses, nomeadamente do público infantil.

A título de exemplo, vamos analisar alguns desses casos, sendo os restantes abordados

oportunamente nas secções posteriores.

Caso 1:

Título original em português:

Versos para os pais lerem aos filhos em Noites de Luar

Tradução literal para chinês:

在月夜父母读给孩子的诗句/zai yueye fumu du gei haizi de shiju

Tradução de Zhang Xiaofei na versão chinesa:

月亮给你写了一首诗/yueliang gei ni xie le yi shou shi, isto é, A Lua escreveu-te um

verso

A tradução literal em chinês não é atraente para as crianças, sendo bastante longa para

um título de livro infantil, pelo que a tradutora recorre à modulação para a sua tradução.

Concretamente, em vez de Versos para os pais lerem aos filhos em Noites de Luar, a

tradutora muda o ponto de vista colocando A lua escreveu-te um poema. Esta tradução tem

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matiz romântica e metafórica, que leva os leitores infantis a pensar: a Lua consegue escrever?

O que ela escreveu? Porquê? Estas perguntas despertam o interesse para que continuem a ler

e procurar a resposta no livro.

O mesmo procedimento é utilizado também em outros livros, pela mesma tradutora ou

por outros tradutores, ao serviço do público infantil.

Caso 2:

Título original em português:

Tão, tão grande

Tradução literal para chinês:

太,太大了/tai, tai da le

Tradução de Zhang Xiaofei na versão chinesa:

萨姆尔变形记/Samuer bianxing ji, isto é, A metamorfose do Samuel

Conforme o título chinês, A metamorfose do Samuel, podemos saber que a história tem

como protagonista Samuel e fala sobre as suas transformações. Parece que a palavra

metamorfose não é propriamente da linguagem infantil, mas na China, o termo é muito

conhecido pelas crianças devido aos brinquedos 变形金刚/bianxing jingang (Transformers),

assim como bandas desenhadas e livros de cartoon do mesmo nome, de produção americana

e japonesa, além de fazer lembrar a famosa novela em alemão, A Metamorfose de Franz

Kafka. O título chinês estimula a imaginação dos leitores infantis.

Caso 3:

Título original em português:

A manta, uma história aos quadradinhos

Tradução literal para chinês:

被子——由小布块组成的故事/beizi – you xiao bukuai zucheng de gushi

Tradução para chinês na versão de Huang Youqing:

拼布被/pin bu bei, ou seja, A manta de retalhos

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Tradução para chinês na versão de Zhang Xiaoge:

外婆的宝被/waipo de bao bei, ou seja, A manta-tesouro da avó

Comparando as duas versões de tradução, A manta-tesouro da avó transmite mais

informações do que A manta de retalhos, explicando que a manta é muito importante para a

avó. Além disso, 宝被/bao bei, manta-tesouro, palavra inventada pelo tradutor, é homófono

de 宝贝/baobei (tesouro), contribuindo para chamar atenção ou curiosidade das crianças.

Podemos dizer que a A manta de retalhos é uma tradução mais adequada do que a tradução

literal, mas carece de força atrativa que A manta-tesouro da avó possui.

Caso 4:

Título original em português:

Andar por aí

Tradução literal para chinês:

随便走走/suibian zou zou

Tradução de Xu Fangzhou na versão chinesa:

爷俩散步/yelia sanbu, O passeio do avô com o neto

Na tradução, 爷/ye significa avô, 俩/lia significa dois, 爷俩/yelia juntos significa avô e

neto, a tradução 爷俩散步/yelia sanbu (o avô e o neto passeiam ou o passeio do avô com o

neto) explica quem são os dois protagonistas da história e a sua atividade. O verbo andar

passa a ser 散步/sanbu (passear), no uso de modulação.

Caso 5:

Título original em português:

A bola amarela

Tradução literal para chinês:

黄球 /huang qiu

Tradução de Zhang Yiqi na versão chinesa:

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这本书吞了我的小黄球/ zhe ben shu tun le wo de xiao huang qiu, isto é, Este livro

engoliu a minha bolinha amarela.

Recorrendo ao procedimento de adição para concretizar a recontextualização, o título

em chinês transmite-nos informações muito mais concretas da história, que estimulam a

curiosidade do público infantil.

Todos estes procedimentos serão exemplificados, com mais detalhes, em secções

seguintes.

2.2.3 Recontextualização no âmbito de culturas diferentes

Quando a recontextualização é feita no âmbito de culturas diferentes, entendemos que

essas culturas se referem à cultura no seu sentido lato, tal como Tylor definiu em 1871, em

Primitive Culture, “A cultura ou civilização, entendida no seu sentido etnográfico mais

amplo, é o conjunto complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito,

o costume e toda a demais capacidade ou hábito adquiridos pelo homem enquanto membro

de uma sociedade”.30

Verificamos que muitas recontextualizações estão relacionadas com metáforas que,

normalmente, transportam muitos valores culturais.

Caso 6:

No livro A manta, uma história aos quadradinhos, encontramos as seguintes frases:

A minha avó também lá estava… E diz que dormiu como uma santa.

Versão em chinês com tradução de Zhang Xiaoge:

外婆和我们一起睡在床上,她说自己睡得像婴儿一样香甜。

Na versão em chinês, o substantivo santa é substituído pelo substantivo 婴儿/ying’er

(bebé). Em vez de fazer uma tradução literal dormir como uma santa 睡得像圣女一样/shui

de xiang shengnv yiyang, o tradutor escolheu uma expressão equivalente a nível contextual

睡得像婴儿一样香甜/shui de xiang ying er yiyang xiangtian (dormir profundamente como

um bebé), pois na China, os cidadãos nacionais são, na sua grande maioria, 74%, ateus, sem

30 https://www.infopedia.pt/$edward-burnett-tylor, consultado em 11/06/2021.

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terem a noção sobre a santa e, conseguintemente, não vão conseguir perceber o valor

metafórico dessa expressão, muito menos as crianças, que vão perguntar sem dúvida: Quem

é santa? Por que se diz “dormiu como uma santa”? Mas se traduzirmos para dormir como

um bebé, toda a gente compreende de imediato a metáfora, pois vemos os bebés sempre a

dormir, profundamente. Neste caso, foi realizada uma equivalência contextual, através da

recontextualização.

Caso 7:

Em O meu avô:

O Dr. Sebastião não é relojoeiro (apesar de estar sempre a ver as horas), e nunca tem

tempo a perder.

Na versão em chinês com a tradução de Sun Lili:

郑在忙先生不是钟表匠,但他总是盯着手表看,他常说“时间就是生命”。

Nesse caso, a frase nunca tem tempo a perder não é traduzida literalmente para 从来没

有时间去浪费/conglai (nunca) meiyou (não ter) shijian (tempo) qu langfei (perder). O

tradutor optou por uma expressão chinesa 时间就是生命/shijian jiu shi shengming, isto é, o

tempo é a vida (ver a parte sublinhada), a qual é muito conhecida na China e constantemente

citada pelos professores e pais chineses quando explicam aos alunos ou filhos a importância

do tempo. A fim de introduzir esta expressão, até mudou a estrutura sintática do texto

original: ... não é relojoeiro, mas fixa sempre o seu olhar no relógio e diz com frequência:

“O tempo é a vida”. Naturalmente, esse procedimento, de modulação e de reescrita, facilita

a compreensão da ideia por parte das crianças chinesas.

Caso 8:

Em Coração de mãe:

Quando um filho está triste, o coração de mãe parte-se em mil bocadinhos.

Na versão chinesa com a tradução de Yang Lei:

当孩子难过悲伤,妈妈的心也跟着碎了,像鱼缸摔了一地。

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A expressão em mil bocadinhos muda para 像鱼缸摔了一地/xiang yugang shuai le yi

di (como se o aquário se partisse no chão), usando uma metáfora chinesa para estimular a

imaginação dos leitores infantis. Como os chineses têm o hábito de decorar as salas das casas

e espaços comerciais com aquários (tanto a água como o peixe simbolizam prosperidade na

cultura chinesa), as crianças chinesas podem perceber com facilidade a ideia transmitida pelo

autor do livro.

Caso 9:

Em Coração de mãe:

O coração de mãe congela quando um filho se perde na multidão.

Na versão chinesa com a tradução de Yang Lei:

当孩子不慎在人群中走失,妈妈的心就像掉进了冰窟窿一样。

O verbo congelar não é traduzido literalmente para 冻结/dongjie em chinês, mas sim

像掉进了冰窟窿一样/xiang diao jin le bing kulong yiyang (como se caísse num buraco de

gelo), recorrendo-se à metáfora para atingir uma equivalência contextual.

Caso 10:

Em Coração de mãe:

Quando chegam as férias, o coração de mãe bate mais devagarinho.

Na versão chinesa com a tradução de Yang Lei:

一家人去度假的时候,妈妈的心才终于有了一份轻松和安逸。

A expressão bater mais devagarinho, literalmente 跳得更慢一些/tiao (bater) de geng

(mais) man yi xie (um pouco devagar), pode fazer os leitores chineses pensarem que surge

um problema cardíaco, pelo que é traduzida para 终于有了一份轻松和安逸/zhongyu you

le yi fen qingsong he anyi (passou a ter finalmente um relaxamento e conforto), exprimindo

a mesma ideia do texto original.

Caso 11:

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Em A maior flor do mundo:

Deu-se o menino ao trabalho de subir a encosta, e quando chegou lá acima, que viu ele?

Nem a sorte nem a morte, nem as tábuas do destino...

Versão em chinês com a tradução de Zhang Xiaofei:

小男孩颇费了一番力气爬上山丘,抬眼望去,猜猜他看到了什么?不是惊喜,

不是惊吓,也并非指引命运的石碑……

A expressão nem a sorte nem a morte, literalmente 不是好运, 不是死亡/bu shi haoyun,

bu shi siwang muda para 不是惊喜, 不是惊吓/bu shi jingxi, bu shi jingxia (nem a surpresa

agradável, nem o espanto horroroso), apresentando um contraste mais suave, habitualmente

usado pelos chineses nessas situações.

2.2.4 Recontextualização para respeito de hábitos linguísticos

A recontextualização para respeito de hábitos linguísticos acontece em muitos casos

com a substituição de uma expressão de língua-fonte por outra semelhante na língua-alvo e

também através da observação da gramática e sintaxe da língua-alvo.

Caso 12:

Em A casa que voou:

Lentamente, a casa foi-se afastando da cidade.

Tradução de Chen Feijiu na versão chinesa:

房子慢慢飞出了小镇。A casa voou saindo lentamente da vilazinha.

Neste caso, podemos constatar a recontextualização em dois aspetos, cultural e

linguístico, na perspetiva de domesticação.

A palavra cidade é alterada para vilazinha, pois para os chineses, habituados às suas

cidades com milhões e milhões de habitantes, consideram muitas cidades portuguesas vilas

ou vilazinhas. Para evitar a confusão cognitiva por parte das crianças chinesas, o tradutor

reduziu simplesmente o estatuto da cidade para vilazinha.

Em português não é utilizado o verbo voar, mas em chinês é obrigatório, pois alguns

verbos chineses, tais como entrar, sair, aproximar e afastar, devem ser acompanhados de

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outros caracteres que descrevem o modo da sua realização. Concretamente, o ato de entrar

pode ser realizado de maneiras diferentes, por exemplo, uma pessoa entra a pé, uma criança

entra correndo, um pássaro entra voando, etc. Por isso, neste caso, a casa afastou-se voando.

Caso 13:

Em O meu avô:

“Guten tag. Herr Vinho!” Graceja o meu avô em alemão. Trocam dois dedos de

conversa num aperto de mão e o Dr. Sebastião despede-se, sorrindo apressadamente.

Na versão em chinês com a tradução de Sun Lili:

“Guten tag! 你好啊,我亲爱的邻居!”爷爷开玩笑地用德语和他打招呼。他们

总是握握手,说两句话,郑在忙先生就微笑着向爷爷说“再见”了。

Neste caso a expressão portuguesa trocar dois dedos de conversa significa ter uma

conversa rápida, que dura pouco tempo, a que corresponde a expressão chinesa 说两句话

/shuo liang (dois) ju (frase) hua (palavra), isto é, dizer duas frases, a significar uma curta

conversa.

O mesmo acontece com o exemplo seguinte.

Caso 14:

Em A maior flor do mundo:

Se eu tivesse aquelas qualidades todas, poderia contar, com pormenores, uma linda

história que um dia inventei, mas que, assim como a vão ler, é apenas o resumo de

uma história, que em duas palavras se diz...

Versão em chinês com a tradução de Zhang Xiaofei:

我曾酝酿过一个美丽的故事,如果我具备上述那些禀赋,便可将它讲述得生动

有味,只是,就如大家将会读到的那样,我只能勾勒出故事的轮廓,三言两语

便可讲完……

O livro A maior flor do mundo é um dos 3 livros31 que o grande escritor José Saramago

31 Os outros dois livros são O Silêncio da Água (2011) e O Lagarto (2016).

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ofereceu ao público infantil, com ilustrações de João Cetano, lindas e simples.

Neste parágrafo, cumpre-nos indicar três pormenores.

1º pormenor: No texto original o autor usa a expressão em duas palavras para exprimir

que a história é muito curta, e em chinês também existe uma expressão 三言两语/sanyan-

liangyu, literalmente três palavras e duas frases, para significar a narração de uma história

em poucas palavras.

2º pormenor: O substantivo o resumo (de uma história) é substituída pela locução verbal

勾勒出(故事的)轮廓/goule chu (gushi de) lunkuo, isto é, fazer o esboço (da história), sendo

visível o uso de modulação e transposição.

3º pormenor: O complemento direto do verbo contar, juntamente com a sua oração

subordinada adjetiva, uma linda história que um dia inventei, foi colocada no início de todo

o período composto, pois em chinês, não temos períodos compostos tão compridos como os

em português. As frases chinesas costumam ser curtas, por isso, por respeitar o hábito

linguístico chinês e para uma melhor compreensão por parte dos leitores, essa parte foi

anteposta.

Caso 15:

Vamos ler a seguinte conversa no livro A casa que voou:

“Senhor polícia, ajude-me. A minha casa foi-se!”

“Foi-se? Quer dizer que alguém a roubou?”

“Não.”

“Então o que é que se passou?”

“Não sei, levantou voo sem mais nem menos.”

“Nesse caso, não o posso ajudar. Talvez tenha de ir ao Gabinete dos Desastres

Naturais”

Na versão chinesa com a tradução de Chen Feijiu:

他问一位警官:“警察先生,你能帮帮我吗?我的房子不见了!”

“不见了?被人偷了吗?”

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“不是。”

“那是怎么回事?”

“我哪儿知道,它就这么飞走了!”

“这我可帮不了你。你去自然灾害办公室问问吧!”

A expressão no texto original, sem mais nem menos, significa sem motivo ou sem razão.

Na versão chinesa ela não é traduzida, mas é usada a partícula 就/jiu para exprimir o mesmo

significado. A partícula chinesa 就 /jiu desempenha várias funções nas frases chinesas,

indicando neste caso que alguma coisa acontece naturalmente, sem razão, apresentando uma

equivalência contextual.

No entanto, essa expressão, sem mais nem menos, nem sempre é traduzido para 就/jiu

em chinês. Conforme a opção dos tradutores, o processo de recontextualização varia

conforme os casos, o que é comprovado pelo seguinte exemplo em Cem sementes que

voaram:

Foi assim, sem mais nem menos, que dez árvores novas apareceram na floresta.

Na versão chinesa com a tradução de Fan Xiaoxing:

有一天,仿佛魔法降临人间,在森林里,有 10 棵新树拔地而起。

Neste caso a expressão sem mais nem menos é traduzida para 仿佛魔法降临人间

/fangfu mofa jianglin renjian (como se a magia chegasse ao mundo), tornando a frase mais

compreensível e interessante para as crianças.

Caso 16:

Em A casa que voou:

“Bem, nesse caso não podemos fazer nada”, disse o funcionário. “Não é um caso

para este gabinete. As coisas têm de estar perdidas para serem encontradas. A sua

casa não está perdida, apenas levantou voo. Já falou com o Gabinete de Facilitação

e Segurança da Aviação Civil?”

Na versão em chinês com a tradução de Chen Feijiu:

“我觉得我帮不了你,”男人说,“这不是我们能管的事儿。我们只能去找

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那些已经丢掉的东西。你的房子还没丢呢,它刚刚还飞了过去。你问过飞行

许可办公室了吗?”

Para o texto original se tornar mais fácil de entender, algumas expressões foram

alteradas na tradução chinesa. A expressão não podemos fazer nada muda para 我帮不了你

/wo bang bu liao ni (não consigo ajudar-te); não é um caso para este gabinete muda para 这

不是我们能管的事儿/zhe bu shi women neng guan de shir (Isto não é um assunto em que

possamos intervir); apenas levantou voo muda para 刚刚还飞了过去/ganggang hai fei le

guo qu (acaba de passar por aqui voando). No entanto, não foi traduzida a interjeição bem,

que significa neste caso encerrar um assunto e introduzir o outro. Na nossa modesta opinião,

deve ser traduzida para 这样的话/zhe yang de hua (sendo assim) em chinês.

Caso 17:

Em A casa que voou:

“Não o posso ajudar. Talvez devesse passar-lhe uma multa porque a casa anda a voar

sem licença, mas vejo que tem mais com que se preocupar, por isso vou deixar

passar.” “Pode ao menos dizer-me a que gabinete é que me devo dirigir?”, perguntou

o homem.

Na versão chinesa com a tradução de Chen Feijiu:

“我帮不了你。”服务人员说,“你还得给我交一笔罚款,因为你的房子无证

飞行。不过看在今天你已经够倒霉的分上,罚款就算了。”

Aqui a expressão ter mais com que se preocupar é substituída por 看在今天你已经够

倒霉的分上/kan zai jintian ni yijing gou daomei de fen shang, que significa pelo bem do

seu grande azar hoje. A expressão chinesas 看在……的份(分)上/kan zai…de fen shang

pode ser traduzida para pelo bem de, por causa de, etc. (for the sake of em inglês); a

expressão deixar passar é traduzida para 算了/suan le, literalmente deixar assim, para

corresponder aos hábitos linguísticos chineses.

Caso 18:

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Em A casa que voou:

“Engraçado…nunca tinha pensado no agradável que seria ter uma casa no campo”,

disse ele. Depois pegou na chave e abriu a porta.

Na versão chinesa com a tradução de Chen Feijiu:

“有间乡村别墅也挺好的!”主人自言自语道。于是他掏出钥匙,打开了门。

A frase nunca tinha pensado no agradável que seria ter uma casa no campo é traduzida

para 有间乡村别墅也挺好的/you jian xiangcun bieshu ye ting hao de (também é muito bom

ter uma vivenda no campo), tornando a frase negativa na afirmativa, respeitando o raciocínio

dos chineses. Nota-se nesta recontextualização a forte presença de modulação.

Caso 19:

Em Cem sementes que voaram:

A árvore deixou passar os dias frios.

Deixou passar os dias de chuva.

Deixou passar os dias incertos.

Esperou pelo calor.

E quando o calor veio para ficar,

sossegou,

as pinhas secaram,

e como algumas aves planaram no ar:

voaram!

Na versão em chinês com a tradução de Fan Xiaoxing:

树妈妈不去理会——

寒冷的日子,

下雨的日子,

阴晴不定的日子。

她等待着炎热的天气。

当热浪来袭,

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树妈妈静下心来,

松塔渐渐干燥,

松子颗颗松动,

他们像小鸟,飘飘悠悠,

飞向天空!

No texto o substantivo árvore é traduzido para 树妈妈/shu mama (mãe-árvore), usando

a personificação para tornar a linguagem mais viva e figurativa, adaptada aos hábitos

linguísticos das crianças chinesas, pois é costume personificar os animais com tratamentos

a familiares, entre as crianças chinesas. Por exemplo, 狼外婆/lang waipo (Avó-Lobo), 鸡妈

妈/ji mama (mamã-galinha), 骆驼妈妈/luotuo mama (mamã-camela), 猪爸爸/zhu baba

(papá-porco), 猪妈妈/zhu mama (mamã-porca) , 兔小姐/tu xiaojie (menina-coelha) entre

outros, nas histórias e contos infantis.

No texto, a repetição de deixou passar foi substituída pelo sinal travessão em chinês,

que tem a função explicativa, simplificando a estrutura frásica, adaptada à linguagem das

crianças.

Caso 20:

Em A maior flor do mundo:

Correram tudo, já em lágrimas tantas...

Versão em chinês com a tradução de Zhang Xiaofei:

他们四处奔走呼告,几乎哭成泪人……

A expressão portuguesa, em lágrimas tantas na obra original, é substituída na tradução

pela expressão chinesa 哭成泪人/ku cheng lei ren (chorar tanto tornando-se uma pessoa de

lágrimas) para exprimir a mesma ideia.

2.2.5 Recontextualização através da adição e omissão

A língua chinesa e a língua portuguesa são duas línguas totalmente diferentes, seja na

parte de gramática seja em relação ao raciocínio linguístico ou hábitos linguísticos, por isso

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a recontextualização na tradução é constantemente concretizada através de adição e a

omissão, a fim de exprimir, no texto de língua-alvo, exata e naturalmente o significado e o

estilo do texto de língua-fonte. Podemos verificar que o mesmo acontece com a tradução de

português para chinês dos álbuns infantis, fazendo com que o público infantil chinês

compreenda melhor a história de outra língua.

Molina e Albir (2002) citaram as palavras de Nida (1964) para explicar os

procedimentos de adição e omissão: “to clarifay an elliptic expression, to avoid ambiguity

in the target language, to change a grammatical category, to amplify implicit elements, to

add connectors” (2020, p.502).

O uso destes dois procedimentos, ou destas duas técnicas, como dizem alguns

estudiosos, visa estabelecer uma equivalência entre as duas línguas, respeitando os

respetivos hábitos culturais e linguísticos. Tanto a adição como a omissão devem seguir

algumas regras convencionais, isto é, adicionar as palavras, mas não alterar o significado ou

a ideia original, ou adicionar significação redundante ou fora do raciocínio do autor; reduzir

as palavras, mas não cortar o significado original ou mutilar a sua dimensão estética.

Caso 21:

Vamos ver a tradução do título de um livro de Catarina Sobral:

Greve

Tradução literal para chinês:

罢工/bagong

Na versão em chinês com a tradução de Zhang Xiaofei:

点点罢工了/diandian bagong le, isto é, Os pontos entraram na greve

A tradutora acrescentou no título o nome dos protagonistas da história, que são todos

os pontos do mundo, por exemplo, pontos que figuram nos sinais de pontuação, pontos para

fechar a ferida, pontos no relógio, etc. Podemos imaginar quão caótico seria se um dia todos

esses pontos fizessem a greve desaparecendo da nossa frente. O título em chinês com o

sujeito adicionado apresenta uma ideia muito mais clara e direta para as crianças.

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Outros títulos que passaram pelo mesmo processo de adição:

Caso 22:

Título em português:

A Ilha

Tradução literal para chinês:

岛/dao

Na versão em chinês com a tradução de Yang Lei:

小岛和大桥/xiaodao he daqiao, isto é, A ilha pequena e a ponte grande

A adição das palavras “pequena” e “ponte grande” explica-nos que a história envolve

uma pequena ilha e a sua grande ponte, ressaltando o contraste entre os dois.

Caso 23:

Título original em português:

O meu avô

Tradução literal para chinês:

我的爷爷/wo de yeye

Tradução para chinês na versão de Chen Liyan:

我的爷爷/wo de yeye, O meu avô

Tradução para chinês na versão de Sun Lili:

我的爷爷和郑在忙先生/wo de yeye he zhengzaimang xiansheng, ou seja, O meu avô

e o senhor Zheng Zaimang

É curioso constatar que a tradução de Sun Lili acrescentou ao título chinês uma

personagem inexistente no título original, o senhor Zheng Zaimang, que é o senhor Sebastião

na história.

Esse procedimento ressalta o contraste entre o meu avô e o senhor Sebastião,

personagens principais da história. Além disso, o nome do Sr. Sebastião, em vez de ser

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submetido a uma tradução fonética, é alterado para 郑在忙/Zheng Zaimang, homófona de

正在忙/zhengzai mang, isto é, “estar ocupado”, pois o senhor Sebastião anda sempre muito

ocupado, em contraste com o meu avô, que me leva a passear e fazer outras coisas. A

tradutora faz uma recontextualização, através de adição de caracteres, resultando da

interpretação do próprio conteúdo da história.

Caso 24:

Em A manta, uma história aos quadradinhos:

Era de um vestido da tua mãe, tinha ela mais ou menos a tua idade.

Tradução de Zhang Xiaoge na versão chinesa:

那是从你妈妈的小洋装上剪下来的,她那时候跟你现在差不多大。Era cortado

de um vestido da tua mãe, tinha ela mais ou menos a tua idade.

Nesta parte, é adicionado o verbo 剪下来/jia xia lai (cortar) para se tornar a frase mais

fácil de entender, conforme os hábitos linguísticos chineses.

Caso 25:

Em Barriga de baleia:

- Não sou não, sou menina!

Tradução de Ren Shasha na versão chinesa:

莎莉大声争辩:“不!我不是食物,我是一个女孩儿!”A Sari retorquiu em

voz alta: “Não! Não sou comida, sou menina!”

Foram acrescentadas pelo tradutor as partes sublinhadas, para que a história fosse mais

coerente, tanto no desenvolvimento da ideia como na construção de frases.

Hoje em dia, cada vez mais ouvimos dizer que o tradutor é autor da nova versão do

livro, que reescreve a história, o que pode ser fundamentado por este e outros casos citados

nesta dissertação.

Caso 26:

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Em O pai mais horrível do mundo:

Para o Gui, o filho mais incrível do mundo.

Tradução de An Guo na versão chinesa:

对于爸爸吉来说,儿子是世界上最古怪的孩子。Para o Gui, pai, o filho é a criança

mais incrível do mundo.

Neste caso, a colocação das partes sublinhadas na versão chinesa torna a história mais

coerente e clara, além de respeitar os hábitos culturais e linguísticos chineses, pois na cultura

chinesa, os chineses nunca tratam as pessoas mais velhas apenas pelo nome e na construção

de frases, em princípio, os verbos não podem ser omitidos.

Caso 27:

Em Coração de mãe:

Mas quando chega a hora de ir buscar os filhos à escola, parece um avião a jato!

Tradução de Yang Lei na versão chinesa:

可是到了放学接孩子的时间,妈妈的心就像喷气式飞机一样早早就飞到了幼儿

园/zaozao jiu fei dao le you’eryuan (voar ao jardim de infância muito cedo)。

Neste caso, a parte sublinhada, adicionada à frase portuguesa, completa a ideia da

metáfora anterior, enfatizando a ansiedade da mãe de ver os filhos.

Devido às culturas diferentes, para os chineses, a metáfora fica incompleta sem a parte

sublinhada. No processo cognitivo, os chineses são mais diretos e algumas metáforas não

chinesas devem ser completadas com outros elementos para serem entendidas. Os casos

seguintes explicam o mesmo fenómeno.

Caso 28:

Em Coração de mãe:

Nos dias de piqueniques, o coração de mãe é um passarinho.

Tradução de Yang Lei na versão chinesa:

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在野餐的日子里,妈妈的心像自由飞翔的小鸟。

Adiciona-se o adjunto adnominal 自由飞翔的/ziyou feixiang de (que voa livremente)

para completar o valor metafórico tornando a frase acessível para as crianças.

Caso 29:

Em Para onde vamos quando desaparecemos?:

As nuvens, mais cedo ou mais tarde, voltam a cair no chão.

Tradução de Yuan Shenyi na versão chinesa:

云朵迟早会变成雨滴落到地上。As nuvens, mais cedo ou mais tarde, tornam-se

gotas da chuva caindo no chão.

Na versão chinesa, adiciona-se a parte sublinhada para explicar o modo pelo qual as

nuvens voltam a cair no chão.

Caso 30:

Em A maior flor do mundo:

Desce o menino a montanha,

Atravessa o mundo todo,

Chega ao grande rio Nilo,

No côncavo das mãos recolhe,

Quanto de água lá cabia,

Volta o mundo atravessar,

Pela vertente se arrasta,

Três gotas que lá chegaram,

Bebeu-as a flor sedenta.

Tradução de Zhang Xiaofei para chinês:

小男孩跑下山丘,

穿越了整个世界,

抵达浩瀚的尼罗河,

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双手掬起尽可能多的水,

再次穿越整个世界,

步履蹒跚,登上山坡,

只剩下三滴水在握,

干渴的花儿一饮而尽。

Na tradução, o tradutor adiciona 步履蹒跚/bulü panshan (andar devagar e cambaleando)

para demonstrar a exaustão do menino.

Caso 31:

Em A manta, uma história aos quadradinhos:

- Mas se queres mesmo saber, era de uma toalha que me ofereceram os meus padrinhos

de casamento. Quando disse ao teu avô que iam nascer as tuas tias gémeas entornou

aqui uma travessa inteira de ensopado...

Tradução de Zhang Xiaoge na versão chinesa:

“不过,如果你真的想知道的话,那是一条毛巾的一部分,是别人送我的结婚

礼物。当我告诉你外公我怀了你双胞胎阿姨的时候,他打翻了一盘炖肉,就洒

在这条毛巾上。……”

Nessa tradução, recorre-se à adição para colocar o sujeito dos verbos. O sujeito em

português normalmente é revelado pela conjugação verbal, mas isto não acontece em chinês,

porque não há conjugação verbal em chinês, pelo que o sujeito é adicionado na tradução de

chinês para português.

O seguinte caso também apresenta a mesma situação, com o recorrer à adição do

pronome pessoal em chinês.

Caso 32:

Em O pai mais horrível do mundo:

Ele só sabe dizer não. Proíbe-me de brincar. Obriga-me a trabalhar. Nunca tem tempo

para mim.

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Tradução de An Guo para chinês:

他只知道说“不”。他不让我玩。他逼我干活。他从来都没有时间陪我。

Adiciona-se o pronome pessoal 他/ta (ele) para funcionar como o sujeito das frases,

pela exigência da gramática chinesa, referida nos casos anteriores. Os exemplos semelhantes

são imensos.

Caso 33:

Em O meu avô:

Têm pouco em comum, embora o meu avô diga que já foi muito parecido com o dr.

Sebastião…que nunca se esquece de comprar o jornal. O meu avô nunca se lembra de

ler as notícias.

Tradução de Sun Lili para chinês:

他们看起来没有什么相似的地方,可是爷爷说自己以前/yiqian (no passado)和

郑在忙先生很像。那时候他从不会忘记买报纸,而现在/xianzai (agora)从来不

记得看新闻。

Em português, a diferença do tempo pode ser assinalada pela conjugação do verbo, por

exemplo, foi é a conjugação do verbo ser, que indica o tempo pretérito perfeito; esquece e

lembra são respetivamente conjugações do verbo esquecer e lembrar, que indicam o tempo

presente. Mas em chinês, como foi referido anteriormente, os verbos não têm conjugação e

o tempo verbal é revelado por vários métodos, sobretudo pela presença dos advérbios

temporais, 以前/yiqian (no passado) e 现在/xianzai (agora), entre outros, para indicar o

tempo em que acontecem os atos representados pelos verbos.

Mas neste parágrafo, o tradutor cometeu um erro ao traduzir a parte “que nunca se

esquece de comprar o jornal” para “naquela altura ele (o meu avô) nunca se esqueceu de

comprar o jornal” (ver a parte de caracteres chineses em itálico). Na realidade, quem nunca

se esquece de comprar o jornal é o sr. Sebastião nos dias de hoje e não o meu avô naquela

altura.

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Caso 34:

Em Barriga da baleia:

Sari decidiu ir para a praia sozinha. Abriu a porta e fugiu.

Tradução de Ren Shasha na versão chinesa:

莎莉决定自己去海边。于是,她推开门跑了出去。

Neste caso, é acrescentado a locução chinesa 于是/yushi (por isso) para ligar duas

orações e tornar a frase mais coerente.

Caso 35:

Em Cem sementes que voaram:

A árvore já sabia: muitas vezes, para tudo correr bem, basta saber esperar.

Tradução de Fan Xiaoxing para chinês:

树妈妈最明白:万物万事终会顺遂,只需我们耐心地等待。

Adiciona-se o advérbio 耐心地/naixin de (pacientemente) na tradução chinesa para

enfatizar o ato de esperar.

Caso 36:

Em A maior flor do mundo:

Resolveu cortar a direito pelos campos, entre extensos olivais, ladeando misteriosas

sebes cobertas de campainhas brancas, e outras vezes metendo por bosques de altos freixos

onde havia clareiras macias sem rasto de gente ou bicho.

Tradução de Zhang Xiaofei para chinês:

他决定径直穿过田野,那里生长着茂密的橄榄树,缀满白色牵牛花的神秘篱笆

蜿蜒其中。他经过一片高大的白蜡树丛,林中的空地铺满柔软的落叶/lin zhong

de kongdi pu man ruoruan de luoye,人迹罕至,野兽也未踏足。

A tradutora alarga o sintagma nominal clareiras macias para uma frase que combina

vários sintagmas “clareiras nos bosques cobertas de folhas caídas macias”, na sua tradução

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para chinês, transmitindo uma ideia mais concreta, tornando a interpretação do texto mais

fácil, pois a tradução literal 柔软的空地/rouruan de kongdi parece um enigma para os

chineses.

Em outros exemplos nota-se a utilização da omissão.

Caso 37:

Título original em português:

Barriga da Baleia

Tradução literal para chinês:

鲸鱼的肚子/jingyu de duzi

Na versão em chinês com a tradução de Ren Shasha:

鲸鱼/jingyu, ou seja, Baleia

A tradutora optou por eliminar ou omitir a palavra barriga, provavelmente querendo

tornar o título mais sucinto e breve.

Caso 38:

Em Quando for…grande:

Vou calçar as botas da minha irmã e levá-las para a escola.

Tradução de Wu Xun na versão chinesa:

我会穿上姐姐的靴子去上学。Vou calçar as botas da minha irmã para a escola.

Neste caso, é omitida a parte “levá-las” na versão chinesa, pois não é obrigatoriamente

necessária a sua presença em chinês, tornando a frase chinesa mais curta e mais acessível

para as crianças.

Caso 39:

Em A manta, uma história aos quadradinhos:

Serviu para forrar almofadas e cadeiras mas sempre me deu vontade de viajar (e nunca

de me sentar).

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Tradução de Zhang Xiaoge para chinês:

我还用那块布做了枕套和椅套。不知道为什么,一看到这块布,我就很想去旅

行。Não sei porquê, assim que olho para este pano, tenho muita vontade de ir viajar.

Por opção do tradutor, a frase entre parênteses foi omitida, talvez por entender que o

contraste apresentado no livro, “viajar” e “me sentar” não tem importância para o desenrolar

da história, a fim de simplificar o texto.

Também por opção do tradutor, foi acrescentada a parte sublinhada em chinês, para que

história fosse mais coerente, o que prova de novo a tarefa do tradutor de reescrever a história,

ao fazer a recontextualização.

O sujeito do verbo também mudou: em vez do pano que me deu a vontade de viajar, eu

é que tinha a vontade de viajar, assim que olhava para o pano. Cumpre-nos referir que na

produção oral das crianças, usa-se mais a voz ativa, ou o “eu” como sujeito, o que é também

referido no Caso 45.

2.2.6 Recontextualização através da repetição

Em chinês, costuma-se recorrer à redundância para dar ênfase e/ou manter a

musicalidade da língua chinesa, pelo que a repetição ou duplicação de palavras é muito usada

na elaboração de textos e também na tradução, para realizar a recontextualização.

Caso 40:

Em Ir e vir:

Há muito tempo, caminhávamos devagar; dias a fio, à procura de alimento ou de um

bom abrigo onde passar a noite.

Tradução de Yang Lei para chinês:

很久很久以前,我们走得很慢很慢。一天又一天,我们寻找食物,或者寻找一

个适合过夜的地方。

Nesta parte verificam-se três repetições: há muito tempo é traduzido para 很久很久以

前/ hen jiu hen jiu yiqian (literalmente muito tempo, muito tempo atrás); o advérbio devagar

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é traduzido para 很慢很慢/hen man hen man (literalmente muito devagar, muito devagar);

a locução dias a fio passa a ser 一天又一天/yi tian you yi tian (literalmente um dia mais um

dia ou dia após dia). Neste último caso, o tradutor bem podia traduzir “dias a fio” para 连续

几天/lianxu jitian (literalmente dias sucessivos), pois a locução preposicional a fio significa

sucessivo, continuo, sem interrupção, conforme o Dicionário Priberam. Mas o tradutor

preferia usar a repetição para dar a melodia ao texto em chinês.

A utilização de repetição torna a história mais atraente, mais bonita e mais adequada ao

público infantil, correspondendo ao seu processo cognitivo e estado psicológico, pois as

crianças, quando aprendem a falar, costumam repetir o que ouvem e aprendem. E quando os

pais falam com os seus filhos pequenos, também usam muito a repetição para passar

mensagens.

Caso 41:

Em O meu avô:

O tempo voa quando estou com o meu avô.

Tradução de Sun Lili para chinês:

只要跟爷爷在一起,时间就会过得很快,很快……

Neste caso, o verbo voar é traduzido para 过得很快, 很快/guo de hen kuai, hen kuai,

isto é, “passa muito muito rápido”, para enfatizar que o tempo voa muito rápido.

Em chinês existem várias expressões que significam que o tempo voa, mas o tradutor

optou simplesmente pela repetição ou duplicação, literalmente “muito rápido, muito rápido”,

para aproximar a história do estado psicológico das crianças.

Caso 42:

Em Coração de mãe:

O coração de mãe está ligado a cada coração de filho por um fio fininho, quase

invisível.

Tradução de Yang Lei para chinês:

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仿佛有那么一根很细很细,若有若无的丝线,把妈妈的心同孩子的心紧紧相连,

紧紧相连。

Para salientar o ritmo e a melodia das frases chinesas, é repetida duas vezes a expressão

estar ligado, 紧紧相连 /jinjin xiang lian (ligar estreitamente); o diminutivo fininho é

traduzido para 很细很细/hen xi hen xi (literalmente muito fino muito fino).

Caso 43:

Em Ir e vir:

Mas, como somos dados a grandes feitos, não demos um só salto, demos vários, sem

olhar para trás. (Ir e vir)

Tradução de Yang Lei para chinês:

然而,上天赐予了我们伟大的力量,让我们不仅跨越了一大步,而且一往无前

地跨越了许多步。

Em português, os quantificadores existenciais e os pronomes indefinidos podem

substituir as palavras anteriormente mencionadas. Na frase citada acima, o quantificador

vários representa vários saltos, pelo que o substantivo salto é omitido. No entanto, um

qualificador chinês não tem essa função, pelo que na tradução de português para chinês, a

parte omitida em português deve ser mencionada, ou repetida. Neste caso concreto, o

tradutor traduziu o “salto” para “um grande passo” e repetiu na frase posterior: 许多步

/xuduo bu (muitos passos), conforme o hábito linguístico chinês.

2.2.7 Recontextualização através da transposição e/ou modulação

A transposição e a modulação foram conceitos propostos por Vinay e Darbelnet,

explicados por Molina e Albir (2002, p. 499) nas seguintes palavras: “Transposition. A shift

of word class, i.e., verb for noun, noun for preposition…”, “Modulation. A shift in point of

view. Whereas transposition is a shift between grammatical categories, modulation is a shift

in cognitive categories.”

Como os livros infantis ilustrados são destinados ao público infantil, esses dois

procedimentos tornam as frases traduzidas mais atraentes e acessíveis para as crianças,

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levando em consideração os valores culturais e os hábitos linguísticos do público infantil

chinês.

Caso 44:

Em A manta, uma história aos quadradinhos:

- Olha, por acaso, o avental que trazia no dia em que o carteiro lhe entregou a primeira

carta do tio Luís, a dizer que estava bem.

Tradução de Zhang Xiaoge para chinês:

“收到/shoudao (receber)你舅公第一封平安信的那一天,她就是穿着这条围裙。”

No dia em que recebeu a primeira carta...

A expressão o carteiro lhe entregou é traduzida para o verbo 收到/shoudao (receber),

com a utilização de modulação, alterando o ponto de vista. O substantivo carteiro foi omitido,

pois a sua ausência não prejudica em nada o conteúdo da história.

Caso 45:

Em A manta, uma história aos quadradinhos:

Nos meses em que cá está, vem cobrir a minha cama, e é como se voltasse a estar

com a minha avó e com todas as suas histórias.

Tradução de Zhang Xiaoge para chinês:

轮到我们家的时候,我盖着这条被子睡觉,就像外婆还陪在我身边,给我讲她

的那些故事。

A frase “(a manta) vem cobrir a minha cama” passa a ser em chinês “durmo com a

manta a cobrir-me”; em “com todas as suas histórias”, a preposição com é substituída pelo

verbo 讲/jiang (contar), “que me conta aquelas histórias suas”. Em ambos os casos, nota-se

a presença de modulação e transposição.

Cumpre-nos voltar a referir que na produção oral das crianças, usa-se mais a voz ativa,

ou o “eu” como sujeito, tal como foi fundamentado no Caso 39.

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Caso 46:

Em Cem sementes que voaram:

Das 60 semente que sobraram, 25 foram bicadas por pássaros. Para sermos exatos: 4

foram levadas por um gaio, 6 foram comidas por um trinca-pinhões e 15

desapareceram no papo de um melro guloso...

Tradução de Fan Xiaoxing para chinês:

小种子,他们去了哪里?25 个被鸟儿叼去了。更准确地说,松鸦叼走了 4 颗,

小山雀叼走了 6 颗,最后的 15 颗被贪嘴的乌鸦叼走了。

Nota-se que neste caso, em português usa-se sempre a voz passiva, enquanto na versão

chinesa, o tradutor mistura a voz ativa com a voz passiva, passando duas frases em português

para a voz ativa, “um gaio levou 4”, “um trinca-pinhões levou 6”, por respeito ao hábito da

produção oral das crianças que enfatizamos em alguns casos anteriores.

Caso 47:

Em Tão, tão grande:

…na companhia do seu pato de borracha e de um pássaro de verdade.

Tradução de Zhang Xiaofei para chinês:

……带上他的橡皮小黄鸭,还有一只活的小鸟。

Um sintagma preposicional, na companhia, muda para o verbo 带上/dai shang (levar)

e o outro, de verdade, passa a ser o adjetivo 活的/huo de (vivo), recorrendo ao uso de

modulação e transposição.

Caso 48:

Em ir e vir:

Todos os anos, esta pequena ave atravessa o globo à procura de terras mais amenas.

Tradução de Yang Lei para chinês:

每一年,这种小鸟都会远渡重洋,寻找更温暖的地方。

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O sintagma preposicional à procura de muda para o verbo 寻找/xunzhao (procurar),

recorrendo-se à transposição.

Caso 49:

Em Quando eu for…grande:

Vou ser do tamanho do meu pai.

Tradução de Wu Xun para chinês:

我会长得和我父亲一样高大。Vou ser tão alto e grande como o meu pai.

Recorre-se à modulação e à transposição, pois o substantivo tamanho é substituído pelo

adjetivo 高大 /gao da (alto e grande) sendo introduzido também na frase chinesa uma

comparação de igualdade. A ilustração também facilita a sua compreensão por parte dos

leitores infantis chineses.

Figura 12- Ilustração de Quando eu for…grande na edição chinesa

Caso 50:

Em Quando eu for…grande:

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Vou descobrir onde vivem os palhaços.

Tradução de Wu Xun para chinês:

我会找到小丑居住的地方。Vou descobrir onde vivem os palhaços.

O advérbio relativo onde muda para o substantivo 地方/difang (lugar) desdobrando-se

para “o lugar em que”, com o uso da modulação e da transposição.

Caso 51:

Em A casa que voou:

O dono estava perplexo. Jamais lhe tinha passado pela cabeça que uma coisa destas

pudesse acontecer. Estava convencido de que as casas estavam fixas ao seu lugar.

Tradução de Chen Feijiu para chinês:

房子的主人惊呆了,他无法想象发生了这种事,还一直以为房子是牢牢钉在地

上的。

A expressão passar pela cabeça é traduzido para 想象/xiangxiang (imaginar) que

transmite melhor o seu significado em chinês, recorrendo-se ao uso de modulação.

Caso 52:

Em Cem sementes que voaram:

Cresceram tanto que, a certa altura, o sol, a terra e a água já não bastavam para as 3.

Tradução de Fan Xiaoxing para chinês:

他们长得又高又壮,可是有一天,太阳、泥土和水不够三个兄弟分享了。

A expressão crescer tanto muda para os adjetivos 又高又壮/you gao you zhuang (alto

e forte); a expressão a certa altura é traduzida para 有一天/you yi tian (num dia). Nota-se a

modulação em ambos os casos.

2.2.8 Recontextualização através de combinação de textos e ilustrações

Entendemos que os livros infantis ilustrados recorrem à relação mútua entre a língua e

a ilustração para contar histórias, funcionando muitas vezes o texto como legenda dos

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desenhos. Por isso, a tradução do texto ou legenda deve combinar com o respetivo desenho,

a fim de interpretar integralmente o conteúdo transmitido pelos dois, texto e desenho.

Caso 53:

Em Barriga de baleia:

Levantou-se um temporal e o pequeno barco partiu-se num turbilhão.

Tradução de Ren Shasha na versão chinesa:

突然,海上袭来一阵暴风雨。小船翻了,慢慢沉入大海。De repente, levantou-se

no mar um temporal. O pequeno barco virou-se, imergindo devagar no mar.

O tradutor muda “o pequeno barco partiu-se num turbilhão” para “O pequeno barco

virou-se, imergindo devagar no mar”, pois a ilustração apresenta a cena em que a menina

Sari, o menino Azur e o barco virado estão a imergir no mar. A tradução em chinês ajuda os

leitores infantis a perceber integralmente o conteúdo através do texto e da ilustração, além

de explicar a razão pela qual a Sari cai na barriga da baleia, na página seguinte.

Figura 13- Ilustração de Barriga de baleia na edição chinesa 1

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Figura 14- Ilustração de Barriga de baleia na edição chinesa 2

Caso 54:

Em Coração de mãe:

E lá dentro abre-se uma janela, sempre que um filho aprende uma palavra nova.

Tradução de Yang Lei na versão chinesa:

每当孩子学会了一个新词,妈妈的心就像一栋大楼又打开了一扇窗子。Sempre

que um filho aprende uma palavra nova, o coração da mãe, tal como um grande prédio,

abre mais uma janela.

No texto original não há as palavras 一栋大楼/yi dong da lou (um grande prédio), mas

para combinar a ilustração com o texto, o tradutor adicionou esse elemento, para as crianças

entenderem melhor o conteúdo olhando para a ilustração.

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Figura 15- Ilustração de Coração de mãe na edição chinesa

Caso 55:

Em A maior flor do mundo:

Andou, andou, foram rareando as árvores, e agora havia uma charneca rasa de mato

ralo e seco, e no meio dela uma inóspita colina redonda como uma tigela voltada.

Tradução de Zhang Xiaofei na versão chinesa:

他走啊,走啊,树木逐渐稀疏,出现了一片平坦的沼泽,兼有几个干枯的灌木,

沼泽正中只见一座荒凉的小丘,似一只碗倒扣于地面。

Neste parágrafo, “como uma tigela voltada” é literalmente em chinês 似一只倒扣的

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碗 / si yi zhi daokou de wan, mas para explicar melhor a forma da colina no texto, a tradutora

adiciona o elemento “no chão”, ficando 似一只碗倒扣于地面/si yi zhi wan dao kou yu

dimian (como uma tigela voltada no chão), combinando a ilustração e o texto para os leitores

infantis compreenderem diretamente a ideia.

Figura 16- Ilustração de A maior flor do mundo na edição chinesa

Caso 56:

Em O pai mais horrível do mundo:

Mete-me na cama quando não tenho sono. Não me deixa dormir.

Tradução de An Guo na versão chinesa:

当我不想睡觉的时候,他把我放回床上。他又不让我睡了。

Olhando apenas para essas duas frases em português, reparamos que são frases

independentes, sem nenhuma conjunção entre elas. Mas quando olhamos para as ilustrações,

constatamos que cada uma das frases acompanha uma ilustração e a segunda ilustração é a

continuação da primeira, estabelecendo uma conexão entre as duas, pelo que o tradutor

adiciona o advérbio 又/you (mas) para salientar a comparação e o amor do pai nas duas

situações diferentes.

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Figura 17- Ilustração de O pai mais horrível do mundo na edição chinesa 1

Figura 18- Ilustração de O pai mais horrível do mundo na edição chinesa 2

2.2.9 Recontextualização através da simplificação

Como foi referido logo no início deste capítulo, as histórias para crianças devem ser

contadas com palavras muito simples, pelo que a simplificação constitui um procedimento

importante na tradução de literatura infantil.

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Como foi referido também na secção anterior, as histórias contadas pelos álbuns infantis

devem ser entendidas através do texto e do desenho. Deparamo-nos até com livros que têm

apenas pinturas, sem legendas. Tudo isso explica a importância dos desenhos na narração de

histórias. Nesse sentido, achamos que o texto que acompanha os desenhos deve ser figurativo

e sucinto, funcionando como o material auxiliar para ajudar o público infantil a compreender

as ilustrações.

Seguem alguns exemplos de livros infantis ilustrados com poucas palavras, até sem

palavras.

No livro Hoje sinto-me… (今天我感觉/jintian wo ganjue em chinês), cada página só

tem uma letra e uma palavra iniciada por essa letra, e a ilustração é principal.

Figura 19- Ilustração de Hoje sinto-me… na edição chinesa 1

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Figura 20- Ilustração de Hoje sinto-me… na edição chinesa 2

Um outro livro, Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? (萤火虫寻光记

/yinghuochong xun guang ji em chinês), só tem ilustrações coloridas e engraçadas.

Figura 21- Ilustração de Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? na edição chinesa 1

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Figura 22- Ilustração de Olhe, por favor, não viu uma luzinha a piscar? na edição chinesa 2

No entanto, descobrimos que bastantes frases das obras infantis portuguesas são longas,

por causa das próprias características da língua portuguesa, que costuma exprimir ideias

através de orações subordinadas, o que é muito diferente da língua chinesa, que usa estruturas

frásicas mais simples. Por isso, achamos que os tradutores devem simplificar as frases longas

portuguesas usando mais estruturas curtas para os leitores infantis chineses.

No Caso 1 e Caso 3, podemos constatar como os títulos longos em português foram

simplificados na língua chinesa:

Em português: Versos para os pais lerem aos filhos em Noites de Luar

Em chinês: 月亮给你写了一首诗 / A Lua escreveu-te um poema

Em português: A manta, uma história aos quadradinhos

Em chinês: 拼布被 / A manta de retalhos (versão de Huang Youqing)

外婆的宝被 / A manta-tesouro da avó (versão de Zhang Xiaoge)

Nos outros exemplos, Casos 19, 38 e 39, também podemos constatar a simplificação

das frases, através da omissão.

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Pedimos para voltar a analisar o Caso 13, para ver como uma frase longa em português

é cortada em frases curtas.

Caso 13:

Em O meu avô:

“Guten tag. Herr Vinho!” Graceja o meu avô em alemão. Trocam dois dedos de

conversa num aperto de mão e o Dr. Sebastião despede-se, sorrindo

apressadamente.

Na versão em chinês com a tradução de Sun Lili:

“Guten tag! 你好啊,我亲爱的邻居!”爷爷开玩笑地用德语和他打招呼。他们

总是握握手,说两句话,郑在忙先生就微笑着向爷爷说“再见”了。

Pedimos para comparar as duas partes sublinhadas, em português e em chinês.

Podemos verificar que uma frase longa em português foi desdobrada em três frases curtas

em chinês com os respetivos atos/verbos/predicados: 1. apertar a mão (antes da 1ª vírgula);

2. trocar algumas palavras (antes da 2ª vírgula); 3. despedir-se sorrindo (antes do ponto final).

Mas, dum modo geral, este procedimento nem sempre é utilizado. Alguns tradutores

tentam manter a estrutura portuguesa em chinês, ou até complicam a tradução.

Caso 57:

Em A casa que voou:

Foi exatamente ali, no sítio onde antes ficava o jardim da casa dos tios, que a casa

pousou.

Tradução de Chen Feijiu na versão chinesa:

房子终于停了下来,它停在了舅舅房子原来待的地方。

Neste caso, em relação à parte com letras em negrito, o tradutor fez uma tradução literal

mantendo todos os elementos (exceto a palavra “jardim”), até acrescentando o sujeito desta

segunda parte da oração, que é desnecessário, pois em chinês, quando as orações

coordenadas têm o mesmo sujeito, não é preciso repetir sempre o sujeito. Além disso, a

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forma verbal “fica” também não precisa de ser traduzida, neste caso, para chinês, conforme

os hábitos linguísticos chineses.

Indevidamente foi omitida a palavra “jardim”, o que, porém, não contribui nada para

simplificar a frase.

Sugerimos que a segunda parte seja traduzida para 停在了舅舅家原来的花园里/ting

zai le jiujiu jia yuanlai de huayuan li, isto é, no antigo jardim da casa dos tios, frase essa,

simplificada, que é muito mais acessível para as crianças, respeitando também os hábitos

linguísticos chineses.

Caso 58:

Em A casa que voou:

No ar pairava o perfume das figueiras e o cheiro a lenha queimada.

Tradução de Chen Feijiu para chinês:

空气里弥漫着燃烧的木头的气味和水果的甜香。

Nesta tradução, uma partícula auxiliar 的/de (a parte sublinhada) é supérflua. Também

não se sebe por que “o perfume das figueiras” e “o cheiro a lenha queimada” foram trocados.

Sugerimos a tradução para:

空气里弥漫着无花果香和木头焦味。

2.2.10 Recontextualização através de musicalização

O texto dos livros ilustrados infantis serve não só para ler com os olhos, como também

para ler em voz alta e ouvir, motivo pelo qual, os tradutores empregam frequentemente na

versão chinesa partículas modais, palavras reiterativas (叠音词 /dieyinci em chinês) e

palavras onomatopaicas (拟声词/nishengci em chinês) para terem palavras ou frases que

rimam, respeitando os hábitos linguísticos chineses.

Caso 59:

Título original em português:

Ir e vir

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Tradução literal para chinês:

去和来/qu he lai

Tradução para chinês na versão de Yang Lei:

来来往往/lailaiwangwang

O livro Ir e vir debruça-se sobre o desenvolvimento dos meios de transporte dos

humanos, descrevendo que as pessoas vão e vêm a pé, de cavalo, de carro, de comboio, de

avião até de foguete.

Em vez da tradução literal, o tradutor escolheu uma expressão chinesa 来来往往

/lailaiwangwang, que significa principalmente muita gente a ir e vir ou ir e vir muitas vezes.

A expressão chinesa, além de ajudar as crianças chinesas a imaginar cenas com o movimento

intenso de pessoas e veículos, reflete a musicalidade da língua chinesa, representada nesse

caso com a expressão de estrutura AABB.

São muitos os exemplos semelhantes.

Caso 60:

Em Coração de mãe:

Mas quando um filho precisa de ajuda, é um sino que toca sem parar.

Tradução de Yang Lei na versão chinesa

可是当孩子需要帮助,妈妈的心就像闹钟一样丁零丁零响个不停。

Neste caso, a segunda frase em chinês significa que “o coração da mãe é um despertador

que toca com trim sem parar”. O tradutor inseriu uma palavra onomatopaica 丁零丁零/ding

ling ding ling, trim em português, imitando o som do despertador para ressaltar a

musicalidade da língua chinesa e tornar o texto mais bonito e elegante. A palavra sino foi

trocado por despertador, pois para as crianças chinesas, um despertador é muito mais

conhecido e acessível do que um sino. Nessa parte de tradução, são usadas duplamente a

modulação e a adição.

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Caso 61:

Em Cem sementes que voaram:

E a velocidade de uma estrada não é exatamente a mesma de uma pequena semente...

Tradução de Fan Xiaoxing na versão chinesa:

飞驰的车辆,来来往往,Os carros correm, vão e vêm,

小小的种子,躺在路中央。A semente pequena, no meio da estrada.

Foi feita uma recontextualização ou reescrita total, transformando uma frase em

português em duas linhas com quatro versos em chinês, onde os caracteres 辆/liang, 往

/Wang e 央/yang rimam, por terem todos ang como a parte final da sílaba, enfatizando a

melodia da língua chinesa. Para além disso, usa-se a expressão 来来往往/lailaiwangwang,

anteriormente mencionada, para o mesmo efeito da musicalidade da língua chinesa.

2.2.11 Propostas de tradução

Durante o nosso processo de análise de traduções, detetamos algumas falhas de

tradução ou algumas partes que podem ser traduzidas com outros procedimentos. Sendo

simplesmente uma aluna, sem experiências de tradução literária, ganho a coragem para

apresentar algumas propostas, além das já apresentadas ao longo desta dissertação.

Caso 62:

Em Para onde vamos quando desaparecemos:

O sol,

As nuvens,

as folhas,

e até as férias

estão sempre

a começar e a acabar,

a aparecer e a desaparecer.

Na versão em chinês com a tradução de Yuan Shenyi:

阳光、云朵、树叶,

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甚至生日……

它们也都有始有终,

出现又再不见。

Nesta tradução, o substantivo férias é substituído por 生日 /shengri (aniversário),

recontextualização essa que, na nossa modesta opinião, é desnecessária e inadequada.

Julgamos que o tradutor cometeu um erro a nível semântico. Convém manter o sentido da

palavra original 假期/jiaqi (férias).

Caso 63:

Em A casa que voou:

Depois, pouco a pouco, começou a ir mais depressa.

Na tradução de Chen Feijiu para chinês:

它越飞越远。Ele voou cada vez mais longe.

O autor optou por usar neste caso a estrutura chinesa 越……越……/yue…yue… (cada

vez mais), o que é aceitável como uma concretização através da modulação. Mas a nível

semântico, não se pode trocar “depressa” por “longe”, nem esquecer as palavras anteriores

(ver a parte sublinhada).

Propomos a seguinte tradução:

接着,慢慢地,它越飞越快。

Trata-se de uma tradução quase literal, mas omitem-se as palavras “começou a”, pois é

desnecessário neste caso: com ou sem o verbo começar, os chineses entendem a mesma ideia.

Caso 64:

Em Quando eu for…grande:

Vou conseguir ser invisível quando quiser.

Tradução de Wu Xun na versão chinesa:

我会对我不想看到的东西熟视无睹。Vou fechar olhos para as coisas que não quero

ver.

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Esta frase está triplamente mal traduzida. Primeiro, a nível semântico, “ser invisível”

não tem nada a ver com a expressão idiomática chinesa熟视无睹/shushi-wudu, que significa

“fechar os olhos” ou “fazer vista grossa”, no sentido de ignorar. Segundo, em relação à

ilustração, podemos ver um menino escondido atrás da cortina para que outras pessoas não

o vejam. Terceiro, no mundo real, as crianças não sabem “fazer vista grossa”, mas quase

todas têm o sonho de ser invisível.

Por isso, sugerimos a tradução 只要我想,我就能隐身/zhiyao wo xiang, wo jiu neng

yinshen, isto é, Quando quiser, conseguirei ser invisível.

Figura 23- Ilustração de Quando eu for…grande na edição portuguesa

Caso 65:

Em Quando eu for…grande:

Quando eu for grande…não quero esquecer-me que fui criança.

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Tradução de Wu Xun para chinês:

当我长大了……我不想忘记我还是一个孩子。

Neste caso, o tradutor ignorou o tempo pretérito perfeito que a forma verbal fui indica.

A frase “não quero esquecer-me que fui criança” foi traduzido para “não quero esquecer-me

que sou ainda uma criança”, com uma interpretação totalmente errada a nível semântico, em

relação ao texto original. Por isso, sugerimos a seguinte tradução:

我不想忘记我曾是一个孩子/wo bu xiang wangji wo ceng shi yi ge haizi

Adicionamos o advérbio 曾/ceng (antes, antigamente) para transmitir o significado do

texto original.

Caso 66:

Em Uma história de dedos:

Enquanto os irmãos refilavam, começou a puxá-lo para o parque infantil.

Tradução de He Jie para chinês:

手指兄弟们重新聚在一起/reuniram-se de novo,小宝贝拉上他们,一起去了游

乐园。

O verbo refilar é polissémico, podendo significar “reclamar”, “opor-se tenazmente”,

etc. O tradutor não escolheu o significado adequado traduzindo-o para “reunir-se de novo”,

o que não transmite, obviamente, o significado do texto original. Segundo a história, os

outros dedos estavam a brigar e o dedo mínimo puxou-os para ir visitar o parque infantil.

Por isso, sugerimos a seguinte tradução:

当其他手指正吵个不停时,小宝贝拽着他们,一起去了游乐园/dang qita shouzhi

zheng chao ge bu ting shi, xiao baobei zhuai zhe tamen, yiqi qu le youleyuan, 吵个不停

/chao ge bu ting significa brigar sem parar e o verbo 拽 /zhuai implica puxar alguém

obrigando-o a fazer algo.

Caso 67:

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Em Tão, tão grande:

Samuel foi ficando cada vez mais nervoso e, para piorar as coisas, começou a sentir

uma fome de leão. (Tão, tão grande)

Na versão em chinês com a tradução de Zhang Xiaofei:

萨姆尔越来越不安了。而且更糟糕的是,他忽然有了一种从未有过的饥饿感。

A expressão idiomática portuguesa sentir uma fome de leão serve para descrever uma

pessoa faminta, que está com muita fome ou a morrer de fome. Mas esse valor metafórico

não existe na língua chinesa, pelo que a tradutora abandonou a tradução literal da metáfora

感到一阵狮子的饥饿/gandao yizhen shizi (leão) de ji’e escrevendo diretamente em chinês

从未有过的饥饿感/ congwei you guo de ji’e gan (uma fome que nunca teve antes) para

mostrar muita fome, ao serviço dos leitores infantis. A tradutora tem a sua razão em substituir

a metáfora por outras palavras mais simples e diretas, mas por nós, em vez deste

procedimento, sugeríamos uma expressão idiomática chinesa, que exprime a mesma ideia,

饿得能吃下一头牛/e de neng chi xia yi tou niu, isto é, estar com tanta fome que consegue

comer um boi inteiro. Com a nossa proposta é feita uma recontextualização ou uma

adaptação cultural, com a presença de domesticação.

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Conclusão

A tradução de português para chinês, dos livros infantis ilustrados, tal como foi referido

anteriormente, tornou-se indispensável e procurada na China, devido à entrada em força das

obras portuguesas no mercado chinês.

No entanto, devido às inúmeras diferenças entre as duas línguas e as duas culturas, para

além das dificuldades em encontrar uma maneira adequada de narrar histórias às crianças, a

tradução nesta área revela certas dificuldades precisando de ser melhorada, pelo que o

presente trabalho analisa os procedimentos principais de tradução utilizados na versão

chinesa dos álbuns portugueses lançados no mercado chinês, à luz de diversas teorias

tradutológicas e tradutórias.

Entendemos que a recontextualização é a parte mais importante na tradução e pode ser

concretizada através de vários procedimentos. Com a análise das 34 versões de 32 livros

lançados no mercado chinês, concluímos que os principais procedimentos utilizados nesta

área são 8, a saber: adição, omissão, repetição, modulação, transposição, combinação (de

textos e ilustrações), simplificação e musicalização.

Conforme a nossa análise, os procedimentos mais frequentes são adição, omissão,

modulação e transposição, empregues na versão chinesa de quase todos os livros ilustrados

portugueses. Naturalmente, esta afirmação nossa não exclui outros procedimentos, que

também desempenham um papel de grande importância na área em questão.

Dum modo geral, a tradução da maioria dos álbuns infantis portugueses transmite bem

o significado do texto original e do autor aos leitores chineses, recorrendo aos procedimentos

analisados nesse trabalho e levando em consideração as quatro perspetivas anteriormente

referidas, em 3.2, que são a perspetiva funcional, perspetiva sociocultural, perspetiva

linguístico e perspetiva de recontextualização e reescrita.

No entanto, reparamos também que existem problemas na tradução de alguns casos,

tais como interpretar mal o texto original a nível semântico, traduzir palavra por palavra,

sem pensar no contexto, ou adicionar ou omitir palavras à vontade, sem respeitar a ideia do

autor original, etc. Realmente, “... se os valores da língua de partida não são passados para a

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língua de chegada, não se pode dizer que seja uma tradução”, conforme Wang e Lu (2020,

p. 178).

A tradução dos livros infantis ilustrados parece uma atividade muito simples, mas na

realidade é bastante complicada. As crianças constituem um público específico, muito

diferente do público adulto, em termos de processo cognitivo, perceção linguística e

apreciação estética, entre outros, pelo que os tradutores devem levar em consideração esses

aspetos no processo de tradução e, recorrendo a diversos procedimentos de tradução,

organizar a história em linguagem simples e apropriada, a fim de passar as mensagens dos

autores da língua-fonte aos leitores infantis da língua-alvo.

Sem dúvida, a tradução dos livros ilustrados infantis não se refere apenas aos

procedimentos de tradução, mas também aos aspetos culturais das duas línguas e das duas

comunidades. Quando fazemos a tradução, devemos conhecer bem a relação entre as

ilustrações e os textos, a psicologia e a necessidade dos leitores, a fim de encontrar um

caminho adequado para todos, tanto os autores como os leitores.

À medida que se intensifica e aprofunda o intercâmbio entre Portugal e a China, mais

obras portuguesas, incluindo as de literatura infantil, serão introduzidas na China, o que

exige uma tradução de boa qualidade. Atendendo a essa necessidade, a empresa China

International Publishing Group (CIPG) lançou em fevereiro de 2021 o exame de tradução

entre português e chinês, para habilitar os tradutores qualificados, o que revela a importância

da tradução entre essas línguas no mercado chinês, ao serviço de uma comunicação bem-

sucedida entre o mundo chinês e o mundo lusófono.

Nesse sentido, achamos importante analisar os procedimentos de tradução utilizados na

prática da tradução para chinês de álbuns infantis portugueses e desejamos que este trabalho

possa dar uma pequena contribuição para melhorar a qualidade da tradução para chinês dos

livros ilustrados infantis de Portugal e dar também uma pequena ajuda aos aspirantes à

carreira de tradutor(a) nesta área.

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