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1 CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu - MESTRADO EM DIREITO JAMES BILL DANTAS PROTEÇÃO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO: APLICABILIDADE DA LEI 8.630/93 E DA CONVENÇÃO 137 DA OIT Curitiba 2012

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu - MESTRADO EM DIREITO

JAMES BILL DANTAS

PROTEÇÃO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO: APLICABIL IDADE

DA LEI 8.630/93 E DA CONVENÇÃO 137 DA OIT

Curitiba

2012

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu - MESTRADO EM DIREITO

JAMES BILL DANTAS

PROTEÇÃO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO: APLICABIL IDADE

DA LEI 8.630/93 E DA CONVENÇÃO 137 DA OIT

Curitiba

2012

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JAMES BILL DANTAS

PROTEÇÃO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO: APLICABIL IDADE

DA LEI 8.630/93 E DA CONVENÇÃO 137 DA OIT

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito Empresarial e Cidadania do Centro Universitário Curitiba, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito. Orientador: Professor Doutor Eduardo Milléo Baracat

Curitiba

2012

4

Orientador: _____________________________________

Professor Doutor Eduardo Milléo Baracat

_____________________________________

Professor Doutor Luiz Eduardo Gunther

_____________________________________

Professor Doutor Leonardo Vieira Wandelli

Curitiba, 30 de outubro 2012

5

SUMÁRIO

LISTA DE SIGLAS ................................................................................................. 8

RESUMO ................................................................................................................ 9

ABSTRACT .......................................................................................................... 10

INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11

CAPITULO I – A evolução do trabalho portuário brasi leiro, a partir da

representatividade sindical dos trabalhadores, sob enfoque do

neoliberalismo e da globalização ...................................................................... 15

1- HISTÓRIA DO TRABALHO PORTUÁRIO NO BRASIL .................................. 15

1.1 – Origem do trabalho portuário no sistema closed shop system ................... 15

1.2 – o problema da representatividade sindical dos trabalhadores ..................... 22

1.3 – A distorção do monopólio do trabalho portuário pelo sindicato profissional

............................................................................................................................... 28

2 – EVOLUÇÃO DO TRABALHO PORTUÁRIO BRASILEIRO, A PARTIR DA

IMPLEMENTAÇÃO DOS NOVOS MÉTODOS PRODUTIVOS, SOB ENFOQUE DA

GLOBALIZAÇÃO E NEOLIBERALISMO .............................................................. 34

2.1- Aspectos da globalização econômica ............................................................ 34

2.2 – Influxos do neoliberalismo na atividade econômica ..................................... 36

2.3 – A experiência neoliberal na América Latina ................................................. 39

2.4- Reestruturação produtiva .............................................................................. 43

3 – REFLEXOS NO MODELO SINDICAL BRASILEIRO E NA ORGANIZAÇÃO

PORTUÁRIA ......................................................................................................... 46

3.1 – Crise do sindicalismo e reflexos no trabalho portuário brasileiro ................. 46

3.2 - A concertação dos sindicatos em face dos novos métodos produtivos

adotados ............................................................................................................... 48

3.3 - Reflexos da reestruturação produtiva no trabalho portuário brasileiro e o

Projeto de Lei 8/1991 ............................................................................................ 50

CAPÍTULO II - Contradições e convergências entre a Lei 8.630/93 e a

Convenção 137 da OIT e as repercussões na estrutura sindical brasileira

............................................................................................................................... 55

6

1 – A ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO PORTUÁRIO A PARTIR DA LEI

8.630/93 ................................................................................................................ 55

1.1 – Ingerência do Estado na Relação de Trabalho Portuário no Brasil ............. 56

1.1.1 – CAP – Descentralização da política portuária .......................................... 56

1.1.2 - Administração do porto organizado – Autoridade portuária, com

características de poder de polícia ....................................................................... 58

1.1.3 – Estado regulador no domínio portuário ..................................................... 61

1.1.4 – A Fiscalização do Trabalho Portuário pelo Estado ................................... 67

1.1.5 – Contribuição do Ministério Público do Trabalho na implantação da Lei dos

Portos .................................................................................................................... 68

1.2 – Empregadores do Trabalho Portuário – OGMO, Operador Portuário e

Terminal Portuário Privativo .................................................................................. 69

1.2.1 – A responsabilidade pela gestão do trabalho da mão de obra avulsa ....... 69

1.2.2 - Operador portuário – o tomador e empregador da mão de obra portuária

............................................................................................................................... 74

1.2.3 – Terminais Portuários Privativos ................................................................ 76

2 – SISTEMÁTICA DO TRABALHO PORTUÁRIO A PARTIR DA LEI 8.630/93, E A

ISONOMIA DO TRABALHADOR AVULSO COM O DETENTOR DE VÍNCULO

EMPREGATÍCIO PERMANENTE ........................................................................ 78

2.1 – A limitação de categorias profissionais do trabalho avulso e o critério da

multifuncionalidade ............................................................................................... 78

2.2 – A prevalência do vínculo empregatício permanente em detrimento do

trabalho avulso ...................................................................................................... 81

3 – ANÁLISE COMPARATIVA DA CONVENÇÃO 137 E A RECOMENDAÇÃO 145

DA OIT COM A LEI 8.630/93 ................................................................................ 85

3.1 – Convenção 137 e Recomendação 145 da OIT (garantia de renda, estímulos

de aposentadoria e requalificação profissional) .................................................... 85

3.2 – A compatibilidade da Convenção 137 e da Recomendação 145 da OIT com

as Leis 8.630/93 e 9719/98 ................................................................................... 91

3.3 – A isonomia de direitos entre o trabalhador portuário avulso e o trabalhador

detentor de vínculo empregatício permanente ..................................................... 95

3.3.1 – O Trabalhador Avulso tem direito ao gozo de férias? ............................... 97

7

3.3.2 – O trabalho avulso gera direito de recebimento de hora extraordinária ao

TPA? ................................................................................................................... 100

3.3.3 – A Lei 4.860/65 é aplicável ao TPA? ........................................................ 102

CAPÍTULO III – Reflexos da (inacabada) implantação da Lei dos portos e da

Convenção 137 da OIT no trabalho portuário brasilei ro ............................... 105

1 – A NEGOCIAÇÃO DIRETA COMO FORMA DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

............................................................................................................................. 105

1.1 – Estímulo a negociação coletiva como método de solução de conflitos ..... 105

1.2 – A (falta de) obrigatoriedade de submissão dos trabalhadores avulsos na

Comissão Paritária prevista na Lei dos Portos ................................................... 109

1.3 - A utilização da arbitragem como método de solução de conflitos na relação

de trabalho portuário ........................................................................................... 110

2 – FORMAS DE DEFESA DIANTE DO QUADRO ESTABELECIDO A PARTIR DA

LEI 8.630/93 ........................................................................................................ 114

2.1 – Mecanismos de defesa coletiva dos trabalhadores face as novas tecnologias

............................................................................................................................. 114

2.2 – Aposentaria Espontânea – A extinção da inscrição no cadastro e no registro

do TPA prevista na Lei dos Portos fere o direito ao trabalho? ........................... 119

2.3 – O Futuro do Trabalho Portuário ................................................................. 122

CONCLUSÃO ..................................................................................................... 125

REFERÊNCIAS .................................................................................................. 128

ANEXO A – Lei 8.630, de 25 de fevereiro de 1993 .......................................... 136

ANEXO B – Lei 9719, de 27 de novembro 1998 .............................................. 149

ANEXO C - Convenção 137 da OIT, de 24 de junho de 1 975 ........................ 152

ANEXO D – Recomendação 145 da OIT .......................................................... 155

ANEXO E – Laudo Arbitral estabelecido entre o sindi cato patronal dos

operadores portuários e os sindicatos de trabalhado res portuários de

Paranaguá/PR .................................................................................................... 160

ANEXO F – Decisão Tribunal Superior do Trabalho em Dissídio Coletivo de

Natureza Jurídica, que estabeleceu interpretação ao parágrafo único do

artigo 26 da Lei 8.630/93 ................................................................................... 169

8

LISTA DE SIGLAS

ANAEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica

ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações

ANTAQ – Agência Nacional de Transportes Aquaviários

BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

CAP – Conselho de Autoridade Portuária

CF – Constituição Federal

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

DPC – Diretoria de Postos e Costas

DTM – Delegacia de Trabalho Marítimo

EC – Emenda Constitucional

FENCCOVIB – Federação nacional dos conferentes e transportadores de carga e

descarga, vigias portuários, trabalhadores de bloco, arrumadores e amarradores

de navios nas atividades portuárias

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

FMI – Fundo Monetário Internacional

FNE – Federação Nacional dos Estivadores

FNP – Federação Nacional dos Portuários

GEMPO – Grupo Executivo de Modernização dos Portos

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

OGMO – Órgão Gestor de Mão de Obra

OIT – Organização Internacional do Trabalho

OJ – Orientação Jurisprudencial

PL – Projeto de Lei

SINDOP – Sindicato dos Operadores Portuários do Paraná

STF – Supremo Tribunal Federal

TPA – Trabalhador Portuário Avulso

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

TST – Tribunal Superior do Trabalho

9

RESUMO

A presente dissertação reflete sobre os influxos da mecanização, da

reestruturação produtiva e da globalização econômica no âmbito portuário

nacional, que tinha estrutura arcaica e mercado de trabalho fechado. A lei

8.630/93, denominada “Lei de Modernizações dos Portos”, criou novas

possibilidades e novos integrantes na relação de trabalho portuário, ao

desestatizar o setor e tirar dos sindicatos o monopólio da mão de obra do trabalho

avulso. A Convenção 137 da OIT, ratificada pelo Brasil, estabelece diretrizes para

que o trabalho portuário não sofra precarização em razão da inovação tecnológica

de cariz neoliberal. As entidades sindicais profissionais não mais detêm a força

necessária para a solução adequada dos conflitos coletivos de trabalho, fruto da

diminuição do papel do Estado, da prevalência da lei de mercado e da perda do

sentimento de classe em face da desespecialização das atividades laborais.

Mesmo assim, o conjunto legal vigente prioriza a negociação coletiva e a

arbitragem como método de solução dos conflitos entre capital e trabalho. Isto leva

os trabalhadores a procederem de maneira própria na defesa dos seus interesses.

As contradições e convergências destas normas a respeito da proteção do

trabalhador portuário avulso são analisadas, sobretudo diante da influência da

globalização econômica, além dos futuros desafios e das tendências diante do

quadro estabelecido.

Palavras Chave: trabalho portuário, Lei 8.630/93, C onvenção 137 da OIT,

globalização, reestruturação produtiva.

10

ABSTRACT

This essay reflects the influences on mechanization, productive restructuring and

economic globalization on the national port scope, which had archaic structure and

closed shop system. Law 8.630/93, also known as "Port Modernization Act", has

created new possibilities and new members in respect of port work, desocializing

the sector and getting the monopoly of job manpower off the trade union. The ILO

Convention 137, ratified by Brazil, establishes guidelines aiming that port work

does not suffer due to precarious technological innovation neoliberal oriented. The

professional unions have no longer the force required to hold the appropriate

solution of collective labor conflicts, resulting from the diminished government role,

the prevalence of market law and the loss characteristic of the professionin face of

labor activities unspecialized. Nevertheless, all laws prioritize collective bargaining

and arbitration as a method of conflict solution between capital and labor. This

leads workers to proceed so in defense of their own interests. The contradictions

and convergences of these standards regarding the protection of temporary port

workers are analyzed, mainly by of the influence of economic globalization, and the

trends on framework established.

Keywords: port work, Law 8.630/93, ILO Convention 1 37, globalization and

productive restructuring.

11

INTRODUÇÃO

A presidente Dilma Rousseff anunciou um pacote para “desatar o nó Brasil”:

a privatização de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias. Ela ouviu quem conhece

melhor os problemas, empresários e investidores.1

O “custo Brasil” é com frequência utilizado como fundamento de entrave ao

desenvolvimento econômico do país.

Os detentores do capital transnacional argumentam que a elevada carga

tributária incidente sobre a atividade produtiva, os enormes problemas de infra-

estrutura - sobretudo o elevado custo do transporte de mercadorias - seriam

algumas das dificuldades enfrentadas pela atividade econômica brasileira.

Dentre os fatores elencados pelos atores da globalização instalados no

Brasil, a rigidez das normas trabalhistas é um dos principais obstáculos ao

investimento global em território nacional.

Por outro lado, conforme a ideologia neoliberal, a retribuição pelo trabalho

prestado deve permanecer subordinada aos interesses da atividade produtiva, e

não às necessidades do trabalhador e de sua família. Para se manterem taxas

salariais em patamares baixos, favorecendo a atividade econômica, propugnam os

defensores da política neoliberal pela criação de exército de reserva de

trabalhadores, e a manutenção de uma taxa natural de desemprego de forma a

sempre garantir ao mercado mão de obra disponível e barata.

Imprescindível, ainda, para o sucesso da política neoliberal, que as

empresas possuam ampla liberdade de contratar e dispensar, sem qualquer

obstáculo. Nesse sentido, o reconhecimento jurídico de que a dispensa sem justa

causa do empregado é direito irrestrito do empregador brasileiro, atende a esta

exigência.

O Estado, por seu turno, dentro dessa mesma perspectiva, deve atuar no

sentido de reduzir o poder dos sindicatos e minimizar os gastos sociais, além de

1 Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/tag/custo-brasil/, de 17 de agosto de 2012. Acessado: 7/9/2012.

12

evitar as intervenções econômicas, de forma que o mercado possa se ajustar

naturalmente.

O trabalho portuário, diante deste contexto, possui enorme relevância no

debate que envolve eficiência e produtividade da atividade econômica, de um

lado, e a efetividade dos direitos dos trabalhadores, de outro. Com efeito, a

atividade portuária é essencial para a economia em geral, e o seu custo envolve

necessariamente os direitos dos trabalhadores portuários e a correspondente

organização do trabalho.

O sistema portuário nacional é composto por 37 portos públicos. Desse

total, 18 são delegados, concedidos ou tem sua operação autorizada à

administração por parte dos governos estaduais e municipais. Existem também 42

terminais de uso privativo e três complexos portuários que operam sob concessão

à iniciativa privada.

O Brasil em 1999, movimentou, segundo dados do anuário da ANTAQ,

296.585.181 de toneladas em carga. No ano de 2011 esta movimentação passou

a ser 886.055.279 de toneladas.2

Por sua vez, o quantitativo de trabalhadores portuários apurou 61.779

trabalhadores em Agosto de 19953, e a estimativa atual de trabalhadores avulsos

é inferior a 30.000.

A partir desse enfoque, torna-se importante a investigação acerca da

influência da globalização e neoliberalismo na reestruturação produtiva do trabalho

portuário brasileiro que culminou com a Lei nº 8.630/93.

O trabalhador portuário avulso, espécie de trabalhador pouco conhecida e

estudada pela doutrina, teve seus direitos equiparados àqueles detentores de

vinculação empregatícia, consoante CF. A Lei 8.630/93, denominada “Lei de

Modernizações dos Portos”, criou novas possibilidades e novos integrantes na

relação de trabalho portuário.

2 Fonte: http://www.antaq.gov.br/portal/Anuarios/Anuario2011/body/25.htm; acessado em 7/09/2012. 3 BRASIL, Decreto 1.596/95.

13

O aumento substancial e os novos métodos de movimentação de carga,

aliados ao processo de globalização e da desestatização do setor, levaram os

trabalhadores portuários avulsos a se adequarem a uma nova realidade.

A Convenção 137 da OIT, ratificada pelo Brasil após a “Lei de

modernização”, estabelece diretrizes para que o trabalho portuário não sofra

precarização em vista da globalização, da inovação tecnológica e da

reestruturação produtiva de cariz neoliberal.

No âmbito portuário das relações de trabalho, a Convenção 137 da OIT

estabeleceu em seus dispositivos, rumo protetivo aos trabalhadores frente aos

novos métodos de manipulação de cargas nos portos, sobretudo na observância

de indenizações ao excesso de contingente de trabalhadores, estímulos à

aposentadoria antecipada e renda mínima.

Em contrapartida, estabeleceu diretrizes típicas da reestruturação produtiva

advinda do toyotismo, caracterizada pela desespecialização, flexibilidade e

polivalência do trabalho.

A Lei 8.630/93, originária do PL 8/91, tinha em sua concepção inicial,

características exclusivamente neoliberais, ao estabelecer a livre iniciativa dos

agentes na contratação de mão de obra, a desestatização das instalações

portuárias e a descentralização da exploração portuária. A redação final do projeto

fez surgir novos agentes, como o OGMO, o CAP e a Administração do Porto

Organizado, que criaram caminhos regulatórios para o exercício da livre iniciativa

pela atividade empresarial no setor portuário.

As contradições e convergências destas normas serão analisadas, sobretudo

diante da influência da globalização econômica. A partir desta perspectiva, a

problemática da pesquisa é posta nos seguintes temas: Em que medida a Lei

8.630/1993 é conflitante com a Convenção 137 da OIT e quais os seus efeitos no

tocante à proteção do trabalhador portuário avulso, sobretudo diante da

globalização da economia?

Não irá ser tratada, portanto, a influência da Lei dos Portos no trabalho em

atividades que não abranjam o trabalho portuário propriamente dito,

especialmente o trabalho portuário avulso.

14

Para responder ao problema apresentado, o trabalho está estruturado em 3

capítulos.

No primeiro capítulo, objetivar-se-á, pesquisar a origem do trabalho

portuário, do sindicato, os problemas da representatividade sindical e as

consequências da atividade realizada no sistema closed shop system. Serão

abordados neste capítulo os reflexos do neoliberalismo e globalização no modelo

sindical brasileiro e na organização portuária, que fez culminar no PL 8/91, que

originou a Lei dos Portos.

No segundo capítulo, a investigação será direcionada aos efeitos da

estruturação do trabalho portuário a partir da lei de 8.630/93, abordando os

protagonistas da nova sistemática portuária de característica neoliberal, com

análise comparativa da Convenção 137 e a Recomendação 145 da OIT.

O estudo pretende analisar no terceiro capítulo os futuros desafios e as

tendências do trabalho portuário no cenário nacional, com observância das

experiências e normas existentes no Brasil.

Diante das premissas orientadoras para este trabalho, o método proposto

de abordagem será o dedutivo, na medida em que os panoramas, estabelecidos

anteriormente à Lei dos Portos, trouxeram desafios para a implantação da nova

sistemática portuária, e refletem no futuro da atividade do trabalhador portuário

avulso.

Como marco teórico do trabalho, será utilizado Boa Ventura Santos, em sua

obra “A Globalização e as ciências sociais”, com abordagem na globalização e os

seus efeitos no mundo do trabalho e, Giovanni Alves, na sua obra “O novo (e

precário) mundo do trabalho – Reestruturação produtiva e crise do sindicalismo”,

que explicita a reestruturação produtiva e a crise do sindicalismo.

Dentro da área de concentração (Direito Empresarial e Cidadania) e da

linha de pesquisa adotada (Obrigações e Contratos Empresariais:

Responsabilidade Social e Efetividade), emerge a necessidade de análise dos

reflexos do neoliberalismo e da globalização na organização do trabalho portuário,

sobretudo por meio das Leis 8.630/93, que têm aparentes contradições e

influências com a Convenção 137 da OIT.

15

CAPITULO I – A evolução do trabalho portuário brasi leiro,

a partir da representatividade sindical dos trabalh adores,

sob enfoque do neoliberalismo e da globalização

1- HISTÓRIA DO TRABALHO PORTUÁRIO BRASILEIRO

1.1 – Origem do trabalho portuário no sistema closed shop

system

A atividade laboral portuária, do modo como se conhece, de mercado

fechado, de estrutura sindical combativa e de ser taxada como antagonista dos

baixos custos, da eficiência e da modernidade, começou a ser formada no começo

do século passado.

Esta forma característica de trabalho foi resultado da ação coletiva dos

trabalhadores no processo de mudança decorrente dos novos métodos de

organização da produção, advindos da Revolução Industrial.

A luta pelo mercado fechado dos trabalhadores, ou o chamado closed shop,

teve preponderância inicial àqueles trabalhadores oriundos da construção civil,

que dada à especificidade dos seus ofícios e a sua organização coletiva, tinha

condições favoráveis de negociações com os empregadores quanto a condições

de remuneração e de trabalho.

Os operários da construção civil, durante as duas primeiras décadas do

século XX, ocupavam o centro do processo de organização dos trabalhadores

(pedreiros, canteiros, pintores, frentistas, estucadores, marmoristas, ladrilheiros,

16

carpinteiros). Tais operários em razão da complexidade dos seus ofícios se

autodenominavam “artistas”4.

A qualificação profissional dos trabalhadores e a estrutura da construção

civil no começo do século XX, oportunizavam aos operários da construção civil

enorme capacidade de negociação, com recorrentes tentativas para imposição do

“closed shop”, com o controle do fornecimento da mão de obra pelo próprio

sindicato.

A implementação da instituição do mercado fechado de trabalho se fazia

necessária aos “artistas”, em face da intensificação e simplificação dos métodos

de construção, e do aumento do número de trabalhadores de reserva, com a

tendência natural de redução de salários5.

As duas grandes guerras reduziram significativamente o volume de

construções e o avanço da construção civil para fins lucrativos e especulativos,

sob o controle de grandes empreiteiros, e com o respaldo do poder público,

minavam constantemente a manutenção do controle da mão de obra pelo

sindicato operário da construção civil6.

Os grandes construtores, com o objetivo de combater o sistema de

mercado fechado de trabalho, também apoiaram o desenvolvimento da

regulamentação da profissão de engenheiro e construtor, para que pudessem

assumir o controle e o ritmo de construção das obras, especialmente àquelas

encomendadas pelos entes públicos7.

A política da classe empresarial de estabelecer oposição ao “closed shop”,

consistia em subtrair do processo e do mercado de trabalho, o controle exercido

pelos sindicatos de operários sindicalizados, por meio da simplificação das tarefas

e da desqualificação da mão de obra em todo o processo de trabalho, permitindo a

fácil e rápida substituição dos trabalhadores construtores especializados e

4 SILVA, Fernando Teixeira da. Operários sem patrões: os trabalhadores da cidade de Santos no entreguerras. São Paulo: Unicamp, 2003 – pag. 52. 5 Ib., p. 60. 6 Ib., p. 63. 7 Ib., p. 74.

17

sindicalizados pela mão de obra desespecializada, não sindicalizada e afeita de

receber menores salários.8

As políticas empresariais das empresas empreendedores foram bem

sucedidas, o que ocasionou a perda da posição de destaque ocupada pelos

operários da construção civil, e também haveria de concluir com o avanço

tecnológico do setor da construção civil.

A luta pelo “closed shop” no âmbito do trabalho portuário sempre foi

corrente nos portos brasileiros. A conquista, se alcançada, ocasionaria imposição

negocial pelos operários avulsos de regras para determinar as formas de trabalho

que deveriam ser praticadas nas operações portuárias de carga e descarga de

mercadorias.

A luta pelo controle do mercado de trabalho pelos próprios marítimos é

decorrente de um senso internacionalista e de um componente natural de visão do

mundo, bem como a mobilidade ocupacional da atividade e a falta de laços com

uma firma em particular permitiam aos trabalhadores um enfrentamento com os

empregadores por meio da confrontação direta9.

A natureza do trabalho portuário facilitava também a constituição de uma

rede de relacionamentos e de uma comunicação “inter portos”, colocando os

trabalhadores portuários fora dos parâmetros ordinários e regulares de disciplina e

controle, impostos aos demais trabalhadores dos outros setores, especialmente

aqueles originários da indústria10.

Nesse período, as bases tecnológicas do transporte marítimo não tiveram

alterações efetivas até o advento da conteinerização, nos anos 1960, sendo que

por um longo período, a força física dos trabalhadores, empregada nos ternos de

capatazia e estiva, dependia fundamentalmente da capacidade, perícia e iniciativa

dos operários11.

E esse tipo de serviço era realizado fundamentalmente por grupos de

trabalhadores alocados em cada porto, que prestavam serviços de carga e

descarga a diversos empregadores, como se fossem serviços específicos e

8 Ib., p. 89. 9 Ib.. p. 142. 10 Id. 11 Ib., p. 148.

18

autônomos de empreitada, sem que existisse algum vínculo direto entre as partes

contratantes.

A falta de frequência de navios de um mesmo armador em um mesmo porto

desestimulava e evitava a contratação direta de trabalhadores por estes

empregadores.

Isto ocorria em razão da inviabilidade dos armadores de se utilizarem das

próprias tripulações, que já executavam extensas atividades laborais durante todo

o trajeto navegado, ou mesmo de manter um grupo permanente de empregados

em cada porto, que acarretaria despesas desnecessárias, com diminuição do lucro

almejado.

Em vista do panorama estabelecido, a mão de obra portuária presente em

cada porto nacional nas atividades de estivagem, era formada por trabalhadores

sindicalizados e, em alguns casos e portos, por trabalhadores subordinados

diretamente pelas administrações portuárias, denominadas como companhias de

docas.

Nos anos de 1930, o Brasil, dentre os cinco maiores armadores locais,

apenas o Lloyd brasileiro se utilizava da “estiva direta”, em Porto Alegre,

contratando por meio da sua agência local estivadores engajados, quando

necessário.12

Os demais quatro grandes armadores nacionais (Companhia Nacional de

Navegação Costeira, Lloyd Nacional, Companhia de Comércio e Navegação e

Companhia Carbonífera Sul Rio Grandense), adotavam o sistema dominante da

estivagem locada por contratantes, que se obrigavam a agir como empreiteiros de

mão de obra e se responsabilizavam pelo pagamento da remuneração, das

despesas de taxas portuárias, de eventuais avarias, além dos materiais de

segurança dos trabalhadores e do transporte das mercadorias movimentadas.13

Esta dicotomia de contratações fez surgir a mão de obra de trabalhadores

portuários avulsos e a mão de obra dos trabalhadores da Companhia de Docas,

administradora portuária e empregadora, que abriria predatória concorrência com

os estivadores avulsos.

12 Ib., p. 171. 13 Id.

19

Em diversos portos, as companhias de navegação eram contrárias à mão

de obra fornecida pelos administradores portuários (Companhia de docas), e

desconfiavam que não poderiam ter o controle das operações de estivagem se

elas não ocorressem da forma avulsa, o que comprometeria o tempo despendido

na carga e descarga de mercadorias, afetando o preço final do frete e o lucro14.

No porto de Santos, o potencial conflito entre a Companhia de Docas e os

armadores era bastante reduzido, em vista da promessa da administração

portuária de que teriam menores despesas e responsabilidades pelo controle dos

trabalhadores portuários, além da promessa de maior eficiência do serviço a

baixos custos.15 Os armadores que operavam neste porto foram seduzidos com

esta promessa.

Por sua vez, na época de 1930, o serviço de estivagem no porto do Rio de

Janeiro não se dava em concorrência da Cia de docas local, e já tinha como

sistema reinante o “closed shop”.16

A conquista definitiva do closed shop por todas as estivas avulsas dos

portos brasileiros passou a ser consolidada a partir da vitória da aliança liberal de

Getúlio Vargas, em outubro de 1930, com acentuadas disputas entre as diversas

companhias de docas e as entidades estivadoras.17

Entre os trabalhadores portuários ligados às companhias de docas locadas

em cada porto e os trabalhadores avulsos não havia tensão acentuada, existindo

sim um sentimento de solidariedade dos trabalhadores “doqueiros” com os

estivadores avulsos18.

Com Getúlio Vargas no poder, a partir da década de 1930, foi iniciada uma

política de cooptação do operariado, influenciado pelo denominado sindicalismo

cristão do início do século19, cuja influência foi originada no final do século

14 Ib., p. 184. 15 Ib., p. 185. 16 Ib., p.189. 17 Ib., p. 190. 18 Ib., p. 192. 19Rerum Novarum : sobre a condição dos operários (em português Rerum Novarum significa "Das Coisas Novas") é uma encíclica escrita pelo Papa Leão XIII a 15 de Maio de 1891. Era uma carta aberta a todos os bispos, debatendo as condições das classes trabalhadoras. Wilhelm Emmanuel von Ketteler e Edward Manning tiveram grande influência na sua composição. A encíclica trata de questões levantadas durante a revolução industrial e as sociedades democráticas no final do século XIX. Leão XIII apoiava o direito dos trabalhadores formarem a

20

anterior, por meio da Encíclica Rerum Novarum, em que o Papa Leão XIII

convocava a união do operariado ao capital.

Começaram a surgir relações mais estreitas entre os governantes da

Revolução de 1930 e a classe operária, com início de uma política pública estatal,

com disciplina das organizações sindicais e unindo-as ao Estado, passando a se

chamar de trabalhismo.

O embate pelo controle do trabalho de estivagem por parte dos

trabalhadores avulsos teve importante vitória por meio do anteprojeto do Decreto-

Lei número 1371, de 23 de junho de 193920, que assinado pelo presidente Vargas,

reconheceu pela primeira vez oficialmente o closed shop.

O Decreto-Lei previa que os serviços de estivagem passariam a ser

executados exclusivamente sob a responsabilidade dos sindicatos dos

trabalhadores, sendo vedada às empresas de navegação, ou aos seus

representantes, a utilização da mão de obra de estivagem sem a interferência das

entidades profissionais.

Referido anteprojeto não teve o prosseguimento desejado pelos

trabalhadores avulsos filiados aos sindicatos profissionais, em vista do substancial

reclame da classe empregadora e detentora do capital, já que se entregava aos

sindicados, além da contratação e escalação da mão de obra, o próprio serviço de

estiva.

sindicatos, mas rejeitava o socialismo e defendia os direitos à propriedade privada. Discutia as relações entre o governo, os negócios, o trabalho e a Igreja. A encíclica critica fortemente a falta de princípios éticos e valores morais na sociedade progressivamente laicizada de seu tempo, uma das grandes causas dos problemas sociais. O documento papal refere alguns princípios que deveriam ser usados na procura de justiça na vida social, económica e industrial, como por exemplo a melhor distribuição de riqueza, a intervenção do Estado na economia a favor dos mais pobres e desprotegidos e a caridade do patronato aos trabalhadores. A encíclica veio completar outros trabalhos de Leão XIII durante o seu papado (Diuturnum, sobre a soberania política; Immortale Dei, sobre a constituição cristã dos Estados e Libertas, sobre a liberdade humana) para modernizar o pensamento social da Igreja e da sua hierarquia. Em geral é considerada como o pilar fundamental da Doutrina Social da Igreja. Pelos sucessores no papado foi denominada de "Carta Magna" do "Magistério Social da Igreja". (Disponível em: www.wikipedia.org.br Acesso em 02 mai 2012). 20Art. 1° - Os serviços de estiva nos portos da repúb lica serão executados sempre sob a responsabilidade dos sindicatos profissionais devidamente reconhecidos pelo ministério do trabalho, indústria e comércio, mediante contrato com as empresas de navegação. Art. 2° - Para os efeitos do artigo anterior, é ved ada às empresas de navegação, ou seus representantes, a admissão nos trabalhos de estiva da interferência de elementos estranhos aos sindicatos profissionais de estivadores.

21

Fernando Teixeira da Silva cita a veemente discordância de Guilherme

Guinle, presidente da Companhia de Docas do Porto de Santos e membro do

conselho técnico do Estado Novo à época, tentando demonstrar que ao lado da

closed shop, o direito do sindicado de exercer a estivagem direta criaria uma

anomalia no sistema capitalista: a criação da peculiar condição de operários sem

patrões, o que coroaria a “anarquia e os autos custos” e um “monopólio da

ineficiência”.21

As pressões patronais produziram efeito desejado e este anteprojeto não

teve prosseguimento. Surgiu na sequência novo estudo que acabou resultando o

Decreto-Lei n° 2.032/1940, que retirou a estivagem direta das mãos dos sindicatos

profissionais, passando a direção destes serviços aos armadores ou por

intermédio dos seus agentes22.

Como compensação aos sindicatos profissionais, foi retirada também das

companhias de docas, a operação da atividade de estiva, conferindo apenas o

controle sobre as entidades estivadoras responsáveis pela intermediação entre os

trabalhadores e as agências de navegação.

As atividades das companhias de docas no particular se restringiam em

notificações ao sindicato operário sobre o tipo de carga a ser transportada e

requisitando a quantidade necessária de trabalhadores para a movimentação de

carga e descarga das mercadorias.

Por sua vez, o closed shop foi definitivamente institucionalizado, em 1943,

pela CLT, por meio do artigo 257 que estabeleceu que a mão de obra de

estivagem nas embarcações só poderia ser executada por trabalhadores

estivadores, de preferência sindicalizados e matriculados perante as capitanias

dos portos23.

21 SILVA, Fernando Teixeira da. Operários sem patrões: os trabalhadores da cidade de Santos no entreguerras. São Paulo: Unicamp, 2003, p. 200. 22 Ib., p. 202. 23Artigo 257: A mão de obra na estiva das embarcações, definida na alínea "a" do art. 255 só poderá ser executada por operários estivadores ou por trabalhadores em estiva de minérios nos portos onde os houver especializados, de preferência sindicalizados, devidamente matriculados nas Capitanias dos Portos ou em suas Delegacias ou Agências, exceto nos casos previstos no artigo 260 desta Seção. . § 1º Para essa matrícula, além de outros, são requisitos essenciais: 1) Prova de idade entre 21 e 40 anos; 2) Atestado de vacinação; 3) Atestado de robustez física pelo Instituto de Aposentadoria e

22

A “Lei dos Portos” (8.630/93), ainda mantém, de forma parcial, o mercado

fechado aos trabalhadores portuários avulsos, conforme se verificará

oportunamente.

Muito se criticou a chamada atitude permissiva e paternalista por parte do

Estado da era “Vargas” sobre o controle do mercado na estiva pelos sindicatos

operários previsto na CLT.

Fernando Teixeira da Silva complementa com o testemunho de Oliveira

Vianna, um dos formuladores da legislação trabalhista, que relativiza a

originalidade da CLT e enfatiza o trabalho portuário e suas práticas contratuais,

baseadas em normas, costumes, tradições e instituições no porto do Rio de

Janeiro, antes mesmo das leis trabalhistas do pós – 1930.24

Cita também que a CLT teria mais sistematizado tais tradições no âmbito

portuário do que imposto um “direito novo”.

A partir da década de 1930, o Brasil foi um dos países que mais

rapidamente expandiu a sua economia, empreendendo um projeto de

industrialização nacional, que antes era formada apenas pela estrutura de bens

primários de exportação, que se interrompeu com a crise da dívida externa entre

1981-1983. Com o fim da expansão, as relações laborais foram impactadas

fortemente no âmbito portuário.

1.2 – O problema da representatividade sindical dos

trabalhadores

Pensões da Estiva; 4) Folha corrida; 5) Quitação com o Serviço Militar, quando se tratar de brasileiro nato ou naturalizado. . § 2º Para matrícula de estrangeiros, será também exigido o comprovante da permanência legal no País. . § 3º As Capitanias dos Portos, suas Delegacias e Agências, efetuarão as matrículas até o limite fixado, anualmente, pelas respectivas Delegacias de Trabalho Marítimo, não podendo exceder do terço o número de estrangeiros matriculados. § 4º Ficam sujeitos à revalidação no primeiro trimestre de cada ano, as cadernetas de estivador entregues por ocasião da matrícula. 24 SILVA, Fernando Teixeira da. Operários sem patrões: os trabalhadores da cidade de Santos no entreguerras. São Paulo: Unicamp, 2003, p. 216.

23

No âmbito internacional, a afirmação da necessidade de negociação

coletiva é manifestada inicialmente na Convenção n. 52 da OIT.

A tendência internacional da garantia à liberdade de associação ou sindical

também se manifestou na OIT, que, ratificando o conteúdo do Tratado de

Versalhes, publicou a Convenção n. 87, de 17 de julho de 1948, de São Francisco,

sobre “Liberdade Sindical e Proteção do Trabalho de Sindicalização”, e a

Convenção n. 98, de 1º de julho de 194925, de Genebra, sobre “a aplicação dos

princípios do Direito de sindicalização e negociação coletiva”.

A Declaração dos Direitos do Homem, na Assembleia Geral das Nações

Unidas, de dezembro de 1948, concretizou o Princípio da Liberdade Sindical,

garantindo que toda pessoa teria o direito de fundar sindicatos e de se filiar a eles,

na defesa dos seus interesses.

A pluralidade sindical estampada na Convenção n. 87 da OIT é uma das

variáveis do regime da liberdade sindical. Esta Convenção da OIT não foi

ratificada pelo Brasil, em virtude do regime de unicidade sindical existente e

custeio compulsório pelos membros da categoria a partir de 194626.

A Convenção n. 87 da OIT não impõe um ou outro regime, resguardando a

liberdade de escolha quanto à organização, se em regime de unicidade sindical ou

de pluralidade sindical. Caberá aos próprios trabalhadores decidir pelo regime a

ser adotado, inclusive podendo ser optado pela classe obreira o sistema da

unicidade sindical.27

No Brasil, portanto, há liberdade sindical sob algumas situações, sendo

permitido somente um sindicato por categoria dentro de uma mesma base

territorial.

Miriam Cipriani Gomes informa que o sistema de unicidade sindical adotado

no Brasil e abandonado na maioria dos países ocidentais, como França, Espanha,

Portugal e Inglaterra, entre em rota de colisão com os princípios democráticos nas 25 Artigo 4º- Deverão adotar-se medidas adequadas às condições nacionais, quando seja necessário, para estimular e fomentar entre os empregadores e as organizações de empregadores, de um lado, e as organizações de trabalhadores, por outro, o pleno desenvolvimento e uso de procedimentos de negociação voluntária, com objetivo de regulamentar, por meio de contratos coletivos, as condições de emprego. 26 SÜSSEKIND, Arnaldo Lopes. Convenções da OIT. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1998, p. 467. 27 AROUCA, José Carlos. A reforma sindical: contribuição crítica. Revista LTr, São Paulo, v. 68, n. 11, p. 1303, 2004.

24

relações de trabalho, impedindo a livre escolha do trabalhador de optar por outra

entidade sindical para defender os seus interesses na negociação coletiva.28

No circuito portuário, a sistemática legal da unicidade sindical contribui para

a manutenção de um sentimento comum de classe pelo trabalhador e unidade nas

negociações, em razão do local restrito de trabalho, similaridade e peculiaridade

na prestação de serviços.

No âmbito do trabalho portuário, a política sindical é vista pelos

trabalhadores como primordial para a conquista e a manutenção dos seus direitos

e verdadeiro detentor do poder de defesa da classe obreira.29

Os trabalhadores portuários veem na instituição sindical o órgão apto no

exercício da representação dos seus interesses, pois mesmo com a prerrogativa

de ser desnecessária a sindicalização para o exercício do trabalho portuário

avulso, exceto alguns casos isolados, os trabalhadores mantiveram suas filiações

sindicais.30

Mesmo com o fim da obrigatoriedade da sindicalização para o exercício

pleno da profissão como trabalhador portuário avulso, sobretudo por meio dos

dispositivos constitucionais sobre o assunto31, os sindicatos não perderam a

simbologia de ser o órgão de resistência da classe trabalhadora.

28 GOMES, Miriam Cipriani – Violação de direitos fundamentais na negociação coletivade trabalho – São Paulo: LTr, 2012 – p. 61. 29 DIÉGUEZ, Carla Regina Mota Alonso. De OGMO (Operário Gestor de Mão de Obra) para OGMO (Órgão Gestor de Mão de Obra): modernização e cultura do trabalho no porto de Santos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (Orientador: Prof. Dr. Iram Jácome Rodrigues), São Paulo, 2007, p. 86. 30 Id. 31Art. 5º. - XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente; Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:

25

Os anos em que vigeram o closed shop formaram nos trabalhadores um

sentimento de pertencer não somente a sua categoria obreira, mas também à

própria entidade sindical e às suas decisões.

O fim do closed shop acabou não trazendo grandes consequências para a

entidade sindical no seu sentido simbólico, mas sim grandes consequências

econômicas, haja vista que toda a remuneração que era passada diretamente ao

sindicato e posteriormente aos trabalhadores, atualmente vai diretamente às mãos

do OGMO, consoante se verificará oportunamente.32

No caso dos portuários, a legislação introduzida nas décadas de 30 e 40

apresentou às entidades sindicais, além de membro representativo de uma

categoria, a função de serem os gestores da mão de obra.

Isto favoreceu a formação de um sindicalismo extremamente ligado às suas

bases, e de um trabalhador politizado, ativo e militante às causas do sindicato e do

trabalho portuário.

O Estado, ao permitir que os sindicatos atuassem como gestores de mão

de obra para o trabalho portuário avulso, delegou a estas entidades a

possibilidade de se consolidarem como detentores de um grande poder de

barganha e de um elevado poder de negociação junto às instâncias

I - a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical; II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município; III - ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas; IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei; V - ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato; VI - é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho; VII - o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais; VIII - é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei. Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer. 32 Ib., p. 87.

26

governamentais responsáveis. Esta situação permaneceu intocável até a década

de 1980, com o fim do Regime Militar.33

Em diferença das outras categorias obreiras, que se reúnem

ocasionalmente para discussão dos interesses comuns, os encontros entre os

membros do sindicato profissional e os trabalhadores portuários avulsos são

realizados diariamente no ponto de chamada quando da realização das

escalações.

Nesta oportunidade, além da discussão dos mais variados assuntos

enquanto aguarda-se para responder à vez, o trabalhador portuário avulso

vivencia e sente-se participativo nas negociações e conquistas de seu sindicato

com as entidades patronais representativas.

Esse sentimento de unidade em razão dos encontros diários para a

escalação, denominada também de “parede”, fez tornar muito comum as

intervenções diretas dos dirigentes sindicais para discussão de matérias de

interesse da categoria.

A “parede”, além de servir como palco de manifestações de trabalhadores

sobre quaisquer assuntos, sobretudo tem importância para ratificação dos valores

criados da profissão e tradições conquistadas inerentes da atividade portuária

avulsa34.

O modo de operação sindical portuária tem similitudes peculiares às

corporações de ofício, em razão de assumirem forte defesa da profissão,

possuírem critérios rígidos de admissão de novos filiados e pela utilização do

mercado fechado de trabalho35.

33 NASCIMENTO, Hiata Anderson Silva. O nascimento de um novo trabalhador portuário. Reestruturação produtiva e corporativismo: um estudo sociológico acerca da resistência dos portuários capixabas ao processo de modernização dos portos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Orientadora: Prof. Dra. Gilda Figueiredo Portugal Gouvêa), Campinas, 1999, p. 65. 34Ib., p. 131. NASCIMENTO, informa que hoje os sindicatos apresentam algumas similaridades com as antigas corporações de ofício, na medida que exercem o controle sobre o processo de trabalho, sobre a divisão das tarefas, sobre a qualificação profissional e sobre a aplicação das punições aos que infringem as normas que orientam a coletividade. Estas punições são aceitas com naturalidade pelos envolvidos, porque o fator ‘tradição’ é fortemente arraigado na orla portuária. 35 Id.

27

O “lugar comum” de trabalho para toda a categoria, formada pela faixa do

cais, também conspirou para a união dos trabalhadores e da quase completa

sindicalização de toda a classe profissional.

Porém, este sindicalismo ligado diretamente à base e à união da classe

obreira na defesa dos interesses comuns não foi suficiente para a manutenção

dos direitos conquistados nas décadas anteriores.

A globalização econômica e a adoção de novos métodos de movimentação

de carga e de produção36, de características neoliberais, transformaram como

potenciais concorrentes entre si, não somente os portos locais, mas também toda

a estrutura portuária internacional.

José Manuel Pureza37 cita que no quadro de uma economia global, surgem

duas possibilidades de intervenção estratégica e transformadora do movimento

sindical: ou permanece amarrado aos pactos sociais nacionais, com colaboração

na estratégia de condicionamento do modelo de proteção social pela capacidade

competitiva das economias nacionais, ou se reconstitui como movimento social

para combater a lógica da internacionalização do capital.

O autor sugere que para o sucesso destas alternativas, serão necessárias

rupturas para a edificação de um movimento sindical que reencontre no

internacionalismo solidário a sua própria estratégia.38

A unicidade sindical, os novos métodos de movimentação de mercadoria,

de característica toyotista, e a permanente diminuição das oportunidades de

engajamento ao trabalho, criaram anomalias ao sistema de mercado fechado

quando controlado pelas entidades sindicais operárias.

36Que serão tratadas nos tópicos seguintes. 37 SANTOS, Boa Ventura (org) – A globalização e as ciências sociais. PUREZA, José Manuel – Para um internacionalismo pós-vestefaliano- 2ª Ed, São Paulo Cortez 2002, p. 247. O Autor cita como necessárias rupturas com as ‘especificidades nacionais com as tradições sindicais’, rupturas com ‘um pensamento de com um pensamento de concórdia que tende a desacreditar o pensamento e a ação crítica e valorizar o consenso social, ruptura ‘com o fatalismo econômico’, ruptura com ‘um neoliberalismo hábil a apresentar as exigências inflexíveis de contratos de trabalho leoninos sob a capa da flexibilização’, ruptura, enfim, com o ‘social liberalismo’. 38 Id.

28

1.3 – A distorção do monopólio do trabalho portuári o pelo

sindicato profissional

O sistema portuário brasileiro, em vista do atraso na modernização

tecnológica e o sistema de relações de trabalho vigente, são considerados como

segmento da economia em que a tradição firmou-se com força, impondo e

legitimando práticas, códigos de honra e de conduta que orientam o

comportamento dos indivíduos no desenvolvimento de suas atividades. Este agir

coletivo de trabalhadores é marcado pela rotineirização das suas práticas sociais,

conferindo um sentimento de segurança quanto ao tempo, quanto à distribuição

das tarefas e quanto à expectativa de manutenção do mesmo processo

produtivo.39

No sistema portuário brasileiro, esse processo de tradições, muitas delas

ocorridas em razão de décadas de mercado de trabalho fechado, fez surgir

anomalias criadas diversas vezes pelos trabalhadores da própria classe

profissional envolvida.

A institucionalização do closed shop ocasionou o surgimento de uma

categoria dentro da categoria. Surgiram os bagrinhos40, nome dado aos

trabalhadores da força supletiva em analogia aos peixes que ficam embaixo dos

39 NASCIMENTO, Hiata Anderson Silva do Nascimento: O nascimento de um novo trabalhador portuário> Restruturação Produtiva e Corporativismo: Um estudo sociológico acerca da resistência dos portuários capixabas ao processo de modernização dos portos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), sob a orientação da Profa. Dra. Gilda Figueiredo Portugal Gouvêa - p. 119. 40 OLIVEIRA, Gláucio Araújo Oliveira, Procurador do Ministério Público do Trabalho, em sua Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Direito Econômico e Sociel da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial do grau de Mestra (Orientador: Prof. Dr. Carlos Frederico Marés de Souza Filho) – Curitiba 2001 – p. 112 – onde denomina que o Bagrinho: Também chamado de ‘carteirão’ ou ‘cavalo’ ou galinha, e poderá designar o trabalhador que não pertence ao sistema, mas que consegue trabalhar no porto por conta própria ou alheia (em nome de um trabalhador do sistema) ou ainda um trabalhador do sistema que realiza o trabalho em nome do outro. Consiste na utilização da carteira do TPA registrado para se obter a oportunidade de trabalho. Logo após a escalação o TPA procede a ‘troca da vez’, ou seja, substitui os nomes fazendo constar outro trabalhador no seu lugar, recebendo o primeiro sem trabalhar.

29

tubarões aguardando as sobras. A briga entre bagrinhos e tubarões teve duração

até a modernização portuária.41

O panorama desta situação foi bem explicitado por Arnaldo Bastos Santos

Neto e Paulo Sérgio Xavier Ventilari, no sentido de que o monopólio de

fornecimento de mão de obra pelos sindicatos não foi administrado de forma

democrática, como indicam os casos de ‘bagrinhos’ e do nepotismo da ‘escolha’

dos novos filiados. 42

Como o sindicato possuía a prerrogativa de determinar a escala dos

trabalhadores que iriam compor uma determinada turma, por vezes o fazia

escalando trabalhadores em excesso, levando alguns a ganharem sem

trabalhar.43

Interessados em manter ganhos por vezes exagerados que se assemelham

a privilégios reprováveis, os sindicatos dos trabalhadores avulsos não tinham

como justificar perante a sociedade a manutenção de um sistema carcomido e mal

gerenciado.44

Este sistema de subcontratação vigente – também chamado de “exploração

do trabalho pelo trabalho” - entre os trabalhadores portuários avulsos era

duramente atacado pela imprensa, o que catalisou a promulgação da Lei de

Modernização dos Portos.

A Lei 8.630/93, com o objetivo de regularizar a força supletiva existente em

cada porto, discriminou o trabalho avulso em força principal e força supletiva. A

força principal, matriculada com o “Registro” e detentora da preferência de escolha

de trabalho e a força supletiva, matriculada com o “Cadastro”, com o trabalho

restante não realizado pelos trabalhadores registrados.

41 DIÉGUEZ, Carla Regina Mota Alonso – Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Sociologia, do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, para obtenção do títulode Mestre em Sociologia – Orientador: Prof. Dr. Iram Jácome Rodrigues – São Paulo - 2007 – A Autora cita que o ‘bagrinho’ tipifica a forma de trabalho disponível, sem especialiação, que recorre ao porto como seu último reduto de luta pela sobrevivência. Em outros casos, é produto do baixo nível econômico da classe operária, em alguns contextos nos quais o salário não é suficiente para cobrir os custos de reprodução da força de trabalho. Nestes casos, o trabalhador é levado ao cais em busca de um ‘bico’ que possa acrescentar ao ganho parco. 42 SANTOS NETO, Arnaldo Bastos. O trabalho portuário e a modernização dos portos, Curitiba: Juruá, 2000, página 14. 43 Id. 44 Id.

30

A Lei de Modernização dos Portos, ao criar a figura do OGMO, que passou

a ser o responsável pelo gerenciamento da mão de obra do trabalho avulso, teve

claro objetivo de retirar dos sindicatos o monopólio do fornecimento da mão de

obra.

Assim, tanto os trabalhadores registrados como os cadastrados passaram a

ser gerenciados pelo OGMO.

Os bagrinhos ou força supletiva passaram a ser considerados “dentro do

sistema” do OGMO, que passou a ser o responsável pelo dimensionamento de

trabalhadores em cada um dos portos organizados, acabando também com o

nepotismo de escolha.45

A existência da força supletiva dentro do sistema fez com que a luta pela

manutenção do closed shop fosse fortalecida, diante da ameaça de entrada de

novos membros no mercado de trabalho. Esta informação reforça o argumento de

que o mercado fechado de trabalho é central na construção da cultura do trabalho

portuário, em vista da grande importância que tem para a manutenção dos

padrões de trabalho.46

Gláucio Araújo de Oliveira, Procurador do Ministério Público do Trabalho e

atuante no âmbito portuário como “fiscal da Lei”, enumera a seguir algumas

práticas ilegais ocorridas com a mão de obra avulsa47:

a) O substituto pode ser do sistema ou não. Geralmente trata-se de TPA

cadastrado que frequenta o ponto de chamada, mas que dificilmente consegue

uma oportunidade de trabalho, sendo seduzido pelo TPA registrado para adquirir

um posto de trabalho.48

45 SANTOS NETO (op. cit., p. 41) informa que levantou-se muitos rancores contra a estiva, vista como ‘aristocracia operária’ ou como ‘privilegiados’, foi a prática. Durante largo tempo, de “apadrinhar’ parentes para a sindicalização. Este nepotismo sindical ocorreu durante muito tempo, constituindo verdadeiras ‘famílias de estivadores’, avô, pai, filho e neto. Era comum os sindicatos aceitarem apenas os parentes dos atuais membros do quadro. 46 DIÉGUEZ, op. cit., p. 67. 47 OLIVEIRA, Gláucio Araújo de. Dificuldades na implantação da Lei de Modernização dos Portos no Brasil: O caso do porto de Paranaguá. Dissertação de Mestrado apresentada à Pontifícia Universidade Católica do Paraná (Orientador: Prof. Dr. Carlos Frederico Maré Filho), Curitiba, 2001, p. 112/116. 48 Id. OLIVEIRA informa que inclusive existiam panfletos no ponto de chamada do sindicato dos estivadores em Paranaguá alertando que a ‘troca da vez’ seria tolerada até 15 minutos após a escalação do TPA registrado.

31

b) Então, fica obrigado o TPA cadastrado a repassar aproximadamente

70% dos valores auferidos com o trabalho para o TPA registrado.

c) A pratica da “galinha” chegou a ser aperfeiçoada, em que os TPA

registrados iniciaram um processo de comercialização a longo prazo dos

engajamentos ao trabalho. Era oportunizado ao TPA cadastrado pelo TPA

registrado a compra da vaga por 6 meses ou até 1 ano.

d) Também é comum o TPA registrado passar diversos cartões mais de 1

vez no mesmo dia e depois comercializar diversas oportunidades de trabalho com

os TPA cadastrados. O TPA registrado comprava o direito de uso da carteira do

TPA registrado afastado e de posse desse cartão negociava com os cadastrados

as oportunidades de trabalho. Em alguns casos existiam estivadores registrados

que tinham mais de 5 carteiras.

e) A prática “correr o quarto” significa dividir o trabalho entre os colegas

engajados no mesmo terno e em determinado turno, e revela uma solidariedade

de grupo inerente ao trabalho portuário. O nome “correr o quarto” foi denominado

porque no início o estivador trabalhava um quarto da jornada escalada, sendo que

mais tarde foram adotadas outras variantes.

f) Adota-se também o nome de “trabalhador de agência” para toda a prática

em que o TPA for escolhido diretamente pelo operador portuário sem que tenha

concorrido à escala diária pelo sistema de rodízio. Em muitas oportunidades o

operador portuário chega a indicar um terno completo “por fora” e acaba

remunerando em dobro o turno de trabalho, já que está obrigado a respeitar a

composição mínima dos ternos escalados pelo OGMO.49

Portanto, mesmo após a Lei dos Portos, embora a força supletiva passasse

a pertencer ao sistema, era frequente a ocorrência de ilegalidades, quer por parte

dos trabalhadores avulsos, quer por parte dos operadores portuários, que muitas

vezes ignoravam a lista de rodízio, para a escolha do TPA que lhe fosse

conveniente ao trabalho.

Com o sistema viciado e sem aparentes mudanças posteriormente à Lei

8.630/93, a fim de se evitarem dúvidas quanto ao efetivo titular da escalação

49 Id.

32

rodiziária, o artigo 5º da Lei 9719/98, deixou clara a exclusividade da demanda ao

OGMO: “A escalação do trabalhador portuário avulso, em sistema de rodízio, será

feita pelo órgão gestor de mão-de-obra.”

Aliado a isso e com a ocorrência dos atentados de 11 de setembro de 2001,

nos Estados Unidos da América, foi celebrado um tratado internacional para

segurança das embarcações e dos portos mundiais, denominado ISPS Code50, no

âmbito da Organização Marítima Internacional – IMO, que exigia da autoridade

portuária o controle rígido de pessoas e veículos que acessam a área primária do

porto, inclusive com delimitação de acesso de pessoas. Com isso, um TPA

engajado para trabalhar em uma determinada operação e em um determinado

navio não poderia estar em outro lugar, senão no próprio navio ou em áreas

próximas.51

Como no Brasil o sistema de escalação do trabalho avulso é realizado pelo

OGMO, caso ocorra de forma eletrônica, a Autoridade Portuária tomará

conhecimento no início da jornada quais trabalhadores e em quais embarcações

foram escalados.

Se a escalação ocorrer de forma manual, como ainda acontece em alguns

portos nacionais, a Autoridade Portuária sequer terá condições de fiscalizar de

forma efetiva a entrada e saída de trabalhadores.

50 International Ship And Port Facility Security (ISPS) Code. Fonte: http://www.portosdobrasil.gov.br/relacoes-internacionais/isps-code-1 - Acesso: 17 de julho de 2012. Consta na página inicial do sítio que no Brasil como Estado-parte da Convenção SOLAS, desde 25 de maio de 1980 por força do Decreto Legislativo nº 11/80, ainda que a sua promulgação tenha ocorrido apenas pelo Decreto nº 87.186, de 18 de maio de 1985 assumiu o compromisso de implementar o Código ISPS, que entrou em vigor em julho de 2004. O Código ISPS estabelece determinadas regras que tornam os navios e instalações portuárias mais seguras. Dentre as medidas adotadas podemos destacar as seguintes: Estabelecimento de maior controle de entrada e saída de pessoas e veículos nas instalações portuárias; Delimitação do perímetro do porto; Instalação de sistema de vigilância dos limites do perímetro do porto e do cais; e Necessidade de cadastramento das pessoas e veículos que entram na instalação portuária. Prescreve, ainda, o Código que um navio antes de chegar ao porto deve informar os últimos 10 portos que visitou e caso algum deste não seja certificado de acordo com o Código poderão ser adotas medidas adicionais de proteção, tais como inspecionar o navio, coloca-lo em quarentena, etc., o que causará atraso na operação do navio provocando sérios prejuízos. Tendo em vista que o comércio marítimo internacional é um setor altamente competitivo, os navios que o realizam passariam a evitar portos que não são certificados de acordo com o Código ISPS. 51 PAIXÃO, Cristiano – Trabalho Portuário: a modernização dos portos e as relações de trabalho no Brasil – São Paulo: Método, 2008, p. 90.

33

Cristiano Paixão e Ronaldo Curado Fleury afirmam que o único modo de a

Autoridade Portuária ter o devido controle de acesso dos trabalhadores avulsos

efetivamente escalados e os navios em que prestarão suas atividades laborais, é

se a escala for feita por sistema eletrônico pelo OGMO e as informações forem

enviadas on-line à responsável pela segurança no porto organizado. Logo, não

bastará ser trabalhador portuário, mas estar devidamente escalado para o

desempenho de serviço específico.52

Acrescentam os autores que caso seja adotado o sistema pela escalação

eletrônica, será possível não apenas garantir a segurança das operações

portuárias, no que respeita às previsões do ISPS Code, mas também serão

evitados os diversos casos de venda de oportunidades de trabalho, conforme

indicado anteriormente.53

O sistema eletrônico de escalação, fruto de diversas controvérsias pela

classe trabalhadora, muitas delas com episódios violentos54, foi vista inicialmente

como um atentado às tradições de engajamento ocorridas por meio da ‘parede’.

A escala eletrônica acabou sendo adotada na maioria dos portos nacionais,

principalmente pela atuação efetiva dos órgãos governamentais responsáveis, e

por ser requisito para a implementação definitiva do ISPS Code, que caso, não

adotada pela instalação portuária, poderia impedi-la de atuar como porto

exportador e importador.

Atualmente, a força supletiva fazendo parte do sistema e com a escala

eletrônica sendo realizada definitivamente pelo OGMO em boa parte dos portos

nacionais, as distorções ocorridas pelos sindicatos profissionais no gerenciamento

da mão de obra no sistema do closed shop, não mais são frequentemente

sentidas pelos órgãos responsáveis pela fiscalização.

52

PAIXÃO, Cristiano; FLEURY, Ronaldo Curado Fleury. Trabalho portuário: a modernização dos portos e as relações de trabalho no Brasil. São Paulo: Método, 2008, p. 91. 53 Id. 54 A justiça do trabalho na cidade de Paranaguá, em Julho de 2006, ao tentar impor o cumprimento de decisão judicial transitada em julgado que obrigava os sindicatos a implementarem a escalação pela via eletrônica e a observância do intervalo de 11 horas entre turnos, sofreu violenta manifestação, inclusive com apedrejamento do fórum local e ameaça aos envolvidos no processo de implementação, como partes, juízes e representantes do Ministério Público do Trabalho e do Ministério do Trabalho. http://www.parana-online.com.br/editoria/cidades/news/186115/ Acesso: 17 de julho de 2012.

34

2 – EVOLUÇÃO DO TRABALHO PORTUÁRIO BRASILEIRO, A

PARTIR DA IMPLEMENTAÇÃO DOS NOVOS MÉTODOS

PRODUTIVOS, SOB O ENFOQUE DA GLOBALIZAÇÃO E DO

NEOLIBERALISMO

2.1- Aspectos da globalização econômica

A globalização estabelece nova dinâmica nas interações econômicas,

sociais, políticas e culturais, com reflexos em toda a população mundial.

A natureza da globalização sugere a ideia falsa de um movimento linear,

monolítico e inequívoco. Na realidade a globalização é um conjunto diferenciado

de relações sociais, que fazem surgir diferentes fenômenos, não existindo apenas

uma, mas várias globalizações55.

Por outro lado, conforme estudo do Banco Internacional para Reconstrução

e Desenvolvimento, as sociedades e economias do mundo estão se tornando mais

integradas e que tal integração é permitida pela globalização. De acordo com o

estudo, a globalização permite a redução de custos com transporte, menores

barreiras comerciais, comunicação mais rápida de ideias, fluxos crescentes de

capital e pressões de migração intensificadas. Argumenta-se na referida

publicação que a integração global é uma força poderosa para a redução da

pobreza, embora pudesse ser mais efetiva, porque economias mais integradas

tendem a crescer mais rapidamente, e esse crescimento é, na maioria das vezes,

bastante difundido. O mesmo estudo reconhece, todavia, que os países ricos

55 SANTOS, Boaventura de Souza - A Globalização e as Ciências Sociais – 2ª edição – São Paulo – Cortez, 2002, p. 49.

35

mantêm barreiras significativas em relação aos produtos provenientes das nações

pobres, inibindo essa integração redutora da pobreza.56

O conceito de globalização, para economia mundial, segundo MENEZES57,

é aquele sustentado pelo ´Consenso de Washington’, de caráter neoliberal, com

disciplina fiscal, redução dos gastos públicos, reforma tributária, juros e câmbio de

mercado, abertura comercial, investimento estrangeiro direto com eliminação de

restrições, privatização de empresas estatais, desregulamentação e direito à

propriedade intelectual. O Brasil comprometeu-se, em 1989, a implantar as

diretrizes decorrentes deste “consenso” impostas pelo FMI, BIRD e Banco

Mundial.

De fato, a transnacionalização do capital é a origem do processo conhecido

como “globalização econômica”, que possui tanto uma dimensão produtiva quanto

financeira. A primeira refere-se a fato de produtos de um bem industrial serem

produzidos em diferentes países. A segunda, significa a possibilidade de se

movimentar livremente excedentes de capital (aplicados especialmente em títulos

secundários e ações) entre os principais centros financeiros do mundo.58

FURTADO59, por sua vez, observa a tendência de desequilíbrio dos

agentes envolvidos no processo de globalização, ao afirmar que duas forças estão

na base do dinamismo das economias industriais: a introdução das novas técnicas

de produção e a expansão do poder de compra da população. As novas técnicas

aumentam a produtividade do trabalho e, em geral, reduzem a demanda de mão

de obra. Por outro lado, a massa trabalhadora se organiza e luta pela elevação

dos salários reais, o que amplia o mercado e abre novos horizontes aos

investimentos.

O equilíbrio dessas forças poderia ser alcançado pela arbitragem realizada

pelo Estado, mediante política econômica: se predominam forças que comandam

56 Globalization, growth, and poverty: building na inclusive world economy. The International Bank for Reconstruction and Development. Trad. Melissa Kassner. SP: Editora Futura, 2002, p. 16. 57MENEZES, WAGNER - Estudos de Direito Internacional: anais do 3º Congresso Brasileiro de Direito Internacional – Volume IV – Wagner Menezes (coordenador), Curitiba: Juruá, 2005. 58 PRONI, Marcelo W. O império da concorrência: uma perspectiva histórica das origens e expansão do capitalismo. In: Revista Paranaense de Desenvolvimento. Economia, Estado e Sociedade. Curitiba: IPARDES, 1997, p. 3-32. 59 FURTADO, Celso. Artigo publicado originalmente no Jornal Folha de São Paulo, em 1/12/96, p.3. - http://www.cefetsp.br/edu/eso/globalizacao/desafiosglob2.html.

36

a introdução de novas técnicas, a tendência será para a recessão; se prevalecem

forças que pressionam no sentido de elevação dos salários, a tendência será para

a inflação.60

Arremata FURTADO que o processo de globalização modifica esse quadro

em benefício dos agentes que controlam a tecnologia e em detrimento das

organizações sindicais. As empresas transnacionais escapam ao controle dos

Estados, na medida em que estão capacitadas para transferir atividades

produtivas de um país para outro. Essa é a razão pela qual nas economias

industrializadas, nos últimos tempos, têm prevalecido um quadro recessivo e uma

notória debilitação das ações sindicais.61

Por outro lado, sustenta-se que a globalização não teve integração

intensificada em todos os países, e que a desunião da produção mundial,

associada à falta de disseminação global dos investimentos diretos, remetem

tarefas de baixa especialização para as economias periféricas e semiperiféricas,

enquanto as atividades envolvendo maior incorporação de investigação,

desenvolvimento e investimento, ficam retidas nos países centrais. 62

Dessa forma, o desenvolvimento tecnológico e o investimento na produção

apresentam níveis de globalização muito inferiores à generalidade dos processos

produtivos e aos circuitos de produção e consumo final63.

A globalização não pode ser entendida sem que se compreendam outros

dois processos que, paralela e sucessivamente se desenvolveram com maior ou

menor intensidade nas economias nacionais e nas relações internacionais: o

neoliberalismo e a reestruturação produtiva.

2.2 – Influxos do neoliberalismo na atividade econô mica

60 Id. 61 Id. 62SANTOS, Boa Ventura (org) – A globalização e as ciências sociais. PUREZA, José Manuel – Para um internacionalismo pós-vestefaliano- 2ª Ed, São Paulo Cortez 2002, p. 239. 63 Id., cita o Autor que existe uma manifesta falta de globalidade na globalização.

37

O neoliberalismo surgiu logo após a Segunda Grande Guerra Mundial, na

Europa e América do Norte, onde o capitalismo era mais forte. Caracterizou-se por

uma veemente reação teórica e política contra o Estado intervencionista e de bem-

estar social. A ideia central de seus arautos, dentre os quais Friedrich Hayek,

Milton Friedman e Karl Popper era combater o keynesianismo e o solidarismo

reinantes e preparar as bases de um tipo de capitalismo, duro e livre de regras

para o futuro. Argumentavam que o novo igualitarismo, promovido pelo Estado e

bem-estar social, destruía a liberdade dos cidadãos e a vitalidade da concorrência,

da qual dependia a prosperidade de todos.64

Durante os “trinta gloriosos” – anos que sucederam a Segunda Grande

Guerra Mundial em que se verificou grande desenvolvimento sócio-econômico na

Europa e nos Estados Unidos, com altas taxas de crescimento e distribuição de

riqueza – o ideário neoliberal pareceu pouco convincente.

No entanto, com a grande crise do modelo econômico em 1973, quando o

mundo capitalista avançado sofreu longa e profunda recessão, as ideias

neoliberais emergiram com grande força. O principal foco das críticas neoliberais

eram sindicatos, acusados de possuir excessivo e nefasto poder, bem como do

movimento operário, em geral, que, conforme a corrente neoliberal, havia corroído

as bases de acumulação capitalista com suas sucessivas pressões reivindicatórias

por aumentos salariais e pela intervenção do Estado para aumento desmedido de

gastos sociais.65

O neoliberalismo, destarte, surgiu como o amargo e único remédio para a

crise generalizada das economias de mercado. O Estado deveria ser forte apenas

para romper o poder dos sindicatos e controlar o dinheiro, devendo, contudo, ser

comedido em relação a gastos sociais e intervenções econômicas. No mesmo

sentido, os governos deveriam primar por uma sólida disciplina orçamentária,

sobretudo por meio da contenção dos gastos sociais e “a restauração da taxa

64 ANDERSON, Perry. Balanço do neoliberalismo in SADER, Emir & GENTILI, Pablo (Org.), Pós-Neoliberalismo. As políticas sociais e o Estado democrático. 5ª ed. SP: Paz e Guerra, 1995, p. 9-37. 65 Id.

38

‘natural’ de desemprego, ou seja, a criação de um exército de reserva de trabalho

para quebar os sindicatos”.66

A globalização econômica é sustentada pelo consenso econômico

neoliberal em que as principais inovações institucionais são: restrições drásticas à

regulação estatal da economia; novos direitos de propriedade internacional para

investidores estrangeiros, inventores e criadores de inovações suscetíveis de

serem objeto de propriedade intelectual; subordinação dos Estados nacionais as

agências multilaterais como Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e

Organização Mundial do Comércio67.

O consenso neoliberal sugere que crescimento e estabilidade econômica só

operam pela redução dos custos salariais, liberalização do mercado e redução de

direitos, além da proibição de indexação dos salários aos ganhos de

produtividade.68

Ocorre a prevalência do princípio do mercado sobre o do Estado, com a

subordinação dos interesses do trabalho aos do capital, caracterizado pelo

protagonismo das empresas transnacionais.69

Na ideologia neoliberal busca-se cada vez mais o aumento da produtividade

e eficiência, a obtenção na qualidade dos produtos e nos serviços e, as empresas,

para se manterem competitivas, reduzem custos e flexibilizam a produção, com

negativos reflexos no salário e nas condições de trabalho dos empregados.

As novas formas de organização do trabalho remetem ao consumo como

fator determinante da produção e demanda. A empresa acaba sendo

caracterizada apenas por um núcleo central de empregados altamente

qualificados, sendo os responsáveis pelo acompanhamento e pela implementação

66 Id. 67SANTOS ainda acrescenta da necessidade dos países periféricos em se renderem a políticas de “ajustamento estrutural”e de “estabilização macroeconômica – impostas como condição para renegociação da divida externa – cobrem um enorme campo de intervenção econômica, provocando enorme turbulência no contrato social, nos quadroa legais e nas molduras institucionais: a liberalização dos mercados; a privatização das indústrias e dos serviços; a desativação das indústrias regulatórias e de licenciamento; a desregulamentação do mercado de trabalho e a ‘flexibilização’ da relação salarial; a redução e a privatização dos serviços de bem estar social; SANTOS, Boaventura de Souza – os processos de globalização - A globalização e as ciências sociais – 2ª. Ed – São Paulo – Cortez – 2002 – p.31. 68 Ib., p. 35. 69 Ib., p. 76.

39

de novas tecnologias que aumentem a produtividade e eficiência do produto

comercializado.70

Enquanto no âmbito periférico, a empresa contrata pessoas jurídicas ou

físicas para o desempenho de atividades acessórias, terceirizando parte da sua

produção.

Para justificar a manutenção e a expansão dessas políticas, apresentam os

ideólogos que a tendência da economia mundial é ser neoliberal71, e ainda o único

caminho viável, em vista do fracasso das sociedades comunistas, sociais

democratas e de Estados de bem-estar social72.

2.3 – A experiência neoliberal na América Latina

As políticas inspiradas no Consenso de Washington, que se difundiram a

partir da década de 90, na América Latina, não tiveram o resultado esperado. A

fragmentação laboral, a descentralização da negociação coletiva e as

privatizações causaram um aumento da informalidade e desigualdade com

redução da proteção social, sem estimulação a novas contratações empregatícias.

73

70 ALVES, Giovanni – O novo (e precário) mundo do trabalho – Reestruturação produtiva e crise do sindicalismo; Boitempo Editorial, São Paulo – 1ª edição: setembro de 2000; 1ª reimpressão: setembro de 2005, p. 72. 71 Em artigo da Folha de São Paulo com a denominação– O impensável aconteceu de 25 de setembro de 2008” – Boa Ventura Santos relata a crise de crédito dos EUA – “O Estado deixou de ser problemas para voltar a ser solução” - “O fato de que a fatura das crises é sempre paga por quem nada contribuiu para elas” – “Não estamos perante uma desglobalização, mas sim perante uma nova pós-neoliberal”; Boa Ventura Santos cita ainda que em 1998, o conhecido economista norte americano e, ao mesmo tempo, vice-presidente do Banco Mundial, Joseph Stiglitz, desfere o primeiro ataque ao ‘Consenso de Washington’ e propõe um ‘pós consenso de Washington’ e em finais de 1999 leva mais longe ainda a sua crítica, afirmando que o modelo mundial de segurança social (modelo neoliberal), para além de ter causado sofrimento humano e contribuído para o agravamento das desigualdades sociais a nível mundial e no interior de cada país, é um modelo cientificamente errado, uma vez que as supostas verdades em que assenta não passam de mitos. 72 GOMES, Dinaura Godinho Pimentel – Direito do Trabalho e dignidade da pessoa humana, no contexto da globalização econômica: problemas e perspectivas – São Paulo – LTr. 2005 – p. 117. 73 FRAILE, Lydia – La experiência neoliberal de América Latina. Políticas sociales y laborales desde El decênio de 1980 – Revista Internacional de Trabalho, vol. 128 (2009), num. 3, fls. 235.

40

Reformas também foram implementadas nas legislações trabalhistas dos

países latino-americanos. De acordo com o Consenso de Washington, a

globalização exigia mercados de trabalho mais flexíveis, com mobilidade salarial e

de trabalhadores, o que facilitaria a reestruturação na medida certa para abertura

das suas economias com maior competência. Para isso, necessário modificar as

políticas de negociação coletiva, contratação e contribuições sociais sobre o

salário, que favoreceriam apenas aqueles que se encontravam no mercado laboral

formalizado.74

Ao contrário do que esperavam os defensores das reformas trabalhistas, as

medidas de flexibilização não tiveram resultados eficazes quanto à redução do

mercado informal, em razão do aumento da competitividade e instabilidade

econômicas, e da pouca vontade dos governos em fazer cumprir as legislações

trabalhistas.75

No Brasil, o regime contratual preponderante era aquele a prazo

indeterminado e regido pela CLT.

Os primeiros passos da flexibilização da mão de obra foram realizados pela

Lei 6.019/7476, que institui no Brasil o trabalho temporário. A legislação oportuniza

as empresas à contratação de trabalhadores a prazo determinado e por curto

espaço de tempo, mediante terceira empresa, na ocorrência de aumento

extraordinário de serviços ou na substituição temporária de empregados

permanentes.

Na esteira da flexibilização, a Lei 7.102/8377 cria a possibilidade das

empresas contratarem serviços especializados de segurança, vigilância e

transporte de valores por meio de empresa terceirizada. Esta lei contribuiu para

estabelecer o conceito de que a terceirização de “atividade meio” do empregador é

lícita, inclusive pacificada na Justiça do Trabalho.78 Em outras palavras, as

74 Id. 75 Ib, p. 247. 76 Dispõe sobre o trabalho temporário nas empresas urbanas e dá outras providências. 77 Dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, e dá outras providências. 78 BRASIL, TST, SÚMULA 331 - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal,

41

atividades desvinculadas do objetivo final da empresa tomadora de serviços serão

passíveis de terceirização legalizada.

Citem-se, ainda, as Leis nº 8745/199379 e 9849/199980 que disciplinaram

contratação a prazo determinado com diminuição dos custos sobre a mão de obra

nos âmbito público, na ocorrência de “necessidade temporária de excepcional

interesse público”, como em assistências emergenciais, realização de pesquisas,

contratação de professores, nas atividades que exijam técnicas especializadas e

de assistência a saúde de militares e indígenas.

Na tentativa de seguir a consolidada precarização do trabalho no âmbito

público, a Lei 9.601/199881 buscou fragilizar também a relação de emprego no

âmbito privado ao permitir a existência de trabalhadores com contrato a prazo

determinado que recebessem a contribuição do FGTS, em valores inferiores ao

dos trabalhadores com vínculo empregatício a prazo indeterminado.

Também é perceptível a inequívoca tentativa neoliberal de buscar

desregulamentação do regime de trabalho, com reflexos no sistema

previdenciário, conforme se observa da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de

formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral. 79 Dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, e dá outras providências. 80 Altera os arts. 2o, 3o, 4o, 5o, 6o, 7o e 9o da Lei no 8.745, de 9 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, e dá outras providências. 81 Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras providências.

42

dezembro de 1998, que alterou os critérios de aposentadoria tanto na iniciativa

privada quanto na esfera pública.

A política neoliberal do Governo Collor, na década de 90, impulsionou a

integração do neoliberalismo nacional ao capital globalizado, com mudança

substancial no processo de reestruturação produtiva que atingiu os principais

polos industriais brasileiros.

Prevendo dificuldades das economias periféricas, argumentou-se que o

desafio maior que as economias industrializadas teriam que enfrentar seria

encontrar a forma adequada de instalar-se no processo de globalização, preservar

a capacidade de se auto-organizar e dar solução a seus problemas específicos. 82

Na tentativa de instalar-se no processo de globalização de forma adequada,

o Brasil adotou transformações neoliberais, com um novo complexo de

reestruturação produtiva, com casos de inovações tecnológico-organizacionais,

que aumentaram de forma significativa a produção, mas que atingiram, em maior

ou menor grau, o mundo do trabalho. O período liberal impulsionado pelo governo

brasileiro instaurou medidas capazes de atrair investimentos de capitais, como a

estabilização da moeda em meados da década de 90.

Acentua-se neste período o fenômeno da terceirização da produção e da

mão de obra, com desconcentração operária (o que trouxe maior facilidade nas

negociações coletivas), maior capacidade das empresas de suportar alterações

das suas produções (flexibilidade produtiva) e a redução dos custos

administrativos da produção.

Sobre a flexibilização sociolaboral vivida pelo Brasil nos anos 90,

POCHMAN analisa o resultado da reforma de caráter neoliberal na seguridade

social, na medida em que o acesso aos benefícios de aposentadoria torna-se

incerto e inalcançável para boa parte dos trabalhadores. A expansão do emprego

no Brasil na década de 90 se concentrou apenas em ramos de maior rotatividade,

82 FURTADO, Celso. Artigo publicado originalmente no Jornal Folha de São Paulo, em 1/12/96, p.3. - http://www.cefetsp.br/edu/eso/globalizacao/desafiosglob2.html.

43

impulsionando uma nova legião de excluídos, o que chegou a comprometer

inclusive o próprio financiamento da seguridade social. 83

A partir do plano real de 1994, observou-se o crescimento de investimentos

externos diretos no Brasil, mas sem a promessa de novos empregos industriais,

sendo que o investimento produtivo foi intenso em capital e não em postos de

trabalho.

A competitividade mundial, decorrente dos processos de globalização nos

âmbitos econômicos, políticos e tecnológicos, estabelece a desenfreada

competitividade entre os países que, na procura de atrair novos postos de

trabalho, precarizam todas as demais atividades laborais.

2.4- Reestruturação produtiva

Com a mundialização do capital, desenvolveu-se um novo complexo de

reestruturação produtiva. O aumento da intensidade das novas estratégias das

multinacionais nos anos 80 implicou a adoção por parte das subsidiárias no Brasil,

de padrões organizacionais tecnológicos, inspirados no toyotismo japonês.

Esses padrões de produção caracterizam-se pela flexibilidade do trabalho

(variação de intensidade do trabalho, salários participativos, horários e locais de

realização indeterminados), com objetivo de instaurar, de modo organizado e

métodos predefinidos (toyotismo sistêmico), a acumulação flexível.84

Uma das principais características do modo de produção toyotista é a

descentralização produtiva, estabelecida pelo processo de terceirização e pela

deslocalização industrial, e que nas palavras de Giovani Alves, debilita a classe

83 POCHMANN, Marcio – Flexibizaciòn sociolaboral. Lo que aprendió el Brasil em lós anos noventa – Revista Internacional Del Trabajo, vol. 128 (2009), num 3, p. 309, artigo p. 296-310 – Cita ainda o Autor que o abandono atual de projeto de sociedade neoliberal abre novas possibilidades para a reconstrução de um regime de bem estar social e laboral, sendo que os indicadores sócio econômicos assinalam melhoras importantes, mas ainda insuficientes para compensar a população do sofrimento acumulado durante os anos de neoliberalismo. 84 ALVES, Giovanni – O novo (e precário) mundo do trabalho – Reestruturação produtiva e crise do sindicalismo; Boitempo Editorial, São Paulo – 1ª edição: setembro de 2000; 1ª reimpressão: setembro de 2005, p. 232.

44

trabalhadora, não apenas de forma objetiva, pois precariza a atividade produtiva

do trabalhador (menores salários, piores condições de trabalho na busca de maior

produtividade e eficiência), mas também subjetiva, por meio da perda da

consciência de classe.85

Para compreensão dos diferentes padrões de produção, no modelo do

taylorismo/fordismo, o trabalhador atua em única unidade de produção, com

atividades de forma repetitiva, rápida e estressante, com categorias profissionais

definidas de trabalhadores pouco qualificados e gerenciamento centralizado

verticalmente na pessoa do superior hierárquico. A ideia do taylorismo foca na

racionalização do trabalho, com divisões e funções específicas, sendo

desnecessário o conhecimento de todo o processo produtivo pelos trabalhadores.

Apenas o gestor da unidade econômica dispõe do conhecimento acerca da

totalidade do processo produtivo, incumbindo-lhe, por conseguinte, a fiscalização

do tempo destinado à produção.

Ressalta Cristophe Dejours que o sistema taylorista acaba por retirar do

trabalhador o conhecimento acerca do ofício, atribuindo-lhe apenas tarefas

esparsas e desconexas. O trabalhador, desse modo, não vê sentido na produção,

deixa de integrar e participar da organização do trabalho. Paralelamente, o

empregador efetua rigorosa vigilância sobre a pessoa do trabalhador, tanto no

local de trabalho, quanto fora dele de forma que restem apenas trabalhadores

dóceis e isolados, desprovidos de quaisquer iniciativas. 86

A relação de trabalho do modelo fordista se assenta na duração

indeterminada com garantia do vínculo de emprego, na unicidade do empregador

sem a necessidade da presença de empresas subsidiárias ou terceirizadas e

estabilidade remuneratória e temporal do trabalho.

Os novos métodos de produção de mercadorias a partir do toyotismo

estabeleceram novas bases de administração da produção e da gestão da força

de trabalho e, vieram caracterizados pelos métodos de trabalho como

automação/auto ativação, just-in-time/Kanban, CCQ´s e programas de qualidade

85 Ib., p. 9. 86 DEJOURS, Cristophe, 1949 – A loucura do trabalho: estudo da psicopatologia do trabalho; tradução de Ana Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira – 5ª Ed. Ampliada – São Paulo: Cortez – Oboré, 1992, p. 42.

45

total e pela terceirização de atividades, inclusive de forma globalizada, com

incansável objeto de redução de custos sociais.87

Se o taylorismo/fordismo procurou resolver a eficiência da produção por

meio da parcelização e da repetitividade do trabalho, o toyotismo buscou eficiência

por intermédio da desespecialização dos trabalhadores qualificados, com

instalação de polivalência e da multifucionalidade dos homens e das máquinas.88

Enquanto o fordismo procura a integração dos trabalhadores na economia

capitalista por meio do consumo proveniente do aumento de salário, a

financeirização atual do capital, que já torna prescindível o produto do trabalho

assalariado, faz com que o toyotismo e seus métodos de acumulação flexível não

tragam nenhuma compensação ou atrativo para os trabalhadores, que observam a

crescente precarização das suas relações de trabalho.

Giovani Alves afirma que é a flexibilidade da força de trabalho que expressa

a necessidade imperiosa de o capital subsumir – ou ainda, submeter e subordinar

– o trabalho assalariado à lógica da valorização, pela perpétua sublevação da

produção (e reprodução) de mercadorias (até, e principalmente, da força de

trabalho).89

É por isso que a acumulação flexível se apoia, sobretudo, na flexibilidade

dos processos de trabalho (e, ainda, dos produtos e padrões de consumo).

As grandes empresas, principalmente as transnacionais, passaram a adotar

o sistema toyotista, em busca de maior eficiência e competitividade. O novo

trabalhador, multiqualificado e polivalente, torna-se o responsável pela realização

de inúmeras tarefas, para que durante a sua jornada de trabalho, tenha a

capacidade de prestar os seus serviços com a flexibilidade exigida pela empresa,

para a sua manutenção competitiva.

As noções de crise do contrato social, crise do Estado Providência e de

crise da relação salarial fordista são os indicadores privilegiados deste período em

87 ALVES, Giovanni – O novo (e precário) mundo do trabalho – Reestruturação produtiva e crise do sindicalismo; Boitempo Editorial, São Paulo – 1ª edição: setembro de 2000; 1ª reimpressão: setembro de 2005, p. 41. 88 Ib., p. 39. 89 Ib., p.25.

46

que se iniciaram significativas transformações, chamadas como “o futuro do

trabalho”, gerado como crise do trabalho assalariado.90

Esta nova fase, chamada por Rifkin de a terceira revolução industrial,

também é o resultado do surgimento de novas tecnologias, como o

processamento de dados, a robótica, as telecomunicações e outras formas de

automação. Aos poucos as máquinas substituem os trabalhadores.91

O sistema toyotista gerou forte impacto na organização sindical brasileira, e,

consequente, na organização do trabalho portuário.

3 - REFLEXOS NO MODELO SINDICAL BRASILEIRO E NA

ORGANIZAÇÃO PORTUÁRIA

3.1 – Crise do sindicalismo e reflexos no trabalho portuário

brasileiro

Em vista das novas características dos sistemas de trabalho, surgem

fenômenos associados ao recuo da voz coletiva, a descoletivização e ao

esvaziamento e precarização da estrutura contratual em que se fixava o modelo

fordista de relação de trabalho.

A transformação dos métodos de produção e de especialização flexível

colocam em xeque as organizações tradicionais e o emprego formal, trazendo às

empresas mais autonomia nos planos de gestão de pessoal, atribuindo

essencialmente uma maior importância à dimensão individual, caracterizada

90 SANTOS, Boa Ventura Santos (org),A Globalização e as ciências Sociais FERREIRA, António Casimiro Ferreira –– Para uma concepção decente e democrática do trabalho e dos seus direitos: (Re)pensar o direito das relações laborais -2. Ed – São Paulo, Cortez, 2002, p. 266. 91 RIFKIN, Jeremy. O fim dos empregos: o declínio inevitável dos níveis dos empregos e a redução da força global de trabalho. Tradução: Ruth Gabriela Bahr. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2001, p. 12/14.

47

muitas vezes por prêmios seletivos de produtividade, assiduidade e outras

retribuições não convencionais.

Estas tendências concorrem para que as ações sindicais e os contratos

coletivos de trabalho típicos percam a sua centralidade e importância, sendo

substituídos por negociações informais e interpessoais ou fórmulas contratuais

tendencialmente de natureza “civilista” aceitas preferencialmente em relações que

envolvem trabalhadores altamente especializados e qualificados. 92,

Nas relações industriais, os fenômenos da segmentação e dualidade dos

mercados de trabalho contribuíram para a dificuldade de organização de relações

de trabalho atípicas, que resultaram em uma descentralização e tendo como

resultado o enfraquecimento das estruturas de negociação coletiva.

O recuo dos empregos no setor industrial, o aumento do setor de serviços,

a precarização dos vínculos contratuais e o aumento do desemprego, contribuem

também para a desestruturação de pactos coletivos de trabalhadores, com

reduções significativas de sindicalizações93.

O aumento do desemprego, dos macjobs94 ou dos workingpoor95, afeta

muitas vezes os trabalhadores que têm a oportunidade de um emprego estável.

Com a fragmentação da classe operária, surgem novos modelos de classe menos

institucionalizadas, com contextos menos corporativistas.96

Esta classe menos favorecida parece emergir sempre que a flexibilidade da

relação laboral é entendida de forma unilateral, como o ajustamento dos recursos

92 SANTOS, Boa Ventura Santos (org),A Globalização e as ciências Sociais FERREIRA, António Casimiro Ferreira –– Para uma concepção decente e democrática do trabalho e dos seus direitos: (Re)pensar o direito das relações laborais -2. Ed – São Paulo, Cortez, 2002, p. 274. 93 A designada “crise do movimento sindical” encontra algum fundamento nos dados sobre a evolução da sindicalização e dos conflitos laborais. Após o período de forte mobilização coletiva dos trabalhadores, nos anos 60 e 70, sucedeu-se um período cuja evolução foi de sentido inverso nos anos 80 e 90. Os movimentos sindicais, dos 18 países da OCDE, sofreram uma erosão estimada em 5 milhões de membros, tendo a proporção de assalariados sindicalizados decrescido 7 pontos percentuais relativamente a população ativa. A queda das taxas de sindicalização ocorre na quase totalidade dos países da União Européia, fato que reconhecido pela Comissão Européia (Id.). 94 Gíria, comumente utilizada em países de língua inglesa, para se referir a empregos de baixo salário, baixo prestígio, que requerem poucas habilidades e possibilidades de crescimento profissional. 95 Trabalhadores pobres não inseridos no mercado de trabalho. 96 Ib., p. 258.

48

humanos às flutuações do mercado e não de forma bilateral, como conciliação

entre liberdade de empreender e a liberdade de trabalhar97.

O trabalho portuário também sofre os reflexos da reestruturação produtiva e

da fragilização da estrutura sindical.

3.2 - A concertação dos sindicatos em face dos novo s métodos

produtivos adotados

A consolidação do modelo toyotista no Brasil, produto da nova ofensiva do

capital no sistema de produção, ocorreu com maior força e eficiência a partir da

década de 90.

A característica sindical predominante a partir deste momento passou a ser

aquela que atuava somente sobre os fatos consumados, procurando a negociação

coletiva apenas para minimizar impactos.

A postura de resistência ocorria na medida em que não se conseguia

intervir nos projetos empresariais já planejados, definidos e em execução, e que

não tinham a participação do operariado.

Outras posturas, como aquela que se “recusa a gerir o capitalismo”98 ou

aquela de caráter propositivo (também chamado de ‘novo sindicalismo’),

caracterizada pela negociação antecipada diante do processo de reestruturação

produtiva, demonstram a crise do sindicalismo, que atesta a sua incapacidade de

preservar o seu poder de resistência de classe, diante da ofensiva do capital na

produção e do surgimento de um precário mundo do trabalho.

Esta nova posição política das lideranças sindicais contribuiu para o avanço

do novo complexo de reestruturação produtiva, confirmando a incapacidade de

ação dos sindicatos contra as inovações técnico-organizacionais predatórias à

classe trabalhadora, e fazem com que o sindicalismo atue somente de forma

defensiva, abdicando de pleitear o controle da produção capitalista. 97 Ib., p. 274. 98 ALVES, op. cit., denomina como ‘esquerda radical’.

49

Análises sobre o sindicalismo no Brasil e no mundo têm mostrado um futuro

sombrio para as entidades de trabalhadores. Dentre as causas da crise são

citados o desemprego, o encolhimento das empresas, a terceirização, o avanço

tecnológico, a privatização, a desindustrialização, a globalização e a presença da

mulher no mercado de trabalho. Isso tem enfraquecido o poder de fogo dos

sindicatos junto às empresas. Os indicadores utilizados são a descentralização

das negociações, as concessões salariais, a perda de filiados e o enfraquecimento

financeiro.99

A ação sindical percebe que o declínio do número de empregos em razão

da acumulação flexível e da inovação tecnológica tem fragilizado a resposta

organizada dos trabalhadores e que o movimento sindical vem enfrentando sérias

dificuldades para reagir e procurar estancar, pelo menos parcialmente, a perda de

postos de trabalho.

Os novos métodos de trabalho ancorados pela tecnologia reforçam as

oportunidades de redução do quadro assalariado, sem provocar qualquer impacto

negativo na produção. Muito ao contrário, os novos equipamentos obrigam os

trabalhadores a acompanhar seu ritmo, alcançando níveis expressivos de

produtividade, sem que o ‘novo sindicalismo’ tenha a possibilidade de dividir os

ganhos da automação com a classe trabalhadora.

Tal princípio inclusive está descrito no inciso XXVII, do artigo 7º, da CF

(proteção contra a automação), que não consegue ser pleno em razão da gritante

disparidade das categorias econômicas e profissionais atuantes no Brasil.

ALVES denomina a postura sindical de caráter propositivo como

“defensivismo de novo tipo”, afirmando que é plena a captura da consciência

operária pela consciência contingente da classe.100

As entidades sindicais não reunindo os elementos indispensáveis e

necessários para uma negociação “à altura” do capital, em razão da perda de

consciência de classe, desespecialização e descentralização das atividades

99 PASTORE, José. “Um novo Sindicalismo” Disponível no site oficial do Autor, acesso em 11/08/2012 - http://www.josepastore.com.br/artigos/rt/rt_144.htm. 100 Op. cit., p. 325.

50

(terceirização), mantêm a estrutura sindical moribunda e sequer com capacidade

de viés propositivo.

Este panorama também é refletido no mundo do trabalho portuário.

Segundo NASCIMENTO, a globalização da economia, as mudanças

verificadas na esfera dos mercados e o surgimento de novas tecnologias que, sob

diversos aspectos atuam como poupadores de mão de obra, configuram-se como

fatores que uma vez conjugados passam a requerer profundas transformações

nas estruturas do setor portuário.101

Transformações essas que passam não apenas pela questão das melhorias

na infraestrutura dos portos, mas também pela revisão das legislações trabalhistas

que regulam as relações de trabalho no seguimento.

3.3 - Reflexos da reestruturação produtiva no traba lho portuário

brasileiro e o Projeto de Lei 8/1991

Os ventos globalizantes e neoliberais ocorridos no Brasil com maior

intensidade, a partir da década de 90, começaram a soprar também no âmbito

portuário, com decisivo reflexo nas relações laborais existentes.

O processo de reforma no setor portuário nacional iniciou-se no período

posterior aos governos militares, sob um contexto maior de reforma do Estado

brasileiro.

Tal contextualização de reforma teve início, em 1985, no Governo de José

Sarney, cuja preocupação maior era na obtenção de consenso político em razão

da transição democrática que o país passava, e teve diversas pautas de reformas

não aprovadas, como a da administração pública e a agrária.

101 NASCIMENTO, Hiata Anderson Silva. O nascimento de um novo trabalhador portuário. Reestruturação produtiva e corporativismo: um estudo sociológico acerca da resistência dos portuários capixabas ao processo de modernização dos portos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Orientadora: Prof. Dra. Gilda Figueiredo Portugal Gouvêa), Campinas, 1999.

51

Mesmo assim, foram levados adiante projetos de desestatização, como o

Decreto nº 91.991/85102 (programa de privatização) e o Decreto nº 95.886/88103,

que instituiu o Programa Federal de Desestatização.

Um projeto de característica mais privatizante surgiu no Governo de

Fernando Collor de Mello, a partir de 1990. Neste período, foram realizadas as

privatizações de empresas dos setores siderúrgico, petroquímico e de fertilizantes,

cujo consenso de privatização era mais efetivo.104

Em 12 de abril de 1990, foi promulgada a Lei 8.031, criando o Programa

Nacional de Desestatização (PND) e, menos de um ano depois, entra em

tramitação no Congresso Nacional o PL 8, de 25 de fevereiro de 1991, que

dispunha sobre a reforma do setor portuário nacional.105

Com efeito, o PL 8/1991, originário da Lei 8.630/93, continha apenas 11

artigos e contemplava a livre iniciativa dos agentes na contratação de mão de obra

e a flexível possibilidade de descentralização da exploração portuária e

desestatização das instalações de interesse da iniciativa privada.

A livre possibilidade de contratação e negociação de mão de obra também

se encontraram nas idéias originárias da lei, tendo sido estabelecido um consenso

entre os empresários do setor, quanto à necessidade de eliminar gradualmente o

monopólio dos trabalhadores portuários sobre a gestão da mão de obra, a

concessão de liberdade nos terminais privados e a privatização dos portos

públicos.

O PL 8/91 não contemplava os interesses dos TPA, excluídos inicialmente

da pauta de discussão do projeto. De forma tardia, os sindicatos profissionais

passaram a lutar pelo abrandamento das propostas estabelecidas originalmente

no PL.

102 Dispõe sobre o processo de privatização de empresas sob controle direto ou indireto do Governo Federal, e dá outras providências. 103 Dispões sobre o Programa Federal de Desestatização e dá outras providências. 104 DIÉGUEZ, Carla Regina Mota Alonso. De OGMO (Operário Gestor de Mão de Obra) para OGMO (Órgão Gestor de Mão de Obra): modernização e cultura do trabalho no porto de Santos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (Orientador: Prof. Dr. Iram Jácome Rodrigues), São Paulo, 2007, p. 45. 105 Id.

52

Quanto à quebra do monopólio das entidades sindicais, o PL previa que a

organização do trabalho fosse transferida para os operadores portuários. Desse

modo, os trabalhadores avulsos poderiam ser contratados pelos operadores

portuários por meio de ente denominado OGMO, responsável também pela

manutenção do cadastro e do registro dos trabalhadores portuários. Assim, as

instituições sindicais estariam enfraquecidas pela perda do poder na

administração da mão de obra portuária.

Após dois anos de intensos debates, inclusive com constantes greves no

setor portuário nacional, em 23 de fevereiro de 1993, foi promulgada a Lei 8.630,

com a composição final de 76 artigos, criação de novos agentes portuários (como

OGMO, CAP e Administração do Porto Organizado), a manutenção parcial do

monopólio de mão de obra e o acréscimo de infrações e penalidades, com a

finalidade de contemplar interesses diversos.106

Restaram preservadas no novo regramento de Modernização dos Portos,

as questões relativas as tarifas, terminais privados de carga e descarga e

organização do trabalho, verdadeiros alicerces do PL.

A partir da promulgação da Lei 8.630/93, a luta passou a ser por sua

implementação, como constituir e estabelecer em cada porto organizado o OGMO

e o CAP, privatizar os terminais; enfim, colocar o setor portuário na economia

globalizante de mercado.107

Com isso, traços marcantes do toyotismo são verificados na Lei 8.630/93,

como no artigo que obriga o OGMO a promover a formação e o treinamento

multifuncional do trabalhador portuário.

A lei também professa a implantação progressiva dos novos processos de

manipulação de cargas, para sucessivo aumento da produtividade, forçando por

meio da negociação coletiva a adoção a reestruturação produtiva.

Este novo panorama afetou sensivelmente a atividade portuária avulsa.

A precarização do trabalho portuário já era sentida com a adoção dos novos

métodos de transporte de cargas, que já causava devastação na quantidade de

vagas disponíveis no setor.

106 Ib., p. 51. 107 Ib., p. 52.

53

Sob este contexto, foi aprovada a Convenção 137, da OIT, ratificada pelo

Brasil pelo Decreto nº 1.574, de 31 de julho de 1995, relativa às Repercussões

Sociais dos Novos Métodos de Manipulação de Cargas nos Portos, com princípios

que pretendiam minimizar a inevitável redução e precarização dos postos de

trabalho existentes.

A desespecialização inclusive foi estimulada pela Recomendação 145 da

OIT, que trata também das repercussões sociais dos novos métodos de trabalho

na atividade portuária, sugestionando que na ocorrência de diminuição do número

de categorias especializadas, deveria ser observada a capacitação dos

trabalhadores para executarem um maior número de tarefas, inclusive com

supressão da distinção entre o trabalho de bordo e o trabalho de terra.

As características do modelo de produção toyotista se encontram presentes

também nesta Recomendação, com a sugestão aos países signatários do

abandono de práticas laborais obsoletas e racionalização do tempo de serviço

visando eliminar o tempo improdutivo, e estimulando que o cálculo das

remunerações seja realizado pela tonelagem, ou por outras formas baseadas na

produtividade.

A reação contrária adotada pelo movimento sindical portuário no Brasil

quanto à mudança de todo o panorama existente, foi de recusa ou resistência.

Referidas posturas reativas se mostraram inócuas com o passar do tempo,

visto que a ofensiva do capital demonstrou que a classe trabalhadora não poderia

resistir aos novos e modernos métodos de transporte, considerados como o futuro

dos portos, hoje traduzidos principalmente por embarcações no sistema “Roll on –

Roll off”108 e pela conteinerização109, do processo de carregamento e

descarregamento de cargas.

108 Os navios Roll-on/Roll-off, mais conhecidos como Ro-Ro, são navios em que sua carga entra e sai pelos seus próprios meios, através de rodas (como os automóveis, ônibus, caminhões, trailers,etc) ou, até mesmo sobre outros veículos.Como o nome Roll-on/Roll-off (rolar para dentro/rolar para fora) sugere, em navios dessa categoria, é possível carregar quase tudo que puder subir a bordo rodando através das rampas de popa (parte traseira do navio), de meia nau (mais ou menos o meio do navio) e até mesmo, menos comumente encontrado, pela proa (parte da frente do navio). 109A conteinerização pode ser conceituada como a utilização em massa do contêiner, caracterizado por unidades ou caixas de aço que são usadas no transporte de mercadoria, o que inclusive permitiu a homogeinização dos transportes de carga em nível mundial.

54

A conteinerização trouxe a padronização das mais diferentes cargas, sendo

possível a integração de diversas modalidades de transportes, aumentando a

segurança, diminuindo os riscos de danos, roubos ou avarias, bem como

facilitando os trâmites burocráticos para liberação e localização das cargas nos

pátios portuários.

A implementação da conteinerização acabou ocasionando a racionalização

das operações portuárias, com redução do tempo de carga e descarga das

mercadorias, e consequentemente das embarcações em cada porto, com redução

de custos e aumento da produtividade, elementos imprescindíveis nos novos

métodos de gestão da produção e do trabalho.

A classe trabalhadora, por sua vez, observa impotente a drástica redução

dos postos e das oportunidades de trabalho, fruto dos novos métodos de

transporte de cargas, decorrentes das inovações tecnológicas e da reestruturação

produtiva no âmbito portuário advindas do sistema toyotista.

Para contextualizar as profundas mudanças ocorridas no âmbito do trabalho

portuário brasileiro, o próximo Capítulo irá descrever de forma pormenorizada as

características da Lei 8.630/93, da Convenção 137 e da Recomendação 145 da

OIT.

55

CAPITULO II – CONTRADIÇÕES E CONVERGÊNCIAS

ENTRE A LEI 8.630/93 E A CONVENÇÃO 137 DA OIT E AS

REPERCUSSÕES NA ESTRUTURA SINDICAL

BRASILEIRA

1 – A ESTRUTURAÇÃO DO TRABALHO PORTUÁRIO A PARTIR

DA LEI 8.630/93

A partir da criação da Lei 8.630/93, foram introduzidos novos agentes no

sistema portuário brasileiro, com a incumbência de administrar, regular e

normatizar as atividades portuárias, incluída a mão de obra existente.

Surge o CAP e a Administração do Porto Organizado e, posteriormente por

meio da Lei 10.233/2001, a ANTAQ, com objetivo de fomentar a livre iniciativa e a

concorrência entre os entes privados, com observância do interesse público.

O trabalho portuário também passou a ser estruturado de forma diferente,

com a criação do OGMO em cada porto organizado, sendo o responsável pelo

gerenciamento do trabalho avulso requisitado pelos operadores portuários.

O reflexo das mudanças pretendidas pela lei de modernização dos portos

se fez sentir em todo o mundo do trabalho portuário, inclusive com medidas

conflitantes que a automação dos meios de transporte de carga trouxe com

aquelas relativas à proteção do trabalhador.

A tendência de falta de proteção ao trabalhador portuário pela implantação

da reestruturação produtiva no transporte marítimo e aquaviário, está prevista na

Convenção 137 e na Recomendação 145 da OIT, que sugerem medidas de

proteção ao trabalhador para amenizar a precarização do trabalho portuário.

O presente capítulo irá descrever os agentes envolvidos na atividade

portuária hodierna a partir da criação da Lei 8.630/93, a nova sistemática adotada

para o trabalho portuário, com destaque na limitação de categorias profissionais

56

envolvidas e medidas de integração por intermédio da implantação progressiva da

multifuncionalidade de atividades, que é decorrente da adoção de métodos de

trabalho advindos do sistema toyotista de produção.

1.1 – Ingerência do Estado na Relação de Trabalho P ortuário no

Brasil

1.1.1 – CAP – Descentralização da política portuári a

A lei de modernização dos portos criou e delegou o planejamento, a

normatização e a administração das atividades portuárias em atos do CAP e da

Administração do Porto organizado110.

O CAP, conforme a “lei dos portos”, tem atribuições e competências para:

baixar o regulamento de exploração, fomentar a ação industrial e comercial do

porto, zelar pelo cumprimento das normas de defesa da concorrência, assegurar o

cumprimento das normas de proteção ao meio ambiente111.

O CAP ainda é o responsável pela instituição de Centros de Treinamento

Profissional destinados à formação e ao aperfeiçoamento de pessoal para

exercícios de cargo e ocupações peculiares às operações portuárias112.

Este órgão é instituído em cada porto organizado, com funções

normatizadoras das atividades portuárias, inclusive com responsabilidade de julgar

em grau de recurso decisões emanadas pela Administração do Porto Organizado

e do OGMO113.

110 SOUZA JUNIOR, op. cit., p. 157, define o Conselho de Autoridade Portuária como um órgão colegiado deliberativo, constituído em cada região onde se encontre localizado um porto organizado ou no âmbito de cada concessão, com competência normativa, cabendo-lhe, dentro dos seus limites, apreciar e julgar recursos contra decisões da Administração do Porto 111 Artigo 30 da Lei 8.630/93. 112 Artigo 32 da Lei 8.630/93. 113 Artigo 41 da Lei 8.630/93.

57

Com o objetivo de implementar com maior eficiência a reestruturação

produtiva dos novos métodos de movimentação de carga, especialmente aqueles

decorrentes da conteinerização e do sistema roll on roll of, compete ao CAP

estabelecer normas que visem ao aumento da produtividade e à redução dos

custos das operações portuárias114.

O Conselho atua de forma consultiva, de regulação e de supervisão quanto

às atividades realizadas no porto, aos operadores portuários, arrendatários,

trabalhadores usuários do sistema.

O CAP é formado por blocos de membros do poder público, dos operadores

portuários e da classe de trabalhadores portuários e usuários do porto. As

modificações introduzidas pela Lei 8.630/93 residem na possibilidade de uma

gestão descentralizada e compartilhada com representantes do Poder Público e

aqueles diretamente interessados na atividade portuária115.

Por isso, o CAP tem voz dos segmentos interessados diretamente no

produto da atividade portuária: Poder Público, com três representantes dos

governos municipal, estadual e federal; operadores portuários, com quatro

representantes (administração do porto, armadores, terminais portuários privativos

e demais operadores); trabalhadores portuários, com quatro representantes; e

usuários dos serviços portuários e afins, com dois representantes dos

exportadores e importadores e dois dos proprietários de mercadorias.

A Lei dos Portos, ao criar o CAP, fez com que o sistema de gestão dos

portos nacionais se aproximasse dos moldes de gerenciamento dos portos dos

países mais industrializados, em que as questões relacionadas ao arrendamento

de terminais, alterações na jornada de trabalho, mudanças na forma de execução

das tarefas, são decididas a nível local, visando o atendimento máximo das

necessidades comerciais e comunitárias da região.116

114 Parágrafo 2º do Artigo 30 da Lei 8.630/93. 115 Artigo 31 da Lei 8.630/93. 116 NASCIMENTO, Hiata Anderson Silva. O nascimento de um novo trabalhador portuário. Reestruturação produtiva e corporativismo: um estudo sociológico acerca da resistência dos portuários capixabas ao processo de modernização dos portos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Orientadora: Prof. Dra. Gilda Figueiredo Portugal Gouvêa), Campinas, 1999, p. 54.

58

Essa descentralização da política portuária não afasta as obrigações do

governo federal em relação ao controle do sistema portuário, cabendo a ele a

função de manter a supervisão das atividades, com o objetivo de garantir as

mesmas condições de possibilidades à participação dos usuários, trabalhadores e

investidores privados117.

Para a classe trabalhadora portuária, a descentralização da política

representa um avanço, na medida em que transfere para a localidade portuária o

poder de decidir o seu próprio futuro, adotando mecanismo e alcances que

garantam o seu potencial de competitividade118.

Pode-se concluir que o CAP caracteriza-se por reunir nas suas atribuições,

finalidade regulatória dentro da sua respectiva competência no porto organizado,

sofrendo limitação de autonomia e independência na observância do interesse

público em razão da estrutura colegiada híbrida.

1.1.2 - Administração do porto organizado – Autorid ade portuária, com

características de poder de polícia

A Administração do Porto organizado, que antigamente era representada

pelas Companhias de Docas, é exercida diretamente pela União ou pela entidade

concessionária do porto organizado, com a competência dentro dos limites do

porto e dispostas na Lei 8.630/93.

Anteriormente à lei modernizadora, cada porto organizado era formado por

sua própria estrutura administrativa e cabia à Administração do Porto, a

117 Inciso I, Aline ‘a’ e inciso II do parágrafo 4º do artigo 31 da Lei 8.630/93. 118 Ib, p. 55. NASCIMENTO acrescenta que a descentralização visa ainda atingir os seguintes objetivos: alcançar a otimização da produtividade e da eficiência, favorecer a participação local nas tomadas de decisão, dar aos funcionários locais maior responsabilidade e nível de participação/inserção nos assuntos portuários, transferindo poderes e funções do nível central ao local, equilibrando os diversos interesses envolvidos; e por fim, possibilitar que as organizações públicas e privadas instaladas a nível local, não só realizem as operações diárias mas, que sejam capazes de planejar estratégias de ação para o futuro, obter capital para investimentos e fixar os preços dos serviços.

59

exploração da infraestrutura mediante pagamento de tarifa, fixada e reajustada

pelo Poder Público.

A competência da Administração do Porto era limitada à exploração dos

serviços, vedada à licitação, mas admitindo-se apenas o arrendamento de parte

do porto organizado.

Com a Lei 8.630/93, surgiu a ampliação das possibilidades de participação

da iniciativa privada na exploração dos serviços.

A Administração do Porto passou a figurar como autoridade portuária, com

características de poder de polícia, para exercício do controle, fiscalização e

coordenação das atividades de exploração dos serviços portuários, que

posteriormente teve parte destas atribuições transferidas à ANTAQ.

Foi delegada à Administração Portuária a responsabilidade em organizar e

regulamentar a guarda portuária, a fim de prover a vigilância e segurança do porto

e com a finalidade de agilizar a fiscalização e a liberação das pessoas,

embarcações e mercadorias119.

Como autoridade portuária, a Administração do Porto tem como

competência, dentro dos limites da área do porto organizado, o cumprir e fazer

cumprir as leis, regulamentos e as cláusulas do contrato de concessão, pré-

qualificar operadores portuários, fixar e arrecadar tarifas portuárias, fiscalizar

obras de construção e as operações portuárias, inclusive podendo determinar ou

aplicar as penas dentro do seu limite de competência120.

A autoridade portuária ainda atua em conjunto com a autoridade aduaneira

(com funções de controlar a entrada e saída de pessoas, bens e veículos, bem

como o despacho aduaneiro de mercadoria e a repressão ao contrabando e

descaminho, executada pela Receita Federal)121.

A Administração do Porto atua também em parceria com a autoridade

marítima (responsável pela segurança do tráfego aquaviário, com competências

119 Parágrafo 4º do artigo 33 da Lei 8.630/93. 120 Artigo 33 da Lei 8.630/93. 121 Inciso II do parágrafo 5º, do artigo 34 da Lei 8.630/93.

60

nas inspeções nas embarcações, realizada pela Diretoria de Portos e Costas,

vinculada à Marinha)122

E também atua em conjunto com a autoridade sanitária (exercida pelos

inspetores de vigilância sanitária, com a finalidade de garantir condições de

higiene a bordo dos navios e do estado sanitário de seus passageiros e

tripulantes)123.

No que se refere aos trabalhadores das administrações portuárias, o regime

de trabalho adotado é regulado pela Lei 4.860, de 26 de novembro de 1965. Fica

evidente na lei a qualificação deste órgão como autoridade máxima dentro da

“área do porto”124.

Referida legislação estabelece o horário de trabalho nos portos

organizados, para todas as categorias de servidores ou empregados, fixados pela

respectiva Administração do Porto, de acordo com as necessidades de serviços e

as peculiaridades de cada local.

A legislação que dispõe sobre o regime de trabalho nos portos organizados

ainda estipula os limites de horário das atividades portuárias dos empregados ou

servidores operacionais e administrativos, com fixação também de porcentuais de

horas extraordinárias de forma progressiva.

Conveniente salientar que anteriormente à Lei 8.630/93, a atividade

portuária avulsa dos serviços de capatazia era supletiva dos empregados ou

servidores efetivos da Administração do Porto.

Em caso de maior demanda ocasional de serviço, ficaria a Administração

do Porto autorizada a engajar a necessária força complementar nos trabalhos de

122 Inciso II do parágrafo 5º, do artigo 34 da Lei 8.630/93. 123 Artigo 3º da Lei 8.630/93. 124 Art 1º Em todos os portos organizados e dentro dos limites fixados como "área do porto", a autoridade responsável é representada pela Administração do Porto, cabendo-lhe velar pelo bom funcionamento dos serviços na referida área. Parágrafo único. Sob a denominação de "área do porto" compreende-se a parte terrestre e marítima, contínua e descontínua, das instalações portuárias definidas no art. 3º do Decreto nº 24.447, de 22 de junho de 1934. Art 2º As demais autoridades que exercerem atividades dentro da "área do porto", pertencentes a qualquer órgão do Serviço Público, seja êle Federal, Estadual ou Municipal, excetuado o Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis, não poderão determinar medidas que afetem a realização dos serviços portuários e outros correlatos, sem o prévio conhecimento e concordância da Administração do Pôrto.

61

capatazia, sem vínculo empregatício, dispensando-a tão logo cesse essa

demanda ocasional.

A Lei 4.860/65 estabelece aos seus empregados ou servidores e, a fim de

remunerar os riscos relativos à insalubridade, periculosidade e outros porventura

existentes, a instituição do "adicional de riscos" de 40% (quarenta por cento), que

incidirá sobre o valor do salário-hora ordinário do período diurno e substituirá

todos aqueles que, com sentido ou caráter idêntico, vinham sendo pagos125.

1.1.3 – Estado regulador no domínio portuário

A figura do Estado Regulador no âmbito portuário mostrou-se

definitivamente por meio da agência reguladora ANTAQ, que exerce

características de intervenção econômica neste segmento.

Os principais protagonistas que sofrem a ingerência estatal na atividade

portuária concentram-se nas figuras dos Operadores Portuários, dos Arrendatários

de instalações portuárias de uso público ou privativo (exclusivo ou misto), e dos

OGMO.

A Lei dos Portos criou a possibilidade de descentralização das atividades

portuárias para a iniciativa privada, por meio de regimes de autorização,

concessão e permissão dos serviços públicos.

Isso com o objetivo de construção, total ou parcial, conservação, reforma,

ampliação, melhoramento e exploração de instalações portuárias (novas ou já

125 É entendimento majoritário que os trabalhadores portuários avulsos não têm direito ao adicional de risco. A não ser que o benefício seja definido em negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores avulsos e dos operadores portuários. As Orientações Jurisprudenciais n. 316 e n. 402 do TST, caminham neste sentido. 316. PORTUÁRIOS. ADICIONAL DE RISCO. LEI Nº 4.860/65 ( DJ 11.08.2003) - O adicional de risco dos portuários, previsto no art. 14 da Lei nº 4.860/65, deve ser proporcional ao tempo efetivo no serviço considerado sob risco e apenas concedido àqueles que prestam serviços na área portuária. 402. ADICIONAL DE RISCO. PORTUÁRIO. TERMINAL PRIVATIVO. ARTS. 14 E 19 DA LEI N.º 4.860, DE 26.11.1965. INDEVIDO. (mantida) – Res. 175/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 - O adicional de risco previsto no artigo 14 da Lei nº 4.860, de 26.11.1965, aplica-se somente aos portuários que trabalham em portos organizados, não podendo ser conferido aos que operam terminal privativo.

62

existentes) e na prestação direta de serviços por operadores portuários

previamente qualificados.

A necessidade de oferecer à iniciativa privada, atividades de titularidade do

Estado para exploração portuária, é resultado da ineficiência da administração nos

serviços de infraestrutura e nos investimentos (ou falta deles) contínuos de

tecnologia exigidos no setor. Por se tratar de atividades privativas do Estado,

merecem controle especial126.

Referida descentralização do Estado tem escopo subsidiário, que para

GABARDO significa ‘privatização’ no tocante à organização estatal e relativo ao

exercício das atividades públicas.127

Embora seja comum a ligação entre as ideias de subsidiariedade e

desenvolvimento, no Brasil não seria correto o reconhecimento desta relação. A

ordem econômica encontrada na Constituição de 1988 não consagrou a

subsidiariedade como princípio, apesar de alguns autores identificarem,

implicitamente, a sua previsão constitucional.128

Portando, a ideia criada de Estado Mínimo, que descentraliza boa parte das

atividades privativas do Estado, leva-o a criar diversos mecanismos de controle,

que relativo ao trabalho portuário, são materializados principalmente pelos órgãos

anteriormente descritos.

Estes inúmeros mecanismos de controle levam a situação a um paradoxo, o

que leva crer que o Estado, sendo confesso na sua incapacidade de empreender

126

Conforme palavras de QUEIROZ DE ANDRADE já a regulação exercida sobre atividades monopolizadas pelo Estado, mas que são prestadas pela iniciativa privada, afeta, de modo direto, apenas os prestadores de tais atividades, não é exercida sobre a sociedade como um todo. Seu alvo são os indivíduos que se encontram na condição de prestadores de atividades públicas, ou melhor, a atividade por eles desempenhadas, que não está no campo da livre iniciativa privada, mas, ao contrário, insere-se no campo das competências atribuídas ao Poder Público, conforme consta do artigo 175 da Constituição. É evidente que quando a atividade é de titularidade monopolizada pelo Estado a intensidade da regulação é muito maior: primeiro, porque a decisão de exercer ou não tal atividade não depende apenas da iniciativa privada, pois é necessário que o Poder Público lhe outorgue um título jurídico autorizativo; segundo, porque a atividade continua sendo pública, ainda que prestada por um particular, o que acarreta inúmeras outras consequências. DE ANDRADE, Letícia Queiroz. Regulação e poder de polícia: distinções conceituais juridicamente relevantes. In: PIRES, Luis Manuel Fonseca; ZOCKUN, Maurício. Intervenções do estado. São Paulo : Quartier Latin, 2008, p 64. 127

GABARDO, Emerson. Interesse público e subsidiariedade. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 37. 128 Id.

63

atividades inerentes a sua condição, possa agir com eficiência na fiscalização das

atividades descentralizadas?

Para Neves, há um dever constitucional e não uma faculdade do Estado na

atividade regulatória de setores estratégicos da economia, cuja legalidade

muitas vezes é questionada, por somente haver previsão na CF explicita

das agentes reguladoras ANATEL e ANEEL.129

Informa o autor que aqueles que defendem a constitucionalidade

apenas das agências reguladoras acima especificadas, não se valem do

preceito constitucional do art. 174 caput da CF. Todas as agências já criadas e

as que ainda o serão tem previsão constitucional, haja vista que a norma citada

tem caráter geral, quando diz "agente normativo e regulador da atividade

econômica".130

Com o advento da Lei 10.233, de 5 de junho de 2001, que dispõe sobre a

reestruturação dos transportes aquaviários, foi criada a ANTAQ, agente de

regulação do setor portuário e aquaviário nacional, e é submetida ao regime

autárquico especial e vinculada ao Ministério do Transporte.

A ANTAQ é caracterizada pela independência administrativa, autonomia

financeira e funcional, com mandato fixo de seus dirigentes de maneira

escalonada e área de atuação.

A independência das agências reguladoras, reflexo dos tempos atuais, é

tratada como elemento essencial para a construção de uma estrutura propícia ao

fomento de setores econômicos específicos.

A intervenção regulatória estatal no setor portuário é inevitável, e a

realidade de determinados segmentos estratégicos nacionais demonstra o

perfil regulatório do Estado e a ampliação da atuação da iniciativa privada

nestes setores.131

Em vista da importância da atividade portuária para o crescimento

econômico nacional e das tipicidades dos monopólios legais e naturais,

129 NEVES, Rodrigo Santos - Função Normativa e Agências Reguladoras – Uma contribuição a teoria dos sistemas à regulação jurídica da economia – Editora Lúmen Júris, Rio de Janeiro 2009. 130 Id. 131

SOUZA JUNIOR, Suriman Nogueira de. Regulação portuária: a regulação jurídica dos serviços públicos de infra-estrutura portuária no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 27.

64

levam o Estado a intervir para desenvolvimento do setor portuário, aplicando

as formas disponibilizadas pelo ordenamento econômico.132

A lei de modernização dos portos por meio do CAP, por si só não foi

capaz de fomentar as atividades aquaviárias de interesse nacional.

Foi necessária a criação da ANTAQ para o desempenho desta função,

que tem objetivos específicos, conforme Lei 10.233/2001, dentre os quais a

implementação das políticas formuladas pelo Estado, regular o setor, garantir

a eficiência do serviço e harmonizar a concorrência, com observância do

interesse público.

A ANTAQ tem as competências definidas na Lei 10.233/2001, inclusive se

sobrepondo àquelas destinadas ao CAP e da própria administração do Porto

Organizado, com o poder de indicar o presidente do citado Conselho e substituir-

se ao Ministério competente na análise recursal de interessados na construção e

exploração portuária mediante processo licitatório133.

A necessidade normatizadora da agência reguladora é essencial para a sua

atuação, na medida em que a produção normativa das agências é condição sine

quan non para sua atuação efetiva no mercado.134

A produção jurídica convencional realizada pelo legislativo é muito lenta e

não acompanha a dinâmica dos mercados, sendo necessárias tomadas de

decisões conjunturais que podem ser exercidas pela agência, limitadas a

conteúdos relativos a matérias técnicas.135

E esse poder é atribuído às agências por meio da deslegalização, que

institucionaliza o reenvio das normas produzidas pelas agências ao ordenamento

jurídico estatal.136

132 Id. 133 Artigo 27 - § 3º O presidente do Conselho de Autoridade Portuária, como referido na alínea a do inciso I do art. 31 da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, será indicado pela ANTAQ e a representará em cada porto organizado. § 4º O grau de recurso a que se refere o § 2º do art. 5º da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, passa a ser atribuído à ANTAQ. 134 NEVES, Rodrigo Santos - Função Normativa e Agências Reguladoras – Uma contribuição a teoria dos sistemas à regulação jurídica da economia – Editora Lúmen Júris, Rio de Janeiro 2009. 135 Id. 136 Id.

65

Exemplo paradigmático quanto à influência dos atos decisórios da ANTAQ

nos reflexos do trabalho portuário foi o julgamento, que tinha como parte

interessada a empresa Portonave S/A – Terminais Portuários de Navegantes137.

A agência reguladora ao impor infração à empresa, operadora do terminal

de uso privativo misto do Porto de Navegantes, em Santa Catarina, advertiu que a

autorização concedida tinha indícios de desvirtuamento quanto à natureza das

cargas movimentadas, se próprias ou de terceiros.

Isto porque a Lei 8.630/93 obriga de forma prioritária a utilização da mão de

obra de trabalhadores matriculados junto ao OGMO, nas atividades portuárias em

terminais públicos (aqueles que operam cargas de terceiros), não sendo

necessária a utilização de trabalhadores junto ao OGMO nos terminais privativos

(que operam cargas próprias ou de terceiros), como é o caso da Portonave.138

Referida empresa portuária autuada, segundo constatação da agência

reguladora, sob o manto de terminal de uso privativo misto, atuava efetivamente

em concorrência direta com os terminais públicos, causando flagrante

desequilíbrio à livre concorrência do setor139, distorcendo sua natureza de terminal

de uso privativo misto, criando uma assimetria regulatória e, consequentemente

concorrencial140.

137 BRASIL, ANTAQ - Acórdão n. 08-2010 - ANTAQ PROCESSO: 50300.001413/2008-61, 50303.000175/2008-46 e 50300.001984/2007-14 138 Parágrafo 2º do artigo 4º, da Lei 8.630/93. 139 Conveniente salientar que a Resolução n.º 1.660 da ANTAQ, aprova a norma para outorga de autorização para a construção, exploração e ampliação de terminal portuário de uso privativo, revogando a Resolução n.º 517, e reforçando a necessidade de contratação de mão de obra junto ao OGMO quando constatada irregularidade do trabalho portuário, com publicação no Diário Oficial da União do dia 12 de abril de 2010. Resolução retirada dp sítio www.antaq.gov.br Art. 31. A ANTAQ poderá determinar à Autorizada a contratação compulsória de mão-de-obra junto ao OGMO quando identificar a existência de precarização de mão-de-obra, de conflito de âmbito concorrencial – ou a sua potencialidade –, entre o terminal de uso privativo misto e a zona de influência do Porto Organizado 140 A decisão da agência reguladora sobre o assunto manifesta em dois itens específicos: 4) pela enfatização que, para a perpetuação da outorga da PORTONAVE, será imprescindível a movimentação de carga própria que justifique o empreendimento para autorização do terminal de uso privativo misto, ou seja, esta deve ser suficiente, sob pena de desfigurar o fim pelo qual a Administração Pública, por meio de delegação do serviço, autoriza terceiros à execução ora pretendida, conforme se depreende do art. 12 da Resolução nº 517-ANTAQ. 5) Para que, tão logo a decisão judicial em curso no âmbito do TRF1 seja prolatada, esta Agência Reguladora instaure procedimento administrativo contencioso em desfavor da interessada, a fim de apurar as irregularidades pertinentes à mão-de-obra, objeto do presente PAC, presente no processo em apenso nº 50300.001984/2007-14. Para tanto, determino que a PRG acompanhe,

66

A multa e as advertências aplicadas pela agência reguladora fizeram à

empresa portuária Portonave ceder em outro “front”, em que se discutia perante a

Justiça do Trabalho, Ação Civil Pública patrocinada pelo Ministério Público do

Trabalho, que questionava a validade da utilização da mão de obra de

trabalhadores estranhos ao sistema do OGMO no porto de Navegantes, conforme

disposto no artigo 26 da Lei 8.630/93.141

O Ministério Público, na qualidade de autor e outros assistentes

litisconsorciais representativos de classes de trabalhadores portuários,

estabeleceram obrigações com a empresa portuária, notadamente na contratação

a vínculo empregatício permanente de trabalhadores portuários junto ao OGMO

de forma prioritária, estabelecendo pisos salariais e benefícios, além de um fundo

social indenizatório a todos os trabalhadores portuários envolvidos. 142

Outra grande diferença entre as duas modalidades de terminais portuários,

de uso público ou privativo, é que aquele é precedido de licitação143, e submete-se

às regras de direito público que regem a matéria, com maior controle estatal, o

que enseja maiores custos regulatórios.

Quanto aos terminais privativos, têm por objetivo fazer parte do processo

produtivo dos grandes conglomerados industriais, estando sujeitos a um regime

jurídico de direito privado, com menor influência do Estado, diferentemente dos

terminais de uso público.

Essas instalações portuárias, em razão dos motivos expostos, são

outorgadas a particulares mediante mera autorização, sem necessidade de prévia

licitação.

A regulação jurídica do mercado, que deve ser controlado para não causar

danos a si mesmo, necessita ser realizada de forma dinâmica e independente,

caso necessário proceda judicialmente, com o objetivo de buscar solução à demanda judicial acerca do tema, ora relatado nestes autos. 141 A possibilidade de contração de trabalhadores portuários “fora do sistema” do OGMO será abordada oportunamente. 142 SANTA CATARINA -TRT – REQUERENTE: Ministério Público do Trabalho; REQUERIDO: Portobave S/A – Terminais Portuários de Navegantes - Ação Civil Pública 1674-2008-047-12, 3 Vara do Trabalho de Itajaí, TRT-SC. 143 de acordo com os arts. 13, I e 14, I, a, e § 1.º, da Lei n.º 10.233/01.

67

para que alcance os seus objetivos, na correção das falhas do mercado e sua

manutenção, com a observância indissociável do interesse público144.

E o interesse público atual caracteriza-se pela necessidade de eficiência

nas atividades portuárias, com mudança de mentalidade de todos os agentes

envolvidos, que nas palavras de SOUZA JUNIOR, requerem alterações em

padrões gerenciais estabelecidos ao longo do tempo e vencimento de obstáculos

relacionados a questões sociais, tecnológicas, econômicas, financeiras, políticas,

culturais e institucionais.145

1.1.4 – A Fiscalização do Trabalho Portuário pelo E stado

A atividade fiscalizatória do Ministério do Trabalho e Emprego nas relações

de trabalho portuário surge expressamente por meio do Decreto 1.886, de 29 de

abril de 1996.

Esta fiscalização obriga o OGMO a ser o responsável pela exatidão das

listas diárias dos trabalhadores portuários avulsos, para se evitar preterição de

trabalhadores, bem como responsabiliza os tomadores de serviços (operadores

portuários), à verificação da presença, no local do trabalho, dos trabalhadores

constantes das listas de escalação diária de cada navio.

Referido agente fiscalizador utiliza-se dessa prerrogativa por meio da

Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho Portuário e Aquaviário, criada

pela Instrução Normativa nº 61 de 2006 (MTE), no âmbito da Secretaria de

Inspeção do Trabalho.

Por sua vez, a Coordenação Nacional de Inspeção do Trabalho Portuário e

Aquaviário delega aos seus correspondentes regionais a efetiva verificação das

condições de trabalho no meio portuário, conforme Instrução Normativa.

O Ministério do Trabalho é ainda membro do Grupo Executivo de

Modernização dos Portos (GEMPO), criado pelo Decreto nº 1467, de 1995, e

144 SOUZA JUNIOR, op. cit., p, 210. 145 Id, p 215.

68

responsável pela elaboração do Programa Integrado de Modernização dos

Portos146.

Dentre estas atribuições concedidas ao Ministério do Trabalho, foi à criação

da Norma Regulamentadora de Segurança e Saúde no Trabalho Portuário nº 29,

que trata de forma específica quanto às condições de trabalho e saúde do

trabalhador portuário.

A atuação do Ministério do Trabalho na relação laboral portuária é de suma

importância, uma vez que a inevitável mecanização dos meios de transporte leva

uma grande massa de trabalhadores a terem seu mercado de trabalho reduzido e

precarizado.

1.1.5 – Contribuição do Ministério Público do Traba lho na implantação da Lei

dos Portos

O Ministério Público do Trabalho, como componente do Ministério Público

da União, tem como prerrogativa a defesa dos interesses difusos, coletivos e

individuais indisponíveis dos trabalhadores, nos termos do art. 127, caput, da

Constituição Federal.147

Consoante item anterior, o Ministério Público também é membro do Grupo

Executivo para Modernização dos Portos (GEMPO), para a implantação integral

do modelo previsto na Lei 8.630/93. 146 Conforme SANTOS NETO (op. cit., p. 103), atribuiu-se ao Ministério do Trabalho no âmbito do trabalho portuárioas seguintes metas a) Pleno desempenho das competências atribuídas ao OGMO pela Lei 8.630/93; b) implantação da multifuncionalidade no trabalho portuário; c) implantação de medidas de amparo financeiro à mão-de-obra, em função das repercussões sociais decorrentes do processo de modernização dos portos; d) Elaboração e divulgação do Manual de Fiscalização do Trabalho Marítimo, Portuário e na Pesca e treinamento dos agentes de inspeção para fiscalização destas atividades; e) estabelecimento de rotinas para a geração de estatísticas quanto às ações de fiscalização do trabalho marítimo, portuário e na pesca; f) Adequação da legislação de segurança e saúde aos trabalhos portuários, considerando o disposto na Convenção 152 da OIT, promulgada pelo Decreto 99.534/90; e g) requalificação profissional dos trabalhadores avulsos que não preencheram os requisitos para registro no OGMO, a fim de reinseri-los no mercado de trabalho. 147 Art. 127, CF – O Ministério Público é instituição, permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

69

Entre as atividades realizadas pelo Ministério Público do Trabalho no

âmbito portuário, são destacadas as seguintes: (1) visitas aos portos nacionais; (2)

reuniões com lideranças sindicais de trabalhadores e operadores portuários; (3)

reuniões ordinárias e extraordinárias com os diversos órgãos públicos envolvidos

no âmbito portuário; (4) mediação em negociações coletivas solicitadas

diretamente à Procuradoria Geral do Trabalho; (5) apoio institucional à atuação

das Procuradorias Regionais do Trabalho; e (6) eventos em que se procura expor

a atuação do Ministério Público do Trabalho perante os agentes sociais

envolvidos.148

O excesso de jornada de trabalho em que os trabalhadores portuários

podem ser submetidos também consiste na atuação do Ministério Público, que

justifica pela natureza insalubre e perigosa das atividades portuárias, como

também pela alta tonelagem das cargas conteinerizadas, o que incrementa o risco

de acidentes. Inclusive, por tal razão, foi inserido o artigo 8º na Lei 9.719/98, no

sentido de estabelecer intervalo mínimo de 11 horas entre jornadas, salvo

previsão excepcional prevista em norma coletiva.149

1.2 – Empregadores do Trabalho Portuário – OGMO, Op erador

Portuário e Terminal Portuário Privativo

1.2.1 – A responsabilidade pela gestão do trabalho da mão de obra avulsa

Referidos agentes descritos no tópico anterior, influenciam diretamente

outros três agentes privados criados pela Lei 8.630/93: o OGMO, o Operador

Portuário e o Terminal Portuário Privativo, que serão abordados nos itens

seguintes.

148 PAIXÃO, op. cit., p. 101. 149 Ib, p. 103.

70

Anteriormente à Lei dos Portos, quando era necessária a contratação

temporária de trabalhadores, a entidade estivadora, para serviços de bordo ou a

Administração do Porto, para serviços de terra, procediam a sua requisição aos

respectivos sindicatos, que escalavam os trabalhadores portuários avulsos em

sistema de rodízio150.

A partir da Lei dos Portos, as funções das extintas entidades estivadoras

passaram a ser realizadas diretamente pelo OGMO, no fornecimento aos

interessados, da mão de obra portuária.

A Lei dos Portos, ao criar a figura do OGMO, delegou a responsabilidade

pelo gerenciamento da mão de obra do trabalho avulso, com claro objetivo de

retirar dos sindicatos o monopólio do fornecimento da mão de obra.

A ideia do OGMO foi adaptada do Centro de Empregadores do Porto de

Antuérpia (Bélgica), com a diferença que no modelo belga o controle do órgão

gestor pertence apenas aos empresários do setor.151

Complementa o autor que no modelo brasileiro criado pela lei dos portos

existem representantes dos operadores, dos trabalhadores portuários e ainda dos

usuários dos serviços portuários, em se tratando de Comissão Paritária para

solução de litígios decorrentes da aplicação das normas e competências inerentes

ao OGMO.

Criou-se então o OGMO, que é reputado de utilidade pública, sem fins

lucrativos, constituído pelos operadores portuários em cada porto organizado, com

objetivo essencial de centralizar e administrar a prestação de serviços nos portos

do país152.

Foi delegada ao OGMO, a responsabilidade pelo gerenciamento da mão de

obra do trabalho portuário avulso, assemelhando-o claramente com a figura do

empregador disposto no artigo 2º da CLT153.

150 CARVALHO, Francisco Edivar – Trabalho portuário avulso antes e depois da lei de modernização dos portos – São Paulo: LTr, 2005 – p. 20. 151 SANTOS NETO, op. cit, p. 85. 152 Artigo 25 da Lei 8.630/93. 153 Artigo 2º da CLT - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. § 1º Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados.

71

É atribuída ao OGMO, a responsabilidade pela contratação de novos

trabalhadores portuários avulsos, além de outras funções como promover

treinamento e habilitação profissional, conforme a Lei 8.630/93.

O OGMO ainda tem como competências a administração da mão de obra

do trabalho portuário, a arrecadação de valores por parte dos operadores

portuários para repasse aos trabalhadores dos valores devidos e seus encargos

em razão dos serviços realizados, a aplicação de punição aos trabalhadores

portuários avulsos nos termos da lei, contrato ou norma coletiva, e a promoção do

treinamento e formação profissional dos trabalhadores avulsos154.

Consoante à lei acima, o Operador Portuário e o OGMO são solidariamente

responsáveis pelo pagamento dos encargos previdenciários, fundiários e

trabalhistas ao portuário avulso, de forma que cada um responde pela totalidade

da obrigação155.

Não é reputado ao órgão gestor, o estabelecimento de condições de

trabalho, ou a fixação, negociação ou reajustes de remuneração diretamente com

os trabalhadores portuários avulsos, cabendo aplicar, quando couber, somente as

normas e condições de trabalho estabelecidas em lei, contrato, convenção ou

acordo coletivo realizado entre os sindicatos profissionais, econômicos ou

operadores portuários156.

A negociação coletiva direta entre trabalhadores e operadores portuários

poderá inclusive dispensar a intervenção do OGMO nas relações entre capital e

trabalho157.

SOUZA JUNIOR enumera que esses dispositivos evidenciam o princípio da

subsidiariedade ao estabelecerem padrões, em que o Poder Público indica os

limites de atuação do OGMO, estimulando a reorganização e privilegiando a

autorregulação do setor, ao dar prevalência aos contratos, acordos ou convenções

coletivas de trabalho.158

154 Artigos 18 e 19 da Lei 8.630/93. 155 Conforme artigo 275 do Código Civil, O credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto.” 156 Artigo 22 da Lei 8.630/93. 157 Parágrafo Único do artigo 18 da Lei 8.630/93. 158 SOUZA JUNIOR, op. cit., p. 170.

72

As competências anteriormente exercidas pelas Delegacias de Trabalho

Marítimo (DTMs) e pela Diretoria de Postos e Costas do Ministério da Marinha

(DPC) e outros órgãos do Ministério do Trabalho, referentes à formação,

treinamento profissional, saúde, higiene e segurança no trabalho, como também

atos típicos de empregador foram transferidos ao OGMO.

A criação desta forma original de supervisão do trabalho portuário avulso

prestado a cada operador resulta na ausência de vínculo empregatício com os

operadores portuários159.

Embora cada operador tenha a supervisão específica da sua operação,

todos dela participam em conjunto por meio do OGMO, que substituiu os

sindicatos profissionais na administração e gestão da mão de obra160.

. Não se admite no âmbito portuário a utilização de locação de mão de obra

ou trabalho temporário nos moldes da Lei 6.019/74161. Tal modo de contratação

advinda da reestruturação produtiva do modelo toyotista, foi vetada na redação

final do PL 8/91, originário da Lei 8.630/93.

159 Artigo 20 da Lei 8.630/93. 160 Sobre estas competências, os tribunais trabalhistas já se manifestaram sobre o assunto, reconhecendo a plena legitimidade do OGMO, como sujeito passivo na responsabilidade pelo pagamento de débitos trabalhistas ao avulso portuário : SANTA CATARINA, TRT, RO Nº: 02301-2004-028-12-00-0, Recorrente: OGMO, Recorrido: Paulo Joel Dias, Acórdão 2412/2006 - Juiz Garibaldi T. P. Ferreira - Publicado no DJ/SC em 06-03-2006, página: 213 - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. ÓRGÃO DE GESTÃO DE MÃO-DE-OBRA DO TRABALHO PORTUÁRIO AVULSO. LITÍGIO ENVOLVENDO O NÃO-PAGAMENTO DE VERBAS TRABALHISTAS. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. AÇÃO PROPOSTA APENAS EM FACE DE UM DOS DEVEDORES. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DOS Arts. 19, § 2º, da Lei nº 8.630/93 e 2º, § 4º, da Lei nº 9.719/98, BEM COMO do Art. 275 do Código Civil-2002. Se no caso "sub judice", em que o litígio envolve interesse de trabalhador portuário avulso, a responsabilidade pelo não-pagamento de verbas trabalhistas é solidária entre o Órgão de Gestão de Mão-de-obra e os Operadores Portuários, "ex vi" dos artigos 19, § 2º, da Lei nº 8.630/93 e 2º, § 4º, da Lei nº 9.719/98, e se o instituto da solidariedade passiva caracteriza-se, segundo o disposto no artigo 275 do CC-2002 (art. 904 do CCB revogado), pelo direito que é conferido ao credor de "exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum", não importando em renúncia a ele a propositura de ação contra um ou alguns dos devedores, forçoso é reconhecer que, por não se tratar na espécie de litisconsorte necessário, é parte legítima "ad causam" para figurar exclusivamente no pólo passivo da relação jurídica processual o Órgão de Gestão de Mão-de-obra do Trabalho Portuário Avulso. 161 Artigo 45 da Lei 8.630/93.

73

Mesmo presentes a figura da subordinação, da continuidade e da

onerosidade com o OGMO, inexiste a pessoalidade na prestação dos serviços,

uma vez que a atividade portuária avulsa se dá em forma de rodízio162.

Não será obrigatório o engajamento pelo trabalhador portuário em

determinada prestação de serviços, decorrendo o labor do seu livre arbítrio, em

um serviço que corresponda à sua disponibilidade e a sua necessidade de

remuneração.

Sobre a inerente subordinação do trabalhador portuário avulso pelo OGMO,

CARVALHO163 e STEIN 164 manifestam-se sobre a equiparável posição deste

órgão a um típico empregador descrito na CLT.

DIÉGUEZ cita que os trabalhadores portuários são unânimes quando

preferem a gestão do trabalho anteriormente a Leis dos Portos. Informa três

pontos principais como fatores que influenciaram na transformação do processo

de trabalho e das relações que os portuários mantêm com seus colegas e com o

próprio trabalho: (1) a passagem da escala para o OGMO; (2) a obrigatoriedade

do intervalo de 11 horas entre as jornadas de trabalho e (3) a introdução da escala

eletrônica.165

PAIXÃO informa que apesar da literalidade da lei, persistiu a luta de alguns

dirigentes sindicais pela manutenção do poder de escalação dos avulsos ou pela

ingerência na escalação dos trabalhadores.166

Sustentavam que a Lei 9719/98, embora determinasse que a escalação

fosse realizada pelo OGMO, não impôs o local da realização da chamada, o que 162 Artigo 5º da Lei 9719/98. 163 Carvalho, Francisco Edivar – Trabalho portuário avulso antes e depois da lei de modernização dos portos – São Paulo: LTr, 2005, página 52; - “Pender-se-á vincular o TPA ao OGMO no aspecto subordinação, posto que no exercício de sua competência assentada no artigo 19 da Lei 8.630/93 poderá aplicar normas disciplinares previstas em lei, contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho e até sanções disciplinares, tais como repreensão verbal ou por escrito, suspensão do registro de dez a trinta dias ou o seu cancelamento. Nesta última hipótese, situação equivalente a demissão por justa causa, posto que o TPA é excluído dos quadros do OGMO. Trata-se, pois, de autêntico poder disciplinar que é inerente ao empregador” 164 STEIN, Alex Sandro, Curso de Direito Portuário: lei 8.630/93; São Paulo: LTr, 2002;, página 77 - “Ora, perante a jurisprudência mansa e pacífica dos tribunais especializados, as atividades do OGMO correspondem insofismavelmente à concentração descrita no artigo 2º da CLT, pois exerce ele, em relação ao trabalhador avulso, irrecusável domínio, configurando o tácito contrato de trabalho individual de trabalho de que tratam os artigo 442 e seguintes da mesma legislação consolidada.” 165 Op. cit, p. 89. 166 Op. cit, p. 43.

74

permitiria que a escala pudesse ser realizada no âmbito do próprio sindicato, a

partir de terminais conectados ao OGMO.167

O autor complementa que referida alternativa foi experimentada nos portos

de Itajaí, Rio Grande e Paranaguá, com resultados desastrosos, persistindo

somente no porto de Itajaí a escalação na sede entidade sindical. Nos demais

portos citados, decisões judiciais foram responsáveis pela transferência das

escalações para instalações próprias do OGMO, conforme explicitado

anteriormente.168

1.2.2 - Operador portuário – o tomador e empregador da mão de obra

portuária

Quanto ao operador portuário, que é o responsável pela realização das

operações portuárias, é o tomador de serviços da mão de obra do trabalho avulso,

e também empregador de trabalhadores portuários com vínculo permanente a

prazo indeterminado, nos moldes do artigo 3º da CLT.

A Lei 8.630/93 instituiu esta categoria econômica com a criação dos

operadores portuários, que substituíram a Administração do Porto (serviço de

terra) e as agências marítimas (serviços de bordo) como tomadoras do trabalho

portuário nos serviços de capatazia ou estiva.

Para a execução desses serviços as antigas entidades estivadoras e as

agências se utilizavam de mão de obra avulsa enquanto as administrações

portuárias utilizavam-se dos seus próprios empregados ou de terceiros

autorizados para a realização de determinadas atividades, caracterizada pela mão

de obra dos arrumadores nos serviços de capatazia e das empresas de bloco, na

limpeza e conservação das embarcações mercantes.

167 Id. 168 Id.

75

O operador portuário pela definição da própria lei, “é pessoa jurídica pré-

qualificada para a execução de operação portuária no porto organizado”, ou seja,

responsável pela movimentação de mercadorias169.

A Administração do Porto é considerada pré-qualificada como operadora

portuária, mas, atualmente, as concessionárias de porto acabam restringindo-se

nas funções de exploração e administração, como visto anteriormente170.

Para a realização da movimentação de mercadorias, o operador portuário

poderá se valer de mão de obra própria, com vínculo empregatício a prazo

indeterminado ou utilizar-se da mão de obra avulsa, gerenciada pelo OGMO,

consoante tópico anterior.

É de responsabilidade do operador portuário recolher para o OGMO, os

valores devidos pelos serviços executados pela mão de obra avulsa, de caráter

trabalhista, securitário e previdenciário.

Cabe ao operador portuário a responsabilidade pela direção e coordenação

da atividade portuária, inclusive sendo coobrigado com o OGMO regional no

pagamento da remuneração devida aos trabalhadores, e nas demais obrigações

decorrentes dos serviços realizados pela mão de obra avulsa contratada.

O Operador Portuário fica sujeito ao cumprimento das normas de

segurança, higiene e medicina do trabalho portuário171, como também pelo

cumprimento das normas deliberadas pelo CAP e demais normas operacionais

emanadas pela Autoridade Portuária.

Conforme explicitado, não é admitido no serviço portuário, utilização de

mão de obra decorrente de terceirização de atividade, nem locar ou tomar mão de

obra sob o regime de trabalho temporário ou cooperativo, exceto quando os

169 Artigo 8º da Lei 8.630/93. 170 Parágrafo 3º do artigo 9º da Lei 8.630\93. 171 Norma Regulamentadora - 29.1.4.1 Compete aos operadores portuários, empregadores, tomadores de serviço e OGMO, conforme o caso: a) cumprir e fazer cumprir esta NR no que tange à prevenção de riscos de acidentes do trabalho e doenças profissionais nos serviços portuários; b) fornecer instalações, equipamentos, maquinários e acessórios em bom estado e condições de segurança, responsabilizando-se pelo correto uso; c) zelar pelo cumprimento da norma de segurança e saúde nos trabalhos portuários e das demais normas regulamentadoras expedidas pela Portaria MTb nº 3.214/78 e alterações posteriores.

76

próprios trabalhadores avulsos se estabelecerem como operadores portuários por

meio de cooperativa, de acordo com o artigo 17 da Lei 8.630/93.172

1.2.3 – Terminais Portuários Privativos

A Lei 8.630/93 criou a possibilidade de arrendamento e privatização das

instalações portuárias para a iniciativa privada para construir, reformar, ampliar,

melhorar, arrendar e explorar instalação portuária, mediante contrato de

arrendamento.

Sempre com licitação, quando se tratar de instalação dentro dos limites da

área do porto organizado ou mediante autorização, quando se tratar de terminal

de uso privativo, quando ocorrer fora da área do porto organizado, ou quando o

interessado for titular do domínio útil do terreno, mesmo dentro da área do porto

organizado.173

A descentralização da exploração portuária há muito tempo era tendência

nos demais países, independentemente das diferenças culturais, econômicas e

políticas, com elementos comuns que incentivavam a completa

desregulamentação do setor.

O relatório confeccionado por entidades sindicais portuárias apresenta o

panorama dos portos na Europa174, apontando que com a globalização

econômica, torna-se acirrada a concorrência entre países em todos os setores,

havendo uma tendência política econômico administrativa bem delineada para os

portos: o total afastamento do Estado da prestação de serviços portuários, que

172 Artigo 17 da Lei 8.630/93 – Fica permitido as cooperativas formadas por trabalhadores portuários avulsos, registrados de acordo com esta Lei, se estabelecerem como operadores portuários para a exploração de instalações portuárias, dentro e fora dos limites da área do porto organizado. 173 Artigo 4º, incisos I e II da Lei 8.630/93. 174 Relatório “Viagem aos portos da Europa”, realizada entre os dias 24/10 a 11/11/1995, sob responsabilidadeda comissão da FENCCOVIB – Extraído de NASCIMENTO, op. cit.., p. 48;

77

passará a ser feito por terminais ou arrendatários privados, passando a funcionar

apenas como ‘port autorit’.175

Pode-se afirmar que o processo de reestruturação do aparelhamento

portuário ocorrido em todo o mundo tem o objetivo de alcançar: (1) a melhoria da

qualidade dos serviços prestados; (2) aumento de produtividade; (3) maior

controle sobre custos; (4) modernização institucional do segmento, para por fim a

uma estrutura paternalista e centralizada, para que ocorra um ambiente que prime

pela agilidade e eficiência das operações.176

Na esteira das tendências mundiais sobre o assunto, a Lei dos Portos

estabeleceu duas modalidades de exploração das instalações portuárias: de uso

público ou de uso privativo, sendo que nesta última hipótese há a subdivisão em

outras duas categorias: de uso exclusivo, nos casos de movimentação de carga

própria ou de uso exclusivo misto, quando se tratar de movimentação de carga

própria e de terceiros.177

Nestas hipóteses, surgiram questionamentos quanto à obrigatoriedade dos

terminais privados (de uso público ou privativo, com uso exclusivo ou mito) de se

utilizarem da mão de obra dentro do sistema do OGMO.

Os terminais privativos fora da área do porto organizado podem se utilizar

da mão de obra avulso de forma facultativa.178

Os terminais privativos que operavam antes da Lei dos Portos deverão

manter em caráter permanente, a proporção entre trabalhadores com vínculo

empregatício e trabalhadores avulsos.179

Há ainda uma terceira situação, relativa aos terminais privativos lotados

dentro da área do porto organizado. A prestação de serviços por operadores

portuários e a construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação,

175 arrendando a empresas privadas as superestruturas que eventualmente ainda possua e fazendo investimentos apenas na infra-estrutura daquela área que entrega, em regime de concessão, aos terminais privados, além de continuar [o Estado], obviamente, com a responsabilidade quanto a administração dos arrendamentos e a necessária fiscalização das atividades dos concessionários e arrendatários 176 NASCIMENTO, op. cit., p. 49. 177 Parágrafo 2º do artigo 4º da Lei 8.630/93. 178 Artigo 56, caput, da Lei 8.630/93. 179 Artigo 56, parágrafo único, da Lei 8.630/93.

78

melhoramento e exploração de instalações portuárias, dentro dos limites da área

do porto organizado, deverá ter a observância da Lei 8.630/93.180

Os terminais de uso privativo dentro da área do porto organizado são

regidos integralmente pela Lei 8.630/93, seguindo todas as prescrições legais

relativas ao gerenciamento e contratação da mão de obra com administração do

OGMO181 ou contratação a prazo indeterminado nos termos do artigo 26 da Lei

8.630/93.

2 - SISTEMÁTICA DO TRABALHO PORTUÁRIO A PARTIR DA L EI

8.630/93, E A ISONOMIA DO TRABALHADOR AVULSO COM O

DETENTOR DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO PERMANENTE

2.1 – A limitação de categorias profissionais do tr abalho avulso e

o critério da multifuncionalidade

A adoção de novos métodos de organização e a gestão do trabalho

originários do modelo toyotista pelos operadores portuários primavam pela

desespecialização e flexibilidade no trabalho (de remuneração, de horário e

intensidade).

Em razão da crescente automação das atividades portuárias e do aumento

da competitividade no mundo globalizado, os métodos existentes de

movimentação de mercadorias nos portos brasileiros eram considerados

obsoletos, de elevados custos e de notória ineficiência182.

A multifuncionalidade trata-se de tendência em todo tipo de mercado de

trabalho, em que os trabalhadores serão chamados para executar diversas

180 Artigo 2º, da Lei 8.630/93. 181 PAIXÃO, op. cit., p. 42. 182 SANTOS NETO (op. cit., p. 20)

79

tarefas, ao contrário da especialização radical que ocorria anteriormente. Em

várias das novas modalidades de trabalho as pessoas serão demandadas a ser

polivalentes.183

A necessidade do trabalhador atual de possuir uma formação profissional

diversificada aumentará as suas chances de “empregabilidade”, ou seja, a sua

capacidade individual de manter-se inserido no mercado de trabalho.184

E como visto anteriormente, a tendência de polivalência nas atividades

laborais, decorrentes dos novos métodos de reestruturação produtiva, encontrou-

se bastante caracterizada no âmbito portuário, com a Lei 8.630/93.

Para a adoção progressiva da multifuncionalidade185, procurou a legislação

dos portos limitar a quantidade de categorias profissionais, com a definição das

atividades de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, vigilância

de embarcações e bloco186, para posteriormente, sob o comando do OGMO,

implantar a desespecialização das atividades portuárias avulsas, com criação de

trabalhadores polivalentes.

183 PASTORE, José – A agonia do emprego. São Paulo: Ed. LTr, 1997, p. 19. 184 FARIA, José Eduardo. “Os novos desafios da Justiça do Trabalho” São Paulo: Ed. LTr, 1995. p. 63. 185 Define STEIN (op. citi., p. 119), tem-se que a multifuncionalidade pode ser definida como a união de duas definições existentes, ou seja, possibilitar a polivalência do trabalhador portuário avulso, habilitando-o a operar os diversos tipos de equipamentos portuários, incorporando diversas habilidades profissionais, aumentando as ofertas de trabalho e evitando a ociosidade em caso de falta de serviço ou não engajamento em sua atividade originária. 186 O parágrafo 3º, do artigo 57 da Lei 8.630/93, considera: I - Capatazia: a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações de uso público, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário; II - Estiva: a atividade de movimentação de mercadorias nos conveses ou nos porões das embarcações principais ou auxiliares, incluindo o transbordo, arrumação, peação e despeação, bem como o carregamento e a descarga das mesmas, quando realizados com equipamentos de bordo; III - Conferência de carga: a contagem de volumes, anotação de suas características, procedência ou destino, verificação do estado das mercadorias, assistência à pesagem, conferência do manifesto, e demais serviços correlatos, nas operações de carregamento e descarga de embarcações; IV - Conserto de carga: o reparo e restauração das embalagens de mercadorias, nas operações de carregamento e descarga de embarcações, reembalagem, marcação, remarcação, carimbagem, etiquetagem, abertura de volumes para vistoria e posterior recomposição; V - Vigilância de embarcações: a atividade de fiscalização da entrada e saída de pessoas a bordo das embarcações atracadas ou fundeadas ao largo, bem como da movimentação de mercadorias nos portalós, rampas, porões, conveses, plataformas e em outros locais da embarcação; VI - Bloco: a atividade de limpeza e conservação de embarcações mercantes e de seus tanques, incluindo batimento de ferrugem, pintura, reparos de pequena monta e serviços correlatos .

80

DIÉGUEZ salienta que a lei ao introduzir o OGMO, e criar a possibilidade

de multifuncionalidade que acaba com a divisão entre as categorias, institui

apenas uma, a do trabalhador portuário avulso (TPA), e retira a noção de ofício,

tão cara aos trabalhadores pela distinção que proporciona.187

A desespecialização foi estimulada pela Recomendação 145 da OIT, que

trata das repercussões sociais dos novos métodos de trabalho na atividade

portuária, conforme se verificará posteriormente.

A Recomendação 145 da OIT sugestiona que na ocorrência de diminuição

do número de categorias especializadas deverá ser observada a capacitação

profissional dos trabalhadores para executarem um maior número de tarefas, com

supressão da distinção entre o trabalho de bordo e o trabalho de terra

(multifuncionalidade).

A lei 8.630/93 informa que todas estas mudanças progressivas deverão ter

origem na livre negociação da classe trabalhadora e da classe econômica,

representada pelos operadores portuários.

A resistência da classe operária avulsa na realização de tais negociações, a

manutenção pelos interessados da falta de qualificação da mão de obra, a

padronização mundial na movimentação de mercadorias por meio da

conteinerização e a crescente diminuição da mão de obra avulsa existente em

cada porto organizado (inexistência de novo contingente), direcionam o trabalho

portuário a ser qualificado diretamente pelo operador portuário por meio de vínculo

empregatício permanente.

DIÉGUEZ afirma que ao debater a multifuncionalidade os trabalhadores

estão debatendo a própria perda de suas características, que os tornam diferentes

entre si. A distinção entre os trabalhadores realizada pelas habilidades que cada

um tem para o exercício da profissão desfaz-se com a multifuncionalidade. A

polivalência e a estandardização do trabalhador chegam ao sistema portuário.188

E a perda da característica de cada ofício decorrente da multifuncionalidade

das atividades laborais tem sido implementada no âmbito portuário com maior

187 Op. cit., p 77. 188 Op. cit., p 104.

81

eficácia, na ocorrência de contratação de vinculação empregatícia diretamente

com o operador portuário.

2.2 – A prevalência do vínculo empregatício permane nte em

detrimento do trabalho avulso

A lei 8.630/93 oportunizou nova realidade ao mundo do trabalho nacional,

ao permitir que a prestação de serviços ocorra pelo método avulso com a

intermediação obrigatória do OGMO, ou por meio de contratação empregatícia

direta a prazo indeterminado pelo operador portuário.

A contratação de forma permanente deverá ocorrer exclusivamente dentre

os avulsos registrados nos serviços de estiva, conferência de carga, conserto de

carga e vigilância das embarcações, consoante parágrafo único, do artigo 26 da

citada Lei.

De acordo com Cristiano Paixão, essa duplicidade de regimes de

contratação parece ser a tônica em grande parte dos países do mundo, em que se

pode perceber um padrão.189

Acrescenta que por um lado trabalhadores do setor de capatazia (equipe de

terra) normalmente são contratados por prazo indeterminado pelas empresas que

operam nos portos (no mais das vezes, mediante concessão) e, no outro lado,

trabalhadores avulsos, sem vinculação direta a um único empregador e com forte

ligação ao sindicato profissional, executando os serviços de estiva (equipe de

bordo).190

No século XXI, a tendência nos portos brasileiros de grande movimentação

de cargas é a eliminação do trabalho avulso, o que já vem ocorrendo nos maiores

portos internacionais.191

189 Op. Cit., p. 29. 190 Id. 191 OLIVEIRA (op. cit., p. 88)

82

Com o advento da Lei 8.630/93, as atividades de capatazia, que antes eram

exercidas por intermédio da Companhia de Docas em regime de monopólio192,

passaram a ser objeto na composição final do preço do transporte, como já ocorria

com as atividades de estivagem.

Estabelecida a livre concorrência, não mais interessava às empresas que

os trabalhadores avulsos da capatazia fossem bem remunerados, o que reduziria

os lucros auferidos.

Nos terminais que movimentam muita carga, os serviços de capatazia

serão sempre contínuos, com necessidade constante de trabalhadores. A

requisição de trabalhadores portuários avulsos se tornou cara para aquelas

atividades em que sempre exista trabalho. Fica economicamente favorável às

empresas a contratação de trabalhadores portuários com vínculo empregatício

permanente.193

Conforme se infere no caput do artigo 26 da Lei 8.630/93, a lei oportunizou

aos operadores portuários a contratação com vínculo direto ao estabelecer que “o

trabalho portuário de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga,

bloco e vigilância das embarcações, nos portos organizados, será realizado por

trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e por

trabalhadores portuários avulsos.”

Por sua vez, o parágrafo único do mesmo artigo cita quais são as

categorias em que o vínculo deverá ocorrer somente com trabalhadores do

sistema do OGMO, salientando que “a contratação de trabalhadores portuários de

estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância das embarcações,

com vínculo empregatício a prazo indeterminado será feita, exclusivamente,

dentre os trabalhadores portuários registrados”.

A redação do parágrafo único do artigo 26 da Lei 8.630/93 motivou as

empresas operadoras portuárias a buscar mão de obra nos serviços de capatazia

e bloco de trabalhadores fora do sistema do OGMO, com consequente

192 Havia apenas exceção na hipótese de insuficiência de pessoal de capatazia da Aministração Portuária, oportunidade em que era possível a contratação de força supletiva, representada por trabalhadores associados aos sindicatos de movimentação de mercadoria, que passaram a ser denominados de ‘arrumadores’, após a denominação dada pela Lei 2.196/54. 193 PAIXÃO (op. cit., p. 46)

83

oferecimento de remuneração inferior à realizada praticada com os arrumadores

matriculados junto ao OGMO.

O TST, por intermédio de Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica194,

interpretou quanto aos serviços de capatazia e de bloco que a contratação de

trabalhadores a vínculo empregatício a prazo indeterminado deveria ocorrer

somente de forma prioritária e não exclusiva como aplicada às outras categorias.

O Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica teve como objetivo estabelecer o

pronunciamento do TST em torno da exegese do artigo 26 e seu parágrafo único

da Lei 8.630/93.

A decisão da Justiça Laboral máxima adotou a interpretação literal ao

parágrafo único do artigo 26, que não mencionava capatazia e bloco dentre as

modalidades que devem ser contratadas aproveitando trabalhadores registrados

no OGMO, afastando a interpretação histórica exigida pelas entidades

representativas dos trabalhadores.

A existência de um parágrafo único ao artigo 26, e com rol diferenciado de

modalidades de trabalhadores (estiva, conferência de carga, conserto de carga e

vigilância), tem disciplina jurídica diversa quanto à contratação disposta no caput

de referido artigo.

A decisão do TST ainda informa que, sob o prisma teleológico, a lei dos

portos visou a modernizar e baratear o custo operacional dos portos brasileiros,

por meio da introdução de tecnologia que, necessariamente, acaba por substituir o

trabalho preponderantemente braçal pelo trabalho operacional de máquinas.

Cita a decisão que até o momento não foi regulamentado o art. 7º, XXVII195,

da CF, que visa a proteger a classe trabalhadora em face da automação.

194 BRASIL, TST, RODC - 2017400-75.2004.5.02.0000, Recorrente: Sindicato dos Operadores em Aparelhos Guindastescos, Empilhadeiras, Máquinas e Equipamentos Transportadores de Carga dos Portos e Terminais Marítimos e Fluviais do Estado de São Paulo – Sindogeesp. Recorridos: Marimex Despachos, Transportes e Serviços Ltda, Sindicato dos Empregados Terrestres em Transportes Aquaviários e Operadores Portuários do Estado de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores de Bloco dos Portos de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebas e Outro. Data de Julgamento: 16/08/2007. Data de Publicação: DJ 22/02/2008. Seção Especializada em Dissídios Coletivos. Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho. 195 Proteção em face da automação, na forma da lei.

84

No entanto, a ausência de promulgação da lei que regulamenta o preceito

constitucional não autoriza a manutenção das técnicas e modelos antigos de

gerenciamento e funcionamento dos portos.

O sistema anterior à Lei 8.630/93 era o da intermediação dos sindicatos na

contratação dos trabalhadores avulsos, tendo em vista que a forma de prestação

de serviços, com engajamento temporário em cada navio aportado, sem

empregador permanente, recomendava a concentração numa entidade para a

cobrança do preço pelo serviço prestado e o rateio do produto entre os

trabalhadores engajados.

A decisão busca o histórico do trabalho portuário, explicando que se, nos

primórdios da navegação comercial, as embarcações levavam seus próprios

estivadores, para carga e descarga da mercadoria nos portos, a evolução

posterior, visando à redução dos custos, foi a de contratar o pessoal dos portos

para essas fainas, reduzindo a tripulação dos navios mercantes.

Procurou a decisão estabelecer um paralelo, no momento em que se

distingue fundamentalmente o serviço de capatazia, ligado à movimentação, em

terra, das mercadorias nas instalações portuárias, do serviço de estiva, ligado à

movimentação das mercadorias dentro das embarcações; tem-se uma sinalização

para o critério utilizado para dar tratamento diferenciado a essas modalidades.

O OGMO, como órgão que substituiu o sindicato na gestão da mão de obra

portuária, serve, basicamente, para concentrar e administrar a utilização da mão

de obra para as atividades realizadas nos navios, cujos armadores são variados e

nos quais a relação de trabalho é temporária.

Já os trabalhos de capatazia, realizados nos armazéns e instalações

portuárias, podem ser contratados por um único operador portuário, em regime

contratual de prazo indeterminado, nos moldes comuns aos demais trabalhadores

regidos pela CLT, uma vez que provêm das antigas Companhias Docas, onde

eram funcionários com vínculo permanente.

A decisão do TST informa que a Convenção 137 da OIT ao torná-la direito

interno mediante sua ratificação pelo Brasil com o Decreto 1.574/95, lança luz

nova sobre a questão em exame, quando recomenda que o trabalhador portuário

85

tenha emprego permanente e seja contratado prioritariamente dentre aqueles

registrados no porto.

O TST, no julgamento da Ação de Dissídio Coletivo de Natureza Jurídica,

deu provimento parcial à ação suscitada pela classe patronal, para declarar que

não estão obrigados os operadores portuários a contratar apenas trabalhadores

portuários avulsos que sejam registrados no OGMO no que diz respeito às

modalidades de trabalho em capatazia e bloco, devendo, no entanto, dar

prioridade aos trabalhadores registrados.

A decisão judicial interpretativa da Lei dos Portos, coaduna com o

desenhado futuro do trabalho nos portos nacionais.

Para os serviços realizados por trabalhadores qualificados que exijam

atividades contínuas (como a utilização de máquinas para a movimentação de

mercadorias por contêineres), as atividades serão caracterizadas com vínculo

empregatício permanente.

Quando o trabalho exigir menor capacidade técnica ou decorrerem de

atividades sazonais, que não compensarem a contratação de trabalhadores

vinculados, os serviços serão realizados por trabalhadores portuários avulsos

multifuncionais.

3 – ANÁLISE COMPARATIVA DA CONVENÇÃO 137 E A

RECOMENDAÇÃO 145 DA OIT COM A LEI 8.630/93

3.1 – Convenção 137 e Recomendação 145 da OIT (gara ntia de

renda, estímulos de aposentadoria e requalificação profissional)

Com o fim da Primeira Guerra Mundial, em 1919, foi criada a OIT, na

Conferência da Paz, realizada em Paris, por meio do Tratado de Versalhes, na

qual os Estados Membros da Sociedade das Nações envidariam todos os esforços

86

para assegurar condições humanitárias e equitativas aos trabalhadores do seu

próprio território.196

A OIT é a agência das Nações Unidas que tem por missão promover

oportunidades para que homens e mulheres possam ter acesso a um trabalho

decente e produtivo, em condições de liberdade, equidade, segurança e

dignidade.197

Dentre os fundamentos, objetivos e instrumentos do Direito Internacional do

Trabalho, que diz respeito à OIT, surge o fundamento econômico, com vistas a

equiparação dos custos das medidas sociais de proteção ao trabalhador, para

evitar-se concorrência desleal no comércio mundial. Surge também o fundamento

social, com o objetivo da universalização da justiça social e da dignidade do

trabalhador. Uma das formas de instrumentalidade destes fundamentos é

materializada por meio das Convenções e Recomendações da OIT198, e dos seus

196 SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. 3 ed. São Paulo LTr 2000, p. 104. 197 Conceito extraído do sítio da OIT no Brasil – acessado em 16 de julho de 2012: www.oitbrasil.org.br/content/apresenta. 198 Jorge Luiz Fontoura e Luiz Eduardo Gunther diferenciam a Convenção da Recomendação, através dos estudos realizados por Nicolas Valticos. VALTICOS, Nicolas. Derecho Internacional Del Trabajo. Tradução de Maria José Trivinõ. Madrid: Tecnos, 1977. P. 234-236 apud FONTOURA, Jorge; GUNTHER. Luiz Eduardo. A natureza jurídica e a efetividade das Recomendações da OIT. APEJ – Academia Paranaense e Estudos Jurídicos. Acessado em 16 de julho de 2012 - http://www.apej.com.br/artigos_doutrina_leg_01.asp 1) a convenção é o procedimento–tipo da regulamentação internacional do trabalho, sendo ela somente passível de ser objeto de ratificação e criar uma rede de obrigações internacionais, seguidas de medidas de controle; 2) a recomendação é um acessório, sendo seu papel definido a partir do princípio geral segundo o qual adota-se essa forma quando o objeto tratado não se preste a adoção imediata de uma convenção. Podem ser distinguidas três funções principais da recomendação: a) é a forma mais apropriada quando um tema ainda não está maduro para o adoção de uma convenção, e a recomendação derivada da autoridade da Conferência contribui para a criação de uma consciência social comum, abrindo espaço para a adoção posterior de uma convenção; b) uma Segunda função é a de servir de complemento a uma convenção, podendo ser útil para inspirar os governos, porém sem o mesmo caráter obrigatório que os termos de uma convenção; c) a recomendação tem um valor intrínseco em um certo número de casos: quando as normas que contém possuem um caráter técnico detalhado, isto pode ser útil às administrações nacionais, contribuindo para a elaboração de uma legislação uniforme sobre a matéria, deixando no entanto a possibilidade de implementarem-se adaptações conforme a necessidade dos países; a mesma coisa acontece quando a recomendação trata de questões nas quais as situações e as práticas variam de tal maneira de um país a outro que dificilmente poder-se-ia pensaar em compromissos internacionais estritos a respeito das medidas preconizadas; 3) a recomendação cumpre assim, junto à convenção, uma função útil em vários aspectos, residindo a diferença existente entre os dois instrumentos no aspecto relativo à eficácia, uma vez que, por definição, uma recomendação não pode ser objeto de compromissos internacionais e que os Estados dispõem da margem que desejem para dar-lhe o efeito que julguem oportuno, embora estejam obrigados a submeter tanto as recomendações, como as convenções, às autoridades

87

estudos e investigações, que servem como subsídios para a elaboração de

normas legislativas em diversos países.199

Quanto à obrigatoriedade de cumprimento no Brasil das convenções da OIT

internalizadas, era entendimento anterior do STF, no julgamento do RE número

84004, que as convenções internacionais eram equiparadas juridicamente às leis

federais, admitindo-se a derrogação de um tratado por lei posterior.200

O STF, em mudança de entendimento, ao julgar em habeas corpus o tema

relativo à prisão civil de depositário infiel, entendeu que prevaleceria o tratado de

direitos humanos (Pacto de São José da Costa Rica) sobre a lei ordinária, ante a

hierarquia supralegal daquele.201

Essa mudança de rumo do STF ocorreu em razão da nova redação

acrescida ao artigo 5º, parágrafo 3º da CF, pela EC n. 45, de 2004, que

estabeleceu: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos

que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por

três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas

constitucionais”.

Assim, a partir de 1º de janeiro de 2005, em razão da EC 45 e do parágrafo

3º do artigo 5º, acrescido na CF, desde que internalizadas com quórum específico,

as Convenções da OIT passam a ter status de emendas constitucionais.202

nacionais competentes, informando sobre a execução desta obrigação e sobre o curso dado a tal ou qual recomendação. Estas medidas não são comparáveis, contudo, com as obrigações que a ratificação de uma convenção impõe e com o controle sistemático de que é objeto a execução de tais obrigações; 4) Embora a recomendação seja considerada como a parente pobre da convenção, devem se ter presentes dois pontos: a) dada a natureza das questões que geralmente são objeto de recomendação, a alternativa nem sempre se apresenta entre uma recomendação e uma convenção, senão entre uma recomendação e a ausência de toda norma internacional ou na existência de uma convenção que obteria tão poucas ratificações que perderia toda autoridade; b) é incontestável que algumas das recomendações têm tido uma influência considerável em numerosos países, sendo rutilante exemplo a recomendação nº 119, de 1963, sobre a Terminação da Relação de Trabalho. 199 GUNTHER, Luiz Eduardo. A OIT e o direito do trabalho no Brasil. Curitiba: Juruá, 2011, p. 32. 200 PIOVESAN, Flávia – Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional, 7ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2006. p. 61. 201 GUNTHER, Luiz Eduardo. A OIT e o direito do trabalho no Brasil. Curitiba: Juruá, 2011, p. 71. 202 Ib., p. 72. O Autor ainda questiona se todas as Convenções da OIT versam sobre direitos humanos? Citando Arnaldo Süssekind que nomina de direitos humanos social-trabalhistas, de acordo com o novo Direito Internacional Público, que vem consagrando alguns direitos naturais do homem.

88

E dentre os direitos humanos social trabalhistas estão os princípios

indissociáveis da OIT como o da luta contra o desemprego e a garantia de um

salário que assegure condições de sobrevivência convenientes.

A inovação trazida pela conteinerização e a implementação das novas

técnicas produtivas de trabalho, gravaram substancialmente nas atividades

realizadas pelo trabalhador portuário203.

Diante da importância e da peculiaridade das condições de trabalho no

setor portuário, a OIT editou algumas normas que imprimissem proteção social

aos trabalhadores portuários.

Para minimizar as repercussões sociais dos novos métodos de

manipulação de carga nos portos, conforme observado anteriormente, o Brasil

incorporou, em 1995, a Convenção 137, de 1973, da OIT, que tenta imprimir

técnica conciliatória entre a reestruturação produtiva e a obtenção de vantagens

sociais compensatórias.

Consoante PAIXÃO, a Convenção adotada visa à proteção do trabalhador

portuário diante de todo o processo de automação, flexibilização e redução de

quadros que marcaram a América do Norte e a Europa a partir da década de 70,

com reflexos no Brasil a partir da década de 90.204

Para que se possa analisar a dimensão do processo de redução dos postos

de trabalho, o autor informa que no Brasil existia em dezembro de 1995, um

contingente de 61.779 trabalhadores portuários e, ao final do ano de 2002, foram

contabilizados no sistema do OGMO cerca de 34.000 trabalhadores, em razão da

modernização dos novos métodos de movimentação de mercadorias, com reflexos

no mundo inteiro.205

203 GUNTHER cita exemplificativamente que além dos princípios acima descritos, a OIT considera urgente a melhora das condições de trabalho relativos à: regulamentação das horas de trabalho; à fixação de uma jornada máxima do dia e da semana de trabalho; ao recrutamento da mão de obra; à proteção dos trabalhadores contra moléstias graves ou profissionais e os acidentes do trabalho; à proteção das crianças, dos adolescentes e das mulheres; as pensões de velhice e invalidez; à defesa dos interesses dos trabalhadores empregados no estrangeiro; à afirmação do princípio “para igual trabalho mesmo trabalho”; a afirmação do princípio da liberdade sindical; à organização do ensino profissional e técnico. Ib., p. 37. 204 Op. cit., p. 20. 205 Id.

89

A Convenção estabelece a necessidade de adoção de medidas que

estimulem, na medida do possível, empregos regulares e permanentes aos

trabalhadores portuários.

Prevê a garantia mínima de renda ou de períodos de emprego aos

trabalhadores portuários e a manutenção dos registros de trabalhadores de acordo

com a capacidade de demanda de atividades de cada porto206.

A Convenção 137 da OIT cita que os portuários matriculados terão

prioridade para a obtenção de trabalho nos portos e deverão estar prontos para o

trabalho conforme legislação ou prática nacionais.207

Quando houver redução dos efetivos de trabalhadores, medidas

compensatórias deverão ser tomadas para prevenir ou atenuar os efeitos

prejudiciais aos portuários.208

Para que as vantagens sociais possam ser obtidas pelos trabalhadores em

decorrência da nova esfera de manipulação de carga, incumbe ao Estado

estimular as empresas e as organizações sindicais patronais e de trabalhadores,

para que cooperem na melhoria da eficiência dos trabalhos nos portos, com

participação das autoridades competentes.209

Aos trabalhadores que continuarem na atividade portuária, medidas mais

rígidas de segurança, higiene e formação profissional dos trabalhadores

envolvidos deverão ser observadas.210

A Convenção 137 ainda prega o estimulo à negociação coletiva, a

possibilidade de pacificação dos interesses pela via arbitral, como formas

substitutivas aos preceitos dispostos neste regramento internacional.211

Após a ratificação da Convenção 137 da OIT, o Brasil adotou a

Recomendação 145 da OIT, que também trata das repercussões sociais dos

novos métodos de processamento de carga nos portos.

Como principais conclusões excedentes àquelas previstas na Convenção, a

Recomendação estabelece a adoção de políticas nacionais de desenvolvimento e 206 Artigo 2º da Convenção 137 da OIT. 207 Artigo 3º da Convenção 137 da OIT. 208 Artigo 4º da Convenção 137 da OIT. 209 Artigo 5º da Convenção 137 da OIT. 210 Artigo 6º da Convenção 137 da OIT. 211 Artigo 7º da Convenção 137 da OIT.

90

qualificação da mão de obra, quando da implementação de novos métodos de

processamento de carga.212

Na medida do possível, deve-se assegurar um emprego permanente e

regular aos trabalhadores portuários. Na impossibilidade, devem ser observadas

garantias mínimas de renda, indenizações pela falta de trabalho, períodos

mínimos de prestação de serviço e compensação financeira àqueles trabalhadores

que decidam pelo definitivo desligamento das suas atividades laborais.213

O regramento da OIT recomenda a diminuição do número de categorias

especializadas com a capacitação dos trabalhadores para executarem um número

maior de tarefas e abandono de práticas arcaicas.214

Na busca de trabalhadores polivalentes, o instrumento internacional ainda

estimula a supressão da distinção do trabalho de bordo e trabalho em terra, para

conseguir maior intercâmbio e flexibilidade da mão de obra na designação do

trabalho e rendimento das operações.215

Para evitar a precarização mais efetiva dos postos de trabalho, a

Recomendação estimula a periódica revisão do quantitativo disponível de

trabalhadores e desestimula a contratação de trabalhadores que não são

registrados como portuários, exceto quando tais trabalhadores estejam

empregados. A readaptação profissional também é prevista, quando ocorrer a

diminuição da demanda de trabalho216

A Recomendação estabelece que exceto nos casos de emprego regular e

permanente com vinculação direta a um empregador, deverá ser observada uma

distribuição equitativa do trabalho disponível, tempo reduzido para a seleção e

designação do trabalho e que, na medida do possível, que as atividades sejam

terminadas pelos mesmos trabalhadores portuários que tenham começado no

serviço.217

Recomenda também a prestação de serviços por turnos, com limitação de

jornada e compensação financeira pelos inconvenientes do trabalho noturno e em 212 Item 6 da Recomendação 146 da OIT. 213 Itens 7 a 10 da Recomendação 145 da OIT. 214 Item 12 da Recomendação 145 da OIT. 215 Item 13 da Recomendação 145 da OIT. 216 Item 15 e 17 da Recomendação 145 da OIT. 217 Item 20 da Recomendação 145 da OIT.

91

finais de semana, com racionalização do tempo de serviço e eliminação do tempo

improdutivo.

O reconhecimento das entidades representativas dos empregadores e

trabalhadores é reforçado nesta Recomendação, que orienta a negociação

coletiva não somente para problemas relativos a salários e condições de trabalho,

mas também a discussão de medidas sociais necessárias para fazer frente às

repercussões de novos métodos de processamento de carga.218

Para minimizar a precarização das atividades, a Recomendação 145 da OIT

sugere a paridade de condições de trabalho entre os trabalhadores portuários e os

trabalhadores das empresas industriais, e prevê a possibilidade dos

empregadores em partilhar com os trabalhadores portuários, os aumentos de

produtividade decorrentes de métodos mais rentáveis de movimentação de

mercadorias.219

A Recomendação 145 da OIT ainda fomenta a possibilidade de aumento da

remuneração e alteração das condições de trabalho dos portuários que recebem

por produtividade, quando os empregadores introduzirem novos métodos de

processamento de carga.220

E, com base nos preceitos dispostos nestes regramentos internacionais, a

Lei 8.630/93 e posteriormente a Lei 9719/98, foram criadas e são aquelas que

essencialmente balizam as condições de trabalho no âmbito portuário.

3.2 – A compatibilidade da Convenção 137 e da Recom endação

145 da OIT com as Leis 8.630/93 e 9.719/98

Como visto anteriormente, o projeto original da Lei dos Portos, de

característica eminentemente neoliberal (PL 8/1991), sofreu mudanças, muitas

218 Item 23 da Recomendação 145 da OIT. 219 Item 33 da Recomendação 145 da OIT. 220 Item 34 da Recomendação 145 da OIT.

92

delas decorrentes da influência da Convenção 137 e da Recomendação 145 da

OIT.

Na tentativa de frear os impulsos liberais, foram assegurados direitos

mínimos e proteção transitória ao trabalho portuário que reduz ferozmente em

quantidade, em vista da implementação dos novos métodos de movimentação de

carga, especialmente aqueles decorrentes da conteinerização do transporte

internacional.

Com a retirada dos sindicatos dos trabalhadores do controle da mão de

obra, restou às entidades profissionais somente a função de defender os

interesses coletivos e individuais de suas categorias. O OGMO passou

paulativamente a assumir suas obrigações, muitas delas decorrentes das normas

internacionais aqui discutidas.

Dentre as atividades incumbidas ao OGMO, em observância a Convenção

137, está a possibilidade de ceder ao operador portuário, trabalhadores

matriculados, com prioridade para a obtenção de trabalho, para vinculação

empregatícia permanente a prazo determinado.221

Na impossibilidade de emprego permanente aos portuários, e em razão ao

disposto no parágrafo 5º da Lei 9.719/98, caberá ao OGMO, na ausência de

negociação coletiva, realizar a escalação do trabalhador portuário avulso, em

sistema de rodízio, com a observância equitativa na distribuição do trabalho

disponível, baseando-se no sistema numérico de trabalhadores e verificadas as

habilitações exigidas para cada posto de trabalho.222

A verificação periódica do quantitativo de trabalhadores presentes em cada

porto é de competência do OGMO, conforme artigo 18 da Leis dos Portos e

prevista na convenção, em seu artigo 4º.

A política de garantia de emprego e renda mínima aos trabalhadores

portuários não chegou a ser implementada no Brasil, nos termos recomendados

pela OIT.

221 Artigo 2 e 3 da Convenção 137 c/c Item 7 da Recomendação 145 da OIT c/c artigos 21 e 26 da Lei 8.630/93. 222 STEIN, Alex Sandro. Curso de direito portuário: lei 8.630/93; -São Paulo: LTr, 2002, p. 80.

93

Isto vem causando inúmeras manifestações das entidades sindicais

brasileiras para o efetivo cumprimento das normas portuárias da OIT, na em

medida em que sem o estabelecimento de regras para a observância integral das

normas internacionais, elas perderiam sua eficácia frente aos novos métodos de

processamento de cargas.

Um exemplo muito claro disso está na preocupação das 3 federações

representativas de trabalhadores portuários (FENCCOVIB, FNP e FNE223), ao

fazerem a entrega de documento conjunto ao Ministro de Portos, pedindo o

cumprimento das medidas de proteção ao trabalhador portuário dispostas na

Convenção 137 e na Recomendação 145 da OIT.224

O estímulo à negociação coletiva estampado no artigo 5º da Convenção

137 materializa-se na Lei dos Portos ao prever a possibilidade de dispensa da

intervenção do OGMO, no caso de vir a ser celebrado contrato, acordo ou

convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviço.225

223 Federação Nacional dos Conferentes e Consertadores de Carga e Descarga, Vigias Portuários, Trabalhadores de Bloco, Arrumadores e Amarradores de Navios nas Atividades Portuárias – FENCCOVIB; Federação Nacional dos Portuários – FNP; Federação Nacional dos Estivadores – FNE. 224 Pelo exposto, as signatárias vêm respeitosamente requerer providências de Vossa Excelência no sentido de adotar os encaminhamentos do âmbito de sua competência funcional, no sentido de que sejam adotadas as medidas regulamentadoras necessárias e cabíveis para a eficácia e, desse modo, o cumprimento integral das normas consubstanciada na Convenção nº 137 da OIT e na sua Recomendação Nº 145, com ênfase quanto: a) a garantia mínima de trabalho ou renda (item 2, do artigo 2º, da convenção 137, e itens 8.1 e 8.2 da Recomendação 147); b) a reserva a cada portuário registrado de uma parte eqüitativa do trabalho disponível (item 20, “b”, da Rec. 145); c) a observância da exclusividade dos trabalhadores portuários devidamente qualificados no órgão competente para contratação e engajamento profissional nos portos e nos navios que frequentam as instalações portuárias privativas; d) a não utilização de mão-de-obra adicional quando o trabalho existente não baste para proporcionar meios adequados de vida aos portuários (item 11 “a” da Rec. 145); e) a adoção de medidas úteis e necessárias, com a finalidade de prevenir ou atenuar os efeitos prejudiciais aos portuários, quando uma redução dos efetivos de um registro se tornar necessária (Art. 4, item 2, da Convenção 137) f) a não utilização, como portuários, daqueles que não estejam registrados como tais, salvo quando todos os portuários registrados estiverem empregados, quando poder-se-á contratar outros trabalhadores (item 15 da Rec. 145); g) criação de normas específicas e excepcionais para os portuários,no sentido de que seja levado em conta a redução de sua idade para aposentadoria e/ou para facilitar sua aposentadoria voluntária antecipada (item 19.2 “d”). http://www.fenccovib.org.br/modules/news/index.php?storytopic=2 Acessado em 18/07/2012. 225 Parágrafo Único do artigo 18 da Lei 8.630/93.

94

Os preceitos de aplicação da Convenção 137 da OIT podem ainda serem

dispensados de aplicação, consoante seu artigo 7º, caso existentes tratativas

coletivas ou sentenças arbitrais, que também são previstas nos parágrafos do

artigo 23 da Lei dos Portos.

A incumbência do OGMO na promoção da formação profissional e no

treinamento multifuncional do trabalhador portuário, bem como programas de

realocação e de incentivo na saída do sistema como trabalhador portuário226, teve

influência na Recomendação 145 da OIT.

A norma internacional também estimula a supressão da distinção do

trabalho de bordo e de terra, com limitação de categorias de trabalhadores e na

impossibilidade de emprego permanente ou regular à classe operária, à

implementação de medidas adequadas de indenização ou estímulo à antecipação

da aposentadoria.227

Quanto ao critério de assiduidade dos trabalhadores na atividade portuária,

a Convenção 137 da OIT conceitua como trabalhadores por ela abrangidos

aquelas “pessoas que trabalham de modo regular como portuário, e cuja principal

fonte de renda anual provém deste trabalho”228, acrescentando em seu artigo 3º,

que “os portuários matriculados deverão estar prontos para trabalhar de acordo

com o que for determinado pela legislação ou a prática nacionais”

A Recomendação 145 da OIT prevê, em seu item 19.2 – quando trata da

necessidade de redução de quadros de portuários – a observância para a

exclusão dos trabalhadores que não tirem seus principais proventos da atividade

portuária.

Alguns OGMO no Brasil têm retirado da escala rodiziária de trabalho

aqueles portuários avulsos que não comparecem aos pontos de escalação por

longo período. No Porto de Itaqui, no Maranhão, inclusive há punições previstas

em norma coletiva àqueles que não se habilitam periodicamente ao trabalho.229

226 Inciso II do artigo 18 e parágrafos 1º e 2º do artigo 57 da Lei 8.630/93. 227 Alínea d do item 5 c/c item 10 c/c item 12 c/c item 13 da Convenção 145 da OIT. 228 Artigo 1º, ‘1’ da Convenção 137 da OIT. 229 PAIXÃO, Cristiano – Trabalho portuário: a modernização dos portos e as relações de trabalho no Brasil – São Paulo: Método, 2008, p. 82/83. Acrescenta o Autor que a realidade nacional revela que dos atuais cerca de 34.000 trabalhadores portuários avulsos, não mais que 20.000 efetivamente comparecem aos pontos de escalação regularmente, o que permitiria uma redução

95

A Recomendação 145 da OIT refere-se também à conveniência de evitar o

trabalho em dois turnos consecutivos, com fixação de horário adequado aos

turnos e duração máxima. Neste mesmo sentido, o artigo 8º da Lei 9719/98

internaliza a Recomendação da OIT ao determinar: “na escalação diária do

trabalhador avulso, deverá sempre ser observado um intervalo mínimo de 11

horas consecutivas entre duas jornadas, salvo em situações excepcionais,

constantes de acordo ou convenção coletiva”.

3.3 – A isonomia de direitos entre o trabalhador po rtuário avulso e

o trabalhador detentor de vínculo empregatício perm anente

Reflexo das alterações no regime de trabalho portuário decorrentes dos

novos métodos de processamento de cargas, e pela tendência neoliberal da livre

negociação entre os agentes envolvidos, o inciso XXXIV do artigo 7º da CF,

estabeleceu como medida protetiva dos possíveis efeitos prejudiciais ao

trabalhador, a “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício

permanente e o trabalhador avulso”.

O caput de referido artigo e seus trinta e quatro incisos definem os direitos

fundamentais dos trabalhadores urbanos e rurais.

O trabalhador portuário avulso, dada a especificidade do modo de

prestação de serviços, inclusive por que ausentes à totalidade dos requisitos para

relação de emprego dispostos no artigo 3º da CLT, tem relativizado alguns dos

direitos previstos na carta maior, muitas vezes objeto de controvérsias no

judiciário.

Mesmo após a revogação dos artigos 254 a 292 da CLT e diversas outras

normas sobre a atividade avulsa, pelos artigos 75 e 76 da Lei 8.630/93, alguns

drástica no atual contingente e uma melhor análise da questão portuária e seus reflexos na sociedade nacional. Informa que a legislação vigente, já oferece elementos sucientes para que sejam excluídos dos quadros dos OGMO´s aqueles trabalhadores que não têm como fonte de renda principal o trabalho portuário e/ou não comparecem, regularmente, para habilitação ao trabalho.

96

direitos trabalhistas garantidos aos trabalhadores portuários avulsos ainda

subsistiram em diversas leis sobre o assunto.

Pode-se citar a Lei 5.085/1966, que instituiu aos avulsos portuários o direito

às férias anuais remuneradas e a Lei 5.480/1968, que aplicou o direito ao FGTS e

também ao décimo terceiro salário.

A Lei 7.002/1982 permitiu às administrações dos portos o estabelecimento

de jornada noturna para os serviços de capatazia, com duração de seis horas

cada turno e adicional de 50%.

O art. 4º da Lei 4.860/1965 dispõe sobre o horário noturno para as

atividades do portuário. 230

O direito fundamental ao descanso semanal remunerado já era extensivo

ao avulso portuário na Lei 605/1949, e os adicionais de periculosidade e

insalubridade também estão estendidos aos TPA de forma incontroversa, em vista

da isonomia constitucional anunciada.

A Lei nº 8.212/91231 declara que os trabalhadores avulsos são segurados

obrigatórios da Previdência Social.

Entretanto, para que alguns dos direitos trabalhistas do portuário avulso não

sejam relativizados pela livre negociação incentivada pela Lei 8.630/93, os direitos

fundamentais previstos no artigo 7º da CF e seus incisos deverão ser observados,

nos limites da igualdade fática com os trabalhadores detentores de vínculo

empregatício permanente.

Não se trata, portanto, de igualdade absoluta, a ponto de lhes assegurar

todos os direitos devidos aos empregados urbanos, na medida em que os avulsos

não se referem aos trabalhadores com relação de emprego, com regramento

específico sobre o tema.

A seguir, serão abordados, exemplificativamente, alguns dos direitos

previstos no artigo 7º da CF, que são controvertidos de aplicação ao trabalhador

portuário avulso no judiciário especializado: gozo de férias, hora extra e adicional

de risco portuário.

230 19:00 às 07:00 horas do dia seguinte. 231 artigo 12, do Plano de Benefícios da Previdência Social, ... VI – como trabalhador avulso quem presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviços de natureza urbana ou rural definidos no regulamento.

97

3.3.1 – O Trabalhador Avulso tem direito ao gozo de férias?

As duas decisões antagônicas sobre este assunto abrem a discussão

quanto à aplicabilidade da igualdade constitucional do trabalhador avulso com

aquele detentor de vínculo empregatício permanente, em direitos não

expressamente previstos na legislação infraconstitucional.232

A primeira, além do recebimento, confere ao TPA o gozo das férias, sob a

responsabilidade de controle pelo OGMO, e em razão da isonomia entre o avulso

e o detentor de vínculo empregatício permanente, aplica no caso de falta de

usufruto do descanso anual o artigo 137, da CLT, que obriga o empregador o

pagamento em dobro caso não usufruídas as férias no momento oportuno.233

A decisão oposta sobre o tema, embora ratifique o direito constitucional das

férias ao TPA, não transfere o direito ao OGMO na obrigação de abster o

232 Decisões extraídas do sítio do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná: www.trt9.jus.br. 233 PARANÁ, TRT RO-04154-2007-322-09-00-8- RECORRENTE(s): Amaury Correia, Ariovaldo Mendes Diniz Junior, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR RECORRIDO(s): Amaury Correia, Ariovaldo Mendes Diniz Junior, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR Publicado no DEJT em 26-10-2010 - 2A. TURMA Relator: ROSEMARIE DIEDRICHS PIMPÃO. TRABALHADORES PORTUÁRIOS AVULSOS. DOBRA DE FÉRIAS. Os trabalhadores portuários avulsos possuem igualdade de direitos com os trabalhadores com vínculo empregatício permanente, por força do disposto no art. 7º, XXXIV, da Constituição Federal, sendo alcançados pelo direito ao descanso anual remunerado, tal como, inclusive, já antevia a Lei 5.085/66, que lhes reconheceu tal direito, e o Decreto 80.271/1977, que disciplinou a matéria. A par disso, a solução a ser adotada na espécie há de levar em consideração, precipuamente, que as condições de trabalho dos avulsos devem ser aperfeiçoadas, prestigiando-se iniciativas que acarretem benefícios duradouros à classe trabalhadora nos portos, bem como se rechaçando aquelas que lhes ameace, na diretriz da Lei de Modernização dos Portos. Assim, em que pese não serem o OGMO ou os operadores portuários empregadores dos trabalhadores portuários avulsos, bem assim o fato de que estes laboram em regime de escala, trabalhando na medida da demanda de serviço, possuindo liberdade para comparecer ou não à escalação, não se lhes afasta a incidência do direito ao gozo de férias. Consoante os mais recentes pronunciamentos desta Egrégia Turma a respeito do tema, dos quais passei a compartilhar, o trabalhador portuário avulso faz jus ao gozo de férias, de modo que recebendo o pagamento correspondente, porém, não as usufruindo, como ocorre in casu de forma incontroversa, tem direito à dobra prevista no art. 137 da CLT, por força da igualdade de direitos que lhe é assegurada em relação ao trabalhador com vínculo empregatício permanente (art. 7º, XXXIV, da Constituição Federal).

98

trabalhador de concorrer à escala rodiziária, sendo de livre arbítrio do TPA o gozo

e a quantidade de dias de descanso.234

Os defensores da extensão deste direito ao TPA apresentam que a CF, ao

equiparar o avulso com aqueles trabalhadores detentores de vinculação

empregatícia, regulamentou o direito ao gozo de férias235, inclusive remetendo

este direito individual indisponível aos artigos dispostos na própria CLT.

Referida transcrição, juntamente com aqueles artigos da CLT, destinados

às férias236, remetem à obrigatoriedade do gozo de férias pelos trabalhadores

avulsos e não somente ao respectivo pagamento.

O Decreto nº 80.271/1977 regulamenta a concessão de férias anuais aos

trabalhadores avulsos.237

O direito ao gozo de férias é indisponível e direito fundamental, uma vez

que é importante para a saúde e segurança do trabalhador, nem mesmo podendo

ser alterado em convenção coletiva ou recusado pelo trabalhador. Dada a

irrenunciabilidade dessa verba, o sindicato da categoria e nem mesmo o próprio

trabalhador podem optar pelo não gozo de férias.

Nesse momento, é que surge a controvérsia quanto à responsabilidade pelo

controle dos períodos aquisitivos e concessivos de férias do trabalhador, bem 234 PARANÁ, TRT, RO 01730-2007-411-09-00-0-ACO-07495-2009, RECORRENTE(s): Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR, Paulo Cesar de Carvalho, Levy Alves dos Santos Filho, Aurimar Alves - Recurso Adesivo, RECORRIDO(s): Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR, Paulo Cesar de Carvalho, Levy Alves dos Santos Filho, Aurimar Alves - Recurso Adesivo, Publicado no DJPR em 17-03-2009, 1A. TURMA, Relator: EDMILSON ANTONIO DE LIMA. FÉRIAS DOBRADAS - A ausência de regulamentação em norma coletiva acerca do período de gozo de férias pelo trabalhador portuário avulso não transfere ao OGMO a obrigação de se abster a seu talante de integrar o trabalhador na escala. A obrigação do OGMO e do operador portuário, nesse caso, limita-se ao pagamento da verba, nos termos do art. 2º da Lei 9.719/98. Se isso ocorre e o trabalhador avulso opta por não deixar de concorrer à escala diária, não terá direito à dobra das férias. Situação distinta da prevista no art. 137 da CLT, pois a definição do período concessivo não cabe ao OGMO. Recurso dos autores a que se nega provimento, no particular. 235 BRASIL, Lei 5085/66 - Art. 1º É reconhecido aos trabalhadores avulsos, inclusive aos estivadores, conferentes e consertadores de carga e descarga, vigias portuários, arrumadores e ensacadores de café e de cacau, o direito a férias anuais remuneradas, aplicando-se aos mesmos no que couber, as disposições constantes das Seções I a V, do Capítulo IV do título II, artigos 130 a 147, da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. 236 Artigos 130 e seguintes da CLT; 237 BRASIL, Decreto 80.271/77, art. 7º - As férias dos trabalhadores avulsos serão de 30 dias corridos, salvo quando o montante do adicional for inferior ao salário base diário multiplicado por trinta, caso em que gozarão férias proporcionais.

99

como os limites de aplicação da lei consolidada. Se a responsabilidade é atribuída

exclusivamente ao TPA ou ao OGMO.

Os defensores que atribuem à responsabilidade do OGMO, no controle do

gozo de férias do trabalhador portuário avulso, consideram que o órgão de gestão

é o responsável pela contratação de novos trabalhadores portuários, além de

promover treinamentos e habilitação profissional.

O OGMO, com base na Lei 8630/93, é o responsável na aplicação de

punições, até podendo cancelar o registro do trabalhador, preenchendo o requisito

necessário da relação de emprego, qual seja, a subordinação. O OGMO também

é o responsável em realizar a escalação do trabalhador portuário avulso e

determinar o local e a hora do trabalho a ser realizado.

Apesar da relação de trabalho do avulso portuário se tratar de um contrato

de trabalho especial, como em todo e qualquer contrato de emprego, também

existe subordinação no trabalho avulso.

Havendo a subordinação, consubstanciado no poder disciplinar e no

domínio da escala de trabalho, acabará sendo o OGMO o responsável pela escala

de férias do trabalhador portuário avulso e, se caso não efetivou o gozo das férias

destes trabalhadores, deverá ser o responsável pelo pagamento da respectiva

dobra, nos termos do artigo 137 da CLT e em observância à isonomia

constitucional prevista na Constituição.

Entretanto, as decisões majoritárias da justiça especializada defendem que

diferentemente da hipótese do art. 137 da CLT, não existe responsabilidade do

OGMO nas marcações dos períodos de férias dos trabalhadores avulsos, que só

poderia ser responsabilizado se presente esta obrigação em lei, acordo ou

convenção coletiva de trabalho.

A falta de regulamentação efetiva exime o orgão gestor de responsabilizar-

se pelo controle do gozo de férias dos avulsos portuários.

Portanto, a ausência de gozo de férias, segundo entendimento dominante,

acaba sendo imputável exclusivamente ao trabalhador, razão que não poderá o

OGMO ser penalizado por tal omissão, que não deixou de remunerar e nem de

possibilitar o descanso anual, e, portanto, não deverá sofrer a aplicação da

penalidade prevista na CLT.

100

3.3.2 – O trabalho avulso gera direito de recebimen to de hora extraordinária

ao TPA?

Seguindo a sistemática adotada no item anterior, dois acórdãos rivalizam

entre si quanto à extensão do direito constitucional ao avulso portuário quanto ao

recebimento de horas extras.238

O primeiro, que entende ser extensível o direito de horas extras ao TPA,

justifica a necessidade de observância de períodos mínimos de descanso, em face

da necessidade de valorização do trabalho humano em que se fundamenta a

ordem econômica e, sendo o OGMO o responsável pelo controle da escala do

trabalhador, caberia e ele o pagamento de jornada extraordinária, caso não

observados os limites de proteção dispostas em lei.239

Por sua vez, as decisões que não aplicam a isonomia constitucional do TPA

com o trabalhador vinculado, entendem que o engajamento é fruto de livre arbítrio

do trabalhador, não podendo ser atribuído ao OGMO, a responsabilidade pelo

238 Decisões extraídas dos sítios www.trt9.jus.br e www.trt12.jus.br . 239 PARANÁ, TRT, RO - 00054-2007-411-09-00-7, RECORRENTE(s): Alcione dos Santos, Salvador Cardozo dos Santos, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR, RECORRIDO(s): Alcione dos Santos, Salvador Cardozo dos Santos, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR Publicado no DJPR em 08-04-2008, 2A. TURMA, Relator: ROSEMARIE DIEDRICHS PIMPÃO. TRABALHADOR PORTUÁRIO AVULSO. 1 - JORNADA DE TRABALHO - TURNOS ININTERRUPTOS DE REVEZAMENTO - A inspiração constitucional orienta no sentido de que sejam observados os limites legais de jornada do trabalhador avulso, bem assim a necessidade da concessão dos períodos mínimos de descanso, face à premente necessidade de valorização do trabalho humano em que se fundamenta a ordem econômica, com vistas a assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (art. 170 da CF), reverenciando os fundamentos do Estado Democrático de Direito, precipuamente a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (art. 1º, III e IV, da CF). De nada adiantaria o ordenamento jurídico assegurar ao trabalhador avulso idênticos direitos em relação ao trabalhador com vínculo empregatício permanente e depois deixar esses direitos subordinados ao livre arbítrio e no interesse do Órgão Gestor de Mão-de-Obra e dos operadores portuários, em detrimento dos trabalhadores avulsos. Assim, se houve trabalho nos moldes da previsão inserta no art. 7º, XIV, da Constituição Federal, ou seja, em alternância de turnos, atentaria contra os princípios antes mencionados afastar a incidência da proteção constitucional em relação aos trabalhadores portuários avulsos, revelando-se incensurável, dessarte, a decisão que reconheceu sujeitar-se o autor a jornada de seis horas.

101

pagamento de hora suplementar, quando desrespeitada a legislação protetiva

sobre o assunto.240

No presente caso, a igualdade constitucional do trabalhador com vínculo

empregatício permanente e o trabalhador avulso, de pagamento das horas

extraordinárias, têm previsão constitucional nos incisos XIII e XIV do artigo 7º.

Considerando esta igualdade constitucional e o OGMO sendo o

responsável pela escala e verificação do local de trabalho, inclusive sendo o

responsável hierárquico dos avulsos, converge o direito fundamental aos

trabalhadores portuários avulsos do recebimento de horas extras.

A Lei 9.719/98 informa que deverá ser observado intervalo mínimo de 11

horas entre uma jornada de trabalho e outra, à luz, inclusive, do disposto no artigo

66 da CLT.

Embora não aplicável ao trabalho portuário avulso, a Lei 12.023/2009, que

trata do trabalhador avulso “não portuário”, estende o direito fundamental do

artigo 7º da CF também para a aplicabilidade de horas extras, mais um indicativo

de que deverá ser extensível ao avulso portuário, àqueles que defendem a

aplicação deste direito ao avulso.

Todavia, as decisões judiciais que não conferem ao avulso o direito a

jornada extraordinária, justificam de forma similar ao direito de gozo de férias, na

medida em que é plena a liberdade de prestação de serviços por parte do avulso,

que não sofre ingerência do OGMO no controle da sua escala.

Ainda, o contrato de trabalho do avulso, por ser considerado por diversos

entendimentos de período extremamente breve, iniciando e cessando em cada 240 SANTA CATARINA, TRT, RO 04273-2008-050-12-00-0, RECORRENTE: ORGÃO DE GESTÃO DE MÃO-DE-OBRA DO TRABALHO PORTUÁRIO AVULSO DO PORTO DE SÃO FRANCISCO DO SUL, RECORRIDO: JOAREZ LOPES, Publicado no TRTSC/DOE em 17-06-2009, Juíza Gisele P. Alexandrino. TRABALHADOR AVULSO. HORAS EXTRAS. PAGAMENTO INDEVIDO. De acordo com o art. 8º da Lei nº 9.719/98, na escalação diária do trabalhador portuário avulso deverá sempre ser observado um intervalo mínimo de onze horas consecutivas entre duas jornadas, salvo em situações excepcionais, constantes de acordo ou convenção coletiva de trabalho. Portanto, a lei prevê a possibilidade de jornada dobrada apenas em casos excepcionais. A realidade vivida pelos trabalhadores portuários avulsos, contudo, indica que a ocorrência de labor em mais de uma pegada no dia, ocorre por interesse próprio do trabalhador portuário. Diante disso, não há como responsabilizar o órgão de gestão de mão-de-obra pelo pagamento de horas extras, quando se verifica que o engajamento na pegada seguinte, sem observação do intervalo mínimo de onze horas consecutivas entre duas jornadas, ocorre pelo livre arbítrio do trabalhador e muitas vezes em afronta a determinação expressa em contrário.

102

trabalho realizado, não será compatível com o direito de horas extras, quando a

prestação de serviços for realizada a diversos operadores portuários.

As decisões que conferem o direito de horas extras sob a responsabilidade

do OGMO, que passam a ser dominantes, atribuem à necessidade de

observância do intervalo de 11 horas, quando realizada a dobra de jornada com o

mesmo operador portuário que requisitou o serviço, subsistindo este direito

constitucional ao trabalhador avulso.241

3.3.3 – A Lei 4.860/65 é aplicável ao TPA?

Seguindo a mesma sistemática adotada nos itens anteriores, outro direito

controverso de aplicação é o adicional de risco, previsto na Lei 4.860/65, que

assegura adicional de 40% aos trabalhadores da Administração do Porto, para

compensar a insalubridade e a periculosidade presentes no ambiente de trabalho

portuário. As duas ementas demonstram o dissenso sobre o assunto.

A primeira decisão, que confere a igualdade de direitos, assegura que a Lei

4.860/65 prevê o adicional de 40% apenas ao trabalhador empregado da

Administração do Porto.

A mera falta de vinculação empregatícia do TPA que exerce atividades no

mesmo local de trabalho do empregado da Administração do Porto, não

fundamenta logicamente a discriminação pelo não pagamento do adicional de

risco, contrariando o preceito constitucional da igualdade. Este direito deverá ser

estendido também ao portuário avulso.242

241 Ementas extraídas do sítio www.tst.jus.br . 242 BRASIL, TST, RR - 688/2001-322-09-00, Recorrente(s): ÓRGÃO DE GESTÃO DE MÃO DE OBRA DO SERVIÇO PORTUÁRIO AVULSO DO PORTO ORGANIZADO DE PARANAGUÁ E ANTONINA - OGMO Recorrido(s): ARMAZÉNS GERAIS TERMINAL LTDA. Recorrido(s): CLARINDO AMORIM ADÃO E OUTROS - PUBLICAÇÃO: DJ - 20/10/2006, 3ª Turma, RELATOR Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi. ADICIONAL DE RISCO IGUALDADE DE DIREITOS ENTRE TRABALHADORES EMPREGADOS E AVULSOS ART. 7º, XXXIV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA O Tribunal Regional consignou que o adicional de risco, a teor da Lei nº 4.860/65, é assegurado somente ao trabalhador empregado da Administração do Porto.2. Entretanto, o simples fato de um trabalhador ser empregado, enquanto o outro é avulso, não justifica a percepção do adicional pelo

103

Todavia, as decisões que não estendem ao TPA o direito do adicional de

risco, fundamentam que a partir da Lei 8.630/93, as administrações dos portos

passaram a ter função apenas gerencial, não tendo mais trabalhadores expostos a

condições de risco, e que, portando, não teriam direito de receber o referido

adicional, tornando impossível a extensão deste direito ao TPA.243

As decisões que reconhecem a isonomia constitucional entre os

trabalhadores vinculados e os avulsos quanto ao adicional de risco, enumeram

que o simples fato de um trabalhador ser empregado, enquanto o outro é avulso,

não justifica a percepção do adicional de risco pelo primeiro, mas, não, pelo

segundo.

A mera inexistência de vínculo permanente de emprego não fundamenta

a discriminação entre atividades iguais, mas realizada por diferentes espécies de

trabalhadores.

Reconhecer o tratamento diferenciado entre estes trabalhadores, com

observância apenas na existência ou não de vínculo empregatício, implicaria

contrariar diretamente o preceito constitucional ora em discussão.

primeiro, mas, não pelo segundo, mormente se constatado, na espécie, que os Reclamantes estavam, sim, submetidos às condições de risco. Em suma, a mera inexistência de vínculo permanente de emprego não fundamenta logicamente a discriminação reconhecida pelo Eg. Tribunal Regional. 3. Esse entendimento é reforçado em face do artigo 7º, XXXIV, da Carta Magna, que é expresso ao prever a igualdade de direitos entre trabalhadores empregados e avulsos. Por conseguinte, reconhecer o tratamento diferenciado entre ambos, com espeque apenas na existência ou não de vínculo empregatício, implicaria contrariar diretamente esse preceito constitucional. 243 BRASIL, TST, Processo: RR - 117100-31.2006.5.05.0121, RECORRENTE INTERMARÍTIMA TERMINAIS LTDA. ÓRGÃO DE GESTÃO DE MÃO-DE-OBRA DO TRABALHO PORTUÁRIO AVULSO DOS PORTOS ORGANIZADOS DE SALVADOR E ARATU - OGMOSA E OUTROS, RECORRIDO: PAULO ROBERTO RIBEIRO DA SILVA, Data de Julgamento: 27/06/2012, 7ª TURMA, Data de Publicação: DEJT 29/06/2012, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho. ADICIONAL DE RISCO - PORTUÁRIO - TRABALHADOR AVULSO - ART. 14 DA LEI 4.860/65 - PARCELA INDEVIDA. 1. Considerando que, a partir da Lei 8.630/93, a administração dos portos passou a ter apenas função gerencial e as operações portuárias passaram a ser executadas pelos operadores portuários privados, este Tribunal Superior passou a entender que não seria mais possível estender o adicional de risco aos trabalhadores avulsos, já que os trabalhadores portuários empregados deixaram de receber o referido benefício, uma vez que não estavam mais sujeitos ao risco das operações portuárias. 2. Na hipótese dos autos, a Turma Julgadora -a quo- deferiu ao Obreiro o adicional de risco , ao fundamento de que, à luz do art. 7º, XXXIV, da CF, o art. 14 da Lei 4.860/65 assegura a todos, ainda que sem vínculo empregatício, a verba prevista no diploma mencionado. 3. Nesse contexto, a reforma do acórdão regional é medida que se impõe, haja vista que a SBDI-1 do TST entende que os trabalhadores portuários avulsos não têm o direito de receber o adicional de risco pleiteado. Recursos de revista das Reclamadas providos. (

104

Entretanto, as decisões majoritárias sobre a extensão do adicional de

risco ao avulso, fundamentam que a CF, ao garantir igualdade de direitos entre o

trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso, não

estendeu a este os direitos previstos na Lei nº 4.860/65244, assegurados apenas

aos empregados da Administração dos Portos. Os direitos especiais previstos a

categorias determinadas não são extensíveis aos trabalhadores avulsos.

A discussão quanto à extensão dos direitos dos vinculados aos TPA não

fica limitada aos assuntos aqui discutidos. Diversas outras controvérsias sofrem

interpretações variáveis na justiça especializada, como intervalos legais, multa do

FGTS e termo inicial para aplicação da prescrição bienal.245

244 BRASIL, Lei 4.860/65 - Art 14. A fim de remunerar os riscos relativos à insalubridade, periculosidade e outros porventura existentes, fica instituído o "adicional de riscos" de 40% (quarenta por cento) que incidirá sobre o valor do salário-hora ordinário do período diurno e substituirá todos aqueles que, com sentido ou caráter idêntico, vinham sendo pagos. § 1º Este adicional sòmente será devido enquanto não forem removidas ou eliminadas as causas de risco. § 2º Este adicional sòmente será devido durante o tempo efetivo no serviço considerado sob risco. § 3º As Administrações dos Portos, no prazo de 60 (sessenta) dias, discriminarão, ouvida a autoridade competente, os serviços considerados sob risco. § 4º Nenhum outro adicional será devido além do previsto neste artigo. § 5º Só será devido uma única vez, na execução da mesma tarefa, o adicional previsto neste artigo, mesmo quando ocorra, simultâneamente, mais de uma causa de risco. 245 O TST, em 14/09/2012, cancelou a OJ n. 384, que dava interpretação quanto ao termo inicial da prescrição bienal aos TPA: TRABALHADOR AVULSO. PRESCRIÇÃO BIENAL. TERMO INICIAL - É aplicável a prescrição bienal prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988 ao trabalhador avulso, tendo como marco inicial a cessação do trabalho ultimado para cada tomador de serviço.

105

CAPÍTULO III – REFLEXOS DA (INACABADA)

IMPLANTAÇÃO DA LEI DOS PORTOS E DA CONVENÇÃO

137 DA OIT NO TRABALHO PORTUÁRIO BRASILEIRO

1 – A NEGOCIAÇÃO DIRETA COMO FORMA DE SOLUÇÃO DOS

CONFLITOS

1.1 – Estímulo a negociação coletiva como método de solução de

conflitos

A Lei dos Portos elegeu como método principal de solução de conflitos

entre capital/trabalho, a negociação direta entre os trabalhadores avulsos e os

operadores portuários para o estabelecimento de remuneração, quantitativo de

equipes e condições de trabalho.

O fruto da negociação realizada pelas partes deverá ser observado

obrigatoriamente pelo OGMO.

O enfraquecimento das entidades sindicais em sua representatividade e no

seu poder de negociação desestabilizou o equilíbrio negocial inerente às partes

contratantes no âmbito do trabalho.

A falta de obrigatoriedade de sindicalização, a flexibilidade e a

desespecialização da mão-de-obra decorrentes dos novos métodos de gestão do

trabalho, contribuíram para que os sindicatos profissionais estabelecessem

apenas postura defensiva às investidas do capital.

RAMOS FILHO afirma que durante o período hegemonizado pelo

neoliberalismo, o redimensionamento da regulação estatal sobre o trabalho

subordinado aparecia direcionado pela “inelutabilidade” (restaria inútil qualquer

106

luta ou resistência) e da “necessidade” da diminuição do intervencionismo estatal

para revalorizar e repotencializar a autonomia da vontade.246

Acrescenta RAMOS FILHO que para a contínua evolução do Direito

Capitalista do Trabalho247, se faz necessário por parte dos empregadores, dentre

inúmeros outros fatores, debilitar o contrapoder da classe trabalhadora que é

tradicionalmente maior nos períodos de quase pleno emprego e bastante menor

nos momentos de desemprego.

E o Direito do Trabalho procura resistir às investidas empresariais que

propugnam pela sua precarização, utilizando de eufemismos como “flexibilização”,

“modernização” ou “adequação” às necessidades da “sociedade”, ocultando,

ideologicamente, que se trata de necessidades de acumulação de capital.248

A nova redação do artigo 114 da Constituição trazida pela EC n. 45/2004,

retirou da Justiça do Trabalho seu poder normativo para estabelecer direitos e

deveres no âmbito das categorias profissionais e econômicas, quando frustrada a

negociação direta entre os envolvidos.Remete como possibilidade na solução de

conflitos a eleição de árbitros e o julgamento de dissídios coletivos de natureza

econômica somente quando existente comum acordo das partes.249250

A debilidade da atuação sindical na defesa dos interesses dos

trabalhadores, aliada a impossibilidade de recurso às instâncias judiciais

especializadas, levou diversas categorias a não mais estarem albergadas por

246 RAMOS FILHO, Wilson. Direito capitalista do trabalho: história, mitos e perspectivas no Brasil – São Paulo: LTr, 2012, p. 424. 247 Ib, p. 91, Denominado pelo Autor como ramo específico da ordem jurídica garantidora da propriedade dos meios de produção e das condições da sua reprodução, legalizando a exploração do trabalho humano. Esta ordem jurídica, legalizando o direito dos empregadores a subordinar os empregados mediante algumas contrapartidas, permite a racionalização econômica e a fixação das regras do jogo dentro das quais funcionará o sistema capitalista. 248 Ib., p. 309. 249 Artigo 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (...) § 1º - Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros. § 2º - Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. 250 Referido dispositivo constitucional (§ 2º, 114) é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade – BRASIL, STF. ADIN. 3423, Requerente: CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM TURISMO E HOSPITALIDADE - - CONTRATUH e OUTROS, Intdo: CONGRESSO NACIONAL, Distribuído em 04/03/2005, RELATOR Ministro Gilmar Mendes. Disponível www.stf.gov.br.

107

instrumentos coletivos de trabalho, ou se submeterem a condições extremamente

desvantajosas para garantirem condições mínimas de trabalho não abrangidas

pela legislação.

No âmbito do trabalho portuário, a tendência patronal em priorizar a livre

negociação se manifesta também ao discordar na submissão das demandas entre

capital e trabalho na esfera judicial, forçando as entidades sindicais profissionais a

se curvarem às novas condições de gestão adequadas aos novos métodos de

processamento de carga, para ao menos garantirem parte do mercado de trabalho

que detinham anteriormente.

Por sua vez, a Justiça do Trabalho reiteradamente ratifica que a ausência

de comum acordo é pressuposto específico para o ajuizamento de dissídio

coletivo de natureza econômica. A não observância deste requisito para

ajuizamento da ação coletiva ocasiona a extinção do processo sem julgamento do

mérito. 251

251 BRASIL, TST, RODC - 1601400-88.2006.5.09.0909, RECORRENTE: SINDICATO DOS ARRUMADORES E TRABALHADORES PORTUÁRIOS AVULSOS NOS SERVIÇOS DE CAPATAZIA NOS PORTOS DE PARANAGUÁ, RECORRIDO: SINDICATO DOS OPERADORES PORTUÁRIOS DO PARANÁ, Data de Julgamento: 09/10/2008, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: 24/10/2008, Relator Ministro: Márcio Eurico Vitral Amaro. RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE COMUM ACORDO PARA AJUIZAMENTO DO DISSÍDIO COLETIVO. ART. 114, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. Ausência de comum acordo, pressuposto específico para o ajuizamento do dissídio coletivo de natureza econômica nos termos do artigo 114, § 2º, da Constituição da República. Manifestação contrária ao procedimento judicial expressa na contestação. Mantém-se a decisão que, acolhendo preliminar argüida na defesa, declara a extinção do processo, sem julgamento do mérito, por aplicação do art. 267, IV, do CPC. Recurso a que se nega provimento. BRASIL, TST - RODC - 2034000-69.2007.5.02.0000, EMBARGANTE: SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS METALÚRGICAS, MECÂNICAS E DE MATERIAL ELÉTRICO DE SÃO PAU E OUTROS, EMBARGADO: SINDICATO DA CATEGORIA PROFISSIONAL DIFERENCIADA DOS EMPREGADOS E TRABALHADORES DO RAMO DE ATIVIDADE DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA PRIVADA DE SANTOS E REGIÃO E OUTROS, Data de Julgamento: 09/08/2010, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: 17/09/2010, Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda. DISSÍDIO COLETIVO. ANÁLISE CONJUNTA. MÚTUO ACORDO. ARTIGO 114, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXTINÇÃO DO FEITO. Com a edição da Emenda Constitucional n.º 45/2004, estabeleceu-se novo requisito para o ajuizamento da ação coletiva de natureza econômica, qual seja, que haja comum acordo entre as partes. A expressão -comum acordo-, de que trata o art. 114, § 2.º, da Constituição Federal, não significa, necessariamente, petição conjunta das partes, expressando concordância com o ajuizamento da ação coletiva, mas a não oposição da parte, antes ou após a sua propositura, que se pode caracterizar de modo expresso ou tácito, conforme a sua explícita manifestação ou o seu silêncio. In casu, verifica-se que, efetivamente, em preliminar de contestação, houve a recusa expressa de diversos suscitados-recorrentes, o que resulta em relação a esses na extinção do processo sem resolução de mérito,

108

Embora o poder normativo da Justiça Especializada tenha sofrido enorme

restrição pela nova redação da CF, sua postura como mediadora tem apresentado

importância no trabalho portuário.

O desestímulo das entidades sindicais profissionais de ajuizarem dissídios

coletivos de trabalho perante os tribunais regionais, em razão da inevitável falta de

“comum acordo” das entidades patronais no prosseguimento da ação, transfere

aos órgãos judiciais de primeira instância, a necessidade de mediação dos

conflitos.

São frequentes as audiências públicas que ocorrem nas cidades portuárias,

patrocinadas pela Justiça do Trabalho ou pelo Ministério Público do Trabalho, que

tentam a pacificação dos conflitos individuais e coletivos advindos da atividade

laboral portuária.

O ativismo judicial das varas especializadas de Paranaguá, por exemplo,

costuma estabelecer por meio de reuniões com os sindicatos econômicos e

profissionais, OGMO e demais envolvidos, cronograma para conclusão de

processos de negociação envolvendo tanto as convenções coletivas, parâmetros

de ações individuais e coletivas em curso.252

O envolvimento do Poder Judiciário como agente mediador e pelas suas

reiteradas decisões, tornou-se imprescindível na pacificação dos conflitos

originários do trabalho portuário, em vista dos controvertidos direitos trabalhistas

dos TPA como explicitado anteriormente.

A Constituição da República com a EC n. 45 criou também alternativa da

negociação direta, com a faculdade das partes em se submeterem aos árbitros

para solução de conflitos.

ante a ausência de pressuposto de desenvolvimento válido e regular do processo. Prossegue-se o processo em relação aos demais. Recursos ordinários aos quais se dá provimento, no particular. 252 No âmbito da justiça do trabalho, o TRT/PR, através dos juízes Leonardo Vieira Wandelli, José Mário Kohler e Marli Gonçalves Valeiko, lideraram no primeiro semestre de 2012 em Paranaguá, diversas audiências públicas com representantes dos sindicatos dos operadores portuários e trabalhadores, OGMO, advogados e trabalhadores, com o objetivo de mediar o crescimento dos conflitos coletivos e individuais no âmbito do trabalho portuário avulso no porto de Paranaguá, estabelecendo cronogramas e limites de negociação na elaboração de instrumentos coletivos de trabalho, reformulação de sentença arbitral e parâmetros mínimos nas conciliações individuais das ações trabalhistas. Fonte: www.trt9.jus.br – acessado em 20 de agosto de 2012.

109

1.2 – A (falta de) obrigatoriedade de submissão dos trabalhadores

avulsos na Comissão Paritária prevista na Lei dos P ortos

Conforme Lei dos Portos, no âmbito do OGMO deverá ser constituída uma

Comissão Paritária e de Arbitragem.

A Comissão Paritária tem o objetivo de “solucionar litígios decorrentes da

aplicação das normas, referentes aos artigos 18, 19 e 21 da referida Lei”, que

tratam basicamente do gerenciamento, da manutenção do cadastro ou do registro

do trabalhador portuário avulso, da promoção e habilitação profissional, da

aplicação das normas disciplinares dispostas em lei, contrato, acordo ou

convenção coletiva e ainda, da possibilidade do OGMO, ceder trabalhador

portuário avulso em caráter permanente (leia-se vínculo empregatício a prazo

indeterminado), ao operador portuário.

A Comissão Paritária é constituída por membros dos trabalhadores

portuários avulsos e membros dos operadores portuários, e na ocorrência de

impasse, as partes envolvidas deverão recorrer à arbitragem de ofertas finais.

Muito se discute sobre o alcance da necessidade de utilização da

arbitragem disposta na Lei de Modernização dos Portos, como condição para

eventual apresentação de ação perante a Justiça Especializada.

As Comissões de Conciliação Prévia previstas na Lei 9.958/2000, de

origem similar a da arbitragem disposta na Lei dos Portos, tiveram a sua eficácia

suspensa quanto à obrigatoriedade de submissão, em decisão liminar emanada

pelo STF253.

Na mesma esteira do pensamento do STF, tem decidido a Justiça Laboral

especializada quanto à desnecessidade da submissão obrigatória do trabalhador

portuário avulso perante a Comissão Paritária presente em cada porto organizado,

inclusive com a edição da OJ n. 391, da Subseção de dissídios individuais – I, do

253 Em 13 de maio de 2009, o STF suspendeu liminarmente a obrigatoriedade de utilização da comissão de conciliação prévia antes do ajuizamento de ação trabalhista, preservando o direito universal dos cidadãos de acesso à justiça ( ADIs 2139 e 2160)

110

TST, no sentido que a submissão prévia da demanda à comissão paritária,

constituída nos termos do artigo 23 da Lei dos Portos, não é pressuposto de

constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, ante a ausência de

previsão legal.254

1.3 - A utilização da arbitragem como método de sol ução de

conflitos na relação de trabalho portuário

Em vista da disposição legal da Lei 8.630/93, em que as partes elegem

árbitros nos limites da Comissão Paritária, surge a discussão sobre a amplitude do

instituto da arbitragem no âmbito das relações de trabalho portuário.

A controvérsia sobre o tema é dominante, na medida em que a CF255,

dispõe que as partes poderão eleger árbitros para a solução de conflitos coletivos

de trabalho para solucionar cláusulas que irão balizar a relação dos empregadores

e seus respectivos trabalhadores.

Aos defensores de uma maior amplitude da arbitragem nas relações

laborais, afirma ser grave o equívoco contido na alegação de que o direito

trabalhista é indisponível, pois desconsidera as nuances e a complexidade dessa

proposição, sendo que a própria Justiça do Trabalho enfatiza as conciliações nos

processos trabalhistas, em que a transação e a renúncia de direitos

invariavelmente ocorre.256

Os defensores da irrestrita abrangência da arbitragem no Direito do

Trabalho ainda afirmam que se nos conflitos coletivos estão presentes direitos

254 BRASIL, TST, Orientação Jurisprudencial 391/TST-SDI-I. Portuário. Submissão prévia de demanda a comissão paritária. Inexigibilidade. Lei 8.630/93, art. 23. A submissão prévia de demanda a comissão paritária, constituída nos termos do art. 23 da Lei 8.630, de 25/02/93 (Lei dos Portos), não é pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, ante a ausência de previsão em lei. 255 Artigo 114, parágrafo 1º e 2º da CF; 256 YOSHIDA, Márcio. A arbitragem e o Judiciário Trabalhista. Revista Brasileira de Arbitragem, Porto Alegre, n. 6, p. 7-17, 1º abr. 2005. Trimestral. p. 11.

111

disponíveis, o mesmo raciocínio poderá ocorrer nos direitos individuais, uma vez

que estes direitos estarão inseridos naqueles.257

Com efeito, a disponibilidade de direitos é passagem obrigatória para

apreciação de um litígio, sendo que um direito é disponível quando está sob o total

domínio de seu titular, de tal modo que ele pode fazer tudo em relação a este,

principalmente alienar ou renunciar.258

No ramo especializado do trabalho, é de vital importância a consciência da

proteção jurídica conferida ao trabalhador, na medida em que a garantia de

direitos é o objetivo principal da legislação trabalhista, em que se confere

superioridade jurídica ao obreiro em compensação a superioridade econômica do

empregador.

Maurício Godinho Delgado cita que a Lei de Arbitragem dispõe sobre a

regulação de direitos patrimoniais disponíveis259, o que cria certa dificuldade na

inserção nos direitos juslaborativos, principalmente quando considerados no plano

das relações bilaterais do contrato empregatício.260

É que vigora, no Direito do Trabalho, especialmente em seu segmento

jusindividual, o princípio da indisponibilidade de direitos, o que torna inválido

qualquer renúncia ou mesmo transação lesiva operada pelo empregado ao longo

do contrato.261

DELGADO acrescenta que a indisponibilidade inata aos direitos trabalhistas

constitui-se talvez no veículo principal utilizado pelo Direito do Trabalho, para

257 PEREIRA, Ana Lúcia – Revista de Arbitragem e Mediação – Ano 6 – n. 23 – out. – dez./2009 – Coord. Arnaldo Wald – Ed. Revista dos Tribunais. 258 LEE, João Bosco – Arbitragem comercial internacional nos países do Mercosul – 1ª Ed (2002), 6ª reimpr. – Curitiba: Juruá, 2011 – p. 62. 259 art. 1º, Lei n. 9.307, de 1996 - As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis. 260 DELGADO, Maurício Godinho - Curso de Direito do Trabalho, 7ª edição. São Paulo: Ltr, 2008 - páginas 1.453. 261 Id., DELGADO, acrescenta que A fórmula arbitral, que pode levar a uma considerável redução ou supressão de direitos, teria força para esterilizar, ou mesmo atenuar, semelhante princípio básico do ramo justrabalhista especializado? Em princípio, parece-nos que a resposta é negativa. As fórmulas de solução de conflitos, no âmbito do Direito Individual do Trabalho, submetem-se, é claro, aos princípios nucleares desse segmento especial do Direito, sob pena de a mesma ordem jurídica ter criado mecanismo de invalidação de todo um estuário jurídico-cultural tido como fundamental por ela mesma. Nessa linha, é desnecessário relembrar a absoluta prevalência que a Carta Magna confere à pessoa humana, à sua dignidade no plano social, em que se insere o trabalho, e a absoluta preponderância deste no quadro de valores, princípios e regras imantados pela mesma Constituição.

112

tentar igualizar, no plano jurídico, à assincronia clássica existente entre os sujeitos

da relação socioeconômica de emprego, o que possibilita tornar efetiva a liberdade

do empregado na dinâmica do trabalho, que se encontra restringida pelo estado

de dependência perante o empregador.262

A impossibilidade de renúncia de direitos pelo trabalhador manifesta-se

também por meio da declaração de nulidade de todo ato cujo objetivo é

estabelecer solução diferente da estipulada pelo legislador. O Direito do Trabalho,

no art. 9º da CLT, torna irrenunciáveis as normas da CLT, ao prever a nulidade “de

pleno direito dos atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a

aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.263”

No que diz respeito à utilização da arbitragem como instituto de pacificação

da relação capital trabalho no âmbito portuário, este não teve o alcance desejado

pelos signatários em experiência inédita ocorrida entre o Sindicato Patronal

(SINDOP264) e os Sindicatos Profissionais (estiva, capatazia, bloco. Vigia,

consertador e conferente) da cidade de Paranaguá, no Paraná.

Em outubro de 2009, os referidos signatários se submeteram a um juízo

arbitral eleito pelas partes, para conter e solucionar o crescente número de ações

trabalhistas, que pleiteavam a isonomia de direitos dos trabalhadores portuários

avulsos com os trabalhadores detentores de vínculo empregatício, nos moldes do

inciso XXXIV, do artigo 7º da CF. 265.

A insegurança jurídica era decorrente de um número expressivo de

decisões judiciais dissonantes entre si, que interpretavam de diversas formas o

alcance da propalada igualdade entre os avulsos e os vinculados.

O laudo arbitral, que estabelecia o regramento definitivo quanto às

condições de trabalho, propunha também uma submissão àqueles trabalhadores

que haviam ingressado ou não com ações judiciais, a aceitaram conciliação

extrajudicial nos moldes e parâmetros estabelecidos pelos sindicatos signatários,

262 DELGADO, Maurício Godinho, Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2002, p. 211. 263 BARROS, Alice Monteiro de – Curso de direito do trabalho – 8 ed. – São Paulo: LTr, 2012, p. 155. 264 Sindicato dos Operadores Portuários do Paraná. 265 Fonte: http://www.sindop.org.br/arquivos/circsindop/c82010.pdf Acessado em 31 de agosto de 2012.

113

o que redundou em um novo ciclo de ações trabalhistas questionando o instituto

da arbitragem nos contratos individuais de trabalho.

Referido compromisso arbitral assumido começou, no âmbito da Justiça do

Trabalho, a ser questionado individualmente pelos portuários quanto à

possibilidade de renunciarem direitos de origem trabalhista.

Um dos primeiros a analisar o assunto e sensível aos questionamentos

levantados, o Magistrado Leonardo Vieira Wandelli, da 3ª Vara do Trabalho de

Paranaguá-PR, do TRT-9ª Região, cita em sua decisão que a arbitragem tem

abrangência apenas em conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis, na

forma do artigo 1º da Lei 9.307/96, o que não poderia ocorrer com direitos

relativos às horas extras, férias, adicional de risco/insalubridade dos trabalhadores

avulsos de Paranaguá. 266

Acrescenta que as condições de trabalho estabelecidas no laudo arbitral

não poderiam ter força vinculativa obrigatória, mas sim força interpretativa dos

operadores do direito quanto às condições de trabalho e limites da extensão da

isonomia constitucional entre vinculados e avulsos, nos mesmos moldes de uma

convenção coletiva de trabalho, não cabendo afastar ou afrontar a legislação

vigente.

As decisões do TRT/PR sobre o assunto ratificam a indisponibilidade dos

direitos individuais trabalhistas, de modo que a arbitragem no Direito do Trabalho,

só poderia ser chancelada se estivesse restrita a direitos coletivos e que fossem

assegurados como acréscimos aos direitos mínimos previsto em lei.267

266 TRT-9ª Região – 3ª Vara do Trabalho – RT 1380-2011-411/PR, em ação trabalhista de trabalhador contra o OGMO, publicada em 09.09.2011. 267 PARANÁ, TRT, RO-01551-2010-411-09-00-8, RECORRENTE(s): Luciano Colodel, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá – OGMO, RECORRIDO(s): Luciano Colodel, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá - OGMO Publicado no DEJT em 19-04-2011 - 2A. TURMA Relator: ANA CAROLINA ZAINA ARBITRAGEM - LEI 9307/1996 - DIREITOS INDIVIDUAIS INDISPONÍVEIS - HORAS EXTRAS - A sentença arbitral não pode tratar de direito indisponível, nos termos do art. 1º da Lei 9.307/1996 (Lei de Arbitragem): "As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis". Com efeito, o pagamento das horas extraordinárias é direito indisponível do trabalhador, que empregou sua mão-de-obra em sobrejornada, devendo receber a contraprestação pelo labor despendido. A arbitragem, no Direito do Trabalho, poderia ser chancelada, em tese, se estivesse restrita a direitos coletivos e que fossem assegurados como plus em face da lei. Nos autos, contudo, conforme visto a discussão

114

No domínio do TST, a jurisprudência também se consolida neste mesmo

sentido, uma vez que não existe compatibilidade do Direito do Trabalho com o

instituto da arbitragem, em razão da indisponibilidade dos direitos, hipossuficiência

do empregado em relação ao empregador e da irrenunciabilidade dos direitos

trabalhistas268

Em vista do exposto, o instituto da arbitragem no âmbito trabalhista poderá

servir como fonte interpretativa das partes compromissadas, no limite da proteção

jurídica conferida aos trabalhadores e da irrenunciabilidade dos direitos, inerentes

em toda a estrutura das normas trabalhistas existentes.

2 – FORMAS DE DEFESA DIANTE DO QUADRO ESTABELECIDO

A PARTIR DA LEI 8.630/93

2.1 – Mecanismos de defesa coletiva dos trabalhador es em face

das novas tecnologias

alberga direito individual indisponível, ínsito ao patamar mínimo de civilidade. Trata-se da aplicação dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho. 268... No direito do trabalho não há como se entender compatível arbitragem, pela inserção no contrato de trabalho da cláusula compromissória, ou pelo compromisso arbitral posterior ao fim da relação contratual, com o fim de solucionar o conflito decorrente da relação de emprego, visto que a essência do instituto é a disponibilidade dos direitos que as partes pretendem submeter, conforme art. 1º da Lei da Arbitragem. Ainda que se recepcione, em diversos ramos do direito, a arbitragem como solução de conflitos que acaba por desafogar o judiciário, é preciso enfrentar que o ato de vontade do empregado não é concreto na sua plenitude, no momento da admissão na empresa, em face da subordinação ínsita ao contrato de trabalho e à hipossuficiência do empregado, a inviabilizar que se reconheça validade à sentença arbitral como óbice ao ajuizamento de ação trabalhista, porque incompatível com os princípios que regem o direito do trabalho. Isso porque à irrenunciabilidade e à indisponibilidade está adstrita ao conteúdo do contrato de trabalho em razão do princípio fundamental a ser protegido, - o trabalho-, e as parcelas de natureza alimentar dele decorrentes, por consequência. Para submeter o conflito trabalhista ao juízo arbitral necessário seria relevar todos os princípios que regem esse ramo do direito, em especial a hipossuficiência, presumida em face da relação contratual em que se coloca o empregado, como a parte mais fraca, a indisponibilidade das verbas decorrentes do trabalho, a sua natureza alimentar e, em especial, a impossibilidade da manifestação volitiva plena, própria do processo arbitral. Recurso de revista conhecido e provido para afastar a coisa julgada e determinar o retorno dos autos ao eg. TRT para o julgamento da pretensão, como entender de direito.( BRASIL, TST, RR 2253/2003-009-05-00.9, RECORRENTE: ANA MOREIRA SANTIAGO, RECORRIDO: JOVIL VAREJO DE PRESENTES LTDA. publicado no DJ de 15/05/2009, 6ª Turma, RELATOR: Ministro Aloysio Corrêa da Veiga).

115

A resistência dos trabalhadores à implantação da Lei 8.630/93 e a lentidão

do empresariado do setor fizeram com que o governo federal criasse em 27 de

abril de 1995 a GEMPO (Grupo Executivo para a Modernização dos Portos), órgão

com subordinação direta à Presidência da República e, conforme dito

anteriormente, com representantes do Ministério do Trabalho, Marinha, Fazenda e

Transportes e Ministério Público do Trabalho269.

A função do GEMPO era agilizar o processo de modernização, com análise

dos focos de resistência que se relacionasse à operação portuária nos parâmetros

da Lei dos Portos. Assim, o GEMPO deveria recensear todos os trabalhadores em

atividades portuárias para determinar quais teriam direito ao registro perante o

OGMO, com estudos e solução de casos daqueles trabalhadores que se

encontravam em situação irregular.270

O prazo limite estabelecido pelo Governo Federal para que todos os OGMO

assumissem definitivamente as funções criadas pela Lei dos Portos foi 29 de abril

de 1996.271

O GEMPO recensearia todos os trabalhadores para traçar o perfil do

trabalhador em atividades portuárias. Somente aqueles trabalhadores

recenseados e registrados no OGMO poderiam prestar atividades como portuário

avulso. Mesmo após o prazo limite estipulado pelo Governo, os sindicatos

continuaram com o controle da mão de obra nos portos.272

A resistência quanto às alterações trazidas pela Lei dos Portos, aos novos

métodos de processamento de carga e a não aplicação integral da Convenção

137 da OIT foram fontes constantes de greves e paralisações no âmbito do

trabalho portuário.

Aliada a estas resistências e manifestações, a classe trabalhadora

defendia-se ou mostrava a sua discordância com os rumos da política portuária

nacional com mecanismos próprios.

269 HIATA (op. cit., p. 82). 270 Id. 271 Ib, p. 83. 272 Id.

116

Cita-se o sistema de divisão de trabalho dentro de cada terno (equipe),

denominado de “quarto ou quarteio”, conforme citado anteriormente, em que

metade dos trabalhadores presta serviços nas primeiras horas do turno, e a outra

metade trabalha nas horas finais.

O trabalho em equipe e a participação em um grupo de operação, cujo

sentido é compreendido pelo conjunto dos operários tornam possível a realização

de defesas coletivas.273

A não implantação integral da Convenção 137 da OIT, no que se refere à

criação de mecanismos de renda mínima ou indenizações por ausência de

trabalho, e a falta da definição do dispositivo constitucional previsto no inciso

XXVII do artigo 7º, de proteção do trabalhador em face da automação, fizeram

com que os trabalhadores avulsos na prática criassem regulamentação própria

destes dispositivos legais.274

DEJOURS questiona se referidas atitudes se referem realmente à defesa

coletiva contra a organização do trabalho? A resposta é afirmativa se o que é

desafiado coletivamente com este comportamento é o tempo, o ritmo, a cadência

ou a organização do trabalho. Mas é negativo porque esse comportamento

coletivo que se desafia só dura pequeno espaço de tempo, com eficácia muito

limitada, mas com virtudes de seu caráter simbólico. 275

273 DEJOURS, Cristophe, 1949 – A loucura do trabalho: estudo da psicopatologia do trabalho; tradução de Ana Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira – 5ª Ed. Ampliada – São Paulo: Cortez – Oboré, 1992, p. 40. 274 Decisão proferida pela Magistrada Angela Maria Konrath nos autos 996/2004, da 4ª Vara do Trabalho de Joinville – TRT da 12ª Região. Categoria profissional organizada, com marcante atuação sindical, os trabalhadores avulsos do Porto de São Francisco do Sul criaram, na prática diária, um mecanismo de divisão do trabalho capaz de fazer efetiva, ao menos em parte, a garantia constitucional de proteção em face da automação (CRFB 7º XXVII), decorrente do processo de modernização dos Portos: o quarto, que se traduz na prestação de três horas de trabalho para uma pegada (turno) de seis horas. 275 DEJOURS, descreve um grupo de operários iugoslavos da linha de produção das indústrias Citroën. Em número de três, eles estabelecem um sistema de solidariedade e convivência, com a realização de táticas operatórias espontâneas, conseguem ganhar alguns minutos do ritmo imposto pela organização do trabalho. No grupo, um dos três deixa a linha de produção para visivelmente fumar, enquanto os demais trabalhadores continuam as suas atividades laborais. Estes poucos minutos arrancados do tempo e do ritmo são aproveitados coletivamente, inclusive com intensa alegria, como uma espécie de vitória coletiva contra a higidez e a violência da organização do trabalho. Em outros casos, assiste-se uma aceleração coletiva dos operários da Lina de produção de tal modo que dois ou três operários do começo da linha conseguem deixar seu posto durante alguns minutos que eles usam da maneira que lhes for conveniente (DEJOURS, Cristophe, 1949 – A loucura do trabalho: estudo da psicopatologia do trabalho; tradução de Ana

117

Sob outro prisma, o sistema de divisão de trabalho pode reafirmar o “Direito

ao Ócio” do trabalhador, que nas palavras de Paul Lafargue se contrapõe a

“uma estranha loucura que tomou conta das classes operárias nas nações

onde reina a civilização capitalista. Esta loucura trouxe consigo misérias

individuais e sociais que há dois séculos torturam a triste humanidade.

Esta loucura é o amor pelo trabalho, a paixão agonizante pelo trabalho,

levada até o esgotamento da energia vital do indivíduo e de seus filhos.

Em vez de reagir contra essa aberração mental, os padres, os economistas

e os moralistas preferiram sacrossantificar o trabalho.”276

Os trabalhadores portuários também se defendem coletivamente dos novos

métodos de produção com as operações denominadas “tartaruga”, que são

bastante frequentes no âmbito portuário.

Consiste no trabalho realizado pelo TPA em ritmo de trabalho aquém do

esperado pelo OGMO, pelo armador e pelo operador portuário, o que causa

prejuízos financeiros aos detentores do capital envolvidos na operação.

Referida iniciativa coletiva muitas vezes é realizada como fruto de protesto

ou reivindicação para que sejam mantidos sistemas de trabalho já superados

pelos novos métodos de produção ou proibidos pela legislação protetiva vigente.

E por estes motivos, não são passíveis de serem reconquistados com a

proposição de ações coletivas ou individuais perante a justiça especializada.

Por outro lado, como tentativa de impor a diminuição das equipes de

trabalho, a eliminação de ações trabalhistas e a redução da remuneração por

tonelagem, os operadores portuários, representados pelo OGMO, comumente

realizam locautes disfarçados, com implementações de intervalos de jornada

Isabel Paraguay e Lúcia Leal Ferreira – 5ª Ed. Ampliada – São Paulo: Cortez – Oboré, 1992, p. 41). 276 DE MASI, Domenico A economia do ócio / Bertrand Russel, Paul Lafargue; Domenico de Mais, organização e introdução; tradução Carlos Irineu W. da Costa, Pedro Jorgensen Júnior e Léa Manzi – Rio de Janeiro: Sextante, 2001, p. 143.

118

superiores ao mínimo permitido em lei, o que faz reduzir a remuneração dos

trabalhadores avulsos, que recebem pelo fruto das suas produções. 277 278

Ainda, embora a Lei dos Portos atribuísse ao OGMO a capacitação dos

trabalhadores portuários avulsos, parece evidente a falta de vontade dos

operadores portuários e dos órgãos governamentais em realizar o contínuo

treinamento da massa de trabalhadores avulsos existentes, em razão da

277 Fonte: Gazeta do Povo – 03/04/2008 (www.portogente.com.br – acesso em 10/08/2012). Trabalhadores portuários e auditores da Receita Federal trabalhando em ritmo lento, filas quilométricas de caminhões, paralisação no embarque de grãos e suspeitas de sabotagem no painel de controle das torres de embarque para carregamento de granéis sólidos – conhecidas como “ship loaders” – transformaram em caos a movimentação para o escoamento da safra que chega ao Porto de Paranaguá . Nesta quarta-feira (2), o embarque de grãos foi paralisado por volta das 10 horas da manhã e só foi restabelecido por volta das 15h30. No início da noite, cerca de 370 caminhões, cuja carga, somada, chega a 13 mil toneladas de soja, estavam estacionados às margens da BR-277 em uma fila com quase 20 quilômetros. Os transtornos começaram logo pela manhã, após trabalhadores portuários avulsos (como são chamados os operadores que não são vinculados à administração do porto), de diversas categorias, decidirem realizar uma “operação tartaruga”. A movimentação era uma forma de pressionar o Sindicato dos Operadores Portuários (Sindop) e o Órgão Gestor de Mão-de-Obra (Ogmo) a aceitarem que os trabalhadores possam trabalhar sem a necessidade de respeitar o período de rodízio de 18 horas. Na segunda-feira, o Ogmo determinou que os portuários avulsos desenvolvessem suas atividades diárias respeitando a carga horária de 6 horas, como determina a legislação trabalhista, e só retornassem à atividade após um descanso de 18 horas. Em 2006, em acordo intermediado pelo Ministério Público, operadores e trabalhadores decidiram que a jornada de trabalho no porto seria desenvolvida durante o período de 6 horas, com intervalo mínimo de 11 horas, para que o trabalhador avulso voltasse a trabalhar. Com base no acordo, 850 trabalhadores impetraram ações trabalhistas, solicitando indenizações pelo trabalho realizado além do prazo estipulado pela lei e ratificado pelo acordo. As ações, que solicitam valores retroativos a cinco anos, tramitam na Justiça. No ano passado, o Sindop tentou selar um acordo com os trabalhadores com a garantia de retirada das queixas trabalhistas e não conseguiu. “Agora, estamos respeitando o que determina a legislação para não correr o risco de ampliar o passivo de débitos trabalhistas”, disse um dirigente do Sindop. 278 Fonte: www.gazetadopovo.com.br - acesso em 20/08/2012. Porto Impasse trabalhista atrasa operações em Paranaguá Appa aponta que há navios levando o dobro de tempo para operar e que o embarque de açúcar e o desembarque de fertilizantes são os mais prejudicados Os atrasos no embarque e desembarque de cargas no Porto de Paranaguá (PR) têm se intensificado nos últimos dias, em virtude do impasse trabalhista entre operadores portuários e trabalhadores avulsos. Há 20 dias, o Órgão Gestor de Mão de Obra Portuária (Ogmo) instalou uma trava eletrônica para impedir que Trabalhadores Portuários Avulsos (TPAs) dobrem a jornada de trabalho, evitando assim ações judiciais pelo descumprimento da lei que determina intervalos de descanso de 11 horas entre um turno e outro. Segundo a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (Appa), há trabalhadores suficientes, mas a medida está fazendo com que haja mais faltas, gerando atrasos. Para o Ogmo, um dos principais agravantes da situação é que uma parte dos TPAs que trabalham em Paranaguá exerce outras atividades, tem outros empregos. Com isso, escolhe quando e como quer trabalhar. A Appa aponta que há navios levando o dobro de tempo para operar e que o embarque de açúcar e o desembarque de fertilizantes são os mais prejudicados. Nesta segunda-feira, 113 navios esperavam ao largo para atracar em Paranaguá.

119

constante diminuição de avulsos nos portos nacionais, que não têm renovações

expressivas em seus quadros. 279

Em vista do expressivo aumento de trabalhadores vinculados

permanentemente nos terminais públicos e privados, a responsabilidade pelo

treinamento passa a ser somente do próprio operador local.

2.2 – Aposentaria Espontânea – A extinção da inscri ção no

cadastro e no registro do TPA prevista na Lei dos P ortos fere o

direito ao trabalho?

A falta de novos contingentes de trabalhadores em substituição àqueles que

deixam o sistema do OGMO reduz ferozmente o quantitativo de trabalhadores

avulsos nos portos brasileiros.

As novas tecnologias de movimentação de carga e o crescimento do

trabalhado portuário com vínculo empregatício permanente são os responsáveis

pela falta de reposição do trabalho portuário avulso.

Embora a presença do “exército de reserva” de trabalhadores seja

substantivo em muitos portos nacionais, os porcentuais de avulsos em relação aos

“vinculados” decrescem gradativamente, a ponto de se questionar o futuro do

trabalho portuário avulso.

A Lei dos Portos, em consonância com a legislação até então vigente,

aplicava aos avulsos a isonomia com os detentores de vínculo também no que se

279 O presidente do CAP de Imbituva, Gilberto Barreto, em entrevista ao sítio www.portogente.com.br (acessado em 10/08/2012) afirma que não existe um programa definido de capacitação de trabalhadores avulsos, quem é o órgão capacitador, quem define as necessidades. Embora a Marinha tenha em suas estruturas programas de capacitação do portuário avulso, aumenta a quantidade dos trabalhadores portuários dos terminais privados. O avulso não se sente em condições físicas, emocionais e psicológicas de enfrentar novas capacitações e treinamentos. Os órgãos gestores não cuidaram da multifuncionalidade e hoje chegamos a um impasse complicado. O governo diz que esse é um problema do setor privado, mas o recurso de capacitação vai para o governo, que destina para a Marinha executar a capacitação. Então se o problema é operador e trabalhador, então deixa o recurso para que se resolva o problema num nível mais próximo do porto.

120

referia à extinção do contrato de trabalho quando da aposentadoria espontânea,

sendo aplicado ao trabalhador portuário o cancelamento do seu cadastro ou do

seu registro perante o OGMO.280

Com a declaração da inconstitucionalidade pelo STF281 do dispositivo

consolidado que previa a extinção do contrato de trabalho pela aposentadoria,

surgiram dúvidas quanto à constitucionalidade do dispositivo da Lei 8.630/93 que

prevê o cancelamento do cadastro ou do registro em caso de aposentadoria

voluntária.

Abriu-se oportunidade para aqueles trabalhadores retirados do “sistema” do

OGMO em razão das suas aposentadorias, de retornarem as suas antigas

atividades.

As decisões favoráveis sobre o tema enfatizam que o ato da extinção do

cadastro ou registro do trabalhador avulso no OGMO, em razão de sua

aposentadoria voluntária, inviabiliza o exercício do seu labor, afronta o valor social

do trabalho (CF, art. 6º, caput) e o direito ao livre exercício de qualquer trabalho,

ofício ou profissão, consagrados na CF como direitos de natureza fundamental.282

DELGADO, em relatoria de processo em grau de Recurso de Revista,

afirmou que a partir da interpretação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 453 da CLT

280 Parágrafo 3º do Artigo 27 da Lei 8.630/93 – A inscrição no cadastro e o registro do trabalhador portuário avulso extingue-se por morte, aposentadoria ou cancelamento. 281 BRASIL, STF ADIn 1721/DF, REQUERENTE: PARTIDOS DOS TRABALHADORES E OUTROS, REQUERIDO: PRESIDENTE DA REPÚBLICA CONGRESSO NACIONAL, Julgamento em 11/10/2006, Publicado no DJ 29/06/2007, Relator: Relator Carlos Ayres Britto. EMENTA: DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA (CF, ART. 7º, I): Viola a garantia constitucional o acórdão que, partindo de premissa derivada da interpretação conferida ao art. 453, caput, da CLT (redação alterada pela L. 6204/75), decide que a aposentadoria espontânea extingue o contrato de trabalho, mesmo quando o empregado continua a trabalhar na empresa após a concessão do benefício previdenciário. (RE 449.420-5 PARANÁ Relator Ministro Sepúlveda Pertence). 282 SÃO PAULO, TRT, RO Nº: 00235-2007-445-02-00-9 RECORRENTE ROBERTO GOUVEIA DE ABREU, RECORRIDO: ADM DO BRASIL LTDA. E OUTROS DATA DE JULGAMENTO: 03/06/2008, 6ª TURMA, DATA DE PUBLICAÇÃO: 13/06/2008. RELATOR(A): VALDIR FLORINDO Disponível em www.trtsp.gov.br. SANTA CATARINA, TRT, RO nº 0004187-03.2010.5.12.0047, RECORRENTE: JOSÉ FREITAS DE ARAÚJO, RECORRIDO: OGMO/ITAJAÍ E OUTRO, Publicado no TRTSC/DOE, em 22-07-2011, RELATOR: Juiz Jorge Luiz Volpato. Disponível em www.trt12.jus.br;

121

adotada pelo STF, já não subsiste o entendimento de que a aposentadoria

espontânea é causa de extinção do contrato de trabalho. 283

Acrescenta que não se pode dizer que a continuidade do exercício da

função de portuário é incompatível com a manutenção do seu registro no OGMO.

Assim, impedir que o trabalhador avulso mantenha seu registro junto ao OGMO é

o mesmo que impedir o seu direito ao trabalho, o que vai de encontro, inclusive,

ao princípio da livre iniciativa e dos valores sociais do trabalho, como fundamento

da República Federativa do Brasil.

Por sua vez, as decisões que seguem o dispositivo legal da Lei dos Portos,

que cancela a matrícula do TPA diante da sua aposentadoria, entendem que a

especificidade da norma portuária não pode ser estendida aos efeitos da

declaração da inconstitucionalidade pelo STF, na medida em que o entendimento

ali assentado não alcança as categorias profissionais regidas por regulamentação

própria, como é o caso dos trabalhadores portuários avulsos.284

Referidas decisões acrescentam que a intenção da lei de vedar a

vinculação permanente do trabalhador avulso tem como objetivo possibilitar a

renovação do quadro de TPA, com a escalação de novos trabalhadores.285

283 BRASIL, TST, RR-83240-71.1999.5.02.0443, RECORRENTE: MANUEL DE PAULO RODRIGUES SEBASTIÃO, RECORRIDO: ÓRGÃO DE GESTÃO DE MÃO DE OBRA DO TRABALHO PORTUÁRIO DO PORTO ORGANIZADO DE SANTOS – OGMO, Publicado em 27/08/2010, 6ª. Turma, RELATOR: Ministro Maurício Godinho Delgado. Disponível em www.tst.jus.br. 284 BRASIL, TST, AIRR - 294-29.2011.5.09.0022, AGRAVANTE: ANTÔNIO CARLOS GONÇALVES DOS SANTOS, AGRAVADO: OGMO/PARANAGUÁ, Data de Julgamento: 25/04/2012, Data de Publicação: DEJT 27/04/2012, 3ª Turma, Relator Ministro: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira. 285 PARANÁ, TRT, RO 01304-2007-022-09-00-7, RECORRENTE(s): Clarisvaldo Januario da Silva, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR, RECORRIDO(s): Clarisvaldo Januario da Silva, Órgão de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso do Porto Organizado de Paranaguá e Antonina - OGMO/PR , Publicação em 28/03/2008, Desembargador Relator: Ubirajara Carlos Mendes. TRABALHADOR PORTUÁRIO. CANCELAMENTO DO REGISTRO NO OGMO. ART. 27, § 3º, DA LEI Nº 8.630/93. APOSENTADORIA. A Lei nº 8.630/93, no intuito de modernizar o sistema portuário do País, dispôs, em seu art. 27, § 3º, que a aposentadoria é causa de extinção da inscrição no cadastro e do registro do trabalhador portuário. Nos termos da referida lei, o registro depende do preenchimento de alguns requisitos, dentre os quais o de não ter havido a aposentadoria. Evidencia-se a intenção de vedar a vinculação permanente do avulso registrado junto ao órgão gestor, de forma a possibilitar a renovação das forças de trabalho, através da escalação de novos trabalhadores. Assim, o cancelamento do registro do trabalhador junto ao OGMO/PR decorreu de expressa previsão legal, não se cogitando de ofensa aos arts. 5º, XIII, e 7.º, XXXIV, da Constituição Federal. Recurso Ordinário do Reclamante a que se nega provimento.

122

O dispositivo legal da Lei dos Portos em controvérsia também é objeto de

Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF, com pendência de julgamento.286

2.3 – O Futuro do Trabalho Portuário

Diante das particularidades históricas, políticas e jurídicas que sofreu a

atividade portuária e de influências da reestruturação produtiva de característica

neoliberal, a evolução do sistema de emprego no setor portuário caracteriza-se

por algumas etapas.

A primeira etapa, que ocorreu do século XVI até o começo do seguro XX,

tinha como característica a contratação ocasional dos trabalhadores, e quando

havia navios no cais do porto, com predomínio da contratação individual de acordo

com as necessidades do empregador. 287

A existência de um grande número de trabalhadores dispostos a prestar

serviços deixava-os expostos à mercê das vontades empresariais, e atuava

também como mecanismo desestabilizador e fragilizador do poder de negociação

e reivindicação dos trabalhadores portuários.288

Ocorre a segunda etapa, com os sindicatos surgindo para atenuar os

efeitos nefastos deste tipo de contratação de mão de obra, no qual as entidades

são convertidas numa central de contratação e consignação de trabalhadores.

Surge um sistema de distribuição de tarefas de acordo com a ordem de colocação

286 BRASIL, STF, ADIN. 4035-9, Requerente: CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES EM TRANSPORTES AQUAVIÁRIO, AÉREO, NA PESCA E NOS PORTOS - CONTTMAF (CF 103, ) Requerido :PRESIDENTE DA REPÚBLICA CONGRESSO NACIONAL, Distribuído em 03/03/2008, RELATORA Ministra Rosa Weber. Disponível em www.stf.gov.br. 287 NASCIMENTO, Hiata Anderson Silva. O nascimento de um novo trabalhador portuário. Reestruturação produtiva e corporativismo: um estudo sociológico acerca da resistência dos portuários capixabas ao processo de modernização dos portos. Dissertação de Mestrado apresentada ao Departamento de Sociologia da Universidade Estadual de Campinas (Orientadora: Prof. Dra. Gilda Figueiredo Portugal Gouvêa), Campinas, 1999, p. 136. 288 Id.

123

do trabalhador em uma lista prévia, denominado nacionalmente como “sistema de

rodízio”. 289

Esse rodízio assegurava as mesmas condições de possibilidade de acesso

ao trabalho, mas restringia o trabalhador de adquirir novas habilidades que o

qualificassem à manipulação de equipamentos mais sofisticados. Caso o número

de trabalhadores disponíveis fosse maior que a quantidade de trabalho, os

sindicatos procuravam reduzir os turnos de trabalho, obter exclusividade para

novas subespecialidades e evitar a inserção de tecnologias que poupassem força

de trabalho.290

A terceira etapa, conhecida como “sistema de emprego permanente ou por

empresa”, surgiu como resultado do avanço tecnológico, dos novos equipamentos

utilizados nos processos de manipulação de cargas e no intermodalismo no

sistema de transporte de mercadorias, e que marcado pela competitividade,

influenciou na redução das variadas formas de se requisitar e utilizar a mão-de-

obra. 291

Agora, essa força de trabalho é mais estável e detentora de um maior nível

de sofisticação técnica e passa a ser a tônica predominante nos processos de

contratação de trabalhadores.292

O último sistema de contratação de mão-de-obra é conhecido como

“sistema de emprego estratificado”, e surgiu a partir da necessidade de muitos

portos se utilizarem de trabalhadores estáveis, com certos postos de maneira

contínua com pessoas altamente qualificadas, e da necessidade de se contar com

um contingente de trabalhadores não permanentes, de acordo com as

necessidades impostas pelo contexto sócio econômico.293

Portanto, considerando a nova dinâmica do meio portuário, estabelecida a

partir da Lei 8.630/93, de característica neoliberal, aliada aos novos métodos de

movimentação de carga de caris toyotista e à crescente interdependência

289 Ib, p. 137. 290 Id. 291 Id. 292 Id. 293 Ib, p. 138.

124

globalizada das relações comerciais, denotam-se as seguintes tendências no

âmbito do trabalho portuário:

a) Concentração das atividades portuárias em terra e a vínculo

empregatício a prazo indeterminado, em vista que o aparelhamento necessário

para a movimentação de mercadorias encontra-se disponível na estrutura

portuária, sendo desnecessário encontrar-se nas embarcações, que poderão se

utilizar de todo o espaço disponível para o transporte de mercadorias.

b) Os trabalhadores portuários avulsos serem considerados categoria

diferenciada, com utilização da mesma entidade sindical do trabalho avulso ou

vinculado, na representação da classe operária.

c) Em razão dos novos métodos de movimentação de mercadorias e do

crescente aparelhamento diretamente nas estruturas portuárias, além da

diminuição do contingente de trabalho avulso existente, é evidente a eliminação

virtual da atividade de estiva.

d) A atividade portuária avulsa será fonte supletiva do trabalho estável ou a

vínculo empregatício permanente. Este modo de contratação será o responsável

pelos ‘melhores empregos’, em vista da alta qualificação exigida. A atividade

ocasional do avulso ficará direcionada às operações que tenham características

sazonais e que demandem menor qualificação e complexidade na prestação dos

serviços.

e) A não aplicação integral da Convenção 137 e da Recomendação 145 da

OIT precarizam a atividade do TPA, principalmente por não existirem critérios

definidos de garantia de emprego e renda mínima.

f) A flexibilização das relações laborais, o enfraquecimento das entidades

sindicais e a busca na centralidade das negociações coletivas, como forma

primordial na solução dos conflitos, redundam na proteção dos trabalhadores em

perspectivas mínimas, atreladas somente ao previsto como básico na legislação

protetiva do trabalhador.

125

CONCLUSÃO

O sistema closed shop surgiu no âmbito do trabalho portuário para conter

as investidas do capital e garantir melhores condições de trabalho e remuneração

aos avulsos albergados pela proteção sindical existente.

Este mercado de trabalho fechado foi recepcionado pela CLT e revogado

posteriormente pela Lei dos Portos, que aplicou estrutura híbrida ao retirar do

sindicato profissional a gestão da mão de obra do trabalho avulso e oportunizar a

contratação de trabalhadores a vínculo empregatício fora do sistema, nos serviços

de capatazia e bloco.

Em muitos casos os dirigentes dos sindicatos profissionais distorceram o

monopólio do trabalho portuário ao criar arranjos que só beneficiavam pequeno

grupo de trabalhadores. Estas lideranças criavam privilégios apenas para a elite

sindical, excluindo a maioria dos trabalhadores que realizavam as atividades mais

difíceis e insalubres.

Este motivo foi muito utilizado pelos idealistas do neoliberalismo para a

criação do PL 8/91, originário da Lei dos Portos, que contou com o apoio da

opinião pública da época, que concluía que o monopólio sindical sobre a mão de

obra portuária era um dos grandes entraves para a modernização dos portos e

protagonista do “custo Brasil”.

Com a superação do modelo econômico que vigorou durante os trinta anos

seguintes a Segunda Guerra Mundial e impressionante desenvolvimento

tecnológico observado a parir dos anos 70, as ideias neoliberais que estavam

sendo adubadas desde meados do século XX, emergiram com colossal força.

A globalização econômica, tanto no seu viés produtivo, mas,

principalmente, financeiro, permitiu enorme mobilidade dos agentes econômicos,

com nefastos reflexos nas economias periféricas e na vida dos trabalhadores.

A elevada competitividade e a frenética busca pela eficiência e

produtividade, forçaram a flexibilização das proteções trabalhistas, favorecendo o

desemprego estrutural.

126

No âmbito do trabalho portuário brasileiro, as chagas resultantes do

neoliberalismo e globalização foram ainda mais profundas.

A Lei nº 8.630/93, assim, rompeu o monopólio sindical na organização do

trabalho portuário, mas sem criar qualquer mecanismo de participação

democrática dos trabalhadores. Ao invés, transferiu aos detentores do capital a

prerrogativa de organizar o trabalho portuário, com a criação do OGMO, a quem

incumbiria à formação e treinamento multifuncional do trabalhador.

Com o enfraquecimento da atuação sindical, superou-se qualquer

resistência para implantação de novas tecnologias no ambiente portuário que, por

sua vez, reduziram postos de trabalho e direitos dos trabalhadores.

Os novos métodos produtivos originados do toyotismo estabeleceram uma

nova realidade na atividade portuária, estimulando o trabalho polivalente e

multiqualificado, que afasta as características próprias de cada ofício.

A Convenção 137 e a Recomendação 145 da OIT embora ratifiquem a

estruturação do trabalho por meio da desespecialização e remuneração por

produção, reconhecem que o método produtivo adotado é predatório aos

trabalhadores portuários.

Criam em contrapartida mecanismos compensatórios como estímulos a

aposentadoria, indenizações para exclusão de trabalhadores disponíveis e renda

mínima. A CF prevê também a proteção do trabalhador em face da automação

nos termos da lei, equiparando o trabalhador avulso com os trabalhadores

detentores de vinculação empregatícia.

Essas normas internacionais foram incorporadas no ordenamento jurídico

brasileiro após a Lei dos Portos.

Muito embora elas convirjam no que diz respeito à limitação de categorias,

multifuncionalidade das atividades e fomento na negociação direta entre os

envolvidos, são nas medidas de proteção aos trabalhadores que elas se afastam.

Salvo o Adicional de Indenização do Trabalhador Portuário Avulso (AITP)

criado pela Lei 8.630/93 para aqueles trabalhadores que requeressem o

cancelamento do registro, medidas efetivas de amparo aos trabalhadores

portuários não foram adotadas por legislações posteriores, remetendo à

negociação coletiva a solução destes problemas.

127

Por sua vez, em razão das peculiaridades do trabalho portuário avulso, a

tentativa de pacificar as divergências por meio da arbitragem não surtiu o efeito

desejado, na medida em que os direitos trabalhistas nunca estarão à disposição

dos sindicatos convenentes para transação.

E as estruturas sindicais existentes não mais detêm a força efetiva para

negociar com os donos do capital a aplicação das medidas protetivas previstas

nas normas internacionais.

Elas assistem com resistência inócua o desenho traçado pela Lei dos

Portos, de concentração das atividades portuárias em terra, com trabalhadores

multifuncionais vinculados diretamente pelo operador portuário e a eliminação

virtual da atividade avulsa, principalmente a de estivagem, a mais representativa

das atividades portuárias.

Assim, os trabalhadores portuários criam outros modos de defesa em face

do panorama existente, inclusive invocando seus direitos individuais isonômicos

com os trabalhadores com vínculo empregatício permanente.

Diante disso, tudo leva a crer que o trabalho portuário avulso ficará restrito

a um pequeno número de trabalhadores e a atividades de menor complexidade

que exijam força física e remuneração baixa. Nas operações portuárias que se

utilizam dos modernos métodos de movimentação de carga, como a

conteinerização, caso seja necessária a utilização de mão de obra, esta será

realizada por trabalhadores multiespecializados e com vínculo empregatício

permanente.

Os “operários sem patrões”, que já perderam a sua força representativa no

ideário nacional, observam que a renovação da mão de obra avulsa no âmbito

portuário é inexpressiva em razão do grande número de desligamentos originários

das aposentadorias regulares.

E, diante da irreversibilidade do quadro existente, seria adequado por meio

de uma nova legislação infraconstitucional, efetivar a aplicação das medidas

protetivas dispostas na Convenção 137 da OIT, como modo póstumo de

reconhecimento dessa profissão, que um dia foi reverenciada por todos.

128

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ANEXOS A - Lei 8.630, de 25 de fevereiro de 1993. 294

Dispõe sobre o regime jurídico da exploração dos portos organizados e das instalações portuárias e dá outras providências. (LEI DOS PORTOS) O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte lei: CAPÍTULO I Da Exploração do Porto e das Operações Portuárias Art. 1° Cabe à União explorar, diretamente ou media nte concessão, o porto organizado. § 1° Para os efeitos desta lei, consideram-se: I - Porto Organizado: o construído e aparelhado para atender às necessidades da navegação, da movimentação de passageiros ou da movimentação e armazenagem de mercadorias, concedido ou explorado pela União, cujo tráfego e operações portuárias estejam sob a jurisdição de uma autoridade portuária; (Redação dada pela Lei nº 11.314 de 2006) II - Operação Portuária: a de movimentação de passageiros ou a de movimentação ou armazenagem de mercadorias, destinados ou provenientes de transporte aquaviário, realizada no porto organizado por operadores portuários; (Redação dada pela Lei nº 11.314 de 2006) III - Operador portuário: a pessoa jurídica pré-qualificada para a execução de operação portuária na área do porto organizado; IV - Área do porto organizado: a compreendida pelas instalações portuárias, quais sejam, ancoradouros, docas, cais, pontes e piers de atracação e acostagem, terrenos, armazéns, edificações e vias de circulação interna, bem como pela infra-estrutura de proteção e acesso aquaviário ao porto tais como guias-correntes, quebra-mares, eclusas, canais, bacias de evolução e áreas de fundeio que devam ser mantidas pela Administração do Porto, referida na Seção II do Capítulo VI desta lei. V - Instalação Portuária de Uso Privativo: a explorada por pessoa jurídica de direito público ou privado, dentro ou fora da área do porto, utilizada na movimentação de passageiros ou na movimentação ou armazenagem de mercadorias, destinados ou provenientes de transporte aquaviário. (Redação dada pela Lei nº 11.314 de 2006) VI - Estação de Transbordo de Cargas: a situada fora da área do porto, utilizada, exclusivamente, para operação de transbordo de cargas, destinadas ou provenientes da navegação interior; (Incluído pela Lei nº 11.518, de 2007) VII - Instalação Portuária Pública de Pequeno Porte: a destinada às operações portuárias de movimentação de passageiros, de mercadorias ou ambas, destinados ou provenientes do transporte de navegação interior. (Incluído pela Lei nº 11.518, de 2007) § 2° A concessão do porto organizado será sempre pr ecedida de licitação realizada de acordo com a lei que regulamenta o regime de concessão e permissão de serviços públicos. Art. 2° A prestação de serviços por operadores port uários e a construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação, melhoramento e exploração de instalações portuárias, dentro dos limites da área do porto organizado, serão realizadas nos termos desta lei. Art. 3° Exercem suas funções no porto organizado, d e forma integrada e harmônica, a Administração do Porto, denominada autoridade portuária, e as autoridades aduaneira, marítima, sanitária, de saúde e de polícia marítima. CAPÍTULO II Das Instalações Portuárias Art. 4° Fica assegurado ao interessado o direito de construir, reformar, ampliar, melhorar, arrendar e explorar instalação portuária, dependendo: (Regulamento) 294 http://legis.senado.gov.br/sicon/index.jsp - acessado em 16 de julho de 2012;

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I - de contrato de arrendamento, celebrado com a União no caso de exploração direta, ou com sua concessionária, sempre através de licitação, quando localizada dentro dos limites da área do porto organizado; II - de autorização do órgão competente, quando se tratar de Instalação Portuária Pública de Pequeno Porte, de Estação de Transbordo de Cargas ou de terminal de uso privativo, desde que fora da área do porto organizado, ou quando o interessado for titular do domínio útil do terreno, mesmo que situado dentro da área do porto organizado. (Redação dada pela Lei nº 11.518, de 2007) § 1° A celebração do contrato e a autorização a que se referem os incisos I e II deste artigo devem ser precedidas de consulta à autoridade aduaneira e ao poder público municipal e de aprovação do Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente (Rima). § 2° A exploração da instalação portuária de que tr ata este artigo far-se-á sob uma das seguintes modalidades: I - uso público; II - uso privativo: a) exclusivo, para movimentação de carga própria; b) misto, para movimentação de carga própria e de terceiros. c) de turismo, para movimentação de passageiros. (Incluído pela Lei nº 11.314 de 2006) d) Estação de Transbordo de Cargas. (Incluído pela Lei nº 11.518, de 2007) § 3o A exploração de instalação portuária de uso público fica restrita à área do porto organizado ou à área da Instalação Portuária Pública de Pequeno Porte. (Redação dada pela Lei nº 11.518, de 2007) § 4° São cláusulas essenciais no contrato a que se refere o inciso I do caput deste artigo, as relativas: I - ao objeto, à área de prestação do serviço e ao prazo; II - ao modo, forma e condições da exploração do serviço, com a indicação, quando for o caso, de padrões de qualidade e de metas e prazos para o seu aperfeiçoamento; III - aos critérios, indicadores, fórmulas e parâmetros definidores da qualidade do serviço; IV - ao valor do contrato, nele compreendida a remuneração pelo uso da infra-estrutura a ser utilizada ou posta à disposição da referida instalação, inclusive a de proteção e acesso aquaviário; V - à obrigação de execução das obras de construção, reforma, ampliação e melhoramento, com a fixação dos respectivos cronogramas de execução físico e financeiro; VI - aos direitos e deveres dos usuários, com as obrigações correlatas do contratado e as sanções respectivas; VII - à reversão de bens aplicados no serviço; VIII - aos direitos, garantias e obrigações do contratante e do contratado, inclusive, quando for o caso, os relacionados com as previsíveis necessidades de futuras suplementações, alterações e expansões do serviço e conseqüente modernização, aperfeiçoamento e ampliação das instalações; IX - à forma de fiscalização das instalações, dos equipamentos e dos métodos e práticas de execução dos serviços; X - às garantias para adequada execução do contrato; XI - ao início, término e, se for o caso, às condições de prorrogação do contrato, que poderá ser feita uma única vez, por prazo máximo igual ao originalmente contratado, desde que prevista no edital de licitação e que o prazo total, incluído o da prorrogação, não exceda a cinqüenta anos; XII - à responsabilidade do titular da instalação portuária pela inexecução ou deficiente execução dos serviços; XIII - às hipóteses de extinção do contrato; XIV - à obrigatoriedade de prestação de informações de interesse da Administração do Porto e das demais autoridades no porto, inclusive as de interesse específico da Defesa Nacional, para efeitos de mobilização; XV - à adoção e ao cumprimento das medidas necessárias à fiscalização aduaneira de mercadorias, veículos e pessoas; XVI - ao acesso, pelas autoridades do porto, às instalações portuárias; XVII - às penalidades contratuais e sua forma de aplicação; XVIII - ao foro.

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§ 5° O disposto no inciso VI do parágrafo anterior somente se aplica aos contratos para exploração de instalação portuária de uso público. § 6° Os investimentos realizados pela arrendatária de instalação portuária localizada em terreno da União localizado na área do porto organizado reverterão à União, observado o disposto na lei que regulamenta o regime de concessão e permissão de serviços públicos. § 7o As autorizações de exploração de Instalações Portuárias Públicas de Pequeno Porte somente serão concedidas aos Estados ou Municípios, os quais poderão, com prévia autorização do órgão competente e mediante licitação, transferir a atividade para a iniciativa privada. (Incluído pela Lei nº 11.518, de 2007) Art. 5° O interessado na construção e exploração de instalação portuária dentro dos limites da área do porto organizado deve requerer à Administração do Porto a abertura da respectiva licitação. § 1° Indeferido o requerimento a que se refere o ca put deste artigo cabe recurso, no prazo de quinze dias, ao Conselho de Autoridade Portuária de que trata a Seção I do Capítulo VI desta lei. § 2° Mantido o indeferimento cabe recurso, no prazo de quinze dias, ao ministério competente. § 3° Na hipótese de o requerimento ou recurso não s er decidido nos prazos de trinta dias e sessenta dias, respectivamente, fica facultado ao interessado, a qualquer tempo, considerá-lo indeferido, para fins de apresentação do recurso a que aludem os parágrafos anteriores. Art. 6° Para os fins do disposto no inciso II do ar t. 4° desta lei, considera-se autorização a delegação, por ato unilateral, feita pela União a pessoa jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. § 1° A autorização de que trata este artigo será fo rmalizada mediante contrato de adesão, que conterá as cláusulas a que se referem os incisos I, II, III, V, VII, VIII, IX, X, XI, XII, XIS, XV, XVI, XVII e XVIII do § 4° do art. 4° desta lei. § 2° Os contratos para movimentação de cargas de te rceiros reger-se-ão, exclusivamente, pelas normas de direito privado, sem participação ou responsabilidade do poder público. § 3° As instalações de que trata o caput deste arti go ficarão sujeitas à fiscalização das autoridades aduaneira, marítima, sanitária, de saúde e de polícia marítima. Art. 7° (Vetado) CAPÍTULO III Do Operador Portuário Art. 8° Cabe aos operadores portuários a realização das operações portuárias previstas nesta lei. § 1° É dispensável a intervenção de operadores port uários nas operações portuárias: I - que, por seus métodos de manipulação, suas características de automação ou mecanização, não requeiram a utilização de mão-de-obra ou possam ser executadas exclusivamente pela própria tripulação das embarcações; II - de embarcações empregadas: a) na execução de obras de serviços públicos nas vias aquáticas do País, seja diretamente pelos poderes públicos, seja por intermédio de concessionários ou empreiteiros; b) no transporte de gêneros de pequena lavoura e da pesca, para abastecer mercados de âmbito municipal; c) na navegação interior e auxiliar; d) no transporte de mercadorias líquidas a granel; e) no transporte de mercadorias sólidas a granel, quando a carga ou descarga for feita por aparelhos mecânicos automáticos, salvo quanto aos serviços de rechego, quando necessários; III - relativas à movimentação de: a) cargas em área sobre controle militar, quando realizadas por pessoal militar ou vinculado à organização militar; b) materiais pelos estaleiros de construção e reparação naval; c) peças sobressalentes, material de bordo, mantimentos e abastecimento de embarcações; IV - relativas ao abastecimento de aguada, combustíveis e lubrificantes à navegação. § 2° Caso o interessado entenda necessário a utiliz ação de mão-de-obra complementar para execução das operações referidas no parágrafo anterior deve requisitá-la ao órgão gestor de mão-de-obra . Art. 9° A pré-qualificação do operador portuário se rá efetuada junto à Administração do Porto, na forma de norma publicada pelo Conselho de Autoridade Portuária com exigências claras e objetivas.

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§ 1° As normas de pré-qualificação referidas no cap ut deste artigo devem obedecer aos princípios da legalidade, moralidade e igualdade de oportunidade. § 2° A Administração do Porto terá trinta dias, con tados do pedido do interessado, para decidir. § 3° Considera-se pré-qualificada como operador a A dministração do Porto. Art. 10. A atividade de operador portuário obedece às normas do regulamento do porto. Art. 11. O operador portuário responde perante: I - a Administração do Porto, pelos danos culposamente causados à infra-estrutura, às instalações e ao equipamento de que a mesma seja a titular ou que, sendo de propriedade de terceiro, se encontre a seu serviço ou sob sua guarda; II - o proprietário ou consignatário da mercadoria, pelas perdas e danos que ocorrerem durante as operações que realizar ou em decorrência delas; III - o armador, pelas avarias provocadas na embarcação ou na mercadoria dada a transporte; IV - o trabalhador portuário, pela remuneração dos serviços prestados e respectivos encargos; V - o órgão local de gestão de mão-de-obra do trabalho avulso, pelas contribuições não recolhidas; VI - os órgãos competentes, pelo recolhimento dos tributos incidentes sobre o trabalho portuário avulso. Art. 12. O operador portuário é responsável, perante a autoridade aduaneira, pelas mercadorias sujeitas a controle aduaneiro, no período em que essas lhe estejam confiadas ou quando tenha controle ou uso exclusivo de área do porto onde se acham depositadas ou devam transitar. Art. 13. Quando as mercadorias a que se referem o inciso II do art. 11 e o artigo anterior desta lei estiverem em área controlada pela Administração do Porto e após o seu recebimento, conforme definido pelo regulamento de exploração do porto, a responsabilidade cabe à Administração do Porto. Art. 14. O disposto nos artigos anteriores não prejudica a aplicação das demais normas legais referentes ao transporte marítimo, inclusive as decorrentes de convenções internacionais ratificadas, enquanto vincularem internacionalmente a República Federativa do Brasil. Art. 15. O serviço de movimentação de carga a bordo da embarcação deve ser executado de acordo com a instrução de seu comandante ou de seus prepostos, que serão responsáveis pela arrumação ou retirada da carga no que se refere à segurança da embarcação, quer no porto, quer em viagem. Art. 16. O operador portuário é titular e responsável pela direção e coordenação das operações portuárias que efetuar. Art. 17. Fica permitido às cooperativas formadas por trabalhadores portuários avulsos, registrados de acordo com esta lei, se estabelecerem como operadores portuários para a exploração de instalações portuárias, dentro ou fora dos limites da área do porto organizado. CAPíTULO IV Da Gestão de Mão-de-Obra do Trabalho Portuário Avulso Art. 18. Os operadores portuários, devem constituir, em cada porto organizado, um órgão de gestão de mão-de-obra do trabalho portuário, tendo como finalidade: (Vide Lei nº 9.719, de 1998) I - administrar o fornecimento da mão-de-obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário-avulso; II - manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso; III - promover o treinamento e a habilitação profissional do trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro; IV - selecionar e registrar o trabalhador portuário avulso; V - estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso; VI - expedir os documentos de identificação do trabalhador portuário; VII - arrecadar e repassar, aos respectivos beneficiários, os valores devidos pelos operadores portuários, relativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários. Parágrafo único. No caso de vir a ser celebrado contrato, acordo, ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e tomadores de serviços, este precederá o órgão gestor a que se refere o caput deste artigo e dispensará a sua intervenção nas relações entre capital e trabalho no porto. (Vide Lei nº 9.719, de 1998)

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Art. 19. Compete ao órgão de gestão de mão-de-obra do trabalho portuário avulso: (Vide Lei nº 9.719, de 1998) I - aplicar, quando couber, normas disciplinares previstas em lei, contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho, no caso de transgressão disciplinar, as seguintes penalidades: a) repreensão verbal ou por escrito; b) suspensão do registro pelo período de dez a trinta dias; c) cancelamento do registro; II - promover a formação profissional e o treinamento multifuncional do trabalhador portuário, bem assim programas de realocação e de incentivo ao cancelamento do registro e de antecipação de aposentadoria; III - arrecadar e repassar, aos respectivos beneficiários, contribuições destinadas a incentivar o cancelamento do registro e a aposentadoria voluntária; IV - arrecadar as contribuições destinadas ao custeio do órgão; V - zelar pelas normas de saúde, higiene e segurança no trabalho portuário avulso; VI - submeter à Administração do Porto e ao respectivo Conselho de Autoridade Portuária propostas que visem à melhoria da operação portuária e à valorização econômica do porto. § 1° O órgão não responde pelos prejuízos causados pelos trabalhadores portuários avulsos aos tomadores dos seus serviços ou a terceiros. § 2º O órgão responde, solidariamente com os operadores portuários, pela remuneração devida ao trabalhador portuário avulso . § 3º O órgão pode exigir dos operadores portuários, para atender a requisição de trabalhadores portuários avulsos, prévia garantia dos respectivos pagamentos. Art. 20. O exercício das atribuições previstas nos arts. 18 e 19 desta lei, pelo órgão de gestão de mão-de-obra do trabalho portuário avulso, não implica vínculo empregatício com trabalhador portuário avulso. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Art. 21. O órgão de gestão de mão-de-obra pode ceder trabalhador portuário avulso em caráter permanente, ao operador portuário. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Art. 22. A gestão da mão-de-obra do trabalho portuário avulso deve observar as normas do contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Art. 23. Deve ser constituída, no âmbito do órgão de gestão de mão-de-obra, Comissão Paritária para solucionar litígios decorrentes da aplicação das normas a que se referem os arts. 18, 19 e 21 desta lei. § 1° Em caso de impasse, as partes devem recorrer à arbitragem de ofertas finais. § 2° Firmado o compromisso arbitral, não será admit ida a desistência de qualquer das partes. § 3° Os árbitros devem ser escolhidos de comum acor do entre as partes e o laudo arbitral proferido para solução da pendência possui força normativa, independentemente de homologação judicial. Art. 24. O órgão de gestão de mão-de-obra terá, obrigatoriamente, um Conselho de Supervisão e uma Diretoria Executiva. § 1° O Conselho de Supervisão será composto por trê s membros titulares e respectivos suplentes, sendo cada um dos seus membros e respectivos suplentes indicados por cada um dos blocos a que se referem os incisos II a IV do art. 31 desta lei, e terá por competência: I - deliberar sobre a matéria contida no inciso V do art. 18 desta lei; II - baixar as normas a que se refere o art. 28 desta lei; III - fiscalizar a gestão dos diretores, examinar, a qualquer tempo, os livros e papéis do organismo, solicitar informações sobre quaisquer atos praticados pelos diretores ou seus prepostos. § 2° A Diretoria Executiva será composta por um ou mais diretores, designados e destituíveis, a qualquer tempo, pelo bloco dos prestadores de serviços portuários a que se refere o inciso II do art. 31 desta lei, cujo prazo de gestão não será superior a três anos, permitida a redesignação. § 3° Os membros do Conselho de Supervisão, até o má ximo de 1/3 (um terço), poderão ser designados para cargos de diretores. § 4° No silêncio do estatuto ou contrato social, co mpetirá a qualquer diretor a representação do organismo e a prática dos atos necessários ao seu funcionamento regular. Art. 25. O órgão de gestão de mão-de-obra é reputado de utilidade pública e não pode ter fins lucrativos, sendo-lhe vedada a prestação de serviços a terceiros ou o exercício de qualquer atividade não vinculada à gestão de mão-de-obra. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) CAPíTULO V

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Do Trabalho Portuário Art. 26. O trabalho portuário de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados, será realizado por trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e por trabalhadores portuários avulsos. Parágrafo único. A contratação de trabalhadores portuários de estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de embarcações com vínculo empregatício a prazo indeterminado será feita, exclusivamente, dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados. Art. 27. O órgão de gestão de mão-de-obra: (Vide Lei nº 9.719, de 1998) I - organizará e manterá cadastro de trabalhadores portuários habilitados ao desempenho das atividades referidas no artigo anterior; II - organizará e manterá o registro dos trabalhadores portuários avulsos. § 1° A inscrição no cadastro do trabalhador portuár io dependerá, exclusivamente, de prévia habilitação profissional do trabalhador interessado, mediante treinamento realizado em entidade indicada pelo órgão de gestão de mão-de-obra. § 2° O ingresso no registro do trabalhador portuári o avulso depende de prévia seleção e respectiva inscrição no cadastro de que trata o inciso I deste artigo, obedecidas a disponibilidade de vagas e a ordem cronológica de inscrição no cadastro. § 3° A inscrição no cadastro e o registro do trabal hador portuário extingue-se por morte, aposentadoria ou cancelamento. Art. 28. A seleção e o registro do trabalhador portuário avulso serão feitos pelo órgão de gestão de mão-de-obra avulsa, de acordo com as normas que forem estabelecidas em contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho. Art. 29. A remuneração, a definição das funções, a composição dos termos e as demais condições do trabalho avulso serão objeto de negociação entre as entidades representativas dos trabalhadores portuários avulsos e dos operadores portuários. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) CAPíTULO VI Da Administração do Porto Organizado SEÇÃO I Do Conselho de Autoridade Portuária Art. 30. Será instituído, em cada porto organizado ou no âmbito de cada concessão, um Conselho de Autoridade Portuária. § 1° Compete ao Conselho de Autoridade Portuária: I - baixar o regulamento de exploração; II - homologar o horário de funcionamento do porto; III - opinar sobre a proposta de orçamento do porto; IV - promover a racionalização e a otimização do uso das instalações portuárias; V - fomentar a ação industrial e comercial do porto; VI - zelar pelo cumprimento das normas de defesa da concorrência; VII - desenvolver mecanismos para atração de cargas; VIII - homologar os valores das tarifas portuárias; IX - manifestar-se sobre os programas de obras, aquisições e melhoramentos da infra-estrutura portuária; X - aprovar o plano de desenvolvimento e zoneamento do porto; XI - promover estudos objetivando compatibilizar o plano de desenvolvimento do porto com os programas federais, estaduais e municipais de transporte em suas diversas modalidades; XII - assegurar o cumprimento das normas de proteção ao meio ambiente; XIII - estimular a competitividade; XIV - indicar um membro da classe empresarial e outro da classe trabalhadora para compor o conselho de administração ou órgão equivalente da concessionária do porto, se entidade sob controle estatal; XV - baixar seu regimento interno; XVI - pronunciar-se sobre outros assuntos de interesse do porto. § 2° Compete, ainda, ao Conselho de Autoridade Port uária estabelecer normas visando o aumento da produtividade e a redução dos custos das operações portuárias, especialmente as de contêineres e do sistema roll-on-roll-off.

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§ 3° O representante dos trabalhadores a que se ref ere o inciso XIV do § 1° deste artigo será indicado pelo respectivo sindicato de trabalhadores em capatazia com vínculo empregatício a prazo indeterminado. Art. 31. O Conselho de Autoridade Portuária será constituído pelos seguintes blocos de membros titulares e respectivos suplentes: I - bloco do poder público, sendo: a) um representante do Governo Federal, que será o Presidente do Conselho; b) um representante do Estado onde se localiza o porto; c) um representante dos Municípios onde se localiza o porto ou os portos organizados abrangidos pela concessão; II - bloco dos operadores portuários, sendo: a) um representante da Administração do Porto; b) um representante dos armadores; c) um representante dos titulares de instalações portuárias privadas localizadas dentro dos limites da área do porto; d) um representante dos demais operadores portuários; III - bloco da classe dos trabalhadores portuários, sendo: a) dois representantes dos trabalhadores portuários avulsos; b) dois representantes dos demais trabalhadores portuários; IV - bloco dos usuários dos serviços portuários e afins, sendo: a) dois representantes dos exportadores e importadores de mercadorias; b) dois representantes dos proprietários e consignatários de mercadorias; c) um representante dos terminais retroportuários. § 1° Para os efeitos do disposto neste artigo, os m embros do Conselho serão indicados: I - pelo ministério competente, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais, no caso do inciso I do caput deste artigo; II - pelas entidades de classe das respectivas categorias profissionais e econômicas, nos casos dos incisos II e III do caput deste artigo; III - pela Associação de Comércio Exterior (AEB), no caso do inciso IV, alínea a do caput deste artigo; IV - pelas associações comerciais locais, no caso do inciso IV, alínea b do caput deste artigo. § 2° Os membros do conselho serão designados pelo m inistério competente para um mandato de dois anos, podendo ser reconduzidos por igual ou iguais períodos. § 3° Os membros do conselho não serão remunerados, considerando-se de relevante interesse público os serviços prestados. § 4° As deliberações do conselho serão tomadas de a cordo com as seguintes regras: I - cada bloco terá direito a um voto; II - o presidente do conselho terá voto de qualidade. § 5° As deliberações do conselho serão baixadas em ato do seu presidente Art. 32. Os Conselhos de Autoridade Portuária (CAPs) instituirão Centros de Treinamento Profissional destinados à formação e aperfeiçoamento de pessoal para o desempenho de cargos e o exercício de funções e ocupações peculiares às operações portuárias e suas atividades correlatas. SEÇÃO II Da Administração do Porto Organizado Art. 33. A Administração do Porto é exercida diretamente pela União ou pela entidade concessionária do porto organizado. § 1° Compete à Administração do Porto, dentro dos l imites da área do porto: I - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos do serviço e as cláusulas do contrato de concessão; II - assegurar, ao comércio e à navegação, o gozo das vantagens decorrentes do melhoramento e aparelhamento do porto; III - pré-qualificar os operadores portuários; IV - fixar os valores e arrecadar a tarifa portuária; V - prestar apoio técnico e administrativo ao Conselho de Autoridade Portuária e ao órgão de gestão de mão-de-obra;

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VI - fiscalizar a execução ou executar as obras de construção, reforma, ampliação, melhoramento e conservação das instalações portuárias, nelas compreendida a infra-estrutura de proteção e de acesso aquaviário ao porto; VII - fiscalizar as operações portuárias, zelando para que os serviços se realizem com regularidade, eficiência, segurança e respeito ao meio ambiente; VIII - adotar as medidas solicitadas pelas demais autoridades no porto, no âmbito das respectivas competências; IX - organizar e regulamentar a guarda portuária, a fim de prover a vigilância e segurança do porto; X - promover a remoção de embarcações ou cascos de embarcações que possam prejudicar a navegação das embarcações que acessam o porto; XI - autorizar, previamente ouvidas as demais autoridades do porto, a entrada e a saída, inclusive a atracação e desatracação, o fundeio e o tráfego de embarcação na área do porto, bem assim a movimentação de carga da referida embarcação, ressalvada a intervenção da autoridade marítima na movimentação considerada prioritária em situações de assistência e salvamento de embarcação; XII - suspender operações portuárias que prejudiquem o bom funcionamento do porto, ressalvados os aspectos de interesse da autoridade marítima responsável pela segurança do tráfego aquaviário; XIII - lavrar autos de infração e instaurar processos administrativos, aplicando as penalidades previstas em lei, ressalvados os aspectos legais de competência da União, de forma supletiva, para os fatos que serão investigados e julgados conjuntamente; XIV - desincumbir-se dos trabalhos e exercer outras atribuições que lhes forem cometidas pelo Conselho de Autoridade Portuária; XV - estabelecer o horário de funcionamento no porto, bem como as jornadas de trabalho no cais de uso público. § 2° O disposto no inciso XI do parágrafo anterior não se aplica à embarcação militar que não esteja praticando comércio. § 3° A autoridade marítima responsável pela seguran ça do tráfego pode intervir para assegurar ou garantir aos navios da Marinha do Brasil a prioridade para atracação no porto. § 4° Para efeito do disposto no inciso XI deste art igo, as autoridades no porto devem criar mecanismo permanente de coordenação e integração das respectivas funções, com a finalidade de agilizar a fiscalização e a liberação das pessoas, embarcações e mercadorias. § 5° Cabe à Administração do Porto, sob coordenação : I - da autoridade marítima: a) estabelecer, manter e operar o balizamento do canal de acesso e da bacia de evolução do porto; b) delimitar as áreas de fundeadouro, de fundeio para carga e descarga, de inspeção sanitária e de polícia marítima, bem assim as destinadas a plataformas e demais embarcações especiais, navios de guerra e submarinos, navios em reparo ou aguardando atracação e navios com cargas inflamáveis ou explosivas; c)estabelecer e divulgar o calado máximo de operação dos navios, em função dos levantamentos batimétricos efetuados sob sua responsabilidade; d) estabelecer e divulgar o porte bruto máximo e as dimensões máximas dos navios que irão trafegar, em função das limitações e características físicas do cais do porto; II - da autoridade aduaneira: a) delimitar a área de alfandegamento do porto; b) organizar e sinalizar os fluxos de mercadorias, veículos, unidades de cargas e de pessoas, na área do porto. Art. 34. É facultado o arrendamento, pela Administração do Porto, sempre através de licitação, de terrenos e instalações portuárias localizadas dentro da área do porto, para utilização não afeta às operações portuárias, desde que previamente consultada a administração aduaneira. (Regulamento) SEÇÃO III Da Administração Aduaneira nos Portos Organizados Art. 35. A administração aduaneira, nos portos organizados, será exercida nos termos da legislação específica.

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Parágrafo único. A entrada ou saída de mercadorias procedentes ou destinadas ao exterior, somente poderá efetuar-se em portos ou terminais alfandegados. Art. 36. Compete ao Ministério da Fazenda, por intermédio das repartições aduaneiras: I - cumprir e fazer cumprir a legislação que regula a entrada, a permanência e a saída de quaisquer bens ou mercadorias do País; II - fiscalizar a entrada, a permanência, a movimentação e a saída de pessoas, veículos, unidades de carga e mercadorias, sem prejuízo das atribuições das outras autoridades no porto; III - exercer a vigilância aduaneira e promover a repressão ao contrabando, ao descaminho e ao tráfego de drogas, sem prejuízo das atribuições de outros órgãos; IV - arrecadar os tributos incidentes sobre o comércio exterior; V - proceder ao despacho aduaneiro na importação e na exportação; VI - (Revogado pela Lei nº 12.350, de 2010) VII - proceder à apreensão de mercadoria em situação irregular, nos termos da legislação fiscal aplicável; VIII - autorizar a remoção de mercadorias da área do porto para outros locais, alfandegados ou não, nos casos e na forma prevista na legislação aduaneira; IX - administrar a aplicação, às mercadorias importadas ou a exportar, de regimes suspensivos, exonerativos ou devolutivos de tributos; X - assegurar, no plano aduaneiro, o cumprimento de tratados, acordos ou convenções internacionais; XI - zelar pela observância da legislação aduaneira e pela defesa dos interesses fazendários nacionais. § 1° O alfandegamento de portos organizados, pátios , armazéns, terminais e outros locais destinados à movimentação e armazenagem de mercadorias importadas ou destinadas à exportação, será efetuado após o cumprimento dos requisitos previstos na legislação específica. § 2° No exercício de suas atribuições, a autoridade aduaneira terá livre acesso a quaisquer dependências do porto e às embarcações atracadas ou não, bem como aos locais onde se encontrem mercadorias procedentes do exterior ou a ele destinadas, podendo, quando julgar necessário, requisitar papéis, livros e outros documentos, inclusive, quando necessário, o apoio de força pública federal, estadual ou municipal. CAPÍTULO VII Das Infrações e Penalidades Art. 37. Constitui infração toda a ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe: I - na realização de operações portuárias com infringência ao disposto nesta lei ou com inobservância dos regulamentos do porto; II - na recusa, por parte do órgão de gestão de mão-de-obra, da distribuição de trabalhadores a qualquer operador portuário, de forma não justificada; III - na utilização de terrenos, área, equipamentos e instalações localizadas na área do porto, com desvio de finalidade ou com desrespeito à lei ou aos regulamentos. § 1° Os regulamentos do porto não poderão definir i nfração ou cominar penalidade que não esteja autorizada ou prevista em lei. § 2° Responde pela infração, conjunta ou isoladamen te, qualquer pessoa física ou jurídica que, intervindo na operação portuária, concorra para a sua prática ou dela se beneficie. Art. 38. As infrações estão sujeitas às seguintes penas, aplicáveis separada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade da falta: I - advertência; II - multa, de 100 (cem) até 20.000 (vinte mil) Unidades Fiscais de Referência (Ufir); III - proibição de ingresso na área do porto por período de trinta a cento e oitenta dias; IV - suspensão da atividade de operador portuário, pelo período de trinta a cento e oitenta dias; V - cancelamento do credenciamento do operador portuário . Art. 39. Compete à Administração do Porto: I - determinar a pena ou as penas aplicáveis ao infrator ou a quem deva responder pela infração, nos termos da lei; II - fixar a quantidade da pena, respeitados os limites legais.

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Art. 40. Apurando-se, no mesmo processo, a prática de duas ou mais infrações pela mesma pessoa física ou jurídica, aplicam-se, cumulativamente, as penas a elas cominadas, se as infrações não forem idênticas. § 1° Quando se tratar de infração continuada em rel ação à qual tenham sido lavrados diversos autos ou representações, serão eles reunidos em um só processo, para imposição da pena. § 2° Considerar-se-ão continuadas as infrações quan do se tratar de repetição de falta ainda não apurada ou que seja objeto do processo, de cuja instauração o infrator não tenha conhecimento, por meio de intimação. Art. 41. Da decisão da Administração do Porto que aplicar a penalidade caberá recurso voluntário, no prazo de trinta dias contados da intimação, para o Conselho de Autoridade Portuária, independentemente de garantia de instância. Art. 42. Na falta de pagamento de multa no prazo de trinta dias a partir da ciência, pelo infrator, da decisão final que impuser a penalidade, terá lugar o processo de execução. Art. 43. As importâncias pecuniárias resultantes da aplicação das multas previstas nesta lei reverterão para a Administração do Porto. Art. 44. A aplicação das penalidades previstas nesta lei, e seu cumprimento, não prejudica, em caso algum, a aplicação das penas cominadas para o mesmo fato pela legislação aplicável. CAPÍTULO VIII Das Disposições Finais Art. 45. O operador portuário não poderá locar ou tomar mão-de-obra sob o regime de trabalho temporário (Lei n° 6.019, de 3 de janeiro de 1974). Art. 46. (Vetado) CAPÍTULO IX Das Disposições Transitórias Art. 47. É fixado o prazo de noventa dias contados da publicação desta lei para a constituição dos órgãos locais de gestão de mão-de-obra do trabalho portuário avulso. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Parágrafo único. Enquanto não forem constituídos os referidos órgãos, suas competências serão exercidas pela respectiva Administração do Porto. Art. 48. Os atuais contratos de exploração de terminais ou embarcadores de uso privativo deverão ser adaptados, no prazo de até cento e oitenta dias, às disposições desta lei, assegurado aos titulares o direito de opção por qualquer das formas de exploração previstas no inciso II do § 2° do art. 4° desta lei. Art. 49. Na falta de contrato, convenção ou acordo coletivo de trabalho, deverá ser criado o órgão gestor a que se refere o art. 18 desta lei no nonagésimo dia a contar da publicação desta lei. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Art. 50. Fica o Poder Executivo autorizado a desmembrar as atuais concessões para exploração de portos. Art. 51. As administrações dos portos organizados devem adotar estruturas de tarifas adequadas aos respectivos sistemas operacionais, em substituição ao modelo tarifário previsto no Decreto n° 24.508, de 29 de junho de 1934, e suas alterações. Parágrafo único. As novas estruturas tarifárias deverão ser submetidas à apreciação dos respectivos Conselhos de Autoridade Portuária, dentro do prazo de sessenta dias. Art. 52. (Revogado pela Lei nº 9.309, de 2.10.1996) Art. 53. O Poder Executivo promoverá, no prazo de cento e oitenta dias, a adaptação das atuais concessões, permissões e autorizações às disposições desta lei. Art. 54. É assegurada a inscrição no cadastro de que trata o inciso I do art. 27 desta lei aos atuais integrantes de forças supletivas que, matriculados, credenciados ou registrados, complementam o trabalho dos efetivos. Art. 55. É assegurado o registro de que trata o inciso II do art. 27 desta lei aos atuais trabalhadores portuários avulsos matriculados, até 31 de dezembro de 1990, na forma da lei, junto aos órgãos competentes, desde que estejam comprovadamente exercendo a atividade em caráter efetivo desde aquela data. Parágrafo único. O disposto neste artigo não abrange os trabalhadores portuários aposentados. Art. 56. É facultado aos titulares de instalações portuárias de uso privativo a contratação de trabalhadores a prazo indeterminado, observado o disposto no contrato, convenção ou acordo

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coletivo de trabalho das respectivas categorias econômicas preponderantes. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Parágrafo único. Para os efeitos do disposto neste artigo, as atuais instalações portuárias de uso privativo devem manter, em caráter permanente, a atual proporção entre trabalhadores com vínculo empregatício e trabalhadores avulsos. (Vide Lei nº 9.719, de 1998) Art. 57. No prazo de cinco anos contados a partir da publicação desta lei, a prestação de serviços por trabalhadores portuários deve buscar, progressivamente, a multifuncionalidade do trabalho, visando adequá-lo aos modernos processos de manipulação de cargas e aumentar a sua produtividade. § 1° Os contratos, as convenções e os acordos colet ivos de trabalho deverão estabelecer os processos de implantação progressiva da multifuncionalidade do trabalho portuário de que trata o caput deste artigo. § 2° Para os efeitos do disposto neste artigo a mul tifuncionalidade deve abranger as atividades de capatazia, estiva, conferência de carga, conserto de carga, vigilância de embarcações e bloco. § 3° Considera-se: I - Capatazia: a atividade de movimentação de mercadorias nas instalações de uso público, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário; II - Estiva: a atividade de movimentação de mercadorias nos conveses ou nos porões das embarcações principais ou auxiliares, incluindo o transbordo, arrumação, peação e despeação, bem como o carregamento e a descarga das mesmas, quando realizados com equipamentos de bordo; III - Conferência de carga: a contagem de volumes, anotação de suas características, procedência ou destino, verificação do estado das mercadorias, assistência à pesagem, conferência do manifesto, e demais serviços correlatos, nas operações de carregamento e descarga de embarcações; IV - Conserto de carga: o reparo e restauração das embalagens de mercadorias, nas operações de carregamento e descarga de embarcações, reembalagem, marcação, remarcação, carimbagem, etiquetagem, abertura de volumes para vistoria e posterior recomposição; V - Vigilância de embarcações: a atividade de fiscalização da entrada e saída de pessoas a bordo das embarcações atracadas ou fundeadas ao largo, bem como da movimentação de mercadorias nos portalós, rampas, porões, conveses, plataformas e em outros locais da embarcação; VI - Bloco: a atividade de limpeza e conservação de embarcações mercantes e de seus tanques, incluindo batimento de ferrugem, pintura, reparos de pequena monta e serviços correlatos Art. 58. Fica facultado aos trabalhadores avulsos, registrados em decorrência do disposto no art. 55 desta lei, requererem ao organismo local de gestão de mão-de-obra, no prazo de até 1 (um) ano contado do início da vigência do adicional a que se refere o art. 61, o cancelamento do respectivo registro profissional. Parágrafo único. O Poder Executivo poderá antecipar o início do prazo estabelecido neste artigo. Art. 59. É assegurada aos trabalhadores portuários avulsos que requeiram o cancelamento do registro nos termos do artigo anterior: I - indenização correspondente a Cr$ 50.000.000,00 (cinqüenta milhões de cruzeiros), a ser paga de acordo com as disponibilidades do fundo previsto no art. 64 desta lei; II - o saque do saldo de suas contas vinculadas do FGTS, de que dispõe a Lei n° 8.036, de 11 de maio de 1990. § 1° O valor da indenização de que trata o inciso I deste artigo será corrigido monetariamente, a partir de julho de 1992, pela variação mensal do Índice de Reajuste do Salário Mínimo (IRSM), publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). § 2° O cancelamento do registro somente surtirá efe ito a partir do recebimento pelo trabalhador portuário avulso, da indenização . § 3º A indenização de que trata este artigo é isenta de tributos da competência da União. Art. 60. O trabalhador portuário avulso que tenha requerido o cancelamento do registro nos termos do art. 58 desta lei para constituir sociedade comercial cujo objeto seja o exercício da atividade de operador portuário, terá direito à complementação de sua indenização, no valor correspondente a Cr$ 12.000.000,00 (doze milhões de cruzeiros), corrigidos na forma do disposto no § 1° do artigo

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anterior, mediante prévia comprovação da subscrição de capital mínimo equivalente ao valor total a que faça jus. Art. 61. É criado o Adicional de Indenização do Trabalhador Portuário Avulso (AITP) destinado a atender aos encargos de indenização pelo cancelamento do registro do trabalhador portuário avulso, nos termos desta lei. Parágrafo único. O AITP terá vigência pelo período de 4 (quatro) anos, contados do início do exercício financeiro seguinte ao da publicação desta lei. Art. 62. O AITP é um adicional ao custo das operações de carga e descarga realizadas com mercadorias importadas ou exportadas, objeto do comércio na navegação de longo curso. Art. 63. O adicional incide nas operações de embarque e desembarque de mercadorias importadas ou exportadas por navegação de longo curso, à razão de 0,7 (sete décimos) de Ufir por tonelada de granel sólido, 1,0 (uma) de Ufir por tonelada de granel líquido e 0,6 (seis décimos) de Ufir por tonelada de carga geral, solta ou unitizada. Art. 64. São isentas do AITP as operações realizadas com mercadorias movimentadas no comércio interno, objeto de transporte fluvial, lacustre e de cabotagem. Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, considera-se transporte fluvial, lacustre e de cabotagem a ligação que tem origem e destino em porto brasileiro. Art. 65. O AITP será recolhido pelos operadores, portuários responsáveis pela carga ou descarga das mercadorias até dez dias após a entrada da embarcação no porto de carga ou descarga em agência do Banco do Brasil S.A., na praça de localização do porto. § 1° Dentro do prazo previsto neste artigo, os oper adores portuários deverão apresentar à Receita Federal o comprovante do recolhimento do AITP. § 2° O atraso no recolhimento do AITP importará na inscrição do débito em Dívida Ativa, para efeito de cobrança executiva, nos termos da legislação em vigor. § 3° Na cobrança executiva a dívida fica sujeita à correção monetária, juros de mora de 1% (um por cento) ao mês e multa de 20% (vinte por cento) sobre a importância devida. § 4° Os órgãos da Receita Federal não darão seguime nto a despachos de mercadorias importadas ou exportadas, sem comprovação do pagamento do AITP. Art. 66. O produto da arrecadação do AITP será recolhido ao fundo de que trata o art. 67 desta lei. Art. 67. É criado o Fundo de Indenização do Trabalhador Portuário Avulso (FITP), de natureza contábil, destinado a prover recursos para indenização do cancelamento do registro do trabalhador portuário avulso, de que trata esta lei. § 1° São recursos do fundo: I - o produto da arrecadação do AITP; II - (Vetado); III - o produto do retorno das suas aplicações financeiras; IV - a reversão dos saldos anuais não aplicados. § 2° Os recursos disponíveis do fundo poderão ser a plicados em títulos públicos federais ou em outras operações aprovadas pelo Ministro da Fazenda. § 3° O fundo terá como gestor o Banco do Brasil S.A . Art. 68. Para os efeitos previstos nesta lei, os órgãos locais de gestão de mão-de-obra informarão ao gestor do fundo o nome e a qualificação do beneficiário da indenização, bem assim a data do requerimento a que se refere o art. 58 desta lei. Art. 69. As administrações dos portos organizados estabelecerão planos de incentivo financeiro para o desligamento voluntário de seus empregados, visando o ajustamento de seus quadros às medidas previstas nesta lei. Art. 70. É assegurado aos atuais trabalhadores portuários em capatazia com vínculo empregatício a prazo indeterminado a inscrição no registro a que se refere o inciso II do art. 27 desta lei, em qualquer dos órgãos locais de gestão de mão-de-obra, a sua livre escolha, no caso de demissão sem justa causa. Art. 71. O registro de que trata o inciso II do caput do art. 27 desta lei abrange os atuais trabalhadores integrantes dos sindicatos de operários avulsos em capatazia, bem como a atual categoria de arrumadores. Art. 72. (Vetado) Art. 73. O BNDES, por intermédio do Finame, financiará, com prioridade, os equipamentos portuários. Art. 74. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

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Art. 75. Ficam revogados, no prazo de cento e oitenta dias contado da publicação desta lei, os arts. 254 a 292 e o inciso VIII do art. 544 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto - Lei n° 5.452, de 1° de maio de 1943. Art. 76. Ficam revogados, também os Decretos n°s 24 .324, de 1° de junho de 1934, 24.447, de 22 de junho de 1934, 24.508, de 29 de junho de 1934, 24.511, de 29 de junho de 1934, e 24.599, de 6 de julho de 1934; os Decretos -Leis n°s 6.460, de 2 de maio de 1944 e 8.439, de 24 de dezembro de 1945; as Leis n°s 1.561, de 21 de fevereiro de 1 952, 2.162, de 4 de janeiro de 1954, 2.191, de 5 de março de 1954 e 4.127, de 27 de agosto de 1962; os Decretos - Leis n°s 3, de 27 de janeiro de 1966, 5, de 4 de abril de 1966 e 83, de 26 de dezembro de 1966; a Lei n° 5.480, de 10 de agosto de 1968; os incisos VI e VII do art. 1° do Decreto - Lei n° 1.143, de 30 de dezembro de 1970; as Leis n°s 6.222, de 10 de julho de 1975 e 6.914, de 27 de maio de 1981, bem como as demais disposições em contrário. Brasília, 25 de fevereiro de 1993; 172° da Independ ência e 105º da República. ITAMAR FRANCO Alberto Goldman Walter Barelli Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 26.2.1993

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ANEXO B – Lei 9719, de 27/11/1998 295

Dispõe sobre normas e condições gerais de proteção ao trabalho portuário, institui multas pela inobservância de seus preceitos, e dá outras providências. Faço saber que o PRESIDENTE DA REPÚBLICA , adotou a Medida Provisória nº 1.728-19, de 1998, que o Congresso Nacional aprovou, e eu, Antonio Carlos Magalhães, Presidente, para os efeitos do disposto no parágrafo único do art. 62 da Constituição Federal, promulgo a seguinte Lei: Art. 1o Observado o disposto nos arts. 18 e seu parágrafo único, 19 e seus parágrafos, 20, 21, 22, 25 e 27 e seus parágrafos, 29, 47, 49 e 56 e seu parágrafo único, da Lei nº 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, a mão-de-obra do trabalho portuário avulso deverá ser requisitada ao órgão gestor de mão-de-obra. Art. 2o Para os fins previstos no art. 1o desta Lei: I - cabe ao operador portuário recolher ao órgão gestor de mão-de-obra os valores devidos pelos serviços executados, referentes à remuneração por navio, acrescidos dos percentuais relativos a décimo terceiro salário, férias, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, encargos fiscais e previdenciários, no prazo de vinte e quatro horas da realização do serviço, para viabilizar o pagamento ao trabalhador portuário avulso; II - cabe ao órgão gestor de mão-de-obra efetuar o pagamento da remuneração pelos serviços executados e das parcelas referentes a décimo terceiro salário e férias, diretamente ao trabalhador portuário avulso. § 1o O pagamento da remuneração pelos serviços executados será feito no prazo de quarenta e oito horas após o término do serviço. § 2o Para efeito do disposto no inciso II, o órgão gestor de mão-de-obra depositará as parcelas referentes às férias e ao décimo terceiro salário, separada e respectivamente, em contas individuais vinculadas, a serem abertas e movimentadas às suas expensas, especialmente para este fim, em instituição bancária de sua livre escolha, sobre as quais deverão incidir rendimentos mensais com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança. § 3o Os depósitos a que se refere o parágrafo anterior serão efetuados no dia 2 do mês seguinte ao da prestação do serviço, prorrogado o prazo para o primeiro dia útil subseqüente se o vencimento cair em dia em que não haja expediente bancário. § 4o O operador portuário e o órgão gestor de mão-de-obra são solidariamente responsáveis pelo pagamento dos encargos trabalhistas, das contribuições previdenciárias e demais obrigações, inclusive acessórias, devidas à Seguridade Social, arrecadadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, vedada a invocação do benefício de ordem. § 5o Os prazos previstos neste artigo podem ser alterados mediante convenção coletiva firmada entre entidades sindicais representativas dos trabalhadores e operadores portuários, observado o prazo legal para recolhimento dos encargos fiscais, trabalhistas e previdenciários. § 6o A liberação das parcelas referentes à décimo terceiro salário e férias, depositadas nas contas individuais vinculadas, e o recolhimento do FGTS e dos encargos fiscais e previdenciários serão efetuados conforme regulamentação do Poder Executivo. Art. 3o O órgão gestor de mão-de-obra manterá o registro do trabalhador portuário avulso que: I - for cedido ao operador portuário para trabalhar em caráter permanente; II - constituir ou se associar a cooperativa formada para se estabelecer como operador portuário, na forma do art. 17 da Lei nº 8.630, de 1993. § 1o Enquanto durar a cessão ou a associação de que tratam os incisos I e II deste artigo, o trabalhador deixará de concorrer à escala como avulso. 295 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8630.htm - Acessado em 16 de julho de 2012;

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§ 2o É vedado ao órgão gestor de mão-de-obra ceder trabalhador portuário avulso cadastrado a operador portuário, em caráter permanente. Art. 4o É assegurado ao trabalhador portuário avulso cadastrado no órgão gestor de mão-de-obra o direito de concorrer à escala diária complementando a equipe de trabalho do quadro dos registrados. Art. 5o A escalação do trabalhador portuário avulso, em sistema de rodízio, será feita pelo órgão gestor de mão-de-obra. Art. 6o Cabe ao operador portuário e ao órgão gestor de mão-de-obra verificar a presença, no local de trabalho, dos trabalhadores constantes da escala diária. Parágrafo único. Somente fará jus à remuneração o trabalhador avulso que, constante da escala diária, estiver em efetivo serviço. Art. 7o O órgão gestor de mão-de-obra deverá, quando exigido pela fiscalização do Ministério do Trabalho e do INSS, exibir as listas de escalação diária dos trabalhadores portuários avulsos, por operador portuário e por navio. Parágrafo único. Caberá exclusivamente ao órgão gestor de mão-de-obra a responsabilidade pela exatidão dos dados lançados nas listas diárias referidas no caput deste artigo, assegurando que não haja preterição do trabalhador regularmente registrado e simultaneidade na escalação. Art. 8o Na escalação diária do trabalhador portuário avulso deverá sempre ser observado um intervalo mínimo de onze horas consecutivas entre duas jornadas, salvo em situações excepcionais, constantes de acordo ou convenção coletiva de trabalho. Art. 9o Compete ao órgão gestor de mão-de-obra, ao operador portuário e ao empregador, conforme o caso, cumprir e fazer cumprir as normas concernentes a saúde e segurança do trabalho portuário. Parágrafo único. O Ministério do Trabalho estabelecerá as normas regulamentadoras de que trata o caput deste artigo. Art. 10. O descumprimento do disposto nesta Lei sujeitará o infrator às seguintes multas: I - de R$ 173,00 (cento e setenta e três reais) a R$ 1.730,00 (um mil, setecentos e trinta reais), por infração ao caput do art. 7o; II - de R$ 575,00 (quinhentos e setenta e cinco reais) a R$ 5.750,00 (cinco mil, setecentos e cinqüenta reais), por infração às normas de segurança do trabalho portuário, e de R$ 345,00 (trezentos e quarenta e cinco reais) a R$ 3.450,00 (três mil, quatrocentos e cinqüenta reais), por infração às normas de saúde do trabalho, nos termos do art. 9o; III - de R$ 345,00 (trezentos e quarenta e cinco reais) a R$ 3.450,00 (três mil, quatrocentos e cinqüenta reais), por trabalhador em situação irregular, por infração ao parágrafo único do art. 7o e aos demais artigos. Parágrafo único. As multas previstas neste artigo serão graduadas segundo a natureza da infração, sua extensão e a intenção de quem a praticou, e aplicadas em dobro em caso de reincidência, oposição à fiscalização e desacato à autoridade, sem prejuízo das penalidades previstas na legislação previdenciária. Art. 11. O descumprimento dos arts. 22, 25 e 28 da Lei nº 8.630, de 1993, sujeitará o infrator à multa prevista no inciso I, e o dos arts. 26 e 45 da mesma Lei à multa prevista no inciso III do artigo anterior, sem prejuízo das demais sanções cabíveis. Art. 12. O processo de autuação e imposição das multas prevista nesta Lei obedecerá ao disposto no Título VII da Consolidação das Leis do Trabalho ou na legislação previdenciária, conforme o caso.

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Art. 13. Esta Lei também se aplica aos requisitantes de mão-de-obra de trabalhador portuário avulso junto ao órgão gestor de mão-de-obra que não sejam operadores portuários. Art. 14. Compete ao Ministério do Trabalho e ao INSS a fiscalização da observância das disposições contidas nesta Lei, devendo as autoridades de que trata o art. 3o da Lei no 8.630, de 1993, colaborar com os Agentes da Inspeção do Trabalho e Fiscais do INSS em sua ação fiscalizadora, nas instalações portuárias ou a bordo de navios. Art. 15. Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória no 1.679-18, de 26 de outubro de 1998. Art. 16. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 17. Revoga-se a Medida Provisória nº 1.679-18, de 26 de outubro de 1998. Congresso Nacional, em 27 de novembro de 1998; 177o da Independência e 110o da República. Senador ANTONIO CARLOS MAGALHÃES Presidente Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 30.11.1998

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ANEXO C - Convenção 137 da OIT, de 24 de junho de 1975 296

I — Aprovada na 58ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho (Genebra — 1973), entrou em vigor no plano internacional em 24.6.75. II — Dados referentes ao Brasil: a) aprovação = Decreto Legislativo n. 29, de 22.12.93, do Governo Nacional; b) ratificação = 12 de agosto de 1994; c) promulgação = Decreto n. 1.574, de 31.6.95; d) vigência nacional = 12 de agosto de 1995.~ “A Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho,Convocada pelo Conselho Administrativo da Repartição Internacional do Trabalho em Genebra, onde se reuniu a 6 de junho de 1973, em sua qüinquagésima oitava sessão; Considerando que os métodos de processamento de carga nos portos se modificaram e continuam a se modificar — por exemplo, a adoção de unidades de carga, a introdução de técnicas de transbordo horizontal (roll on roll off), o aumento da mecanização e automatização enquanto que novas tendências aparecem no fluxo das mercadorias, e que semelhantes modificações deverão ser ainda mais acentuadas no futuro; Considerando que essas mudanças, ao acelerarem o transporte da carga, e reduzirem o tempo passado pelos navios nos portos e os custos dos transportes, podem beneficiar a economia do país interessado, em geral, e contribuir para elevar o nível de vida; Considerando que essas mudanças têm também repercussões consideráveis sobre o nível de emprego nos portos e sobre as condições de trabalho e vida dos portuários e que medidas deveriam ser adotadas para evitar ou reduzir os problemas que decorrem das mesmas; Considerando que os portuários deveriam beneficiar-se das vantagens que representam os novos métodos de processamento de carga e que, por conseguinte, o estudo e a introdução desses métodos deveriam ser acompanhados da elaboração e da adoção de disposições tendo por finalidade a melhoria duradoura de suas situação, por meios tais como a regularização do emprego, a estabilização da renda e por outras medidas relativas às condições de vida e de trabalho dos interessados e à segurança e higiene do trabalho portuário; Depois de ter resolvido adotar diversas moções relativas às repercussões sociais dos novos métodos de processamento de carga nos portos, que constituem o quinto item da agenda da sessão; Depois de ter resolvido que essas moções tomariam a forma de uma Convenção Internacional, adota, neste vigésimo quinto dia de junho de mil e novecentos e setenta e três, a Convenção abaixo que será denominada ‘Convenção sobre o Trabalho Portuário, de 1973’. Art. 1 — 1. A Convenção se aplica às pessoas que trabalham de modo regular como portuários, e cuja principal fonte de renda anual provém desse trabalho. 2. Para os fins da presente Convenção, as expressões ‘portuários’ e ‘trabalho portuário’ designam pessoas e atividades definidas como tais pela legislação ou a prática nacional. As organizações de empregadores e de trabalhadores interessadas devem ser consultadas por ocasião da elaboração e da revisão dessas definições ou serem a ela associadas de qualquer outra maneira; deverão, outrossim, ser levados em conta os novos métodos de processamento de carga e suas repercussões sobre as diversas tarefas dos portuários.

296 http://www.oitbrasil.org.br/node/491 - acessado em 16 de julho de 2012;

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Art. 2 — 1. Incumbe à política nacional estimular todos os setores interessados para que assegurem aos portuários, na medida do possível, um emprego permanente ou regular. 2. Em todo caso, um mínimo de períodos de emprego ou um mínimo de renda deve ser assegurado aos portuários sendo que sua extensão e natureza dependerão da situação econômica e social do país ou do porto de que se tratar. Art. 3 — 1. Registros serão estabelecidos e mantidos em dia, para todas as categorias profissionais de portuários na forma determinada pela legislação ou a prática nacional. 2. Os portuários matriculados terão prioridade para a obtenção de trabalho nos portos. 3. Os portuários matriculados deverão estar prontos para trabalhar de acordo com o que for determinado pela legislação ou as práticas nacionais. Art. 4 — 1. Os efeitos dos registros serão periodicamente revistos, a fim de fixá-los num nível que corresponda às necessidades do porto. 2. Quanto uma redução dos efetivos de um registro se tornar necessária, todas as medidas úteis serão tomadas, com a finalidade de prevenir ou atenuar os efeitos prejudiciais aos portuários. Art. 5 — Para obter dos novos métodos de processamento de carga o máximo de vantagens sociais, incumbe à política nacional estimular os empregadores ou suas organizações, por um lado, e as organizações de trabalhadores, por outro, a cooperarem para a melhoria da eficiência do trabalho nos portos, com a participação, se for o caso, das autoridades competentes. Art. 6 — Os Membros farão com que as regras adequadas, referentes à segurança, higiene, bem-estar e formação profissional dos trabalhadores, sejam aplicadas aos portuários. Art. 7 — Exceto nos casos em que forem implementadas mediante convênios coletivos, sentenças arbitrais ou qualquer outro modo conforme a prática nacional, as disposições da presente Convenção deverão ser aplicadas pela legislação nacional. Art. 8 — As ratificações formais da presente Convenção serão transmitidas ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho e por ele registradas. Art. 9 — 1. A presente Convenção obrigará somente os Membros da Organização Internacional do Trabalho cujas ratificações tenham sido registradas pelo Diretor-Geral. 2. Entrará em vigor doze meses após serem registradas pelo Diretor-Geral, as ratificações por parte de dois Membros. 3. Posteriormente esta Convenção entrará em vigor, para cada Membro, doze meses após a data de registro de sua ratificação. Art. 10 — 1. Todo Membro que tenha ratificado a presente Convenção poderá denunciá-la ao expirar o prazo de dez anos, contados da data inicial da vigência da Convenção, por meio de um ato comunicado ao Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho e por ele registrado. A denúncia somente se tornará efetiva um ano após haver sido registrada. 2. Todo Membro que tenha ratificado a presente Convenção e que no prazo de um ano após o termo do período de dez anos, mencionado no parágrafo precedente, não houver feito uso da faculdade de denúncia prevista pelo presente artigo, ficará ligado por um novo período de dez anos e, posteriormente, poderá denunciar a presente Convenção ao termo de cada período de dez anos, nas condições previstas no presente artigo. Art. 11 — 1. O Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho notificará a todos os Membros da Organização Internacional do Trabalho o registro de todas as ratificações, declarações e denúncias que lhe forem transmitidas pelos Membros da Organização. 2. Ao notificar aos Membros da Organização o registro da segunda ratificação que lhe tenha sido transmitida, o Diretor-Geral chamará a atenção dos Membros da Organização para a data na qual a presente Convenção entrará em vigor. Art. 12 — O Diretor-Geral da Repartição Internacional do Trabalho transmitirá ao Secretário-Geral das Nações Unidas, para fins de registro de acordo com o artigo 102 da Carta das Nações Unidas, informações completas a respeito de todas as ratificações, declarações, e atos de denúncia que tenha registrado de acordo com os artigos precedentes. Art. 13 — Ao termo de cada período de dez anos, contados da entrada em vigor da presente Convenção, o Conselho de Administração da Repartição Internacional do Trabalho deverá apresentar à Conferência Geral um relatório sobre a aplicação da presente Convenção e decidirá da conveniência de ser inscrita na ordem do dia da Conferência a questão de sua revisão total ou parcial. Art. 14 — 1. Caso a Conferência adotar uma nova Convenção que implique revisão total ou parcial da presente Convenção e a menos que a nova Convenção não disponha de outro modo:

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a) a ratificação, por parte de um Membro, da nova Convenção revista acarretará de pleno direito, não obstante o artigo 16 acima, denúncia imediata da presente Convenção desde que a nova Convenção revista tenha entrado em vigor; b) a partir da data da entrada em vigor da nova Convenção revista, a presente Convenção cessará de estar aberta à ratificação por parte dos Membros. 2. A presente Convenção permanecerá, entretanto, em vigor na sua forma e teor para os Membros que a houverem ratificado e que não ratificarem a Convenção revista. Art. 15 — As versões francesa e inglesa do texto da presente Convenção são igualmente autênticas.”

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ANEXO D – Recomendação 145 da OIT 297

Conferência Internacional do Trabalho, Recomendações Sobre as repercussões sociais dos novos métodos de Processamentos de carga nos portos. A Organização Geral da Organização Internacional do Trabalho: Convocada em Genebra pelo Conselho Administrativo da Repartição Internacional do Trabalho, e reunida na referida cidade a 6 de julho de 1973 em sua quinquagésima oitava sessão; Considerando que se produzem e continuam a produzir importantes mudanças no método de processamento de cargas nos portos – por exemplo, a adoção de unidades de carga, a introdução de técnica de transbordo horizontal (roll-on/rolloff) e o aumento da mecanização de automação – e no movimento de mercadorias, e que, se prevê que no futuro tais mudanças venham a adquirir ainda maior importância; Considerando que as referidas mudança, ao acelerar o transporte de cargas e reduzir o tempo de estadia dos navios no porto e as custas do transporte, podem beneficiar a economia do País em seu conjunto e contribuir para a elevação do nível de vida; Considerando que tais mudanças têm também repercussões consideráveis sobre o nível de emprego nos portos e as condições de trabalho e vida dos portuários e que deveriam ser adotadas medidas para prevenir ou reduzir os problemas decorrentes das mesmas. Considerando que os portuários deveram beneficiar-se com a introdução de novos métodos de processamento de carga e que, por conseguinte, ao mesmo tempo que se planeja e introduzem novos métodos, dever-se-ia planejar e adotar uma serie de medidas para melhorar de modo duradouro sua situação, tais como a regularização do emprego e a estabilização da renda e outras medidas relativas às condições de trabalho e vida e à segurança e higiene do trabalho portuário; Depois de terem resolvido adotar diversas propostas relativas às repercussões sociais dos novos métodos de processamento de carga nos portos, questão que constitui o quinto item da agenda da reunião; e Depois de terem resolvido que as referidas propostas tomem a forma de uma Recomendação que completa a Convenção sobre o Trabalho Portuário de 1972, adota, na data de vinte e cinco de junho de mil novecentos e noventa e três, a presente recomendação que poderá ser citada coma Recomendação sobre o Trabalho Portuário de 1973. I – CAMPO DE APLICAÇÃO E DEFINIÇÕES 1. Ressalvando o disposto no § 36, a presente Recomendação se aplica às pessoas que dedicam de modo regular a um trabalho como portuário e cuja principal fonte de renda anual provém desse trabalho. 2. Para os efeitos da presente Recomendação, as expressões “portuário” e “trabalho portuário” designam as pessoas e as atividades definidas como tais pela legislação ou a práticas nacionais. As organizações interessadas de empregadores e trabalhadores devem ser consultadas por ocasião de tais definições e pedir-se-á sua contribuição de uma ou de outra forma para elaboração ou revisão das mesmas; dever-se iam assim mesmo levar em conta os novos métodos de processamento de carga e seus efeitos sobre as diversas tarefas dos portuários. II – REPERCUSSÕES DAS MUDANÇAS DOS MÉTODOS DE PROCE SSAMENTO DE CARGA 3. Em cada país, e eventualmente em cada porto, deveriam avaliar-se de modo regular e sistemático, as possíveis repercussões das mudanças dos métodos do processamento de carga, particularmente nas oportunidades de emprego e condição de trabalho dos portuários, assim com na estrutura de emprego nos portos; assim mesmo, deveriam ser sistematicamente revisadas as medidas que resultem dessa avaliação por órgãos aos quais pertençam representantes das

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PAIXÃO, Cristiano; FLEURY, Ronaldo Curado Fleury. Trabalho portuário : a modernização dos portos e as relações de trabalho no Brasil. São Paulo: Método, 2008, p. 137-143.

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organizações de trabalho e de trabalhadores interessados, e, se fosse conveniente, das autoridades competentes. 4. A introdução de novos métodos de processamento de carga e as medidas decorrentes deveriam ser coordenadas com os programas e políticas nacionais e regionais de desenvolvimento de mão-de-obra. 5. Para os fins indicados nos §§ 3.º e 4.º, dever-se-ia compilar, de modo continuo, toda a informação pertinente e, em particular; a) estatísticas relativas ao trânsito de carga pelos portos, com a indicação dos métodos de processamento de carga utilizados; b) gráficos que mostrem a procedência e o destino das principais correntes e transportes de mercadorias, assim como os pontos de reunião e dispersão de carga dos containeres e outras unidades de carga; c) a avaliação das tendências futura, se possível, apresentadas de modo análogo; d) previsões acerca da mão-de-obra necessária nos portos para manipular a carga, levando em conta a evolução futura dos métodos de processamento de carga e a procedência e destino das principais correntes de transportes de mercadorias. 6. Na medida do possível, cada país deveria adotar as mudanças nos métodos de processamento de carga mais convenientes à sua economia, levando-se em conta, particularmente, a disponibilidade relativa de capitais – especialmente de divisas -, de mão-de-obra e de meios de transporte interno. III – REGULARIZAÇÃO DO EMPREGO E DA RENDA A) Emprego permanente ou regular 7. sendo possível, dever-se-ia assegurar aos portuários um emprego permanente ou regular. B) Garantias de emprego ou de renda 8.1 Nos casos em que não seja possível o emprego permanente ou regular, dever-se-ia propiciar garantias de emprego ou de renda, ou ambas as coisas ao mesmo tempo; a natureza ou amplitude de tais garantias dependerão da situação econômica e social do País ou do porto do que se trata. 8.2 Entre essas garantias, poderiam ser incluídas uma ou várias da seguintes: a) emprego durante um número combinado de horas ou turno por ano, por mês ou por semana, ou em lugar, o pagamento correspondente; b) indenização em dinheiro, mediante um sistemas que não requeira contribuição financeira dos trabalhadores, quando os portuários estivessem presentes à chamada ou disponíveis de alguma outra forma para o trabalho, sem conseguir ser admitidos ao mesmo; c) indenização de desemprego quando haja trabalho. 9. Todos os interessados deveriam adotar medidas positivas para evitar que se restringisse ao mínimo, na medida do possível, qualquer redução da força do trabalho, sem prejuízo do desenvolvimento eficiente das operações portuárias. 10. Deveriam ser tomadas disposições adequadas para dar proteções financeiras aos portuários no caso de redução inevitável da força de trabalho, tais como: a) um seguro de desemprego ou outras formas de previdência social; b) uma indenização por cessação da relação de trabalho ou outros tipos de indenização pelos mesmo motivos, a cargo dos empregadores; c) uma combinação de indenização conforme o prevejam a legislação nacional ou os contratos coletivos. C) Registro 11. Deveriam ser restabelecidos e mantidos em dia os registros para todas as categorias de portuários na forma que determine a legislação ou práticas nacionais, com a finalidade de: a) evitar a utilização de mão-de-obra adicional quando o trabalho existente não baste para proporcionar meios adequados de vida aos portuários; b) pôr em prática planos de regularização do emprego e estabilização das admissões e sistemas de distribuição de mão-de-obra nos portos. 12. O número de categorias especializadas deveria ser reduzido e deveriam ser modificadas suas atribuições, à medida que estiver sendo modificada a natureza do trabalho, e que

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um número mais elevado de trabalhadores se capacitam para efetuar uma variedade maior de tarefas. 13. Deveria ser suprida, quando possível, a distinção entre trabalho a bordo e trabalho em terra, a fim de se conseguir uma maior possibilidade de intercâmbio de mão-de-obra, maior flexibilidade na designação do trabalho e maior rendimento das operações. 14. Quando não haja emprego permanente ou regular para todos os trabalhadores portuários, os registros deveriam tomar as formas de: a) um registro único; ou de b) registros independentes para: I) os trabalhadores com emprego mais ou menos regular; II) os trabalhadores do grupo de reserva. 15. Não se deveria normalmente empregar como portuários aqueles que não estivessem registrados como tais. Em casos excepcionais, quando todos os portuários registrados estejam empregados, poder-se-ia contratar outros trabalhadores. 16. Os trabalhadores portuários registrados deveriam dar a conhecer que estão disponíveis para o trabalho na forma que determina a legislação ou práticas nacionais. D) Acordos sobre o número de inscritos nos registros 17. O número de trabalhadores inscritos deveria ser revisados periodicamente pelas partes interessadas, de modo que seu resultado seja adequado, mas não excessivo, para satisfazer as necessidades do porto. Ao proceder a essas revisões, os interessados deveriam levar em conta todos os fatores pertinentes, em particular os fatores a longo prazo, como as mudanças do método do processamento de cargas e das correntes comerciais. 18.1) Quando diminuir a demanda de determinadas categorias de portuários deveria ser feito todo o possível para manter esses trabalhadores nos empregos da indústria portuária, dando-lhes a necessária oportunidade de readaptação profissional para trabalhar em outras categorias; essa readaptação deveria ser facilitada com suficiente antecedência, em qualquer mudança prevista nos métodos de trabalho. 18.2) Se fosse inevitável reduzir o volume total de inscrições deveriam ser feitos todos os esforços necessários para ajudar a conseguir outro emprego colocando a sua disposição os serviços de readaptação profissional e a assistência dos serviços públicos de emprego. 19.1) Se possível, qualquer redução do volume de inscritos no registro que se faça necessária, deveria se efetuar gradualmente e sem que se recorra ao rompimento da relação de trabalho. A esse respeito poderia ser útil aplicar aos portos a experiência relativa às técnicas de planificação pessoal da empresa. 19.2) Ao determinar o alcance da redução deve-se-ia levar em consideração entre outros fatores: a) a diminuição natural dos efetivos; b) a suspensão da contratação, salvo em caso de funções especiais em que não se possa trinar os portuários já registrados; c) a exclusão dos trabalhadores que não tirem seus principais meios de vida do trabalho portuário; d) a redução da idade de aposentadoria ou medida destinadas a facilitar a aposentadoria voluntária antecipada, mediante a concessão de pensões, suplemento às pensões do Estado ou pagamento de quantias globais; e) quando o aconselhar a situação, e ressalvando os contratos coletivos e o consentimento dos trabalhos interessados, a transferência permanente de portuários dos portos em que haja excesso para os portos em que haja escassez dos referidos trabalhadores. 19.3) O cancelamento da relação de trabalho somente deveria ser considerado depois de se levar devidamente em conta os meios mencionados do item 2 anterior e a reserva das garantias de emprego que pudessem ter sido concedidas. Dentro do possível, o término da relação de trabalho dever-se-ia fazer de acordo com critérios combinados e sujeitando-se a um aviso prévio adequado e ao pagamento das indenizações estabelecidas no § 10. E) Distribuição de mão-de-obra 20. Exceto nos casos de emprego regular ou permanente, com um determinado empregado, deveriam ser estabelecido sistemas de distribuição da mão-de-obra que:

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a) ressalvando as disposições dos §§ 11, 15 e 17, proporcionem a cada empregador a mão-de-obra de que necessita para a rotação rápida dos barcos ou, se houver escassez de trabalhadores, uma parte equitativa da mão-de-obra disponível; b) proporcionem a cada portuário registrado uma parte equitativa do trabalho disponível; c) reduzam ao mínimo a necessidade de apresentar-se às chamadas para a seleção e designação do trabalho, assim como o tempo necessário para ele; d) assegurem, na medida do possível, e ressalvando a necessária rotação das equipes, que os trabalhos sejam terminados pelos mesmos portuários que os tenham começado. 21) Nas condições que se estabelecem na legislação nacional ou nos contratos coletivos, deveria ser permitida, caso necessária, a transferência dos portuários empregados regularmente por um empregador para um emprego temporário com outro empregador. 22) Nas condições que se estabeleçam na legislação nacional ou nos contratos coletivos, deveria ser permitida, caso necessária, a transferência temporária e voluntária de portuários de um porto para outro. IV – RELAÇÕES DE TRABALHO 23. As discussões e as negociações entre os empregadores e os trabalhadores interessados deveriam ser orientadas não somente para resolver os problemas correntes, como salários e condições de trabalho, mas também para fazer frente às repercussões de novos métodos de processamento de carga. 24. Com essa finalidade, deveria ser reconhecida a importância da existência de organizações de empregadores e de trabalhadores portuários, estabelecidas de acordo com princípios da Convenção sobre a Liberdade Sindical e a Proteção do Direito de Sindicalização, de 1948, e da Convenção sobre o Direito e Sindicalização e de Negociação Coletiva, de 1949, que possam entabular livremente negociações e assegurar a execução dos acordos que se concluam. 25. Onde ainda não exista, deveria ser estabelecido um sistemas de relações de trabalho, com a finalidade de criar um clima de confiança e de colaboração entre os portuários e os empregadores, graças ao qual possam se efetuar reformas sociais e técnicas sem tensões nem conflitos, e possam se resolver rapidamente as queixas, de acordo com as Recomendações sobre o Exame de Reclamações, de 1967. 26. As organizações de empregadores e de trabalhadores juntamente com as autoridades competentes, quando for o caso, deveriam participar na aplicação das medidas sociais necessárias e, em particular, no funcionamento dos sistemas de regularização de emprego e da estabilidade de remuneração. 27. Deveriam ser instaurados métodos efetivos de comunicação entre os empregadores e portuários, e entre os dirigentes das organizações de trabalhadores e seus filiados, de acordo com a Recomendação sobre a Comunicação dentro da Empresa, de 1967, Tais métodos deveriam ser postos em prática por todos os meios possíveis e a todos os níveis. V – ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO PORTUÁRIO 28. A fim de que a introdução de novos métodos de processamento de carga se traduza por um máximo de benefícios sociais, deveria ser fomentada a colaboração entre os empregadores, ou suas organizações, e as organizações de trabalhadores para aumentar o rendimento do trabalho portuário, com a participação, quando for o caso, das autoridades competentes. 29. Entre as medidas objeto de tais acordos pode-se-ia incluir; a) o emprego de conhecimento científico e técnicas referentes ao ambiente de trabalho, particularmente quando às condições de trabalho portuário; b) programas completos de formação profissional, inclusive em matéria de segurança; c) esforços mútuos para alimentar práticas obsoletas; d) uma maior flexibilidade ao distribuir portuários entre os diversos porões, entre os que trabalham a bordo e em terra, e entre as diversas operações em terra; e) o recurso, em caso necessário, ao trabalho por turno e em fim de semana; f) uma organização do trabalho e uma formação profissional que permitam aos trabalhadores desempenhar várias funções correlatas; g) a adaptação do número de trabalhadores de cada turma às necessidades que foram combinadas, levando em conta a necessidade de assegurar períodos razoáveis de descanso;

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h) esforços mútuos para eliminar, na medida do possível, o tempo improdutivo; i) disposições para a utilização eficiente do equipamento mecânico, que levam em conta as normas de segurança adequada e as restrições de peso que impões a capacidade máxima de utilização das máquinas. 30. As referidas medidas deveriam ser acompanhadas de acordos sobre matérias de regularização do emprego e de estabilização de renda e da melhoria das condições de trabalho a que se refere a parte subsequente da presente Recomendação. VI – CONDIÇÕES DE TRABALHO E DE VIDA 31. A legislação sobre a segurança, higiene, bem-estar e formação profissional, aplicável a empresas industriais, deveria aplicar-se efetivamente nos portos cm as adaptações técnicas necessárias; deveria haver serviço de inspeção adequado e qualificado. 32. As normas relativas à duração do trabalho, descanso semanal, férias remuneradas e condições análogas, não deveriam ser menos favoráveis para os portuários do que para a maioria dos tabuladores das empresas industriais. 33. Deveriam ser adotadas medidas em relação ao trabalho por turno, entre elas: a) evitar que as pessoas trabalhem em dois turnos consecutivos, além dos limites estabelecidos pela legislação nacional e os contratos coletivos; b) compensação salarial pelos inconvenientes que cause ao trabalhador o trabalho por turnos, inclusive aquele efetuado em fim de semana; c) fixação de uma duração máxima e de um horário adequado dos turnos, levados em conta as condições locais. 34. Quando se introduzem novos métodos de processamento de carga, e as remunerações forem calculadas pela tonelagem, ou por outras formas baseadas na produtividade, poder-se-ia adotar medidas para examinar e, quando preciso, rever os métodos de escalas e de pagamento e, caso necessário, deveriam ser aumentados os ganhos dos portuários, como resultado dos novos métodos de processamento de carga. 35. Onde não existam, deveriam ser estabelecidos sistemas adequados de pensões e aposentadorias. VII – DISPOSIÇÕES DIVERSAS 36. As disposições adequadas da presente Recomendação dever-se-ia aplicar, na medida do possível, aos portuários ocasionais ou sazonais, de acordo com a legislação e as práticas nacionais.

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ANEXO E – Laudo Arbitral estabelecido entre o sindicato

patronal dos operadores portuários e os sindicatos de

trabalhadores portuários de Paranaguá/PR

COMPROMISSO ARBITRAL 298 Pelo presente instrumento particular de Compromisso Arbitral, de um lado SINDICATO DOS ESTIVADORES DE PARANAGUÁ E PONTAL DO PARANÁ , entidade representativa da classe, inscrita no CNPJ sob o número 78.178.340/0001-02, com sede na Rua Visconde de Nácar, 732, Paranaguá Paraná, neste ato representado por seu presidente ANTONIO CARLOSBONZATO , brasileiro, casado, estivador, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 170.403.539-20. SINDICATO DOS CONFERENTES DE CARGA E DESCARGA NOS P ORTOS DO PARANÁ , entidade representativa de classe, inscrita no CNPJ sob o número 79.626.009/0001-91, com sede na Rua Nestor Victor, 856, Paranaguá, Paraná, neste ato representado por seu presidente JOSÉ MARCOS PIETROFERNANDES , brasileiro, casado, conferente de carga e descarga, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 017.981.709-49; SINDICATO DOS ARRUMADORES E TRABALHADORES PORTUÁRIO S AVULSOS NOS SERVIÇOS DE CAPATAZIA NOS PORTOS DE PARANAGUÁE PONT AL DO PARANÁ , entidade representativa de classe, inscrita no CNPJ sob o número 80.294.770/001-23, com sede na Rua Manoel Pereira, 104, Paranaguá, Paraná, neste ato representado por seu presidente MARCOS MAURICIO RODRIGUES, brasileiro, casado, arrumador, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 740.009.669-04; SINDICATO DOS CONSERTADORES DE CARGA E DESCARGA NOS PORTOS DO ESTADO DO PARANÁ, entidade representativa de classe, inscrita no CNPJsob o número 79.625.331/0001-77, com sede na RuaPrincesa Isabel, 754, Paranaguá, Paraná, neste ato representada por seu presidente CRISTIAN CESAR DE OLIVEIRA, brasileiro, casado, consertador de carga e descarga, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 017.053.319-04; SINDICATO DOS VIGIAS PORTUÁRIOS DE PARANAGUÁ , entidade representativa de classe, inscrita no CNPJsob o número 79.625.024/0001-00, com sede na Rua Conselheiro Correia, 1657, Paranaguá Paraná, neste ato representado por seu presidente PEDRO HENRIQUE MARTINS, brasileiro, casado, vigia portuário, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 316.853.589-34; SINDICATO DOS TRABALHADORES DE BLOCO NOS PORTOS DE PARANAGUÁ E ANTONINA , entidade representativa de classe, inscrita no CNPJ sob o número78.177.797/0001-94, com sede na Rua Manoel Pereira, 1862, Paranaguá Paraná, neste ato representado por seu presidente ELCIO LEONEL DOMINGUES, brasileiro, casado, trabalhador de bloco, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 813.210.079-49, ao final assinados. E de outro lado SINDICATO DOS OPERADORES PORTUÁRIOS DO ESTADO DO PA RANÁ, entidade representativa de classe, inscrita no CNPJ sob o número 95.751.350/0001-04, com sede na Av. Arthur de Abreu, 29, 5º andar. Paranaguá Paraná, neste ato representado por seu presidente EDSON CEZAR AGUIAR, brasileiro, casado, administrador, inscrito no Cadastro de Pessoas Físicas sob o número 166.923.069-49, ao final assinados. Após um longo processo de mediação, onde puderam apresentar seus argumentos, convencionam submeter a juízo arbitral, nos termos da lei 9.307/96, com base nos princípios gerais de direito, em especial de direito do trabalho, nos usos e costumes das relações de trabalho portuário e nos

298 Sentença arbitral assinada pelas partes em 30 de setembro de 2012. Foi excluído deste anexo o histórico anterior, que transcrevia todas as convenções coletivas de trabalho das categorias envolvidas.

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acordos e convenções coletivos porventura existentes entre as partes, salvo, quanto a estes, no tocante ao prazo de vigência. Esta solução definitiva dos conflitos consignados deu-se a partir da instauração do Dissídio Coletivo de Trabalho de Greve, autuado no TRT da 9º Região sob o número 292-2008-909-09-00-8 entre as partes, por sugestão do vice-presidente do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 9º Região, Desembargador Luiz Eduardo Guinter, de acordo com as seguintes condições: 1. Nomeia árbitro o Dr. Gelson de Azevedo, brasileiro, advogado, OAB/RS 70.962, com escritório profissional na Av. Borges de Medeiros, nº 2105, cj, 1008, na cidade de Porto Alegre/RS, (art.10, II, idem), cuja assinatura também aposta neste termo implica aceitação do encargo (art.19, idem), ademais de constituir compromisso de atuar com imparcialidade, independência, competência, diligência e discrição (art. 13, § 6º, idem). 2. O objeto da arbitragem é a solução definitiva dos conflitos consignados sobre horas extras, férias, adicional de risco/insalubridade dos trabalhadores avulsos de Paranaguá, consignados em inúmeras ações trabalhistas individuais que tramitam nas diversas instâncias da Justiça do Trabalho. Cabendo ao árbitro julgar de maneira declaratória, de acordo com a legislação brasileira, a aplicabilidade, a oportunidade e o limite dos direitos sobre os temas conflituosos relacionados acima. Caberá também ao árbitro a instituição de princípios e normas que passarão a reger as relações de trabalho entre as partes sobre o objeto desta arbitragem. 3. A sentença arbitral será proferida na cidade de Curitiba. 4. O árbitro julgará de acordo com a legislação brasileira (art.11, II e IV, idem). 5. A sentença arbitral deverá ser apresentada no prazo de 60 (sessenta dias) (art. 11, III). 6. As partes convencionam que as despesas e os honorários da arbitragem deverão ser custeados pelo OGMO/Pguá. 7. As partes convencionam que as normas de natureza social e os princípios que venham a ser estabelecidos pela sentença arbitral tenham prazo de vigência indeterminado, comente podendo ser alterados por meio de nova sentença arbitral. Curitiba, 1º de julho de 2009. É o relatório. Introdução. 1. A igualdade prevista no art. 7º, XXXIV, da Constituição Federal. No citado dispositivo constitucional, dispõe-se como direito dos trabalhadores a “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso”. Não poucos conflitos nas relações de trabalho portuário têm decorrido da tentativa de aplicação dessa regra de isonomia material – repita-se, que iguala o trabalhador avulso ao trabalhador com vínculo empregatício – a qual encontra resistência, muitas vezes, justamente naqueles a quem a norma busca beneficiar. Cite-se, como exemplo, paralisação coletiva de trabalho havida por força de concessão de férias, realizada pelo OMGO, em cumprimento a determinação havida em ação civil pública julgada procedente. Os trabalhadores portuários avulsos recusavam-se a permanecer sem possibilidade de trabalho por períodos de até trinta dias consecutivos, embora tivessem recebido, junto com a contraprestação pelo trabalho, ao longo do ano, a remuneração, correspondente as férias... Ora, o valor da remuneração das férias incorpora-se aos ganhos (e despesas) mensais e não seria possível suportar trinta dias sem trabalho e sem nenhuma receita financeira! E a razão desse fenômeno de conflitos generalizados está justamente na equivocada tentativa de aplicar-se uma mesma regra a situações fáticas absolutamente distintas. Assim, não se ofende o principio da isonomia se o critério adotado para discriminar encontra fundamento racional para sua adoção. No dizer da doutrina: “Para aferir eventual ofensa ao princípio da igualdade, cumpre investigar, especialmente, o critério adotado como fato discriminatório e a existência de justificativa racional ou fundamento lógico para sua adoção” (MELLO, Celso Antonio Bandeira de Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade). Impõem-se, em decorrência, antes de serem estabelecidas normas, algumas digressões doutrinárias.

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A igualdade formal prevista no art. 5º, caput, da Constituição Federal, afirma a desigualdade real dos indivíduos e, ao mesmo tempo, a possibilidade de serem agrupados segundo determinados aspectos comuns escolhidos pelo legislador. No dizer de José Afonso Silva ( Curso de Direito Constitucional Positivo, 9º edição, pág.197, Malheiros Editores): “...o principio[da igualdade perante a lei] não pode ser entendido em sentido individualista, que não leve em conta as diferenças entre grupos. Quando se diz que o legislador não pode distinguir, isso não significa que a lei deva tratar todos abstratamente iguais, pois o tratamento igual – esclarece Petzold - não se dirige a pessoas integralmente iguais entre si, mas áquelas que são iguais sob os aspectos tomados em consideração pela norma, o que implica que os “iguais” podem diferir totalmente sob outros aspectos ignorados ou considerados como irrelevantes pelo legislador.” (...) “...vale dizer que as pessoas ou situações são iguais ou desiguais de modo relativo, ou seja, sob certos aspectos.” No mesmo sentido Perelman, quando diz, no tocante à igualdade formal, perante a lei, que “os seres de uma mesma categoria essencial devem ser tratados da mesma forma” (De la Justice, in Justice et Raison), porque todos são “iguais perante a lei”, Tal assertiva confirma a existência de categorias essenciais que são diferentes entre si, a partir de determinados aspectos considerados e valorizados pelo legislador para estabelecimento de normas também distintas que objetivem assegurar essa igualdade. Já no art. 7º, da Constituição Federal, estabelece-se a igualdade material entre grupo de trabalhadores com vínculo empregatício permanente e grupo de trabalhadores avulsos, que são essencialmente distintos entre si. Daí a perplexidade inicial, no sentido de que, muitas vezes, são resistentes à aplicação da norma justamente aqueles a quem a norma objetivou beneficiar. A perplexidade, porém, se desfaz se atentarmos para dois aspectos: o primeiro, no sentido de que se está em busca de interpretação e aplicação de norma que institui igualdade para fazer-se justiça; o segundo, no sentido de que a noção de igualdade, a impor um tratamento desigual justamente para igualar. Ou seja: fazer justiça é tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Considerados esses dois aspectos, pode-se afirmar que tanto na igualdade formal, quanto na igualdade material (esta, ainda que determinada por lei), devem p legislador e o aplicador do direito pensar a desigualdade real, especialmente tratando-se de grupos desiguais entre si, sob pena de tornarem-se injustos. Ou seja: ofensa ao principio isonômico haveria se houvesse tratamento desigual a pessoas igualadas e agrupadas segundo um mesmo critério escolhido pelo legislador. Veja-se um exemplo: no art. 7º, I, da Constituição Federal, assegura-se proteção à relação de emprego, hipótese inaplicável ao trabalhador avulso, a despeito da regra contida no inciso XXXIV, do citado artigo. Se ignorássemos as distinções entre os citados grupos, por absurdo, o trabalhador avulso deixaria de ser avulso e teria uma relação de emprego protegida... Outro exemplo: não fosse proporcional ao resultado financeiro de seus engajamentos – muitas vezes reduzidos por ausência voluntária do trabalhador portuário avulso à oferta de trabalho -, a gratificação natalina que lhe é devida igualar-se-ia à do trabalhador com vínculo de emprego que laborou ininterruptamente durante doze meses no ano. O que não seria justo. E mais: como assegurar ao trabalhador avulso o seguro desemprego previsto no inciso II do art. 7º da Constituição Federal? Assim fosse, estar-se-ia afirmando que o trabalhador portuário registrado poderia ter seu registro cancelado imotivadamente, o que, por óbvio, fere até mesmo a lógica. Regra diversa haveria de dispor a respeito de seguro desemprego porventura instituído em favor do trabalhador portuário avulso. Por último: o contrato de trabalho do trabalhador avulso é celebrado e extinto a cada requisição atendida, que se realiza, de regra, em favor de operadores portuários distintos entre si, De cada término dessa prestação de trabalho se há de contar, por exemplo, o prazo prescricional de dois anos previsto no art. 7º, XXIX, da Constituição Federal. Entendimento diverso levaria à impossibilidade se ter uma data única, definida, de extinção de contrato, considerando-se a prestação de trabalho para múltiplos operadores, ou, quem sabe, admitir que houvesse “contrato de trabalho” entre o trabalhador portuário avulso e o OGMO, o que é legalmente inadmissível. (TST-E+ED+RR+87/2002-022-09-00.3, Rel. Min. Maria de Assis Calsing. DJ:28/03/2008; TST-E-ED-RR-15/2002-022-09-00.6. Rel. Min. Vieira de Mello Filho, DJ 27/06/2008).

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Pode-se afirmar, portanto, que a igualdade prevista no inciso XXXIV, da Constituição Federal, é pertinente a direitos nominalmente assegurados ao trabalhador avulso, a serem materializados, tanto quanto possível, em consonância com a desigualdade essencial existente entre aqueles e o trabalhador com vínculo de emprego. 2. Os conflitos. Os conflitos existentes ou latentes, na sua quantidade e complexidade, entre operadores e trabalhadores portuários, decorrem de diversos fatores. Talvez o primeiro deles seja a alteração legislativa ocasionada pela Lei nº 8.630/93, que, pela urgência que se fazia necessária na modernização dos portos brasileiros, não veio acompanhada de regras sobre o período de transição nem poderia ter regulamentado todas as relações trabalhistas portuárias. Acresça-se o fato, não menos importante, de que a cultura até então existente nas operações portuárias era praticamente o oposto daquela trazida pela Lei mencionada: pode-se até mesmo afirmar que não havia uma real preocupação sobre o custo da operação, principalmente na perspectivada economia nacional, considerando que a maior parte de nossa riqueza exportada passa pelos portos. De todo modo, seria importante encontrar uma solução global, quer pudesse, em tese, pacificar as relações de trabalho portuárias, pondo cobro, em especial, ao incontável número de ações trabalhistas atualmente existentes e que pudesse, ainda em tese, evitar novas ações. 3. O regime de trabalho. Pelas mesmas razões consignadas no item anterior, não podem ser igualados aos regimes de trabalho do empregado e do trabalhador avulso, circunstancia por eles mesmos reconhecida nas convenções coletivas celebradas. Desnecessário lembrar que ao trabalhador com vínculo empregatício, a jornada de trabalho de observância obrigatória, sob pena de punição ou despedida motivada - é antecipadamente determinada pelo mesmo empregador e em relação a tarefas normalmente repetidas a cada dia, submetendo-se a alterações dentro de limites muito escritos. Já no regime de trabalho avulso, fixam-se turnos de trabalho, aos quais o trabalhador portuário pode ou não, comparecer, ou, comparecendo, pode aceitar ou não o trabalho oferecido pelo Órgão Gestor de Mão-de-Obra. E mais: tal oferta se dá em relação a operadores portuários distintos entre si, que oferecem condições de trabalho (navios, cargas, equipamentos, etc.) muitas vezes também distintas, as quais se realizam, até mesmo por força de razões climáticas, em circunstâncias que podem variar ao longo da prestação de trabalho. No tema, pelo menos duas outras situações de trabalho têm suscitado dúvidas e questionamentos, por suas consequências, inclusive perante o Poder Judiciário: a de trabalho prorrogado em relação ao turno normal de seis horas, sem observância de nenhum intervalo (dobra) e a de requisição de trabalho com observância de intervalo de apenas seis horas, ou seja, sem observância do intervalo de onze horas previsto no art. 8º da Lei nº9. 719/98. Muitas são as ações trabalhistas em que, nas situações mencionadas, se pleiteia o pagamento de horas extras. Se procedentes, trata-se de ônus do operador portuário que, entretanto, sequer tinha condições de saber se o contrato que celebrou foi ou não imediatamente subsequente a contrato de trabalho havido com outro operador. 4. As Férias Embora já referido como mero exemplo, a concessão de férias ao trabalhador avulso, direito assegurado por norma constitucional, merece destaque especial. É certo que os trabalhadores portuários avulsos recebem, ao longo do ano e juntamente com a contraprestação por seu trabalho, parcela pertinente a férias. Resistem, porém, à respectiva fruição, porque o valor correspondente às férias incorporou-se à sua contraprestação mensal e, por certo, já foi consumido. Assim, entendem como praticamente desastrosa a fruição de férias – o que significa ausência de requisição – sem nenhum pagamento no período. Avulta a dificuldade diante do fato de o trabalhador portuário avulso não ser obrigado a comparecer à oferta de trabalho ou, comparecendo, não ser obrigado à aceitá-la. Ou ainda: comparecer à oferta de trabalho e esta se esgotar antes que ele possa manifestar-se. Como estabelecer o número de faltas injustificadas desse trabalhador para efeito de determinar o número de dias de férias a que teria direito? A respeito do tema, aliás, o Tribunal Superior do Trabalho vem decidindo que o trabalhador portuário avulso, pelas peculiaridades do trabalho que presta, nem está sujeito ao gozo de férias.

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Aduz, ainda, aquela Corte, ao fundamento de que o disposto no art.137, da CLT aplica-se apenas aos trabalhadores empregados, que não cabe ao Órgão Gestor de Mão-de-Obra, que não é empregador do trabalhador portuário avulso por expressa disposição legal, determinar período de férias deste. Decisões:RR-5397/2005-004-12-00.9, Rel. Min Carlos Alberto Reis de Paula. DJ:20/03/2009; RR-1905/2006-030-12-00.7, Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello. DJ:13/03/2009. RR-943/2007-043-12-00.0, Rel. Min. Antonio José de Barros Levenhagem. DJ: 06/03/2009. RR-3720/2006-005-12-00.7, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho. DJ:13/02/2009. 5. O adicional de Risco Portuário (Lei 4860/65). Outro tema recorrente nos conflito trabalhista portuários é pertinente aos adicionais de insalubridade, de periculosidade e de risco. Quanto aos dois primeiros, a execução do trabalhado portuário se dá a cada requisição, de regra, em favor de operador portuário diferente e de forma vinculada a navio, carga e equipamentos que também podem ser diversos entre si. Como avaliar, portanto, a cada dia e a cada turno, as condições de trabalho para determinação de insalubridade ou periculosidade e da respectiva esporadicidade ou intermitência ou habitualidade? Acresça-se, por outro lado, o fato de que se vem integrando nas taxas ajustadas até agora ajustadas, a fim de evitar a dificuldade consignada, um valor médio que contrapresta o trabalho porventura realizado em condições insalubres ou perigosas ou penosas ou de risco. Diz-se valor médio, justamente porque quase impossível determinar, a cada requisição, o agente potencialmente insalubre ou perigoso, bem como o respectivo tempo de exposição do trabalhador portuário avulso a tal agente. Tal solução, embora inteligente, sempre poderia ter sido (e em algumas ocasiões o foi) impugnada com base no entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, expresso na Súmula nº 91, segundo o qual “Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador.” Data vênia, é inaplicável à espécie tal entendimento, quer porque se trata de norma convencional coletiva (art. 7º, XXVI, da constituição Federal) e não, individual, quer por se tratar de adaptação à realidade cambiante, acima descrita, na qual a prestação do trabalho portuário se realiza. Já no tocante adicional de risco, previsto no art. 14, da Lei 4860/65, trata-se de regra especifica, destinada aos empregados das companhias de administração portuária (art. 15), circunstância que impede possa ser estendida, ainda que por analogia, a destinatários estranhos à norma, consoante jurisprudência agora consolidada pelo Tribunal Superior do Trabalho. Ou seja: se o legislador distinguiu determinada coletividade de trabalhadores e lhes atribuiu vantagem diferenciada, é porque viu neles uma situação de carência que veio a ser preenchida com a vantagem afinal outorgada. Estender tal vantagem a quem dela não carecia, até porque merecedor, em tese, de adicionais de periculosidade ou insalubridade, importa em instituir novamente uma desigualdade, que justamente se pretendeu extinguir! Tal entendimento veio a ser adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho, em decisão recente, que aguarda publicação. Acresça-se, por último, que os atuais servidores e empregados das Administrações portuárias, com o advento da Lei nº 8.630/93, deixaram de realizar as atividades relacionadas no seu art. 26, salvo insignificantes exceções decorrentes de momentânea falta de pessoal para atendimento das requisições de mão de obra. 6. As dificuldades A brevíssima digressão fático-doutrinária acima tem o objetivo de caracterizar as dificuldades encontradas pelo árbitro na consecução de sua tarefa. Em relação a esta, entretanto, o objetivo sempre foi o de estabelecer, nos exatos limites da outorga que lhe foi deferida pelo compromisso arbitral, princípios e regras que dispusessem para o futuro, relativamente aos temas horas extras, adicional de risco e férias; a segunda, a partir de amplo debate com os Assistentes Técnicos, de elaboração de uma proposta de transação que, mediante livre opção dos trabalhadores interessados e diante de limites financeiros disponibilizados pelos operadores portuários, houvesse ou não ações trabalhistas tramitando, pusesse fim à quantidade incontável de ações que se acumulam na Justiça do Trabalho, relativas aos três temas citados. PRIMEIRA PARTE. Princípios e normas objetivando evitar ações trabalhistas.

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HORAS EXTRAS. Em face das considerações consignadas anteriormente a respeito de horas extraordinárias, estabeleço o quanto segue. 1. São distintas as características de prestação de trabalho do trabalhador avulso e daquele vinculado mediante relação de emprego. Daí a necessidade de tratamento desigual entre uns e outros para que se lhes possa assegurar, tanto quanto possível, a igualdade material constitucionalmente prevista. 2. Não há como estabelecer, para o trabalhador avulso, uma jornada de trabalho, no sentido clássico. Para o trabalhador empregado, trata-se de um lapso tempo fixo de disponibilidade continuados, normalmente a cada dia ou dias determinados, para o mesmo empregador, aguardando ou executando ordens, ainda que em regime de revezamento. Para o trabalhador portuário avulso, em que se sucedem os operadores requisitantes de acordo com suas necessidades, e em que não há garantia de oferta de trabalho nem o dever de comparecimento ou, comparecendo o trabalhador, não há o dever de aceitação do trabalho oferecido, impõe-se a fixação de contratos de trabalho , que se iniciam e se extinguem a cada requisição aceita pelo trabalhador portuário avulso e que são executados em turnos ou períodos durante o dia civil estabelecido por operadores e trabalhadores portuários interessados. 3. Assim, adotam-se, como turnos de trabalho do trabalhador portuário avulso, quatro períodos diários de seis horas cada um, os quais se iniciam às 07h00min, independentes entre si, porque de regra disponibilizados para operadores portuários diferentes. Para efeito de dia civil, por força de costume na área portuária, considera-se o lapso de vinte e quatro horas que se inicia às 07h00min do dia seguinte. 4. Como não há jornada de trabalho e, sim, contrato de trabalho realizado em turnos durante o dia civil normativo e, agora sentencialmente estabelecido, não se pode cogitar de intervalo entre jornadas, mas, sim, de intervalo entre contratos de trabalho ou entre turnos de trabalho. Ou seja: é período entre contratos de trabalho, durante o qual o trabalhador portuário avulso não pode ser requisitado, salvo exceções legal ou convencionalmente previstas, como adiante se discriminará. 5. No tocante aos turnos de trabalho, decido: I – a requisição e a aceitação de trabalho, sem observância do intervalo de onze horas em relação ao contrato de trabalho (turno) anteriormente executado, previsto no art. 8º, da Lei nº 9.719/98, somente serão permitidas quando não houver mão de obra habilitada, que tenha descansado 11 (onze) horas. Tal trabalho, por sua excepcionalidade, não será considerado extraordinário, uma vez que o órgão Gestor de Mão de Obra, por um lado não é empregador do trabalhador portuário avulso, e, por outro, o Operador Portuário não tem condições de saber se aquele que agora atende a requisição usufruiu ou não, do intervalo mencionado. Registre-se entender-se como mão de obra habilitada aquela em que o trabalhador se apresenta à oferta de trabalho e passa o cartão; II – a realização de trabalho, sem intervalo em relação ao contrato de trabalho (turno) imediata e anteriormente executado, caracterizará trabalho extraordinário, quando preenchidas três condições (e não apenas duas, como convencionado), a saber: (a) vincular-se o trabalho a peculiaridades da operação e/ou a circunstâncias nas quais a operação está sendo realizada, de modo que esta não sofra prejuízo a qualquer titulo; (b) tratar-se do mesmo operador portuário; (c) tratar-se de requisição feita pelo operador portuário ao OGMO em relação a trabalhador especifico. Em tal hipótese, o adicional extraordinário será de 50%; III – a habilitaçãoa escalação, em turno intercalado entre o primeiro e quarto turnos, com lapso de onze horas até o inicio do primeiro turno subsequente, não caracterizarão trabalho em horário extraordinário nem intervalo interturnos suprimido. Este trabalho ocorrerá apenas com o consentimento do trabalhador que, para tanto, apresentar-se-á e habilitar-se-á espontaneamente; IV – o intervalo de quinze minutos, no turno de seis horas (art.71§§ 1º e 2º, da CLT) ocorrerá a partir da terceira hora e, sempre que possível, mediante rodizio, de modo a não prejudicar a operação; V – terá prioridade, na escalação, o trabalhador portuário avulso que usufruiu do intervalo de onze horas ou, sucessivamente, de seis horas, dentro da mesma categoria profissional. 6. A fim de evitar, tanto quanto possível, a excepcionalidade prevista no item5. I, supra, decido ser obrigatória a comunicação ao Conselho de Supervisão da ocorrência de engajamentos sem intervalo de onze horas em número superior a dez por cento do total de engajamentos no mês.

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DESCANSO ANUAL OPCIONAL. O tribunal Superior do Trabalho vem decidindo que o trabalhador portuário avulso não tem direito a gozo de férias, dadas às peculiaridades da prestação de seu trabalho. Por outro lado, no art. 20, da Lei nº8.630/93, estabelece-se que o órgão Gestor de Mão de Obra não é empregador do trabalhador portuário avulso. Mesmo assim, julgo importante tentar dar efetividade, de modo democrático, à igualdade prevista no art.7º, XXXIV, da Constituição Federal, estabelecendo um regramento tanto para a manifestação de vontade do trabalhador no sentido de usufruir de um descanso anual, quanto a atuação do Órgão Gestor de Mão de Obra, diante de tal manifestação, de modo que a atividade portuária – cuja asseguração é o objetivo maior na pacificação das relações de trabalho - não sofra prejuízos. Assim, decido. a) Descanso anual. I – A partir de 1º de janeiro de 2010, fica instituído o primeiro período aquisitivo do direito a descanso anual opcional para o trabalhador portuário avulso. II – De 1º a 30 de novembro de 2010 e, posteriormente, de cada ano subsequente, o trabalhador portuário avulso manifestará seu desejo de usufruir, no ano seguinte, de um descanso anual não inferior a 15 e não superior a 30 dias. Na mesma ocasião, apontará o período em que deseja usufruir desse descanso, bem como fará a opção pela forma de recebimento do valor correspondente, a saber: (a) de modo continuado, juntamente com a contraprestação pelo trabalho efetivamente realizado, ou (b) de modo acumulado e corrigido pelos mesmos índices das cadernetas de poupança, ao início da fruição desse descanso anual opcional devida ao trabalhador portuário avulso. III – De 1º a 30 de dezembro, o órgão Gestor de Mão-de-Obra organizará e publicará a escala de fruição do descanso anual. Na organização da escala, o OGMO zelará pela garantia da disponibilidade da mão-de-obra em situações de acúmulo de operações e/ ou de coincidência de períodos de descanso. Para tanto, se for o caso, informará ao trabalhador portuário avulso a impossibilidade de concessão do descanso anual do período indicado pelo trabalhador, facultando-lhe a escolha de período diverso. IV – Os trabalhadores portuários avulsos que desejarem usufruir de descanso anual já no ano de 2010 deverão atender ao procedimento descrito no item II, supra, no período de 1º a 30 de novembro de 2009. No período de 1º a 31 de dezembro de 2009, o órgão Gestor de Mão de Obra procederá na forma prevista no item III, supra. V – Não sendo o órgão Gestor de Mão de Obra empregador do trabalhador portuário avulso, por expressa disposição legal, são inaplicáveis à espécie as regras da Consolidação do Trabalho, em especial o art. 137, e legislação extravagante, relativas a férias. ADICIONAL DE RISCO Na Lei nº 4.860/65, independentemente do debate a respeito de seus reais destinatários (art.19), estabeleceu-se, simplificadamente, o adicional de risco como forma de remunerar o trabalho executado sob risco de insalubridade, periculosidade e “outros porventura existentes” (art. 14). Operadores e trabalhadores portuários em suas negociações, sempre dispuseram que, nas taxas normativamente estabelecidas, incluíam-se todos os adicionais porventura devidos, relativos à higidez física e mental do trabalhador, diante da dificuldade, já enunciada, de determinarem-se as atividades efetivamente realizadas sob risco e o respectivo tempo de exposição – se de forma habitual, intermitente ou esporádica. Tal ajuste, entretanto, não impediu a existência de ações trabalhistas, como já referido. Em algumas, questionando-se a validade de tal pagamento, porque realizado de modo complessivo, e requerendo-se o respectivo pagamento. Em outras, na dúvida a respeito de sua extensão aos trabalhadores portuários avulsos – portanto, não servidores ou empregados das Administrações dos Portos organizados – requerendo-se simplesmente o pagamento de adicional de periculosidade ou insalubridade. Desnecessário referir a dificuldade de realizar-se perícia técnica para determinação da existência de condições insalubres ou perigosas, considerando, em grade parte dos casos, a variedade dos tipos de navios, de cargas e de equipamentos utilizados a cada turno de trabalho na operação portuária. A fim de evitar a continuidade do ajuizamento de tais ações, na esteira até mesmo da solução encontrada pelo legislador na Lei citada, decido:

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a) o adicional previsto na Lei nº 4.860/65 não é devido ao trabalhador portuário avulso; b) ao adicional de insalubridade e periculosidade serão remunerados, independentemente da realização de perícia, mediante o pagamento de um adicional de 40% (quarenta por cento) a incidir sobre o salário-dia ou sobre o salário-produção, o que prevalecer no turno de trabalho efetivamente realizado; c) o citado pagamento ocorrerá de forma destacada, sob a rubrica adicional de insalubridade. Consigno que o percentual mencionado não foi obtido aleatoriamente, mas mediante consenso com os assistentes técnicos a partir de média mensal obtida da soma dos valore remuneratórios (cadastro e registro) nos últimos12 (doze) meses, dividida pelo número de todos os engajamentos no mesmo período. SEGUNDA PARTE. Princípio e normas relativos à proposta de transação. TRANSAÇÃO. Não teria sentido estabelecerem-se princípios e normas que devem a partir de agora, reger as relações entre as partes, sem que pelo menos se tentasse por fim às milhares de ações trabalhistas entre elas existentes e evitar o ajuizamento de novas ações. Isto, porque, em relação as primeiras, há uma insegurança jurídica, diante de decisões díspares dos Tribunais do Trabalho, e outra econômica, em especial dos operadores portuários, que não sabem como planejar sequer o preço de seus negócios, na incerteza de passivos trabalhistas. Tudo sem esquecer o altíssimo custo social que tais ações – repetitivas, salientem-se – carregam, decorrentemente, v.g; da hipertrofia das atividades da Justiça do Trabalho; de valores de depósitos judiciais inertes, que apenas beneficiam os Bancos depositários; e do estremecimento das relações entre operadores reclamados e trabalhadores reclamantes, circunstância que, comprovadamente, aumenta a possibilidade de acidentes do trabalho. Em relação aos trabalhadores que optaram, até agora, por não ajuizar ações trabalhistas, mesmo diante das dúvidas existentes no tocante a seus direitos, entendeu-se que não seria justo deixa-los à margem dessa tentativa conciliatória ampla. Deveriam eles, também, receber uma proposta em relação a res dúbiainconteste de suas relações laborais. Comungando desse entendimento, árbitro e Assistentes Técnicos das partes laboraram no sentido de encontrar uma proposta de solução aos problemas referidos, de modo democrático e opcional, em relação aos trabalhadores. Após inúmeras tratativas, chegaram as partes a bom termo, a integrar esta sentença, quanto a valores e forma de participação opcional de cada trabalhador portuário avulso na obtenção da eficácia do ajuste. Assim. I – Para efeito de eliminação, mediante quitação, de todas as controvérsias relativas a adicional de risco, adicional de insalubridade e adicional de periculosidade, horas extras e gozo de férias, cujos direitos já foram reconhecidos ou indeferidos, com ou sem trânsito em julgado, e para o efeito de eliminação, mediante quitação, da res dúbia, ora reconhecida pelas partes, mesmo inexistente ação trabalhista, os operadores portuários disponibilizarão, a título de indenização, o valor bruto de até R$15.000.000,00 (quinze milhões de reais), no lapso de até 24 (vinte e quatro) meses. II – A cada trabalhador portuário avulso que aderir à proposta de transação, nas condições adiante especificadas, será devido o valor calculado pelo OGMO, em consonância com os seguintes critérios: a) percentual entre o valor do MMO total e o valor efetivamente pago ao trabalhador, individualmente considerado, no período de 1º de agosto de 2007 a 31 de julho de 2008; b) percentual entre MMO total e o valor efetivamente pago ao trabalhador nos últimos doze meses antecedentes a exercício de cargo de diretor de sindicato, a aposentadoria, a gozo de beneficio previdenciário e a contratação com vínculo empregatício. Imponho ao órgão Gestor de Mão de Obra a obrigação de realizar o tratamento estatístico necessário para determinação dos percentuais referidos nas alíneas imediatamente anteriores. O valor devido a cada trabalhador será pago nas seguintes condições: a) uma primeira parcela no valor fixo de R$2.000,00, ainda que superior ao total que lhe é devido, ficando assim, o valor devido integralmente quitado. Se o valor fixo citado for superior ao que é efetivamente devido, aquele valor será abatido deste;

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b) uma segunda parcela correspondente ao saldo se houver, a ser paga em até 24 meses. O pagamento desse saldo fica condicionado à arrecadação mensal a ser realizada pelo órgão Gestor de Mão de Obra junto aos operadores portuários, dando-se preferência aos créditos de menor valor, até esgotar-se o valor mensal arrecadado; c) em ambas as hipóteses mencionadas, serão destacadas 2% sobre o valor arrecadado pelo Órgão Gestor de Mão de Obra, a título de contingenciamento para casos omissos. Os casos omissos serão resolvidos por Comissão desde logo constituída pelo Árbitro e pelos Assistentes Técnicos. Na falta ou impedimento de qualquer um deles, cada uma das partes compromissárias indicará o respectivo substituto. A adesão à proposta de transação – a ser realizada no período de 13 de outubro a 13 de novembro de 2009 -é facultada ao trabalhador portuário avulso que, sendo parte em processo judicial, diretamente ou na qualidade de substituído processual, compareça pessoalmente a seu Sindicato de classe aí manifeste, com a devida assistência deste, por escrito e em Termo próprio com duas vias, assinado também por duas testemunhas, sua livre vontade de (i) aceitar o valor oferecido, nas condições parceladas referidas; (ii) dar plena, integral e irrevogável quitação dos valores pleiteados ou já reconhecidos na ação individual, singular ou plúrima, com trânsito em julgado ou não, em que figura como parte, relativamente às pretensões ao pagamento de toda e qualquer vantagem decorrente de adicional de risco e/ ou insalubridade e/ ou periculosidade; de férias, inclusive respectiva fruição e/ ou dobra; e horas extras, em especial por dobra e/ou inobservância ou observância parcial de intervalos entre os turnos de trabalho; (iii) autorizar a liberação do (s) depósito (s) judicial (is) vinculado (s) a quaisquer recursos, se houver, na mesma ação, em favor da entidade depositante e , ainda (iii) desistir do prosseguimento da (s) respectiva (s) ação (ões), decorrentemente da transação com quitação. Tratando-se de ação com decisão a seu favor, já transitada em julgado, o trabalhador declarará, ainda, no mesmo termo, que tem conhecimento da imutabilidade de sua decisão (artigos 840 e seguintes, do Código Civil). III – Idêntico procedimento, no que couber, será adotado em relação ao trabalhador portuário avulso que, embora não sendo parte em processo trabalhista, queira transacionar na forma do disposto no art. 840 e seguintes, do Código Civil. No mesmo termo, o trabalhador declarará, ainda, que reconhece existir res dúbia(dúvida sobre o direito aplicável) em relação a direitos relativos há horas extras, adicional de risco e férias, com as mesmas especificações antes consignadas. IV – Cabe ao Sindicato assistente dar ciência da manifestação de vontade do advogado do trabalhador, se houver, e entregar a primeira via do Termo mencionado ao OGMO. Cabe a este, depois de assinado o termo de adesão, encaminhar petição assinada pelas partes ao juízo trabalhista de competência originária. V – Homologada a transação (art. 842, segunda parte, do Código Civil), o valor devido será liberado ao trabalhador no prazo máximo de cinco dias úteis. ISTO POSTO. Diante do exposto, com a concordância unânime dos AssistentesTécnicos já nominados e compondo o conflito coletivo do qual se originou a presente sentença arbitral, decido estabelecer, na forma e para os efeitos da Lei nº9.307/96, os princípios e normas consignados na fundamentação, aqui não repetidos a Horas Extras, Adicionais de Risco, de Periculosidade e de Insalubridade e Repouso Anual Opcional. Decido, ainda, também com a concordância unânime dos Assistentes Técnicos, oferecer a proposta de transação opcional consignada na fundamentação, objetivando compor os conflitos porventura existentes ou latentes até 30 de setembro de 2009. A presente sentença é assinada pelo Árbitro e pelos Assistentes inicialmente nominados. Curitiba, 30 de setembro de 2009. Gelson de Azevedo Mario Teixeira José Adilson Pereira Ronaldo Lopes Garcia

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ANEXO F – Decisão Tribunal Superior do Trabalho em Dissídio

Coletivo de Natureza Jurídica, que estabeleceu inte rpretação ao

parágrafo único do artigo 26 da Lei 8.630/93 299

DISSÍDIO COLETIVO DE NATUREZA JURÍDICA – PORTUÁRIOS – EXEGESE DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 26 DA LEI 8.630/ 93 À LUZ DA CONVENÇÃO 137 DA OIT – POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DOS TRABALHADORES EM CAPATAZIA E BLOCO SEM NECESSIDADE DE REGISTRO NO OGMO, MAS DANDO-SE PRIORIDADE AOS REGISTRADOS. 1. O presente dissídio coletivo de natureza jurídica tem como escopo primordial obter pronunciamento do Judiciário Laboral em torno da exegese do art. 26 e seu parágrafo único da Lei 8.630/93. 2. O parágrafo único do art. 26 é de clareza solar ao não mencionar capatazia e bloco dentre as modalidades que devem ser contratadas aproveitando trabalhadores registrados no OGMO. Essa é a interpretação literal do dispositivo, método próprio de aplicação das normas, cuja clareza redacional faz exsurgir seu sentido pleno da simples leitura do texto, sem maiores perquirições ou dúvidas, na esteira do brocado “in claris cessat interpretatio”. 3. Sob o prisma da técnica legislativa e interpretação histórica, se fosse intenção do legislador exigir o registro de todos os trabalhadores portuários no OGMO, teria simplesmente mencionado, no parágrafo único do art. 26, “os trabalhadores portuários referidos no caput deste artigo” ou então nem sequer teria previsto um parágrafo único, já que, sendo a disciplina jurídica comum a todas as modalidades de trabalho portuário, bastava que no caput do art. 26 se dissesse, ao final, “contratados exclusivamente dentre os trabalhadores avulsos registrados”. Assim, a existência de um parágrafo único ao art. 26, e com rol diferenciado de modalidades de trabalhadores, está a gritar que as modalidades não elencadas no parágrafo único têm disciplina jurídica diversa quanto à contratação. 4. Sob o prisma teleológico, a lei dos portos visou a modernizar e baratear o custo operacional dos portos brasileiros, através da introdução de tecnologia que, necessariamente, acaba por substituir o trabalho preponderantemente braçal pelo trabalho operacional de máquinas. Até o momento não foi regulamentado o art. 7º, XXVII, da CF, que visa a proteger o trabalhador em face da automação. No entanto, a ausência de promulgação da lei que regulamenta o preceito constitucional não autoriza a manutenção das técnicas e modelos antigos de gerenciamento e funcionamento dos portos.

299 RODC - 2017400-75.2004.5.02.0000 Data de Julgamento: 16/08/2007, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Publicação: DJ 22/02/2008. Recorrente: Sindicato dos Operadores em Aparelhos Guindastescos, Empilhadeiras, Máquinas e Equipamentos Transportadores de Carga dos Portos e Terminais Marítimos e Fluviais do Estado de São Paulo – Sindogeesp. Recorridos: Marimex Despachos, Transportes e Serviços Ltda, Sindicato dos Empregados Terrestres em Transportes Aquaviários e Operadores Portuários do Estado de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores de Bloco dos Portos de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebas e Outro

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5. Assim, o sistema anterior à Lei 8.630/93 era o da intermediação dos sindicatos na contratação dos trabalhadores avulsos, tendo em vista que a forma de prestação de serviços, com engajamento temporário em cada navio aportado, sem empregador permanente, recomendava a concentração numa entidade para a cobrança do preço pelo serviço prestado e o rateio do produto entre os trabalhadores engajados. 6. Se, nos primórdios da navegação comercial, as embarcações levavam seus próprios estivadores, para carga e descarga da mercadoria nos portos, a evolução posterior, visando à redução dos custos, foi a de contratar o pessoal dos portos para essas fainas, reduzindo a tripulação dos navios mercantes. 7. Ora, no momento em que se distingue fundamentalmente o serviço de capatazia, ligado à movimentação, em terra, das mercadorias nas instalações portuárias (art. 57, § 3º, I), do serviço de estiva (art. 57, § 3º, II), ligado à movimentação das mercadorias dentro das embarcações, tem-se uma sinalização para o critério (o discrimen) utilizado para dar tratamento diferenciado a essas modalidades: o OGMO, como órgão que substituiu o sindicato na gestão da mão-de-obra portuária, serve, basicamente, para concentrar e administrar a utilização da mão-de-obra para as atividades realizadas nos navios, cujos armadores são variados e onde a relação de trabalho é temporária. 8. Já os trabalhos de capatazia, realizados nos armazéns e instalações portuárias, podem ser contratados por um único operador portuário, em regime contratual de prazo indeterminado, nos moldes comuns aos demais trabalhadores regidos pela CLT, uma vez que provêm das antigas Companhias Docas, onde eram funcionários com vínculo permanente. 9. Finalmente, tendo a Convenção 137 da OIT se tornado direito interno mediante sua ratificação pelo Brasil com o Decreto 1.574/95, lança luz nova sobre a questão em exame, quando recomenda que o trabalhador portuário tenha emprego permanente e seja contratado prioritariamente dentre aqueles registrados no posto. 10. Assim, é de se acolher o presente dissídio coletivo de natureza jurídica, para declarar que não estão os operadores portuários obrigados a contratar apenas trabalhadores portuários avulsos que sejam registrados no OGMO no que diz respeito às modalidades de trabalho em capatazia e bloco, devendo, no entanto, dar prioridade aos trabalhadores registrados. Recurso ordinário provido em parte .

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em

Dissídio Coletivo TST-RODC-20.174/2004-000-02-00.0, em que é Recorrente MARIMEX DESPACHOS, TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA. e Recorridos SINDICATO DOS OPERADORES EM APARELHOS GUINDASTESCOS, EMPILHADEIRA S, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS TRANSPORTADORES DE CARGA DOS PORTOS E TERMINAIS MARÍTIMOS E FLUVIAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO – SINDOGEESP E OU TROS, SINDICATO DOS EMPREGADOS TERRESTRES EM TRANSPORTES AQUAVIÁRIOS E OPERADORES PORTUÁRIOS DO ESTADO DE SÃO PAULO e SINDICATO DOS T RABALHADORES DE BLOCO NOS PORTOS DE SANTOS, SÃO VICENTE, GUARUJÁ, C UBATÃO E SÃO SEBASTIÃO E OUTRO.

R E L A T Ó R I O O TRT da 2ª Região , apreciando o dissídio coletivo de natureza

jurídica suscitado pela Empresa Marimex , após rejeitar as preliminares argüidas pelos Suscitados, julgou parcialmente procedente o dissídio, “para declarar que a possibilidade de contratação de trabalhadores a prazo indeterminado, para o trabalho de capatazia e bloco, sem

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qualquer vinculação com o OGMO está excluída. Para tanto, os avulsos deverão ser, ao menos inscritos (cadastrados), naquele Órgão de Gestão. Para os demais serviços referidos no caput do art. 26 da Lei 8.630/93, a contratação a prazo indeterminado deverá ser feita, necessariamente, dentre os avulsos registrados no OGMO, nos termos do parágrafo único do mencionado artigo de lei” (cfr. fls. 807-827).

Inconformada, a Empresa-Suscitante interpõe o presente recurso ordinário , argüindo nulidade do julgado por cerceamento de defesa e, no mérito, postulando a exclusão dos trabalhadores de capatazia e bloco da necessidade de serem registrados no OGMO para poderem ser contratados por operador portuário (fls. 842-857).

Admitido o recurso (fls. 863-864), foram apresentadas razões de contrariedade (fls. 872-910), tendo o Ministério Público do Trabalho, em parecer da lavra da Dra. Márcia Raphanelli de Brito , opinado no sentido do não-provimento do apelo (fls. 914-926).

É o relatório. V O T O I) CONHECIMENTO Tempestivo o apelo (cfr. fls. 841-842), regular a representação (fl.

14) e devidamente preparado (fls. 859-861), dele CONHEÇO. II) PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEIO DE DEFESA A prefacial de cerceio de defesa esgrimida pelo Suscitante-Recorrente

diz respeito ao indeferimento da prova oral postulada. Em se tratando de dissídio coletivo de natureza jurídica , ligado

exclusivamente à interpretação de norma sentencial, convencional ou legal categorial, não comporta realização de prova, quanto mais a oral.

Aliás, nem sequer se exige o comum acordo para ajuizamento do dissídio, pois se está em sede de exercício típico de jurisdição (ação declaratória meramente interpretativa de regra de direito, in abstractu) e não de exercício de poder normativo, criador de regra nova.

O caráter abstrato da sentença em dissídio coletivo de natureza jurídica, com seu comando abrangendo genericamente todos os integrantes da categoria, apenas para dar o conteúdo normativo da cláusula sentencial ou convencional, ou de dispositivo de lei aplicável a determinada categoria profissional, aponta para a impertinência da prova de fato, própria das lides individuais de interesses concretos e delimitáveis.

De qualquer modo, em face da regra do art. 249, § 2º, do CPC , podendo ser julgado o mérito do recurso favoravelmente ao Recorrente, NÃO CONHEÇO da preliminar em apreço.

III) MÉRITO Muito se escreveu na decisão recorrida, nas contra-razões ao recurso

ordinário patronal e no parecer do Ministério Público para se dizer que o que está escrito na lei não está escrito na lei.

Com efeito, o presente dissídio coletivo de natureza jurídica teve como escopo primordial obter pronunciamento do Judiciário Laboral em torno da exegese do art. 26 e seu parágrafo único da Lei 8.630/93 , que dispõem:

“Art. 26. O trabalho portuário de capatazia, estiva, conferência

de carga. conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados, será realizado por trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e por trabalhadores portuários avulsos.

Parágrafo único. A contratação de trabalhadores portuários de estiva, conferência de carga, conserto de carga e vigilância de

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embarcações com vínculo empregatício a prazo indeterminado será feito, exclusivamente, dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados”. Se a pretensão obreira é de que os servidores de capatazia e bloco

sejam obrigatoriamente contratados dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados no OGMO, o comando legal específico que disciplina a matéria – o parágrafo único do art. 26 – não obriga a contratação exclusiva de portuários regist rados no OGMO para essas modalidades de trabalho portuário.

Essa é a interpretação literal do dispositivo, sabendo-se que a exegese gramatical, jungida ao sentido estrito das palavras expressas no comando normativo, é a menos elástica de todas, pois leva o juiz a lastrear-se no texto da lei, aplicando-o à risca, nos moldes em que foi redigida. É o método próprio de aplicação das normas, cuja clareza redacional faz exsurgir seu sentido pleno da simples leitura do texto, sem maiores perquirições ou dúvidas, na esteira do brocado “in claris cessat interpretatio”.

Como para alguns a interpretação literal é o mais pobre dos métodos de hermenêutica, poder-se-ia também adotar, no caso dos autos, a interpretação sistemática ou orgânica , que, na análise de um dispositivo concreto de lei, tem em conta o contexto em que se encontra inserido. Ora, se cada parte da lei (artigo, parágrafo, inciso, alínea) representa um diferente comando legal, tem-se que, no caso, a exegese do parágrafo único do art. 26 da Lei 8.630/93 deve ser feita em cotejo com o caput do art. 26 da Lei 8.630/93.

Ora, aqui a clareza da exclusão da capatazia e bloco da obrigatoriedade de contratação de trabalhadores registrados no OGMO é ainda maior, pois, ao se tratar das formas de contratação – vínculo empregatício por prazo indeterminado e trabalho avulso – mencionam-se expressamente as duas modalidades, que , no dispositivo seguinte, são excluídas . O simples cotejo dos comandos legais mostra, às escâncaras, que a capatazia e bloco são modalidades de trabalho portuário com possibilidade de contratação avulsa ou permanente, mas sem obrigatoriedade de registro no OGMO.

Ainda sob o prisma da interpretação sistemática , temos que o art. 70 da Lei dos Portos lança luzes para a compreensão da sistemática onde estão inseridos os trabalhadores de capatazia. Assim reza o dispositivo em comento:

“Art. 70. É assegurado aos atuais trabalhadores portuários em

capatazia com o vínculo empregatício a prazo indeterminado a inscrição no registro a que se refere o inciso II do art. 27 desta Lei, em qualquer dos órgãos locais de gestão de mão-de-obra, a sua livre escolha, no caso de demissão sem justa causa”. Ora, o registro do trabalhador de capatazia é opcional, para o caso

de ser demitido , quando laborava com contrato de trabalho a prazo determinado, que é a regra nessa modalidade de atividade portuária. Assim, registrado esse trabalhador como avulso, poderá se engajar tanto em serviços de capatazia, como em outros que lhe forem ofertados e aceitar.

Indo mais além, quer na interpretação sistemática mais ampla, quer na interpretação teleológica ou finalista , que busca captar a finalidade da norma, descobrindo a mens legis (o espírito da lei), até chegarmos à interpretação histórica ou intencional , que fixa o sentido da norma segundo a mens legislatoris, isto é, conforme a vontade política manifestada pelo legislador no momento de criação da lei, conclui-se também pela exclusão da capatazia e bloco dos serviços obrigatoriamente contratáveis dentre trabalhadores registrados no OGMO.

Com efeito, sob o prisma da técnica legislativa , se fosse intenção do legislador exigir o registro de todos os trabalhadores portuários no OGMO, teria simplesmente mencionado, no parágrafo único do art. 26, “os trabalhadores portuários referidos no caput deste artigo” ou então nem sequer teria previsto um parágrafo único, já que, sendo a disciplina jurídica comum a todas as modalidades de trabalho portuário, bastava que no caput do art. 26 se dissesse, ao final, “contratados exclusivamente dentre os trabalhadores avulsos registrados”. Assim, a existência de um parágrafo único ao art. 26 e com rol diferenciado de modalidades de trabalhadores está a gritar que as modalidades não elencadas no parágrafo único têm disciplina jurídica diversa quanto à contratação!

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Sob o prisma teleológico , a lei dos portos visou a modernizar e baratear o custo operacional dos portos brasileiros , através da introdução de tecnologia que, necessariamente, acaba por substituir o trabalho preponderantemente braçal pelo trabalho operacional de máquinas.

Até o momento não foi regulamentado o art. 7º, XXVII, da CF , que visa a proteger o trabalhador em face da automação . No entanto, a ausência de promulgação da lei que regulamenta o preceito constitucional não autoriza a manutenção das técnicas e modelos antigos de gerenciamento e funcionamento dos portos.

Assim, o sistema anterior à Lei 8.630/93 era o da intermediação dos sindicatos na contratação dos trabalhadores avulsos , tendo em vista que a forma de prestação de serviços, com engajamento temporário em cada navio aportado, sem empregador permanente, recomendava a concentração numa entidade para a cobrança do preço pelo serviço prestado e o rateio do produto entre os trabalhadores engajados.

Se, nos primórdios da navegação comercial, as embarcações levavam seus próprios estivadores , para carga e descarga da mercadoria nos portos, a evolução posterior, visando à redução dos custos, foi a de contratar o pessoal dos portos para essas fainas, reduzindo a tripulação dos navios mercantes.

Já no caso dos serviços de capatazia , a atividade antes da Lei 8.630/93 era desenvolvida por trabalhadores com vínculo permanente, empregados nas Companhias Docas dos vários Estados da Federação, laborando em terra e não dentro dos navios atracados.

Ora, no momento em que se distingue fundamentalmente o serviço de capatazia , ligado à movimentação, em terra, das mercadorias nas instalações portuárias (art. 57, § 3º, I), do serviço de estiva (art. 57, § 3º, II), ligado à movimentação das mercadorias dentro das embarcações, tem-se uma sinalização para o critério (o discrimen) utilizado para dar tratamento diferenciado a essas modalidades: o OGMO, como órgão que substituiu o sindicato na gestão da mão-de-obra portuária, serve, basicamente, para concentrar e administrar a utilização da mão-de-obra para as atividades realizadas nos navios , cujos armadores são variados e onde a relação de trabalho é temporária.

Já os trabalhos de capatazia , realizados nos armazéns e instalações portuárias , podem ser contratados por um único operador portuário , em regime contratual de prazo indeterminado, nos moldes comuns aos demais trabalhadores regidos pela CLT.

Com efeito, antes da Lei dos Portos, o trabalho de capatazia era realizado pelo funcionários da Companhias Docas , de cada porto organizado, com vínculo perman ente, já que servidores estaduais . Daí o regime distinto a que devem ser submetidos.

Assim, a regra do art. 18 da Lei 8.630/93 , que fala das funções do OGMO, dentre as quais o registro e a administração do fornecimento da mão-de-obra portuária, é norma genérica , que admite as regras específicas , dentre as quais o parágrafo único do art. 26.

Finalmente, aproveitando o método sociológico e o comparado de hermenêutica, que levam em conta, respectivamente, a evolução da realidade social sobre a qual incide a norma, bem como o seu contexto internacional, temos que o rigor da norma interpretanda merece ser matizado e mitigado.

Com efeito, têm os operadores portuários reconhecido que, antes de contratarem trabalhadores para os serviços de capatazia, mormente aqueles ligados à operação de equipamentos, fora do sistema de registro ou cadastro no OGMO, têm promovido consulta, para verificar se há trabalhadores registrados, interessados e em condições de assumirem as vagas. Só diante da recusa é que contratam pessoal de fora do sistema. O motivo alegado para a recusa é o de que não desejam os trabalhadores registrados no OGMO a contratação permanente , mas continuarem avulsos.

Ora, pelo Decreto 1.574/95, o Brasil ratificou a Convenção 137 da OIT, que trata do trabalho portuário , que tem os seguintes dispositivos com incidência sobre a questão em exame:

“Artigo 2 1. Incumbe à política nacional estimular todos os setores

interessados para que assegurem aos portuários, na medida do

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possível, um emprego permanente ou regular. (...) Artigo 3 (...) 2. Os portuários matriculados terão prioridade para a obtenção

de trabalho nos portos (...)”.

A ratificação da convenção tornou-a direito interno, que deve ser

compatibilizado com as normas pré-existentes que disciplinam o trabalho nos portos. Da redação dos dispositivos da convenção supracitados se percebe seu caráter programático : estimular o emprego permanente dos portuários e dar prioridade aos registrados.

Diante do quadro até aqui traçado, emoldurado pelos diferentes métodos hermenêuticos, conclui-se que:

a) os operadores portuários podem contratar pessoal fora dos sistema de registro no OGMO;

b) devem, no entanto, dar prioridade aos trabalhadores registrados no OGMO, consultando o órgão para saber se há interessados registrados; não havendo, estão liberados para buscar fora do sistema trabalhadores para os serviços de capatazia e bloco.

Pelo exposto, DOU PROVIMENTO PARCIAL , ao recurso ordinário para declarar que, até 11 de agosto de 1995, os operadores portuários podiam contratar trabalhadores, fora do sistema, para a atividade de capatazia. À partir de 12 de agosto de 1995, data da incorporação da Convenção 137 da OIT ao ordenamento jurídico, a contratação de trabalhador, por prazo indeterminado, para o serviço de capatazia, deve ocorrer, prioritariamente, dentro do sistema, especificando o operador portuário a qualificação do trabalhador desejado, facultando-se às empresas operadoras portuárias a contratar, por prazo indeterminado, fora do sistema, na hipótese de remanescer vagas.

ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Egrégia Seção Especializada em

Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por maioria, dar provimento parcial ao Recurso Ordinário para declarar que, até 11 de agosto de 1995, os operadores portuários podiam contratar trabalhadores, fora do sistema, para a atividade de capatazia. À partir de 12 de agosto de 1995, data da incorporação da Convenção 137 da OIT ao ordenamento jurídico, a contratação de trabalhador, por prazo indeterminado, para o serviço de capatazia, deve ocorrer, prioritariamente, dentro do sistema, especificando o operador portuário a qualificação do trabalhador desejado, facultando-se às empresas operadoras portuárias a contratar, por prazo indeterminado, fora do sistema, na hipótese de remanescer vagas. Vencidos em parte os Exmos. Ministros Relator, Milton de Moura França e Carlos Alberto Reis de Paula, que entenderam que a recusa do operador portuário em contratar há que ser fundamentada. O Exmo. Ministro Presidente da Sessão deferiu o pedido de juntada de voto convergente ao pé do acórdão, formulado pelo Exmo. Ministro João Oreste Dalazen.

Brasília, 16 de agosto de 2007.

__________________________________ IVES GANDRA MARTINS FILHO

MINISTRO-RELATOR

Ciente:

___________________________________ REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO

TRABALHO

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J U S T I F I C A T I V A D E V O T O C O N V E R G E N T E

D O E X M O . M I N I S T R O J O Ã O O R E S T E D A L A Z E N MARIMEX DESPACHOS, TRANSPORTES E SERVIÇOS LTDA.

ajuizou dissídio coletivo de natureza jurídica em face do SINDICATO DOS OPERADORES EM APARELHOS GUINDASTESCOS, EMPILHADEIRAS, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS TRANSPORTADORES DE CARGA DOS PORTOS E TERMINAIS MARÍTIMOS E FLUVIAIS DO ESTADO DE SÃO PAULO — SINDOGEESP. Pretendeu o reconhecimento judicial de que não se lhe aplicaria a Lei nº 8.630/93, por exercer suas atividades na área retroportuária, de modo que, para o exercício da função de capatazia, a Empresa Suscitante não estaria obrigada a contratar por tempo indeterminado trabalhadores avulsos vinculados ao Órgão Gestor de Mão-de-Obra — OGMO.

Por sua vez, o SINDOGEESP, Suscitado, apresentou reconvenção , mediante a qual postulou a declaração de que a atividade realizada pela Empresa Suscitante seja realizada exclusivamente por trabalhador habilitado e inscrito junto ao Órgão Gestor de Mão-de-Obra — OGMO e pertencente à categoria representada pelo Sindicato profissional Reconvinte, quer na área arrendada, quer na condição de Operador Portuário, no porto organizado.

Sindicato dos Conferentes de Capatazia do Porto de Santos, Sindicato dos Trabalhadores de Bloco nos Portos de Santos, São Vicente, Guarujá, Cubatão e São Sebastião, Sindicato dos Trabalhadores Administrativos em Capatazia, nos Terminais Privativos e Retroportuários e na Administração em Geral dos Serviços Portuários do Estado de São Paulo — SINTRAPORT e Sindicato dos Empregados Terrestres em Transportes Aquaviários e Operadores Portuários do Estado de São Paulo foram integrados à relação processual na qualidade de litisconsortes passivos .

O Eg. 2º Regional, em acórdão formalmente uno, julgou parcialmente procedentes os pleitos formulados no dissídio coletivo de natureza jurídica e na reconvenção ofertada pelo Sindicato profissional Suscitado para “declarar que a possibilidade de contratação de trabalhadores a prazo indeterminado, para o trabalho de capatazia e bloco, sem qualquer vinculação com o OGMO, está excluída . Para tanto, os avulsos deverão ser ao menos inscritos (cadastrados), naquele órgão de Gestão. [...] A presente conclusão é de ser aplicada, no que couber, a todos os trabalhadores representados pelos Sindicatos que são partes na presente lide. (Suscitado e Litisconsortes)” (fl. 827).

Assentou a Corte de origem que a Empresa Suscitante insere-se na definição de operadora portuária, à luz do art. 26 da Lei nº 8.630, de modo que a aludida lei aplica-se-lhe integralmente. Consignou, também, que, da leitura do art. 27 da Lei nº 8.630/93, depreende-se que não há viabilidade jurídica para a contratação com vínculo permanente que prescinda de mão-de-obra portuária ao menos cadastrada no Órgão Gestor de Mão-de-Obra — OGMO.

O Eg. 2o Regional partiu de duas premissas inerentes ao porto organizado: 1) a distinção entre trabalhadores portuários registrados e trabalhadores portuários cadastrados ; e 2) a imposição legal de que o OGMO, e apenas o OGMO, administra o fornecimento de mão-de-obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso (art. 18, I, Lei nº 8.630/93).

Irresignada, a Empresa Suscitante interpõe recurso ordinário. Renova a argumentação no tocante à suposta inaplicabilidade da Lei nº 8.630/93. Alega violação ao art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.630/93, sustentando que tal dispositivo expressamente libera os operadores portuários de contratar trabalhador registrado ou cadastrado no órgão Gestor de Mão-de-Obra para as funções de capatazia e bloco.

A questão central, tormentosa e atormentadora, que o presente dissídio suscita, em suma, consiste em saber se a lei brasileira autoriza as empresas operadoras portuárias a contratação com vínculo empregatício, por tempo indeterminado, para o serviço de bloco e capatazia, dentre trabalhadores não inscritos no OGMO; enfim, se pode haver contratação por tempo indeterminado fora do sistema concebido pela Lei 8.630/93.

Sabe-se que a moderna Hermenêutica considera insatisfatório e indesejável, na interpretação da lei, o método silogístico e puramente literal, na base de um raciocínio apenas lógico-formal-dedutivo, porque conduz a resultados absurdos.

Apenas para ilustrar, é sempre interessante relembrar o episódio

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narrado por Luís RECASÉNS SICHES, citando RADBRUCH. Em uma estação ferroviária da Polônia, havia uma letreiro cujo texto rezava: "Proibida a entrada com cães". Sucedeu uma vez que alguém pretendeu adentrar acompanhado de um urso . O porteiro impediu o acesso. A pessoa que se fazia acompanhar do urso protestou, alegando que a norma proibia a passagem com cães, não com outra classe de animais.

Diz RECASÉNS SICHES que no conflito jurídico acerca da interpretação dessa norma não cabe qualquer dúvida de que, em se aplicando a lógica tradicional, indiscutivelmente a pessoa acompanhada de urso teria direito de entrar, pois não há modo de incluírem-se os ursos no conceito de "cão". Se o legislador houvesse querido proibir também o acesso com urso, deveria ter utilizado uma proibição mais genérica (por exemplo, "animais perigosos"), ou simplesmente "animais". Porém, como a norma referiu-se a "cães", de sentido unívoco, a vedação dirige-se somente a cães e nada mais que cães...

Esse singelo episódio denota a inadequação da lógica puramente dedutiva para a interpretação do conteúdo dos preceitos jurídicos: em Direito há que prevalecer, acima de tudo, a "lógica do razoável", não apenas estimando-se as razões que ditaram a norma, ou os valores que ela busca tutelar, mas também tomando em conta o sistema em que ela se acha concebida.

Em uma palavra: não é recomendável a interpretação literal e mormente insulada de uma norma jurídica porquanto produz, não raro, resultados ilógicos e desarrazoados.

Tal reflexão, em meu entender, vem bem a propósito da candente controvérsia ora em exame, que aparentemente repousa na exegese do art. 26, parágrafo único, da Lei nº 8.630/93, de seguinte teor:

“Art. 26. O trabalho portuário de capatazia, estiva, conferência

de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados, será realizado por trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e por trabalhadores portuários avulsos.

Parágrafo único. A contratação de trabalhadores portuários de estiva, conferência de carga, conserto de carga e v igilância de embarcações com vínculo empregatício a prazo indeterminado será feita, exclusivamente , dentre os trabalhadores portuários avulsos registrados .” (grifo nosso) É certo que, como visto, o aludido parágrafo único não alude aos

serviços de bloco e de capatazia, o que, ante uma exegese isolada e literal dessa norma, conduziria à conclusão da ora Recorrente, ou seja, de que não haveria obrigatoriedade de as operadoras portuárias, para o exercício da função de capatazia e bloco no porto organizado, contratarem trabalhador, por tempo indeterminado, registrado ou cadastrado no OGMO.

Ora, essa diretriz, consistente em permitir a contratação fora do sistema, antes de mais nada conflita abertamente com o espírito da própria Lei nº 8.630/93, de erigir um sistema centralizado no OGMO para a contratação de mão-de-obra.

O que quis a lei essencialmente, como sabemos? Como se recorda, a Lei 8.630/93 buscou modernizar a estrutura dos

portos brasileiros, na medida em que pôs fim ao recrutamento de mão-de-obra junto aos sindicatos, redimensionou o papel do Estado, prestigiou a negociação coletiva e estimulou os investimentos da iniciativa privada em ambiente concorrencial.

Especialmente no tocante à mão-de-obra, a lei concebeu um sistema, em que o OGMO administra todo o fornecimento da mão-de-obra tanto do trabalhador portuário quanto do trabalhador portuário avulso. É o que reza explicitamente o art. 18, inciso I.

Ora, nesse contexto, como conceber a contratação direta de mão-de-obra no mercado, fora do sistema? A meu juízo, data venia , isso seria flagrantemente ilógico e contrário ao espírito da lei.

De outro lado, o art. 18, inciso II, da Lei nº 8.630/93 dispõe que incumbe ao OGMO “manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso ”. Reitera o art. 27, incisos I e II, que o OGMO organizará e

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manterá cadastro de trabalhadores portuários habilitados ao desempenho das atividades referidas no art. 26 (em que há referência expressa à capatazia!) e organizará e manterá o registro dos trabalhadores portuários avulsos .

Qual a inferência que daí se extrai? Que a própria lei alude expressamente a cadastro no OGMO para trabalhadores em serviço de capatazia?

Mais ainda: o art. 70 da própria lei também assegurou , como disposição transitória, aos trabalhadores portuários em capatazia com vínculo empregatício por tempo indeterminado a inscrição no registro a que se refere o inciso II do art. 27 da lei, em qualquer dos órgãos locais de gestão de mão-de-obra, a sua livre escolha, no caso de despedida sem justa causa. Ademais, o art. 71 dispôs expressamente que o referido registro, desde a edição da lei, já abrangia os trabalhadores avulsos em capatazia .

Eis o que dispôs a Lei textualmente, a propósito:

“Art. 70. É assegurado aos atuais trabalhadores portuários em capatazia com vínculo empregatício a prazo indeterminado a inscrição no registro a que se refere o inciso II d o art. 27 desta lei, em qualquer dos órgãos locais de gestão de mão-de-obra, a sua livre escolha, no caso de demissão sem justa causa .

Art. 71. O registro de que trata o inciso II do caput do art. 27 desta lei abrange os atuais trabalhadores integrantes dos sindicatos de operários avulsos em capatazia , bem como a atual categoria de arrumadores.” (grifo nosso)

Em meu entender, a conclusão é de que, no tocante à capatazia,

somente existiriam trabalhadores registrados. Ou, ao menos, dada a necessidade da re alização da atividade da capatazia, a lei impulsionou todos os trabalhadores em capatazia a obterem o registro.

A meu juízo, decorre dessa interpretação sistemática da Lei 8.630/93 que, ao omitir os trabalhadores portuários de capatazia, o parágrafo único do art. 26 não pretendeu, pura e simplesmente, liberar os operadores portuários de observarem o sistema ao contratarem com vínculo empregatício, por tempo indeterminado. Do contrário, não fariam sentido os outros preceitos a que se vêm de aludir.

De todo modo, penso que quaisquer dúvidas a respeito dissiparam-se ao sobrevir a Convenção nº 137 da OIT (ratificada pelo Decreto nº 1.574, de 31 de julho de 1995).

A referida norma internacional do trabalho, ao incorporar-se ao ordenamento jurídico nacional, ostentando hierarquia de lei ordinária, inequivocamente sobrepôs-se, a partir da ratificação, a qualquer lei interna do Estado brasileiro que virtualmente dispusesse em sentido contrário.

Estou convencido de que, independentemente do alcance que se emprestar à Lei 8.630/93, hoje não se pode fazer tábula rasa da Convenção nº 137 da OIT na contratação de trabalhador portuário.

E o que reza textualmente a Convenção nº 137 da OIT?

“Art. 3º – 1. Registros serão estabelecidos e mantidos em dia para todas as categorias profissionais de portuários na forma determinada pela legislação ou a prática nacionais.

2. Portuários matriculados terão prioridade para a obtenção de trabalho nos portos.

3. Os portuários matriculados deverão estar prontos para trabalhar de acordo com o que for determinado pela legislação ou a prática nacionais.” Como se percebe, a Convenção nº 137 da OIT elege um critério

inafastável de prioridade ou de preferência na contratação, que obviamente difere do critério da exclusividade abraçado pelo Egr. Regional.

A integração da Convenção nº 137 da OIT ao ordenamento jurídico brasileiro, em meu entender, significa que os operadores portuários, na contratação por tempo

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indeterminado para o serviços de bloco e capatazia, necessariamente haverão de dar prioridade ou primazia aos trabalhadores portuários registrados no OGMO; sucessivamente, aos cadastrados.

Somente se não houver trabalhador registrado ou cadastrado no OGMO interessado na contratação por tempo indeterminado, porque os eventualmente registrados ou cadastrados prefiram apenas a contratação como avulsos, é lícito ao operador portuário socorrer-se de mão-de-obra fora do sistema para os serviços de bloco e capatazia.

A integração da Convenção nº 137 da OIT ao nosso ordenamento jurídico, portanto, implicou uma relativa flexibilização na contratação para os serviços de bloco e capatazia: a exigência de exclusividade na obtenção dessa mão-de-obra junto a o OGMO transmudou-se para preferência ou prioridade.

Por derradeiro, acentuo que compreendo a relevante preocupação dos operadores portuários com o treinamento e capacitação para o manejo de equipamentos muitas vezes sofisticados utilizados na área portuária.

Não posso deixar de ter presente, todavia, que são as empresas que mantêm o OGMO, e, por isso, cabe-lhes empreender ingentes esforços para a capacitação dos avulsos a fim de que possam desempenhar a contento os misteres dos serviços de bloco e capatazia em contratação por tempo indeterminado.

Com todo respeito, não me parece razoável consentir em que as empresas, nesse passo, tirem proveito de uma omissão em capacitação desses profissionais e, pior, por conta disso, ainda assim escancarem uma imensa porta à contratação direta de mão-de-obra mais barata fora do sistema.

Eis as razões pelas quais acompanhei o douto voto do Exmo. Min. Relator para dar provimento parcial ao recurso interposto pela Empresa Suscitante para declarar que a Empresa Suscitante, quando contratar trabalhadores para as atividades de capatazia e bloco, por tempo indeterminado, deverá prioritariamente oferecer as vagas aos trabalhadores registrados e cadastrados no OGMO. Somente remanescendo vagas dentre as ofertadas, faculta-se a contratação direta de trabalhadores não registrados nem cadastrados no OGMO para a atividade de capatazia e bloco.

Brasília, 16 de agosto de 2007.

JOÃO ORESTE DALAZEN

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Deposite-se na Secretaria do Mestrado.

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Professor (a) Orientador (a) Curitiba, ____/_____/________

Recebido em: _______/________/________

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Secretaria